Os Jovens e a escola: tensões e possibilidades de diálogo num mundo veloz, mutante e inseguro Prof. Dr. Paulo Carrano Universidade Federal Fluminense – UFF www.uff.br/observatoriojovem www.emdialogo.uff.br Duas questões para o diálogo Como fazer para que nossas escolas consigam incorporar os objetivos da formação integral dos nossos jovens, objetivos estes consagrados nas novas Diretrizes Curriculares do Ensino Médio? Como fazer para que as nossas práticas educativas funcionem de fato como suporte nos processos de construção de identidades e projetos de vida dos e das jovens estudantes? Eixos da comunicação Quem trabalha com a juventude precisa compreender o que significa ser jovem nos dias de hoje. A importância do reconhecimento comum sobre os desafios que precisamos enfrentar para que a escola faça sentido para os estudantes. A escola como espaço-tempo de experiências significativas para estudantes e professores. A arte de aprender a fazer boas escolhas num mundo saturado de informações e valores conflitantes. Juventude-Juventudes A juventude representa a síntese complexa de uma unidade – enquanto fase da vida - e de diversidades – considerando os atributos sociais que distinguem os jovens uns dos outros A juventude é ciclo medido em anos de vida e também representação social sobre as idades Adolescência e Juventude: Explicação fácil: Adolescente = entre 12 e 18 anos (ECA). Juventude = entre 15 e 29 anos (Estatuto da Juventude). Juventude(s) – Expressão que temos utilizado nos últimos anos para descrever a diversidade evidenciada. É preciso tentar perceber também as unidades que legitimam o uso de juventude como conceito. As idades do homem 1 The Ages of Man, late 16th century (oil on panel), English School, (16th century) / Private Collection / Photo © Christie's Images / The Bridgeman Art Library As idades do homem The Ages of Man, 1906 (colour litho), French School, (20th century) / Musee Nat. des Arts et Traditions Populaires, Paris, France / Lauros / Giraudon / The Bridgeman Art Library Idades líquidas Idade de vida e representação Declínio do Patriarcalismo Para Gilberto Freyre, o moço só tem espaço para aparecer no Brasil com a desintegração da sociedade patriarcal. Durante o predomínio do patriarcalismo, havia uma distância imensa entre o menino e o adulto, mas nenhuma categoria intermediária entre os dois extremos. O menino queria ser adulto o quanto antes, até mesmo para se livrar do sadismo com que era tratado dentro da casagrande. Era como se a meninice fosse uma doença que tivesse que ser curada velozmente, e com toda a crueldade. Com a decadência do sistema patriarcal, esse antagonismo entre menino e adulto se transformou em rivalidade, com a inclusão de um terceiro termo [O ADOLESCENTE] numa relação que até então refletia apenas a total dominação de um extremo, o adulto, sobre o outro sem voz, o menino. Hermano Viana, "A RIVALIDADE ENTRE O HOMEM MOÇO E O HOMEM VELHO":o conflito de gerações em Sobrados e Mucambos publicado no livro Quem Somos Nós – 60 Anos Sobrados de Mucambos, organizado por Maria do Carmo Tavares de Miranda, publicado pelas Fundação Joaquim Nabuco e Editora Massangana, em 2000. Não mais o “ser adulto” como referência cultural A calça Lee libertou os jovens de terem de usar a calça de tergal de seus pais (Antonio Maria – Jornalista – 19212001) A calça comprida marcava a transição do moço para o adulto (Gilberto Freyre – A dialética entre o homem moço e o homem velho) Antigamente as filhas faziam de tudo para usar as roupas de suas mães para serem adultas mais rápido. Hoje, tenho assistido brigas porque as mães pegam as roupas das filhas “emprestadas” (Estilista de São Paulo em entrevista na TV) Juventude transviada (Década de 50) (Rebel Without A Cause). Direção: Nicholas Ray. EUA, Drama, colorido, legendado, 110’. A geração iôiô [...] Nas "voltas que a vida dá" é curioso constatar que o movimento (iô) de socialização de pais para filhos dá uma volta de retorno (ioiô) que assegura que também os pais sejam socializados pelos filhos, aculturizados por uma cultura juvenil, cada vez mais referencial, nomeadamente no domínio da moda e da valorização do corpo. (José Machado Pais). TRANSIÇÕES PARA A VIDA ADULTA EM TEMPOS DE INDETERMINAÇÃO (I) Fluidez nas relações entre gerações (sociedade pós-tradicional – A. Giddens). O indivíduo da modernidade pode projetar a própria biografia (desinstitucionalização do curso da vida). Mudanças estruturais nas sociedades capitalistas ( a década de 1970 é um marco) tem afetado os modos de passagem da juventude para a vida adulta. Sociedade de risco (Ulrick Beck). Geração ioiô (J.M. Pais) – Os jovens se desdobram em personagens possíveis experimentando estatutos intermediários e reversíveis, com maior ou menor grau de transitoriedade, precariedade ou formalidade. Transições para a vida adulta (ii) A calça Lee libertou os jovens de terem de usar a calça de tergal de seus pais (Antonio Maria – Jornalista – 1921-2001) A calça comprida marcava a transição do moço para o adulto (Gilberto Freyre – A dialética entre o homem moço e o homem velho) Antigamente as filhas faziam de tudo para usar as roupas de suas mães para serem adultas mais rápido. Hoje, tenho assistido brigas porque as mães pegam as roupas das filhas “emprestadas” (Estilista de São Paulo em entrevista na TV) Transições (iii) Os atuais processos individuais de transição para a vida adulta fogem aos padrões tradicionais (fim da escolarização; trabalho; casamento; moradia independente dos pais; ser mãe-ser pai). Trajetórias diversificadas - sentidos diferentes a cada uma das etapas isoladamente e também às relações estabelecidas entre estas. Transições (iv) Não só as fronteiras entre o percurso de escolaridade e o mercado de trabalho se tornam fluídas, como a saída de casa dos pais não é definitiva nem implica necessariamente o casamento. Há um campo infinito de oportunidades, combinações e experiências. Surgem "buracos negros", situações em que os jovens não estão integrados em qualquer das esferas (educação, emprego, família), mergulhando em processos de “desfiliação” e isolamento. Prolongamento da juventude crescimento do número de jovens que retardam o cumprimento das etapas consideradas marcadores da passagem para a vida adulta. Trajetórias escolares prolongadas, entrada tardia no mercado de trabalho, permanência prolongada na casa dos pais ou sob sua dependência financeira e adiamento do casamento e do nascimento de filhos. Com quem contar para entrar e sair do labirinto? Desafios educacionais Como educar para sociedades complexas, sem referências comunitárias estáveis, e que exigem multiplicidade de papéis dos indivíduos? Como não praticar socializações profiláticas e pedagogias tutelares para jovens de comunidades populares? Como fazer com que os indivíduos (jovens) sejam diretores de suas próprias vidas? A individuação como processo relacional em busca do “O governo de si” (autonomia) e o reconhecimento do outro (princípio ético da vida em sociedade) A dependência tecnológica, as relações superficiais e o fetiche da informação A experiência e a narração A experiência estaria ficando cada vez mais rasa, cada vez mais pobre, em decorrência do excesso de informações. Cada manhã recebemos notícias de todo o mundo. E, no entanto, somos pobres em histórias surpreendentes. A razão é que os fatos já chegam acompanhados de explicações. Em outras palavras: quase nada do que acontece está a serviço da narrativa, e quase tudo a serviço da informação. (W. BENJAMIN) Como escolher? Aprender/ensinar a fazer boas escolhas – Entrevista com H. Eco Spiegel: Mas você disse que as listas podem estabelecer a ordem. Então, tanto a ordem quanto a anarquia se aplicam? Isso tornaria a internet, e as listas criadas pelo mecanismo de busca Google, perfeitas para você. Eco: Sim, no caso do Google, ambas as coisas convergem. O Google faz uma lista, mas, no minuto em que eu olho para minha lista gerada pelo Google, ela já mudou. Essas listas podem ser perigosas - não para pessoas mais velhas como eu, que adquiriram o conhecimento de outra forma, mas para os jovens, para quem o Google é uma tragédia. As escolas precisam ensinar a fina arte de discriminar. Spiegel: Você está dizendo que os professores deveriam instruir seus alunos sobre a diferença entre o que é bom e o que é ruim? Se sim, como eles deveriam fazer isso? Eco: A educação deveria voltar à forma que era nas oficinas do Renascimento. Lá, os mestres não eram necessariamente capazes de explicar aos alunos porque uma pintura era boa em termos teóricos, mas eles faziam isso de forma mais prática. Veja, o seu dedo pode se parecer com isso, mas ele é de fato assim. Veja, esta é uma boa mistura de cores. A mesma abordagem deveria ser usada nas escolas ao lidar com a internet. O professor deveria dizer: "Escolha qualquer assunto, quer seja a história alemã ou a vida das formigas. Busque 25 páginas diferentes na internet e, ao compará-las, tente descobrir qual oferece uma boa informação". Se dez páginas descreverem a mesma coisa, pode ser um sinal de que a informação publicada está correta. Mas também pode ser um sinal de que alguns sites copiaram os erros dos outros. Entrevista ao jornal Der Spiegel, publicada no Uol Notícias/ Brasil http://vaocombate.blogs.sapo.pt/161932.html A escolarização com sentido Para que o conhecimento escolar não se oponha “à vida” dos estudantes é preciso que a escola não apenas se dedique a ensinar novos conhecimentos, mas se preocupe também em dialogar com os diferentes saberes. Este diálogo entre “conhecimento escolar” e os “outros saberes” (saberes dos outros?) contribui para que a experiência de escolarização faça mais sentido e que novos conhecimentos possam ser aprendidos por sujeitos (crianças, jovens e adultos) que foram valorizados social e culturalmente. Por fim... Um método para o diálogo com os jovens Para o diálogo... “Primeiro pergunte...depois, escute” (Antonio Machado, poeta espanhol, 1875-1939).