PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO 9ª Câmara de Direito Privado Registro: 2015.0000742793 ACÓRDÃO ACORDAM, em 9ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Julgaram prejudicado o recurso. V. U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores ALEXANDRE LAZZARINI (Presidente), THEODURETO CAMARGO E LUCILA TOLEDO. São Paulo, 6 de outubro de 2015. Alexandre Lazzarini RELATOR Assinatura Eletrônica Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento nº 2160258-28.2015.8.26.0000, da Comarca de São Paulo, em que são agravantes ARCONTE DESENVOLVIMENTO IMOBILIÁRIO LTDA. e BNE ADMINISTRAÇÃO DE IMÓVEIS S/A, é agravado ROSINA GALLARO DA SILVA. PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO 9ª Câmara de Direito Privado Ltda. e BNE AGRAVO DE INSTRUMENTO. RESCISÃO CONTRATUAL. RESTITUIÇÃO DE VALORES PAGOS. DEPÓSITO JUDICIAL. SUSPENSÃO DAS MENSALIDADES FUTURAS. NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO. 1. Agravo interposto contra decisão que deferiu a liminar para que as requeridas depositassem em juízo, no prazo de dez dias, os valores pagos pela autora para aquisição do imóvel (R$1.378.654,47), devendo suspender, ainda, a cobrança das mensalidades devidas. 2. Documentos que comprovam a precária situação financeira das requeridas, além de possíveis irregularidades no empreendimento, o que justifica a manutenção da decisão do MM Juízo. 3. Recurso não provido. Trata-se de agravo de instrumento interposto contra a r. decisão copiada às fls. 18/20, que em sede de “ação de rescisão contratual c/c restituição de valores pagos, com pedido de antecipação de tutela”, deferiu a liminar para que as requeridas depositassem em juízo, no prazo de dez dias, os valores pagos pela autora para aquisição do imóvel (R$1.378.654,47), devendo suspender, ainda, a cobrança das mensalidades devidas. Pleiteiam as agravantes a reforma da r. decisão, sustentando, em síntese, que: a) o empreendimento está regular, com todas as licenças e alvarás necessários; b) a decisão foi baseada em mera especulação sobre a situação financeira das rés; c) a r. decisão viola os princípios do contraditório e do devido Agravo de Instrumento nº 2160258-28.2015.8.26.0000 - Voto nº 15174 2 Voto nº 15174 Agravo de Instrumento nº 2160258-28.2015.8.26.0000 Comarca: São Paulo (45ª Vara Cível) Juiz(a): Juliana Koga Guimarães Agravantes: Arconte Desenvolvimento Imobiliário Administração de Imóveis S/A Agravado: Rosina Gallaro da Silva PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO 9ª Câmara de Direito Privado processo legal, já que haverá constrição indevida do patrimônio das agravantes sem que as mesmas tenham se manifestado nos autos; e d) estão ausentes os requisitos autorizadores da medida, ou seja, não seria o caso de concessão de tutela antecipada, devendo-se aguardar o julgamento da ação, sobretudo pelo considerável patrimônio das requeridas. Requerem, alternativamente, que o depósito seja substituído Petição da “Associação das Vítimas da Bueno Netto, Benx, Related e Parque Global” às fls. 257/269. Contraminuta às fls. 915/928. É o relatório. I) Cuida-se de ação de “ação de rescisão contratual c/c restituição de valores pagos, com pedido de antecipação de tutela” movida pela agravada, na qual objetiva a rescisão do contrato celebrado com as agravantes, determinando, por conseguinte, a devolução dos valores pagos (R$1.378,654,47), acrescidos de correção monetária desde o desembolso de cada parcela. A tutela antecipada foi cencedida, nos seguintes termos: “(...) O receio da autora é fundado, razão pela qual, com base no poder geral de incidentalmente, cautela, medida concedo cautelar a liminar para que e, as requeridas depositem em juízo, no prazo de 10 dias do recebimento desta decisão, os valores já pagos pela autora para aquisição do bem descrito na inicial (R$1.378.654,47), bem como, defiro tutela antecipada para que, até o julgamento deste feito, as requeridas suspendam a cobrança das mensalidades devidas em razão do contrato cuja rescisão se pretende.” Agravo de Instrumento nº 2160258-28.2015.8.26.0000 - Voto nº 15174 3 por seguro garantia. PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO 9ª Câmara de Direito Privado II) Por primeiro, importante tecer alguns comentários sobre o grupo econômico ao qual pertencem as agravantes. É certo que o grupo Bueno Netto é composto de inúmeras empresas, mostrando-se publicamente como um sólido conglomerado, com patrimônio e ativo financeiro capazes de enfrentar qualquer crise econômica Todavia, nos últimos anos, pelo que demonstram os entre as pessoas física e jurídica, o que colaca em risco a reputação, credibilidade e liquidez do grupo. Passo a transcrever trechos dos pareceres: - Elaborado pelo Dr. Elpídio Donizetti, em 10/04/2015 (fls. 371/402): “À vista de tudo que se expôs, dou às questões contidas na consulta as seguintes respostas: a) Ante as informações constantes do parecer técnico contábil (DOC_3), é possível afirmar que houve trespasse irregular das atividades da Bueno Netto Empreendimentos Imobiliários S.A para BNI Empreendimentos e Participações S.A, tendo em vista que a constituição da BNI Empreendimentos e Participações S.A se deu com a finalidade de dar continuidade aos negócios da Bueno Netto Empreendimentos S.A/BNE Administração de Imóveis S.A. b) É possível afirmar que houve fraude à execução, pois diversas ações da BNE Administração de Imóveis S.A levam a esta inegável conclusão, destacando-se i) reduziu seu capital social em 64%, ii) alienou significativa parcela de seus ativos, iii) reduziu drasticamente seu lucro e faturamento, v) desviou receitas para pagamento de dívidas de outras empresas, vi) fez a cessão e transferência de suas participações societárias, vii) realizou seguidas alterações societárias (inclusive mudando sua razão social e objeto social) e, ainda, viii) transferiu seu controle para uma offshore não autorizada pelo Poder Público tudo isto descumprindo seu dever de publicar e arquivar balanços, Agravo de Instrumento nº 2160258-28.2015.8.26.0000 - Voto nº 15174 4 pareceres juntados, a situação vem se alterando, com uma confusão patrimonial PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO 9ª Câmara de Direito Privado tornando, ao final, inadimplente e sem bens suficientes para pagar sua dívida -, resta indubitavelmente demonstrada a fraude à execução. c) É possível afirmar que há desvio de finalidade ou abuso de direito por parte da BNE Administração de Imóveis S.A, principalmente pelo uso do patrimônio e dos ativos imateriais, que estão sendo utilizados para gerar negócios para outras empresas, que se apropriam das respectivas receitas. cautelar de arresto, pois o fumus boni iuris (sentença arbitral) e o periculum in mora (trespasse fraudulento, fraude à execução e desvio de finalidade) específicos para tanto estão presentes. e) Ainda no caso concreto, a medida liminar de arresto pode atingir todas as empresas do Grupo Bueno Netto e seu controlador (Adalberto Bueno Netto), tendo em vista tratar-se de um grupo econômico de fato com patente desvio de finalidade.” - Parecer elaborado pelo Perito Judicial Remo Dalla Zanna em 19/05/2015 (fls. 413/417): “1. A leitura atenta dos três pareceres, inclusive com o cotejo com os demais elementos nos autos da arbitragem e outras pesquisas, demonstra que cada conclusão dos três ilustres pareceristas foi lastreada em acervo probatório robusto e insofismável. 2. A criação de empresas com nomes semelhantes (grupo informal de empresas) depois da decisão arbitral para que a empresa BUENO NETTO/BNE pagasse os haveres da SPPATRIM, conjugada com a intencional ocultação e desvio de bens mediante manobras societárias, foi abundantemente demonstrada e caracteriza o trespasse irregular das atividades da BUENO NETTO/BNE para BNI Empreendimentos e Participações S.A e demais empresas do “grupo”, chamando a atenção a existência de dezenas de empresas com razões sociais “BNI”; 3. As evidências de que o trespasse praticado pela BUENO Agravo de Instrumento nº 2160258-28.2015.8.26.0000 - Voto nº 15174 5 d) No caso concreto seria viável a concessão de medida PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO 9ª Câmara de Direito Privado NETTO teve o escopo de descapitalizá-la, favorecendo o sócio controlador Sr. Adalberto Bueno Netto e as outras empresas por ele criadas, inclusive uma offshore, tudo em detrimento do participante SPPATRIM; são provas usuais (comuns) de conduta fraudulenta para apropriar-se do patrimônio pertencente a outro(s) sócio(s); 4. O sócio ostensivo e controlador Adalberto Bueno Netto assim, justificar a impossibilidade de pagar os haveres da SPPATRIM. A transferência de sua participação acionária para outra(s) empresa(s) e o não pagamento do valor arbitrado seguido do desmantelamento da BUENO NETTO Empreendimentos Imobiliários S/A configura fraude à execuação; (...)” No mesmo sentido, pareceres de fls. 424/496 e 498/580. III) Em que pesem os argumentos das agravantes, o presente recurso não deve ser provido. Analisando os muitos documentos acostados aos autos pelas partes e por terceiro interessado (Associação das Vítimas da Bueno Netto, Benx, Related e Parque Global), tem-se que, ao contrário do alegado pelas agravantes, a saúde financeira do grupo econômico Bueno Netto não permite que se aguarde o julgamento da ação para satisfação de eventual crédito da agravada. Observa-se que, na Medida Cautear de Arresto, ajuizada por MS Participações Ltda em face de BNE Administração de Imóveis S/A e outros (partes na presente ação), foi deferido bloqueio, via BACENJUD, nas contas de titularidade das pessoas físicas e jurídicas pertencentes ao grupo econômico, no montante de R$ 154.414.456,13. Ora, para empresas do porte das agravadas, pensar-se-ia que tal valor seria facilmente localizado, o que não ocorreu, já que foram bloqueados pouco mais de R$10.000,00, o que demonstra a fragilidade financeira das agravantes. Anote-se que, das contas da Arconte Desenvolvimento Agravo de Instrumento nº 2160258-28.2015.8.26.0000 - Voto nº 15174 6 agiu de forma a levar a empresa BUENO NETTO/BNE à insolvência técnica e, PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO 9ª Câmara de Direito Privado Imobiliário Ltda, foram encontrados, tão somente, R$1.428.744,51 (fl. 2422), ou seja, praticamente a quantia pleiteda pela agravada (R$1.378.654,47). Nesse diapasão, foi ajuizada “Ação Declaratória de Falência”, envolvendo as mesmas partes (fls. 325/346), distribuída sob nº 1010070-31.2015.8.26.0100, na 2ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais da Comarca de São Paulo, cujo valor da causa é R$ 6.222.641,88. Ao que consta, não Além disso, desde agosto de 2014 as obras do empreendimento estão paralisadas por força de liminares concedidas nas ações civis públicas ( Proc. nº 1030506-89.2014.8.26.0053 fls. 217/219 e Proc. nº 1044759-82.2014.8.26.0053 fls. 221/223) e na ação popular (Proc. nº 0072017-77.2013.8.26.0002 fls. 199/214), todas tramitando junto à 12ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de São Paulo. Tal fato gerou uma insegurança muito grande em todos os adquirentes dos imóveis, uma vez que essa situação pode perdurar por anos, deixando os mesmos sem qualquer expectativa de recebimento dos imóveis. A fim de evitar maiores prejuízos, por óbvio, ajuizarão ações visando a rescisão do contrato e recebimento dos valores pagos, como no presente caso, o que resultará em um decréscimo patrimonial considerável das agravantes, que, ao final de todas as ações, não terão dinheiro para quitar todas as dívidas. Assim, correta a MMa. Juíza que, utilizando-se do poder de cautela, determinou o depósito do valor pago pelo imóvel, uma vez que a fragilidade financeira das agravantes é cristalina, inexistindo, por conseguinte, patrimônio suficiente para garantir o pagamento do débito, em eventual procedência da ação. Importante destacar, também, que as fortes suspeitas de irregularidades nas licenças ambientais impedirão a retomada imediata das obras, o que poderia gerar credibilidade às agravantes e, consequentemente, recursos financeiros, o que, por certo, não ocorrerá. Portanto, evidenciados estão o risco de dano irreparável e a Agravo de Instrumento nº 2160258-28.2015.8.26.0000 - Voto nº 15174 7 foi efetuado depósito elisivo. PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO 9ª Câmara de Direito Privado verossimilhança nas alegações da agravada, requisitos estes que autorizam a concessão da antecipação de tutela, nos termos do art. 273 do CPC. IV) Diante dos fundamentos expostos, a r. decisão deve ser mantida, tal como lançada. Na hipótese de apresentação de embargos de declaração recurso, a respeito de eventual oposição ao julgamento virtual, nos termos do art. 1º da Resolução n. 549/2011 do Órgão Especial deste Eg. Tribunal de Justiça, entendendo-se o silêncio como concordância. Portanto, nega-se provimento ao agravo de instrumento. ALEXANDRE LAZZARINI Relator (assinatura eletrônica) Agravo de Instrumento nº 2160258-28.2015.8.26.0000 - Voto nº 15174 8 contra o presente acórdão, ficam as partes intimadas a se manifestar, no próprio