BOA FÉ OBJETIVA
Francisco dos Santos Prior
6º semestre de direito na finan
1. Apresentação
O princípio da boa-fé objetiva e o da probidade devem estar presentes em
toda a estrutura contratual, ou seja, desde a fase de negociação preliminar até a
fase pós-contratual. Veja que a incidência do princípio da boa-fé objetiva obriga os
contratantes a manterem uma conduta leal e ética durante toda a relação negocial.
Além disso, o princípio em análise gera obrigações para os contratantes que não
necessitam estarem expressas nos contratos para que sejam observadas e exigidas.
A nova estrutura nas relações contratuais, provocadas pela adoção do princípio da
boa-fé objetiva em nosso ordenamento, é uma realidade que não pode ser negada
nos dias atuais.
Desta forma, cabe a sociedade brasileira se adaptar a esse novo
panorama estabelecido pelo nosso Direito Civil; modificando as antigas práticas
negociais que nos deixam com fama internacional: “o jeitinho brasileiro”. A realidade
de nosso atual Direito Civil, em matéria contratual, nos leva a abandonar o
entendimento de que o contrato seria um simples instrumento de circulação de
riquezas para considerá-lo um meio eficaz de desenvolvimento social. Portanto, a
única forma de compreender o sentido amplo proposto pela adoção do princípio da
boa-fé objetiva é abandonar os conceitos individualistas presentes no Código Civil
revogado e ingressar nesta nova etapa do desenvolvimento jurídico.
2. Introdução
A Lei n º 10.406 de 10/01/02 (Código Civil) instituiu uma nova estrutura na
disciplina contratual, baseada em aspectos sociais. O Código anterior era
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individualista, enquanto que no Código Civil em vigor, o "sentido social" é uma de
suas características marcantes.
A nova estrutura contratual revela, ainda, uma grande intervenção do Estado
nas relações contratuais, com destaque para alguns conceitos como: ordem pública,
função social, interesse público e a boa fé, a qual iremos abordar neste trabalho.
O tema boa-fé objetiva, embora seja de suma importância e desperte grande
interesse prático, não é um assunto do qual se terá a pretensão de esgotá-lo neste
trabalho, mas simplesmente traçar suas características principais.
3. Conceito
Boa-fé segundo o dicionário wikipedia, “é a intenção pura, isenta de dolo
ou engano, com que a pessoa realiza o negócio ou executa o ato, certa de que está
agindo na conformidade do direito e, consequentemente, protegida pelos preceitos
legais”.
Como princípio jurídico a boa-fé tem que ser intrínseca ao contrato, tanto
subjetiva, como objetivamente, sob pena de viciar o contrato. Tem que estar
manifesta desde a fase pré-contratual até após a sua execução.
Luis Eduardo Franco Bouéres (2005), citado por Mariana Pretel e Pretel,
nos ensina:
O novo Código Civil Brasileiro retrata, sem sombra de dúvida, uma
mudança substancial nas regras das relações de cunho privado em nosso
país. Há uma efetiva modificação no enfoque do Direito Civil, que deixa para
trás o cunho individualista das suas regras, trazendo à baila, conceitos
outrora ignorados nas relações interindividuais. Mais do que isso houve, por
certo, uma significativa mudança de forma na exposição das disciplinas do
Direito Civil, passando, da ultrapassada técnica das situações-tipo, para o
modelo das cláusulas gerais.
4. Boa-fé objetiva x boa-fé subjetiva
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A boa-fé objetiva consiste em um padrão de comportamento,
que a sociedade considera leal, uma regra de conduta que implica uma
relação de confiança, impondo as partes o dever de agir com ética.
A boa-fé objetiva segundo GAGLIANO, PAMPLONA FILHO (2009, p. 65)
“tendo natureza de principio jurídico – delineado em um conceito jurídico
indeterminado -, consiste em uma verdadeira regra de comportamento, de fundo
ético e exigibilidade jurídica.”
De outro lado, a boa-fé subjetiva está relacionada à intenção dos
contratantes, ou seja, verifica-se o espírito do contratante diante da prática de um
ato para avaliar se ele está ou não de boa-fé.
Ainda citando GAGLIANO, PAMPLONA FILHO (2009, p.64) “consiste em
uma situação psicológica, um estado de ânimo ou de espírito do agente que realiza
determinado ato ou vivencia dada situação, sem ter ciência do vício que a inquina.”
A cláusula mais importante no contrato é, sem dúvida, a da boa-fé, sem
prejuízo das cláusulas que estão expressas nos mesmos, ou seja, nos contratos,
neste sentido observamos os ensinamentos de Giselda Hironaka, (apud GAGLIANO,
PAMPLONA FILHO, 2009, p. 65).
A mais célebre das cláusulas gerais é exatamente a da boa-fé objetiva nos
contratos. Mesmo levando-se em consideração o extenso rol de vantagens
e desvantagens que a presença de cláusulas gerais pode gerar num
sistema de direito, provavelmente a cláusula da boa-fé objetiva, nos
contratos, seja mais útil que deficiente, uma vez que, por boa-fé, se entende
que é um fato (que é psicológico) e uma virtude (que é moral).
Observando o principio da boa-fé objetiva, do ponto de vista do homem
comum, deve-se esperar que as partes ajam com lealdade e respeito.
5. Funções
As funções da boa-fé objetiva, conforme a doutrina, são:
a) Interpretativa e de Colmatação;
b) Criadora de Deveres Jurídicos Anexos ou de Proteção;
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c) Delimitadora do Exercício de Direitos Subjetivos;
6. Função interpretativa e de colmatação
Essa função está relacionada intimamente com o art. 5º da LICC, senão
vejamos: “na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às
exigências do bem comum”.
Assim a função interpretativa e de colmatação está diretamente ligada ao
princípio da boa-fé objetiva.
É oportuno apontar que a interpretação subjetiva permite elucidar a
intenção dos contratantes. Já a interpretação objetiva possibilita a análise de suas
condutas, conforme os padrões éticos exigidos.
A sustentação legal encontra se, no art. 113 do Código Civil, “Os negócios
jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé e os usos do lugar de sua
celebração”.
Assim sendo, essa função leva os contratantes a terem uma conduta leal
e ética durante todas as fases contratuais, inclusive, após a conclusão.
Além disso, caso tais deveres não sejam observado, o magistrado
analisará a questão dentro dos parâmetros estabelecidos pelo princípio e
solucionará a demanda visando aplicar as finalidades sociais da norma.
7. Função criadora de deveres jurídicos anexos ou de proteção
A boa-fé objetiva tem uma importante função que é a de criar deveres
anexos ou de proteção, são os deveres que estão implícitos nos contratos, dos quais
podemos elencar os mais conhecidos que são:
a) Lealdade e confiança recíprocas;
b) Assistência;
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c) Informações;
d) Sigilo ou confidencialidade.
Fica claro que esse rol é exemplificativo e não taxativo, vejamos cada um
deles:
a) Lealdade e confiança recíprocas – toda relação contratual, tem que existir
confiança de ambas as partes, o que costuma ser denominado de deveres anexos,
gerais de uma relação contratual. São princípios que constituem verdadeiros
compromissos assumidos pelas partes contratantes de agirem com ética e
probidade. A lealdade e fidelidade têm que existir em toda relação jurídica como
citado por Gagliano, Pamplona Filho (2009, p. 71) “Ora, se isso não estiver implícito
em qualquer relação jurídica, não se sabe o que poderia estar”.
b) Assistência – esse dever também é conhecido como dever de cooperação, ou
seja, as partes devem cumprir o compromisso assumido sendo ela (ela quem? A
assistência?) o credor ou devedor, não havendo informação entende a doutrina que
esse pode ser um dos maiores vícios, podendo vir a ser transformado num defeito.
Ferindo assim a Regra Geral da Boa-fé. (Esse parágrafo está muito confuso)
c) Informações – pode afirmar que esse dever está intrinsecamente ligado a
imposição moral e jurídica de comunicar à outra parte todas as característica e
circunstância do negócio jurídico. Tal dever anexo está presente em todas as formas
contratuais seja ela tutelado pelo direito do consumidor ou pelo Código civil.
Exemplo: Quando for formalizar um contrato as partes têm o dever moral de passar
todas as informações para que não paire dúvidas sobre o negócio que está sendo
realizado sob pena de ter que reembolsar a outra parte por eventual perda,
observando sempre o dolo ou culpa, e a boa-fé.
d) Sigilo ou confidencialidade – mesmo não estando expresso no contrato que as
partes devem guardar sigilo sobre dados uma das outras, esse dever esta implícito,
nas relações contratuais.
Exemplo: o “Fulano de Tal” compra uma fazenda do “Ciclano”, ambas as partes têm
dados sigilosos uma da outra, não devendo divulgar, caso ocorra poderá a parte que
assim proceder ferir esse princípio, e responderá pelo ato praticado.
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É importante frisar que todos os deveres anexos, oriundos do princípio da
boa-fé objetiva, deverão ser seguidos pelos contratantes mesmo não existindo
menção expressa no instrumento que formalizou o negócio jurídico.
8. Delimitadora do exercício de direitos subjetivos
Esta função tem o objetivo de evitar o exercício abusivo dos direitos
subjetivos, tais como cláusulas abusivas e/ou leoninas, com efeitos que beneficiam
uma parte e onerando excessivamente a outra.
O professor Cristoph Fabian, ensina:
Se encontra o problema do abuso de direito. Todo o direito é delimitado pela
boa-fé. Fora ou contra a boa-fé não existe nenhum direito subjetivo. Tais
interesses jurídicos não merecem proteção. O exemplo mais significante
para a limitação de direitos pela boa-fé é o art. 51 do CDC. CRISTOPH
FABIAN (apud GAGLIANO, PAMPLONA FILHO, 2009, p. 76).
O Código Civil, também faz menção ao abuso de direito, senão vejamos:
Art. 187. “Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede
manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé
ou pelos bons costumes.”
9. Análise do art. 422 do código civil
O Código Civil de 2002, em seu artigo 422, traz o princípio da boa-fé
objetiva, aplicado especificamente em matéria contratual, nos seguintes termos: “Os
contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em
sua execução, os princípios de probidade e boa-fé.”
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Como vimos acima, neste artigo está contido o principio da boa-fé e da
probidade, e esses princípios estão relacionados desde o pré-contrato propriamente
dito até a fase pós-contratual, obrigando as partes a observarem esse importante
princípio.
Na II Jornada do Conselho Federal de Justiça foram estabelecidos os
seguintes enunciados:
24 - Art. 422: em virtude do princípio da boa-fé, positivado no art. 422 do
novo Código Civil, a violação dos deveres anexos constitui espécie de
inadimplemento, independentemente de culpa.
25 - Art. 422: o art. 422 do Código Civil não inviabiliza a aplicação, pelo
julgador, do princípio da boa-fé nas fases pré e pós-contratual.
26 - Art. 422: a cláusula geral contida no art. 422 do novo Código Civil
impõe ao juiz interpretar e, quando necessário, suprir e corrigir o contrato
segundo a boa-fé objetiva, entendida como a exigência de comportamento
leal dos contratantes.
27 - Art. 422: na interpretação da cláusula geral da boa-fé, deve-se levar em
conta o sistema do Código Civil e as conexões sistemáticas com outros
estatutos normativos e fatores metajurídicos.
Na III Jornada do Conselho Federal de Justiça
168 – Art. 422: O princípio da boa-fé objetiva importa no reconhecimento de
um direito a cumprir em favor do titular passivo da obrigação.
169 – Art. 422: O princípio da boa-fé objetiva deve levar o credor a evitar o
agravamento do próprio prejuízo.
10. Venire contra factum proprium
Conforme Gagliano, Pamplona Filho (2009, p. 82) a tradução literal é “vir
contra um fato próprio.” Também significa vedação do comportamento contraditório,
baseando-se na regra da pacta sunt servanda.
O venire contra factum proprium está respaldado na premissa de que as
partes devem agir com coerência para que os seus comportamentos não venham a
gerar expectativas.
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Podemos observar a aplicação desse sub-princípio (decorrente da boa-fé
objetiva) no julgado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, cuja ementa
segue abaixo:
Apelação Com Revisão 4158704500
Relatora): Enio Zuliani
Órgão julgador: 4ª Câmara de Direito Privado
Data de registro: 15/08/2006
Ementa: Compromisso de venda e compra - Quitação, sem ressalvas, da
última das 240 prestações convencionadas, quanto à existência de saldo
devedor acumulado - Inadmissibilidade de se exigir, no instante em que se
reclama a outorga da escritura definitiva, o pagamento de saldo
astronômico, por constituir comportamento contraditório [venire contra
factum propríum] - Sentença que deferiu a adjudicação compulsória
preservada - Não provimento.
11. Supressio / surrectio
Supressio é a extinção de um direito em razão da constante ausência de
seu exercício.
Surrectio é a criação de um direito em virtude de sua prática reiterada e
aceita pelo outro contratante, ainda que haja sido convencionado em sentido
contrário.
Em ambos os casos, é possível verificar que a conduta de um contratante
contraria, de forma reiterada, o teor do contrato existente entre eles, e tal conduta
prevalecerá sobre essa regra expressa. Isto se dá em razão da boa-fé objetiva,
justamente porque aquilo que é praticado de forma habitual e sem impugnação da
outra parte passa a constar da avença. É o que ocorre quando credor e devedor
convencionam que este procurará mensalmente aquele para efetuar o pagamento
da dívida, mas, na constância da execução do contrato, o credor é quem toma a
iniciativa, visitando mensalmente o devedor para exigir-lhe as parcelas do débito.
Neste caso, o credor não poderá exigir que o devedor passe a procurá-lo para
cumprir sua obrigação; há, portanto, supressio e surrectio de direitos.
12. TU QUOQUE
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Em sua tradução literal, significa “e tu também”. Tal expressão tem origem
na famosa frase de Júlio César dita a Brutus: “O tu quoque, Brutus, Fili mi!” (Até tu,
Brutus, Filho meu!)
Tal sub-princípio é aplicado nas hipóteses em que existe um determinado
comportamento dentro do contrato que viola seu conteúdo preceptivo e que, apesar
disto, propicia a que a parte exija um comportamento conforme ao contrato em
relação ao seu parceiro de programa contratual. Existe uma contradição entre o que
um dos sujeitos na relação obrigacional exige e as circunstâncias que ele mesmo
deixou de cumprir.
Exemplo: Artigo 476 do Código Civil: “nos contratos bilaterais, nenhum dos
contratantes, antes de cumprida a sua obrigação, pode exigir o implemento da do
outro”
A exceptio doli generalis consiste em um outro tipo de atuação da boa-fé objetiva no
sentido de veicular seu conteúdo material para específicas situações subjetivas. A
exceptio doli atua no sentido de paralisar o exercício de pretensões claramente
dirigidas contra a parte contratante de modo doloso.
13. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O princípio da boa-fé objetiva e o da probidade devem estar presentes em
toda a estrutura contratual, ou seja, desde a fase de negociação preliminar até a
fase pós-contratual.
Veja que a incidência do princípio da boa-fé objetiva obriga os
contratantes a manterem uma conduta leal e ética durante toda a relação negocial.
Além disso, o princípio em análise gera obrigações para os contratantes
que não necessitam estarem expressas nos contratos para que sejam observadas e
exigidas.
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A nova estrutura nas relações contratuais, provocadas pela adoção do
princípio da boa-fé objetiva em nosso ordenamento, é uma realidade que não pode
ser negada nos dias atuais.
Desta forma, cabe a sociedade brasileira se adaptar a esse novo
panorama estabelecido pelo nosso Direito Civil; modificando as antigas práticas
negociais que nos deixam com fama internacional: “o jeitinho brasileiro”.
A realidade de nosso atual Direito Civil, em matéria contratual, nos leva a
abandonar o entendimento de que o contrato seria um simples instrumento de
circulação de riquezas para considerá-lo um meio eficaz de desenvolvimento social.
Portanto, a única forma de compreender o sentido amplo proposto pela
adoção do princípio da boa-fé objetiva é abandonar os conceitos individualistas
presentes
no
Código
Civil
revogado
e
ingressar
nesta
nova
etapa
do
desenvolvimento jurídico.
14. Bibliografia
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito
civil contratos: teoria geral, volume IV, tomo1. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2009.
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume III: contratos e atos
unilaterais. 5. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2008.
TARTUCE, Flávio. O princípio da boa-fé objetiva em matéria contratual.
Apontamentos em relação ao novo código civil e revisão do projeto nº 6960/02. Site:
www.flaviotartuce.adv.br.
DINIZ, Maria Helena. Código civil anotado: 13. ed. São Paulo Saraiva, 2008.
PRETEL, Mariana Pretel e, http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=12803,
acessado em 22 de agosto de 2009:
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