V Seminário da Pós Graduação em Ciências Sociais: Cultura, desigualdade e Desenvolvimento GT 3 – Políticas Públicas e Desenvolvimento DEMOCRATIZAÇÃO DO ENSINO SUPERIOR: ACESSO E PERMANÊNCIA DE ESTUDANTES QUILOMBOLAS Tiara Melo - UFBA1 Dyane Brito Reis – UFRB2 1 Mestranda no Programa de Pós-Graduação Estudos Interdisciplinares sobre a Universidade da Universidade Federal da Bahia. Pesquisadora bolsista CAPES. Psicóloga. [email protected] 2 Professora Adjunta CFP-UFRB. Professora Colaboradora do PPGESIU-UFBA. Doutora em Educação. [email protected] DEMOCRATIZAÇÃO DO ENSINO SUPERIOR: ACESSO E PERMANÊNCIA DE ESTUDANTES QUILOMBOLAS 3 Tiara Melo - UFBA Dyane Brito Reis Santos –UFBA e UFRB RESUMO Falar em democratização do ensino superior, nos remete sobretudo à discussão do acesso de grupos sociais historicamente excluídos do processo educacional às Universidades Brasileiras. As práticas discriminatórias do passado ainda se fazem presentes, visto que, a maioria de suas vítimas, principalmente a população negra, ainda não saíram totalmente da zona de exclusão que foi imposta séculos atrás. A visibilidade desses grupos minoritários tem sido prioridade no campo das políticas de Ações Afirmativas, que preconizam a erradicação das desigualdades e todas as formas de discriminação, atitudes de superioridade ou qualquer atividade que exclua alguma parte da população em qualquer campo social. Leis que garantam a proteção, o direito de reivindicação e a participação mais efetivas de tais minorias deve estar aliadas ao reconhecimento da individualidade das mesmas, suas fraquezas e necessidades especificas não podem ser igualadas a de outros grupos, visto que as condições e vivencia dos mesmo diferem entre si. Sanar essas diferenças requer também a oferta de uma educação de qualidade para todos e todas como forma de ascensão social, sobretudo sujeitos pertencentes a comunidades tradicionais, neste contexto, a política de acesso à educação superior através das cotas se delineia como uma possibilidade real de equidade no ensino superior. A presença dessas minorias, sobretudo os estudantes quilombolas, no espaço universitário, até então fechado, promovem mudanças na academia que precisam ser refletidas. Palavras Chave: Acesso; Permanência; Estudantes Quilombolas INTRODUÇÃO Este artigo, é parte da pesquisa que estamos desenvolvendo no Programa de Pós Graduação em Estudos Interdisciplinares sobre a Universidade (PPGEISU-UFBA) e que pretende compreender o acesso e permanência (material e simbólica) de jovens negros oriundos de comunidades remanescentes de Quilombo, na Universidade Federal do Recôncavo da Bahia - UFRB, ao longo dos 10 anos de sua existência. Nesse texto, a partir de um estudo secundário buscaremos abordar o acesso e permanência de estudantes de camadas populares, quilombolas nas instituições de ensino superior, tomando como objeto as ações afirmativas e o seu desenvolvimento, especialmente no Brasil. Neste 3 Trabalho apresentado no V Seminário da Pós Graduação em Ciências Sociais: Cultura, Desigualdade e Desenvolvimento – realizado entre os dias 02, 03 e 04 de dezembro de 2015, em Cachoeira, BA, BRASIL. sentido, trazemos para o debate o conceito de Ação Afirmativa e a conjuntura social, política e ideológica que permeia o conceito, considerando a evolução na concepção de direitos humanos e o uso desta medida como política pública, capaz de promover a reparação e facilitar a ascensão de grupos minoritários, sobretudo no ambiente educacional. No âmbito nacional, situamos a adoção das ações afirmativas com recorte étnico racial a partir do envolvimento reivindicatório dos movimentos sociais negros. Sustentamos, aqui, a influência negativa da “suposta democracia racial” na formação da identidade brasileira e a tese do branqueamento enquanto política nacional como fatores imperativos que contribuíram para a história de negação do homem negro aos bens materiais e simbólicos. Sem pretender esgotar todo o assunto referente a temática, abordamos o uso do Sistema de Cotas como mediador na superação deste passado e a importância da conjugação com outras políticas que garantam não só o acesso mas também a permanência destes sujeitos na instituição de ensino. AS POLÍTICAS AFIRMATIVAS NO MUNDO As Políticas de Ações Afirmativas, de modo geral, são definidas como políticas que favorecem grupos excluídos na sociedade, visando uma reparação compensatória e/ou preventiva em busca da correção da discriminação e desigualdade vivida por estes grupos ao longo da história, por meio da valorização social, econômica, política e cultural durante um período determinado, logo, as ações afirmativas são apresentadas como medidas concretas, especiais e temporárias que objetivam compensar um passado discriminatório pautadas no direito à igualdade, compreendendo que a igualdade deve ser pensada a partir do respeito à diferença e à diversidade (SANTOS, 2009; PIOVESAN, 2005). Respondem a essa denominação diversos procedimentos, frutos da pressão de setores da sociedade, destinados a diminuir as iniquidades existentes, tais como as medidas protetivas a estilos de vida, políticas de identidade, dentre outros (DAFLON; FERES JÚNIOR; CAMPOS, 2013). Sua efetivação presume a existência de um Estado capaz de suprir as carências particulares- frutos da desigualdade social, ofertando um tratamento desigual aos historicamente tratados como desiguais (SANTOS, 2009; PIOVESAN, 2005; 2008; SILVA FILHO, CUNHA, 2014). De acordo com Moehlecke, (2002) a expressão ação afirmativa surge nos Estados Unidos em 1960 em um cenário permeado por reinvindicações, sobretudo, expressadas no movimento pelos direitos civis, que empunhava a bandeira da extensão da igualdade de oportunidade para todos os cidadãos norte-americanos. Entretanto, as políticas de ação afirmativas não são uma criação americana, como sinaliza o então Ministro do Supremo Tribunal de Justiça Ricardo Lewandowski (BRASIL, 2010), elas nascem na Índia com o intuito de reverter a desigualdade entre as pessoas em decorrência do sistemas de castas que durante muito tempo expôs os excluídos à tensões sociais. Segundo Daflon (2008, p. 3-4), Medidas de favorecimento a minorias discriminadas começaram a ser aplicadas na Índia pelos colonizadores britânicos no fim do século XIX e tiveram sua continuidade assegurada pela Assembléia Constituinte [sic] após a conclusão do processo de independência em 1947. Além de possuir a mais duradoura experiência com a ação afirmativa de que se tem registro, a Índia apresenta uma multiplicidade de desafios a essas políticas, uma vez que entre seus beneficiários há minorias culturais a proteger (as tribos), grupos estigmatizados cuja militância de modo geral alega não pleitear a afirmação de sua identidade degradada, mas sim a assimilação à sociedade (os “Intocáveis”) e grupos que, apesar de discriminados, entende-se que sofrem mormente de privação econômica (as “Other Backward Classes”). A ação afirmativa no país não se restringe às cotas no ensino superior, mas também é aplicada nas legislaturas, educação, serviços públicos e promoções no emprego. No caso específico dos Estados Unidos, tomando como ponto de partida a expressão real do preconceito, racismo, intolerância e violência, surgem como protagonistas os movimento sociais negros organizados a partir dos anos 604 e a remoção das leis segregacionistas por parte do estado americano. Na medida que as leis formais de segregação começaram a ser eliminadas, o período se mostrou propício para o surgimento das ações reparatórias reivindicadas pelo movimento negro por meio da cobrança de um Estado participativo no que tange a melhoria das condições básicas da população negra. Todavia, torna se impossível pensar que qualquer proposta de mudança com vistas ao favorecimento dos excluídos atraíssem à todos, especialmente por se tratar de uma nação que historicamente apresentava fortes antagonismos raciais. Por outro lado, apesar das críticas dos seus opositores, a experiência exitosa na sociedade americana comprova mudanças significativas que favoreceram à ascensão social dos afro - americanos (MUNANGA, 2001, SANTOS, 2009). 4 Nos referimos aos movimentos negros como o Black Power e os Panteras Negras organizados nos meados de 1960, principais forças atuantes, apoiados por liberais e progressistas brancos e sensibilizados pela defesa dos direitos. Na mesma época, experiências semelhantes ocuparam lugar de destaque nos países em que ascenderam as ações afirmativas, entre eles, a Europa Ocidental, Nigéria, África do Sul, Malásia, Austrália e Argentina. Dentre as apresentações assumidas pelas ações afirmativas o sistema de cotas parece ser amplamente conhecido e consiste na visão de Moehlecke (2002, p. 199), [...] estabelecer um determinado número ou percentual a ser ocupado em área específica por grupo(s) definido(s), o que pode ocorrer de maneira proporcional ou não, e de forma mais ou menos flexível. Existem ainda as taxas e metas, que seriam basicamente um parâmetro estabelecido para a mensuração de progressos obtidos em relação aos objetivos propostos, e os cronogramas, como etapas a serem observadas em um planejamento a médio prazo [...]. Contudo é necessário ressaltar que, para além das cotas, as políticas de ações afirmativas envolvem um conjunto de outras medidas de caráter especial e transitório, voltadas à atender certo grupo minoritário e devem ser suprimidas logo que a erradicação dos motivos que levaram a sua adoção seja realmente findada. As diversas modalidades de ações afirmativas assumidas nos distintos países que implementaram têm buscado: considerar o critério racial, de gênero ou qualquer outro aspecto que caracterize o grupo como minoritário a fim de promover a integração social; afastar o critério referente a antiguidade para pessoas com potencial econômico elevado em determinados ambientes de trabalho; definir zonas eleitorais distritais para o fortalecimento minorias políticas que lá se encontram; estabelecer o sistema de cotas ou reserva de vagas para pessoas que fazem parte de setores marginalizados (SANTOS, 2009; MOELHECKE, 2002; BRASIL, 2010). No âmbito dos direitos humanos, as políticas de ações afirmativas surgem como poderosas ferramentas de inclusão social na medida em que buscam “remediar um passado discriminatório, objetivam acelerar o processo com o alcance da igualdade substantiva por parte de grupos vulneráveis, como as minorias étnicas e raciais e as mulheres, entre outros grupos” (PIOVESAN, 2005, p. 49). Sua origem e, sobretudo, exequibilidade só foi possível a partir de uma nova proposta ética de proteção dos direitos do homem, da superação de valores e princípios universais pautados na proteção geral e abstrata com base na igualdade formal (PIOVESAN, 2005; 2008; MUNANGA, 2001). Para Silva Filho e Cunha (2014), os Direitos Humanos tem se constituído, ao longo da história, como campo de concretização da justiça social - independente de nação, raça, Estado, etnia, condições físicas, idade, gênero ou orientação sexual, por meio de reivindicações e luta dos atores sociais. Assim, em consonância com os avanços políticoculturais, os Direitos Humanos devem emprestar o máximo de concretude a igualdade material, conjugando os campos dos direitos econômicos, sociais e culturais, transcendendo o plano formal de inspiração liberal provenientes da Revolução Francesa5. A transposição do princípio da isonomia em oportunidade iguais concretas, especialmente aquelas destinadas à participação equitativa aos bens sociais, é alcançada pela justiça distributiva ou compensatória. Encontra-se fundamentada no reconhecimento da posição social que cada grupo ocupa e objetiva promover a inclusão destes, sobretudo, aqueles que ao longo dos anos ocuparam a periferia das camadas sociais (BRASIL, 2010). Nesse seguimento, as ações afirmativas cumprem uma finalidade pública, essencial para uma proposta de democracia que assegure as vivências heterogêneas e plurais na sociedade, refletindo a consciência ética compartilhada pelos Estados a partir do consenso transnacional, prescrevendo parâmetros mínimos de proteção universais (PIOVESAN, 2005). POLÍTICAS AFIRMATIVAS NO BRASIL: Uma breve digressão No Brasil, as Políticas de Ações Afirmativas foram adotadas com o processo de redemocratização do país, quando, ao romper com o silêncio do regime autoritário imposto pela ditadura diferentes grupos e organizações passaram a reivindicar publicamente seus direitos e reclamar ao poder público um posicionamento mais ativo diante das questões emergentes e a adoção de medidas reparativas para grupos raciais, étnicos e de gênero (DAFLON; FERES JÚNIOR; CAMPOS, 2013). O termo chega ao país influenciado pelos debates e experiências dos países onde foram desenvolvidas as ações afirmativas, predominando a imprensa e dividindo opiniões nos meios de comunicação e entre intelectuais6 (MOEHLECKE, 2002; SANTOS, 2009). O primeiro registro do que podemos chamar atualmente de ação afirmativa é datada em 1968, quando técnicos do Ministério do Trabalho e do Tribunal Superior do Trabalho se posicionaram a favor de uma lei que garantisse que empresas do setor privado 5 A igualdade formal de inspiração liberal provenientes da Revolução Francesa preconiza que os homens nascem e permanecem livres e iguais em direitos, as diferenças sociais não podem ser fundadas senão sobre a utilidade comum. Para maior aprofundamento no assunto ver Piovesan (2005; 2008), Munanga (2006). 6 Interpretado equivocadamente como sistema de cotas e, mais preciso, cotas para acesso ao ensino superior. oferecessem uma cota mínima para empregados de cor contudo, não foi dado continuidade aos procedimentos para elaboração da legislatura (MOEHLECKE, 2002). No âmbito do movimento negro, essas não foram as primeiras manifestações do grupo em busca de melhoria das condições de vida e, prever uma constituição de medidas destinadas à atender demandas de grupos historicamente excluídos, sugere a compreensão do seu desenvolvimento sócio-cultural, das circunstâncias políticas e das ações coletivas que as impulsionaram (DAFLON; FERES JÚNIOR; CAMPOS, 2013; GUIMARÃES, 1999; SANTOS, 2009), especialmente por se tratar de uma nação de ampla extensão territorial, marcada pela diversidade étnica e cultural na constituição identitária de seus povos, e que também apresenta-se com intensa desigualdade socioeconômica a clara divisão de classe. De acordo com Assis e Canen (2004), não há como negar ou ignorar as relações assimétricas de poder entre as diferentes matrizes culturais e raciais, formadas ao longo da história, que determinaram e ainda dividem o território brasileiro (ASSIS E CANEN, 2004). A abolição da escravatura – com a proposta de libertar o homem negro do cativeiro, retirando de sua condição de objeto de posse e, portanto, de responsabilidade do seu senhor, na verdade acabou por expor os egressos da escravidão a condição de vulnerabilidade e insegurança social. A condição de homem livre não conferiu ao negro garantias ou amparo por parte do Estado, atenção específica nas suas necessidades básicas, tão pouco indenização pelo tempo cativo, pela retirada abrupta da sua nação, pela morte real e simbólica da sua cultura. Ao contrário, o projeto de liberdade se mostrou fragilizado quando não pesou as consequências concretas de uma abolição sem estratégias de cuidado, prestação de auxílio ou assistência, que viessem assegurar ao negro a inclusão na sociedade. A liberdade sem uma proposta de inclusão na sociedade se tornou a principal fonte explicativa do quadro de miséria, submissão e falta de amparo formado após a promulgação da Lei Áurea. Segundo Silva e Araújo (2011), a herança do passado escravagista levou a população negra a compor um quadro vulnerável predominado por negação de bens materiais e simbólicos necessitando de amparo específico na legislação e propostas de ações relativas a proteção dos seus direitos humanos. Uma possível explicação dos motivos ideológicos por traz da dificuldade encontrada pelo negro no período que procedeu a abolição, tem destaque a construção da identidade brasileira forjada a partir da suposta “democracia racial” e a defesa da eugenia com base no clareamento da população brasileira. Construída a partir de 1820, o mito alcança seu ápice em 1930, ano da publicação do clássico Freyriano “Casa Grande e Senzala”7 Tal obra, além de representar a esperança de um ambiente capaz de proporcionar o convívio social harmônico e pacífico entre as diferentes raças e postos hierárquicos que formaram a nação, argumentava a favor do ideal de raça a ser alcançado num futuro próximo. Tinha como referência para este ideal a generalização de poucos casos de ascensão social do mulato e, seu reconhecimento se dava, antes de tudo, pela depreciação do negro visto como portador de comportamentos e estética incompatíveis com o que se esperava de uma nação civilizada (BERNADINO, 2002). Segundo Bernadino (2002), a abolição da escravatura e a Proclamação da República foram acontecimentos fundamentais para a estruturação do mito da democracia racial visto que, antes dos mesmos, jamais poderia se falar em igualdade entre negros e brancos. Soma-se a esses fatos a correspondência entre abolicionistas brasileiros e norteamericanos e a percepção da sociedade brasileira, vista como utópica em contraponto ao ambiente tenso vivenciado nos Estados Unidos. Neste seguimento, o sociólogo Joaze Bernadino (2002) propõe ainda, ao lado do mito da suposta democracia racial formou-se no Brasil o ideal de branqueamento como política nacional que estimulava a entrada de brancos europeus com o objetivo de suprir a necessidade de mão de obra qualificada e alinhar as diretrizes políticas e econômicas do país rumo ao progresso8. Libertos e entregues à própria sorte, restou aos negros adentar o submundo do trabalho braçal; vivenciar dificuldades no acesso e permanência em instituições escolares9, até mesmo completa negação de acesso à educação formal. Em busca por estratégias para sua existência, ainda que as condições para o exercício da cidadania fossem vetadas à eles, é possível identificar nestas trajetórias formas de sobrevivência ligadas ao envolvimento com movimentos sociais de classe e raça. Mesmo sem a integração na vida social normativa as manifestações de resistência e luta estavam presentes, até mesmo antes do fim do sistema colonial escravagista,10 e, mais intenso, na ocasião pós abolição. A comprovação deste fato é a existência dos primeiros 7 A obra apresenta a realidade brasileira a partir da influência social e cultural na relação entre os habitantes da casa – grande e da senzala e enfatiza a miscigenação entre as raças na formação da nação. 8 A tese do Branqueamento foi reforçada tanto pela alta taxa de mortalidade dos negros, fruto do desamparo destinado aos negros Bernadino (2002). 9 Para estudos sobre acesso e permanência dos negros na educação formal após abolição ver Barros (2005); Dias (2005); Cruz (2005). 10 Admitimos também, para efeito de esclarecimento, os quilombos como símbolo de organização social revolucionaria, e movimento em direção a um funcionamento mais pleno, livre da coerção e violência a que estavam submetidos os negros. jornais para a população negra em 1920, com temáticas relacionadas as condições de vida do grupo e artigos que abordavam a discriminação racial e a pouca mas significativa presença de negros matriculados em uma instituições de ensino superior, em São Paulo, antes mesmo da Lei do Ventre Livre promulgada em 1871 (SANTOS, 2009; PORTES E SOUZA, 2013). Os primeiros passos em direção a uma ação afirmativa ocorrem em 1930 quando é fundado a Frente Negra Brasileira, importante entidade formada por afrodescendentes, pautada na ideia de progressão do negro via educação. O trabalho desenvolvido pela frente negrina revelou não só a insatisfação do negro com a sua real condição, mas também buscou apresentar propostas quanto ao acesso a espaços públicos, políticos, educacionais e de trabalho, a partir da união dos esforços formados por lideranças potencialmente voltadas para a luta destes ideais. Em 1936 a Frente negra é lançada como partido político, entretanto não deu continuidade aos seus objetivos em razão do impedimento da existência de partidos políticos no governo de Getúlio Vargas (SANTOS, 2009). Silva e Araújo (2011) lembram que a identidade nacional forjada em torno do mito da democracia racial não impediu os efeitos do sistema escravocrata. Nesta perspectiva, Bernardino (2002) conclui que o mito da democracia racial e o ideal de branqueamento trouxeram consequências que deram origem a uma realidade social em que a voz do negro empoderado é percebido como um discurso incômodo, demasiado emotivo e dificulta o reconhecimento da categoria raça do ponto de vista analítico e de intervenções práticas imprimindo um quadro de diferenças sociais que se revela como um dos mais graves e estáveis do mundo ocidental. Importantes acontecimentos ocorreram, na década de 4011, que influenciaram na estruturação do movimento social negro trazendo - lhe maior visibilidade a causa, com ramificações entre os estados brasileiros e notoriedade no contexto internacional. Na pauta dos encontros estavam presentes; a exigência de participação do Estado, especialmente na elaboração de leis que punissem a discriminação racial e preconceito e a concessão de bolsas de estudos para estudantes negros na universidade e no ensino secundário (SILVA, 2005). 11 Os acontecimentos emblemáticos ocorridos na década de 40 foram, a Convenção Nacional do Negro, em São Paulo, no ano de 1945; a Conferência Nacional do Negro Brasileiro, no Rio de Janeiro, em 1949, e o I Congresso Negro Brasileiro, no Rio de Janeiro, em 1950. Para aprofundamento na questão vide Silva (2005). No ambiente acadêmico, o consenso sobre a democracia racial no país perdurou até a metade dos anos 50 quando então, foi revelado, a partir de estudos sobre as relações raciais no Brasil que, após o período de escravidão, os negros sofreram consequências negativas que dificultaram o acesso tanto ao mercado de trabalho quanto à educação. Estava constatada a farsa que envolvia a suposta democracia racial. Apesar disso, somente no final dos anos 70 é que a ideia de uma classe de estudantes acadêmicos racialmente igualitárias começa a ser pensada, associada ao ressurgimento dos movimentos sociais. A educação, como caminho para a superação das desigualdades, era considerada essencialmente a única forma que permitiria ao homem negro alcançar igualitariamente as possibilidades que os brancos tinham, com oportunidades de progredir, integrar-se, lutar contra a falta de recursos e combater as mazelas a quais estavam expostos (SANTOS, 2009). Merece destaque o ano de 1978, momento em que diversas entidades negras, sensibilizadas com a questão da discriminação racial, fundaram em São Paulo o Movimento Negro Unificado conta a Discriminação Racial (posteriormente abreviado para MNU) que apresentava como prioridade ações voltadas para a educação do negro (SANTOS, 2009; CALHEIROS E STANDHER, 2010). No final dos anos 80 o quesito cor é reintroduzido no censo demográfico brasileiro e tornou possível a comprovação estatística das desigualdades raciais entre brancos e negros. (SANTOS, 2009). Ações compensatórias destinadas aos negros no âmbito educacional foram proposta pelo Deputado Federal Abdias do Nascimento entretanto, por falta de apoio na esfera legislativa, o projeto foi arquivado. A questão da educação do negro foi retomada no início da década de 90 nas reuniões regionais do Movimento Negro (MOEHLECKE, 2002; REIS, 2009). Em 20 de novembro de 1995 o Governo, sob a Liderança de Fernando Henrique Cardoso, influenciado pela Marcha Zumbi dos Palmares – marco do movimento negro nacional, decretou a criação do Grupo de Trabalho Interministerial para a Valorização da População Negra (GTI) (PIOVESAN, 2005; SANTOS, 2009). Com o objetivo de introduzir a temática do negro na agenda nacional, o GTI foi inicialmente alvo de críticas e funcionou de maneira precária quanto ao corpo técnico, infraestrutura e recursos financeiros (SANTOS, 2009). A estratégia discursiva e política deste governo buscou promover o reconhecimento por parte do Estado brasileiro de que a escravidão e o tráfico de escravos constituíram violações graves e sistemáticas dos direitos humanos porém, não houve efetivos investimentos em medidas para diminuir as iniquidades (LIMA, 2010). Se por um lado, o GTI para não conseguiu cumprir exitosamente seus objetivos, por outro, foi fundamental para o início de discussões sobre a temática nas entranhas governamentais e o reconhecimento da existência de desigualdade racial no país (SANTOS, 2009). No início dos anos 2000, uma maior disponibilidade de dados e indicadores sociais revelaram detalhadamente a dimensão das desigualdades raciais no Brasil ampliando o espectro de possibilidades para se pensar alternativas para a superação destas desigualdades (HERINGER, 2014). Em 2001, é apresentado documento oficial brasileiro à Conferência das Nações Unidas contra o Racismo, em Durban, que propunha a adoção de medidas de cunho afirmativo para a população negra no âmbito da educação superior e do trabalho. Nesse mesmo ano, políticas de ação afirmativa para a população negra são aprovadas tendo como fundamento o sistemas de cotas e pautados na crença da necessidade de representação desse extrato populacional em diversos setores sociais (PIOVESAN, 2005; REIS, 2009; MOEHLECKE, 2002). A pressão dos movimentos negros impulsionaram o governo seguinte, liderado por Luiz Inácio Lula da Silva, a criar a Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir), avançando mais que o governo anterior ao encaminhar para o Congresso Nacional Brasileiro o Projeto de Lei nº 3.627 de 20 de maio de 200412, que estabelece a reserva de vagas em instituições públicas de ensino superior para estudantes oriundos do ensino público, especialmente negros e indígenas (SANTOS, 2009). Em 2012, sob o governo da Presidenta Dilma Rousseff, foi sancionada a Lei 12.711 que dispõe sobre o ingresso nas Universidades Federais e nas Instituições Federais de Ensino Técnico de Nível Médio, reservando 50% das vagas, em cada concurso seletivo, para estudantes que tenham cursado integralmente o ensino médio em escolas públicas. Desta reserva, a metade deverá ser preenchida por estudantes, cujas famílias tenham renda igual ou inferior a um salário mínimo e meio. Deste percentual 50% das vagas reservadas em cada Instituição deverão ser preenchidos por pretos, pardos e indígenas, respeitando-se a composição da Unidade da Federação onde está instalada a Instituição, segundo o último Censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE (BRASIL, 2012). 12 O projeto de Lei Nº 3.627, DE 2004 institui o Sistema Especial de Reserva de Vagas para estudantes egressos de escolas públicas, em especial negros e indígenas, nas instituições públicas federais de educação superior. ACESSO E PERMANÊNCIA NO ENSINO SUPERIOR: A QUESTÃO DO ESTUDANTE QUILOMBOLA Sem dúvidas, a partir da década de 90 houve uma evolução significativa acerca das questões raciais no cenário brasileiro marcado, especialmente, pela aproximação entre o movimento negro e o Estado. Os reflexos do encontro em Durban repercutiram na esfera governamental nos anos seguintes e desde então podem ser verificadas propostas de políticas públicas de abrangência nacional com recorte raça/etnia na educação superior (LIMA, 2010). De acordo com Moehlecke (2002), a redemocratização no Brasil é ainda um processo recente, com diversas lacunas aparentes, apontado nos dados referentes à discriminação e desigualdades raciais e o impacto negativo no desempenho educacional, acesso ao ensino superior, divulgados nos últimos anos. Neste sentido, falar em democratização do ensino superior, nos remete sobretudo à discussão do acesso de grupos sociais historicamente excluídos do processo educacional, às Universidades Brasileiras. O fundamento para a criação de ações afirmativas com recorte étnico racial na educação repousa, principalmente, em evidencias numéricas e também na evidência de mecanismos excludentes criados pelas próprias instituições de Ensino Superior desde a seleção do sujeito até sua permanência enquanto estudante universitário. De acordo com Munanga (2001, p. 33): Num pais onde os preconceitos de discriminação racial não foram zerados, ou seja, onde os alunos brancos pobres e negros pobres ainda não são iguais, pois uns são discriminados uma vez pela condição socioeconômica e os outros são discriminados duas vezes pela condição racial e pela condição socioeconômica, as políticas ditas universais [...] não trariam as mudanças substanciais esperadas. Os critérios de raça e etnia utilizados anteriormente para excluir os afrodescendentes devem hoje ser utilizadas para incluir e atenuar os efeitos do passado discriminatório (PIOVESAN, 2005). A questão fundamental que se coloca para Munanga (2001), é como aumentar o contingente negro no ensino superior uma vez que os ensinos básico e fundamental público não oferecem ferramentas para que os mesmos estudantes, de origem popular possam competir em pé de igualdade com estudantes vindos da rede particular e que continuam a usufruir das vantagens adquiridas ao longo do tempo. Ainda de acordo com o autor, as políticas de ações afirmativas são muito recentes na história da ideologia antirracista e, experiências exitosas ou não, em países que convivem com a questão do racismo podem servir como ponto de partida para se pensar em soluções locais, levando em consideração as particularidades culturais e históricas do racismo à brasileira. No âmbito nacional, temos acompanhado o que Portes e Sousa (2013) chamaram de “manifestações exultantes e alarmistas”, acerca da ampliação do acesso do jovem negro ao ensino superior, resultado da implementação das políticas públicas de expansão do acesso à educação superior. Ao analisar a implementação de tais medidas no Brasil, Heringer (2014)13 conclui que se trata de uma história de sucesso, fruto de um longo caminho de disputa e negociações. Sua pesquisa revelou a ampliação expressiva ao acesso a instituições de ensino superior por estudantes pretos e pardos (de 10% em 2001 para 35% em 2011), resultado da combinação assertiva de um conjunto de medidas de inclusão para a população específica e também de políticas voltadas para a expansão do próprio sistema de educação superior. Outro aspecto apontado pela autora como avanço é a maior legitimidade alcançada por estas política. A inscrição do ingresso nas universidades federais na ordem jurídica, como aparato legal para sua execução, trouxe segurança legalística e fortaleceu, sobretudo, o caráter político e ideológico da equidade e relevância das ações afirmativas. Entretanto, mesmo avançado na direção certa, a velocidade ainda é insuficiente para alcançar as grandes dificuldades existentes entre grupos racialmente distintos e, a ausência de debate entre os juristas mais o critério particular usado por cada um deles no julgamento dos casos14, transparece a sua fragilidade. Portes e Sousa (2013) chamam atenção para a diferença entre acesso e permanência. Para os autores apenas a ampliação do acesso não é suficiente, é preciso que a universidade disponha de práticas que facilitem a permanência deste estudante no ensino superior e consiga concluir o curso. Nas palavras dos autores: Para estudantes oriundos dos estratos mais empobrecidos, abrirem-se as portas da universidade para que eles ingressem nela não é suficiente. É preciso que, através de políticas de assistência estudantil, sejam garantidas melhores condições materiais e culturais (2013, p. 64). 13 Para acesso ao estudo completo ao longo dos dez anos da implementação das políticas de ações afirmativas no ensino superior: HERINGER, R. R. Um balanço de 10 anos de políticas de ação afirmativa no Brasil. Tomo (UFS), v. 1, p. 13-29, 2014. 14 A Juíza Fernanda Duarte (2010), chama atenção para a consideração particular do jurista, por exemplo, na seleção do critério usado para avaliar o percentual de vagas e a forma de identificação dos beneficiário. Lembramos aqui o caso emblemático da UNB, em Brasília - DF, que adotou o uso da fotografia para identificação do candidato na seleção de vestibular em 2004. O caso foi julgado pela Corte brasileira e, em 2010, os métodos utilizados foram avaliados como proporcional e eficazes, compatíveis com o princípio da igualdade humana. De acordo com Heringer (2014), a questão da permanência aparece como um desafio na relação entre a instituição pública e as necessidades específica dos estudantes negros. E, embora já se tenha avançado em termos de alcance e recursos disponíveis, com criação de programas específicos na área de moradia e permanência material, muitas vezes na prática, o que se encontra são ações de assistência estudantil e permanência material integradas, sobrepostas ou até mesmo confundidas. Para Portes e Sousa (2013) há ainda a constatação de necessidades que ultrapassam o plano material e que requer atenção específica por parte da instituição voltada para as necessidades médicas, pedagógicas, artísticas, psicológicas, social e psiquiátricas. Se por um lado, a proposta de superação das desigualdades no acesso a instituições de ensino superior com a adoção de políticas de ações afirmativas, direciona para uma multiplicidade de contextos regionais de conexão de forças e também, de parcerias estratégicas, que modificará o perfil do estudante universitário e também da instituição (CALMON E LÁZARO, 2013; PORTES E SOUSA, 2013). Por outro, pesquisadores na área de educação15 lembram que muitos destes estudantes recém ingressos nas universidades brasileiras, necessitam de auxílio materiais, mas também de ordem acadêmica ,a fim de que possam ter uma permanência bem sucedida no curso. Portes e Sousa (2013) afirmam ainda existir, nos dias de hoje, dentro da própria instituição desigualdades entre os cursos, estando os de maior prestígio, concorrência e carga horária disponíveis apenas para uma pequena parcela do estrato social, em sua maioria esmagadora, a elite. Um outro estudo realizado por Silva (2007), sobre o Sistema de Cotas descreve a eficácia quanto à democratização desse acesso, ao admitir uma presença expressiva de negros em universidades estaduais e federais, além de viabilizarem o ingresso em cursos considerados de maior prestígio, como Direito e Medicina. Nos resta saber em que medida jovens negros estão, de fato, ingressando nesses cursos de maiores prestígios e quais estratégias utilizadas para sua permanência, especialmente, os oriundos de comunidades tradicionais, os quilombolas. Em estudo anterior, Santos (2009) afirma que o sistema de cotas raciais já são uma realidade na maioria nas Universidades Públicas no Brasil, contudo, é necessário compreender o acesso de jovens negros ao ensino superior por meio das cotas (escolha pelo tipo de curso); as condições para a permanência material (aquisição de textos e livros, 15 Portes e Sousa (2013). despesas com deslocamento, alimentação dentre outros); assim como a sua permanência simbólica, visto que o debate sobre a temática viabiliza a revisão de crenças e pressupostos que dão sustentação a identidade racial brasileira bem como possibilita o rompimento histórico da cultura universitária de exclusão baseada na meritocracia elitista. A esse respeito, Portes e Sousa (2013) afirma que a ampliação de vagas para o acesso no ensino superior abre espaço para novas discussões - relacionadas à reflexão sobre o processo seletivo, meritocracia, a ocupação nos cursos de maior prestígio, preconceito e discriminação, ao mesmo tempo que revela a dificuldade do jovem pobre e egressos de escolas públicas, carecidos de conhecimentos na sua escolarização e que apresentam dificuldades para permanecer e realizar a graduação. Nesses termos, situamos também a questão do estudante que pertence a comunidade tradicional quilombola. Segundo Calheiros e Stadtler (2010) os quilombos acompanham a história brasileira desde a sua constituição, os quilombolas, por sua vez, desenvolveram uma relação com o Estado e ocuparam lugar de destaque ao interagir e se relacionar com outras instâncias de poder. Entretanto, parece haver uma incompreensão por parte dos brasileiros deste lugar, que gera equívocos e duvidas quando se discute a questão do grupo. Marques (2009) ressalta que tais grupos não precisam apresentar nenhuma relação com o que convencionalmente estamos acostumados a tratar como quilombos. A pauta das comunidades quilombolas entrou no Plano Plurianual (PPA)16 pela primeira vez em 2004. Desde então, houve um aumento na inclusão de demandas do grupo quilombola, com repercussões nas ações orçamentárias. No mesmo ano foi lançado o Programa Brasil Quilombola e, em 2007, instituída a Agenda Social Quilombola17 que agrupa ações voltadas às comunidades em diversas áreas. A educação aparece incluída no eixo que dispõe sobre a infraestrutura e prevê a consolidação de mecanismos efetivos para a construção de equipamentos a atender esta demanda. No eixo Direitos e Cidadania, encontramos a estimulação da presença ativa de representantes quilombolas em espaços coletivos de controle e participação social em conselhos e fóruns municipais, estaduais e nacionais de política pública para promover o acesso das comunidades ao conjunto de ações definidas pelo governo, e seu envolvimento no acompanhamento das ações 16 Estabelece as diretrizes, objetivos e metas para as três esferas governamentais no período de quatro anos. A ordem temática prevista no PPA de 2012-2015 prevê iniciativas de coordenação, acompanhamento e avaliação das ações governamentais direcionadas para as comunidades quilombolas. 17 Para mais informações sobre o Programa Brasil Quilombola acesse: http://www.seppir.gov.br/comunidades-tradicionais/programa-brasil-quilombola implementadas em cada município onde houver território quilombola. A coordenação geral do Programa Brasil Quilombola é de responsabilidade da SEPPIR em parceria com outros órgãos do Governo Federal, conforme a necessidade da comunidade e a competência de cada órgão. A política de acesso ao curso superior garante legalmente o acesso a estas instituições. Para estes estudantes, está disponível também o Programa Bolsa Permanência 18 que garante um valor diferenciado, em razão de suas especificidades com relação à organização social comunitária onde vivem, condição territorial, as regras sociais de sua cultura costumes, idiomas, matrizes religiosas e passado. Ao longo deste texto, buscamos entender a história das Ações Afirmativas no Mundo e mais especificamente no Brasil, onde a ideia de uma Democracia Racial forjou a nossa identidade e impediu uma visão mais real sobre as relações entre brancos e negros em nosso pais. A adoção de medidas de cunho compensatório na educação superior, por sua vez, trouxe novamente a questão sobre “quem é sujeito de Direito no Brasil (GUIMARÃES, 1999) e reatualizou o debate em torno do Brasil como país com oportunidades iguais para todas e todos, em que pesem as distorções econômicas e sociais apresentadas pelos indicadores sociais, sobretudo quando analisado à luz da perspectiva racial. 03 anos após a efetivação da Lei de Cotas e mais de uma década após a implantação do sistema de reserva de vagas elas Universidade Brasileira, cabe uma reflexão apurada sobre o acesso e permanência dos estudantes de origem quilombola, suas especificidades e sobretudo as contribuições que o espaço acadêmico tem permitido para a preservação da sua identidade étnico racial e empoderamento. Não se pode negar o papel social que as instituições de ensino superior cumpriram ao longo da sua existência e também as várias formas de expressão do racismos no cotidiano do tecido social, especialmente, “quando ligadas a critérios de fenotipia [sic] como a cor da pele, a tessitura do cabelo, os traços corporais que denotam pertencimento a um determinado grupo étnicorracial [sic] – negros, quilombolas” (PASSOS, 2005, p. 4-5). Não se pode negar também que a Academia possui uma estrutura curricular com uma abordagem que não é a dos povos africanos ou das comunidades tradicionais e muito dos O Programa de Bolsa Permanência – PBP é uma ação do Governo Federal de concessão de auxílio financeiro a estudantes matriculados em instituições federais de ensino superior em decorrência de sua vulnerabilidade social e econômica e para estudantes indígenas e quilombolas. Informações: http://permanencia.mec.gov.br/ 18 conhecimento trazidos por este “novo estudante universitário” sempre são colocados em xeque, quando confrontados com o “discurso acadêmico tradicional”. A permanência simbólica, tão cara quando pensamos a passagem do estudante pelo ensino superior, requer que se pensem práticas de ensino que permita ao estudante se identificar com o meio universitário ao mesmo tempo em que será reconhecido pelos seus pares. Este é um princípio básico da existência social. REFERÊNCIAS ASSIS, M.D.P.; CANEN, A. Identidade negra e espaço educacional: vozes, histórias e contribuições do multiculturalismo. Cadernos de Pesquisa. v. 34, n. 123, p. 709-724, set./dez. 2004. BARROS, Surya Aaronovich Pombo de. Discutindo a escolarização da população negra em São Paulo entre o final do século XIX e início do século XX. ROMÃO, J. História da educação dos negros e outras histórias, p. 79-92, 2005. BERNARDINO, J. 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