UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS - CEJURPS CURSO DE DIREITO - NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA - NPJ REGULAÇÃO E DEFESA DA CONCORRÊNCIA DA ATIVIDADE PORTUÁRIA DANIELA APARECIDA BITENCOURT ITAJAÍ - SC, 18 DE NOVEMBRO DE 2008 i UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS - CEJURPS CURSO DE DIREITO-NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA - NPJ REGULAÇÃO E DEFESA DA CONCORRÊNCIA DA ATIVIDADE PORTUÁRIA DANIELA APARECIDA BITENCOURT Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito. Orientador: Professor Doutor Osvaldo Agripino de Castro Jr. ITAJAÍ- SC, 18 de novembro de 2008 ii AGRADECIMENTOS Agradeço a Deus, pela dádiva da vida, e pela força concedida para eu prosseguir sempre em busca dos meus sonhos. Aos meus pais, João e Lindomar, que sempre me incentivaram, e me apoiaram em todos os momentos da minha vida. A minha avó Maria Gonçalves Amaro (in memorian), com ela aprendi a ser perseverante, ter fé e confiar em Deus. Aos poucos, porém bons e fiéis amigos, que me acompanharam nesta trajetória. Ao meu irmão Joares, e meus sobrinhos João Victor e Leonardo, agradeço pelo amor e carinho. Agradeço em especial ao Professor Doutor Osvaldo Agripino de Castro Jr. o qual tive o privilégio de ter como orientador. Enfim, agradeço a todas as pessoas que cruzaram minha vida, que de uma maneira ou outra, me ajudaram a chegar até aqui. iii DEDICATÓRIA Dedico este trabalho à minha avó Maria Gonçalves Amaro (in memorian), grande inspiração, para minha vida. iv TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo. Itajaí - SC, 18 de novembro de 2008 Daniela Aparecida Bitencourt Graduanda v PÁGINA DE APROVAÇÃO A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, elaborada pela graduanda Daniela Aparecida Bitencourt, sob o título Regulação e Defesa da Concorrência da Atividade Portuária, foi submetida em 18 de novembro de 2008 à banca examinadora composta pelos seguintes professores: Dr. Osvaldo Agripino de Castro Jr. (Orientador e Presidente da Banca), Msc. Giselda da Silveira Cherem (Membro), e aprovada com a nota __. Itajaí - SC,18 de novembro de 2008 Professor Doutor Osvaldo Agripino de Castro Jr. Orientador e Presidente da Banca Msc. Giselda da Silveira Cherem Membro da Banca Professor Mestre Antônio Augusto Lapa Responsável pelo Núcleo de Prática Jurídica vi ROL DE ABREVIATURAS E SIGLAS ANTAQ Agência Nacional de Transportes Aquaviários ANTT Agência Nacional de Transportes Terrestres ART. Artigo CONIT Conselho Nacional Transportes CAP CADE CMM DNIT de de Políticas de Conselho de Autoridade Portuária Conselho Administrativo de Defesa Econômica Comissão de Marinha Mercante Departamento Nacional de Infra-Estrutura de Transportes E.C Emenda Constitucional MPF Ministério Público Federal PCN Plano de Construção Naval SNV Integração Sistema Nacional de Viação SEP Secretaria Especial de Portos SBDC Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência vii ROL DE CATEGORIAS Rol de categorias que a autora considera estratégicas à compreensão do seu trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais. Agência Reguladora As agências reguladoras são autarquias sob regime especial, ultimamente criada com a finalidade de disciplinar e controlar certas atividades.1 Área do Porto Organizado Área compreendida pelas instalações portuárias, quais sejam ancoradouros, docas, cais, pontes e píer de atracação e acostagem, terrenos e armazéns, edificações e vias de circulação interna, bem como pela infra-estrutura de proteção e acesso aquaviário ao porto tais como guia - correntes, quebramares, eclusas, canais, bacias de evolução e área de fundeio que devem ser mantidas pela Administração do Porto”.2 Carga Própria “Aquela que pertence a pessoa jurídica ou a pessoa jurídica que seja sua subsidiária integral ou controlada, ou a pessoa jurídica de que a autorizada seja subsidiária integral ou controlada ou, ainda, que pertença a pessoas jurídicas que integram grupo de sociedades de que a autorizada seja integrante como controladora ou controlada”.3 Porto Organizado Porto organizado é “o construído e aparelhado para atender às necessidades da navegação, 1 da movimentação de passageiros ou da movimentação e MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 13. ed. São Paulo: Malheiros, 2001, p. 132. 2 Conforme inciso III, § 1º do art. 4º da Lei n. 8.630/93. 3 Conforme inciso IV, do art. 2º . da Resolução n. 517/2005. viii armazenagem de mercadorias, concedido ou explorado pela União, cujo tráfego e operações portuárias estejam sob a circunscrição de uma autoridade portuária”.4 Regulação Aragão conceitua regulação como “conjunto de medidas legislativas, administrativas e convencionais, abstratas ou concretas, pelas quais o Estado, de maneira restritiva da liberdade privada ou meramente indutiva, determina, controla ou influencia o comportamento dos agentes econômicos, evitando que lesem os interesses sociais definidos no marco da Constituição e orientando-os em direções socialmente desejáveis”.5 Regulamentação Ato de criar regulamentos necessários à execução da lei, prerrogativa competente do Presidente da República. Conforme o dicionário regulamentação é “o ato de fixar por meio de regulamento. Conjunto de medidas legais ou regulamentares que regem um assunto”.6 Transporte Aquaviário Denomina-se transporte aquaviário quando o veículo se desloca no meio líquido, estando, assim, incluídos o transporte marítimo, fluvial e terrestre. A modalidade aquaviária caracteriza-se pela capacidade de transportar grandes volumes de carga em um único veículo de transporte, o que representa um baixo consumo de energia por unidade de peso movimentada.7 4 Conforme inciso IV, do art. 1º . da Lei. n. 8.630/93. ARAGÃO, Alexandre Santos de. Agências Reguladoras e a Evolução do Direito Administrativo e Econômico. 4 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 25. 6 HOUAISS, Antônio. Enciclopédia e Dicionário Ilustrado. Rio de Janeiro: Edições Delta, 1994. p. 723. 7 FARIA, Sérgio Fraga Santos. Fragmentos da História dos Transportes. São Paulo: Aduaneiras, 2000, p. 20. 5 ix SUMÁRIO RESUMO...........................................................................................XII ABSTRACT......................................................................................XIII INTRODUÇÃO .................................................................................... 1 CAPÍTULO 1 ....................................................................................... 5 CONCEITOS DO SISTEMA JURÍDICO DA ATIVIDADE PORTUÁRIA 1.1 PROBLEMA ......................................................................................................5 1.1.1 JUSTIFICATIVA .............................................................................................5 1.2 CONCEITOS .....................................................................................................5 1.2.1 REGULAÇÃO.................................................................................................6 1.2.2 REGULAMENTAÇÃO ....................................................................................7 1.3 DEFESA DA CONCORRÊNCIA .......................................................................8 1.4 INFRA-ESTRUTURA PORTUÁRIA ................................................................11 1.4.1 TERMINAIS PORTUÁRIOS DE USO PÚBLICO .........................................13 1.4.2 TERMINAIS PORTUÁRIOS DE USO PRIVATIVO.. ....................................14 1.4.3 TERMINAIS PORTUÁRIOS DE USO PRIVATIVO MISTO..........................14 1.5 DESCENTRALIZAÇÃO DE AÇÕES...............................................................15 1.5.1 CONCESSÕES ............................................................................................16 1.5.2 PERMISSÕES.. ............................................................................................16 1.5.3 AUTORIZAÇÕES .........................................................................................17 1.6 CADE... ...........................................................................................................17 CAPÍTULO 2 ..................................................................................... 21 CONTEXTUALIZAÇÃO DO TRANSPORTE AQUAVIÁRIO E DA ATIVIDADE PORTUÁRIA 2.1 ASPECTOS HISTÓRICOS DA REGULAÇÃO................................................21 2.2 ORIGEM E EVOLUÇÃO DA REGULAÇAO DO TRANSPORTE AQUAVIÁRIO NO BRASIL ..........................................................................................................23 2.3 REGULAÇÃO DO SISTEMA DE TRANSPORTES ........................................24 2.4 INTERVENÇÃO REGULATÓRIA ...................................................................25 2.5 REGULAÇÃO DO MONOPÓLIO ....................................................................26 2.6 SISTEMA NACIONAL DE VIAÇÃO ................................................................29 2.7 SECRETARIA ESPECIAL DE PORTOS ........................................................30 2.8 COMPETÊNCIAS DA AGÊNCIA REGULADORA - ANTAQ..........................32 2.9 ANTAQ E CADE NA DEFESA DA CONCORRÊNCIA ...................................34 x CAPÍTULO 3 ..................................................................................... 37 REGULAÇÃO E DEFESA DA CONCORRÊNCIA DO TRANSPORTE AQUAVIÁRIO E DA ATIVIDADE PORTUÁRIA 3.1 REGULAÇÃO DA CONCORRÊNCIA PORTUÁRIA.......................................37 3.2 COMPETÊNCIA DA ANTAQ E DO ÓRGÃO DE PROTEÇÃO À CONCORRÊNCIA .................................................................................................40 3.3 PRINCÍPIOS DA DEFESA DA CONCORRÊNCIA..........................................44 3.3.1 PRINCÍPIO DA SOBERANIA NACIONAL ..................................................45 3.3.2 PRINCÍPIO DA GARANTIA DO DESENVOLVIMENTO NACIONAL...........46 3.3.3 PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE ....................................................47 3.3.4 PRINCÍPIO DA EFICIÊNCIA ........................................................................48 3.3.5 PRINCÍPIO DA LEGALIDADE .....................................................................48 3.3.6 PRINCÍPIO DA IGUALDADE .......................................................................49 3.3.7 PRINCÍPIO DA LIVRE CONCORRÊNCIA ...................................................50 3.3.8 PRINCÍPIO DA LIVRE INICIATIVA..............................................................51 3.4 O PODER JUDICIÁRIO NA ATIVIDADE PORTUÁRIA E NO TRANSPORTE AQUAVIÁRIO........................................................................................................52 CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................. 54 REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS ........................................... 57 xi RESUMO O presente trabalho tem como tema Regulação e Defesa da Concorrência da Atividade Portuária, e objetiva identificar de modo sistemático, as principais características dos órgãos de regulação do transporte aquaviário e da atividade portuária, visando estabelecer através da ANTAQ (Agência Nacional de Transporte Aquaviário) e do CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), uma estrutura adequada que gere condições de manter o equilíbrio econômico, e ambiente competitivo no setor portuário. É visível que o sistema portuário brasileiro, encontra-se em uma situação de debilidade e defasagem institucional, esse setor exige uma modernização e adequação capaz de promover concorrência e equilíbrio entre entes públicos e privados. O trabalho é produto do Grupo de Pesquisa Regulação da Infra-estrutura e Juridicidade da Atividade Portuária, da Linha de Pesquisa Produção e Aplicação do Direito, do Programa de Doutorado e Mestrado em Ciência Jurídica da UNIVALI, e está dividido em três capítulos. O primeiro capítulo trata das questões introdutórias, a escolha do tema, e aborda conceitos operacionais essenciais para a compreensão da presente pesquisa. No segundo capítulo objetiva-se a tratar a origem e evolução histórica da regulação do transporte aquaviário e da atividade portuária. E o terceiro capítulo trata-se do estudo dos órgãos reguladores, e princípios que objetivam a fiscalizar e regular as atividades do setor portuário, tentando manter a ordem econômica, a concorrência e o equilíbrio do mercado. Ao final, são apresentados os pontos conclusivos e relevantes da pesquisa, seguidos da estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões sobre a regulação e defesa da concorrência portuária. Palavras chave: Transporte Aquaviário e Atividade Portuária. Regulação. Concorrência. xii ABSTRACT The present work has as subject Regulation and Competition’s Defense of the Port Activity, searching to identify in a systematic way, the main characteristics of the agencies of regulation of the aquatic transport and the port activity, aiming to establish through the ANTAQ (National Agency of Waterways Transport) and of the CADE (Administrative Advise of Economics’ Defense), an adequate structure that generate conditions to keep the economic balance, and competitive environment in the port sector. It is visible that the Brazilian port system, finds in a situation of weakness and institutional imbalance, where this sector demands a modernization and adequacy capable to promote competition and balance between public and private beings. The work is a product of the Group of Research on Regulation of the Infra-structure and Legality of the Port Activity, of the Line of Research on Production and Application of Law of the Program of Doctorate and Master´s degree in Legal Science of the UNIVALI, and it is divided in three chapters. The first chapter deals with introductory questions, the choice of the subject, and boards operational essential concepts for the understanding of the present inquiry. In the second chapter it is aimed treating the origin and historical evolution of the regulation of the aquatic transport and of the port activity. And one treats the third chapter as the study of the regulating organs, and beginnings what they aim to supervise and to regulate the activities of the sector longshoreman, trying to maintain the economical order, the competition and the balance of the market. Finally, conclusions and relevant points of the research are presented, resulted from the stimulation to the continuity of the studies and of the reflections on the regulation and defense of the port’s competition. Keywords: Maritime Transportation and Port activities. Regulation. Competition. INTRODUÇÃO A presente Monografia tem como objetivo geral contribuir para a efetividade da concorrência nos transportes aquaviários e portos brasileiros. Como objetivo específico pretende identificar as principais características regulatórias do transporte aquaviário e da atividade portuária no Brasil, especificamente na atuação da Agência Nacional de Transportes Aquaviário – ANTAQ e seu papel e o do CADE diante da defesa da concorrência. O esgotamento financeiro dos recursos do Estado marcou o fim de um modelo de Administração Pública, caracterizando o surgimento de empresas prestadoras de serviços portuários, surgindo a necessidade de ampliação de agências reguladoras. Dessa necessidade, nasceram as agências reguladoras de atividades econômicas, destinadas a regular a exploração de serviços portuários. O objetivo dessas agências é manter este mercado em equilíbrio, atuando em conjunto com estruturas jurídicas existentes, e observar a defesa da concorrência, devendo promover o equilíbrio entre os interesses públicos e privados. O segmento da exploração das atividades portuárias é de singular importância para o desenvolvimento da economia nacional, observandose que é através da utilização desses serviços que se viabilizam 95% da totalidade das operações de comércio exterior nacional. Os portos são estruturas básicas e desempenham indispensável função no desenvolvimento econômico regional, com a geração de serviços auxiliares. Aproximadamente 95% das mercadorias que entram e saem do país são movimentadas por meio das atividades portuárias. Diante da necessidade brasileira no mercado internacional, o crescimento das instalações portuárias, é condição básica. Contudo, os processos atuais não são suficientes, criando uma defasagem no setor. Assim, objetivando alcançar o aumento da 2 competitividade e eficiência dos serviços, nasce a necessidade de aprimoramento do sistema jurídico regulatório. O modelo atual de exploração e regulação das atividades no sistema portuário é regulamentado pela Lei n. 8.630, de 25 de fevereiro de 1993, conhecida por “Lei dos Portos”, que disciplina as instalações portuárias dos portos organizados, caracterizando o início da regulação. Como instrumento jurídico auxiliar, foi criada em 2001, a Agência Nacional de Transporte Aquaviário – ANTAQ, a quem compete implementar a competição portuária, disponibilizando os mecanismos legais para aplicação das políticas de concorrência. A Lei n. 8.884, de 11 de junho de 1994, publicada no DOU (Diário Oficial da União) de 13 de junho 1994, transformou o Conselho Administrativo de Defesa Econômica, em Autarquia, que dispõe sobre a prevenção e repressão às infrações contra a ordem econômica. O CADE, além de seu papel judicante, atua preventivamente contra abusos de ordem econômica, orientado pelos ditames constitucionais que garantem à liberdade de iniciativa, a livre concorrência, a função social da propriedade, a defesa dos consumidores e contra o abuso do poder econômico. Diante do estímulo concorrencial a ser implantado pela ANTAQ, conduzindo os agentes econômicos da atividade portuária a se comportarem de maneira competitiva, o sucesso da regulação das atividades portuárias, depende da eficiência da ANTAQ e do controle de condutas exercido pelo CADE. Para atingir os objetivos da monografia, o trabalho é modulado em capítulos individualizados. O Capítulo 1 trata das questões introdutórias e da conceituação dos institutos relevantes à atividade portuária para melhor entendimento do aludido trabalho. No Capítulo 2, trata-se da gênese e aspectos históricos da regulação do transporte aquaviário e da atividade portuária. 3 Por fim, o Capítulo 3 discorre acerca da regulação da defesa da concorrência por meio do estudo da legislação competente para resguardar a eficiência da competitividade entre agentes econômicos dos setores de transportes aquaviários e portuário. No final, apresentam-se breves considerações conclusivas, além de destacar pontos relevantes para a elaboração do trabalho, estimulando à continuidade dos estudos. Para a presente monografia foi criada a seguinte hipótese: O estudo dos principais aspectos legais e econômicos que regulam o transporte aquaviário e a atividade portuária contribui para a efetividade da defesa da concorrência no setor portuário e aquaviário, e para a manutenção do mercado em equilíbrio através das agências reguladoras, evitando um mercado concentrado, que provoca falta de competição. Quanto à Metodologia 8 registra-se que, na fase de 9 investigação foi utilizado o método indutivo , na fase de tratamento dos dados o método cartesiano10 e, os resultados expressos na presente monografia são compostos na base lógica indutiva. 8 “(...) momento no qual o Pesquisador busca e recolhe os dados, sob a moldura do Referente estabelecido (...)”. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa Jurídica e Metodologia da Pesquisa Jurídica. 9. ed. Florianópolis: OAB-SC Editora e co-edição OAB Editora, 2005, p. 101. 9 “(…) pesquisar e identificar as partes de um fenômeno e colecioná-las de modo a ter uma percepção ou conclusão geral (…)”. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa Jurídica e Metodologia da Pesquisa Jurídica. 9. ed. Florianópolis: OAB-SC Editora e co-edição OAB Editora, 2005, p. 104. 10 Sobre as quatro regras do Método Cartesiano (evidência, dividir, ordenar, e avaliar). LEITE, Eduardo de Oliveira. A monografia jurídica. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, p. 2226. 4 Nas diversas fases da pesquisa, foram acionadas as técnicas do Referente11, da Categoria12, do Conceito Operacional13 e da Pesquisa Bibliográfica14. O estudo tenta, de forma simples e direta, não sobrecarregar o texto com excessivas referências às normas portuárias, busca abordar a regulação da defesa do transporte aquaviário, bem como da atividade portuária, de modo que contribua para o esclarecimento do presente trabalho, e incentive o aperfeiçoamento de parâmetros jurídicos para a execução dessas atividades. 11 “(...) explicitação prévia do(s) motivo(s), do(s) objetivo(s) e do produto desejado, delimitando o alcance temático e de abordagem para atividade intelectual, especialmente para uma pesquisa”. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa Jurídica e Metodologia da Pesquisa Jurídica. 9. ed. Florianópolis: OAB-SC Editora e co-edição OAB Editora, 2005, p. 62. 12 “(...) palavra ou expressão estratégica à elaboração e/ou expressão de uma idéia”. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa Jurídica e Metodologia da Pesquisa Jurídica. 9. ed. Florianópolis: OAB-SC Editora e co-edição OAB Editora, 2005, p. 31. 13 “(...) uma definição para uma palavra ou expressão, com o desejo de que tal definição seja aceita para os efeitos das idéias que expomos (...)”. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa Jurídica e Metodologia da Pesquisa Jurídica. 9. ed. Florianópolis: OAB-SC Editora e co-edição OAB Editora, 2005, p. 45. 14 “Técnica de investigação em livros, repertórios jurisprudenciais e coletâneas legais”. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa Jurídica e Metodologia da Pesquisa Jurídica. 9. ed. Florianópolis: OAB-SC Editora e co-edição OAB Editora, 2005, p. 239. 5 CAPÍTULO 1 CONCEITOS DO SISTEMA JURÍDICO DA ATIVIDADE PORTUÁRIA A presente monografia, dividida em três capítulos, objetiva estudar os principais aspectos legais e econômicos da legislação que regula o transporte aquaviário e a atividade portuária, bem como visa à aplicação dos dispositivos pertinentes para a execução da defesa da concorrência, e ao estímulo à competitividade nessas atividades. 1.1 PROBLEMA A edição da Lei n. 8.884, de 11 de junho de 1994, publicada no DOU em 13 de junho de 1994, que trata da defesa da concorrência, juntamente com a posterior criação da Agência Nacional de Transporte Aquaviário - ANTAQ pela Lei n. 10.233 editada em 05 de junho de 2001, que tem entre suas competências zelar pela aplicação da defesa da concorrência do transporte aquaviário e da atividade portuária, colocam a regulação do setor numa situação de debilidade institucional, acrescida da ineficácia dos mecanismos legais pertinentes, dentro de uma realidade que exige modernização e adequação desse sistema. 1.1.1 JUSTIFICATIVA É necessário aperfeiçoar o ambiente institucional no qual atua a ANTAQ especialmente no que tange à defesa da concorrência no setor de sua competência, a fim de evitar desequilíbrio provocado pelo mercado globalizado, e articular um método capaz de trazer para o conjunto da sociedade a perspectiva de uma economia equilibrada e competitiva. 1.2 CONCEITOS Neste subtítulo tratar-se-á de diferenciar regulação, regulamentação, dentre outras compreensão do aludido trabalho. categorias importantes para a melhor 6 1.2.1 REGULAÇÃO Não se deve confundir regulação com regulamentação. A origem dessa expressão vem da tradução do inglês de regulation. Dependendo do contexto, pode ser traduzida para o português como regulação ou regulamentação, mas no contexto das agências reguladoras, a expressão deve ser traduzida obrigatoriamente como regulação. Já a regulamentação é a tradução de outra expressão inglesa de rulemaking. Deste modo, Alexandre Santos de Aragão após analisar a diferença entre regulação e regulamentação, assim define regulação: “Conjunto de medidas legislativa, administrativas e convencionais, abstratas ou concretas, pelas quais o Estado, de maneira restritiva da liberdade privada ou meramente indutiva, determina, controla, ou influencia o comportamento dos agentes econômicos, evitando que lesem os interesses sociais definidos no marco da Constituição e orientando-os em direção socialmente desejáveis”.15 Assim entende-se que regulação é um conjunto de normas impostas pelo Estado que limita a liberdade de ação de escolha de empresas e profissionais liberais nos mais diversos campos de atividade. Dessa forma, o autor italiano Sérgio Fois ensina que “isso a que se quer aludir falando de regulação, afigura-se como fenômeno jurídico dificilmente enquadrável nas três tradicionais funções públicas”.16 Neste contexto, Sérgio Fois diagnostica que a utilização do vocábulo “regulation” revela a referência às funções governamentais que não se identificam nem com uma função normativa em sentido próprio, nem com função verdadeiramente jurisdicional, nem com atuação administrativa em sentido restrito. 15 ARAGÃO, Alexandre Santos de. O Conceito Jurídico de Regulação da Economia. Rio de Janeiro: Forense. 2001, p. 74. 16 FOIS, Sérgio. Servizi e Interessi tra Privatizzazionni e Regolazione Pubblica, em Diritto e Societa, vol. 1, Padova: Cedam, 2000, p. 27. 7 Justen Filho, buscando lições de Sérgio Fois, entende que regulação revela uma atuação governamental distinta das funções estatais clássicas, é, nem uma função normativa própria, tampouco função jurisdicional ou mesmo administrativa em sentido estrito, mas sim uma espécie de governo de setor.17 Diante destes conceitos, conclui-se que o termo regulação diz respeito a todo tipo de intervenção que o Estado faz na atividade econômica pública e privada, ora para controlar, ora para orientar o mercado, com objetivo de proteger o interesse público. 1.2.2 REGULAMENTAÇÃO A expressão “regulamentação” corresponde ao desempenho de função normativa infra-ordenada, pela qual se detalham as condições de aplicação de uma norma de cunho abstrato e geral. 18 Justen Filho, alude de forma semelhante, que a expressão regulamentação corresponderia “ao desempenho de função normativa infra-ordernada, pela qual se detalham as condições de aplicação de uma norma de cunho abstrato e geral”19, isto é, especificam-se as condições necessárias para dar eficácia a dispositivos que, pela sua amplitude de abrangência, o tornam difícil para ser aplicado a situações concretas. É nesta função reguladora (rulemaking) ou quase legislativa que reside o cerne das atribuições das agências independentes americanas. O interessante é que no exercício dessa função normativa elas agem ora como um típico Poder Regulamentar, ora adotam procedimentos mais comumente usados na prática do Poder Judiciário. 17 JUSTEN FILHO, Marçal. O Direito das agências reguladoras independentes. São Paulo: Dialética, 2002, p. 15. 18 GRAU, Eros Roberto. O Direito Posto e o Direito Pressuposto. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 186. 19 JUSTEN FILHO, Marçal. O Direito das agências reguladoras independentes. São Paulo: Dialética, 2002, p. 15. 8 Em princípio, o rulemaking das agências consiste em editar prescritive formulations ou lesgislatives rules, isto é, normas regulamentares das atividades incluídas no respectivo campo de especialidade, passando tais normas a ter força de lei, tanto para os agentes econômicos envolvidos quanto para os usuários dos respectivos serviços. Estas normas revestem-se de características que as aproximam das leis. De um lado, o seu descumprimento sujeita o infrator às mesmas conseqüências jurídicas previstas para a não observância das leis votadas pelo Congresso, como, por exemplo, o pagamento de pesadas multas. Por outro lado, tais normas são bem menos vulneráveis a ataques na via jurisdicional, eis que a tradição do direito público jurisprudencial norte-americano é de outorgar especializadas, ampla 21 deferência20 à expertise dos órgãos e entidades tais como as agências reguladoras. A regulamentação propicia a edição de atos de cunho normativo, que apresentam natureza derivada. Isto significa que o regulamento introduz inovação, mas compreendida no âmbito normativo produzido por um ato legislativo. O regulamento esclarece e complementa a lei, veiculando norma que estava implícita ou que se insere nos limites da lei.22 1.3 DEFESA DA CONCORRÊNCIA A competição reflete a disputa entre as empresas pela possibilidade de vender seus produtos para o maior número possível de clientes. É o principal mecanismo que uma economia de mercado possui para garantir o seu bom funcionamento. Em mercados competitivos, as empresas precisam manter baixos custos e margens de lucro, oferecer produtos de boa qualidade, e sempre inovarem e colocarem novos produtos a disposição dos consumidores. 20 Estudo realizado em 1990 mostrou que nos anos de 1986 e 1987 a Corte Suprema dos EUA validou 70% das decisões das agências. V. Steve Cann. Administrative Law. 2. ed., Sage Publications: London, 1998, p. 96. 21 SCALIA, Antonin. Judicial Deference to Administrative Interpretations of Law. In: Duke Law Journal, 1989, p. 511. 22 TÁCITO, Caio. Temas de direito público. Rio de Janeiro: Renovar, vol. 1, 1997 , p. 510. 9 Caso contrário, as empresas correm o risco de serem expulsas do mercado por concorrentes mais hábeis. No longo prazo, a disputa entre empresas em um mercado competitivo leva à maximização das eficiências alocativa, técnica e dinâmica, garantindo uma alocação ótima de recursos e o máximo de bem-estar social. Para que haja concorrência, é necessário que o mercado tenha um número suficientemente grande de produtores e consumidores de tamanhos não muito diferentes, agindo de forma independente. Isso faz com que nem vendedores, nem compradores tenham poder de mercado, não sendo capazes de determinar, de forma unilateral ou coordenada, as condições com que bens e serviços são comercializados no mercado em termos de preço, qualidade dos produtos e condições de venda. As empresas, naturalmente, prefeririam não ter competição, já que é esta quem impede o empresário de extrair lucros anormais, fixando preços acima do custo, ou de relaxar na busca permanente da eficiência. Por isso, é natural, buscar a neutralização da concorrência por meio do domínio do mercado ou mesmo da realização de acordos com objetivo de regular ou atenuar mutuamente as forças concorrenciais. Se possível todas as empresas sempre seriam monopolistas ou trabalhariam de forma concertada para reduzir a rivalidade entre elas. O objetivo final da política de defesa da concorrência é promover a eficiência econômica e o bem-estar social. Em geral, esse objetivo é tão ou mais facilmente atingido quanto mais atomizado for o mercado, seja pelo lado dos produtores, seja dos consumidores, e quanto mais independente for a atuação de cada um. Isso não se confunde com um regime laissez-faire para existir competição, é necessário que existam regras delimitando o que vale ou não na disputa entre empresas e, em especial, que se defenda a concorrência do esforço constante das empresas para reduzi-la. Do ponto de vista jurídico, deve-se distinguir livre mercado e livre concorrência. O conceito histórico de livre mercado – a entrada, permanência 10 ou saída do mercado, não se confunde com o princípio constitucional da ordem econômica, que celebra a livre concorrência como um dos pilares do Estado de Direito. A livre concorrência é a competição honesta, é a garantia de que todos têm direito de acessar o mercado. O artigo 170 da Carta de 1988 determina que: Art. 170 - A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios. VI – a livre iniciativa. Neste sentindo João Bosco Leopoldino, alude que “a liberdade de atuação no mercado, a livre concorrência, é a que mais interessa ao sistema econômico”. Ele define concorrência no mercado como a que “decorre de um conjunto de condições que permite a todos os agentes do mercado concorrer à compra e venda de forma que cada um possa alcançar seus objetivos sem ferir, desarrazoadamente, as metas pretendidas pelos demais”.23 A política de competição opera por meio de dois tipos de instrumentos. O primeiro é estabelecido de estruturas competitivas de mercado, impedindo o surgimento de empresas grandes o suficiente para deter poder de mercado. Tipicamente, as agências de defesa da concorrência fazem isso controlando os atos de concentração entre empresas. Complementarmente, as autoridades também proíbem certas condutas empresariais, tanto para impedir que um grupo de empresa aja de forma concertada para manipular condições de oferta, como ainda para impedir que uma empresa dominante abuse de sua posição para prejudicar concorrentes menores. Trata-se da repressão ao abuso de poder econômico ou do controle de condutas anticoncorrenciais. 23 LEOPOLDINO DA FONSECA, João Bosco. Lei de Proteção da Concorrência. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2001, p. 3. 11 A política de defesa da concorrência, assim como a regulação econômica, tem como objetivo final a promoção do bem-estar social. Freqüentemente, ainda que nem sempre, este é mais bem servido quando se estimula o máximo de competição no mercado. Há, porém, duas diferenças relevantes entre os dois tipos de política. Uma na qual nos setores regulados a competição é um instrumento auxiliar, mas não é o foco principal do trabalho do regulador, enquanto nos demais setores a situação se inverte. Outra que, em setores regulados, é necessário estar sempre buscando e promovendo oportunidades de aumentar a competição, ao passo que o trabalho das agências de defesa da concorrência, como diz o próprio nome, é mais reativo, voltado principalmente para impedir que os agentes econômicos dificultem o natural surgimento da competição.24 1.4 INFRA-ESTRUTURA PORTUÁRIA Base da atual regulação portuária, a Lei n. 8.630 regulamentada em 25 de fevereiro de 1993 – a Lei dos Portos, entre outras questões, veio regular a forma de exploração dos serviços portuários. Por esse instrumento legal é admitida a exploração das instalações portuárias nacionais para fins de uso público ou para uso privativo, e de turismo, para a movimentação de passageiros. No caso de exploração para uso privativo ela poderá ser exclusiva ou mista, sendo assegurado a todos os interessados o direito de construir, reformar, ampliar, arrendar e explorar instalações portuárias, dependendo para tanto de contrato de arrendamento ou de autorização de acordo com a sua localização. A Lei dos Portos não definiu sobre a figura do terminal portuário de uso público, tendo que ser criado a Lei n. 11.518/2007, que estabelece em seu artigo 4º, § 3º, que: 24 PINHEIRO, Armando Castelar. Direito, Economia e Mercados. Rio de Janeiro: Elsevier, 2005, p. 356 -357. 12 “A exploração de instalação portuária de uso público fica restrita a área do porto organizado ou a área de instalação portuária pública de pequeno porte”. As instalações de uso público estão localizadas dentro da área do porto organizado, e as de uso privativo podem localizar-se dentro ou fora do porto organizado. As referentes modalidades podem ser utilizadas para a movimentação de passageiros, ou armazenagem de mercadorias, destinados ou provenientes de transporte aquaviário.25 A Lei n. 8.630/93, em seu artigo 1º, dispõe que compete à União explorar, diretamente ou mediante concessão, o porto organizado. Deste modo, a União Federal é titular da exploração do porto organizado de forma direta ou, através de terceiros mediante concessão através de licitação. Salienta Castro Junior que: “a concessão não significa a substituição do Estado na função administrativa portuária, pois a administração estará sob a supervisão normativa do Estado”.26 Além da modalidade de uso público, na modalidade privada dos terminais portuários é possível o uso de instalações com finalidade exclusiva ou mista; na primeira, mediante contrato de arrendamento, movimenta-se carga própria do titular das instalações; na segunda, a movimentação envolve cargas de terceiros. A construção e a operação de terminais privativos de uso exclusivo ou misto submetem-se à prévia autorização do Poder Federal, por intermédio da Agência Nacional de Transportes Aquaviários – ANTAQ. 27 25 Lei n. 8.630, de 25 de fevereiro de 1993, artigo 1º, § 1º, inciso V. CASTRO JR. Osvaldo Agripino de (Org). Temas Atuais de Direito do Comércio Internacional. Florianópolis: Editora da OAB/SC, 2005, p. 177. 27 SOUZA JUNIOR, Suriman Nogueira de. Regulação Portuária – A Regulação Portuária dos Serviços Públicos de Infra-Estrutura Portuária no Brasil. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 24. 26 13 1.4.1 TERMINAIS PORTUÁRIOS DE USO PÚBLICO Não há definição formal sobre os terminais de uso público, podendo este ser interpretado conforme o artigo 4º, § 3º, da Lei n. 11.518/2007. “A exploração de instalação portuária de uso público fica restrita à área do porto organizado ou à área de instalação portuária pública e de pequeno porte.” Os terminais portuários de uso público estão localizados em áreas de Portos Organizados, sendo explorados diretamente pela União ou, nos termos da Lei de concessões e permissões de serviços públicos, ou por arrendatários. Os terminais de uso público são prestadores de serviço público e, como tal, sujeitos ao regime de direito público. Dessa maneira, estes terminais obedecem a contratos de concessão, precedidos de licitação (art. 4° da Lei n. 8.630/93). Os terminais de uso público enfrentam restrições tanto nos preços que praticam quanto nas quantidades que oferecem. No que se referem às quantidades, estes terminais estão obrigados a atender todos os consumidores de maneira isonômica, não podendo, recusar mercadorias de menor valor agregado. Neste sentido Carlos Augusto Lobo, ressalta: “Os terminais de uso público prestam serviços públicos, ou seja: a) seu objetivo primordial é suplementar os portos organizados na satisfação das necessidades da coletividade, quanto a serviços portuários; b) qualquer interessado tem o direito de utilizar-se do serviço, em igualdade de condições com os demais usuários; c) o titular de uso público tem a obrigação de colocar o serviço à disposição dos interessados de forma regular e contínua, sem discriminação entre os usuários; d) seus serviços devem ser remunerados mediante uma tarifa estabelecida pelo poder público, de aplicação geral; e) seus serviços estão sujeitos à fiscalização pelo poder concedente”.28 28 LOBO, Carlos Augusto Silveira. Os terminais portuários privativos na Lei 8.630/93. In: Revista de Direito Administrativo. Rio de Janeiro: Renovar, vol. 220, p. 28-29. 14 1.4.2 TERMINAIS PORTUÁRIOS DE USO PRIVATIVO O terminal portuário de uso privativo conforme o artigo 4º, § 2º, “a”, determina que se destine a movimentação de carga própria. A partir disso entende-se que os terminais de uso privativo exclusivo destinam-se à movimentação e armazenagem de carga própria, isso significa a vedação à sua implantação como instrumento de prestação de serviço público. A referência a carga própria indica que o terminal se destina a movimentação e armazenamento de cargas de titularidade de um único e mesmo sujeito. A exigência de carga própria, então, pressupõe que o terminal portuário não se destinará a atender ao mercado, prestando serviços ao público em geral. Atuará no interesse e para benefício de determinada empresa, a qual não necessitará recorrer aos préstimos de uso público. Poderão estar situados dentro ou fora da área do porto organizado. Os terminais privativos situados fora dessa área, dependerão de autorização da ANTAQ, que é considerada pelo artigo 6º da Lei n. 8.630/93, delegação, por ato unilateral, feita pela União à pessoa jurídica que demonstre capacidade para seu desempenho, por sua conta e risco. 1.4.3 TERMINAIS PORTUÁRIOS DE USO PRIVATIVO MISTO Pode-se inferir que o terminal de uso privativo misto é aquele que conjuga operações com cargas próprias e com cargas de terceiros. A exceção da movimentação de cargas de terceiros nada mais é que a previsão do aproveitamento econômico da capacidade ociosa dos terminais privativos. Essa situação é bem descrita por Carlos Augusto Silveira Lobo: “O terminal privativo é um verdadeiro estabelecimento da empresa a que pertence e integra sua atividade industrial ou comercial, até porque a finalidade precípua do terminal é a movimentação da carga própria, relacionada com o 15 empreendimento. A movimentação de carga de terceiros visa a ocupar a capacidade ociosa do terminal. O titular do terminal privativo desfruta da ampla liberdade de contratar a movimentação de cargas de terceiros, na medida em que possa preencher a capacidade ociosa de suas instalações portuárias e na medida em que seus serviços satisfizerem às pretensões dos terceiros. Distingui-se, assim, do serviço público portuário que, quando prestado por particulares, depende de delegação do poder público e se sujeita aos controles administrativos próprios”. 29 A Resolução n. 517/2005, estipula condições para a outorga de autorização para os terminais de uso privativo misto. Esta Resolução estabelece condições objetivas para a efetiva configuração do uso privativo misto. Prevê que o interessado na autorização deve comprovar, por meio de estudo técnico, que a carga própria que pretende movimentar no terminal privativo é suficiente para o retorno do investimento, ou seja, que essa declaração de carga própria a ser movimentada no terminal privativo não é mero pretexto ou promessa insubsistente. Exige ainda, que o interessado declare as cargas de terceiros que eventualmente pretende movimentar, utilizando a capacidade ociosa de suas instalações. Com este procedimento, busca impedir que os terminais de uso privativo misto transformem-se, na realidade, em terminais de uso público não sujeitos às obrigações e aos controles do regime público. 1.5 DESCENTRALIZAÇÃO DE AÇÕES Uma das mais importantes diretrizes gerais do gerenciamento da infra-estrutura portuária é a descentralização das ações, promovendo sua transferência: a) a outras entidades públicas; ou b) a empresas 29 SILVEIRA LOBO, Carlos Augusto. Os terminais portuários privativos na Lei n. 8.630/93, p. 28. 16 públicas ou privadas. No primeiro caso, mediante convênios de delegação e, no segundo, mediante outorgas de concessão, autorização ou permissão. 30 1.5.1 CONCESSÕES Segundo ensinamento de Celso Antônio Bandeira de Mello: “Concessão de serviço público é o instituto através do qual o Estado atribui o exercício de um serviço público a alguém que aceita prestá-lo em nome próprio por sua conta e risco, nas condições fixadas e alteráveis unilateralmente pelo Poder Púbico, mas sob garantia contratual de um equilíbrio econômicofinanceiro, remunerando-se pela própria exploração do serviço, em geral e basicamente mediante tarifas cobradas diretamente dos usuários dos serviços”.31 A concessão de serviços e de uso de bens públicos é, constitucional e doutrinariamente, um contrato administrativo, destinado a transferir a particulares certas atividades reservadas à Administração Pública. O regime concessional se formaliza por meio de um contrato administrativo, no qual são estabelecidas as obrigações do contratante privado, de forma a satisfazer o interesse público. 1.5.2 PERMISSÕES O regime permissional é classicamente o vínculo produzido por ato administrativo unilateral, discricionário e precário, revogável a qualquer tempo, gratuito ou oneroso, pelo qual a Administração Pública faculta ao particular a execução de serviço público ou a utilização privativa de bem público por terceiros, em face de interesse particular, desde que não contrarie o interesse público. 30 Art. 12, caput, inciso I, da Lei n. 10.233/2001. BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo. 17. ed. São Paulo: Malheiros, 2004, p. 652. 31 17 Valemo-nos das palavras de Celso Antônio Bandeira de Mello, “permissão é ato unilateral e precário, intuitu personae, através do qual o Poder Público transfere a alguém o desempenho de um serviço de sua alçada, proporcionando à moda do que faz na concessão, a possibilidade de cobranças de tarifas dos usuários”.32 1.5.3 AUTORIZAÇÕES Para Di Pietro o ato que autoriza ao particular a exploração do serviço inexiste como delegação de serviço público prestado ao público, pois, na autorização, o serviço é prestado no interesse exclusivo do particular.33 O ato de autorização independe de processo licitatório, sendo a autorização portuária exercida em liberdade de preços de serviços, tarifas e fretes, em ambiente de livre competição, não sendo estipulado prazo de vigência ou termo final, e extiguindo-se pela sua própria eficácia, por renuncia, anulação ou cassação.34 Assim, é clara a conclusão que na autorização o serviço prestado é de interesse do particular. 1.6 CADE – LEGISLAÇÃO DE DEFESA DA CONCORRÊNCIA Há várias décadas o Brasil tem dispositivos legais de defesa da concorrência. Na década de 1930, criaram-se dispositivos legais com vistas a proteger a economia popular, e na Constituição Federal de 1946, no seu artigo 148, a defesa da concorrência aparece explicitamente como um objetivo a ser perseguido pelo governo: “A lei reprimirá toda e qualquer forma de abuso do poder econômico, inclusive as uniões ou agrupamentos de empresas 32 BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo. 17. ed. São Paulo: Malheiros, 2004, p. 701-702. 33 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 14. ed. São Paulo: Atlas, 2002, p. 218. 34 MEDAUAR, Odete. A figura da concessão. In: Concessão de serviço público. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995, p. 16. 18 individuais ou sociais, seja qual for a sua natureza, que tenham por fim dominar os mercados nacionais, eliminar a concorrência e aumentar arbitrariamente os lucros”. Apenas em 1962, porém, esse artigo seria regulamentado, pela Lei n. 4.137, que criou o Conselho Administrativo de Defesa Econômica – CADE e tipificou com maior detalhe o abuso do poder econômico que deveriam ser punidos, e instituiu os procedimentos a serem seguidos nas averiguações, entre outras disposições. Definiu-se como abuso de poder econômico a monopolização e a eliminação da concorrência via acordos entre empresas, fusões e aquisições; a criação de barreiras à entrada ou ao desenvolvimento de concorrentes; o exercício do poder de monopólio; a exigência de exclusividade para propaganda; e a combinação prévia entre participantes de concorrências públicas. Um aspecto importante dessa lei era atribuir ao CADE a responsabilidade de fiscalizar a conduta das empresas, fazer averiguações, instaurar processos, julgar casos e, quando necessário, ordenar as providências cabíveis. O CADE pode ser dividido em três grandes fases. A primeira, que se dá desde a sua fundação em 1962, no governo João Goulart (momento conturbado na história brasileira) até 1991. Nesse período o CADE permaneceu praticamente inativo, com poucas e parcas realizações, tendo se prestado muito mais a ser instrumento do Estado em ações demagógicas de combate a crimes contra a economia popular e contra o desabastecimento de determinados produtos essenciais (em razão dos constantes tabelamentos de preços) do que efetivamente a defender a livre concorrência. O segundo período que compreende a edição da Lei n. 8.158, de 8 de janeiro de 1991, até 1994. Nessa grande fase, o Executivo alardeou a abertura do mercado e a liberalização dos mercados, mas o CADE 19 acabou servindo principalmente como instrumento de ameaça e de retaliação contra determinados setores da economia. Essa segunda fase terminou com a edição, em 1994, da atual Lei n. 8.884, verdadeiro marco legal que transformou o CADE em Autarquia35, de forma que passa a ser órgão que administra a si mesmo e possui determinadas prerrogativas de autonomia – característica de ente administrativo que estabelece regras para si mesmo. Nesta terceira fase, o CADE se apresenta como uma autarquia federal criada em 1962, e vinculada ao Ministério da Justiça, com jurisdição nacional e sediada no Distrito federal. Cabe-lhe fiscalizar o abuso do poder econômico, tutelando a sua apuração e repressão, quando este for verificado. Sua instância superior é o Plenário, composto por sete membros, sendo um presidente e seis conselheiros, todos indicados e nomeados pelo Presidente da República após aprovação do Senado Federal, para um mandato fixo de dois anos, com direito a uma recondução. O CADE tem uma procuradoria, responsável por prestar assessoria jurídica, defendê-lo em juízo e promover a execução judicial de suas decisões. O Procurador-Geral é indicado pelo Ministro da Justiça e nomeado pelo Presidente da República, depois de aprovado pelo Senado Federal, e aplicandose a ele as mesmas regras que aos conselheiros. O Procurador-Geral participa das reuniões do CADE, mas não tem direito a voto. Junto ao CADE também funciona um representante do Ministério Público Federal. O Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência (SBDC), por intermédio do CADE, interage com o Ministério Público Federal (MPF). Este pode oficiar processos contra infrações da ordem econômica sujeitos à apreciação do CADE. Por outro lado, o CADE poderá acionar o MPF para que este promova a execução de suas decisões e dos compromissos de cessação, e a 35 Autarquias “pessoas jurídicas de direito público interno criado por lei da União, Estado ou município para a consecução de determinados serviços públicos específicos, delegados pelo Estado com capacidade de autogovernarem-se”. CRETELLA JUNIOR, José. Curso de Direito Administrativo de acordo com a Constituição vigente. Rio de Janeiro: Forense, 1995, p. 44. 20 adoção de medidas judiciais cabíveis. O Ministério Público Federal também pode participar, junto com a Polícia Federal, do combate aos cartéis, tipificados pela Lei n. 8.137, em seu artigo 4º, inciso I, item a, como crime contra ordem econômica.36 “Constitui crime contra ordem econômica abusar do poder econômico, dominando o mercado ou eliminando, total ou parcialmente, a concorrência mediante ajuste ou acordo de empresas”. Nos casos de deficiência de concorrência, surgiu a necessidade da intervenção de autoridades competentes que imponha aos agentes econômicos a observância de ações e omissões necessárias à obtenção de resultados eficientes que tornem a concorrência perfeita. Assim, fixada a necessidade de aplicar a defesa da concorrência e, após abordar a importância da modernização e adequação do sistema portuário com a finalidade de atender ao interesse público, é relevante estudar a evolução histórica da regulação do transporte aquaviário e da atividade portuária, objeto de investigação do próximo capítulo. 36 PINHEIRO, Armando Castelar. Direito, Economia e Mercados. Rio de Janeiro: Elsevier, 2005, p. 381-389. 21 CAPÍTULO 2 CONTEXTUALIZAÇÃO DO TRANSPORTE AQUAVIÁRIO E DA ATIVIDADE PORTUÁRIA Neste capítulo, analisar-se-á a origem e evolução do transporte aquaviário e da atividade portuária, observando que a regulação portuária comporta uma categoria de entes reguladores que não encontra paralelo em outros ordenamentos setoriais no Brasil. 2.1 ASPECTOS HISTÓRICOS DA REGULAÇÃO De criação estrangeira, a regulação surgiu na Inglaterra, a partir da criação, pelo Parlamento no ano de 1834, de diversos entes autônomos, objetivando aplicar e concretizar medidas previstas em lei e para decidir controvérsias resultantes desses textos, sendo depois apropriado juridicamente pelos Estados Unidos.37 Depois sofre influência inglesa e, a partir de 1887, tem início a proliferação de agencies para regulação de atividades, imposição de deveres na matéria e aplicação de sanções. Na França, as Autoridades Administrativas, embora sem personalidade jurídica e sujeitas à fiscalização do Conselho do Estado, marcam também um propósito de neutralidade política. De acordo com Conrado Hubner Mendes, a história das agências reguladoras nos Estados Unidos foi marcada por quatro fases. O nascimento desse modelo de regulação deu-se em 1887, quando se verificou a necessidade de se conferir uma resposta reguladora às disputas que estavam a ocorrer entre as empresas de transporte ferroviário que procuravam obter o lucro máximo nas tarifas que livremente estipulavam, e os fazendeiros do Oeste, que atuaram como grupo de pressão sobre as Assembléias Estaduais, obtendo que fossem reguladas, legislativamente, as tarifas ferroviárias e o preço de armazenagem de cereais. 37 MORAES, Alexandre de. Agências Reguladoras. São Paulo: Atlas, 2002, p. 24. 22 Nesse ano, criou-se então a ICC – Interstate Commerce Comission e, um pouco mais tarde, a FTC – Federal Trade Comission, destinada a controlar condutas anticompetitivas de empresas e corporações monopolistas. Numa segunda fase, localizada entre os anos 1930 e 1945, a economia norte-americana, abalada por uma forte crise, foi socorrida por uma irrupção de inúmeras agências administrativas que, como parte da política do New Deal, liderada pelo Presidente Roosevelt, intervieram fortemente na economia. Tal intervenção, suprimindo os princípios básicos do Liberalismo e conferindo ampla autonomia a tais agências administrativas, foi motivo de um início de debate constitucional-jurisprudencial substancioso. O terceiro momento, entre 1945 e 1965, foi marcado pela edição de uma lei geral de procedimento administrativo (APA – Administrative Procedural Act), que trouxe uniformidade no processo de tomada de decisões pelas agências conferindo-lhes maior legitimidade. Na década de 1960 defrontou-se o sistema regulatório americano com um problema que desvirtuou as finalidades da regulação desvinculada do poder político: a captura das agências reguladoras pelos agentes econômicos regulados. Assim os agentes privados, com seu colossal poder econômico e grande poder de influência, diante de entes reguladores que dispunham de completa autonomia perante o poder político, não encontraram dificuldades para implantar um mecanismo de pressão que acabasse por quase determinar o conteúdo da regulação que iriam sofrer. Os maiores prejudicados, por conseqüência, foram os consumidores. Finalmente, em 1985, num processo que continua até os dias de hoje, o modelo começou a se redefinir para que se consolide um modelo regulatório independente, mas com os controles externos adequados para garantir essa independência.38 38 SUNDFELD, Carlos Ari. Direito Administrativo Econômico. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 120-121. 23 2.2 ORIGEM E EVOLUÇÃO DA REGULAÇÃO DO TRANSPORTE AQUAVIÁRIO NO BRASIL As primeiras concessões para a construção de portos no Brasil ocorreram no final do século XIX e início do século XX, e pode ser dividida em cinco fases em relação à trajetória do transporte aquaviário. A primeira fase ocorreu até 1967 onde foram criadas a Comissão de Marinha Mercante (CMM) em 1941; e a Taxa de Renovação da Marinha Mercante em 1958; editada a Resolução n. 2.995/67 da CMM, estabelecendo igualdade de participação entre armadores nacionais e dos países importador e exportador. Além disso, foram feitos o I e II Plano de Construção Naval (PCN), que expandiu os estaleiros nacionais. A segunda fase deu-se entre os anos de 1967 a 1984. Em 1969 foram adotadas medidas de reserva de carga à bandeira brasileira (carga prescrita) Decretos – Lei n. 666 e 687; foi criada a exclusividade da cabotagem para armadores brasileiros e feita a abertura do transporte marítimo de longo curso à iniciativa privada, com a entrada de empresas brasileiras nas conferencias de fretes e assinatura de acordos bilaterais. A terceira fase aconteceu entre o período de 1984 a 1990 onde surgiu uma política protecionista bem como a edição da Resolução SUNAMAM n. 8.364/84, os fretes eram elevados e encareciam o comércio exterior, o que causou a perda de competitividade das empresas brasileiras, que passaram a atuar com empresas estrangeiras. Nesse período houve grande redução de frota mercante nacional. A quarta fase ocorreu entre 1991 a 2001. Em 1991 houve a desregulação total do tráfego, por meio de Portaria do Ministério dos Transportes n. 07/91, que extinguiu as cotas das empresas brasileiras financiadas pelo governo e liberou a operação em qualquer tráfego, bem como a navegação turística de cabotagem (EC n. 07/1995). Ressalta-se que, em 1993 foi editada a Lei n. 8.630 – Lei de Modernização dos Portos, e em 1997 foi editada a Lei n. 9.432 que ordena o tráfego aquaviário no Brasil. Na sua quinta fase entre o período de 2001 a 2008, deu-se a 24 criação da ANTAQ e da Secretaria Especial dos Portos, criada pela MP n. 369 de 2007, convertida na Lei n. 11.118, de 5 de setembro de 2007. Essa lei incluiu dispositivos na Lei n. 10.683, de 28 de maio de 2003, dentre os quais o artigo 24 A, que trata da competência da Secretaria Especial de Portos (SEP). Além disso, deve-se mencionar a proposta da emenda à Constituição (PEC) n. 81, de 2003, de autoria do Senador Tasso Jereissatti que estabelece princípios da atividade regulatória. 39 Somente em 2001 foi editada a Lei n. 10.233, que criou a Agência Nacional de Transportes Aquaviários, responsável entre outras atribuições pela regulação das atividades de 37 portos públicos existentes, e editada antes dela a Lei n. 8.630/93, lei que regula a atividade portuária, ocasionando então problemas para aplicação da legislação do setor. 2.3 REGULAÇÃO DO SISTEMA DE TRANSPORTES Como preconizado constitucionalmente, a atividade econômica é instrumento para a obtenção do desenvolvimento nacional, pelo qual se busca atingir o pleno emprego, o respeito à dignidade da pessoa humana e o bem-estar da população. Esses objetivos republicanos legitimam a intervenção do Estado, sempre direcionada no sentido do atendimento dos interesses públicos, restringindo ou ampliando a liberdade de iniciativa dos agentes econômicos nacionais.40 De fato, essa intervenção é um importante instrumento de promoção do desenvolvimento econômico e social, expressa pela formulação de políticas públicas gerais e setoriais refletindo o conteúdo programático de um governo. É, exatamente, a implementação dessas políticas públicas que, no campo da ação exclusiva do Estado, direcionam as ações regulatórias, dimensionando a liberdade empresarial em face do interesse coletivo. 39 CASTRO JUNIOR, Osvaldo Agripino de. A regulação dos transportes aquaviários e portos nos Estados Unidos e Brasil. Revista Portos e Navios, dez 2007, p. 40-44. 40 Art. 3º da Constituição Federal do Brasil. 25 A Lei n. 10.233, de 5 de junho de 2001, com as alterações introduzidas pela Medida Provisória n. 2.217-3, de 4 de setembro de 2001, ao dispor sobre a reestruturação dos transportes aquaviário e terrestre, conforme previsão constitucional, reorganizou o gerenciamento do Sistema Federal de Viação, disciplinando a prestação de serviços de transportes e criando o Conselho Nacional de Integração de Políticas de Transportes – CONIT, o Departamento Nacional de Infra-Estrutura de Transportes – DNIT, a Agência Nacional de Transportes Terrestres – ANTT e a Agência Nacional de Transportes Aquaviários – ANTAQ. 2.4 INTERVENÇÃO REGULATÓRIA As características sociais e econômicas do país tornam irrenunciável o dever da implementação de programas desenvolvimentistas de governos, nos quais, sempre que possível, a forma de intervenção do Estado no domínio econômico deixe de ser a empresarial e seja a de eminentemente regulador, buscando o desenvolvimento dos setores produtivos nacionais. Isso ocorre mediante a aplicação de instrumentos e mecanismos de regulação adequados à nossa realidade, equilibrando os interesses públicos e privados relacionados à prestação de serviços públicos, notadamente os relativos à infra-estrutura dos transportes aquaviários. A noção de serviço público situa-se numa área, nem sempre clara, entre o direito público e o privado. É dentro desse espaço limítrofe que, elasticamente, a estrutura prestacional dos serviços públicos se ajusta as mudanças técnicas e econômicas de uma sociedade, condicionando à extensão do papel do Estado na economia. Essa dinâmica de ordem econômica impulsiona a evolução do direito, vinculando-a as necessidades econômicas de um período temporal. A realidade de determinados segmentos econômicos estratégicos brasileiros mostra que, mesmo com o reforço do perfil regulatório do Estado e a ampliação do espaço de atuação da iniciativa privada, a intervenção estatal setorial é inevitável. 26 Esta é a situação do Sistema Portuário Nacional, onde as tipicidades dos monopólios naturais e legais levam o Estado a intervir, aplicando os meios disponibilizados pelo ordenamento econômico visando à consecução do desenvolvimento setorial. Em razão da sua importância estratégica, os portos brasileiros sempre estiveram submetidos à intervenção estatal independente da organização política do país. Essa intervenção não foi o resultado de uma estratégia de governo cuidadosamente concebida, ao contrário, foi o resultado de numerosas circunstâncias políticas e econômicas que levaram o Estado brasileiro a ampliar ou restringir sua atuação interventiva.41 Assim, é expressa a presença do Estado pelo exercício de atividade econômica de interesse público, prestando serviço de infra-estrutura portuária, porquanto é assegurada constitucionalmente à União a competência para explorar esses serviços, quer diretamente ou mediante concessão, autorização ou permissão.42 2.5 REGULAÇÃO DO MONOPÓLIO Durante todo o século XX, o Brasil regulou a exploração de seus monopólios naturais sem dispor de órgãos reguladores independentes. Com a liberalização da exploração desses monopólios para a iniciativa privada, tornouse clara a necessidade da instituição de um novo modelo regulatório, dotando o Estado de instrumentos que o tornassem mais eficiente no desempenho de suas funções. A regulação dos serviços públicos é uma forma de intervenção econômica setorial que adquiriu relevância a partir da implementação dos processos de desestatização empresarial. Antes desses processos, a intervenção econômica setorial era operada por intermédio das próprias empresas controladas pelo Estado. 41 S0UZA JUNIOR, Suriman Nogueira de. Regulação Portuária – A Regulação Jurídica dos Serviços Públicos de Infra-Estrutura Portuária no Brasil. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 27 – 28. 42 S0UZA JUNIOR, Suriman Nogueira de. Regulação Portuária – A Regulação Jurídica dos Serviços Públicos de Infra-Estrutura Portuária no Brasil. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 30. 27 Exemplificando, tem-se a atuação da extinta Empresa de Portos do Brasil S/A – Portobrás, controladora do sistema portuário nacional, que tinha entre suas finalidades a realização de atividades vinculadas à construção, administração e exploração dos portos e vias navegáveis, exercendo a supervisão, orientação, coordenação, controle e fiscalização sobre tais atividades. Conforme Bilac Pinto, se a economia e as técnicas de prestação dos serviços de utilidade pública permitissem a sua exploração num ambiente aberto de competição, a regulação desses serviços seria dispensável, porque “a concorrência cindiria o poder das empresas em luta, e conduziria tanto ao baixo nível das tarifas como aos altos padrões dos serviços”.43 Contudo, se tais serviços só podem ser economicamente prestados em regime de monopólio, surge à necessidade de encontrar um meio que supra o fator de equilíbrio das tarifas e da qualidade dos serviços; surge a regulação da prestação dos serviços como forma de manter o equilíbrio sistemático de determinado mercado. A regulação dos monopólios naturais é expressa pela utilização do poder legítimo e coativo do Estado objetivando alcançar fins sociais, que de outra forma não seriam alcançados, ampliando-se o acesso aos bens e serviços socialmente desejados a um menor custo ou melhores preços, corrigindo as falhas de mercado ou problemas de informação, típicos dos monopólios naturais, como o portuário. No segmento portuário, a regulação exercida pela ANTAQ, criada pela Lei n. 10.233, de 05 de junho de 2001, com as alterações introduzidas pela Medida Provisória n. 2.217-3, de 04 de setembro de 2001, justifica-se como forma de atendimento a determinados grupos sociais, cujos interesses demandam a prática regulatória num ambiente monopolizado, podendo esses principais grupos sociais serem caracterizados em três blocos: o dos empresários privados, com maior poder de influência; o dos usuários da infra-estrutura portuária, que dão 43 PINTO, Bilac. Regulamentação efetiva dos serviços de utilidade pública. 2. ed. atualizada. por Alexandre Santos de Aragão. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 201. 28 o necessário apoio social aos reguladores; e os próprios reguladores, buscando aumentar seu poder político e social.44 Como podemos observar no atual sistema regulatório brasileiro, a ANTAQ assume importante papel, especificamente quando se tem como propósito estimular a concorrência num ambiente monopolizado 45 naturalmente , caso da infra-estrutura portuária brasileira, que por suas características não abriga a possibilidade de atuação de vários agentes submetidos aos princípios constitucionais da livre concorrência e da competição. A agência, enquanto referência regulatória do setor é o espaço no qual as relações entre o Direito e a Economia devem coexistir de forma equilibrada, onde a propriedade e a iniciativa privada deparam-se com os interesses nacionais. A regulação do monopólio portuário deve ser norteada pela capacidade de interpretação das transformações econômicas e sociais, aplicandose os instrumentos normativos ajustados à função social que lhe cabe desempenhar, sem que isso signifique uma distorção influenciada por finalidades político-partidárias, ou por resultados econômicos imediatos.46 Além de ser um monopólio natural, a prestação de serviços públicos de infra-estrutura portuária é um monopólio legal. Assim, a função regulatória assume destacado papel, impedindo a conduta abusiva por parte do monopolista, cabendo à entidade reguladora orientar a formação do segmento, bem como, intervir sempre que não houver consenso entre os agentes econômicos que participem da atividade regulada, e impedir que os portos, antes um monopólio estatal, transformem-se num monopólio privado. supervisionando e Origina-se disso fiscalizando, a o dever da implementação ANTAQ das de regular, políticas públicas garantidoras do acesso ao serviço de infra-estrutura portuária a todos os agentes econômicos integrantes da cadeia produtiva nacional, impedindo que os portos figurem como ponto de estrangulamento, tanto operacional como financeiro, 44 LASHERAS, Miguel Angel. La regulación econômica de los servicios publicos. Barcelona: Ariel, 1999, p. 2. 45 Monopólio natural se configura em atividade econômica, cujo exercício pressupõe elevados custos fixos, com rentabilidade decrescente em função da economia de escala. Isso significa que a duplificação de uma infra-estrutura reduzirá a eficiência econômica da exploração. 46 GOMES, Orlando; VARELA, Antunes. Direito Econômico. São Paulo: Saraiva, 1977, p. 15. 29 dificultando a capacidade de comercialização de bens e o transporte de pessoas.47 2.6 SISTEMA NACIONAL DE VIAÇÃO – SNV Os portos brasileiros integram o Sistema Nacional de Viação – SNV, que é constituído pela infra-estrutura viária e pela estrutura operacional dos diferentes meios de transporte de pessoas e bens, sob jurisdição da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Sob a jurisdição da União está a malha viária nacional, formada por eixos e terminais relevantes do ponto de vista da demanda de transporte, da integração nacional e das conexões internacionais, estando compreendido no SNV os elementos físicos da infra-estrutura viária existente e planejada, definidos pela legislação vigente.48 Os objetivos essenciais do SNV são: a) dotar o país de infra-estrutura viária adequada; b) garantir a operação racional e segura dos transportes de pessoas e bens; e c) promover o desenvolvimento social e econômico e a integração nacional.49 Como base conceitual para a implementação dos objetivos do SNV é definido como infra-estrutura viária adequada aquela que torna mínimo o custo total do transporte, este entendido como a soma de custos de investimentos, de manutenção e de operação dos sistemas. Por operação racional e segura, temos aquela que se caracteriza pela gerência eficiente das vias, dos terminais, dos equipamentos e dos veículos, para fim de garantir a segurança e a confiabilidade dos transportes.50 47 NUSDEO, Ana Maria de Oliveira. A regulação e o direito de concorrência. In: Direito administrativo econômico. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 171. 48 Art. 3º da Lei n° 10.233, de 5 de junho de 2001. 49 Art. 4º da Lei n° 10.233, de 5 de junho de 2001. 50 Art. 4º, §§ 1° e 2° da Lei n° 10.233, de 5 de junh o de 2001. 30 2.7 SECRETARIA ESPECIAL DE PORTOS Objetivando priorizar as ações necessárias para maior eficiência e eficácia na formulação de políticas e diretrizes para o desenvolvimento do setor de portos marítimos e promover a execução e a avaliação de medidas, programas e projetos de apoio ao desenvolvimento da infra-estrutura portuária marítima e dos portos outorgados às companhias docas, foi instituída a Secretaria Especial de Portos da Presidência da República, pela Lei n. 11.518, de 5 de setembro de 2007. Além desses objetivos, cabe a essa Secretaria a participação no planejamento estratégico do setor de portos marítimos e da infraestrutura portuária marítima, a aprovação dos planos de outorgas e o desenvolvimento da infra-estrutura dos portos sob sua esfera de atuação, visando a segurança e a eficiência do transporte aquaviário de cargas e de passageiros. Para tanto, foi observado o marco regulatório do setor, mantidas integralmente as competências da Agência Nacional de Transportes Aquaviários – ANTAQ. As alterações na Lei n. 10.233, de 5 de junho de 2001, resumiram-se a transferir do Ministério dos Transportes para a Secretaria Especial de Portos as competências básicas relativas à infra-estrutura portuária marítima e aos portos outorgados às companhias docas, bem como incluir Secretaria Especial de Portos Conselho Nacional de Integração de Políticas de Transporte – CONIT. Além disso, a Secretaria Especial de Portos foi incluída no Conselho Diretor do fundo de Marinha Mercante – CDFMM. Visando a focalização e a priorização do desenvolvimento da infra-estrutura portuária, essas alterações legais visaram assegurar a integração dos diversos modais de transporte. Assim, continuou o Ministério dos Transportes responsável pela formulação da política relacionada à Marinha Mercante, vias navegáveis e portos fluviais e lacustres. 31 Com essas medidas buscou-se dotar o setor portuário de um órgão especializado, voltado para o seu desenvolvimento, viabilizando a ação governamental, em articulação com a sociedade, para incremento da infraestrutura portuária marítima e dos portos outorgados às companhias docas, contribuindo para a manutenção e o aumento das exportações brasileiras, bem como para a ampliação de sua competitividade. Com exceção das matérias relacionadas às Companhias Docas, ao Ministério dos Transportes passaram a competir as matérias ligadas à política nacional de transportes ferroviário, rodoviário e aquaviário; à marinha mercante, vias navegáveis e portos fluviais e lacustres; e a participação na coordenação dos transportes aeroviários e serviços portuários. À Secretaria Especial de Portos compete assessorar direta e imediatamente o Presidente da República na formulação de políticas e diretrizes para o desenvolvimento e o fomento do setor de portos e terminais portuários marítimos e, especialmente, promover a execução e a avaliação de medida, programas e projetos de apoio ao desenvolvimento da infra-estrutura e da superestrutura dos portos e terminais portuários marítimos, bem como dos outorgados às companhias docas, competindo-lhe: a) a formulação, coordenação e supervisão das políticas nacionais; b) a participação no planejamento estratégico, o estabelecimento de diretrizes para sua implementação e a definição das prioridades dos programas de investimentos; c) a aprovação dos planos de outorgas; d) o estabelecimento de diretrizes para a representação do Brasil nos organismos internacionais e em convenções, acordos e tratados referentes às suas competências; e e) o desenvolvimento da infra-estrutura e da superestrutura aquaviária dos portos e dos terminais portuários sob sua esfera de atuação, visando à segurança e a eficiência do transporte aquaviário de cargas e de passageiros. Para a Secretaria Especial de Portos foram transferidas as competências relativas a portos marítimos, portos de vias interiores, portos outorgados ou delegados e aos diversos segmentos e modalidades de navegação, estabelecidas em leis gerais ou específicas ao Ministério dos 32 Transportes e ao Departamento Nacional de Infra-Estrutura de Transportes – DNIT. 2.8 COMPETÊNCIAS DA AGÊNCIA REGULADORA – ANTAQ O órgão regulador da atividade portuária no Brasil é a Agência Nacional de Transportes Aquaviários (ANTAQ), que foi criada pela Lei n. 10.233, de 05 de junho de 2001, cujo regulamento está previsto no Anexo I do Decreto n. 4.122, de 13 de fevereiro de 2002: Art. 1º - A Agência Nacional de Transportes Aquaviários – ANTAQ, criada pela Lei n. 10.233, de 05 de junho de 2001, tem sede e foro no Distrito Federal, com personalidade jurídica de direito público, submetida ao regime autárquico especial e vinculada ao Ministério dos Transportes, com a qualidade de órgão regulador das atividades portuárias e de transporte aquaviário.51 Aragão, sobre as agências reguladoras brasileiras, sustenta que “são autarquias de regime especial, dotadas de considerável autonomia frente à Administração Central do Estado”.52 Assim, a ANTAQ é vinculada, porém não subordinada ao Ministério dos Transportes, com regime autárquico especial, e possui independência administrativa, autonomia financeira, e mandado de quatro anos de seus dirigentes. A Agência tem por objetivos, in verbis: a) implementar as políticas formuladas pelo Governo; b) regular ou supervisionar as atividades de prestação de serviços e de exploração da infra-estrutura de transportes, de forma a garantir a movimentação de pessoas e bens, em cumprimento a padrões de eficiência, segurança, conforto, regularidade, pontualidade e modicidade nos fretes e tarifas; e c) harmonizar, preservando o interesse público, os objetivos dos 51 Art. 1º do Anexo I do Decreto n. 4.122, de 13 de fevereiro de 2002. ARAGÃO, Alexandre Santos de. Agências Reguladoras e a Evolução do direito administrativo econômico. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 275. 52 33 usuários, arbitrando conflitos de interesses e impedindo situações que configurem competição imperfeita ou infração da ordem econômica.53 Pode-se afirmar que as competências complexas das quais as agências reguladoras independentes são dotadas, fortalecem o Estado de Direito, vez que, ao retirar do emaranhado das lutas políticas a regulação de importantes atividades sociais e econômicas, atenuando a concentração de poderes na Administração Pública Central, alcançam, com melhor proveito, o escopo maior, não meramente formal, da separação de poderes. Assim, garante-se eficazmente a segurança jurídica, a proteção da coletividade dos indivíduos empreendedores de tais atividades ou por elas atingidos, mantendo-se sempre a possibilidade de interferência do Legislador, seja para alterar o regime jurídico da agência reguladora, ou mesmo para extinguila.54 Entre as competências da ANTAQ, estão: a) elaborar e editar normas e regulamentos relativos à exploração da infra-estrutura portuária; estabelecer normas e padrões a serem observados pelas autoridades portuárias, nos termos da Lei n. 8.630; b) celebrar atos de outorga de permissão ou autorização de prestação de serviços de transportes pelas empresas de navegação; c) controlar, acompanhar e proceder à revisão e ao reajuste de tarifas, nos casos de serviços públicos de transporte de passageiros; d) julgar as licitações e celebrar os contratos de concessão para exploração dos portos organizados, nos termos da Lei n. 8.630; e) adotar normas e procedimentos no sentido de que a exploração da infra-estrutura e a prestação de serviços de transporte se exerçam de forma adequada, satisfazendo as condições de regularidade, eficiência, segurança, atualidade, generalidade, cortesia na prestação do serviço, e modicidade nas tarifas. Cabe à ANTAQ, como agência reguladora apta a exercer intervenção no domínio econômico aquaviário, reger-se pelos atributos da 53 ANTAQ. Regimento interno, art. 3º aprovado pela Resolução n. 646, de 06.10.2006 (alterado pela Resolução n. 1021, de 24.04.2008. 54 ARAGÃO, Alexandre Santos de. Agências Reguladoras e a Evolução do direito administrativo econômico. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 376. 34 regulação de monopólios e competição, assumindo o papel de autêntica agência reguladora, através de uma administração pluralista e pluriorganizada.55 A prevenção e a repressão às infrações contra a ordem econômica são atribuições do Conselho Administrativo de Defesa Econômica – CADE, autarquia federal com atribuições executórias e postulatórias, que de modo conjunto e acessório com a Agência Nacional de Transportes Aquaviários – ANTAQ, visam estabelecer uma economia justa e competitiva. 2.9 ANTAQ E CADE NA DEFESA DA CONCORRÊNCIA Constituem a esfera de atuação da ANTAQ: a) a navegação fluvial, lacustre, de travessia, de apoio marítimo, de apoio portuário, de cabotagem e de longo curso; b) os portos organizados e as Instalações Portuárias Públicas de Pequeno Porte; c) os terminais portuários privativos e as Estações de Transbordo de Cargas; d) o transporte aquaviário de cargas especiais e perigosas; e e) a exploração da infra-estrutura aquaviária federal.56 Atuando em nível federal, a ANTAQ tem entre suas funções o exercício do Poder Concedente, pelo qual lhe compete estabelecer as condições mediante as quais é possível a transferência para a iniciativa privada das atividades relacionadas ao transporte aquaviário. Visando a movimentação intermodal mais econômica e segura de pessoas e bens, é disposto que a ANTAQ deve articular-se com as demais agências reguladoras setoriais para resolução das interfaces do transporte aquaviário com as outras modalidades de transporte, inclusive harmonizando sua esfera de atuação com a de órgãos dos Estados e dos Municípios encarregados do gerenciamento das operações de transporte aquaviário intermunicipal e urbano. Dentro de sua esfera de atuação, cabe à agência: 55 BIOLCHINI, Monique Calmon de Almeida. Regulação do Transporte Aquaviário: a regulação da outorga de autorização. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2005, p. 152. 56 Art. 23 da Lei n. 10.233, de 5 de junho de 2001, com a redação dada pela Medida Provisória n. 2.217-3, de 4 de setembro de 2001, e as inclusões introduzidas pela Lei n. 11.518, de 5 de setembro de 2007. 35 a) promover estudos específicos de demanda de serviços portuários, bem como os aplicados às definições de tarifas, preços e fretes, estabelecendo normas e padrões a serem observados pelas autoridades portuárias; b) aprovar as propostas de revisão e de reajuste de tarifas encaminhadas pelas Administrações Portuárias, após prévia comunicação ao Ministério da Fazenda; c) propor ao Ministério dos Transportes os planos de outorgas, instruídos por estudos específicos de viabilidade técnica e econômica, para exploração da infra-estrutura e a prestação de serviços de transportes terrestre; e d) publicar os editais, julgar as licitações e celebrar os contratos de concessão para exploração dos portos organizados, celebrar os respectivos atos de outorga para a exploração da infra-estrutura aquaviária e portuária, gerindo e fiscalizando os respectivos contratos e demais instrumentos administrativos, e celebrar atos de outorga de permissão ou autorização de prestação de serviços de apoio portuário, gerindo os respectivos contratos e demais instrumentos administrativos. Não obstante as competências legalmente atribuídas à ANTAQ, diversas situações podem implicar conflitos de competência entre os poderes: federal, estadual e municipal, cuja solução dependerá de decisão alheia ao agente regulador. Situação evidente da possibilidade de instalação de conflitos é o caso de monopólios, uma vez que diante dessa situação estaremos na órbita de atuação do Conselho Administrativo de Defesa Econômica – CADE. Nesse sentido, no ato de criação da Agência ficou expressa a forma de relacionamento entre essas entidades, sendo estabelecido que as infrações de abuso de poder econômico devem ser comunicadas ao CADE pela ANTAQ. No mesmo sentido, é possível o conflito de competência entre a agência e os órgãos de defesa dos usuários de serviços públicos. Tratando-se de conflitos 36 envolvendo entidades dentro da mesma esfera de poder da Federação, a solução reside no âmbito do poder hierárquico do administrador.57 Quanto às administrações portuárias, compete à ANTAQ a supervisão e a fiscalização das atividades desenvolvidas por aquelas nos portos organizados. Nessa atribuição de competência, incluem-se as administrações dos portos objeto de convênios de delegação celebrados pelo Ministério dos Transportes nos termos da Lei n. 9.277, de 10 de maio de 1996. Para tanto, a ANTAQ no exercício de suas atribuições, deve observar as prerrogativas específicas do Comandante da Marinha e atuar sob sua orientação em assuntos de Marinha Mercante, que interessem à defesa nacional, à segurança de navegação aquaviária e à salvaguarda da vida humana no mar, devendo ser consultada quando do estabelecimento de normas e procedimentos de segurança que tenham repercussão nos aspectos econômicos e operacionais da prestação de serviços de transporte aquaviário.58 Com o objetivo de alcançar um sistema equilibrado e competitivo, tratar-se-á no próximo capítulo, dos meios para assegurar os interesses dos agentes econômicos da atividade portuária, bem como da efetividade dos órgãos reguladores responsáveis pelo setor. 57 58 Arts. 55 e 56 da Lei n. 8.078, de 11 de setembro de 1990. Art. 51 – A da Lei n. 10.233, de 5 de junho de 2001. 37 CAPÍTULO 3 REGULAÇÃO E DEFESA DA CONCORRÊNCIA DO TRANSPORTE AQUAVIÁRIO E DA ATIVIDADE PORTUÁRIA Neste capítulo será feita a análise da legislação e dos órgãos competentes pela regulação e concorrência do transporte aquaviário e da atividade portuária. 3.1 REGULAÇÃO DA CONCORRÊNCIA PORTUÁRIA Em relação à questão da concorrência entre portos, “a idéia permeia o sistema pós 1990 com a extinção da Portobrás e promove a concorrência entre portos, apesar da responsabilidade única do Ministério dos Transportes, da continuidade da administração pelas Companhias Docas e de uma natural concentração de cargas em Santos [...]”.59 Em que pesem essas restrições institucionais à concorrência entre portos, existe ainda as barreiras de custo de transporte terrestre, de existência de instalações apropriadas a cada tipo de carga, de freqüência de navios de/para os diversos mercados/fontes de suprimento, estrutura de mercado das cadeias de transportes e movimentação, principalmente das ferrovias e dos terminais de carga geral.60 Destaca-se também, a atual assimetria de custos entre os terminais que se localizam dentro e fora da área do porto organizado, determinada fundamentalmente pelo fato de não-obrigatoriedade de utilizarem mão-de-obra avulsa sindicalizada. Não obstante ser esta uma excelente forma de induzir reduções de custo nas operações dos portos públicos representa, sem dúvida, uma discriminação. Some-se ainda, o fato de que não existem critérios regulatórios definidos para o estabelecimento dessas áreas dos portos, tornando frágil essa estratégia e pouco transparentes as ações de governo nessa matéria. 59 OLIVEIRA, C., e MATTOS, C. Defesa da Concorrência nos Portos. Brasília: CADE, 1997, p. 3. Conforme ADPF n. 139 ajuizada em 02 de abr. de 2008 pela ABRATEC – Associação Brasileira dos Terminais de Contêineres de uso Público, momento que a ABRATEC pessoa jurídica de direito privado alega arguição de inconstitucionalidade do art. 4°, § 2°, II, alínea b, da Lei n. 8.630/93 por ofensa aos arts. 21, XII,”f”, e 175 da CF/88. 60 38 Outro ponto que merece destaque concerne às políticas tarifárias para os serviços de utilização de instalações de uso comum. Tipicamente, essas instalações estarão sob a tutela direta ou indireta (via contratos de arrendamento) da administração portuária, seja pública ou privada, e, portanto, ensejando a apropriação de rendas monopolísticas, ou ainda desincentivos à atuação eficiente dos agentes do setor. O exercício da competência do Conselho de Autoridade Portuária - CAP no sentido de homologar as tarifas portuárias deve, portanto, ser amparado por critérios e sistemas de informação adequados, de forma a reprimir, nessa primeira instância, práticas abusivas ou, pró - ativamente, orientar a correta formação de preços por parte das administrações portuárias. No caso portuário, o controle centralizado das instalações de uso comum, ou mesmo de grandes terminais concentradores, faz com que esses serviços adquiram um caráter exclusivo. Isso, por um lado, faculta seu uso comercial, mas, por outro, no tocante às condições de produção, limita a oferta a um único agente. O elemento limitante nesses casos seria a magnitude dos custos (quebra-mar, canal de acesso, píer, etc) exigidos para a entrada de novas empresas no setor, ante o tamanho do mercado. Com efeito, o regime tarifário dessas instalações pode ser definido por um conjunto de regras de fixação das tarifas, pelas formas de aplicação (tarifas: única; por tempo de utilização; por tonelada movimentada; por calado ou porte bruto das embarcações), bem como pelos tipos de serviço sobre os quais as tarifas incidem (por exemplo, atividades ou serviços agrupados ou desagregados). No tocante às regras de fixação, os principais regimes conhecidos e discutidos na literatura incluem: taxa de retorno; tarifa máxima ou teto; tarifa definida pelo custo, destacando-se o marginal; e desempenho comparativo. A aplicação de cada uma dessas regras apresenta vantagens e desvantagens diferenciadas, tendo em vista o modelo institucional a ser adotado para as administrações portuárias e a atual configuração dos CAPs. 39 Por outro lado, olhando pelo lado da desejada atuação comercial das administrações portuárias, tem-se que a formulação de preços por estas deverá passar a ser um instrumento gerencial. Para esse efeito, são dois os aspectos básicos a serem considerados. Em primeiro lugar, a estratégia de formulação de preços deve se basear na compreensão objetiva da rentabilidade da empresa, considerando simultaneamente: a) qual é a estrutura de custos, e como esses custos se comportam; e b) qual a disposição manifestada do cliente em pagar, e de que forma seu comportamento pode ser influenciado. Outra matéria de interesse sob o tema da regulação engloba a relação umbilical de propriedade e conflito de interesse nos elos da cadeia logística que envolve os portos, tanto do lado terrestre, como na navegação. Os casos recentes de fusão de grandes ferrovias norte-americanas exemplificam bem essa situação. O serviço de praticagem é outra área onde se apresentam sérias questões de regulação. De fato, em função das especificidades locais desses serviços, configurados ao longo do tempo em que os recursos de navegação eram limitados, desenvolveu-se um caso emblemático de captura entre reguladores e regulados. As restrições à livre oferta de serviços impostas pelos reguladores, ou mesmo a obrigatoriedade dos serviços onde não mais se justificam, tem propiciado diversas sugestões de aperfeiçoamento, em prol da redução de custos e do aumento da segurança da navegação.61 A concorrência entre portos tem como principais objetivos aumentar a competitividade do sistema portuário face aos concorrentes estrangeiros, garantindo assim níveis de qualidade e preço adequado à competitividade, garantir a modernidade do sistema, criando e desenvolvendo infra-estruturas portuárias modernas que ofereçam um bom serviço e possam receber os modernos navios com altos desempenhos. 61 PINHEIRO, Armando Castelar. A Privatização no Brasil – Os casos dos serviços de utilidade pública. Rio de Janeiro: BNDES, 2000, p. 264-267. 40 Além disso, visa garantir o futuro do sistema e a sua expansão, olhando o longo prazo e o interesse nacional e não interesse de curto prazo, racionalizar o uso do investimento público realizado e definir vocações e complementaridades para as políticas de desenvolvimento de cada porto, apenas no que respeita a investimento público a aplicar. 3.2 COMPETÊNCIAS DA ANTAQ E DO ÓRGÃO DE PROTEÇÃO À CONCORRÊNCIA Na falta de um controle eficaz, que atue de forma restritiva à concorrência ou realize atos de concentração tendentes à limitação da concorrência no setor, sendo um agente público a ANTAQ está obrigada a promover a regulação orientada pelos postulados do Direito da Concorrência. Em face das características do mercado em questão, isso significa garantir a estrutura de mercado eficiente que permita a prestação do serviço público com qualidade, de forma universal e contínua e com modicidade tarifária. A Lei n. 8.884/94, logo no seu parágrafo 1º, identifica a sua finalidade: prevenir e reprimir as infrações contra a ordem econômica. Art. 1º - Esta lei dispõe sobre a prevenção e a repressão às infrações contra a ordem econômica, orientada pelos ditames constitucionais de liberdade de iniciativa, livre concorrência, função social da propriedade, defesa dos consumidores e repressão ao abuso do poder econômico. A repressão à ordem econômica volta-se contra aquelas condutas empresariais que reduzem o bem-estar econômico e social. A jurisprudência do Conselho Administrativo de Defesa Econômica – CADE acompanha nesse sentido, a jurisprudência internacional segundo a qual uma conduta só é anticompetitiva quando afeta a eficiência econômica como um todo. Já a prevenção das infrações constitui-se no controle das estruturas de mercado, de maneira a impedir que estruturas ineficientes sejam criadas a partir de atos e contratos de quaisquer formas manifestados. Nota-se 41 que o CADE não impede nem mesmo a formação de monopólios, desde que essa seja a estrutura de mercado mais adequada na busca da eficiência econômica. Nas duas dimensões da lei repressiva e preventiva, cabe ao CADE a busca das condições de mercado que maximizam a eficiência e o bem estar econômico social. Por essa razão qualquer ação, seja de agente público ou privado, que afete um mercado relevante de bens e serviços de maneira negativa, abrindo espaço para ineficiência econômica, é passível de repressão. O artigo 15 não deixa dúvida quanto à possibilidade de responsabilização de agentes públicos. Art. 15 - Esta lei aplica-se às pessoas físicas ou jurídicas de direito público ou privado, bem como a quaisquer associações de entidades ou pessoas, constituídas de fato ou de direito, ainda que temporariamente, com ou sem personalidade jurídica, mesmo que exerçam atividade sob regime de monopólio legal. Ao se tratar dos relacionamentos entre sistemas de defesa da concorrência e órgãos reguladores devem ser levados em consideração dois aspectos. Em primeiro lugar, a necessidade de se assegurar uma aplicação uniforme e sistemática do Direito e das políticas concorrenciais do país como um todo. Do contrário, se as agências se pusessem a aplicá-los por sua conta, correrse-ia o risco de incoerência e fragmentação da política de concorrência. Além disso, é conveniente que as agências, dotadas da capacitação técnica apropriada, sejam aproveitadas no tratamento de problemas que freqüentemente envolvem questões de grande especificidade e tecnicidade.62 No entanto, a transferência de poderes exclusivos às agências é uma alternativa perigosa, tomando-se em consideração o risco de sua captura pelos interesses regulados, à medida que o contato reiterado com os 62 ROCHA, Bolívar Moura. Articulação entre regulação de infra-estrutura e defesa da concorrência. Revista Instituto Brasileiro de Estudo das Relações de Concorrência e Consumo – IBRAC, vol. 7, 1998, p. 47-48. 42 agentes econômicos atuantes no setor tende a produzir uma identificação entre os interesses dessas empresas e os dos funcionários das agências.63 O CADE deve decidir sobre os processos instaurados e sobre recursos de ofício das decisões da Agência pelo arquivamento de processos administrativos, nos termos estabelecidos pelos incisos II, III e IV do artigo 7° da Lei n. 8.884/94. Art. 7º . Compete ao Plenário do CADE: II. decidir sobre a existência de infração à ordem econômica e aplicar as penalidades previstas em lei; III. decidir os processos instaurados pela Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça; IV. decidir os recursos de ofício do Secretário da SDE. A conclusão decorrente de uma análise sistemática em cotejo com a disciplina legal de proteção à concorrência, permite afirmar que as agências detêm o dever funcional para promover a concorrência, zelando para que os sistemas de atribuição de concessões, autorizações e permissões levem em conta a necessidade de que os mercados envolvidos funcionem em competição. No mesmo sentido, devem ter essa atenção ao lidarem com questões relativas aos acessos por prestadoras de serviço às redes, sistemas e estruturas em geral quando necessário para a viabilização da concorrência na prestação do serviço e na exploração da atividade. As agências reguladoras, no entanto, estarão extrapolando a sua competência se aplicarem por sua conta as regras e as penalidades contidas na Lei n. 8.884, de 1994. A constatação da existência de possíveis infrações à ordem econômica deverá dar ensejo ao procedimento de investigações estabelecido na Lei n. 8.884, de 1994, culminando com uma decisão do CADE. 63 NUSDEO, Fábio. Fundamentos para uma Codificação do Direito Econômico. São Paulo: Editora RT, 1995, p. 122 – 139. 43 Existe no Direito Brasileiro, no entanto, a possibilidade de ingresso em juízo do CADE para a defesa da competição nos mercados. Com efeito, sendo o CADE uma autarquia, tendo personalidade jurídica própria e sendo estruturado para a realização de atividades determinadas, é possível o seu ingresso em juízo para defender as condições de desempenho das funções a ele atribuídas na lei de sua instituição e na legislação em geral. Este tipo de demanda judicial estaria fundado na sua atribuição de zelar pela observância da Lei de Defesa da Concorrência, estabelecida pelo inciso I do artigo 7º da Lei n. 8.884 de 1994, e, ainda nos dispositivos da legislação sobre os setores privatizados que lhe incube reprimir as práticas prejudiciais à livre concorrência. O inciso I, artigo 20, da Lei n. 8.884/94 deixa clara a possibilidade de uma agência reguladora ser responsabilizada por infração à ordem econômica. Art. 20. Constituem infrações da ordem econômica, independentemente de culpa, os atos sob qualquer forma manifestados que tenham por objeto ou possam produzir os seguintes efeitos, ainda que não sejam alcançados: I. limitar, falsear ou de qualquer forma prejudicar a livre concorrência ou a livre iniciativa; Por sua vez, a implantação e a manutenção da concorrência nos setores privatizados tenderão a ser tanto mais efetivas quando for coesa a articulação das autoridades antitruste e das agências reguladoras. Existem outros mecanismos, mais informais, que permitem a participação do CADE no desempenho, pelas agências, das funções de regulação dos setores privatizados em questão. Em primeiro lugar, a participação das autoridades antitruste nas audiências públicas que precedem a adoção de seus atos normativos. Em segundo lugar, o estabelecimento de convênios entre órgãos de defesa da concorrência e as agências reguladoras poderia propiciar uma cooperação e intercâmbio de experiências e conhecimentos tais que não se pusesse, na prática, 44 a necessidade de o CADE impugnar as normas expedidas pelas agências. Nesse último caso estaria sendo aproveitada a competência consultiva da autarquia, estabelecida no inciso XVII do artigo 7º da Lei n. 8.884, de 1994. Mesmo fora do âmbito de um convênio, as agências reguladoras poderiam formular consultas ao CADE, com base no mencionado artigo 7º da Lei de Proteção à Concorrência, que foi disciplinado em maior detalhe pela Resolução n. 18, de 25 de novembro de 1998, conforme a qualquer interessado, inclusive órgãos e entidades públicos, pode consultar o CADE em matéria de sua competência. 3.3 PRINCÍPIOS DA DEFESA DA CONCORRÊNCIA PORTUÁRIA Na Administração Pública, “Toda atividade administrativa do Estado é norteada pelos princípios da supremacia e da indisponibilidade do interesse público”.64 Para realizar suas funções, a Administração Pública recorre freqüentemente a colaboração de terceiros, para melhor cumprir suas finalidades. Significa afirmar a impossibilidade de autorizar qualificação de organizações sociais sem adoção de cautelas severas e rigorosas, destinadas a evitar práticas reprováveis. Assim, nas palavras de Bandeira de Mello “todos estes princípios vigoram segundo determinadas condições, regulamentação e limites, admitindo variantes, temperamentos e qualificações particulares à vista do significado singular que assumem em função da legislação [...] sem embargo, desempenham o papel de guia; norte que orienta a compreensão [...]”.65 Conclui-se que os princípios constituem diretrizes mestras do sistema jurídico no qual se encontram inseridos, e tem como finalidade nortear os objetivos a serem perseguidos pela sociedade, pelo Poder Público e Privado. Feita essa menção preliminar, passamos em seguida a avaliar os princípios: 64 BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros, 1993, p. 16. 65 BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo. 13. ed. São Paulo: Malheiros, 2001, p. 55. 45 3.3.1 PRINCÍPIO DA SOBERANIA NACIONAL Este elemento decorre da secular Teoria do Estado, pelo qual são ressaltados os valores da independência nacional, e cumulativamente o respeito igualitário entre as Nações. Na nova doutrina tratadista, o conceito de soberania, teve alguns aspectos amputados, em busca da integração estatal, como prescreve Celso Ribeiro Bastos: “Se por soberania quisermos entender um poder absolutamente irrefreado, o mais sensato é reconhecer que essa noção não é a mais útil nos tempos modernos e mesmo historicamente e, o mais provável, é que ela tenha sido a expressão de nenhuma realidade objetiva. Um poder absolutamente infrene jamais existiu a começar pela óbvia razão de que todo exercício do poder está condicionado a circunstâncias de ordem econômica, social, demográfica, até mesmo tecnológica, que não podem ser alteradas por manifestações unilaterais do poder”.66 No que tange à atividade portuária em conexão com o conceito atual de soberania, necessitamos, ventilar a noção da vontade soberana do Estado, na regência do ordenamento que regrará o Porto e suas atribuições, com prioridade surge como princípio geral da atividade econômica a soberania nacional. Faz valer este norte a lição imperativa de que nenhuma vontade estranha a da Nação-sede pode se sobrepor - em legitimidade e legalidade - à determinação pátria, sob pena de desconsideração do princípio da autodeterminação dos povos. E assim, nas palavras de Eros Roberto Grau, “a soberania econômica nacional não supõe o isolamento econômico, mas antes, pelo 66 BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Teoria do Estado e Ciência Política. 6. ed. São Paulo: Celso Bastos, 2004, p. 97-98. 46 contrário, a modernização da economia, da sociedade e da ruptura de nossa situação de dependência em relação a sociedades desenvolvidas”.67 3.3.2 PRINCÍPIO DA GARANTIA DO DESENVOLVIMENTO NACIONAL Visualizando o desenvolvimento nacional, os portos não devem ser tratados como meros agentes comerciais por parte dos entes governamentais. Ademais, o ordenamento portuário deve buscar a primazia pela obtenção do desenvolvimento nacional, mediante a concorrência operacional. “Assim, as alterações efetivamente realizadas na Lei n. 8.630/93 buscaram implantar uma política de modernização do setor portuário, com o aumento da competitividade nos portos brasileiros e conseqüente elevação da produtividade, em especial com a privatização dos portos públicos. Utilizou-se nova postura política, objetivando a construção de novos berços e terminais, bem como a exploração de instalações portuárias por meio do arrendamento e locação dos portos públicos; criou-se a figura dos Terminais Privativos de Uso Misto e Terminais Arrendados, objetivando maior competitividade na área das exportações, mediante ganhos de eficiência e produtividade, numa clara aplicação aos princípios da lei de mercado”. 68 Porém, se em um prato da balança compete exclusivamente aos portos o alcance do desenvolvimento, noutro é obrigação primária do Governo fomentar a atividade portuária com o fito de assegurar a competitividade externa, através de taxas condizentes, celeridade de escoamento, segurança negocial, entre outros. Sob égide deste princípio é inaceitável que a legislação portuária tenha aplicação retrógrada, ou descompassada com a realidade 67 GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988. 3. ed. atualizada. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 225. 68 STEIN, Alex Sandro. Curso de Direito Portuário. São Paulo: LTr, 2002, p.47. 47 universal, ceifando a evolução e o desenvolvimento do Brasil, em prevalência de questões meramente formalistas. “Daí por que a idéia de desenvolvimento nacional, patrocinada pelas Constituições contemporâneas, dentre as quais sobreleva, pela sua expressão taxativa, a brasileira (art. 3º, I), põe-se no sentido de aperfeiçoamento das condições de todas as pessoas que compõem o Estado. O egoísmo individual não convive com o princípio da justiça social. Aliás, egoísmo não convive, contracena, faz de conta para manter tudo igual e intangível ao contato de terceiros”.69 3.3.3 PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE “O princípio da proporcionalidade consiste, basicamente, no dever de não serem impostas obrigações, restrições ou serviços em medida superior aquela estritamente necessária ao atendimento do interesse público, segundo critérios negociáveis de adequação dos meios aos fins.”70 E assim, nesse sentido, a instituição da regulação deve necessariamente atender ao princípio da proporcionalidade, em todos os seus elementos constitutivos (elemento a adequação, elemento a necessidade e proporcionalidade em sentido estrito), tanto nos seus aspectos negativos como comissivos, buscando-se assegurar a não imposição de regulações contrárias ao interesse público.71 69 ROCHA, Carmem Lucia Antunes. O princípio constitucional da função social da propriedade. Revista Latino Americana de Estudos Constitucionais. Belo Horizonte, 2003, p. 579. 70 MEDAUAR, Odette. Direito Administrativo Moderno. São Paulo: Revista dos Tribunais, 8. ed., 2003, p. 152. 71 ARAGÃO, Alexandre Santos de. Agências Reguladoras e a Evolução do Direito Administrativo. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 130. 48 3.3.4 PRINCÍPIO DA EFICIÊNCIA As noções de eficiência e de concorrência não podem ser conflitantes, considerando que é a própria concorrência que induz a eficiência. Por isso, as integrações que buscam eficiência devem ser entendidas como benéficas para o mercado, desde que levem à redução de preço dos produtos ofertados no mercado. Cabe ao Estado tutelar o mercado competitivo como um bem jurídico. Instituído pela Emenda Constitucional n. 19, de 04 de junho de 1998, leciona que a administração dos órgãos públicos deve ser desempenhada com presteza, desenvoltura, perfeição e rendimento funcional. O axioma contido neste princípio importa em efetivar os resultados de interesse público. Para Alexandre de Moraes: “Princípio da eficiência é aquele que impõe à Administração Pública direta e indireta e a seus agentes a persecução do bem comum, por meio de exercício de suas competências de forma imparcial, neutra, transparente, participativa, eficaz, sem burocracia e sempre em busca da qualidade, primando pela adoção de critérios legais e morais necessários para a melhor utilização possível dos recursos públicos, de maneira a evitar-se desperdícios e garantirse uma rentabilidade social.”72 Este primado, nas docas do direito portuário é de relevância imensurável, em atendimento da função do porto, que, por sua natureza deve ser eficiente na confecção dos resultados pretendidos. 3.3.5 PRINCÍPIO DA LEGALIDADE Com o objetivo de erradicar o absolutismo da vontade governamental, e em igual medida o poder arbitrário do Estado consagrou-se que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude 72 MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. 14. ed. São Paulo: Atlas, 2003, p. 317. 49 de Lei. Sobre certo panorama é uma garantia que combate a vontade caprichosa do detentor do poder. Além deste genérico conceito, em sentido restrito à administração pública, na qual se enquadram os portos explorados diretamente por órgãos federados, ou de poderes delegados, observa-se que o administrador está sujeito às exigências do bem comum, e deles tem o dever de assim fazer. Enquanto na administração privada é autorizado realizar o que a lei não proíbe, no setor público somente é autorizado fazer o que a lei permite. “Cumprir simplesmente a lei na frieza de seu texto não é o mesmo que atendê-la na sua letra e no seu espírito. A administração, por isso, deve ser orientada pelos princípios do Direito e da Moral, para que ao legal se ajunte o honesto e o conveniente aos interesses sociais”.73 Destarte, deve o envolvido com a administração portuária portar-se em harmonia com os princípios de antemão elencados para além de apresentar-se legalmente, este seu dever de agir seja consoante às necessidades que o moveram. 3.3.6 PRINCÍPIO DA IGUALDADE Este princípio leva à obrigatoriedade de um comportamento que respeite a igualdade de direito de todos os integrantes do mercado, bem como de não adotar comportamentos que impeçam a entrada no mercado ou fornece a eliminação de um concorrente. O princípio da igualdade se refere à possibilidade de atuação garantida a todos, independentemente do seu tamanho estrutural. Este princípio serve de fundamento para o princípio da nãodiscriminação e tem como conseqüência a não-exclusividade. Consagra a Carta Cidadã de 1988, que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer 73 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo brasileiro. 25. ed. atual. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 83. 50 natureza, o que reflete o primado da isonomia. Estas expressões reproduzem em seu bojo a intenção de não-diferenciação das pessoas e que fazem jus a tratamento idêntico pela lei, em conformidade com os critérios chancelados pelo ordenamento jurídico positivo. Conforme versou Moraes, “o que se veda são as diferenciações arbitrárias, as discriminações absurdas, que aleija o próprio conceito de Justiça”.74 No que tange ao estudo da regulamentação portuária, é salutar analisar a importância da isonomia conferida aos brasileiros e estrangeiros residentes no País, no espectro dos Direitos e Garantias Individuais, por inteligência do caput do artigo 5º, da Constituição Federal. Nesta ordem ainda é útil de paráfrase a concessão de igualdade de direitos entre os trabalhadores com vínculo empregatício permanente e os trabalhadores avulsos. Grandiosa a relevância do instituto cabeça do mencionado artigo na estalagem normativa dos portos. É de notório conhecimento e de domínio público que, pelas vias da área portuária andam inúmeros Homens, de variadas nacionalidades, credos, origens raciais e que à luz da ordem constitucional brasileira gozam dos mesmos direitos e iguais garantias dos aqui paridos, nossos conterrâneos. 3.3.7 PRINCÍPIO DA LIVRE CONCORRÊNCIA A instalação da Lei de Modernização dos Portos deuse em meio a monopólios rochosos, fincados nas docas, que relutaram em ceder suas prerrogativas, em típica conduta egoísta. Com a implantação de preceitos novéis para a ordem econômica advindas da Constituição Federal sucumbiram os grilhões para a manifestação da liberdade de iniciativa, com expressão autorização à repressão ao abuso do poder econômico que mirar a dominação dos mercados, à eliminação da concorrência e o aumento desenfreado dos lucros. 74 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 14. ed. São Paulo: Atlas, 2003, p. 64. 51 Em suma, o espírito da lei que dispõe sobre o regime jurídico da exploração dos portos organizados e das instalações portuárias é nutrido e impulsionado para assegurar definitivamente a concorrência, protegida de embates afrontosos pela atuação regulatória do Estado. Ademais, este mesmo diploma, impõe não somente a concorrência dentro dos portos organizados, bem como entre os portos organizados, objetivando brindar os usuários com custos menores e melhor qualidade na prestação do serviço. 3.3.8 PRINCÍPIO DA LIVRE INICIATIVA O direito da propriedade individual e sua conseqüência lógica, o princípio da liberdade de iniciativa são o sustentáculo e a justificativa para a atuação dos integrantes do mercado em regime concorrencial, bem como ainda a fundamentação da legislação antitruste que pretende exatamente resguardar a independência de cada participante. A liberdade iniciativa não pode prescindir da intervenção do Estado, sendo a defesa da concorrência uma forma de assegurar o livre exercício da atividade econômica. Conforme já proclamado pelo CADE: “... a economia de mercado é o pilar de sustentação do sistema capitalista. A livre iniciativa, princípio consagrado na Constituição, requer para a sua concreção indivíduos livres que possam exercer a atividade econômica de sua escolha, evidentemente, nos limites da lei. Mas não existe liberdade sem tutela. De uma concepção liberal da liberdade, passouse a uma concepção social, que transformou o Estado de guardião da propriedade privada e do contrato livremente pactuado em promotor de interesse público”.75 Nesse sentido, “A defesa da concorrência é o único mecanismo possível de se assegurar a livre iniciativa e conter o abuso do poder econômico. Este não é algo ruim, sendo às vezes até indispensável. Mas pode ser 75 ARAGÃO, Alexandre Santos de. Agências Reguladoras e a Evolução do direito administrativo econômico. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p. 386. 52 perverso, tanto na origem, em razão dos métodos utilizados para sua obtenção, quanto depois de consolidado, pelos artifícios de que se vale para se manter”.76 3.4 O PODER JUDICIÁRIO NA ATIVIDADE PORTUÁRIA E NO TRANSPORTE AQUAVIÁRIO Quanto ao papel que cabe ao juiz, também é reservado, nas modernas teorias, o desenvolvimento da argumentação nas decisões, a fim de se poder ter mínimo de controle nas decisões, de se poder ter um mínimo de controle dos valores utilizados, já que todo valor é arbitrário, pois que não existe nenhuma justiça absoluta, perfeita, fundada na razão. Daí, vários autores postulam relativismo axiológico, a fim de pressupor que a função que cabe ao direito, em todas as épocas, é a de fundamentar e manter uma sociedade pacífica e duradoura entre os membros da comunidade jurídica.77 São as leis e as normas delas oriundas (inclusive as expedidas pela própria agência) que, dentro do amplo espectro regulatório que o Poder Público possui, fixam os marcos, menos ou mais amplos, em que o poder regulatório se desenvolverá, razão pela qual “o órgão regulador não pode praticar atos concretos sem base normativa específica e adequada. Se uma competência não foi expressamente conferida por lei, nem com base nela, pelos regulamentos, pelo edital da licitação ou pelo contrato, o órgão não a tem”.78 Objeto de grandes dissensos é a abrangência do poder regulador sobre a gestão interna dos concessionários e permissionários: por um lado, sendo empresas privadas, a matéria é de livre decisão da empresa; por outro, incumbido o Poder Público da fiscalização da quantidade do serviço e da modicidade da tarifa, é possível que a ingerência sem assuntos internos possa ser, 76 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Malheiros. 8. ed. 1992, p. 666-667. 77 BIOLCHINI, Monique Calmon de Almeida. Regulação do Transporte Aquaviário: a regulação da outorga de autorização. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2005, p. 167. 78 ARAGÃO, Alexandre Santos de. Agências Reguladoras e a Evolução do direito administrativo econômico. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p. 386. 53 à luz da teoria dos Implied Powers, o meio necessário para que alcance os seus objetivos regulatórios.79 Na regulação das atividades econômicas de interesse geral, o Poder Público deve limitar-se a expedir normas que digam respeito aos interesses primários a serem atendidos, não podendo se imiscuir em assuntos intestinos das empresas, mesmo que atinentes a outros interesses públicos.80 Não poderá o Poder Público impor regulação que faça com que as autorizações operativas típicas desta modalidade regulatória serem equivalentes às concessões, a um publicatio, ou seja, não pode o Poder autorizante ter poderes correspondentes aos que existiriam se a atividade fosse um serviço público, sob pena de incidir em fraude à Constituição.81 79 ARAGÃO, Alexandre Santos de. Agências Reguladoras e a Evolução do direito administrativo econômico. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p. 387. 80 ARAGÃO, Alexandre Santos de. Agências Reguladoras e a Evolução do direito administrativo econômico. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p. 393. 81 ARAGÃO, Alexandre Santos de. Agências Reguladoras e a Evolução do direito administrativo econômico. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p. 393. 54 CONSIDERAÇÕES FINAIS Ao longo da história da regulação dos portos brasileiros, observou-se que o Estado tem sido incapaz de suprir as necessidades do setor, ocorrendo inexistência de competitividade nas operações, e falta de investimentos em infra-estrutura e equipamentos, atribuindo ao sistema debilidade e perda de concorrência. A privatização dos portos via licitação, assegurou aos interessados o direito de construir, reformar, e ampliar os terminais, estimulando a concorrência portuária. Com a ineficácia do Estado perante o sistema, este então passou a ter função de planejar, regular, e fiscalizar, representado pelas agências reguladoras. Ocorrida às alterações constitucionais no sistema portuário, desde a extinção da Portobrás em 1990, e surgindo a ANTAQ em 2001, é evidente ainda a necessidade de ajustes regulatórios compatíveis com a realidade social e econômica do Brasil. Tendo sido abordados os conceitos do sistema jurídico da atividade portuária, e problemas regulatórios desse sistema, levanto a hipótese: O estudo dos principais aspectos legais e econômicos que regulam o transporte aquaviário e a atividade portuária contribui para a efetividade da defesa da concorrência no setor portuário e aquaviário, para a manutenção do mercado em equilibrado através das agências reguladoras, evitando um mercado concentrado, que provoca falta de competição. Posteriormente foi desenvolvido o estudo dos aspectos históricos do transporte aquaviário, para posteriormente aprofundar a pesquisa da defesa da concorrência atribuída à responsabilidade a ANTAQ e ao CADE de regular, fiscalizar, intervir e prevenir, garantindo o crescimento econômico, para ao final retomar a hipótese para compreensão do aludido trabalho. A ANTAQ foi criada com a finalidade de desenvolver uma estrutura setorial eficiente, confiável, e transparente em suas decisões. Ao estudar 55 a regulação e concorrência do transporte aquaviário e da atividade portuária, mostraram-se alguns pontos relevantes que são necessários para contribuir com o entendimento da não aplicabilidade da defesa da concorrência dentro do sistema: a) a ANTAQ dispõe de regulamento adequado que estabelece critérios para atuação de terminais públicos e privados, porém alguns terminais privados obtêm autorização da própria ANTAQ para exercerem atividades que contrariam com os preceitos constitucionais, causando uma concorrência injusta e desequilibrada; b) o CADE destina-se a prevenir e reprimir o abuso do poder econômico, não admitindo que haja regimes jurídicos distintos entre terminais públicos e privados. Deste modo, cabe a ANTAQ implementar a competição, promovendo políticas concorrenciais, compatibilizando com os dispositivos legais relacionados com o CADE. Essa competência deve ser exercida no sentido de estimular o mercado regulatório. Não resta dúvida que este setor, há muito que se desenvolver, e as imperfeições do sistema, levam a ANTAQ a intensificar sua função reguladora e fiscalizadora, juntamente com atuação do CADE reprimindo e prevenindo abuso econômico. Verifica-se, portanto, que os principais aspectos legais e econômicos que regulam o transporte aquaviário e a atividade portuária que deveriam contribuir para a efetividade da defesa da concorrência da atividade portuária, e com a manutenção do mercado equilibrado através das agências reguladoras, evitando um mercado concentrado, que provoca falta de competição, não ocorre no ambiente portuário. Sobre o tema, ainda ressalta-se as imperfeições setoriais públicas e privadas, como também a prática de intervenção regulatória, pois esta não é capaz de corrigir as falhas ou desequilíbrio do mercado. No setor portuário, o mercado é imperfeito por sua própria natureza, e para reverter isso passará por um processo lento. 56 Diante desse fato, a ANTAQ deveria avaliar melhor o processo de criação de normas, e seu impacto sobre as atividades fiscalizadas. Alguns dos pontos negativos da ANTAQ seria o excesso de flexibilidade que pode conduzir a perda de credibilidade da regulação e inibir o investimento privado, em particular de empresas estrangeiras. Este é um desafio a ser enfrentado e superado ao longo dos próximos anos. Outro aspecto importante é a segurança jurídica que busca prevenir a expropriação de direitos, que tanto a ANTAQ, quanto o CADE devem assegurar aos entes regulados. A função reguladora da ANTAQ deve buscar o equilíbrio dos interesses dos agentes públicos e privados, visando estabelecer um setor atrativo para investimentos financeiros de novas empresas, oferecendo a estas, garantias confiáveis e mecanismos legais e institucionais pertinentes. Assim, conclui-se que competição perfeita não é sinônimo de maior competição possível. A perfeição da competição pressupõe igualdade. Esta pode e deve ser estimulada, mas de maneira regulada e saudável, dentro da lei, sem o que ela se torna predatória ou infratora da ordem econômica. Uma concorrência saudável é aquela que se encontra no plano de igualdade de condições, ou seja, igualdade dos ônus e encargos do ponto de partida e ao longo da competição. Não pode existir contradição entre os interesses público e privado. O Estado, representado pelo CADE e ANTAQ, ao regular as atividades do setor portuário, busca satisfazer os interesses coletivos, e de fato proporcionar um ambiente competitivo e equilibrado. 57 REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS ARAGÃO, Alexandre Santos de. O Conceito Jurídico de Regulação da Economia. Rio de Janeiro: Forense. 2001. ARAGÃO, Alexandre Santos de. Agências Reguladoras e a Evolução do Direito Administrativo. Rio de Janeiro: Forense, 2002. 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