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Formação
docente
Desenvolvimento profissional do
docente do ensino superior
Professional development of higher
education faculty members
Barbara Sicardi
Professora da Faculdade de Educação da Universidade Metodista de São Paulo – UMESP
Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Educação da Unicamp – SP
E-mail: [email protected]
R
e
s
u
m
o
O texto apresenta considerações a respeito do desafio e dos determinantes do exercício da docência
nas instituições de ensino superior. A reflexão, neste espaço, buscará discuti-los a partir de alguns
aportes teóricos, apontando possíveis saídas para a construção da competência necessária, fruto de uma
síntese possível e desejável entre os saberes científicos e pedagógicos, essenciais à profissão e ao desenvolvimento do profissional docente.
Unitermos: desenvolvimento profissional, saberes docentes, ensino superior.
Synopsis
The text presents considerations regarding the challenges and the determining factors of faculty practices in higher
education institutions. Reflection, in this space, will attempt to discuss same based on certain theoretical
foundations, indicating possible alternatives for the building of needed competency, product of a possible and
desired synthesis between scientific and pedagogical knowledge, which are essential to the profession and to the
development of the professional faculty member.
Terms: professional development, faculty knowledge and higher education.
Resumen
El texto presenta consideraciones respecto al desafío y los determinantes del ejercicio de la docencia en las
instituciones de enseñanza superior. La reflexión, en este espacio, procurará discutirlos a partir de algunos aportes
teóricos, apuntando posibles salidas para la construcción de la competencia neces0aria, fruto de una síntesis
posible y deseable entre los saberes científicos y pedagógicos, esenciales a la profesión y al desenvolvimiento del
profesional docente.
Terminos: desenvolvimiento profesional, saberes docentes y enseñanza superior.
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Na perspectiva de
um novo século,
muitas questões
emergiram em
relação à prática
de ensino do docente universitário
Encontramos
exercendo a
docência universitária, professores
nas mais variadas
situações
... para alguns o professor universitário é basicamente um técnico
com a função de transmitir informação e avaliar a aprendizagem
de seus alunos, utilizando, para
isso, uma variedade de meios de
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ensino e mesmo de diagnósticos, a
que teve acesso ou foi orientado
para usar, com uma certa garantia de que “dá certo”. Para outros,
ele é um ator cujas crenças e concepções determinam a forma como
desempenha não só o papel que
precisa assumir, cotidianamente,
mas também as formas de condução bem sucedidas das suas tarefas docentes, mesmo que suas
ações nem sempre se manifestem
concordantes com a visão dos teóricos da educação ou com a vontade prescritiva das autoridades
educativas. E, para outros, ainda,
o professor é um profissional que
procura dar respostas pedagógicas
às situações com que se depara; é
alguém que se move em circunstâncias muito complexas e contraditórias, mas reais, e que, por isso,
é preciso respeitar, valorizar e,
sobretudo, conhecer melhor.
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desafio de exercer a
docência nas instituições de
ensino superior tem, atualmente,
vários determinantes. A docência
universitária tem sido considerada uma “caixa de segredos”, em
razão das políticas públicas
enunciadas costumarem omitir
determinações quanto ao processo do ensinar, ficando tal processo geralmente afeto ao discernimento ou ao conservadorismo
da instituição educacional que,
por sua vez, tende a pressupô-lo
– usando talvez a lei de menor
esforço – como parte integrante
do que é conveniente conceber
de liberdade acadêmica docente.
Na perspectiva de um novo
século, muitas questões emergiram em relação à prática de ensino do docente universitário,
principalmente em função de sua
responsabilidade de formar profissionais em áreas específicas,
inclusive professores. Questões
novas passam a ocupar um certo
lugar comum, dentre as quais:
quem é o docente universitário? Ele
está preparado para acompanhar
as mudanças do terceiro milênio,
mais especificamente, do século
XXI? A complexidade das respostas possíveis pode ser vista de
diversos ângulos.
Parafraseando Ponte (1998),
diríamos que
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Um dos grandes problemas
da ação docente se centra na sua
formação. Apesar da exigência
cada vez maior da capacitação
permanente em curso de pós-graduação da área de conhecimento,
o professor do ensino superior
não parece didaticamente preparado para o exercício acadêmico,
especialmente para a interação
em aulas. Isto porque, considerando o tipo de graduação realizada, encontramos, exercendo a
docência universitária, professores nas mais variadas situações
– que implicam maior ou menor
habilidade e competência docente – quais sejam: a) alguns com
formação didática [inócua] obtida
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em cursos de licenciatura; b) outros, que trazem sua ‘experiência
pessoal’ a título profissional para
a sala de aula, posto que “é um
professor que já foi aluno e age
neste âmbito”, e c) outros, ainda,
sem qualquer experiência profissional ou didática, mesmo oriundos de curso de especialização,
lato e/ou stricto sensu se tornam
“repetidores de informações adquiridas em nível de maior requinte”. Nestes casos, o fator
definidor de toda e qualquer seleção de professores vem/tem
sido, como sempre foi, a ‘competência científica’ ou o ‘domínio
do conhecimento específico da
área’, uma vez que, até hoje se
acredita que para ensinar é suficiente saber o conteúdo específico, e o
“resto” depende do jeito de cada
um e “vem com a experiência,
com o tempo”.
Em função destas questões é
que Pimenta e Anastasiou (2002)
afirmam que, neste contexto, a ação
de pesquisar o ensinar torna-se uma
possibilidade e ao mesmo tempo, um
desafio, tanto na construção da identidade docente como profissional do
professor quanto na revisão das ações
em sala de aula. Para que isto
ocorra, o professor do ensino superior não pode ser visto como
um profissional de outra área de
conhecimento que está ‘quebrando
o galho’ em uma universidade,
‘como um abnegado que vê no ensino
superior uma forma de ajudar os
outros, fazendo um bico...’ (p. 178).
Com exceção dos professores
oriundos da área da Educação ou
de cursos de Licenciatura, a maioRevista de Educação do Cogeime
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A maioria dos
docentes que
atuam nas instituições de ensino
superior não tiveram a oportunidade de realizar
cursos de graduação e pósgraduação com
alguma disciplina
que abordasse
aspectos relativos à
preparação para a
docência
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ria dos demais docentes que atuam
nas instituições de ensino superior
não tiveram a oportunidade de
realizar cursos de graduação e pósgraduação com alguma disciplina
que abordasse aspectos relativos à
preparação para a docência, isto é,
que contemplassem questões de natureza teórica ou prática relativas
ao ensino e à aprendizagem. E
mesmo aqueles que realizaram o
curso de licenciatura, a maioria teve
uma formação didático-pedagógica
voltada apenas ao ensino básico e
não ao ensino superior.
Poder-se-ia até dizer que a
maioria dos que atuam na docência universitária tornou-se professor da noite para o dia: dormiram
profissionais ou pesquisadores de
diferentes áreas e acordaram
professores1. Por mais excelência
que tragam das diferentes áreas
de atuação não há garantia de que
a mesma tenha igual peso na
construção do significado, dos saberes, das competências, dos compromissos e das habilidades
referentes à docência. Por maior
autonomia que tenham em sua
profissão de origem, tomando a
autonomia como a capacidade
profissional
em
conceber
e
implementar novas alternativas diante da crise e dos problemas da sociedade (Cavallet, 1999), não há garantias de que estejam preparados
para conceber e implementar alternativas e soluções pedagógicas
1 . Conforme Selma Garrido Pimenta, em
palestra proferida no XI ENDIPE,
Goiânia, maio de 2002.
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adequadas, diante dos problemas
que surgem na aprendizagem de
seus alunos, nas salas de aula da
universidade.
No Brasil, esses profissionais,
em sua maioria, ingressam como
docentes nas instituições de ensino superior por concurso (no
caso das públicas e de algumas
particulares) ou por convite. No
entanto, os elementos avaliados
não se referem necessariamente à
competência para o processo de
ensinar e de fazer (e deixar)
aprender na sala de aula. Não
trazendo consigo elementos de
formação inicial para a docência,
era de se esperar que esse processo fosse imediatamente assumido de maneira consciente
pela instituição, que proveria momentos específicos de formação
em serviço. No entanto, tais
iniciativas pouco ocorrem institucionalmente, e nem mesmo individualmente, como seria necessário e esperado.
Após ser selecionado, o professor, em geral, ingressa em departamentos organizados em torno de
disciplinas que são oferecidas a
vários cursos, as quais já possuem
ementas prontas. Para ministrar
tais disciplinas, planeja individual
e solitariamente e é nessa condição
– individual e solitária – que deve
se responsabilizar pela docência
que exerce. De maneira geral, o
trabalho docente e os resultados
obtidos não são objeto de estudo
ou de análise do curso ou do departamento, a não ser que eles resultem em situações problemáticas,
como reclamações de alunos, alto
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Inexistem
situações onde
orientações
quanto a
planejamento,
metodologia
ou avaliação sejam
estudadas ou
discutidas
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índice de retenção, entre outros. A
grosso modo, inexistem situações
onde orientações quanto a planejamento, metodologia ou avaliação
sejam estudadas ou discutidas e
não precisa realizar auto-avaliações ou relatórios (ação que lhe
exigiria refletir sobre a própria
docência), como acontece normalmente nos processos de pesquisa,
estes sim, objetos de reflexão,
preocupação e controle institucional. Assim, o processo docente e a
efetivação de uma profissão ficam
entregues à própria sorte. Nesse
contexto, não é de se estranhar a
permanência de uma relação tradicional entre professor, aluno e
conhecimento na sala de aula.
Essa relação tradicional, secularmente superada, cientificamente ultrapassada é muito semelhante àquela que o professor viveu
enquanto aluno universitário. Por
falta de um outro referencial de
ação, do conhecimento da teoria e
da prática pedagógica que possam
lhe oferecer formas mais atuais e
adequadas de ação como profissional docente, o professor seleciona, de suas experiências como aluno, aquelas que considerou mais
efetivas para sua aprendizagem e
passa a reproduzi-las em sala de
aula. Isso nem sempre resulta no
melhor processo de ensino e
aprendizagem ou ensinagem2.
2. Processo de ensino do qual resulta necessariamente a aprendizagem. Certamente, este requer a superação da relação tradicional entre aluno, professor e
conhecimento. Para aprofundamento
do conceito ver Anastasiou (1998).
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Temos assim, atuando nas
salas de aulas, profissionais
competentes em suas áreas específicas, com pleno domínio dos
saberes científicos, mas sendo
desafiados a constituírem-se como
professores, a assumirem-se nessa
nova profissão que tem estatuto,
características, compromissos e
procedimentos próprios, os quais
necessitam serem apreendidos,
questionados e constantemente
reformulados pelos participantes
dos colegiados institucionais da
educação superior. Ficam, então,
desconsiderados os elementos
constitutivos dessa categoria profissional: o ideal, os objetivos, os
compromissos pessoais e sociais, a
regulamentação profissional, o
conceito de profissão e de profissional, o código de ética, as participações nas entidades de classe,
os quais são fundamentais ao
exercício competente de uma profissão, o que possibilitaria um reconhecimento social da mesma.
Em algumas Instituições de
Ensino Superior, e a Umesp contribui com o que se denominou
Seminários Interativos e Fórum dos
Coordenadores, há espaços de
atualização pedagógica para os
docentes e coordenadores de
curso3. Porém, da mesma forma,
os novos Mestres e Doutores,
oriundos em sua maioria, de
cursos de Bacharelado, ainda que
fascinados pelas possibilidades
que se lhes descortinam na área
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Ficam, então,
desconsiderados
os elementos
constitutivos
dessa categoria
profissional
Cabe a cada
formador
reconstruir no
seu dia a dia o
saber escolar
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do ensino, não têm tempo (nem
hábitos) para aprofundar leituras
na área.
Nessa perspectiva, concordamos com Gonçalves e Gonçalves
(1998) quando afirmam que as Universidades parecem não perceber que os
problemas do ensino superior podem
ter causas na formação de seus docentes (p.124). Não basta insistir na
titulação se esta não propiciar, também, o debate sobre as questões
educacionais da área na qual o docente está se especializando.
Sofrendo influências variadas
em sua formação acadêmica e não
discutindo aspectos do processo
educativo, os docentes pós-graduados tendem a se acomodar em
uma prática modelada por abordagens tradicionais e geralmente
almejam dedicar-se integralmente
à pesquisa. Diante dessa realidade questionamos: que saberes,
capacidades e habilidades têm
esses profissionais para o trabalho
em um curso de formação universitária? Quando e de que modo esse questionamento passa a
ser uma preocupação da própria
Universidade?
Essas questões expressam ‘as
necessidades formativas dos professores/formadores’. Como dissemos há
pouco, as leis e os programas de
pós-graduação de caráter generalista nunca levantam todas
essas contradições de modo convincente e exaustivo, durável e
sobretudo concreto. Assim, conforme pontua Tardif (2002) cabe a
cada formador reconstruir no seu
dia a dia o saber escolar – diferenciado do saber científico de
3. Para saber mais sobre ambas experiências, consultar Aragão; Neto e Silva
(2002) e Barbosa & Sicardi (2003).
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referência – um conjunto de conhecimentos realmente utilizados
a partir de elementos temporais,
plurais, heterogêneos e situados
na prática pessoal profissional, –
aí se encontra a complexidade.
Trabalhos recentes, como os
de Altet e Perrenoud (2003), Pimenta e Anastasiou (2002) e Zabalza (2004), têm evidenciado
que ainda são poucas as pesquisas sobre a profissionalização do
docente do ensino superior. É
evidente, porém, que não pode
haver profissionalização do ensino sem as alavancas essenciais
que constituem a formação –
inicial e contínua – e sem a profissionalização dos ofícios de formador. Os trabalhos sobre a
profissionalização do ofício de
professor assinalam que, na melhor das hipóteses, ele está em via
de profissionalização (Perrenoud,
1993), que os critérios de profissionalização – no sentido da
transformação do ofício em profissão – tal como foram destacados por Lemosse (1989) e Tardif
(2002), ainda estão longe de ser
preenchidos. Inclusive, em mais
de um país, o ofício de professor
está na encruzilhada entre uma
possível forma de proletarização
e um engajamento decisivo na
via da profissionalização (Hargreaves, 2002).
Ainda que estejamos diante de
uma tendência internacional
(Tadif, Lessard e Gauthier, 1998),
a corrente de profissionalização
não é contestada; ela requer estratégias, instituições e atores.
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Os trabalhos sobre
a profissionalização
do ofício de
professor assinalam
que, na melhor das
hipóteses, ele
está em via de
profissionalização
É possível pensar a
formação dos professores, pensando
e repensando
constantemente à
luz das ciências
humanas, as
práticas pedagógicas, a estrutura e
funcionamento dos
cursos, das escolas
e dos sistemas
educativos
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Qual é então o lugar dos formadores de professores no processo,
como eles se situam nessa corrente de profissionalização, como
contribuem para isso e estariam
eles próprios em via de profissionalização? (Altet & Perrenoud
2003, p.10).
Aprofundar a discussão nas
questões dos processos formativos é deparar-se com a construção dos Saberes Docentes como
percurso indispensável para a
profissionalização do ensino. Os
Saberes como fundamentos de
uma prática pedagógica que
identifica a categoria docente,
acaba por promover a competência, facilitar o exercício da
autonomia e profissionalizar o
professor. Podem ser concebidos
como uma teoria de argumentação que justifica a tradição pedagógica do professor. Os Saberes
Docentes constroem as concepções que definem a prática pedagógica do professor de forma
individualizada e original, e são
provenientes de diferentes fontes. Perrenoud (1993) enfatiza
que só é possível pensar a formação dos professores, pensando e repensando constantemente
à luz das ciências humanas, as
práticas pedagógicas, a estrutura
e funcionamento dos cursos, das
escolas e dos sistemas educativos. Como se percebe, é preciso
antes de tudo entender a complexidade do ensino, uma atividade caracterizadamente plural
e interativa.
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Num ato de “realismo inovador” que considera desde o peso
dos valores sociais, da profissão,
das crises de origens diversificadas da escola à falta de pesquisa e de reflexão dos professores, Perrenoud (1993) ainda
destaca que os aspectos da profissionalização não podem ser considerados e controlados sem que
a questão dos Saberes Docentes tenha uma situação didática definida acadêmica e pedagogicamente. Ele demonstra a necessidade
de considerar no processo
educativo-formativo, a diversidade dos indivíduos envolvidos no
ensino revelando a importância à
gestão das diferenças e do coletivo, na formação profissional.
Gomez e Sacristan (1998)
também dão ênfase à preocupação com o coletivo da escola,
quando discutem como a mesma
pode converter–se num contexto
significativo de aprendizagem, se
assume uma configuração estruturalmente artificial, distante da
vida e dos problemas relevantes
da comunidade em nível político
social e cultural, no cotidiano das
salas de aula. Dizem os autores,
que a ação pedagógica exercida
pelo professor, entendida como
complexa, revela a necessidade
de um reservatório de conhecimentos de ensino por parte do
docente, para a realização da própria tarefa educativa. É necessário que o docente domine o
conteúdo, tenha talentos, bom
senso, seja dotado e deixe fluir
sua intuição, acumule experiências e assimile uma cultura geral.
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Podemos considerar os Saberes Docentes como doutrinas,
concepções produzidas a partir
de reflexões sobre a prática educativa, formando as teorias pedagógicas. Para Fernandes (1996).
Conhecimento
essencialmente
prático que resulta
da integração de
saberes experienciais e saberes
teóricos
A ação
pedagógica
exercida pelo
professor,
entendida como
complexa, revela a
necessidade de um
reservatório de
conhecimentos de
ensino por parte
do docente
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a prática docente e a formação do
educador têm um eixo importante:
o Saber de Experiência como expansão de um Saber Social. Daí a
necessidade de trabalhar esse eixo e
suas relações com os Saberes de
Formação e os saberes Curriculares. A relação dos Saberes com a
prática, com a ação, lembra o conceito de práxis. O ator social dessa
práxis é o professor.
Uma contribuição muito importante para o estudo do conhecimento profissional dos professores surge com o trabalho de
Elbaz (1983). Para esta autora,
trata-se de conhecimento essencialmente prático que resulta da
integração de saberes experienciais e saberes teóricos (relativos
à sua disciplina de ensino, ao desenvolvimento humano, à aprendizagem e à teoria social) integrados pelo professor individualmente
em termos de valores e crenças pessoais e orientados para a sua situação prática (p. 5). Este conhecimento inclui, assim, a percepção
de diferentes estilos de aprendizagem, interesses, necessidades, pontos fortes e pontos fracos
dos alunos e um repertório de
ensino e formas de gerir a sala de
aula. Inclui também o conhecimento da estrutura social da escola e o que esta requer para a
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sobrevivência e para o sucesso,
bem como o conhecimento da
comunidade em que a escola se
insere e o que ela rejeita ou é capaz de aceitar. Apoiando-se no
estudo em profundidade do caso
de uma professora, Elbaz considera diversos componentes do
conhecimento prático, incluindo
o conhecimento de si mesma e do
contexto de ensino, o conhecimento do conteúdo, do desenvolvimento curricular e do
ensino, propondo um interessante modelo que estrutura esse
mesmo conhecimento em imagens, princípios e regras práticas.
A importância de se dominar
bem os conteúdos que se ensina é
desde há muito reconhecida. A
importância de uma formação
pedagógica geral é uma preocupação mais recente, mas
também já com significativa expressão em muitos programas de
formação. Cabe a um outro autor,
Shulman (1986), o mérito de
chamar a atenção para a importância de um terceiro domínio,
de algum modo a meio caminho
entre aqueles dois: o conhecimento
didático do conteúdo, que apresenta como a capacidade de compreensão profunda das matérias de
ensino, permitindo encontrar as
maneiras mais adequadas de
apresentá-las aos alunos de modo
a facilitar a aprendizagem. Este
conhecimento compreende por
isso, nas suas palavras, as formas
mais úteis de representação das idéias, as analogias mais importantes, as
ilustrações, exemplos, explicações e
demonstrações, numa palavra, a forRevista de Educação do Cogeime
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O conhecimento
na ação é o
componente
inteligente que
orienta toda a
atividade
humana,
manifestando-se
no saber-fazer
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ma de representar e formular a
matéria para a tornar compreensível
(p.9). Este autor não se limita a
estudar o conhecimento de
natureza proposicional, mas sublinha também a existência do
conhecimento de casos (isto é, o
conhecimento muito detalhado
de situações concretas) e do conhecimento estratégico (o conhecimento que informa a tomada
de decisões). Defende que estes
diversos tipos de conhecimento
não podem ser ensinados nas instituições de formação, mas têm
de resultar da elaboração pessoal
dos próprios professores.
Apesar de referir uma componente estratégica do conhecimento, Shulman dá, sobretudo,
atenção ao conhecimento proposicional. Ora, o saber profissional
dos professores exprime-se especialmente na ação, em primeiríssimo lugar na prática pedagógica,
mas também nas restantes atividades escolares e mesmo extraescolares em que está envolvido.
Um outro autor, Schön (1983),
chama a atenção para a importância do estudo deste tipo de conhecimento, o conhecimento na ação que
contrapõe ao conhecimento formal
e descontextualizado que constitui
o essencial do saber escolar. O conhecimento na ação é o componente inteligente que orienta toda a atividade humana, manifestando-se
no saber-fazer. Nesta perspectiva,
há um conhecimento em qualquer
ação inteligente, ainda que ele,
fruto da experiência e da reflexão
anteriores, se tenha consolidado em
rotinas ou em esquemas semi-au-
A importância de
uma formação
pedagógica geral
é uma preocupação mais
recente, mas
também já com
significativa expressão em
muitos programas
de formação
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tomáticos. Tem uma natureza
intuitiva e muitas vezes não é
facilmente explicitável pelos seus
detentores – o que torna a sua
transmissão particularmente problemática – mas não é por isso
menos decisivo na prática
profissional.
Vale ainda lembrarmos do
fato de que a resolução dos conflitos que constantemente surgem
na atividade de qualquer professor pode processar-se por duas
formas
fundamentais:
por
acomodação ou por reflexão. No
primeiro caso, procura-se simplesmente a solução mais simples
e imediata para o conflito. No
segundo caso, procura-se vê-lo de
diversos ângulos, analisando-o à
luz de uma ou várias perspectivas teóricas, pensam-se os prós e
os contras de diversas soluções e
só então se toma uma decisão. A
reflexão pode desenvolver-se a
vários níveis, incluindo: a) a análise de técnicas que melhor permitam concretizar certos objetivos, b) a análise das práticas
pedagógicas, em termos globais,
e do seu valor em relação aos objetivos propostos e c) a análise de
semblante mais fundamental,
debruçando-se sobre os valores e
propósitos essenciais da ação
educativa. Nos dois primeiros
casos, os objetivos informam a reflexão sem serem necessariamente
postos em causa; no terceiro caso,
eles são o próprio objeto de análise.
Schön (1983) distingue diversas formas de reflexão, referindose em especial a reflexão na ação e
a reflexão sobre a ação. A “reflexão
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A “reflexão na
ação” é um
processo de
diálogo com uma
situação problemática que exige
uma intervenção
concreta e que se
processa de uma
forma fortemente
intuitiva
A reflexão parte
sempre do
confronto de uma
prática com um
quadro de
referência teórico
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na ação” é um processo de diálogo com uma situação problemática que exige uma intervenção concreta e que se processa de
forma fortemente intuitiva. Tratase de uma análise sem o cuidado
e o distanciamento de um
escrutínio mais rigoroso e sistematizado, mas com a riqueza da
captação viva dos múltiplos
fatores intervenientes e com as
vantagens da possibilidade de
intervenção imediata, ligando
elementos racionais e afetivos.
Por outro lado, a “reflexão sobre
a ação” desenvolve-se num momento posterior à própria ação,
processando-se de forma formalizada, com apoio da linguagem e
por isso com outra possibilidade
de rigor. Tem lugar, muitas vezes, a partir de discussões e trocas de experiências entre professores preocupados com
problemas comuns.
Em qualquer caso, a reflexão
parte sempre do confronto de
uma prática com um quadro de
referência teórico, que pode ser a
reapreciação dos objetivos
inicialmente fixados ou o
confronto com outras perspectivas e valores. Por isso, é tão essencial a explicitação de objetivos,
propósitos,
intenções
inerentes, por exemplo, à prática
de uma metodologia de projetos.
E, também, por isso, é tão importante o contato com múltiplas
fontes de informação – livros, revistas, outros professores ou
mesmo parceiros exteriores ao
sistema educativo – que podem
proporcionar contatos estimuAno
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lantes, potencializadores de novas perspectivas de análise.
A reflexão permite uma progressiva explicitação (e conseqüente conscientização) do “conhecimento na ação”. Ao mesmo
tempo, conduz à identificação de
quadros teóricos relevantes para
a análise de situações práticas.
Um professor reflexivo vive permanentemente num ciclo, da prática e da teoria à reflexão, para
voltar de novo à teoria e à prática. A teoria é fundamental para o
alargamento de perspectivas e
para indicar linhas condutoras da
reflexão. A prática permite o
envolvimento ativo do próprio
professor, proporcionando uma
experiência concreta a partir da
qual é possível refletir. A reflexão
estimula novos interesses, chama
a atenção para novas questões e
possibilita uma prática mais
segura, mais consciente e mais
enriquecida.
O professor está longe de ser
um profissional acabado e amadurecido no momento em que
recebe a sua habilitação profissional. Os conhecimentos e competências adquiridos antes e
durante a sua formação inicial
são manifestadamente insuficientes para o exercício das suas funções ao longo de toda a carreira.
Por outro lado, o professor não
pode ser visto como um mero receptáculo de informações – pelo
contrário, deve ser encarado como um ser humano com potencialidades e necessidades diversas, que importa descobrir,
valorizar e ajudar a desenvolver.
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Um professor
reflexivo vive permanentemente num
ciclo, da prática e
da teoria à
reflexão, para voltar de novo à
teoria e à prática
O professor não
pode ser visto
como um mero
receptáculo de
informações
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O desenvolvimento profissional é
assim uma perspectiva em que se
reconhece a necessidade de crescimento e de aquisições diversas,
processo em que se atribui ao
próprio professor o papel de sujeito fundamental.
Diversos fatores contribuíram
para a emergência desta nova visão do professor como profissional em permanente desenvolvimento. Em primeiro lugar,
mudanças crescentes nas condições sociais, implicando mudanças no sistema educativo (nos
objetivos da educação, nos currículos, nos alunos, no próprio
conceito de escola). Em segundo
lugar, mudanças na teoria educacional, proporcionando novas
orientações didáticas e novas
perspectivas para fundamentar a
ação do professor. E, finalmente,
mudanças na própria visão do
papel do professor, reconhecendo-se agora a complexidade e dificuldade de sua função.
Apesar de ser uma idéia relativamente nova, o desenvolvimento profissional dos professores entrou na ordem do dia e
depende de diversas condições
que se referem, sobretudo, ao
próprio sujeito, ao seu contexto
institucional e aos recursos disponíveis. Nessa perspectiva,
torna-se imprescindível que se
criem dispositivos e contextos
que levem o professor a uma
atitude
conseqüente
de
investimento profissional ao longo de toda a sua carreira. É a ele
que cabe decidir quando e como
quer estudar determinado
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assunto ou envolver-se nesse ou
naquele projeto.
Assim, a questão não é a de
proporcionar estes ou aqueles saberes formalizados nem como
promover a mudança das suas
concepções e práticas para um
quadro que lhes é totalmente
alheio. Trata-se de lhes estimular
uma reflexão sobre o seu posicionamento profissional, tomando
uma nova postura de iniciativa
no equacionar e resolver os problemas que se colocam no seu dia
a dia docente. Não se trata de
diminuir a importância da didática, mas de a levar a contemplar,
de pleno direito, as problemáticas
dos professores, considerando-as
como questões com lógica própria, deixando de ver a prática
profissional como mero terreno
de aplicação dos resultados e
perspectivas elaboradas pelas teorias educativas.
A construção dos saberes pedagógicos existentes até agora se
constituiu tal como a dos saberes
científicos: a partir da pesquisa
dos problemas, das questões,
dos desafios da própria realidade. Esse é um processo a ser
por nós continuado, no exercício
cotidiano da docência. Para se
constituir docente no mundo de
hoje, o professor universitário
precisará recorrer ao mesmo
procedimento de pesquisa, necessário aos saberes científicos,
efetivados em ações que fundamentem os processos de pesquisa. A relação hoje necessária
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entre os saberes científicos e pedagógicos passa pela análise das
experiências vividas nas instituições de ensino, nas salas de aula,
tomando-as como ponto de
partida e de chegada da reflexão
e da construção processual como
profissional docente.
Morin nos lembra que ciência
progride entre as teorias e os fatos
(2000, p.149); os saberes pedagógicos assim como os científicos
também progridem entre as teorias e os fatos... os fatos que vivemos a cada dia podem ser nosso
referencial na construção da docência no ensino superior.
Segundo ele
Uma nova postura
de iniciativa no
equacionar e
resolver os
problemas que se
colocam no seu
dia a dia docente
Os fatos que
vivemos a cada
dia podem ser
nosso referencial
na construção da
docência no
ensino superior
... a ciência é a aventura da razão
humana que tenta dialogar com os
dados e fatos (...) a ciência não é a
razão somente porque a razão sozinha faz os sistemas muito lógicos
nos quais ela se fecha. A ciência caminha sobre quatro patas. As duas
patas dianteiras são a imaginação e
a verificação, as duas patas traseiras, o racional e o empírico. De
repente, quatro unipatistas diferentes podem fazer um excelente
cientista (2000, p. 146).
A metáfora usada pode servir
de apoio para fecharmos essas reflexões com a seguinte pergunta
para todos que atuam no ensino
superior: quais serão as nossas
bases, os suportes que precisamos para nos constituirmos
como competentes professores
universitários?
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