ENTENDENDO A IMPLEMENTAÇÃO DE SISTEMAS DE MELHORIAS DE DESEMPENHO NAS ORGANIZAÇÕES Autoria: Darlan José Roman, Rolf Hermann Erdmann Resumo O objetivo deste artigo é apresentar um modelo teórico-conceitual capaz de explicar o processo de implementação de sistemas de melhorias nas organizações. A metodologia utilizada foi a Grounded Theory ou Teoria Fundamentada nos Dados. Foram feitas onze entrevistas em cinco organizações de manufatura. Os resultados mostram que implementar sistemas de melhorias em organizações significa, dentre outros aspectos, compreender o valor do envolvimento das pessoas, a importância de obter e gerenciar o conhecimento, a necessidade da mudança de cultura e a capacidade de planejamento das atividades e gerenciamento dos resultados. 1 1 Introdução Testemunhou-se nos últimos anos um crescimento considerável de trabalhos tratando do tema de mensuração e avaliação de desempenho organizacional. Contudo, se constata que existe ainda muito espaço para o avanço e desenvolvimento neste campo de pesquisa, principalmente no que diz respeito ao enfoque na fase de operacionalização. Destarte, a evolução e busca de maturidade nesta área de estudo está ligada diretamente à necessidade de resposta aos insurgentes questionamentos e às demandas especiais de aprofundamento conceitual e explanatório (WAAL; COUNET, 2009; BOURNE; KENNERLEY; FRANCOSANTOS, 2005; NEELY, 2005; NEELY et al., 2000; CARNEIRO DA CUNHA, 2011). Diante disso, apesar do grande número de publicações sobre sistemas de avaliação desempenho, ainda se carece de abordagens que se preocupem com os problemas e dificuldades associados com a operacionalização dos resultados (implementação das melhorias), sendo que há evidências sobre altos níveis de insucesso das aplicações (BOURNE et al., 2003). Nestes termos, a temática que aborda a avaliação do desempenho deve evoluir no sentido de ultrapassar a noção da mensuração. Ou seja, é preciso além de medir, saber como usar, planejar e administrar os resultados emergentes. Destarte, levando em conta a considerável variedade de modelos de avaliação existentes, que expressam a intenção de apoiarem as empresas no processo de manutenção e aquisição de diferenciais competitivos, sente-se falta de abordagens que contemplem o processo de implementação e monitoramento dos resultados esperados, ou seja, há escassez de estudos que expliquem como traduzir as intenções dos modelos em planos de ações, implementação de resultado e monitoramento constante. Como evoluir de modelos de mensuração e avaliação para um horizonte de administração de desempenho. A escassez de estudos sobre aspectos determinantes do sucesso e insucesso de implementação de sistemas de avaliação de desempenho se caracteriza como uma deficiência marcante no conhecimento sobre desempenho organizacional. Contudo, há indícios na literatura que sugerem que alguns problemas e dificuldades na implementação dos sistemas começam a serem reconhecidos e podem estar ligados com as mudanças características que ocorrem no ambiente das organizações (BOURNE et al., 2003). Diante disso, alguns pesquisadores (FINE; HAX, 1985; SEGERSTROM, 2003; ALLIO, 2005) tem direcionado seus estudos no âmbito da implementação e geração de projetos de gerenciamento. Estas abordagens descrevem processos de implementação e fornecem dicas dispersas sobre como gerenciar os processos com sucesso. Contudo, apesar dos esforços mencionados acima, há escassez de pesquisas que possam fornecer para os administradores abordagens práticas e funcionais que efetivamente facilitem a implementação dos resultados ofertados pelos mais diversos modelos de mensuração e avaliação de desempenho (TAN; PLATTS, 2009). Nestes termos, o objetivo deste artigo é apresentar um modelo teórico-conceitual capaz de explicar o processo de implementação de sistemas de melhorias nas organizações. A construção do modelo se deu a partir da investigação de casos reais que tiveram experiência na aplicação de modelos de avaliação de desempenho. A metodologia utilizada foi a Grounded Theory ou Teoria Fundamentada nos Dados, seguindo-se os procedimentos sugeridos por Strauss e Corbin (2008), a fim de se gerar uma teoria substantiva. Com os resultados apresentados, espera-se contribuir para o fortalecimento teórico sobre avaliação de desempenho e análise organizacional. Conforme Waal e Counet (2009), os motivos que levam ao alto índice de insucesso na operacionalização de sistemas de avaliação de desempenho precisam ser mais bem compreendidos. Adicionalmente, tenta-se contribuir para o avanço metodológico na área de administração da produção, uma vez que os estudos que seguem o caminho qualitativo se concentram na utilização do método de estudo de caso e, 2 em menor escala, se utilizam da pesquisa-ação (MARCHI; ERDMANN; DELLAGNELO, 2011; ROMAN; MARCHI; ERDMANN, 2012). Métodos qualitativos como a Grounded Theory são incipientes nesta área e o emprego deste método se restringe a trabalhos pontuais. 2 Implementação de Sistemas de Melhorias de Desempenho A literatura relacionada ao tema de avaliação de desempenho tem apresentado duas fases principais. A primeira fase inicia em meados de 1880 e se estende até o período de 1980. Na primeira fase a preocupação estava concentrada sobre os aspectos financeiros, como lucro, retorno sobre o investimento e produtividade. Com o mercado cada vez mais globalizado e a emergência de novas técnicas e filosofias de produção, revelou-se que os sistemas de avaliação de desempenho tradicionais apresentavam muitas limitações e se fazia necessário a configuração de novos modelos. Algumas limitações dos sistemas tradicionais podem ser descritas como a ênfase em dados contábeis, inobservância da estratégia corporativa, eram inflexíveis e desconsideravam as necessidades dos clientes (GHALAYINI; NOBLE, 1996). Conforme explicam Kaplan e Norton (1992), sistemas de avaliação de desempenho tradicionais, baseados em condições financeiras e contábeis como retorno sobre investimento e lucro por ação, podem fornecer sinais enganosos para a melhoria contínua e inovação, que se tornaram demandas competitivas. Desta forma, observa-se que os modelos tradicionais trabalharam bem para a era industrial, mas ficaram fora de contexto com as habilidades e competências que as empresas começaram a ter que dominar. As diversas inovações que se seguiram nos sistemas de avaliação foram também decorrentes, conforme explica Neely et al. (2000), da emergência de críticas contundentes nos anos de 1970 e 1980 feitas por importantes figuras, como Skinner. Nesta conformidade, Carneiro da Cunha (2011) comenta que as principais críticas sobre os métodos financeiros eram: a) falharem quanto ao estabelecimento de perspectivas de longo prazo; b) estarem ancorados sobre situações momentâneas de um passado da organização; c) não apresentarem uma visão sistêmica da organização, ignorando, inclusive, as condições operacionais do sistema. Na tentativa de superar as críticas, surgem modelos de avaliação de desempenho que exploram uma visão mais equilibrada: Keegran, Eiler e Jones (1989) propõe um equilíbrio entre medidas internas e externas e entre medidas financeira e não financeiras; Cross e Lynch (1989) descrevem uma pirâmide de medidas que busca desempenho por meio das hierarquias da organização; Fitzgerald et al. (1991) fazem uma distinção entre os resultados e seus determinantes; e Kaplan e Norton (1992) apresentam as quatro perspectivas do Balanced Scorecard. Surgem então os modelos multi-dimensionais, desenvolvidos para fornecer equilíbrio por meio da inclusão de medidas de fatores externos e internos e financeiros e nãofinanceiros. As medidas são então desenvolvidas para oferecer uma indicação prévia do desempenho futuro do negócio, bem como registrar o que foi conseguido no passado (BOURNE et al., 2000). Inicia-se assim a segunda fase dos estudos sobre avaliação e mensuração de desempenho organizacional. A segunda fase iniciou no final dos anos 1980 como resultado também das mudanças eminentes no mercado global. Empresas começam a perder espaço no mercado para competidores estrangeiros que estavam estruturados para fornecer produtos com alta qualidade, baixo custo e maior variedade. Os sistemas de avaliação de desempenho nãotradicionais são caracterizados como tendo medidas alinhadas com a estratégia organizacional, medidas essencialmente não-financeiras, flexíveis e capazes de se adaptar para atender as exigências de mercados dinâmicos (GHALAYINI; NOBLE, 1996). 3 As publicações recentes sobre avaliação de desempenho podem ser classificadas em cinco grandes fases. Nos anos 1980 o tema dominante foram as discussões sobre sistemas de medição de desempenho. Nesta fase, envolve-se um processo de identificação de problemas, onde se reconhece e se discute as fraquezas dos sistemas e os impactos sobre as organizações. Os anos 1990 podem ser caracterizados em termos da busca por frameworks capazes de fornecer maneiras úteis de resolver problemas previamente identificados. A terceira fase surge no final dos anos 1990 e se caracteriza pelos métodos de aplicação, envolvendo a busca por maneiras em que os frameworks propostos poderiam ser utilizados. Posteriormente, seguiu-se com o aumento do número de organizações que adotaram os modelos de desempenho propostos (especialmente o balanced scorecard). Este fato tornou mais fácil a coleta de dados empíricos relacionados aos impactos da aplicação, resultando em questões relacionadas à validade teórica e metodológica dos modelos. Recentemente, se desenvolve a fase de verificação teórica, onde as questões levantadas na empiria causam novos problemas para serem identificados, voltando-se a primeira fase de identificação de problemas (NEELY, 2005). Apesar da quantidade considerável de publicações abordando o tema de avaliação e mensuração de desempenho organizacional, fica claro que há concentração de trabalhos para determinados métodos e autores (MARR; SCHIUMA, 2003; NEELY; GREGORY; PLATTS, 2005). Nesta linha, Marr e Shuma (2003) comentam que há falta de um corpo coesivo de conhecimento na área. Carneiro da Cunha (2011) ressalta a necessidade do desenvolvimento de trabalhos que busquem a maturidade deste campo de estudo e que tragam respostas aos questionamentos e demandas ainda não contemplados. O índice de insucesso na implementação de programas de melhoria de desempenho chama a atenção. Conforme explicam Waal e Counet (2009), entre 60% e 70% das iniciativas não atingem os objetivos iniciais. As possíveis razões para os resultados negativos são: falta de comprometimento da alta administração, inexistência de uma cultura de administrar o desempenho, falta de prioridade e abandono do programa após a troca de gerência, as pessoas envolvidas não se sentem beneficiadas com a adoção do programa (WAAL; COUNET, 2009; NEELY; BOURNE, 2000). Contudo, há discordâncias sobre os reais motivos para este alto índice de falhas. O conflito entre teoria e prática se mostra latente neste campo de estudo (WAAL; COUNET, 2009). O grande desafio das condições atuais relacionadas a administração de desempenho é como extrair o máximo dos dados obtidos pela aplicação dos sistemas de mensuração e avaliação. Isso passa, necessariamente pela fortificação do processo de desenvolvimento dos modelos e, principalmente, no entendimento e superação das dificuldades recorrentes do processo de implementação. Sobre este último aspecto, além do que já foi dito anteriormente, será importante considerar questões políticas, infraestruturais e de foco (NEELY; BOURNE, 2000). O modelo de Kaplan e Norton– o conhecido Balanced Scorecard – tornou-se o mais conhecido e utilizado sistema de avaliação de desempenho na conjectura atual (NEELY et al., 2000; NEELY, 2005; MARR; SCHIUMA, 2003; BOURNE; KENNERLEY; FRANCOSANTOS, 2005; BOURNE et al., 2003). No entanto, Neely, Gregory e Platts (2005) fazem uma ressalva, entendendo que o mesmo contem uma falha grave porque não está apto para responder a uma das questões mais fundamentais: o que a concorrência está fazendo (a perspectiva da concorrência). Nesta conformidade, Marr e Schuma (2003) admitem que também parece haver uma significante falta de informação sobre a fundamentação teórica do BSC. Para Rompho (2011) uma das principais causas do insucesso na implementação do BSC é a frequente mudança na estratégia das organizações. Sem conhecimento sólido sobre os problemas que levam a estes números indesejáveis, organizações que estão tentando implementar sistemas de melhorias de 4 desempenho correm o risco de entrar no círculo vicioso que resultará na ineficiência, projetos inacabados e abandono do programa. Nestes termos, Waal e Counet (2009) destacam a importância do desenvolvimento de pesquisas que abordem os problemas durante a fase de implementação, a fim de oferecer subsídios que sejam capazes de melhorar as chances de se conseguir resultados mais gratificantes. Estendendo essa deficiência de estudos para á área de gerenciamento e formulação de estratégias de produção, Tan e Platts (2004) entendem que, embora muita pesquisa haja sido desenvolvida, há pouco material disponível que aborde o processo de implementação de resultados, ou seja, os gestores e acadêmicos sentem falta de orientação para traduzir os objetivos de desempenho das organizações em planos de ação, implementação e monitoramento. Nesta linha, os resultados obtidos por Done, Voss e Rytter (2011) indicam que as organizações não conseguem sustentar bons índices de desempenho após as fases iniciais de intervenção e implementação de programas de melhoria. Logo, percebe-se as fragilidades das organizações no sentido de desenvolverem capacidades necessárias para manter bons índices de desempenho no decorrer do tempo. Desta forma, parece que as propostas existentes não oferecem condições para que as empresas “caminhem com as próprias pernas” no período pós-aplicação. Sendo assim, um dos grandes desafios para o futuro, conforme explicam Radnor e Barnes (2007) é como desenvolver um sistema de administração de desempenho para as condições operacionais que, além de ser gerenciável e coerente, contemple aspectos sistêmicos em vez de produzir medidas desconexas de tarefas e atividades operacionais. O caminho para isso passa necessariamente pelo sucesso durante a fase de implementação. Diante disso, modelos e organizações que focam exclusivamente na mensuração e, por vezes, na avaliação de desempenho, sem entender que as medidas são apenas parte do processo, deixam escapar a oportunidade de ganhar o controle e o domínio das condições que propiciam a criação de um contexto orientado para a melhoria do desempenho e a busca pelo sucesso dos negócios (LEBAS, 1995). 3 Metodologia Este estudo se caracteriza como qualitativo. Adotam-se procedimentos que se caracterizam como analíticos, onde se objetiva a geração de um modelo teórico explicativo e interpretativo. Isso será conseguido a partir da construção de uma teoria substantiva a respeito do processo de implementação de sistemas de melhorias de desempenho em unidades organizacionais que vivenciaram experiências de implementação dos resultados. Conforme explicam Cassiani, Caliri e Pelá (1996) a teoria fundamentada nos dados (TFD) é um tipo de pesquisa interpretativa que considera a compreensão de um processo intelectual pelo qual o pesquisador (o sujeito) adquire o conhecimento a respeito do significado da ação do pesquisado (o objeto). Os pesquisados são pessoas-chave que já tiveram experiência na implamentação de modelos de avaliação de desempenho e operacionalização dos resultados. Foram entrevistados onze profissionais de cinco empresas de manufatura. As entrevistas tiveram duração média de quarenta minutos e foram realizadas nos meses de janeiro e fevereiro de 2013 (primeiro grupo amostral) e abril de 2013 (segundo grupo amostral). Todas as empresas estão localizadas no estado de Santa Catarina. Para o primeiro grupo amostral foram conduzidas entrevistas intensivas, sem o auxilio de roteiro de entrevistas, ou seja, sem categorias pré-estabelecidas. Para o segundo grupo amostral, utilizou-se um roteiro de entrevista construído a partir dos resultados que emergiram do primeiro grupo. 5 Importante ressaltar que, conforme Strauss e Corbin (2008), na TFD não existe um número pré-definido de participantes, sendo que os mesmo são definidos conforme os resultados que emergem dos dados. Por exemplo, após a realização das entrevistas com o primeiro grupo amostral, os resultados emergentes sinalizaram para a necessidade de coletar dados numa empresa de grande porte, ou seja, a análise dos dados de um grupo amostral indica as necessidades de coleta de dados para a próxima ida a campo. Para análise dos dados foram utilizados os seguintes procedimentos de análise: microanálise, a codificação aberta, a codificação axial e a codificação seletiva, conforme sugerido por Strauss e Corbin (2008). Esses procedimentos consistiram na transcrição das entrevistas, codificação (linha a linha e trecho a trecho), agrupamento dos códigos e criação de categorias, definição das propriedades, dimensões e relações entre categorias e construção do modelo teórico. Para este último, utilizou-se a ferramenta analítica definida por Strauss e Corbin (2008) como paradigma. O paradigma é a representação do processo social investigado e contempla as condições, ações/ interações e conseqüências. Com a finalidade de facilitar o processo de organização e categorização dos dados, durante o processo de análise, foi utilizado um software de análise de dados qualitativos, a saber, o NVivo, versão 9, desenvolvido pela QSR International. Esse software, importante destacar, se encontra instalado, licenciado e à disposição no núcleo de pesquisa ao qual esse pesquisador faz parte. Conforme explica Lage (2011), o NVivo é um dos softwares mais utilizados no ambiente acadêmico brasileiro, tendo sido adotado por centro de pesquisa de grande parte das universidades, notadamente, a Unicamp, a USP e a URFGS e, principalmente nas áreas de ciências sociais e saúde. O modelo teórico apresentado a seguir ainda não atingiu a saturação teórica, ou seja, o momento em que se percebe que as idas a campo não proporcionam avanços para o modelo. Contudo, neste estágio de pesquisa já é possível apresentar as principais categorias, suas relações e o fenômeno social denominado de paradigma. Nestes termos, a seleção futura de novos grupos amostrais se mostra necessária para o fortalecimento dos resultados. 4 Resultados e Análise dos Dados Nesta seção são apresentados os resultados conseguidos após a coleta e análise de dados com dois grupos amostrais. O primeiro grupo amostral foi constituído por três empresas e teve um total de seis entrevistas. Os entrevistados foram: diretor de produção, gerente de produção, gerente administrativo, gerente de engenharia e analistas de processos (dois). As entrevistas transcritas foram importadas para o software NVivo e o processo seguinte foi a realização das codificações. Ao final deste processo foram gerados 322 códigos. O próximo passo foi o agrupamento dos códigos. Com este processo criaram-se as categorias, ou seja, elementos conceituais que explicam o fenômeno. Foram criadas dezesseis categorias e suas respectivas subcategorias. Estas categorias serviram como base para a elaboração do roteiro de entrevista para a segunda ida a campo. Para o segundo grupo amostral foi selecionada uma empresa de grande porte, com mais de 1200 funcionários, e foram entrevistados cinco profissionais: gerente de manutenção, coordenador de supervisão, analista de TI e gerentes de projetos (dois). As entrevistas deste grupo confirmaram os resultados preliminares com algumas sugestões e recomendações, como a junção de algumas categorias e relações entre as categorias. Como decorrência o modelo apresentado consiste de doze categorias e suas respectivas subcategorias. A seguir são descritas as categorias que emergiram dos dados. Agregar ganho para a companhia. As empresas buscam constantemente num sistema de melhoria de desempenho ter um retorno econômico do projeto. Adicionalmente, ressalta-se a preocupação em aliar retorno econômico do programa de melhoria com um retorno sócio6 ambiental, um retorno em questões de segurança no trabalho e melhora na produtividade. Logo, a implementação de modelos deve ser uma coisa que influencie positivamente no crescimento da empresa. As subcategorias são agregar valor ao produto, obter retorno econômico e aumentar a produtividade. Conhecer a realidade da empresa. Ressalta a importância de conhecer a vivência da empresa, de analisar e levantar dados sobre a situação atual antes de tomar qualquer decisão. O entendimento do processo produtivo, a realidade dos departamentos e o tamanho da empresa permitem o aproveitamento dos pontos fortes existentes, bem como a adequação destes com os conceitos estabelecidos pelo modelo de avaliação. Por outro lado, a inobservância destes pontos pode levar ao insucesso do modelo, por exemplo, pela necessidade de investimentos miraculosos e mudança radical de estrutura. As subcategorias são limitações da estrutura, tamanho da empresa e processo produtivo. Criar uma cultura na empresa. Criar uma cultura de mudança e de melhorias aparece como um ponto importante para o sucesso da operacionalização de modelos. Reuniões da administração e funcionários em nível de gerência e operacional devem acontecer para, gradativamente, ir conscientizando e ajudando a mudar a cultura até que se torne uma rotina. Uma cultura fraca neste sentido pode ocasionar resistência das pessoas, inclusive da alta administração. As subcategorias são enfrentar a resistência, mudar a cultura das pessoas, dificuldade de descentralização de poder. Desenvolver um planejamento. Uma condição para se ter uma experiência bem sucedida na operacionalização de modelos é o planejamento. Este, de preferência, deve estar alinhado com o planejamento estratégico da organização. Nesta etapa preliminar são definidos aspectos fundamentais como recursos disponíveis, tempo necessário, planos de ação, custos, prazos, necessidade de investimento e particularidades de cada ação. Envolver as pessoas nesta etapa é importante para que se consiga comprometimento necessário durante a fase de implementação. As subcategorias são: desenvolver planos de ação, estabelecer prazos, recursos disponíveis e necessidade de investir. Envolver as pessoas. São as pessoas que fazem a coisa acontecer. Um dos segredos para o sucesso da implantação é as pessoas acreditarem na iniciativa e se envolverem desde o início. O envolvimento traz consigo a criatividade, o comprometimento e é capaz de otimizar recursos. O pessoal de chão de fábrica, por exemplo, deve se sentir dono do próprio negócio, participar de reuniões e apresentar os resultados. Já o pessoal a nível gerencial deve estar convencido de que a iniciativa vai funcionar e trazer retornos. Por outro lado, o envolvimento pode não acontecer se as coisas simplesmente forem impostas. As subcategorias são: criar um ambiente desafiador, perceber um retorno e não impor as coisas. Gerenciar os resultados. Analisar e cobrar os resultados durante a fase de operacionalização do modelo são atividades elementares. Planos de ação não finalizados podem gerar desconfiança e aumentar a resistência. É importante estabelecer indicadores para comparar o antes e o depois, de forma a apresentar os avanços obtidos para que as pessoas sintam as melhorias e valorizem a iniciativa. As subcategorias são: analisar os resultados, fazer reuniões e cumprir os prazos estabelecidos. Incorporar as melhorias nas atividades. Como conseqüência, ao final de um prazo planejado, deve haver incorporação das melhorias previstas pelo modelo nas atividades. Senão, a iniciativa acaba ficando uma cosia paralela e não se dá a devida importância ao sistema de melhorias e, depois de certo tempo, há o risco de as práticas serem excluídas e voltar-se a rotina que era antes, resultando em desperdício de energia, recursos e tempo. As subcategorias são: preocupar-se com o sucesso da implantação e criar uma sistemática de funcionamento. Manter a comunicação. É relevante existir comunicação eficiente entre a administração e a parte operacional. Esse elo tem que ser forte e bem planejado, senão as 7 idéias ficam na administração e a parte operacional acaba nem sabendo do projeto que está em andamento. Na mesma linha, a troca de informações entre seções evita a transferência de gargalos. O ideal é comunicar para toda a organização sobre as iniciativas. A criação de grupos de trabalho, formado por pessoas-chave, é essencial para que se multiplique o conhecimento. As subcategorias são: comunicação entre administração e operacional, comunicação entre seções e formar grupos de trabalho. Manter o sistema funcionando. É uma conseqüência, ou seja, passada a fase de implementação o desafio é manter o sistema funcionando até que se atinja a maturidade e o sistema esteja incorporado a rotina da organização. Estabelecer um cronograma de avaliação e ter o empenho e envolvimento da alta administração são fatores importantes para que o sistema permaneça ativo e alcance a maturidade. As subcategorias são: ter um cronograma de avaliações e envolvimento da alta administração. Ter apoio da alta e média administração. O apoio da diretoria e gerência é um fator determinante para o inicio e continuidade de um programa de melhoria de desempenho. Se a direção não der importância o mesmo acaba sendo deixado de lado. A administração precisa estar convencida de que o programa vai trazer retorno, se envolver com o processo e conhecer o que está sendo feito. Os funcionários devem perceber que se tem o apoio de cima e que haverá cobrança caso os resultados sejam insatisfatórios. As subcategorias são: comprometimento da diretoria e gerência, delegação de atribuições e direção reforçando o compromisso com a causa. Ter conhecimento de como fazer. É importante dar treinamento para as pessoas e deixar claro para a direção e para os funcionários o que vai ser feito. O auxílio de profissionais de fora da empresa que sejam referência na área e que consigam aliar conhecimento teórico e prático, é fundamental para a familiarização de conceitos, técnicas e ferramentas. Ter acompanhamento das pessoas certas pode contribuir para o melhor aproveitamento do tempo e dos recursos empregados. O conhecimento sobre gestão de projetos também pode auxiliar para a obtenção de resultados efetivos. As subcategorias são: treinamento teórico e prático e seleção de consultores. Ter uma unidade de coordenação dedicada. As empresas nem sempre tem um setor para elaborar programas de melhoria e manter as iniciativas funcionando. Muitas vezes as pessoas que estão envolvidas neste processo são da área operacional, de nível de gerência e o cotidiano delas acaba se ocupando com outros assuntos e não tendo tempo suficiente para as melhorias. Desta forma, surge como fator importante para o processo de implantação manter alguém acompanhando, analisando os resultados, melhorando, modificando, conscientizando e ajudando a mudar a cultura. Essa unidade dedicada deve estar respondendo diretamente para a alta administração e ter liberdade para fazer mudanças. As subcategorias são: dedicação exclusiva e ter autonomia. As categorias apresentadas emergiram a partir dos dados brutos oriundos das entrevistas e do processo de codificação. Contudo, é possível encontrar semelhança de termos com trabalhos que usaram outros métodos, a exemplo de Waal e Counet (2009). Apesar de não ser objetivo da TFD confirmar teorias, a semelhança de resultados com a literatura confere credibilidade à teoria que emergiu dos dados. Além da elaboração de categorias, os procedimentos previstos no método da TFD permitem representar um fenômeno social a partir do esquema organizacional conhecido como paradigma (STRAUSS; CORBIN, 2008). Esse esquema permite ao pesquisador enxergar relações entre categorias e proporcionar a integração de estrutura (condições e consequências) com processo (ação/interação). Na Figura 1 ilustra-se o fenômeno social da implementação de sistemas de melhorias. As condições formam o conjunto de situações no qual o fenômeno é incorporado. As ações/interações são as respostas dos agentes aos problemas, acontecimentos ou fatos. Por 8 exemplo, para ter apoio da administração e conhecimento de como fazer é preciso envolver as pessoas e manter a comunicação. Por fim, as consequências são os resultados das condições estabelecidas e das respostas das ações/interações empreendidas. Condições 1- Conhecer a realidade da empresa 2- Desenvolver um planejamento 3- Ter apoio da alta e média Administração 4- Ter conhecimento de como fazer 5- Ter uma unidade de coordenação dedicada Ações/ Interações 1- Criando uma cultura na empresa 2- Envolvendo as pessoas Categoria Central Implementando Sistemas de Melhorias de desempenho nas Organizações 3- Gerenciando os resultados 4- Mantendo a comunicação Consequências 1- Agregar ganho para a empresa 2- Manter o sistema funcionando 3- Melhorias incorporadas nas atividades Figura 1: Modelo teórico explanatório “Implementando Sistemas de Melhorias em Organizações Fonte: Elaborado pelo autor (2013) Assim, a partir da integração das categorias, a teoria substantiva “Implementando sistemas de melhorias de desempenho nas organizações” apresenta cinco categorias como condições. Os entrevistados entendem que é fundamental a organização possuir essas características. Por sua vez, aparecem quatro categorias como ações/interações. São as respostas estratégicas dos agentes para os acontecimentos durante o processo. As três consequências representam o que acontece em uma implementação bem sucedida. A consequência “Manter o sistema funcionando” destaca a preocupação dos entrevistados com o período pós-implemetnação, ou seja, é preciso fazer a manutenção do sistema até que ele atinja a maturidade. 5 Considerações Finais O presente estudo de abordagem qualitativa teve a intenção de compreender o fenômeno da implementação de sistemas de melhorias de desempenho. Todo sistema de avaliação tem por objetivo propor e operacionalizar melhorias no ambiente organizacional. Contudo, muitas iniciativas acabam falhando no momento da operacionalização, ou seja, no momento da mudança do estado atual para o estado de melhorias. O estudo possibilitou a apresentação das principais categorias conceituais que explicam o fenômeno “Implementando sistemas de melhorias de desempenho nas organizações”. Da mesma forma, foi possível ilustrar a integração da estrutura (condições e 9 consequências) com o processo (ações/interações). Desta forma tem-se a categoria central (o fenômeno) e sua relação com as demais categorias em nível de estrutura e processo. Dessa forma, a tentativa de construir uma teoria substantiva sobre a implementação de sistemas de melhorias no ambiente organizacional traz à tona importantes contribuições no sentido de ajudar a compreender melhor as especificidades, a dinâmica e a complexidade desse recurso tão necessário para o desenvolvimento organizacional. A intenção do modelo teórico é trazer explicações sobre o funcionamento, os recursos humanos, a estrutura e as tecnologias, enfim, as facilidades e dificuldades encontradas na organização e no gerenciamento da operacionalização de sistemas de melhorias de desempenho. Destarte, a construção do modelo teórico integra e relaciona categorias para gerar entendimentos, explicar e prever fatos e fornecer diretrizes para a ação. Assim implementar sistemas de melhorias de desempenho em organizações significa, dentre outros aspectos, compreender o valor do envolvimento das pessoas, a importância de obter e gerenciar o conhecimento, a necessidade da mudança de cultura e a capacidade de planejamento das atividades e gerenciamento dos resultados. Cabe ressaltar que o objetivo deste estudo não foi apresentar resultados conclusivos, uma vez que o modelo apresentado ainda não atingiu a saturação teórica. Dessa forma, há a necessidade de novas entrevistas com novos grupos amostrais a fim de se conseguir alcançar a validação teórica e o fechamento da teoria substantiva. Apesar desta limitação, os resultados apresentados permitem chamar a atenção para o alto indicie de insucesso na implementação de melhorias nas organizações e oferece subsídios para fortalecer as discussões sobre o tema. Por fim, o estudo também se esforçou na tentativa de avançar metodologicamente na área de administração de operações, uma vez que a maioria dos estudos de natureza qualitativa nesta área é do tipo estudo de caso e, em menor escala, pesquisa-ação. Nestes termos, o emprego de novos métodos, como a Teoria Fundamentada nos Dados, acena para novas possibilidades na coleta e análise dos dados e um novo jeito de se enxergar o ambiente das operações. Referências ALLIO, M. K. A short, practical guide to implementing strategy. Journal of Business Strategy, v. 26, n. 4, p. 12-21, 2005. BOURNE, M.; KENNERLEY, M.; FRANCO-SANTOS, M. performance Managing through measures : a study of impact on performance. 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