RESUMO A instabilidade de microssatélites (MSI) é o tipo predominante de instabilidade genética presente em tumores de doentes com Síndrome de Lynch e também numa fracção (15-25%) de carcinomas esporádicos do cólon, endométrio e estômago. Na origem da instabilidade de microssatélites estão deficiências no sistema de mismatch repair (MMR) do DNA. A MSI caracteriza-se pela acumulação de mutações em sequências repetitivas do genoma, também chamadas microssatélites. Este tipo de mutação pode ser encontrado em microssatélites codificantes e não-codificantes. Nesta tese, é apresentado um estudo de MSI em tumores de pacientes com Síndrome de Lynch, com particular enfâse nos carcinomas colorectais (CRC) e endometriais (EC), e respectivos equivalentes esporádicos. No capítulo 1 são apresentadas noções gerais sobre Síndrome de Lynch, MSI, e sobre os cancros tradicionalmente associados com as deficiências de MMR. No capítulo 2 descrevemos um estudo sobre como a instabilidade de microssatélites evolui ao longo da sequência adenoma-carcinoma dos carcinomas colorectais. Considerando a frequência relativa de instabilidade dos marcadores de MSI compostos por mononucleotídeos e nos marcadores compostos por dinucleotídeos, encontrámos perfis de MSI comparáveis nos adenomas e carcinomas esporádicos. No entanto, foi possível observar diferenças nos tumores portadores de mutações em genes do sistema de MMR - os adenomas apresentam instabilidade quase exclusivamente nos marcadores com repetições de mononucleotídeos, enquanto que a frequência de instabilidade dos marcadores com repetições de dinucleotídeos é marcadamente aumentada nos carcinomas. Assim, concluimos que os perfis de MSI diferem entre casos esporádicos e casos com agregação familiar, e que a instabilidade de mononucleotídeos precede a de dinucleotídeos durante o desenvolvimento dos tumores em pacientes com Síndrome de Lynch. Por estas razões sugerimos o uso preferencial de repetições de mononuleotídeos como marcadores de instabilidade na identificação de possíveis pacientes com Síndrome de Lynch. No capítulo 3, tentámos perceber se os perfis de MSI diferem entre tumores instáveis (MSI-H) colorectais e endometriais. Para isso analisámos, para três 114 marcadores de instabilidade de mononucleotídeos e três de dinucleotídeos, a frequência de MSI, o tipo de mutação (delecção/inserção) e o tamanho das mutações, em ambos os tipos de carcinoma: colorectal (CRC) e endometrial (EC). A frequência de instabilidade de mono- e dinuleotídeos encontrada nos dois tecidos é comparável, sendo os dois tipos de marcadores afectados em níveis semelhantes. Mostrámos que o tipo de mutação é uma característica que depende do tipo de marcador e não dependente do tecido, pois observámos para ambos os tecidos quase exclusivamente delecções nos mononucleotídeos e delecções e inserções nos dinucleotídeos. O tamanho destas deleções/inserções difere entre CRC e EC, com EC apresentando alterações mais pequenas. Neste capítulo concluimos que não existem diferenças substanciais nos perfis de MSI entre os tumores colorectais e endometriais. Assim, os nossos resultados mostram que os mesmos testes para MSI podem ser usados para ambos os tipos de tumor. O capítulo 4 descreve a nossa busca por novos genes-alvo (target genes) envolvidos no cancro do endométrio com MSI (MSI-H EC). Como acima referido, MSI caracteriza-se pela acumulação de mutações em microssatélites naocodificantes e/ou codificantes. Genes contendo microssatélites são frequentemente alvos de mutação em tumores com deficiências de MMR. Em particular, mutações em genes com importantes funções regulatórias – os chamados target genes – são considerados genes-chave no desenvolvimento de tumores MSI-H. Para encontrar esses novos target genes para tumores endometriais com MSI-H, uma estratégia específica para o endométrio foi estabelecida. Analisámos genes expressos no endométrio normal e que contêm sequências repetitivas. De uma lista de 2338 genes expressos no endométrio normal, 382 genes continham repetições (496) e, consequentemente, foram sequenciados. Mutações nessas repetições foram detectadas em 44 genes. É, no entanto, discutível se todos esses 44 genes contribuem realmente para o desenvolvimento de tumores. Um dos pricipais critérios para a selecção de target genes que realmente contribuem para os tumores é a alta frequência de mutações. Geralmente um valor-referência de 15% é usado. Genes com frequências inferiores a esse valor são considerados bystanders. Aplicando este valor de 15%, encontrámos nos nosso estudo sete novos target genes. 115 Adicionalmente, analisámos, em tumores MSI-H colorectais e gástricos, 10 dos genes encontrados para os tumores do endométrio. O nosso estudo confirma que alguns target genes revelam especificidade de tecido, enquanto outros parecem exercer um papel comum em tumores MSI-H, independentemente da origem do tecido. O gene mais frequentemente mutado nos tumores do endométrio no nosso estudo foi o NRIP1 (34%). Este gene codifica uma proteína co-repressora da via do receptor de estrogénio (ER), uma das principais vias de sinalização na carcinogénesis do endométrio. Surpreendentemente, este gene apareceu também altamente mutado em carcinomas colorectais (24%). Estes resultados apontam assim para um importante papel da via do ER também no desenvolvimento dos tumores colorectais com instabilidade de microssatélites. Consequentemente, sugerem que genes da via ER poderão constituir óptimos candidatos a target gene nos tumores com MSI não só em órgãos dependentes de hormonas, mas também em órgãos de outro tipo, tal como o cólon. Os resultados encontrados no capítulo 4 levaram-nos a escrever um artigo de revisão (capítulo 5), no qual tentámos clarificar os mecanismos que ligam hormonas e tumores associados a Síndrome de Lynch, e particularmente discutir como as hormonas podem desempenhar um papel importante no desenvolvimento de tumores com MSI. Em conclusão, os nossos estudos originaram novas ideias sobre o processo de desenvolvimento de tumores MSI-H. Mostrámos que não existem diferenças substanciais nos perfis de MSI entre tumores colorectais e endometriais, e encontrámos mutações que provavelmente afectam indirectamente a via do receptor de estrogénio, sugerindo que genes dessa via serão óptimos candidatos para análise de mutações em tumores MSI-H, mas possivelmente também em tumores estáveis. Este resultados poderão também revelar-se interessantes do ponto de vista do desenvolvimento de novas terapias. 116