Gêneros textuais, atividades sociais e ensino de linguagem Désirée Motta-Roth Universidade Federal de Santa Maria [email protected] http://w3.ufsm.br/desireemroth Gênero textual no sentido de: linguagem usada em contextos recorrentes da experiência humana, que são socialmente compartilhados formas recorrentes e significativas de agir em conjunto, que põem alguma ordem no contexto da vida em coletividade (nos termos de Clifford Geertz, 1983:21); como formas de vida que se manifestam em jogos de linguagem, de tal sorte que a linguagem é parte integral de uma atividade (nos termos de Ludwig Wittgenstein ([1953] 1958:88, § 241), a ponto de o gênero tornar-se um fenômeno estruturador da cultura. 2 Gênero como tipo de texto ou estratégia/modalidade retórica “Uma aula da disciplina Língua Portuguesa, (…) ao tratar dos gêneros narrativos ou descritivos, pode fazer uso de relatos de fatos históricos, processos sociais ou descrições de experimentos científicos” (p.18). “…parece útil propor que os alunos do ensino médio dominem certos procedimentos relativos às características de gêneros específicos (…): …narrativa ficcional (narrador, personagens, espaço, tempo, conflito, desfecho); …texto poético (rima, ritmo, assonância, aliteração, onomatopéia); …texto de análise ou opinião (tese, argumento, contra-argumento, conclusão) ...; …texto informativo (tópico e hierarquia de informação, exemplificação, analogia).” (p.78-9) 3 Gênero como evento comunicativo compartilhado ”Essa abordagem explicita as vantagens de se abandonar o tradicional esquema das estruturas textuais (narração, descrição, dissertação) para adotar a perspectiva de que a escola deve incorporar em sua prática os gêneros, ficcionais ou não-ficcionais, que circulam socialmente: + na literatura, o poema, o conto, o romance...; + no jornalismo, a nota, a notícia, a reportagem,..., a carta do leitor; + nas ciências,… o verbete, o ensaio; + na publicidade, a propaganda institucional, o anúncio; + no direito, as leis, os estatutos.…” (p.77) 4 Contexto no texto Eventos sociais se constituem na linguagem: redes de relações, conjuntos de objetivos comunicativos se realizam na linguagem com diferentes graus de ritualização. 5 Quais elementos são relevantes em que contextos? Noções/Idéias (Ideologia); Discurso (Função Constitutiva); Funções, Atos de fala, Modo/Modalidade (Significado Interpessoal); Estrutura (Textura, Intertextualidade); Gramática (Encadeamento frasal); Vocabulário (Relações Semânticas, Formação de palavras); Fonologia (Pronúncia). 6 Noções/Idéias (Ideologia) a) Página da web: Detalhes biográficos; b) Interesses e preferências (hobbies); c) Idéias, crenças, valores (religiosos, políticos, filosóficos ou outros); d) Família, amigos, relações, informações professionais. 7 8 9 Modo, Modalidade (Significados Interpessoais) Onde e como o texto é produzido, distribuído e consumido? (impresso ou html, letras ou imagens) Quem pode/deve escrever/falar? Com que objetivo? (mais ou menos interativo) Quem pode/deve ler/ouvir? Com que objetivo? Que tipo de identidade aparentemente se pretender construir para escritor e leitor? (mais ou menos distanciamento social) Que tipo de efeito se imagina que o texto pode causar? Qual a orientação para o leitor? (pessoa, modo verbal, dialeto/registro de linguagem usados) 10 Estrutura (Textura, Intertextualidade) Formato e divisão em seções; Organização temática (no espaço, no tempo, paragrafação); Coesão e coerência entre as partes (hierarquia de informação, coesão referencial); Referência a outros textos/eventos (citação do discurso alheio). 11 Gramática e Vocabulário (Morfologia e Sintaxe) Mecanismos de encadeamento frasal (encaixamento, subordinação, coordenação); Princípios de formação de palavras; Relações semânticas; Recursos oferecidos pelo sistema verbal (tais como emprego apropriado de tempos e modos verbais, formas pessoais e impessoais); Concordância verbal e nominal; Pontuação sintagmática e expressiva, e outros sinais gráficos; Ortografia oficial do Português. 12 Discurso e Funções - Jornal da turma, Carta pessoal, Orkut,Blog Como você se chama? Qual é a sua idade? Onde você nasceu? Onde você mora? Qual é seu endereço? Você tem telefone/celular/email? Com quem você mora? Com a família? Você tem irmãos? Qual é seu estado civil? Você tem namorado/a? Como você se parece? Quais são suas atividades diárias? Você trabalha? No quê? Você estuda? Onde? Que curso você faz? Que você gosta de fazer nos momentos de lazer? Você tem algum hobby? Você coleciona algum objeto? Você gosta de arte, poesia, música, cinema, esporte? Qual é seu tipo preferido? Você gosta de viajar? Que cidades você já visitou? Você já navegou na Internet? Conhece algum site interessante? 13 14 ARTE – Fruição de uma obra de arte (Kehrwald, 1998:25-6): Descrição: O que se vê? Quantas pessoas? Outros elementos? Existem Linhas? Quantas e Como são? Que cores e Que texturas se vêem no rosto, nas roupas, no céu? Qual a técnica e o estilo usados? Qual o contexto histórico de produção da obra? Análise: Que efeitos o artista conseguiu? Há uma figura central? Há movimento, desequilíbrio? Como é o tratamento da cor em relação às formas? Como é o fundo? Interpretação: Que sentimentos se podem associar a’Os Retirantes? O contexto social expresso na obra é o mesmo que o seu? Se Portinari fosse vivo, será que pintaria o mesmo tema? Julgamento: Você acha que essa obra é importante? Por quê? Por que será que Portinari a pintou? Por que algumas pessoas querem ter obras de arte? Elas são importantes? 15 CIÊNCIAS: Reflexão, investigação e relatório (Lopes e Dulac, 1998:40): Reflexão: Quais as relações entre conhecimento científico trabalhado na escola e a ciência e tecnologia presentes no cotidiano das pessoas? Qual a importância da ciência e tecnologia? O que significa ver na publicidade de alguns produtos a expressão “comprovado/testado cientificamente”? Como a ciência e a tecnologia podem melhorar ou piorar a vida em sociedade? Pesquisa e Relatório: Há produtos no comércio que usam informações científicas como chamariz? Você tem em casa algum produto que foi comprado, como um detergente em pó, por conter “uma enxima” XXXase que garante sua ação branqueadora? O que fazem as enzimas? O que sua ação tem a ver com a limpeza? Quando almoçamos em um restaurante que anuncia comida natural, sem produtos químicos, sabemos o que é um produto químico? existe algo sem produtos químicos? O que significa o nome de produtos de limpeza com o prefixo bio? O que tem a ver esse prefixo com o ato de limpar? É importante aprender sobre essas questões? Por quê? 16 EDUCAÇÃO FÍSICA: Movimento, coleta de dados e abstração da experiência (Gonçalves e Santos, 1998:57-9): Exercício físico: Atividade física proposta na aula de Educação Física. Coleta de dados: Anotação de dados sobre o desempenho do aluno nas várias atividades (tempo, deslocamento, altura, batimentos cardíacos, dificuldades e facilidades, preferências, etc) Abstração da experiência: Qual é minha percepção e minha vivência de cada atividade ao longo do semestre? Quais são minhas preferências? Por quê? Quais são minhas habilidades? Em que desejo melhorar? Por quê? 17 Referências BAZERMAN, C. (1988). Shaping written knowledge: The genre and activity of the experimental article in science. Madison, WI: University of Wisconsin Press BAZERMAN, C./ A. P. DIONÍSIO, J. C. HOFFNAGEL (Orgs.) (2005). Gêneros textuais, tipificação e interação. São Paulo: Cortez. BRASIL, Ministério da Educação. (2000). Parâmetros curriculares nacionais para o ensino médio - linguagens, códigos e suas tecnologias. Brasília: MEC. CELIS, Gloria Inostroza de. (1998). Aprender a formar crianças leitoras e escritoras. Trad. Jussara Haubert Rodrigues. Porto Alegre: Artes Médicas. GERALDI, J. W. (1997).Da redação à produção de textos. In: L. Chiappini (Coord.) Aprender e ensinar com textos (Dos alunos), vol. 1, São Paulo: Cortez, p. 17-24. GONÇALVES, C. J. S. & S. S. SANTOS. Ler e escrever também com o corpo em movimento. In: I. C. B. Neves, J. V. Souza, N. O. Schäffer, P. C. Guedes, R. Klüsener. (Orgs.) Ler e escrever: compromisso de todas as áreas.Porto Alegre: Editora da Universidade/UFRGS,, p. 4564. 18 Referências (Cont.) HALLIDAY, M. A. K. (1978). Language as social semiotic: the social interpretation of language and meaning. London: Edward Arnold. ___. (1994). An introduction to functional grammar. 2nd. Edition. London/Melbourne/Auckland: Edward Arnold. KEHRWALD, I.P. (1998). Ler e escrever em artes visuais. In: I. C. B. Neves, J. V. Souza, N. O. Schäffer, P. C. Guedes, R. Klüsener. (Orgs.) Ler e escrever: compromisso de todas as áreas.Porto Alegre: Editora da Universidade/UFRGS, p. 21-34. KOZULIN, A. (1986). Vygotsky in context. In: L. Vygotsky; A. Kozulin (tradução e revisão). Thought and language. Cambridge, Mass./London, England: The MIT Press, p.xi-lvi. LOPES, C. V. M. & E. B. F. DULAC. Idéias epalavras na/da ciência, ou, leitura e escrita: o que a ciência tem a ver com isso? In: I. C. B. Neves, J. V. Souza, N. O. Schäffer, P. C. Guedes, R. Klüsener. (Orgs.) Ler e escrever: compromisso de todas as áreas.Porto Alegre: Editora da Universidade/UFRGS, p. 35-44. 19 Referências (Cont.) MARCUSCHI, L. A. (2005). Apresentação. In BAZERMAN, C./ A. P. DIONÍSIO, J. C. HOFFNAGEL. (Orgs.) Gêneros textuais, tipificação e interação. São Paulo: Cortez, p. 09-13. MILLER, C. R. (1984). Genre as social action. Quarterly Journal of Speech, 70: 151-67. ___. (1994). Rhetorical community: The cultural basis of genre. In: A. Freedman & P. Medway (Eds.) Genre and the new rhetoric. London: Taylor & Francis, p.67-78. MOTTA-ROTH, D. (2005). Questões de metodologia em análise de gêneros. In: A. M. Karwoski, B. Gaydeczka, K. S. Brito (Orgs.) Gêneros textuais: reflexões e ensino. (Volume com as conferências apresentadas durante o II SIGET - Simpósio Nacional de Estudo dos Gêneros Textuais, realizado em União da Vitória, nos dias 05 e 06 de agosto de 2004.) Palmas e União da Vitória, PR: Kaygangue. ISBN 8589625028, p. 179202. NEVES, M.H.M. (1997). A gramática functional. São Paulo: Martins Fontes. ___. (2000). Gramática de usos do português. São Paulo: Editora UNESP. WITTGENSTEIN, L. ([1953]. 1958). Philosophical investigations. Translation by G. E. M. Anscombe. New York: Macmillan. 20