RENADE
Rede Nacional de Defensores dos Adolescentes em Conflito com a Lei
Relatório Final1
“É preciso estar atento e forte...”
O presente Relatório tem o objetivo de apresentar o trabalho realizado pela
Consultoria junto à RENADE no período de um ano compreendido entre abril de 2012 e
março de 2013, bem como propor ações de incidência política junto ao Parlamento e o
Executivo federais. Nesse período, diversas atividades foram executadas, como a
elaboração de pareceres que subsidiem parlamentares atuantes na tramitação dos
projetos de lei e propostas de emenda constitucional que afetem os direitos
socioeducativos de crianças, adolescentes e jovens adultos; realização de encontros da
rede de entidades componentes da RENADE e de adolescentes; articulação entre
entidades e movimentos sociais potencialmente parceiros na consecução de ações de
campanha e de elaboração dos pareceres; disseminação de informações e documentos
normativos na rede eletrônica da RENADE; realização de reuniões com parlamentares
federais etc. Em suma, atividades que contemplam diretamente a finalidade dessa
atuação consultora, em prol das ações da Rede Nacional. Apresentam-se as principais
propostas de alteração legislativa atuais (Câmara dos Deputados e Senado Federal);
análise das propostas em andamento e as ações de articulação parlamentar e incidência
política por meio do assessoramento técnico e parcerias.
A seguir, o Relatório desenvolve-se nas seguintes partes:
I. Propostas de Emenda Constitucional.
II. Projetos de Lei.
III. Leitura política sobre as propostas normativas – Tendências
IV. Estratégias utilizadas durante a Consultoria feita à RENADE
V. Plano de Incidência – experiência 2012/2013 e propostas para a RENADE.
1
Autoria: Daniel Adolpho Daltin Assis
O processo de investigação adotou como estratégia a busca por palavras-chave,
uma vez que o universo de proposições não está previamente divido em categorias que
nos contemplem, senão, apenas, por espécies de normas propostas. A busca se deu nos
portais da Câmara dos Deputados e do Senado Federal e resultou em 100 proposições.
Realizou-se por meio das seguintes palavras-chave: “socioeducativo”, “medida
socioeducativa”, “conflito com a lei”, “adolescente e ato infracional”. Diante disso,
encontramos as proposições a seguir sistematizadas.
Nas tabelas, dividimos em cores que sinalizam os documentos que se
apresentam, ao ver do autor deste Relatório, com o objetivo de:
a) promover retrocessos no marco histórico das conquistas sociais dos adolescentes e
que estejam:
i.
em andamento regular  cor vermelha.
ii.
em andamento irregular (distintos arquivamentos)  cor amarela.
b) promover avanços, estratégicos ou finalísticos 2, no marco histórico das conquistas
sociais dos adolescentes  cor verde.
Com isso, pretendemos que o leitor assimile, de forma didática e sintetizada, o
universo de documentos normativos propostos no Congresso Nacional – instância
legítima para alterar a Carta Magna e as leis ordinárias infra-constitucionais - por meio
da numeração, autoria, ementa (ou explicação da ementa) e etapas do complexo
processo legislativo. Para maior detalhamento de cada documento, sugere-se entrar nos
portais das instituições mencionadas3 e utilizar os recursos presentes.
Pontuaremos, ao final, estratégias utilizadas e a serem aproveitadas para os
próximos passos desta Rede Nacional de Defensores do Adolescente em Conflito com a
Lei e de outras tantas entidades, redes, coletivos, movimentos e órgãos (estatais e nãoestatais) que se coloquem rumo ao objetivo de defesa de direitos humanos de
adolescentes e jovens por meio da incidência política.
2
Adotamos a nomenclatura “avanço estratégico” como sinal de ações legislativas que, apesar de não
gerarem efeitos concretos de significativa conquista, produzem elementos de mobilização dos setores
progressistas e convencimento setores moderados e conservadores. Já “avanço finalístico” é nomenclatura
informalmente adotada para significar o resultado de ações legislativas que assumem um claro
posicionamento de radicalização da democracia e de suas instituições de garantia de direitos.
3
Câmara dos Deputados: www.camara.gov.br; Senado Federal: www.senado.gov.br.
Glossário
Câmara dos Deputados
CCJC – Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania.
CCJR – Comissão de Constituição e Justiça e de Redação (extinta).
CSSF – Comissão de Seguridade Social e Família.
CSPCCO – Comissão de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado.
CECD – Comissão de Educação, Cultura e Desporto.
CREDN - Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional.
CEC – Comissão de Educação e Cultura.
CDHM – Comissão de Direitos Humanos e Minorias.
CMADS - Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável.
Senado Federal
CCJ - Comissão de Constituição e Justiça.
CDH/LP - Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa.
CAS – Comissão de Assuntos Sociais.
CCJSSP - Subcomissão Permanente de Segurança Pública.
CAE – Comissão de Assuntos Econômicos.
I. Propostas de Emenda Constitucional (PEC).
a) Câmara dos Deputados
O processo de busca no portal da Câmara dos Deputados deu origem à
identificação de 31 Propostas de Emenda Constitucional (PEC). São elas:
PEC
Autoria
Ementa / Explicação Tramitação e status
da ementa
171/93
Dep.
Benedito
Domingos (PP/DF)
Altera a redação do art.
228
da
Constituição
Federal
(imputabilidade
penal
do maior
de
dezesseis anos).
De 1993 a 2012: apensamento de
28 PECs: 14/89, 37/95, 91/95,
531/97, 633/99, 68/99, 133/99,
150/99, 167/99, 169/99, 260/00,
321/01, 377/01, 582/02, 64/03,
179/03, 272/04, 302/04, 489/05,
48/07, 73/07, 85/07, 87/07,
125/07, 399/09, 57/11, 223/12,
228/12.
1995: encaminhado à CCJC.
2009: parecer Dep. Rel. Marcelo
Itagiba (PSDB/RJ).
37/95
Dep. Telmo
(PPR/RS)
91/95
Dep. Aracely
Paula (PFL/MG)
Kirst
Dispõe que são penalmente
inimputáveis os menores
de dezesseis anos, sujeitos
às normas da legislação
especial.
1995: apensamento
171/93.
à
PEC
de
Declara inimputáveis os
menores de dezesseis anos.
1995: apensamento
171/93.
à
PEC
1996: Apensadas a esta as PEC
386/96 e 426/96.
301/96
Dep. Jair Bolsonaro
(PPB/RJ)
Estabelece que os menores
1996: apensamento
171/93.
à
PEC
de 16 (dezesseis) anos são
inimputáveis, sujeitando-se
as normas da legislação
especial.
386/96
Dep. Pedrinho Abrão
(PTB/GO)
Excetua a inimputabilidade
penal
os
maiores
de
dezesseis e menores de
dezoito anos no caso de
crimes contra a pessoa, o
1996: apensamento à PEC 91/95.
patrimônio e dos crimes
hediondos.
426/96
Dep. Nair Xavier
Lobo (PMDB/GO)
Declara inimputáveis os
1996: apensamento à PEC 91/95.
menores de dezesseis anos.
531/97
Dep.
Feu
(PSDB/ES)
68/99
Dep. Luiz Antonio
Fleury (PTB/SP)
Rosa
Determina
a
imputabilidade penal do
maior de dezesseis anos.
Estabelecendo
a
1997: apensamento
171/93.
à
PEC
1999: apensamento
171/93.
à
PEC
1999: apensamento
171/93.
à
PEC
1999: apensamento
171/93.
à
PEC
2000: apensamento
171/93.
à
PEC
2000: apensamento
171/93.
à
PEC
imputabilidade penal do
maior de dezesseis anos.
133/99
Dep. Ricardo
(PMDB/SP)
Izar
Declara inimputáveis os
menores de dezesseis anos,
sujeitos
às
normas
da
legislação especial.
150/99
Marçal
(PMDB/RS)
Filho
Dispõe
sobre
a
imputabilidade penal do
maior de dezesseis anos.
167/99
Dep.
Ronaldo
Vasconcellos
(PFL/MG)
Altera o limite de idade da
responsabilidade
penal
para dezesseis anos. Altera
a Constituição Federal de
1988.
169/99
Dep. Nelo Rodolfo
(PPB/SP)
Altera o limite de idade da
responsabilidade
260/00
Dep. Pompeo de
Mattos (PDT/RS)
penal
para quatorze anos.
2004: Apensada a esta a PEC
242/04.
Dispõe que são penalmente
2000: apensamento
171/93.
inimputáveis os menores
de dezessete anos, sujeitos
às normas da legislação
à
PEC
especial.
633/99
Dep. Osório Adriano
(PFL/DF)
321/01
Dep. Alberto Fraga
(PMDB/DF)
Estabelece que o menor
entre 16 (dezesseis) e 18
(dezoito) anos de idade,
sendo ou não emancipado,
poderá
responder
a
processo judicial.
Estabelece
que
a
maioridade
penal
será
1999: apensamento
171/93.
à
PEC
2001: apensamento
171/93.
à
PEC
2001: apensamento
171/93.
à
PEC
2002: apensamento
171/93.
à
PEC
2003: apensamento
171/93.
à
PEC
2003: apensamento
171/93.
à
PEC
2004:
à
PEC
fixada em lei, devendo ser
observados
os
aspectos
psicossociais do agente,
aferido em laudo emitido
por junta de saúde que
avaliará a capacidade de se
autodeterminar
discernimento
e
de
do
fato
delituoso.
377/01
Dep. Jorge Tadeu
Mudalen (PMDB/SP)
Reduz para 16 (dezesseis)
anos
a
imputabilidade
penal.
582/02
Dep. Odelmo Leão
(PPB/MG)
Estabelece
que
penalmente
inimputáveis
os
menores
serão
de
16
(dezesseis) anos.
64/03
Dep. André
(PMDB/RJ)
Luiz
Estabelece que lei federal
disporá sobre os casos
excepcionais
de
imputabilidade
para
menores de dezoito anos e
maiores de dezesseis.
179/03
Dep. Wladimir Costa
(PMDB/PA)
Estabelece
que
penalmente
inimputáveis
os
menores
serão
de
16
(dezesseis) anos.
272/04
Dep. Pedro Corrêa
Reduz para 16 (dezesseis)
apensamento
(PP/PE)
anos a idade para que o
menor
seja
inimputável;
171/93.
penalmente
altera
a
Constituição Federal de
1988
302/04
Dep. Almir Moura
(PL/RJ)
Dá nova redação ao art.
228,
da
2004: apensamento
171/93.
à
PEC
2005: apensamento
171/93.
à
PEC
Constituição
Federal, tornando relativa
a imputabilidade penal dos
dezesseis aos dezoito anos.
489/05
Dep.
(PL/SP)
Medeiros
Submete o menor de 18
(dezoito) anos acusado da
prática de delito penal à
prévia
2005: regime de tramitação –
especial.
avaliação
psicológica para que o juiz
conclua
sobre
sua
inimputabilidade; altera a
Constituição Federal de
1988.
48/07
73/07
85/07
Dep. Rogério Lisboa
(PFL/RJ)
Dep. Alfredo Kaefer
(PSDB/PR)
Dep. Onyx Lorenzoni
(DEM/RS)
Reduz a idade penal para
16
(dezesseis)
anos,
considerando os maiores
de
dezesseis
anos
imputáveis
penalmente.
Altera a Constituição
Federal de 1988.
2007: apensamento
171/93.
Estabelece
que
a
autoridade
judiciária
decidirá
sobre
a
imputabilidade penal do
menor de 18 (dezoito)
anos. Altera a Constituição
Federal de 1988.
2007: apensamento
171/93.
Torna imputável o agente
com idade entre 16
(dezesseis) e 18 (dezoito)
anos que tenha cometido
crime doloso contra a vida,
nos casos em que for
2007: apensamento
171/93.
à
PEC
2007: regime de tramitação –
especial.
2007: recebimento pela CCJC.
à
PEC
2007: regime de tramitação –
especial.
2007: recebimento pela CCJC.
à
PEC
2007: regime de tramitação –
especial.
87/07
Dep. Rodrigo de
Castro (PSDB/MG)
constatado
em
laudo
técnico que ao tempo do
ato infracional o mesmo
tinha perfeita consciência
da ilicitude do fato. Altera
a Constituição Federal de
1988.
2007: recebimento pela CCJC.
Considera
penalmente
imputáveis os menores de
dezoito anos nos casos que
especifica.
2007: apensamento
171/93.
à
PEC
2007: regime de tramitação –
especial.
2007: recebimento pela CCJC.
125/07
399/09
57/11
Fernando de Fabinho
(DEM/BA)
Dep. Paulo Roberto
Pereira (PTB/RS)
Dep. André Moura
(PSC/SE)
Torna
penalmente
imputável o adolescente;
estabelece
que
a
imputabilidade
será
determinada por decisão
judicial,
baseada
em
fatores psicossociais e
culturais do agente, e nas
circunstâncias em que foi
praticada a infração penal.
Altera a Constituição
Federal de 1988.
2007: apensamento
171/93.
Dá nova redação ao art.
228
da
Constituição
Federal, tornando relativa
a imputabilidade penal dos
14 aos 18 anos para crimes
praticados com violência
ou grave ameaça à
integridade das pessoas.
2009: apensamento
171/93.
Estabelece que os maiores
de 16 (dezesseis) anos de
idade são penalmente
imputáveis.
2011: apensamento
171/93.
à
PEC
2007: regime de tramitação –
especial.
2007: recebimento pela CCJC.
à
PEC
2009: regime de tramitação –
especial.
2009: recebimento pela CCJC.
à
PEC
2011: regime de tramitação –
especial.
2011: recebimento pela CCJC.
223/12
Onofre
Santo
Agostini (PSD/SC)
Dispõe sobre alteração do
art. 228 da Constituição
Federal,
propondo
a
redução da maioridade
penal.
2012: apensamento
171/93.
à
PEC
2012: regime de tramitação –
especial.
2012: recebimento pela CCJC.
228/12
Keiko Ota (PSB/SP)
Altera o art. 228 da
Constituição Federal, para
reduzir a idade prevista
para imputabilidade penal,
nas
condições
que
estabelece.
2012: apensamento
171/93.
à
PEC
2012: regime de tramitação –
especial.
2012: recebimento pela CCJC.
b) Senado Federal
Em busca no portal do Senado Federal, a partir das mesmas palavras-chave,
encontramos 09 Propostas de Emenda Constitucional.
PEC
Autoria
Ementa / Explicação Tramitação e status
da ementa
18/99
Romero
Jucá
(PSDB/RR)
Altera a redação do art.
228
da
Constituição
Federal.
1999: encaminhado à CCJ.
1999: tramitação conjunta com a PEC
20/99.
2001: tramitação conjunta com a PEC
03/01.
2004: tramitação conjunta com as PEC
26/02, 90/03 e 09/04.
2007: Aprovação favorável à PEC 20/99,
com rejeição às PEC 18/99, 03/01,
26/02, 90/03 e 09/04 (Rel. Sen.
Demóstenes Torres – DEM/GO). Voto
em separado, pela rejeição, dos Sen.
Aloizio Mercadante (PT/SP) e Patricia
Saboya (PDT/CE)
2009: desapensação das demais PEC e
arquivo.
20/99
Sen. José Roberto
Arruda
(PSDB/DF)
Altera o art. 228 da
Constituição
Federal,
reduzindo para dezesseis
anos
a
idade
para
imputabilidade penal.
1999: Recebido pela CCJ.
1999: tramitação conjunta com a PEC
18/99.
2001: tramitação conjunta com a PEC
03/01.
2004: tramitação conjunta com as PEC
26/02, 90/03 e 09/04.
2007: Aprovação favorável à PEC 20/99,
com rejeição às PEC 18/99, 03/01,
26/02, 90/03 e 09/04 (Rel. Sen.
Demóstenes Torres – DEM/GO). Voto
em separado, pela rejeição, dos Sen.
Aloizio Mercadante (PT/SP) e Patricia
Saboya (PDT/CE)
16.04.2012: Aguarda inclusão em Ordem
do Dia.
03/01
Sen. José Roberto
Arruda
(PSDB/DF)
Altera o art. 228 da
Constituição
Federal,
reduzindo para dezesseis
anos
a
idade
para
imputabilidade penal.
2001: Recebido pela CCJ.
2001: tramitação conjunta com as PEC
18/99 e 20/99.
2004: tramitação conjunta com as PEC
26/02, 90/03 e 09/04.
2007: Aprovação favorável à PEC 20/99,
com rejeição às PEC 18/99, 03/01,
26/02, 90/03 e 09/04 (Rel. Sen.
Demóstenes Torres – DEM/GO). Voto
em separado, pela rejeição, dos Sen.
Aloizio Mercadante (PT/SP) e Patricia
Saboya (PDT/CE)
2011: Arquivado.
26/02
Sen. Íris Resende
(PMDB/GO)
Altera o art. 228 da
Constituição Federal, para
reduzir a idade prevista
para a imputabilidade
penal, nas condições que
estabelece.
2002: Recebido pela CCJ.
2004: tramitação conjunta com as PEC
18/99, 20/99, 03/01, 90/03 e 09/04.
2007: Aprovação favorável à PEC 20/99,
com rejeição às PEC 18/99, 03/01,
26/02, 90/03 e 09/04 (Rel. Sen.
Demóstenes Torres – DEM/GO). Voto
em separado, pela rejeição, dos Sen.
Aloizio Mercadante (PT/SP) e Patricia
Saboya (PDT/CE)
2011: Arquivado.
90/03
Sen. Magno Malta
(PL/ES)
Inclui parágrafo único no
art. 228, da Constituição
Federal, para considerar
penalmente imputáveis os
maiores de treze anos que
tenham praticados crimes
definidos como hediondos.
2004: Recebido pela CCJ.
2004: tramitação conjunta com as PEC
18/99, 20/99, 03/01, 26/02 e 09/04.
2007: Aprovação favorável à PEC 20/99,
com rejeição às PEC 18/99, 03/01,
26/02, 90/03 e 09/04 (Rel. Sen.
Demóstenes Torres – DEM/GO). Voto
em separado, pela rejeição, dos Sen.
Aloizio Mercadante (PT/SP) e Patricia
Saboya (PDT/CE).
04/2012:
(CCJ).
09/04
Sen. Papaléo Paes
(PSDB/AP)
Acrescenta parágrafo no
art. 228 da Constituição
Federal, para determinar a
imputabilidade
penal
quando o menor apresentar
idade psicológica igual ou
superior a dezoito anos.
aguardando
novo
Relator
2004: Recebido pela CCJ.
2004: tramitação conjunta com as PEC
18/99, 20/99, 03/01, 26/02 e 90/03.
2007: Aprovação favorável à PEC 20/99,
com rejeição às PEC 18/99, 03/01,
26/02, 90/03 e 09/04 (Rel. Sen.
Demóstenes Torres – DEM/GO). Voto
em separado, pela rejeição, dos Sen.
Aloizio Mercadante (PT/SP) e Patricia
Saboya (PDT/CE).
2011: Arquivado.
74/11
Sen. Acir Gurgacz
(PDT/RO)
Redução da idade penal
para 15 anos para atos
infracionais equivalentes a
homicídio doloso e roubo
seguido de morte, tentado
ou consumado.
08/2011: remetido à CCJ.
12/12: envio do Requerimento n. 1.175,
do Senador Benedito de Lira (PP/AL),
para tramitação conjunta com as PEC
83/11 e 33/12.
01/2013: Requerimento aprovado na
Mesa do Senado.
83/11
Sen.
Clesio
Andrade
(PMDB/MG)
Estabelece a maioridade
civil e penal aos dezesseis
anos, tornando obrigatório
o exercício do voto nesta
idade.
09/2011: remetido à CCJ.
09/2012: designado Relator
Benedito de Lira (PP/AL)
Sen.
12/12: envio do Requerimento n. 1.175,
do Senador Benedito de Lira (PP/AL),
para tramitação conjunta com as PEC
74/11 e 33/12.
01/2013: Requerimento aprovado na
Mesa do Senado.
33/12
Sen.
Aloysio
Nunes (PSDB/SP)
Altera a redação dos arts.
129 e 228 da Constituição
Federal, acrescentando um
parágrafo
único
para
prever a possibilidade de
desconsideração
da
inimputabilidade penal de
maiores de dezesseis anos
e menores de dezoito anos
07/2012: Recebido na CCJ.
10/2012: Designado Relator
Ricardo Ferraço (PMDB/ES).
Sen.
12/12: envio do Requerimento n. 1.175,
do Senador Benedito de Lira (PP/AL),
para tramitação conjunta com as PEC
74/11 e 83/11.
por lei complementar.
II. Projetos de Lei.
a) Câmara dos Deputados
Durante a pesquisa no portal citado, encontramos 44 Projetos de Lei.
Projetos
de lei
Autoria
Ementa / Explicação da Tramitação e status
ementa
398/99
Dep.
Enio
Bacci
(PDT/RS)
Proibe a divulgação das iniciais
do nome e prenome do menor
infrator.
1999: apensado ao PL 4412/98.
2002: desapensado do PL 4412/98 e
apensado ao PL 397/99.
2002: Recebido pela CSSF.
2003: Arquivado junto ao PL
397/99.
2007: Arquivado na mesa diretora.
1938/99
Dep.
Enio
Bacci
(PDT/RS)
Dispõe que a partir da idade de 18
(dezoito) anos, o adolescente
deverá ser liberado, colocado em
regime de semiliberdade ou de
liberdade assistida; ou ainda
transferido
para
casas
de
transição.
1999: Recebido pela CSSF.
2000: Apensa-se a este o PL
2511/00.
2000: Aprovação pela CSSF.
2001: Recebido pela CCJR.
2011: Aguardo de Relatoria na
CCJC.
2847/00
Dep. Darcísio
Perondi
(PMDB/RS)
Estabelece que para as pessoas
entre 18 (dezoito) e 21 (vinte e
um) anos a pena sócio-educativa
poderá estender-se até 23 (vinte e
três) anos nos casos de crime
violento, ameaça grave a pessoas
e tráfico ilícito de drogas, pode a
mesma
ser
cumprida
em
penitenciária destinada a adultos.
2000: Recebido pela CSSF.
Apensamento dos PLs: 3362/00,
3700/00,
5035/01,
5036/01,
5037/01, 6923/02, 852/03, 904/03,
2523/034,
2588/03,
2628/03,
109/07, 114/07, 157/07.
2007: Recebido pela CSPCCO.
2007: Aprovação pela CSPCCO.
Apensamento dos PLs: 165/07,
102/07, 120/07, 179/07, 241/07,
4
Os PLs em negrito e itálico referem-se a projetos discriminados ao longo da tabela, aleatoriamente
escolhidos como forma de transmitir ao leitor a tendência do conteúdo desses documentos apensados ao
PL n. 2847/2000 (principal).
173/07, 177/07, 184/07, 322/07,
395/07, 565/07, 719/07, 820/07,
934/07, 941/07, 978/07, 2215/07,
2754/08,
3967/08,
4617/09,
4753/09, 4808/09,
2511/00
3362/00
5546/01
Dep. Alberto
Fraga
(PMDB/DF)
Dispõe que o período de
internação do menor infrator
poderá exceder três anos, quando
o ato infracional for considerado
como crime hediondo; e quando o
adolescente infrator completar
dezoito anos de idade será
transferido para a penitenciária.
2003: Recebido pela CCJR.
Dep. Eunício
Oliveira
(PMDB/CE)
Possibilita à autoridade judicial
determinar, ouvido o Ministério
Público, o recolhimento, aos
abrigos, de menores que estejam
em desamparo, pelas ruas, e em
condições
desfavoráveis
de
sobrevivência;
possibilita
a
prorrogação
do
prazo
de
internação; extingue a liberação
compulsória aos vinte e um anos e
inclui a prática do tráfico de
drogas passível de medida de
internação de menores.
2000: Apensado ao PL 2847/00.
Estabelece medidas de prevenção
e regras para a persecução penal
das práticas delituosas previstas
na Lei nº 9.455, de 07 de abril de
1997, e dá outras providências.
2002: Recebido pela CECD.
Dep. Nilmário
Miranda
PT/MG)
e
Nelson
Pellegrino
(PT/BA)
2003: Apensado ao PL 1938/99.
2004: Apensa-se a este o PL
3444/04.
2009: Apensam-se a este os PLs
5212/09 e 5670/09.
2009: Arquivado.
2003: Aprovação pela CECD.
2003: Recebido
(excluída).
pela
CREDN
2004: Recebido pela CSPCCO.
2004: Aprovação pela CSPCCO.
2004: Recebido pela CCJC.
2005: Apensa-se a este o PL
5233/05.
2006: Aprovação pela CCJC.
2011: Apensa-se a este o PL
958/11. Regime de Prioridade.
6577/02
Dep.
José
Carlos
Coutinho
(PFL/RJ)
Caracterizando como crime a
permissão, por omissão ou
abandono, por parte dos pais ou
responsáveis pelo pátrio poder do
menor de 18 (dezoito) anos que
2002: Apensado ao PL 5699/01.
2002: Recebido pela CCJR.
2003: Arquivado.
comete ato infracional.
7318/02
Comissão de
Segurança
Pública
e
Combate ao
Crime
Organizado,
Violência
e
Narcotráfico
Altera dispositivos sobre adoção
internacional
e
medidas
sócioeducativas de internação do
menor
infrator
em
estabelecimentos de recuperação e
ressocialização; aumenta para 16
anos a idade de início da atividade
laboral do menor; agravando a
pena para o crime de pedofilia
pela Internet e para as pessoas que
usam menores como "escudo
humano" em movimento de
manifestação coletiva.
2002: Recebido pela CSSF.
2004: Arquivo.
[aumenta, em casos excepcionais,
em um ano o tempo da medida
socioeducativa de internação]
1754/03
Dep. Carlos
Nader
(PFL/RJ)
Caracteriza como crime a
permissão, por omissão ou
abandono, por parte dos pais ou
responsáveis pelo pátrio poder do
menor de 18 (dezoito) anos que
comete ato infracional.
2003: Recebido pela CEC.
2003: Aprovado o parecer de
rejeição da Dep. Rel. Professora
Raquel Teixeira.
2004: Recebido pela CSSF.
2004: Aprovado o parecer de
rejeição do Dep. Rel. Geraldo
Resende.
2005: Recebido pela CCJC.
2008: Arquivo.
2523/03
Dep. Moroni
Torgan
(PFL/CE)
Aumenta para seis anos o limite
máximo de internação do menor
infrator e para nove anos caso o
ato infracional descrito como
homicídio tenha sido praticado
após a imposição de medida
sócio-educativa
pela
prática
anterior do mesmo ato, não se
aplicando a liberdade compulsória
aos 21 (vinte e um) anos.
2003: Apensado ao PL 2847/00
(arquivado)
2588/03
Dep. Vicente
Cascione
(PTB/SP)
Altera os arts. 103, 108, 121, 122
e 123, da Lei n° 8.069, de 13 de
julho de 1990 - Estatuto da
Criança e do Adolescente,
dispondo sobre medidas de
repressão aos atos infracionais
2003: Apensado ao PL 2847/00
(arquivado)
graves e aos correspondentes aos
crimes hediondos.
2628/03
Dep. Jutahy
Junior
(PSDB/BA)
Estabelece a transferência para
prisão comum de infrator quando
completar
dezoito
anos;
aumentando o período de
internação para oito anos.
2003: Apensado ao PL 2847/00
(arquivado)
1871/03
Dep. Antonio
Carlos Biscaia
(PT/RJ)
Acrescenta parágrafos ao art. 120
da Lei nº 8.069, de 13 de julho de
1990, que dispõe sobre o Estatuto
da Criança e do Adolescente, e dá
outras providências.
Projetos apensados:
1.894/03,
2.382/03,
2.799/03, 3.022/04.
[Propõe a divisão de lucros,
resultantes da atividade de
profissionalização,
entre
adolescente, familiares e despesa
de custeio]
PLs n.
2.705/03,
Parecer de aprovação, com
emendas e voto separado (Dep. Rita
Camata (PMDB/ES), da CSSF;
Parecer de aprovação do parecer da
CSSF, da CCJ, e pela rejeição dos
PLs apensados.
2008: Desapensação dos PLs.
2008: Remessa ao Senado Federal.
2575/03
Dep. Ronaldo
Vasconcellos
(PTB/MG)
Altera dispositivos da Lei nº
8.069, de 13 de julho de 1990,
que dispõe sobre o Estatuto da
Criança e do Adolescente.
[Propõe o aumento excepcional, a
critério do juiz, de um ano no
tempo limite de três anos de
internação; aplicação automática
de internação em caso de tráfico
de entorpecentes.5]
2799/03
Dep.
Alexandre
Santos
(PMDB/RJ)
2005: Parecer
substitutivo.
da
CSSF
com
2005: Aprovação do parecer da
CSSF.
2005: Recebimento pela CCJC.
2007: Parecer do Relator favorável.
2008: Arquivo.
Altera o Estatuto da Criança e do
Adolescente.
2004: Apensado
1871/2003.
ao
PL
n.
[Propõe a divisão de lucros,
resultantes da atividade de
profissionalização,
entre
adolescente, familiares e despesa
de custeio.]
2007: Rejeitado em pareceres da
CSSF e CCJ, no bojo do PL
1871/2003.
2008: desapensação automática do
PL 1871/03.
2008: Arquivado na Mesa Diretora
da Câmara dos Deputados.
5
Neste caso, destacamos apenas a parte do PL referente ao assunto em pauta, eis que o documento traz
inovações de outras áreas infanto-adolescentes, como o aliciamento de crianças e adolescentes, adoção
internacional e trabalho em aprendizagem.
3444/04
Dep. Jefferson
Campos
(PMDB/SP)
Acrescenta dispositivo à Lei nº
8.069, de 13 de Julho de 1990 Estatuto da Criança e do
Adolescente, para dispor sobre a
internação do adolescente que
praticar ato infracional de tráfico
ilícito de entorpecentes
2004: Apensado ao PL 3362/00
(apensado ao PL 2847/00 –
arquivado)
4487/04
Dep.
Enio
Bacci
(PDT/RS)
Proíbe qualquer imagem de
crianças envolvidas em ato
infracional
e
dá
outras
providências.
2004: Recebido pela CSSF.
Acrescenta dispositivos ao art.
120 da Lei nº 8.069, de 13 de
julho de 1990, que ‘dispõe sobre o
Estatuto da Criança e do
Adolescente,
e
dá
outras
providências’.
2004: Apensado
1871/2003.
[Propõe a divisão de lucros,
resultantes da atividade de
profissionalização,
entre
adolescente, familiares e despesa
de custeio.]
2008: desapensação automática do
PL 1871/03.
Dep.
Sigmaringa
Seixas
(PT/DF)
Definindo a pessoa custodiada e
estabelecendo
normas
para
investigação, punição e prevenção
dos crimes de tortura, incluindo
no Código Penal (Decreto-Lei nº
2.848, de 1940) o tipo especial
"Alegação Falsa de Confissão sob
Tortura ou Ameaça de Tortura".
2005: Recebido pela CDHM.
Dep.
Jorge
Tadeu
Mudalen
(PFL/SP)
Estabelece
a
liberação
compulsória de internação aos 24
(vinte e quatro) anos de idade,
para os casos de ato infracional
grave e tráfico ilícito de drogas;
estendendo
o
período
de
internação a no máximo 6 (seis)
anos,
2007: Apensado ao PL 2847/00.
Dep. Solange
Amaral
(PFL/RJ)
Possibilita a internação de
adolescente em estabelecimento
prisional e aumenta o prazo
máximo de internação para 9
(nove) anos, restringindo as
atividades externas e a concessão
de remissão pelo Ministério
Público nos casos de atos
infracionais tipificados como
2007: Apensado ao PL 2847/00.
3022/2004
5233/05
102/07
109/07
Dep. Carlos
Nader (PL/RJ)
2011: Aprovado parecer favorável.
2011: Recebido pela CCJC.
ao
PL
n.
2007: Rejeitado em pareceres da
CSSF e CCJ, no bojo do PL
1871/2003.
2008: Arquivado na Mesa Diretora
da Câmara dos Deputados.
2006: Apensado ao PL 5546/01.
2011: Apensado a este o PL
2442/11 e colocados em regime de
prioridade.
2007: Recebido pela CSPCCO.
2009: Arquivado.
2007: Recebido pela CSPCCO.
2009: Arquivado.
homicídio qualificado ou crime
hediondo.
120/07
167/07
177/07
395/07
Cria a Comissão da Infância e
Juventude para elaboração de
laudo que servirá como requisito
para o juiz estabelecer a medida
socioeducativa a ser aplicada ao
adolescente; extingue o prazo
máximo de internação que será
decidido pelo Juiz, conforme o
ato
infracional
praticado;
determina a separação do infrator
maior de idade do abrigo
destinado ao menor.
2007: Apensado ao PL 2847/00.
Dep. Perpétua
Almeida
(PCdoB/AC)
e Abelardo
Camarinha
(PSB/SP)
Aumenta para até 10 (dez) anos o
tempo de internação e amplia o
limite de idade para liberação
compulsória
do
adolescente
infrator, aplicando medida sócioeducativa especial em caso de ato
infracional descrito como crime
hediondo,
praticada
por
adolescente com mais de 16
(dezesseis) anos; determina o
cumprimento da medida de
internação em local diferenciado e
específico.
2007: Apensado ao PL 2847/00.
Dep.
Onyx
Lorenzoni
(PFL/RS)
Aumenta para no máximo seis
anos o prazo de internação do
menor infrator, com agravação
penal nos casos de homicídio ou
lesão corporal grave e por
participação em quadrilha ou
bando ou em crime organizado.
2007: Apensado ao PL 2847/00.
Altera a Lei nº 8.069, de 13 de
julho de 1990 - Estatuto da
Criança e do Adolescente - para
ampliar o prazo de internação do
adolescente infrator, estabelecer a
possibilidade de aplicação de
medidas de segurança, e dá outras
providências.
2007: Apensado ao PL 2847/00.
Dep. Neilton
Mulim
(PR/RJ)
Dep. Márcio
França
(PSB/SP)
2007: Recebido pela CSPCCO.
2009: Arquivado.
2007: Recebido pela CSPCCO.
2009: Arquivado.
2007: Recebido pela CSPCCO.
2009: Arquivado.
2007: Recebido pela CSPCCO.
2009: Arquivado.
565/07
820/07
1170/07
Dep. William
Woo
(PSDB/SP)
Dep. Clodovil
Hernandes
(PTC/SP)
Dep.
Paulo
Paim (PT/RS)
Possibilita
a
internação
provisória, autorizada pelo juiz,
no caso de suspeita da prática de
ato infracional por adolescente.
Aumenta o prazo de internação
para 6 (seis) meses em caso de
reincidência.
2007: Apensado ao PL 2847/00.
Estabelece
a
liberação
compulsória de internação aos 26
(vinte e seis) anos de idade;
estendendo
o
período
de
internação a no máximo 8 (oito)
anos,
2007: Apensado ao PL 2847/00.
Altera o art. 143 da Lei nº 8.069,
de 13 de julho de 1990 - Estatuto
da Criança e do Adolescente ECA, para ampliar as hipóteses de
vedação da divulgação de nomes
de crianças e adolescentes.
2007: Recebido pela CSSF.
2007: Recebido pela CSPCCO.
2009: Arquivado.
2007: Recebido pela CSPCCO.
2009: Arquivado.
2009: Aprovação do
favorável pela CSSF.
parecer
2009: Recebido pela CCJC.
2011: Aprovação do
favorável pela CCJC.
parecer
2011: Aguardo de deliberação de
recurso na Mesa.
2215/07
2754/08
Dep. Laerte
Bessa
(PMDB/DF)
Dep.
Edson
Ezequiel
(PMDB/RJ)
Estabelece a internação de menor
infrator com conduta descrita
como crime hediondo, tortura,
tráfico de drogas ou terrorismo.
2007: Apensado ao PL 2847/00.
Dispõe sobre o tratamento
individual adolescente que tenha
cometido ato infracional análago
a homicídio doloso e manifeste
grave desvio de personalidade.
2008: Apensado ao PL 2847/00.
2007: Recebido pela CSPCCO.
2009: Arquivado.
2008: Recebido pela CSSF.
2009: Arquivado.
4808/09
5673/09
7208/10
7934/10
7398/10
Dep.
Fernando de
Fabinho
(DEM/BA)
Aumenta o prazo de internação do
menor infrator para até 6 (seis)
anos e estabelece a liberação
compulsória de internação aos 26
(vinte e seis) anos de idade.
2009: Apensado ao PL 2847/00.
Dep. Glauber
Braga
(PSB/RJ)
Dá nova redação ao art. 104 da
Lei nº 8.069, 13 de julho de 1990,
e inclui na referida lei os arts.
105-A e 122, considerando que o
regime de semiliberdade e a
medida de internação não serão
aplicados ao adolescente que
praticou o ato infracional em
razão de dependência ou sob o
efeito de droga; os benefícios da
anistia, graça e indulto alcançam
o menor infrator e a medida de
internação só poderá ser aplicada
após o trânsito em julgado da
sentença condenatória.
2009: Recebido pela CSPCCO.
Altera os arts. 103, 108, 121, 122
e 123, da Lei n° 8.069, de 13 de
julho de 1990 - Estatuto da
Criança e do Adolescente,
dispondo sobre medidas de
repressão aos atos infracionais
graves e aos correspondentes aos
crimes hediondos.
2010: Recebido pela CSPCCO.
Torna obrigatória a realização de
cursos
de
reutilização
e
reciclagem do papelão descartado
por
supermercados
e
distribuidoras
varejistas,
a
egressos do sistema prisional e
jovens em cumprimento de
medidas socioeducativas.
2010: Recebido pela CMADS.
Dá nova redação ao § 3º do art.
121 da Lei nº 8.069, de 13 de
julho de 1990. [Aumenta o prazo
de internação em casos de atos
infracionais que se equiparem aos
crimes hediondos ou tráfico de
entorpecentes.]
2010: Apensado ao PL 7008/2010.
Dep. Willian
Woo (PPS/SP)
Dep. Fátima
Pelaes
(PMDB/AP)
Dep.
Rita
Camata
(PMDB/ES)
2009: Recebido pela CSSF.
2009: Arquivado.
2010:
Aprovado
parecer
desfavorável do Dep. Major Fábio
(DEM/PB).
2010: Recebido pela CSSF.
04/2012: Parecer desfavorável do
Dep.
Rel.
Osmar
Terra
(PMDB/RS), pela CSSF.
2012: No aguardo da pauta.
2010: Designado Relator Dep.
Capitão Assumção (PSB/ES).
03/2012: Ao arquivo.
11/2012: Parecer desfavorável Dep.
Bernardo
Santana
de
Vasconcellos (PR-MG).
12.12.12: Recebido pela CSPCCO.
2010: Recebido pela CSPCCO.
2011: Arquivado na Mesa Diretora
da Câmara dos Deputados.
346/11
347/11
Dep.
Hugo
Leal (PSC/RJ)
Dep.
Hugo
Leal (PSC/RJ)
Estabelece que internação poderá
chegar a cinco anos e concede
formação técnico-profissional.
2011: Recebido pela CSPCCO.
Altera dispositivos da Lei nº
8.069, de 13 de julho de 1990,
que dispõe sobre o Estatuto da
Criança e do Adolescente e dá
outras providências, para tratar
dos casos de aplicação da medida
de internação.
2011: Recebido pela CSPCCO.
04/2011: Designado Dep.
Alessandro Molon (PT/RJ).
Rel.
2011: Apensado a este o PL
1052/11.
06/2011: Parecer, pela rejeição, da
Dep. Rel. Benedita da Silva
(PT/RJ).
2012: Apensados a este os PLs
3503/12 e 3680/12.
348/11
Dep.
Hugo
Leal (PSC/RJ)
Cria dispositivos na Lei nº 8.069,
de 13 de julho de 1990, que
dispõe sobre o Estatuto da
Criança e do Adolescente e dá
outras providências, para dispor
sobre antecedentes, tratamento
ambulatorial,
internação
em
estabelecimento de tratamento
psiquiátrico e responsabilidade do
Estado para adequar as entidades
de atendimento, públicas ou
privadas, às diretrizes e normas
deste Estatuto.
2011: Recebido pela CSPCCO.
2011: Apensa-se a este o PL
1035/11.
2011: Aprovação pela CSPCCO.
2011: Recebido pela CSSF.
04/2012: Designada Dep.
Carmen Zanotto (PPS/SC).
Rel.
958/11
Dep.
Alessandro
Molon
(PT/RJ)
Obriga os órgãos de segurança
pública e os do sistema
penitenciário a informar sobre as
penas para a prática dos crimes de
tortura, bem como os telefones e
endereço eletrônico para a
denúncia desses crimes.
2011: Apensado ao PL 5546/01.
1052/11
Dep.
Dr.
Ubiali
(PSB/SP)
Altera a Lei nº 8.069, de 13 de
julho de 1990 - Estatuto da
Criança e do Adolescente - para
ampliar o prazo de internação do
adolescente infrator, estabelecer a
possibilidade de aplicação de
medidas de segurança, e dá outras
providências.
2011: Apensado ao PL 347/11.
Dep.
Alexandre
Leite
(DEM/SP)
Aumenta o período de internação
no caso de atos infracionais
cometidos com violência ou grave
ameaça.
2011: Apensado ao PL 1052/11
(apensado ao PL 347/11).
1896/11
2011: Recebido pela CSPCCO.
2011: Recebido pela CSPCCO.
2442/11
Presidência da
República.
Institui o Sistema Nacional de
Prevenção e Combate à Tortura,
cria o Comitê Nacional de
Prevenção e Combate à Tortura e
o Mecanismo Nacional de
Prevenção e Combate à Tortura, e
dá outras providências.
11/2011: Apensado ao PL 5233/05.
3503/12
Dep. Ronaldo
Benedet
(PMDB/SC)
Antes da sentença, poderá ser
determinada
a
internação
preventiva,
a
critério
da
autoridade judiciária, levando-se
em conta a periculosidade do
menor infrator.
04/2012: Apensado ao PL 347/11 e
recebido pela CSPCCO.
3680/12
Dep.
Hugo
Leal (PSC/RJ)
Altera a redação do art. 122 da
Lei nº 8.069, de 13 de julho de
1990, que "dispõe sobre o
Estatuto da Criança e do
Adolescente,
e
dá
outras
providências",
a
fim
de
estabelecer critério para a
aplicação
do
conceito
de
reiteração, com vistas à aplicação
da medida de internação.
05/2012: Apensado ao PL 347/11 e
recebido pela CSPCCO.
b) Senado Federal
A pesquisa no portal do Senado resultou em 15 Projetos de Lei e 01 Projeto de
Decreto Legislativo do Senado Federal (PDS)
Projetos de lei
Autoria
Ementa / Explicação da Tramitação
ementa
status
PLS 245/97
Sen. Paulo Paim
(PT/RS)
Dispõe sobre a reserva de 10%
(dez por cento) das vagas dos
cursos
profissionalizantes
administrados pelo senac, senai,
senar e senat para adolescentes
egressos do sistema correcional
ou cumprindo medidas socioeducativas de semiliberdade ou
liberdade assistida, e da outras
providencias.
1997: Recebido pela
CCJ.
Modifica os artigos 121 e 122 da
Lei nº 8069, de 13 de julho de
11/2009: Parecer CCJ.
Rel. Valdir Raupp
PLS 107/03
Sen.
Paulo Paim
e
1999: Arquivado.
(PT/RS)
1990, que 'dispõe sobre o Estatuto
da Criança e do Adolescente e dá
outras providências'.
(PMDB/RO).
11/2009: Encaminhado
para a CDH/LP.
04/2011: Parecer da
CDH/LP de aprovação
com emendas da CCJ.
21.11.2012: adiamento
da matéria por falta de
quorum.
PLS 478/03
PLC 86/06
PLS 118/07
PLC
168/08
(original
PL
1871/03 – Câmara
dos Deputados)
Sen. Demóstenes
Torres (DEM/GO)
Sen. João Alfredo
(PT/CE)
Sen. Pedro Simon
(PMDB/RS)
Dep.
Carlos
(PT/RJ)
Antonio
Biscaia
Altera os artigos 61, 118, 120,
121, 122 e 123 da Lei nº 8069, de
13 de julho de 1990 - Estatuto da
Criança e do Adolescente, para
fixar novos prazos de duração das
medidas de liberdade assistida, de
semi-liberdade e de internação,
estabelecer a oferta obrigatória de
atividades
pedagógicas,
concomitantes à aplicação de
qualquer medida, e dá outras
providências.”
11/2003: remetido para
a CCJ.
Altera a Lei nº 8.069, de 13 de
julho de 1990, que dispõe sobre o
Estatuto da Criança e do
Adolescente.
(Substitui
a
expressão
"medida
sócioeducativa"
pela
"medida
psicossocioeducativa").
2006: Recebido pela
CCJ.
Altera dispositivos do Livro II,
Título III, Capítulo IV da Lei nº
8.069, de 13 de julho de 1990
(Estatuto da Criança e do
Adolescente) para ampliar os
períodos de prestação de serviços
à comunidade e de internação, e
estabelecer outras sanções ao
adolescente infrator.
2007:
remetido
CDH/LP.
Acresce parágrafos ao art. 120 da
Lei nº 8.069, de 13 de julho de
1990, que dispõe sobre o Estatuto
da Criança e do Adolescente.
(Dispõe sobre a supervisão da
autoridade
judiciária
nas
atividades de escolarização e
profissionalização desenvolvidas
pelas unidades socioeducativas
11/2008: remetido à
CDH/LP.
2004: tramitação em
conjunto com a CAS.
11/2011: Designação
da Relatoria na CAS.
2009: Aprovação pela
CCJ.
2011: Arquivado.
à
05/2011: Designação
de
Relatoria
na
CDH/LP.
06/2010:
Parecer
CDH/LP de aprovação
(Relatoria da Sen.
Fatima Cleide (PTRO)).
com adolescente em regime de
semi-liberdade).
06/2010: remetido à
CCJ.
06.03.2013: Relatoria
com
Sen.
Luiz
Henrique (PMDB/SC).
PLS 469/08
Sen. Demóstenes
Torres (DEM/GO)
Altera a Lei n° 8.069, de 13 de
julho de 1990 - Estatuto da
Criança e do Adolescente (ECA),
para aumentar o prazo de
internação
provisória
de
adolescente infrator, fixar o prazo
máximo para a autoridade policial
concluir
e
encaminhar
procedimento investigatório ao
Ministério Público e alterar o
prazo máximo para conclusão do
procedimento judicial.
12.2008: Remetido à
CDH/LP.
11.2011: Parecer de
rejeição (Relatoria da
Sen. Ana Rita (PTES)).
11.2011: remetido à
CCJ.
03.2012: remetido à
CCJSSP.
05.2012:
Relatório
favorável Sen. Rel.
Aloysio
Nunes
(PSDB/SP).
PLS 71/10
PLS 246/10
PLS 389/11
Sen.
Marcelo
Crivella (PRB/RJ)
Sen. Demóstenes
Torres (DEM/GO)
Sen. Vital do Rêgo
(PMDB/PB)
Altera a Lei nº 8.069, de 13 de
julho de 1990 - Estatuto da
Criança e do Adolescente, para
estabelecer pena de prisão aos
maiores de 18 (dezoito) anos
condenados pela prática de ato
infracional equivalente a crime
hediondo.
03.2010: remetido à
CDH/LP.
Altera o Estatuto da Criança e do
Adolescente, para conferir, nos
feitos
infracionais,
efeito
suspensivo ao recurso de apelação
sempre que houver perigo de dano
irreparável ou de difícil reparação.
10.2010: remetido à
CCJ.
Altera dispositivos da Lei nº
8.069, de julho de 1990, que
dispõe sobre o Estatuto da
Criança e do Adolescente.
2011: Recebido pela
CDH/LP.
[entre eles,
normas sobre
internação socioeducativa, com
aumento de prazo para cinco
anos]
03.2011:
Relatório
(Sen. Magno Malta PR-ES) favorável.
01.2011: aguardando
designação Relatoria.
04/2012: Tramitação
conjunta com os PLS
357/11 e 568/11.
04/2012: Recebido pela
CAS.
13/03/2013:
Aprovação, na CAS, do
PLS 389/11, e rejeição
dos outros dois PLS.
13/03/2013: Recebido
pela CDH/LP.
PLS 408/11
Sen.
Eduardo
Amorim (PSC/SE)
Altera a Lei nº 8.069, de 13 de
julho de 1990, que dispõe sobre o
Estatuto da Criança e do
Adolescente
e
dá
outras
providências,
para
garantir
tratamento
especial
ao
adolescente viciado em drogas.
07/2011: remetido à
CDH/LP.
03/2012: Parecer de
aprovação (Sen. Rel.
Paulo
Davim
–
PV/RN).
03.2012: remetido à
CAS.
11/2012: Parecer de
aprovação (Sen. Rel.
Ana Amélia - PP/RS).
11/2012: remetido à
Câmara dos Deputados.
PLS 445/11
Sen. Jayme Campos
(DEM/MT)
Altera o art. 122 da Lei nº 8.069,
de 13 de julho de 1990, que
dispõe sobre o Estatuto da
Criança e do Adolescente e dá
outras providências, para inserir,
dentre os pressupostos para
adoção da medida de internação, a
prática do tráfico de drogas ou de
crimes hediondos.
08/2011: remetido à
CDH/LP.
12/2011: Parecer de
aprovação (Sen. Rel.
Magno Malta (PRES)).
12/2011: remetido à
CCJ.
06/03/2013: designada
relatoria
do
Sen.
Álvaro
Dias
(PSDB/PR).
PLS 23/12
Sen. Aloysio Nunes
(PSDB/SP)
Altera a Lei nº 8.069, de 13 de
julho de 1990 - Estatuto da
Criança e do Adolescente e a Lei
nº 12.594, de 18 de janeiro de
2012, que institui o SINASE Sistema Nacional de Atendimento
Socioeducativo, para prever nova
modalidade
de
medida
socioeducativa e dá outras
providências.
05/2012: Parecer de
aprovação,
com
modificações, da CAS.
Rel. Sen. Cyro Miranda
(PSDB/GO).
05/2012: remetido à
CDH/LP. Sen. Rel.
Lídice
da
Mata
(PSB/BA).
[Cria medida socioeducativa de
“atendimento
médicopsiquiátrico]
PLS 26/12
Sen. Pedro Taques
Acrescenta os arts. 114-A 258-A
03/2012: remetido à
PLS 322/12
PDL 539/12
(PDT/MT)
à Lei nº 8.069, de 13 de julho de
1990 - Estatuto da Criança e do
Adolescente - para prever o prazo
prescricional
das
medidas
socioeducativas e das multas
aplicadas
em
razão
de
cometimento
de
infrações
administrativas.
CCJ,
relatoria.
Sen. Gim Argello
(PTB/DF)
Altera a Lei nº 7.210, de 11 de
julho de 1984, e a Lei nº 12.594,
de 18 de janeiro de 2012, para
conceder incentivo tributário a
pessoas jurídicas que realizem
cursos
de
reutilização
e
reciclagem de materiais ou outros
cursos de capacitação para
egressos do sistema prisional e
para jovens em cumprimento de
medidas socioeducativas.
08/2012: Recebido pela
CAE.
Convoca plebiscito sobre
alteração da maioridade penal.
10/2012: Recebido pela
CCJ.
Sen. Ivo
(PP/RO)
Cassol
a
aguardando
11/2012:
Designado
Sem. Rel. Eduardo
Suplicy (PT/SP).
Leitura política sobre as propostas normativas – padrões e tendências
As proposições encontradas refletem, certamente, o anseio de parcela da
população, notadamente em particulares momentos de vida e de relações interpessoais,
sobretudo as mediadas pelos veículos midiáticos de grande audiência. Justamente pela
capilaridade que possuem, as emissoras de rádio e televisão produzem e reproduzem um
sistema circular de fomento ao ódio e à descrença no processo democrático lentamente
em desenvolvimento no país.
Os picos de produção normativa de aumento de rigor na responsabilização dos
adolescentes ocorrem, coincidentemente ou não, no período em que os veículos de
comunicação de massa destinam significativa parte de seus noticiários à exposição de
casos isolados e singularizados de suspeita ou confirmação de cometimento de crimes
de impacto social. Casos elevados ao grau de exemplo e submetidos a um insistente
processo político-midiático de generalizações. Esse impacto social pode ser composto
pela complexa interface entre a natureza grave do (suposto) crime x classe social do
(suposto) autor x classe social da (suposta) vítima x porte da cidade ou da metrópole do
local do (suposto) crime x composição familiar do (suposto) autor e da (suposta) vítima,
origem étnica e condição de renda do (suposto) autor e da (suposta) vítima. Não à toa,
temos diversas proposições legislativas, ainda em andamento, apresentadas entre 2003 e
2004 (construção midiática do caso “Champinha”) e no ano de 2007 (construção
midiática do caso “João Hélio”)6. É o que se evidencia no artigo Mídia e Política: a
construção da agenda nas propostas de redução da maioridade penal na Câmara dos
Deputados, de Marcelo da Silveira Campos7.
Trata-se de proposições que compõem o acervo da “legislação de emergência” 8,
isto é, o conjunto de reações legislativas de alta ressonância do comportamento especialmente midiático - de massa, supostamente veiculador dos anseios do povo. A
partir do levantamento realizado, verificamos alguns padrões – ou, no mínimo,
tendências - nessas produções de normas. Primeiro, de acordo com a tabela a seguir,
temos a quantidade e porcentagem de proposições de cunho regressivo perante as
conquistas sociais em regular andamento (vermelho) e em irregular andamento
(amarelo), bem como – em minoria – aquelas de natureza progressista em relação aos
direitos humanos de adolescentes e jovens (verde).
6
Vale observar que o primeiro caso é nomeado a partir do apelido do maquinado algoz; o segundo, ao
contrário, leva o nome da maquinada vítima.
7
Artigo escrito sob o Programa de Pós-Graduação em Ciência Política da Universidade Estadual de
Campinas, encontrado em http://www.scielo.br/pdf/op/v15n2/08.pdf.
8
Crime e Congresso Nacional no Brasil pós-1988: uma análise da política criminal aprovada de 1989 a
2006 / Marcelo da Silveira Campos. Campinas, SP: [s. n.], 2010, pg. 20. Dissertação de Mestrado
realizado no Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Estadual de Campinas.
Vermelho
Amarelo
Verde
Câmara dos Deputados
Senado Federal
31 PEC (100%)
5 PEC (56%)
8 PL (18%)
10 PL (66%) e 1 PDS (100%)
0 PEC (0%)
4 PEC (44%)
23 PL (52%)
1 PL (6%)
0 PEC (0%)
0 PEC (0%)
13 PL (29%)
4 PL (26%)
Alguns destaques:
a) PECs da Câmara dos Deputados: todas as PECs identificadas (31) são de
andamento regular e finalidade de maior rigidez e controle sociopenal 9 dos
adolescentes em conflito com a lei. Isso significa que as alterações pretendidas
de maior impacto jurídico e político na sociedade brasileira, partidas dos
deputados federais, são, todas, de tomada do retrocesso social.
b) Já no Senado Federal, apenas metade das PECs tem esse condão, o que pode nos
sinalizar vários significados, como:
9
i.
o menor número de senadores e a ampliação de sua representatividade
política (representação nacional, e não apenas de seu estado eleitor) gera
uma leitura mais crítica, ponderada que, eventualmente, enseja maior
manutenção do ordenamento jurídico;
ii.
o rigor seletivo do processo legislativo no Senado Federal pode ser maior
do que na Câmara dos Deputados, o que contribuiria para a mitigação de
tentativas imediatistas, oportunistas (de acordo com os apelos midiáticos)
e/ou incautas dos parlamentares.
iii.
O grande quadro de deputados não significa, necessariamente, um maior
resguardo do princípio da segurança jurídica presente no ordenamento
constitucional. Em outras palavras, talvez não haja relação direta entre a
alta capilaridade evidenciada no significativo número de deputados
federais e a manutenção dos pilares democráticos da legislação
constitucional. A quantidade não revela, necessariamente, a qualidade
SILVA, Maria Liduína de Oliveira e. Entre proteção e punição: o controle sociopenal dos adolescentes.
São Paulo: Unifesp, 2011.
das ações, ou – para além -, a escolha popular talvez não esteja de acordo
com a postura dos escolhidos (e vice-versa).
c) Na Câmara, dentre as proposições de retrocesso social, temos praticamente o
triplo de projetos de leis em andamento irregular, em relação aos de andamento
regular. Isso pode se vincular diretamente ao significativo apensamento de
projetos de lei uns aos outros, como também com – ou em adição a – o circuito
de alta produção normativa sem efeito. Em outras palavras, há uma cifra
considerável de proposições que vão sendo arquivadas ao longo da tramitação
regular, seja por não receberem adesão nem mesmo para seu regular andamento,
seja porque não há iniciativa de desarquivamento no início da sessão legislativa
seguinte (início do ano). Podemos dizer que muitas das proposições, portanto,
são carentes de conteúdo, inovação e justeza frente aos princípios basilares do
Estado Democrático e Social de Direito?
d) Em segundo lugar, os projetos de lei da Câmara encontram-se no campo verde.
Ganham, portanto, dos PLs de retrocesso social e em andamento regular, o que
pode denotar maior sustância e consistência se comparado com os projetos de lei
em vermelho. Teríamos, aí, um foco de resistência aos apelos midiáticolegislativos? Um foco de desentorpecimento da razão10? Um espaço de produção
normativa regulamentadora – e não destruidora - do marco regulatório dos
direitos humanos?
e) Como se vê e se deduz, a inexistência de PECs em verde, isto é, ausência de
criação normativo-constitucional, o que pode nos gerar a impressão de que a
Constituição Federal já não mais precisa de reparos de avanço político, e sim de
normas regulamentadoras de garantia estratégica de direitos humanos juvenis.
Muitas outras conclusões quantitativas podem ser extraídas da sistematização.
Outras, de cunho quanti-qualitativo, fazem-nos avançar para o conteúdo predominante
das proposições. Identificamos as seguintes tendências:
10
Alusão ao nome do Coletivo DAR – Desentorpecendo a Razão, composição que objetiva a discussão e
a promoção de ações de incidência política e de mobilização social a partir de posicionamentos
antiproibicionistas, especialmente os relacionados ao consumo, produção, porte e comércio de
substâncias psicoativas ilícitas.
40 PECs Câmara dos Deputados (CD) e Senado Federal (SF):
Redução da idade penal11
31 PECs  CD
02 PECs condicionam à mera decisão judicial
(responsabilização penal ou socioeducativa de acordo com
decisão judicial)
09 PECs  SF
05 PECs condicionam à elaboração de laudo psiquiátrico
ou psicológico
59 PLs Câmara dos Deputados (CD) e Senado Federal (SF)
1º - Aumento de tempo de internação
20 PLs  CD
04 PLs SF
2º - Conversão da internação em prisão ou medida de segurança
(aos 18 anos de idade ou no momento da aplicação da medida socioeducativa)
3 PLs  CD
1 PL  SF
2º - Determinação legal de automática internação socioeducativa frente aos atos
infracionais equiparados a crimes hediondos
1 PL  CD
1 PL  SF
Vimos, na penúltima tabela, que todas as PECs versam sobre a redução da idade
penal, algumas das quais num ato judicial (consideração de aumento da capacidade do
adolescente de cumprir uma pena) ou, por ato judicial vinculado a laudos psiquiátricos
ou psicológicos, tema, aliás, que vem crescendo nas interlocuções parlamentares,
voltando a se associar (suposta) loucura ao (suposto) cometimento de crime. A este
fenômeno de transmissão de legado penal para o campo da saúde mental podemos
atribuir a expressão controle penal-sanitarista12.
Já a última tabela nos mostra que mais de um terço de PLs em circulação no
Congresso Nacional propõem o aumento do tempo de internação.
11
Ainda lembramos que há o PDS n. 539/21, do Senado Federal, que visa a instituir o dia das eleições
presidenciais de 2014 como data de realização de plebiscito sobre a redução da idade penal.
12
Dissertação do curso de Mestrado Profissional Adolescente em Conflito com a Lei Risco
social e saúde mental como argumentos para o encarceramento de crianças e adolescentes /
Daniel Adolpho Daltin Assis – São Paulo: [s. n.], 2012. 179f., 30 cm, pg. 120 (Uniban).
IV. Estratégias utilizadas durante a Consultoria feita à RENADE
A Consultoria prestada à RENADE visava a mobilizar as entidades
componentes, especialmente por meio de debates em meio eletrônico; contribuir par a
realização de seminários e elaborar e aplicar ações de incidência política no parlamento
federal. Damos destaques aos dois últimos momentos, eis que os debates eletrônicos se
pulverizaram ao longo do ano.
a) Mobilização das entidades e adolescentes.
O ano de trabalho começou com a preparação do 3º Encontro da Rede Nacional
de Defensores do Adolescente em Conflito com a Lei, dando seqüência aos realizados
em fevereiro de 2008 e agosto de 2009.
A terceira edição ocorreu em Brasília, no mês de junho de 2012, com a presença
de representantes de Centros de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
(CEDECAs), Defensores Públicos da Infância e Juventude, membros das Associações
de Mães do Adolescente em Risco (AMAR) e, pela primeira vez na RENADE, de
adolescentes internados ou egressos do sistema socioeducativo privativo de liberdade.
No mesmo mês, o consultor da RENADE estivera presente em seminário sobre o
SINASE promovido pela Secretaria Nacional de Direitos Humanos da Presidência da
República e a Associação Nacional dos Centros de Defesa da Criança e do Adolescente
(ANCED).
No mês de setembro, ocorreu o III Congresso Nacional dos Defensores Públicos
da Infância e Juventude (Belém, Pará), no qual o consultor esteve presente em
representação à secretaria executiva da RENADE, ampliando os canais de comunicação
com um dos expressivos segmentos da Rede Nacional.
Organiza-se, para tão logo, seminário a se realizar com e por adolescentes.
Em janeiro, para a realização de reunião final com equipe da secretaria
executiva, o consultor elaborou texto-base para provocar reflexões sobre a relação entre
justiça juvenil e saúde mental.
b) Articulação parlamentar e assessoria técnica
A estratégia da incidência política ensejou contato direto com parlamentares
federais e/ou sua assessoria de gabinete. É o que ocorreu, primeiro, com a Deputada
Érica Kokay (maio e junho) e, em seguida, com a assessoria da Senadora Lídice da
Mata (junho).
i. Deputada Érica Kokay (PT/DF)
Entre os dias 22 e 24 de maio, durante encontro promovido pela Agência de
Notícias sobre a Infância (ANDI), em que o “adolescente em conflito com a lei” fora a
temática, houve a primeira oportunidade de interlocução com o parlamento federal. Em
breve diálogo com a deputada federal Érica Kokay, foi possível apresentar a RENADE,
por meio de seu consultor, bem como anunciar algumas investidas realizadas por
instituições paulistas em face da norma contida no artigo 65 da recém-promulgada lei
federal n. 12.594/2012, que dispõe sobre o Sistema Nacional de Sistema Socioeducativo
(SINASE) e dá outras providências. Com isso, despertada na deputada a importância do
assunto e a gravidade da disposição contida na norma, trocou-se contato para uma
próxima reunião.
Durante o período em que se realizava o Seminário sobre o SINASE, promovido
pela Secretaria Nacional de Direitos Humanos da Presidência da República e a
Associação Nacional dos Centros de Defesa da Criança e do Adolescente (ANCED), de
18 a 20 de junho, em Brasília, comparecemos a uma reunião com a deputada para a
formal apresentação da RENADE, a propósito do convite feito pelo Conselho Federal
de Psicologia (CFP), parceiro fundamental para o andamento dos trabalhos de
incidência política no Congresso Nacional. Nessa reunião, a deputada apresentou um
panorama das discussões que permeiam os temas socioeducativos bem como as
estratégias de qualificação dos debates. Dentre elas, anunciou a criação de uma agenda
de discussões interinstitucionais com vista a colocar em pauta as diversas questões que
sustentam a política de atenção integral à criança e ao adolescente. Tais reuniões seriam
realizadas quinzenalmente.
Ademais, surgia a iniciativa de se construir uma agenda de compromisso com
candidatos às prefeituras do país para o comprometimento com as causas da infância.
Nenhuma das pautas foi de possível acompanhamento, entretanto, a deputada esteve
presente no 3º Encontro da RENADE e afiançou a realização e o objetivo da Rede
Nacional.
ii. Senadora Lídice da Mata (PSB/BA)
No fim do mês de maio, fora realizado o primeiro contato com assessoria técnica
parlamentar. A interlocução foi feita com o gabinete da Senadora Lídice da Mata
(PSB/BA), assim que fora nomeada, na Comissão de Direitos Humanos e Legislação
Participativa, relatora do processo pelo qual se encontra tramitando o projeto de lei do
Senado n. 23/2012, já pormenorizado acima.
A iniciativa fundamentou-se na oportunidade evidente de fornecer-lhe subsídios
técnicos para a criação de um posicionamento fecundo e decisivo no trajeto do
documento em pauta. A partir da percepção de que não seria positivo para o
desenvolvimento de adolescentes em conflito com a lei, o texto projetado deveria er
impugnado, entretanto, com as devidas cautelas estratégicas.
Por esse motivo, no dia 19 de junho, realizamos reunião com a assessoria do
gabinete da senadora para apresentar prévio posicionamento sobre o conteúdo do
projeto de lei e provocar a criação de uma agenda técnico-política fundada na
possibilidade de emitirmos, via RENADE, um parecer técnico para fortalecimento do
relatório da parlamentar. Destinou-se o mês de julho para a entrega do parecer à
assessoria, o que se concretizou no início de agosto. Até o final do ano, os diálogos com
o gabinete da Senadora foram moderados em razão da opção do grupo inteiro de manter
as notícias do PL, enquanto na Relatoria da Senadora, em baixa circulação, de modo a
aguardar o arquivamento provisório com o fim da sessão legislativa de 2012.
A articulação política e, especialmente, a elaboração do Parecer Técnico enviado
à assessoria do gabinete da Senadora Lídice da Mata foram feitas a partir da primeira
experiência da RENADE com outros coletivos. Trata-se da parceria com o Projeto
Justiça Criminal, consórcio das entidades Conectas Direitos Humanos, Instituto de
Defesa do Direito de Defesa (IDDD), Pastoral Carcerária, Instituto Sou da Paz, Instituto
Terra, Trabalho e Cidadania, voltadas a promover ações de incidência política no
Congresso Nacional (para tanto, contavam com assessora legislativa alocada em
Brasília para funções diárias); e Frente Nacional Drogas e Direitos Humanos (FNDDH),
coletivo que conta com mais de 70 entidades, no país inteiro, destinadas a promover
ações de incidência política no parlamento e produzir conhecimento para articulações e
mobilizações de movimentos sociais.
iii. Projeto de Lei n. 1.185/2012 da Câmara Legislativa do Distrito Federal
Em meados do segundo semestre, em razão da propositura do Projeto de Lei n.
1185/2012 na Câmara Distrital, fomos acionados para a elaboração de parecer técnico
que levaria a adesão da Rede Nacional e outros parceiros. O texto proposto oficialmente
versava sobre a possibilidade de os agentes penitenciários e socioeducativos adquirirem
porte de armas de fogo de uso externo às unidades socioeducativas, em razão da
natureza de seu ofício. Feito imediatamente – cerca de uma semana depois da
apresentação do PL -, fora tão logo oferecido a parlamentares estratégicos e sensíveis ao
posicionamento evidenciado no parecer. Duas semanas após, tivemos a notícia de que o
artigo que atribui ao agente socioeducativo o direito ao porte de arma fora vetado.
iv. Nota técnica sobre a compatibilidade verificada entre o Decreto n. 3.597/2000,
pelo qual o Congresso Nacional ratifica a subscrição da Convenção 182/1999 da
Organização Internacional do Trabalho (OIT) realizada pelo Estado Brasileiro.
A Nota foi elaborada e entregue a convite de UNICEF Brasil, que, em apoio à
Frente Parlamentar Mista de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente, solicitou
sugestões de temas a motivarem inovação ou revogação legal, com objetivo de
favorecer a construção de Plano de Ação para o Plano Decenal dos Direitos Humanos
de Crianças e Adolescentes. Apresentamos nota que apresenta distorções e contradições
na implementação da norma contida na Convenção 182/99 da OIT no Brasil.
v. Parecer Técnico ao PDS n. 539/2012, de autoria do Sen. Ivo Cassol.
Em sintonia com a questão social da adolescência em conflito com a lei,
elaboramos nova ação parceira junto aos coletivos já mencionados. Desta vez, ampliouse a composição com a aproximação da Justiça Global, entidade de Direitos Humanos
voltado à promoção de ações políticas e jurídicas nacionais e internacionais; Associação
pela Reforma Prisional; Rede de Justiça Criminal e Instituto dos Defensores de Direitos
Humanos.
O Projeto de Lei n. 539/2012, de autoria do Sen. Ivo Cassol (PP/RO), prevê a
realização de plebiscito no dia das eleições presidenciais de 2014. O parecer está pronto
e subscrito, e a utilização dele dar-se-á nas próximas semanas de março junto aos
parlamentes já mapeados no Senado Federal.
vi.
Parecer Técnico à PEC n. 33/2012, de autoria do Sen. Aloysio Nunes.
A ampliação do grupo também resultou na elaboração de parecer contrário ao
texto da Proposta de Emenda Constitucional em maior avanço atualmente, também de
autoria do Senador Aloysio Nunes (PSDB/SP).
Ademais, importa informar que são espaços fundamentais para ampliação da
articulação político-parlamentar a Frente Parlamentar em Defesa dos Direitos da
Criança e do Adolescente, sob coordenação, no ano de 2012, dos deputados Liliam Sá e
Dr. Adilson Soares, bem como a Frente Parlamentar Mista de Direitos Humanos da
Criança e do Adolescente, sob condução da deputada Érica Kokay.
V. Plano de Incidência – experiência 2012/2013 e propostas para a RENADE.
A consultoria assumiu o compromisso de apresentar uma série de ações de
incidência política no Congresso Nacional Brasileiro a partir de temáticas e estratégias
definidas e delimitadas conforme se apresentam o assunto e o debate “Adolescente em
Conflito com a Lei” no cenário nacional, considerada a peculiar observação que fazem
os atores que compõem a RENADE.
Para tanto, realizamos atividades que conferem à RENADE a qualidade de rede
que aprimorou suas ações de incidência e articulação política com a elaboração de
pareceres e notas técnicas. Dentre os meios, fez-se o levantamento das propostas em
tramitação no Congresso Nacional e sua análise crítica acerca do teor, propósito,
aspectos positivos e negativos. Neste momento, apresenta-se todo o material produzido.
Fixamos eixos pelos quais transitaríamos ao produzir conhecimento e articular
parceiros e interlocutores estratégicos. A ideia era acompanhar projetos de leis que
tramitam na Câmara dos Deputados e no Senado Federal para conhecer, entender e
intervir politicamente em proposições escolhidas oportunamente e que retrocedem nas
conquistas constitucionais.
Embora não quiséssemos bastar nossa atuação nas estratégias de enfrentamento
a determinados projetos de lei e projetos de emenda constitucional, mas extravasar as
fronteiras da reatividade e criar campo fértil de debates sustentados em proposições da
RENADE perante o Congresso Nacional e o Poder Executivo, não logramos esse feito,
pela pequena estrutura que, pioneiramente, construiu-se no campo da adolescência e
conflitualidade. Com as próximas edições da RENADE e/ou outras redes e entidades,
certamente, o alerta servirá: devem promover ações afirmativas dos direitos humanos de
adolescentes em conflito com a lei, para o que importa também criar e apoiar as
proposições favoráveis e em andamento no Congresso Nacional. É o que pode ser feito
com base nos seguintes Projetos de Lei:
a) Na Câmara dos Deputados, com os destaques em negrito,
398/99
Dep.
Enio
(PDT/RS)
Bacci
Proibe a divulgação das iniciais do nome e prenome do
menor infrator.
1938/99
Dep.
Enio
(PDT/RS)
Bacci
Dispõe que a partir da idade de 18 (dezoito) anos, o
adolescente deverá ser liberado, colocado em
regime de semiliberdade ou de liberdade assistida;
ou ainda transferido para casas de transição.
5546/01
Dep. Nilmário Miranda
PT/MG)
e
Nelson
Pellegrino (PT/BA)
Estabelece medidas de prevenção e regras para a
persecução penal das práticas delituosas previstas na
Lei nº 9.455, de 07 de abril de 1997, e dá outras
providências.
1871/03
Dep. Antonio Carlos
Biscaia (PT/RJ)
Acrescenta parágrafos ao art. 120 da Lei nº 8.069,
de 13 de julho de 1990, que dispõe sobre o Estatuto
da Criança e do Adolescente, e dá outras
providências.
[Propõe a divisão de lucros, resultantes da atividade
de profissionalização, entre adolescente, familiares
e despesa de custeio]
2799/03
Dep. Alexandre Santos
(PMDB/RJ)
Altera o Estatuto da Criança e do Adolescente.
[Propõe a divisão de lucros, resultantes da atividade de
profissionalização, entre adolescente, familiares e
despesa de custeio.]
4487/04
Dep.
Enio
(PDT/RS)
Bacci
Proíbe qualquer imagem de crianças envolvidas em ato
infracional e dá outras providências.
3022/2004
Dep.
Carlos
(PL/RJ)
Nader
Acrescenta dispositivos ao art. 120 da Lei nº 8.069, de
13 de julho de 1990, que ‘dispõe sobre o Estatuto da
Criança e do Adolescente, e dá outras providências’.
[Propõe a divisão de lucros, resultantes da atividade de
profissionalização, entre adolescente, familiares e
despesa de custeio.]
5233/05
Dep. Sigmaringa Seixas
(PT/DF)
Definindo a pessoa custodiada e estabelecendo normas
para investigação, punição e prevenção dos crimes de
tortura, incluindo no Código Penal (Decreto-Lei nº
2.848, de 1940) o tipo especial "Alegação Falsa de
Confissão sob Tortura ou Ameaça de Tortura".
1170/07
Dep.
Paulo
(PT/RS)
Paim
Altera o art. 143 da Lei nº 8.069, de 13 de julho de
1990 - Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA,
para ampliar as hipóteses de vedação da divulgação de
nomes de crianças e adolescentes.
5673/09
Dep. Glauber Braga
(PSB/RJ)
Dá nova redação ao art. 104 da Lei nº 8.069, 13 de
julho de 1990, e inclui na referida lei os arts. 105-A
e 122, considerando que o regime de semiliberdade
e a medida de internação não serão aplicados ao
adolescente que praticou o ato infracional em razão
de dependência ou sob o efeito de droga; os
benefícios da anistia, graça e indulto alcançam o
menor infrator e a medida de internação só poderá
ser aplicada após o trânsito em julgado da sentença
condenatória.
7934/10
Dep. Fátima
(PMDB/AP)
Pelaes
Torna obrigatória a realização de cursos de reutilização
e reciclagem do papelão descartado por supermercados
e distribuidoras varejistas, a egressos do sistema
prisional e jovens em cumprimento de medidas
socioeducativas.
958/11
Dep. Alessandro Molon
(PT/RJ)
Obriga os órgãos de segurança pública e os do sistema
penitenciário a informar sobre as penas para a prática
dos crimes de tortura, bem como os telefones e
endereço eletrônico para a denúncia desses crimes.
2442/11
Presidência
República.
Institui o Sistema Nacional de Prevenção e
Combate à Tortura, cria o Comitê Nacional de
Prevenção e Combate à Tortura e o Mecanismo
Nacional de Prevenção e Combate à Tortura, e dá
outras providências.
Valem os destaques:
da
i.
PL 1938/99: entra em campo a possibilidade de atrelar as questões de
adolescência às de juventude (marco dos 18 anos).
ii.
PL 1871/03: a partir deste, é possível mobilizar atores do campo econômico,
industrial e comercial, de modo a sensibilizá-los por meio do direito ao trabalho e à
profissionalização qualificada. Mobiliza-se para o sentimento de co-responsabilidade
dos atores sociais.
iii. PL 5673/09: de significativa relevância, seu texto é de radicalização dos
princípios democráticos, levando a cabo a dúvida entre proporcionalidades entre ato
infracional e reação do Estado, e tornando objetiva a apreciação sobre os casos ligados
à dependência química, semiliberdade e internação socioeducativa.
iv. PL 2442/11: sugere-se seja o ponto forte das próximas ações de incidência
política. Do ponto de vista do conteúdo (finalístico), trata-se de um possível grande
avanço na democracia brasileira e no marco regulatório dos direitos humanos, uma vez
que estabelece um mecanismo de forte impacto na inibição dos atos estatais de
violência institucional. Do ponto de vista de forma (estratégico), é projeto de lei
proposto pelo Poder Executivo, o que leva a crer que obterá uma trajetória mais
previsível e, logo, possível de controlar.
b) No Senado Federal, com destaques em negrito:
PLS 245/97
Sen. Paulo Paim (PT/RS)
Dispõe sobre a reserva de 10% (dez por
cento)
das
vagas
dos
cursos
profissionalizantes administrados pelo
senac, senai, senar e senat para
adolescentes
egressos
do
sistema
correcional ou cumprindo medidas socioeducativas de semiliberdade ou liberdade
assistida, e da outras providencias.
PLS 408/11
Sen. Eduardo
(PSC/SE)
Amorim
Altera a Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990,
que dispõe sobre o Estatuto da Criança e do
Adolescente e dá outras providências, para
garantir tratamento especial ao adolescente
viciado em drogas.
PLS 26/12
Sen.
Pedro
(PDT/MT)
Taques
Acrescenta os arts. 114-A 258-A à Lei nº
8.069, de 13 de julho de 1990 - Estatuto da
Criança e do Adolescente - para prever o
prazo
prescricional
das
medidas
socioeducativas e das multas aplicadas em
razão de cometimento de infrações
administrativas.
PLS 322/12
Sen.
Gim
(PTB/DF)
Argello
Altera a Lei nº 7.210, de 11 de julho de
1984, e a Lei nº 12.594, de 18 de janeiro de
2012, para conceder incentivo tributário a
pessoas jurídicas que realizem cursos de
reutilização e reciclagem de materiais ou
outros cursos de capacitação para egressos
do sistema prisional e para jovens em
cumprimento de medidas socioeducativas.
Destacamos:
i.
PLS 245/97: ainda que não seja esta, mas outra proposta contemporânea,
importa salientar a relevância deste tipo de projeto, pois aciona diversos segmentos do
ramo industrial e empresarial no mesmo sentimento de co-responsabilidade apontado
acima.
ii.
PL 26/12: a prescrição socioeducativa vem sendo objeto de teses de defesa, mas
ainda não se consagrou plenamente na legislação brasileira. Por isso, ainda que haja
divergências sobre a equiparação do tempo prescricional socioeducativo com a
prescrição penal, está dado um avanço nas discussões políticas de regulamentação do
poder punitivo estatal.
iii. PL 322/12: mais um projeto que alia aos setores empresarial, comercial e
industrial. Obviamente, para além da sensibilização dos atores sociais desses
segmentos, reside aí uma clivagem importante de ser ultrapassada: os proprietários
majoritários dos meios de produção, especialmente no meio urbano (foco
predominante de ações socioeducativas em razão da demanda) situam-se no meio do
caminho para a autonomia jovem e o fortalecimento dos vínculos familiares e
comunitários.
c) Estratégias de sensibilização e articulação parlamentar
Retomemos as estratégias programadas no início do projeto RENADE. Muitas
delas estão condicionadas a eventos externos à Rede Nacional, não sendo controláveis.
São algumas, em geral: elaboração de cartilha sobre as questões-chave ligadas à
Adolescência e Conflitualidade, destinadas aos parlamentares; nomeação de Senador e
Deputado de Referência nas ações de sensibilização e articulação; instituição de selo
“Parlamentar em Defesa dos Direitos do Adolescente”; criação de subcomissão temática
na Comissão de Direitos Humanos e Minorias, na Comissão de Legislação Participativa,
na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania, e na Comissão Especial
destinada a promover estudos e proposições de políticas públicas e de Projetos de Lei
destinados a combater e prevenir os efeitos do Crack e de outras drogas ilícitas
(CEDROGA), todas da Câmara dos Deputados; Comissão de Direitos Humanos e
Participação Legislativa e Comissão de Constituição e Justiça do Senado Federal;
agenda técnica eventual entre a equipe da RENADE (ou outra rede) e a Subsecretaria
Nacional de Promoção dos Direitos da Criança e do Adolescente, para atualização de
dados e informações que configuram subsídio (político e técnico) para incidência no
parlamento federal; Elaborar os seguintes documentos: Plano Nacional de Atendimento
Socioeducativo; Avaliação da ratificação das Resoluções do CONANDA pelo
Executivo Federal; Avaliação de documentos internacionais ainda não ratificados
internamente; Avaliação dos programas de “egressos” do sistema socioeducativo;
Catalogação de todos os documentos oficiais de estudo e estatísticas sobre a política de
atendimento socioeducativo; Cartilha “passo a passo” para os estados e municípios
elaborarem seus planos de atendimento socioeducativo; Proposta de incidência na
elaboração do Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (em
consonância com o PL 2442/11, de autoria do Poder Executivo e em trâmite na Câmara
dos Deputados.
Dentre os momentos estratégicos do ano, retomamos também os planejados no
início da terceira edição RENADE: maio - junho: votação da proposta executiva de Lei
de Diretrizes Orçamentárias (LDO) no Congresso Nacional; outubro – dezembro:
votação da proposta executiva de Lei Orçamentária Anual (LOA) no Congresso
Nacional; 15 de junho – prazo final para inscrição no Parlamento Jovem Brasileiro, da
Câmara dos Deputados; 26 de junho - Dia Internacional de Luta contra a Tortura; 13 de
julho – aniversário do Estatuto da Criança e do Adolescente; Encontros RENADE:
esses encontros podem ter a presença de parlamentares engajados na causa da
adolescência e conflitualidade.
Importa reforçar que há um universo de dezenas de proposições desfavoráveis à
defesa de direitos humanos submerso no cotidiano legislativo do qual podem brotar
muitos a cada mês, a depender dos ânimos e estímulos (midiáticos, sociais e de
instâncias propriamente administrativo-financeiras). É certo que temos muito a
contribuir, como RENADE, para a desconstrução qualificada de cada projeto de lei e
proposta de emenda constitucional que vise à supressão de garantias de direitos
humanos. Entretanto, para tal, “é preciso estar atento e forte”, bem como preparado aos
percursos e discursos. O ano que passou foi de intensa movimentação legislativa, mas se
tratou apenas de uma experiência piloto (primeira edição em que se utiliza,
permanentemente, da estratégia de incidência política), mostrando que temos
capilaridade tão grande ou maior, na sociedade brasileira, do que os falsos alcances
midiáticos apelativos a uma legislação de emergência. Esta, tão incerta e oportunista
quanto as ações inconsistentes de muitos parlamentares que se rogam o direito de atuar
com PLs flashes, entre os espasmos da mídia. Movimentos sociais somos os que
sustentam as bandeiras do avanço político dos mecanismos de direitos humanos no
Brasil. Afinal, ainda está para nascer o movimento que seja tão contrário quanto
expressivamente composto de membros do Brasil todo, em alta quantidade e qualidade
e de respeito às diversidades, como são os movimentos de esquerda e defensores de
direitos para todas e todos. É com essa trajetória histórica, acúmulo técnico e político e
o guia ético de atuação entre pares e entre diferentes que devemos caminhar,
articulando-se estrategicamente dentro da heterogeneidade e afiançando ainda mais as
relações de igualdade, fraternidade e solidariedade.
Palmas, março de 2013.
Anexos – Pareceres e Notas Técnicas
Parecer técnico ao Projeto de Lei do Senado nº. 23/2012
I. Constitucionalidade formal
De início, inexistem óbices constitucionais formais quanto à iniciativa, na medida em
que a Constituição da República, em seu art. 24, inciso XV, atribui à União, aos Estados
e ao Distrito Federal competência para legislar concorrentemente sobre proteção à
infância e à juventude.
II. Constitucionalidade material
O projeto de Lei do Senado Federal n° 23 de 2012 altera a Lei nº 8.069, de 13 de julho
de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente), para incluir o inciso VIII e alterar o
parágrafo 3º, ambos do artigo 112, que passaria a vigorar com a seguinte redação:
“Art.112...............................................................................................................
...................................................................
VIII – inserção em programa de atenção integral à saúde mental, incluindo
assistência ambulatorial ou em regime de internação.
.............................................................................................................................
.......
§ 3º A medida prevista no inciso VIII do caput será aplicada ao adolescente
com transtorno ou deficiência mental constatada por meio de exame médicolegal e incapacidade de entender o caráter pedagógico e educacional das
medidas socioeducativas previstas nos demais incisos, e não poderá ser
cumulada com essas medidas.” (NR)
Altera, outrossim, a Lei nº 12.594, de 18 de janeiro de 2012, para conferir nova redação
ao art. 64 e para incluir o art. 66, nos seguintes termos:
“Art.
64
.....................................................................................................................
.............................................................................................................................
.....
§4º Quando a equipe técnica multidisciplinar e multisetorial concluir pela
incapacidade do adolescente de se submeter ou entender o caráter pedagógico
e educacional da medida socioeducativa que esta sendo executada, a medida
será extinta nos moldes do art. 46, IV, desta lei, submetendo-o à medida
prevista no inciso VIII do art. 112 da Lei n. 8.069/90 – Estatuto da Criança e
do Adolescente.
“Art. 66. O adolescente em cumprimento de medida socioeducativa com
comprovada dependência de álcool ou de outras substâncias psicoativas que
não o incapacite de cumprir plenamente as atividades previstas no seu PIA
deverá ser inserido em programa de tratamento, preferencialmente na rede
SUS extra-hospitalar, podendo a autoridade judiciária determinar que esse
seja realizado na rede privada se o SUS não dispuser do tratamento adequado,
a expensas do SUS.”
Ademais, revoga o art. 29 e os parágrafos 5º e 6º do art. 64 da mesma Lei 12.594/2 012.
Em parecer aprovado em 16.05.2011, a Comissão de Assuntos Sociais do Senado
Federal deliberou pela aprovação da matéria na forma de um substitutivo, nos termos
seguintes:
Art. 1º O art. 112 da Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990, passa a vigorar
com a seguinte redação:
“Art.
112.
.................................................................................................................
VIII − inserção em programa de atenção integral à saúde mental, incluindo
assistência ambulatorial ou em regime de internação.
...................................................................................
§ 3º A medida prevista no inciso VIII do caput será aplicada ao adolescente
com transtorno ou deficiência mental constatada por meio de exame médicolegal e incapacidade de entender o caráter pedagógico e educacional das
medidas socioeducativas previstas nos demais incisos, e, não poderá ser
cumulada com essas medidas.” (NR)
Art. 2º O art. 64 da Lei nº 12.594, de 18 de janeiro de 2012, passa a vigorar
com a seguinte redação:
“Art.
64.
...................................................................................................................
§ 4º Quando a avaliação de que trata o caput concluir que o adolescente é
incapaz de entender o caráter pedagógico e educacional da medida
socioeducativa a que está sendo submetido, ele será encaminhado para a
realização de exame médico-legal, a fim de verificar a necessidade de
aplicação da medida prevista no inciso VIII do art. 112 da Lei nº 8.069, de 13
de julho de 1990, e a consequente extinção da medida em execução, nos
termos do inciso IV do art. 46 desta Lei.
...............................................................................
§ 9º Quando a avaliação de que trata o caput concluir que o adolescente é
dependente de álcool ou de outra substância psicoativa, mas que é capaz de
cumprir as atividades previstas no seu PIA, ele será inserido em programa de
atenção integral à saúde mental, no âmbito do SUS.
§ 10. Se o exame médico-legal de que trata o § 4º não comprovar a
incapacidade de o adolescente entender o caráter pedagógico e educacional da
medida socioeducativa a que está sendo submetido, aplicar-se-á o disposto no
§ 9º.
§ 11. O atendimento previsto no § 9º será realizado, sempre que o quadro
clínico permitir, em regime ambulatorial.
§ 12. O gestor local do SUS promoverá a inserção do adolescente no
programa de atenção integral à saúde mental de que trata o § 9º, sob pena de
responsabilidade, ainda que o atendimento tenha que ser realizado em serviço
privado de saúde sem vínculo com o SUS, mediante ressarcimento.” (NR)
Art. 3º Ficam revogados o art. 29 e os §§ 5º e 6º do art. 64 da Lei nº 12.594,
de 18 de janeiro de 2012.
Art. 4º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.”
A despeito da nobreza da preocupação em dar guarida a jovens acometidos de doença,
deficiência mental ou dependência de álcool e outras drogas, o presente projeto de lei
não deve prosperar, vez que dissonante dos postulados constitucionais de proteção da
criança e do adolescente, conforme passamos a articular.
II.1 – Sobre a natureza das medidas socioeducativas
O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) estabelece que a medida socioeducativa
é a resposta estatal ao cometimento de ato infracional equivalente a crime ou
contravenção penal (art. 103).
Os conceitos relativos ao tema se fundam em princípios constitucionais, bem como os
procedimentos de apuração do delito, que, por derivação normativa, também se
assemelham, em parte, aos estabelecidos pela lei penal.
A medida socioeducativa, portanto, imbui-se de um caráter de responsabilização
proposto pelo Estado. Com isso, apresenta uma primeira e fundamental distinção em
relação aos Códigos de Menores de 1927 e 1979, para os quais a resposta estatal
responsabilizatória não atingia apenas crianças e adolescentes que cometiam crimes,
mas quaisquer jovens que estivessem na denominada “situação irregular” de vida.
O Código de Menores de 1927, por exemplo, marcou a consolidação do modelo de
assistência e proteção à infância que, a partir do saber jurídico, tornou possível a
construção e popularização da categoria “menor” no Brasil para crianças e adolescentes
pobres em situação considerada de abandono moral e material como “menor”.
Os juristas do início do séc. XX reivindicavam, para “o problema” da criminalidade
juvenil, a criação de leis e instituições assistenciais e protetoras voltadas a impedir o
desenvolvimento da criminalidade. Foi este discurso que permitiu a emergência do novo
Código em 1927 e a criação das instituições e práticas legais que permitiram a
internação do “menor” “abandonado” e “delinquente”.
Assim, com a institucionalização da infância e da adolescência no Brasil, o Estado
passou a visar diretamente os ‘menores’ em estado considerado “de perigo e abandono”
(vadiagem, mendicância, libertinos, loucos), gerando um processo de estigmatização
das crianças e adolescentes oriundos das classes pobres, condenados institucionalmente
à possibilidade de delinquência, caso não se enquadrassem nas normas de trabalho e da
educação (ALVAREZ, 1989; 1997 13).
ALVAREZ, M.C. A emergência do Código de Menores de 1927 : uma análise do discurso jurídico e
institucional de assistência e proteção aos menores. São Paulo, 1989. Dissertação (Mestrado em
13
Vale observar, ainda, que as instituições criadas para a internação do “menor”
“abandonado” ou “delinquente” eram mais entornadas ao recolhimento e à manutenção
dos abandonados fora das ruas, retirando assim do convívio social os considerados
“indesejáveis”.
No Código de Menores de 79, as hipóteses de jovens em “situação irregular” eram,
conforme art. 2º, as seguintes:
I - privado de condições essenciais à sua subsistência, saúde e instrução
obrigatória, ainda que eventualmente, em razão de:
a) falta, ação ou omissão dos pais ou responsável;
b) manifesta impossibilidade dos pais ou responsável para provê-las;
Il - vítima de maus tratos ou castigos imoderados impostos pelos pais ou
responsável;
III - em perigo moral, devido a:
a) encontrar-se, de modo habitual, em ambiente contrário aos bons
costumes;
b) exploração em atividade contrária aos bons costumes;
IV - privado de representação ou assistência legal, pela falta eventual dos
pais ou responsável;
V - Com desvio de conduta, em virtude de grave inadaptação familiar ou
comunitária;
VI - autor de infração penal.
Constata-se, portanto, que o Código de Menores de 1979 não distinguia as situações de
privação de direitos e de cometimento de ilegalidades para fins de resposta estatal. Para
efeito de aplicação de medidas, não diferenciava, assim, as condições de autor ou
vítima, assumida pelos jovens envolvidos em violação de direitos. A natureza da reação
estatal frente aos atos juvenis não era definida em lei.
Historicamente, crianças e adolescentes foram concebidos e tratados pela sociedade
brasileira de maneira autoritária, na medida em que foram juridicamente qualificados
Sociologia) – Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, Universidade de São Paulo, São Paulo, 1989)
e Menoridade e delinqüência: uma analise do discurso jurídico e institucional da assistência
e proteção aos menores no Brasil. Cadernos da FFC. Marília, v.6, n.2, p. 93-114, 1997.
como sujeitos sem fala, destituídos de poder, enquanto, por outro lado, os adultos e a
família são concebidos como detentores de todo poder e que podem expressar as
vontades e deveres das crianças e adolescentes. Nesse contexto, crianças e adolescentes
brasileiros são vistos historicamente como objeto de intervenção de diversas instâncias
de correção e das chamadas instituições de ortopedia social (ADORNO, 200214).
Apesar de romper com a Doutrina da “Situação Irregular”, o próprio ECA também não
define a natureza da medida socioeducativa, deixando a função a cargo dos segmentos
civis e oficiais incumbidos dos debates e da qualificação do sistema de justiça juvenil e
da política de atendimento socioeducativo. Nesse sentido, há duas vertentes bem
demarcadas.
Há estudiosos que reivindicam que a medida socioeducativa se trata de intervenção
meramente educativa, sem caráter punitivo, sancionatório ou responsabilizatório. É
comum a presença dessa interpretação em discursos que propõem o aumento do rigor,
por meio, principalmente, da redução da idade penal estabelecida constitucionalmente e
do aumento do tempo de internação em estabelecimento educacional.
Outros estudiosos, pelo contrário, avaliam constituir-se em ação que tem, em excesso,
um rigor sancionatório, o que é visto, inclusive, como ponto fraco da própria medida,
que tende, assim, a carecer de efetividade educativa. Eles defendem a diminuição das
determinações judiciais de internação em prol das medidas em meio aberto, dado que
seu caráter sancionatório, supostamente, afligiria menos a vida adolescente. Nos dois
pontos de vista, persiste a impressão de que as medidas socioeducativas apresentam-se
com insuficiente caráter educativo.
Dúvida não resta, todavia, se consideramos ampliada a natureza da medida
socioeducativa, dentro, pois, de uma ótica de proteção/sanção, vendo-a como educativa
porque proponente de construção de um projeto de vida, e, ao mesmo tempo,
responsabilizatória porque pungente no caráter compulsório do cumprimento.
Konzen diferencia finalidade e natureza das medidas socioeducativas. Segundo ele,
quanto à natureza, dois são os atributos da medida socioeducativa: a “unilateralidade”
e a “obrigatoriedade”. Pela unilateralidade entende-se que a medida socioeducativa
existe a partir de um único vetor, direcionado do/a magistrado/a para o/a adolescente,
sem que este/a tenha a opinião considerada. A obrigatoriedade, por sua vez, dá o devido
contorno à obediência do/a adolescente em não apenas não opinar sobre a medida
adequada, mas em aceitar e cumprir a designada pelo/a juiz/a.
Quanto à finalidade, Konzen define que serve à “reprovação pela conduta ilícita,
providência subsequente que carrega em si, seja a consequência restritiva ou privativa
de liberdade, ou até mesmo modalidade de simples admoestação, o peso da aflição,
ADORNO, S. Monopólio Estatal da Violência na Sociedade Brasileira Contemporânea. In: MICELI,
S. (org). O que Ler na Ciência Social Brasileira – Volume IV. São Paulo, Editora Sumaré, 2002.
14
porque sinal de reprovação, sinônimo de sofrimento porque segrega do indivíduo um de
seus bens naturais mais valiosos, a plena disposição e exercício da liberdade”15. Afirma,
por fim, que sua natureza, complexa, é de substância penal e finalidade
pedagógica16.
Em coerência com a predominante doutrina acerca da temática, podemos afirmar
que qualquer das sete medidas socioeducativas já previstas no art. 112 do Estatuto
da Criança e do Adolescente configuram uma resposta estatal de compulsório
cumprimento e conteúdo sancionatório, ainda que sob uma perspectiva educadora.
Logo, a criação de qualquer outra medida deve ser alinhada a essa dupla perspectiva,
não sendo assim compreendida caso vise a outras finalidades, como é o caso da
proposição presente no PLS n. 23/2012.
Referido projeto de lei é justificado pela “necessidade de acesso aos serviços de saúde”,
a implicar iniciativa legislativa que serviria ao direito de atenção à saúde mental e não
ao dever de ser responsabilizado pelo cometimento de ato infracional.
De fato, as diretrizes e a dinâmica de execução de uma medida socioeducativa não
podem impedir ou restringir o exercício de direitos pelo/a adolescente, salvo o direito de
liberdade no caso de medidas de internação e semiliberdade. De modo que, ao/à
adolescente privado de liberdade, tanto quanto aos/às encontrados/as em meio aberto,
cabe a garantia do direito de atenção à saúde mental, entre outros direitos sociais.
Nesse sentido é que a instalação de uma nova medida socioeducativa – de
atendimento médico-psiquiátrico – que tenha como simples objetivo catalisar as
etapas de acesso ao serviço público de saúde mental apresenta-se na contramão da
finalidade da medida socioeducativa, que não é, prima facie, garantir direitos, já que,
para isso, há as medidas de proteção, mas responsabilizar os/as adolescentes, cuja ação
as sete medidas socioeducativas já contemplam.
A “nova” medida proposta insere-se no crescente processo de psiquiatrização dirigido a
jovens autores de ato infracional, definido pela professora Maria Vicentin da PUC/SP,
em estudo recém-publicado na Revista Brasileira de Crescimentos e Desenvolvimento
Humano17, com os seguintes elementos centrais:
1) A emergência de propostas de alterações no ECA centradas no
argumento do transtorno mental e da periculosidade.
2) O crescente encaminhamento de adolescentes cumprindo medida
socioeducativa para perícias psiquiátricas visando aferição do “grau de
periculosidade” e diagnóstico de transtorno de personalidade anti-social.
KONZEN, Afonso Armando. Pertinência socioeducativa: reflexões sobre a natureza jurídica das
medidas. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2005, p. 63.
16 Op. cit., p. 91.
17 A patologização do jovem autor de ato infracional e a emergência de “novos” manicômios
judiciários. VICENTIM [ET.AL]. Revista Brasileira de Crescimento e Desenvolvimento Humano,
2010; 20(1): 61-69.
15
3) A crescente internação psiquiátrica de adolescentes por mandado
judicial, já verificada nos dois maiores hospitais psiquiátricos para
adolescentes nos municípios do Rio de Janeiro e de São Paulo,
caracterizada pela: i) compulsoriedade; ii) pela estipulação de prazos para
a internação ou pela sua subordinação aos critérios jurídicos; iii) por
tempo médio de internação superior aos dos demais internos admitidos por
outros procedimentos; iv) pela acentuada presença de quadros relativos a
distúrbios de conduta (portanto, não psicóticos)
4) A proposição, pelo estado de São Paulo, da Unidade Experimental de
Saúde18, inaugurada em dezembro de 2006, Tal atendimento não poderia,
segundo os propositores da Unidade, se dar em hospitais psiquiátricos, já
que esses últimos “obedecem às diretrizes da política de saúde mental do
SUS, caracterizada por serviços que não dispõem de espaços físicos de
contenção” (VICENTIN, 2010, p.62-63).
É preciso notar que a medida socioeducativa é um meio responsabilizatório para que se
alcancem objetivos de qualificação das condições de vida. Já a nova medida
intencionada pela via do projeto de lei em pauta apresenta-se, ela mesma, como um fim
de acesso a serviços públicos.
Neste rumo, portanto, em tela apenas a necessidade de garantia do direito à saúde
mental, reiteramos a possibilidade de o Poder Judiciário requisitar ao Executivo a
oferta imediata de serviços, inclusive no bojo de um processo socioeducativo. Essa
determinação judicial é suficiente para atingir qualquer meta esperada com a
propositura do PLS n. 23/2012, razão pela qual sucumbe a inovação pretendida em
seu texto. Para tanto, mais do que suficientes são as medidas protetivas, explanadas na
seqüência.
II.2 – Sobre a natureza das medidas protetivas
Sobre as medidas de proteção, o Estatuto da Criança e do Adolescente estabelece:
Art. 98. As medidas de proteção à criança e ao adolescente são aplicáveis
sempre que os direitos reconhecidos nesta Lei forem ameaçados ou violados:
I – por ação ou omissão da sociedade ou do Estado;
A Unidade Experimental de Saúde foi criada em dezembro de 2006, num convênio entre as
Secretarias da Saúde, Justiça e Administração Penitenciária do Estado de São Paulo, destinada a
oferecer atendimento para autores de ato infracional portadores de diagnóstico de transtorno de
personalidade e/ou de periculosidade, durante o cumprimento de medida sócio-educativa de
internação em regime de contenção.
18
II - por falta, omissão ou abuso dos pais ou responsável;
III – em razão de sua conduta.
Cumpre lembrar que esses instrumentos protetivos “não poderão ser compreendidos
como castigo ou pena; nem, tampouco, ter o caráter de ‘aliviar’ a responsabilidade
jurídica daqueles que estão causando danos à criança e ao adolescente” 19.
A assertiva exprime bem a dificuldade que subjaz o projeto de lei sob análise: se se quer
proteger adolescentes que cometem atos infracionais a partir do ampliado e imediato
acesso aos serviços de saúde mental, não se deve fazer por meio exclusivo do sistema
socioeducativo. Fazer desse modo significaria revestir tal iniciativa protetiva do caráter
de pena ou castigo, tornando, na proporção em que se impõe judicialmente a nova
medida socioeducativa, obrigatória a adesão.
Conforme aduz o magistrado paulista Eduardo Resende de Melo, “as medidas de
proteção têm uma natureza cautelar. Elas diferem da procura espontânea e voluntária
das crianças, adolescentes e suas famílias aos programas de atendimento”20.
Por isso, não há imposição de medidas protetivas, mas apenas a garantia de serviços a
serem oferecidos, em caráter de urgência e diante do insucesso da promoção regular do
direito. Logo, a medida protetiva não é compulsória, mas facultativa, conforme o desejo
do próprio demandante – criança, adolescente e/ou familiares. É o que depreendemos da
leitura da lei federal n. 8.069/90:
Art. 101. Verificada qualquer das hipóteses previstas no art. 98, a autoridade
competente poderá determinar, dentre outras, as seguintes medidas:
IV – inclusão em programa comunitário ou oficial de auxílio à família, à
criança e ao adolescente;
V – requisição de tratamento médico, psicológico ou psiquiátrico, em regime
hospitalar ou ambulatorial;
VI – inclusão em programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação e
tratamento a alcoólatras e toxicômanos
Caracterizada como direito – e não um dever -, a medida protetiva é a categoria
normativa que mais se aproxima do atendimento médico-psiquiátrico almejado pelo
PLS n. 23/2012. Portanto, não há falar em nova medida socioeducativa, mas nas
necessárias melhorias e fortalecimento dos sistemas sociais, sobretudo o de saúde.
CURY, Munir (coord.). Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado, 11ª edição. São Paulo:
Malheiros, 2010, p. 417.
20 CURY, op. cit., p. 419.
19
II.3 – Da incompatibilidade entre a instituição de nova medida
socioeducativa e sua finalidade
A proposta abrigada no projeto de lei fere os princípios da proporcionalidade e da
eficiência dos atos da administração pública, eis que, em primeiro plano, a nova
medida socioeducativa não visa produzir inéditas narrativas de responsabilização, já que
tem a única finalidade de garantir imediato acesso aos serviços de saúde mental.
Pior: impulsionará a criação de nova estrutura administrativa e judiciária, com
aumento de quadro de recursos humanos e, logo, custeio de pessoal, bem como a
ampliação dos sistemas de monitoramento da política de atendimento
socioeducativo; tudo que, em suma, reverter-se-á no agigantamento dos gastos públicos
sem nenhuma alteração de qualidade no campo socioeducativo, já que não é aí que
reside o principal problema disparador do projeto de lei, conforme anuncia o próprio
autor.
O nó a ser desatado, como pronuncia o Nobre Proponente e o Nobre Relator da
Comissão de Assuntos Sociais, é o acesso, a permanência e a qualidade dos serviços
públicos de atenção à saúde mental destinados a qualquer brasileiro/a, e não apenas a
qualidade e o modelo do sistema de responsabilização socioeducativa.
Se o objetivo é realmente aprimorar o acesso aos bens e serviços para a garantia do
desenvolvimento de adolescentes, devemos aprimorar as políticas correspondentes e não
tornar mais rigoroso o processo responsabilizatório.
Isso porque, além de tornar essa especificidade algo ineficiente e não proporcional
para a administração pública, não gerará, por outro lado, impactos objetivos na
própria política de saúde mental. Logo, a criação de nova medida socioeducativa não
logrará aperfeiçoar nem o sistema socioeducativo nem o sistema de saúde.
Assim, incorremos no risco de criar rotas excepcionais de garantia do direito à saúde
mental, vindo a ser potenciais usuários apenas aqueles jovens que cometerem atos
infracionais.
Corremos ainda outro risco: o regresso à doutrina da situação irregular, notadamente
no seu aspecto da (in)completude institucional, princípio anulado pela entrada em
vigência do Estatuto da Criança e do Adolescente justamente porque se passou a
compreender que a garantia do exercício dos direitos fundamentais de crianças e
adolescentes não deve estar refém ou condicionada à tutela estatal ou à custódia
institucional, pressupondo-se, então, “o rompimento da cultura de institucionalização
como inerente à ação protetora”21.
21
CURY, op. cit., p. 421.
Assim é o posicionamento estatutário, tanto porque, por esse meio, não se promove o
pleno exercício dos direitos – já que se mantêm os/as adolescentes responsabilizados/as,
estando, logo, com direitos restringidos – quanto porque as instituições socioeducativas
não são destinadas a cobrir todas as necessidades básicas do indivíduo - embora venham
a cobrir algumas por consequência da privação de liberdade -, mas, acima de tudo, a
responsabilizá-lo no tempo e espaço demarcados pela decisão judicial. Nesse sentido,
Konsen afirma que “a aplicação de medida socioeducativa, por si tão-somente, não
produz nenhum efeito tutelar ou protetivo do interesse do adolescente” 22
II.4 – Possibilidades de acatamento da justificativa do PLS n. 23/2012: a
garantia do direito de atenção à saúde mental.
Identificado o nó que deu origem à propositura do mencionado projeto de lei, convém
desatá-lo a partir da correta identificação das suas causas.
Uma delas é o investimento público notória e historicamente sacrificado nos campos
socioeducativo e sanitário. A pífia destinação orçamentária encontrada na interface
entre ambas searas demonstra que muitos gestores públicos não atendem ao basilar
princípio da prioridade absoluta encampado na Convenção Internacional sobre os
Direitos da Criança, na Constituição Federal da República e no Estatuto da Criança e do
Adolescente.
Segundo o princípio, os direitos de crianças e adolescentes devem ser garantidos por
meio de oferta de serviços e bens públicos destinados prioritariamente às crianças e
adolescentes, em relação aos demais grupos sociais. É o que preceitua o Estatuto da
Criança e do Adolescente:
Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder
público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos
referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à
profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à
convivência familiar e comunitária.
Parágrafo único. A garantia de prioridade compreende:
a) primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias;
b) precedência de atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública;
22
Op. cit., p. 75.
c) preferência na formulação e na execução das políticas sociais públicas;
d) destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a
proteção à infância e à juventude.
A prioridade absoluta se concretiza, portanto, na execução direta dos serviços
públicos, na amplitude da cobertura conforme a situação infanto-juvenil de
determinado local, no atendimento de proteção e socorro; da formulação das
políticas, bem como na destinação orçamentária de recursos públicos voltados à
garantia dos direitos.
No tocante aos recursos orçamentários, propomos duas dimensões de análise. Pela
primeira, ao se reconhecer que o investimento em saúde não oferece plena cobertura aos
demandantes – seja no acesso, na permanência ou qualidade em relação ao serviço
prestado -, a iniciativa do Estado-legislador não deve ser criar mais uma medida
responsabilizatória ao adolescente, senão ao próprio Estado-administrador, qual
seja, a imposição de maior destinação orçamentária ao setor bem como
qualificação dos sistemas de monitoramento dentre as esferas federativas
componentes da estrutura de co-gestão da política de saúde.
Com isso, promove-se uma “verdadeira inversão do ônus da prova, ao colocar sob a
obrigação do Estado comprovar que não pôde fazer mais do que fez em favor da
efetivação desses direitos sociais” 23. Isto porque, embora se suponha que quanto maior a
destinação de verba tanto maior será a cobertura, alguns aspectos não são plenamente
avaliados nessa perspectiva, sobre os quais se deve compreender o nível de qualidade
encontrado na execução da política, em paralelo à contínua ampliação de recursos.
Já numa segunda linha de análise, podemos dizer que, há tempos, superou-se a noção
restritiva de que saúde seja apenas a ausência de doença. Saúde é a promoção de bemestar vital, individual e coletivo. Não obstante, não é somente a denominada política
de saúde a responsável pela promoção do bem-estar, mas quaisquer outras,
especialmente as sociais básicas (educação, assistência social, previdência social,
habitação, saneamento básico, segurança alimentar e nutricional etc).
Logo, impera reforçar a responsabilidade gestora de produzir insumos de garantia
de vida e saúde mental não apenas no setor de saúde – e nas respectivas secretarias
e propostas orçamentárias -, mas em todos os setores sociais básicos. Um passo
adiante, cumpre a execução qualificada e prioritária da política quando o assunto é
criança e adolescente.
23
CURY, op. cit., p. 425.
Caso não se priorize a oferta de bens e serviços públicos com acesso, permanência e
qualidade, entende-se que, automaticamente, resta violado o direito por alguma das
ações descritas na lei federal n. 8.069/90:
Art. 5º. Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de
negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão,
punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus
direitos fundamentais.
Nessa direção, importa considerar que qualquer iniciativa legal que promova o
aumento do rigor responsabilizatório em nome da proteção de direitos já
estabelecidos em lei – como é o caso da atenção à saúde mental – confirma a prévia
negligência cometida pelo Estado na (não) consecução dos deveres estabelecidos
pela sociedade.
Conforme aduz Myriam Mesquita Pugliese de Castro, “qualquer tipo de ação que não
atenda às suas necessidades básicas de alimentação, moradia, educação, saúde, lazer
constitui descuido, incúria, desleixo e é, portanto, considerada negligência” 24.
A propósito, bom salientar a existência de duas portarias expedidas no âmbito do
Governo Federal que estabelecem diretrizes para a “implantação e implementação da
atenção à saúde dos adolescentes em conflito com a lei, em regime de internação e
internação provisória:
- PORTARIA INTERMINISTERIAL MS/SEDH/SEPM 1.426/200425 que
aprova as diretrizes para a implantação e implementação da atenção à saúde
dos adolescentes em conflito com a lei, em regime de internação e internação
provisória.
- PORTARIA Nº 647, DE 11 DE NOVEMBRO DE 2008 – levando em
conta a Portaria 1426/2004 e outras normativas, aprova as diretrizes para a
implantação e implementação da atenção à saúde dos adolescentes em
conflito com a lei com medida socioeducativa a ser cumprida, em regime de
internação e internação provisória, em unidades masculinas e femininas.
Referidas portarias delineiam política pública específica à equalização do problema
contido na justificativa do projeto de lei em comento e, nesse sentido, os esforços
devem ser envidados à efetivação de seus dispositivos e não à criação de mais uma
medida socioeducativa fadada a não apenas manter o problema como também a agraválo.
24
CURY, op. cit., p. 50.
25http://portal.saude.gov.br/portal/arquivos/pdf/PORTARIA%20INTERMINISTERIAL%201426%
20julho-2004.pdf
Ao se engendrar nova medida socioeducativa como ajustada resposta à precária
prestação positiva estatal de garantia do direito à saúde mental ao/à adolescente
que infringe a lei (por vezes, exatamente em razão de sua sofrida ou desorganizada
condição psíquica no momento do ato infracional), procede-se não necessariamente
à garantia do direito à vida – e à saúde mental -, mas, no máximo, a uma mera
estratégia de coerção do Estado para a prestação do dever de atendimento.
Atendimento que, ademais, pode fracassar haja vista a condição privativa de liberdade
do adolescente usuário do serviço.
No que diz respeito aos estudos citados no Parecer do Senador Cyro Miranda (p. 2, item
ii), em que se menciona pesquisa publicada no Jornal Brasileiro de Psiquiatria na qual
se revela a prevalência de transtornos psiquiátricos entre adolescentes (¾ dos
adolescentes em Salvador teriam pelo menos um transtorno psiquiátrico), cumpre
esclarecer alguns pontos que podem, se mal interpretados, levar a conclusões
desconectadas do estudo evocado.
Se analisado minuciosamente, verifica-se que o estudo em referência aponta para os
seguintes dados: em 290 indivíduos analisados, 40% possuem o chamado transtorno de
conduta e 27,9% transtorno por Uso Nocivo de Substância Psicoativa, ou seja,
aproximadamente 70%, o que representa os quase ¾ dos adolescentes citados como
possuidores de algum “transtorno”.
Segundo o próprio estudo citado, não se pode considerar o chamado “transtorno de
conduta” como uma patologia psiquiátrica (no sentido medicinal do termo), pois
seriam pessoas definidas pelo estudo como os que “...desafiam os limites socialmente
determinados”. Vejamos a citação acima na íntegra:
Em relação ao transtorno de conduta, freqüentemente os jovens com esse
diagnóstico não são considerados portadores de patologia psiquiátrica, mas
pessoas que não internalizaram normas e desafiam os limites socialmente
determinados. Os jovens com transtorno de conduta manifestam-se com
sentimento deficitário de empatia pelo próximo e ausência de culpa, que
atuam como facilitadores para a incursão no crime (2006, p.129)26.
Quanto ao segundo índice – 27,9% dos adolescentes possuem transtorno por uso de
substância psicoativa – é importante ressaltarmos que o uso e dependência de drogas é
algo absolutamente distinto e que a discussão deve avançar no sentido de aumentar a
rede pública de proteção e atenção ao usuário de drogas, fortalecendo e capacitando o
Sistema Público de Saúde e a Rede de Assistência Social:
Em síntese, essa composição do ato infracional com o transtorno mental
vem construindo argumentos tanto para modificações no Estatuto da
Criança e do Adolescente (ECA) – seja no tempo de aplicação da medida ou
“Morbidade psiquiátrica entre adolescentes em conflito com a lei”. PINHO [et. al]. Jornal
Brasileiro de Psiquiatria, 55(2) 2006, p.126-130.
26
na proposição do tipo de medida – quanto para a produção de práticas
dirigidas ao autor de ato infracional que são frontalmente contrárias aos
paradigmas do ECA e às da atual política nacional em Saúde Mental. p. 666727
Com relação ao outro estudo citado – dissertação de mestrado defendida na UNB em
2011 por Natália Pereira Gonçalves junto ao Departamento de Serviço Social –
impende colacionar a conclusão da pesquisadora, que vai exatamente no sentido
contrário ao defendido na justificativa do Projeto de Lei 23/2012:
No atendimento a essas demandas, os adolescentes receberam o diagnóstico
que corresponde ao estigma de perigoso e ameaçador experimentado pelo
autor de ato infracional. A conduta dos adolescentes foi considerada
anormal por esse diagnóstico, devido ao pensamento moralizador que
aponta como doente aquele que foge do padrão de normalidade socialmente
colocado (GONÇALVES, 2011, p.80).
O adolescente, portanto, deve ser escutado para além de um processo “psíquico” ou
“psicossocial” que afeta os internos da Fundação Casa, mas em seu duplo “laço
político”: como lugar-cruzamento de técnicas de si e técnicas políticas e como dimensão
que afeta a todos28.
É preciso buscar novas formas de reflexão sobre os adolescentes e atos infracionais, em
contraposição “...à constituição do discurso da periculosidade e da patologia dos
jovens, e à produção do medo, trata-se de encontrar outros ângulos analíticos que
abram novos espaços de reflexão e que permitam pensar algumas relações entre
processos políticos, sociais e subjetivos que atravessam vidas cotidianas de
adolescentes em espaços sociais de trauma, estigma e perigo.” (VICENTIN, 2011
p.108).
II.5 – Sobre a generalização da medida socioeducativa proposta, em afronta
ao melhor interesse do adolescente.
A patologização do jovem autor de ato infracional e a emergência de “novos” manicômios
judiciários. VICENTIM [ET.AL]. Revista Brasileira de Crescimento e Desenvolvimento Humano,
2010; 20(1): 61-69.
28 “Corpos em Rebelião e o sofrimento-resistência: adolescentes em conflito com a lei”. Maria Cristina
Vicentin, Revista de Sociologia da USP, Tempo Social, v.23, n.1, p.97-113.
27
Sob outro ponto de vista, de se ponderar que, não bastasse a demonstrada inadequação
da criação da novel medida socioeducativa, também outra violação aos direitos dos
adolescentes emerge: não há, no texto legal proposto, qualquer restrição à imposição da
nova (e inadequada) medida socioeducativa proposta, de modo que, seja qual for o ato
infracional, presentes ou não violência ou grave ameaça, primária/o ou não a/o jovem
acusada/o, será possível a sua internação nos casos “transtorno ou deficiência mental
constatada por meio de exame médico-legal e incapacidade de entender o caráter
pedagógico e educacional das medidas socioeducativas previstas nos demais incisos”.
A novidade, portanto, demais de ser claramente inadequada aos fins que se propõe,
subverte o sistema sócio-educativo, que é calcado em disposições constantes de
diplomas internacionais, da Constituição da República e do ECA.
Tais normativas guindam ao patamar de prioridade absoluta o melhor interesse da
criança e do adolescente e, na repressão de atos infracionais, atribuem à privação de
liberdade o caráter de medida excepcional.
Nesse sentido, dispõe o artigo 37, item “b”, da Convenção das Nações Unidas de
Direito da Criança (1989):
“A detenção, a reclusão ou a prisão de uma criança será efetuada em
conformidade com a lei e apenas como último recurso, e durante o mais
breve período de tempo que for apropriado”
Em sentido homólogo, vale lembrar o que dispõem as Diretrizes das Nações Unidas
para a Prevenção da Delinqüência Juvenil (“Diretrizes de Riad”) em seus itens 4 e 5:
“4. É necessário que se reconheça a importância da aplicação de políticas e
medidas progressistas de prevenção da delinqüência que evitem
criminalizar e penalizar a criança por uma conduta que não cause
grandes prejuízos ao seu desenvolvimento e que nem prejudique os
demais. Essas políticas e medidas deverão conter o seguinte:
a) criação de meios que permitam satisfazer às diversas necessidades dos
jovens e que sirvam de marco de apoio para velar pelo desenvolvimento
pessoal de todos os jovens, particularmente daqueles que estejam
patentemente em perigo ou em situação de insegurança social e que
necessitem um cuidado e uma proteção especiais.
b) critérios e métodos especializados para a prevenção da delinqüência,
baseados nas leis, nos processos, nas instituições, nas instalações e uma rede
de prestação de serviços, cuja finalidade seja a de reduzir os motivos, a
necessidade e as oportunidades de cometer infrações ou as condições que
as propiciem.
c) uma intervenção oficial cuja principal finalidade seja a de velar pelo
interesse geral do jovem e que se inspire na justiça e na eqüidade.
d) proteção do bem-estar, do desenvolvimento, dos direitos e dos interesses
dos jovens.
e) reconhecimento do fato de que o comportamento dos jovens que não se
ajustam aos valores e normas gerais da sociedade são, com freqüência,
parte do processo de amadurecimento e que tendem a desaparecer,
espontaneamente, na maioria das pessoas, quando chegam à maturidade,
e
f) consciência de que, segundo a opinião dominante dos especialistas,
classificar um jovem de "extraviado", "delinqüente" ou "prédelinqüente" geralmente favorece o desenvolvimento de pautas
permanentes de comportamento indesejado.
5. Devem ser desenvolvidos serviços e programas com base na comunidade
para a prevenção da delinqüência juvenil. Só em último caso recorrer-se-á a
organismos mais formais de controle social.”
A Constituição da República assenta que o direito à proteção especial abrangerá,
entre outros aspectos, a “obediência aos princípios de brevidade, excepcionalidade e
respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento, quando da aplicação
de qualquer medida privativa da liberdade” (artigo 227, § 3º).
Na mesma trilha, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) reafirma a
excepcionalidade da medida de internação (artigo 121):
“A internação constitui medida privativa da liberdade, sujeita aos princípios
de brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em
desenvolvimento”
Justamente ao fim de estabelecer limites claros à excepcional medida de restrição de
liberdade (inclusa aqui a nova medida, que prevê “regime de internação”), o Legislador
cingiu a sua aplicação às hipóteses de ato infracional cometido com violência ou grave
ameaça à pessoa.
O fundamento de racionalidade dessa moldura legal é bastante simples e guiado pela
excepcionalidade de medida de internação, que, como se aferiu, é fartamente
normatizada: parte-se do pressuposto de que a medida de internação é a menos eficaz
e a mais traumática das medidas aplicáveis ao adolescente infrator, razão pela qual
apenas quando a conduta se concretiza com o emprego de violência ou grave ameaça
passa a ser admissível a privação da liberdade.
Observe-se que, mesmo nas hipóteses de ato infracional que envolve violência ou grave
ameaça, ao Juízo caberá ponderar se há outra medida adequada, sempre com o intuito de
evitar a perniciosa medida de internação:
“Em nenhuma hipótese será aplicada a internação, havendo outra
medida adequada” (artigo 122, § 2º).
Infere-se, pois, que a abertura para a aplicação de nova medida sócioeducativa de
internação a jovens com transtornos mentais, independentemente do ato infracional pelo
qual é acusado, é temerária e contrária ao melhor interesse do adolescente, na medida
em que generaliza medida que deveria ser excepcional (e, em última instância, dada a
inadequação já exposta no item anterior, sequer deveria existir).
III. Conclusão
Em sede de processo socioeducativo, cabe à atividade jurisdicional propagar garantia de
direitos não promovidos pelo Poder Executivo. Conforme vimos, o art. 112 do ECA
autoriza o juiz a aplicar, adjacente à determinação socioeducativa, a medida de
proteção, que pode se constituir, portanto, em assistência à saúde mental do/a
adolescente.
Logo, não há necessidade de se criar mais uma medida socioeducativa, pois, conforme
expõe Paulo Afonso Garrido de Paula, o interesse juridicamente protegido (nesse caso,
de acesso a serviços de saúde) nem sempre precisa resultar de norma específica,
devendo o magistrado recorrer a ferramentas interpretativas que possibilitam equacionar
relações conflituosas: “não concebo uma tutela de interesse divorciada de juridicidade;
eventuais dificuldades devem ser superadas pela atividade de interpretação”29.
Em síntese de boa parte do que aqui se defende, Bianca Mora de Moraes e Helena
Vieira Ramos, ao tratarem da questão do adolescente portador de deficiência mental,
destacam:
“(...) na prática o que ocorre é a falta de instituições adequadas para o
tratamento individual e especializado legalmente previsto, ocasionando
diversidade de atuações para a solução dos casos concretos. Verifica-se que,
lamentavelmente, na maioria das vezes é aplicada a medida socioeducativa de
internação, deixando-se a cargo da entidade recebedora do jovem as
providências necessárias para o tratamento dos distúrbios psiquiátricos.
Considera-se, acompanhando João Batista Costa Saraiva, que aos
adolescentes em tal situação não há como se aplicar medida socioeducativa,
mas sim aquela que emerge do disposto no §3º do art. 112, c/c o art. 101, V,
ECA”30.
Veicular a proteção de direitos por meio exclusivo da responsabilização
socioeducativa é aproximar a garantia de direitos da prática menorista e tutelar
que vigorou por séculos no Brasil e, em legislação específica, por 63 anos. Garantir
proteção pela via da repressão, restrição de direitos e privação de liberdade é
exatamente a ação que caracteriza, primordialmente, a doutrina da situação irregular. Os
meninos e meninas abandonados ou negligenciados eram internados em instituições
asilares, correcionais e disciplinares justamente para que obtivessem alguma garantia de
acesso a serviços públicos que lhes fortalecessem como seres humanos ordeiros,
corretos e obedientes. Essa era a visão que não pode ser mais ressuscitada, pois para ela
não há mais espaço em nossa história.
Ante todo o articulado, Conectas, CFP, Sou da Paz, Pastoral Carcerária, IDDD,
ITTC e RENADE se manifestam pela rejeição integral do PLS 23/2012, vez que
manifestamente eivado de inconstitucionalidade material.
PAULA, Paulo Afonso Garrido de. Direito da criança e do adolescente e tutela jurisdicional
diferenciada. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 55.
30 Curso de Direito da Criança e do Adolescente (Coordenação: Kátia Regina Ferreira Lobo Andrade
Maciel). Ed. Lumen Juris, 2008. 3ª edição.
29
NOTA TÉCNICA
A secretaria executiva da Rede Nacional de Defensores do Adolescente
em Conflito com a Lei – RENADE – vem apresentar posicionamento técnico acerca da
tramitação do Projeto de Lei n. 1.185/2012 da Câmara Legislativa do Distrito Federal,
conforme segue.
Preliminarmente, cai por terra o texto do Projeto de Lei simplesmente
porque imbuído de vício: desconsidera o rol taxativo de possíveis portadores de arma,
dentro do qual não se incluem agentes do sistema socioeducativo. É de se ver, conforme
a lei federal n. 10.826/2003:
.............................................................................................................................................
Art. 6º É proibido o porte de arma de fogo em todo o território nacional, salvo para os
casos previstos em legislação própria e para: (destaque nosso)
.............................................................................................................................................
Conforme sinaliza o artigo, os incisos a seguir tratam dos
possíveis titulares do direito ao porte, também citados na Exposição de Motivos do
Projeto de Lei em pauta. Conforme afirmam os próprios parlamentares autores do texto
projetado, os profissionais do sistema socioeducativo não são contemplados no elenco.
Entretanto, por artifício de linguagem, os mesmos autores explicam não se tratar de rol
taxativo de portadores de arma, restringindo as condições de porte apenas à prévia
existência de legislação própria. E finalizam: se houver lei própria para essa categoria
de trabalhadores, não há impedimento legal para a garantia do direito. Vejamos.
O projeto de lei se justifica a partir do mesmo caput do art. 6º da
lei 10.826/2003, interrompendo o período, como se verifica: Art. 6º É proibido o porte
de arma de fogo em todo o território nacional, salvo para os casos previstos em
legislação própria... E conclui: Ocorre que a Legislação do Desarmamento, em seu art.
6º, não exclui outras categorias, desde que haja legislação própria, vejamos. Assim
citado, convence o desavisado que não tem a oportunidade de ler o artigo integralmente.
Ao afirmar que não se trata de rol taxativo, desconsidera o aditivo
“e”, pelo que, portanto, passa a inovar a legislação federal, o que não cabe ao ente
federativo distrital.
O artigo 6º da lei mencionado é expresso quanto aos possíveis
titulares do direito ao porte de armas. Mais que isso, reserva-lhes o direito, porém,
condiciona seu exercício à promulgação de legislação própria e para determinadas
categorias populacionais. Fundamental a observação desse aditivo, que cerca em
absoluto o grupo ao qual o direito é garantido.
No mérito, em consonância com a Nota de Recomendação do
Conselho dos Direitos da Criança e do Adolescente do Distrito Federal - CDCA/DF,
compartilhamos o posicionamento político segundo o qual os princípios armamentistas
estabelecidos no Projeto de Lei ora impugnado não se coadunam com os princípios de
direitos humanos que regem a legislação brasileira de proteção integral de crianças e
adolescentes. Quanto aos parâmetros político-metodológicos de atendimento de
qualquer criança e adolescente, distinção não há entre as ações de garantia de direitos
seja dentro ou fora do sistema socioeducativo, pois servem – todos – ao paradigma
contemporâneo de proteção dos direitos humanos.
Desse modo, o fato de estarem os adolescentes inseridos no
sistema socioeducativo não enseja constatar, automaticamente, perigo na atuação
educadora. Não há porque sustentar ações bélicas no lugar de intervenções
socioeducativas. Em outra medida, se defendido o uso apenas fora do sistema
socioeducativo, entende-se que cabe ao profissional prover cuidados e exigi-los do
Estado. Todavia, que sejam mecanismos de proteção de outra ordem, em nada associada
à natureza da atividade socioeducativa.
Nesses termos, rechaçamos o texto veiculado pelo PL n. 1.185,
em trâmite na Câmara Legislativa do Distrito Federal, compondo com os defensores de
direitos humanos de crianças e adolescentes.
Nota técnica sobre a compatibilidade verificada entre o Decreto n. 3.597/2000, pelo
qual o Congresso Nacional ratifica a subscrição da Convenção 182/1999 da
Organização Internacional do Trabalho realizada pelo Estado Brasileiro.
A Rede Nacional de Defensores do Adolescente em
Conflito com a Lei (RENADE), em sua terceira edição, vem apresentar a situação
normativa e sugestão para a resolução da equação composta, de um lado, pela norma
presente na Convenção 182 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) –
ratificada pelo Brasil por meio do Decreto n. 3.597/2000 -, e de outro, pelo conjunto
normativo nacional encabeçado pela lei federal n. 8.069/90 (Estatuto da Criança e do
Adolescente).
Preliminarmente,
responde
brevemente
às
questões
apresentadas:
a)
Você vê alguma lacuna entre a normativa internacional de proteção aos direitos
da criança e do adolescente e a legislação nacional? Em caso afirmativo,
(a.1) Em qual(is) normativa(s) internacional(is) e quais os aspectos não se encontram
contemplados na legislação nacional?
A lacuna se estabelece no conflito entre o art. 3º da
Convenção 182 da OIT, subscrita pelo Brasil e ratificada internamente por meio do
Decreto n. 3.597/2000, e o arcabouço legal nacional, em especial o Estatuto da Criança
e do Adolescente. Na Convenção da OIT, define-se que o reconhecimento da prática
adolescente de tráfico de drogas implica a assertiva de que o adolescente se situa na
condição de vítima de uma das piores formas de trabalho infantil. Já a legislação
nacional em vigor desde antes desta Convenção permanece tipificando a conduta
adolescente no âmbito penal e, em decorrência, responsabilizando-o apenas como autor
perante tal prática.
(a.2) Qual é o conteúdo da inclusão ou mudança a ser proposta?
O conteúdo se refere à compreensão de que seja necessário
compatibilizar os entendimentos antagônicos automaticamente vigentes no Brasil.
b)
No caso da legislação nacional você avalia a necessidade alteração ou
complementação de aspectos ainda não regulamentados? Em caso positivo,
(b.1) Em qual (is) lei (s) e quais aspectos (artigos) necessitam alteração/complemento?
Importa desclassificar do campo infracional o ato de
tráfico de drogas, tornando-o uma ocorrência que interesse apenas em âmbito civil, de
modo que sejam as políticas sociais estatais o conteúdo essencial e exclusivo da
resposta estatal frente à conduta.
(b.2) Qual seria o conteúdo da alteração/complementação necessária em cada uma das
normas mencionadas?
A sugestão pode tomar dois caminhos alternativos:
1) Derrogar o art. 103 do ECA, acrescentando-lhe a informação (na forma de
parágrafo) que excetua o tráfico de drogas do quadro de ato infracional,
tornando-o uma conduta que não interesse ao âmbito da justiça especial da
infância e juventude, tampouco ao sistema socioeducativo,
ou
2) Derrogar os artigos pertinentes aos procedimentos judiciários de apuração do ato
infracional, de modo a, ainda que sejam comprovadas a conduta e sua autoria,
não caber ao/à adolescente nenhuma das medidas socioeducativas estabelecidas
pelo ECA, mas apenas as medidas protetivas.
TEXTO DE JUSTIFICATIVAS
I – O comércio de substâncias psicoativas Ilícitas e o Estatuto da Criança e do
Adolescente
O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) impõe, em
seu artigo 103, que ato infracional é a “conduta descrita como crime ou contravenção
penal”. Portanto, de início concluímos que qualquer tipo penal inserido no Código Penal
e na legislação extravagante é, automaticamente, considerado ato infracional. Portanto,
o comércio de substâncias psicoativas ilícitas, nos termos do art. 33 da Lei federal n.
11.343/2006 combinado com o art. 103 do ECA, configura ato infracional.
Em um próximo plano, temos que o ato infracional enseja
investigação policial e, de modo geral, processo judicial, inaugurado a pedido do
promotor de justiça que, após ouvir o/a adolescente suspeito/a (art. 179, ECA), oferece
representação ao Juízo. Se recebida a representação, deve o/a juiz/a agendar a
audiência de apresentação (art. 184, ECA), por meio da qual colherá as primeiras
informações diretamente junto ao/à adolescente e família, bem como verificará a
necessidade de realização de próxima audiência, denominada em continuação, na qual
também se ouvirão as testemunhas. Essa audiência é obrigatória nos casos de possível
internacional em estabelecimento educacional (art. 186, § 2º, ECA). A todo tempo, vale
ressaltar, o juiz pode conceder a remissão (art. 188, ECA).
Vem, assim, o chamado tráfico de drogas a ser ato
infracional que enseja a passagem do/a adolescente por todas essas etapas.
Especialmente em função da natureza da prática – que justificou sua inserção na lei de
crimes hediondos (lei federal n. 8.072/90) -, ainda que não ocorra, via de regra, por
meio de grave ameaça ou violência, pois, de modo geral, exaure-se tão somente a partir
da compra e venda de um produto classificado como ilegal.
II – O comércio de substâncias psicoativas ilícitas e a Convenção 182 da OIT.
A Convenção 182 da OIT determina a “proibição das
piores formas de trabalho infantil e ação imediata para sua eliminação”. Informa, assim,
que o tráfico de substâncias psicoativas ilícitas é uma das piores formas de trabalho
infantil.
--------------------------------------------------------------------------------------------------------------------Artigo 3º. Para os fins desta Convenção, a expressão as piores formas de trabalho
infantil compreende:
(c) utilização, demanda e oferta de criança para atividades ilícitas, particularmente
para a produção e tráfico de drogas conforme definidos nos tratados internacionais
pertinentes;
--------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------Primeiro, devemos qualificar o público “infantil”.
Correlato ao público criança, essa expressão, conforme a Convenção Internacional
sobre os Direitos da Criança - e todos os demais documentos contemporâneos a ela
alinhados -, intitula todas as pessoas situadas entre 0 e 18 anos de idade incompletos.
Portanto, compreende a população de crianças e adolescentes em âmbito nacional.
Em segundo, constatamos que a prática de comércio de
substâncias psicoativas ilícitas cometida por esse público é tratada, em nível
internacional, como agressão e violação de seus direitos. Daí, a configuração de
exploração de trabalho infantil. Já em nível nacional, entretanto, é exclusivamente
tratada como autoria de ato infracional e ofensa por parte do/a adolescente frente à
sociedade31, pois tipificado como crime:
31
Importa lembrar que há doutrinadores contemporâneos críticos que contestam a dogmática jurídica
segundo a qual o crime que afeta um bem jurídico e uma vítima abstrata (caso do tráfico de drogas, que
não apresenta bem e vítima diretamente ofendida) é válido e implica responsabilização na mesma
medida que os demais delitos.
----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------Lei federal n. 11.343/2006
Art. 33. Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender,
expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar,
prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que
gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou
regulamentar:
Pena - reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a
1.500 (mil e quinhentos) dias-multa.
------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------Ao mesmo tempo, é da letra do Decreto n. 3.597/2000,
que “promulga Convenção 182 e a Recomendação 190 da Organização Internacional do
Trabalho (OIT) sobre a Proibição das Piores Formas de Trabalho Infantil e a Ação
Imediata para sua Eliminação, concluídas em Genebra, em 17 de junho de 1999”, a
determinação de cumprimento, pelo Estado Brasileiro, dos dispositivos instalados na
Convenção:
------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------Art. 1º A Convenção 182 e a Recomendação 190 da Organização Internacional do
Trabalho (OIT) sobre a Proibição das Piores Formas de Trabalho Infantil e a Ação
Imediata para sua Eliminação, concluídas em Genebra, em 17 de junho de 1999,
apensas por cópia a este Decreto, deverão ser executadas e cumpridas tão inteiramente
como nelas se contém.
-------------------------------------------------------------------------------------------------------------------Ora, impossível não verificar a incompatibilidade entre a
consideração do ato de tráfico e a resposta estatal planejada em nível internacional e
em nível nacional, levando-se em conta que o Brasil é legislador nos dois âmbitos.
III – Incompatibilidade entre papeis de vítima e de autor assumidos pela mesma
pessoa
Vimos que, no Brasil, vigora um conjunto normativo
(mais antigo) que impõe a qualidade penal à prática de comércio de substâncias
psicoativas, bem como invoca o sistema penal e de justiça juvenil para as devidas
apuração e responsabilização. Constatada a autoria e materialidade da prática, esse
ordenamento jurídico responde apenas de modo responsabilizatório – à luz da
tipificação penal agravada, vale reiterar, pela lei de crimes hediondos. É o que se
verifica quando da leitura de qualquer relatório sobre o sistema de justiça juvenil e o
sistema socioeducativo, pelos quais se constata que o tráfico de drogas está sempre
disputando com o ato equivalente a roubo o primeiro lugar na tabela classificatória da
incidência de atos infracionais. Tanto assim que o Superior Tribunal de Justiça decidiu,
por meio da Súmula 492/2012, que
O ato infracional análogo ao tráfico de drogas, por si só, não conduz obrigatoriamente
à imposição de medida socioeducativa de internação do adolescente.
Ao surgir da mesma constatação de alta incidência de
tráfico de drogas nas Varas da Infância e Juventude e, em decorrência do rigor
responsabilizatório sobre a autoria e caráter ofensivo do ato, nas unidades de internação,
essa determinação dos magistrados superiores tem a finalidade de inibir os juízes frente
às corriqueiras sentenças judiciais mais severas. Entretanto – e também por isso -, é
necessário que se amplie o objetivo dessa súmula, incidindo nas estruturas do processo
responsabilizatório, de modo que não restem medidas socioeducativas a serem aplicadas
justamente porque a República Federativa do Brasil adotou, recentemente, a estratégia
de situar o/a adolescente no lugar de vítima de práticas de exploração do trabalho. Estar
nesse posto impõe ao Poder Judiciário o dever de isentar o/a adolescente da medida de
responsabilização, qualquer que seja. Em outras palavras, se do mundo dos brocardos
jurídicos podemos extrair a velha máxima de que ninguém pode ser considerado
autor e vítima do mesmo crime (ato infracional), aos/às adolescentes imputadas
práticas de comércio de substâncias psicoativas ilícitas devem seguir respostas estatais
de ordem distinta das tradicionais socioeducativas.
Parecer Técnico ao Projeto de Decreto Legislativo do Senado Federal n. 539/2012
O Projeto de Decreto Legislativo 539/2012 tem como objeto a convocação de
Plebiscito, de âmbito nacional, para consulta dos eleitores no primeiro turno das
eleições de 2014, sobre a alteração da maioridade penal. Eis aredação do decreto:
Art. 1º É convocado, nos termos do art. 49, XV, da Constituição
Federal e da Lei nº 9.709, de 18 de novembro de 1998,
plebiscito, de âmbito nacional, para consultar os eleitores sobre
a alteração da maioridade penal de dezoito para dezesseis anos.
Art. 2º O plebiscito de que trata este Decreto Legislativo
realizarse-á juntamente com o primeiro turno das eleições de
2014, para deliberar sobre a seguinte questão: “Você é a favor
da alteração da maioridade penal de dezoito para dezesseis
anos?”. Parágrafo único. Fica sustada a tramitação das
proposições legislativas cuja matéria constitua objeto desta
consulta popular, até que o resultado das urnas seja
proclamado, na forma do art. 9º da Lei nº 9.709, de 1998.
Art. 3º O Presidente da Mesa do Congresso Nacional dará
ciência da aprovação deste ato convocatório ao Tribunal
Superior Eleitoral, para os efeitos previstos no art. 8º da Lei nº
9.709, de 1998.
Art. 4º Este Decreto Legislativo entra em vigor na data de sua
publicação.
I - Histórico das Propostas de Redução da Maioridade Penal
Desde o século XIX, a questão da criminalidade infanto juvenil no Brasil perpassou
uma série de discursos e práticas no saber jurídico, nas práticas institucionais (tanto em
termos assistenciais e pedagógicos, como numa perspectiva punitiva e reformadora)
voltadas aos adolescentes autores de atos infracionais na tentativa de solucionar a
questão da criminalidade das crianças e adolescentes ou de outro modo, a questão do
“menor”.
De um modo geral, as diferentes formas de organização do sistema da justiça criminal
(Roda dos Expostos, Código Criminal do Império, o Código Penal de 1890, o Código de
Menores de 1927, a FUNABEM e as FEBEM´s) basearam-se na construção de um
aparato médico-jurídico-assistencial, que se dividiu em prevenção (vigiar a criança),
recuperação (reabilitar a criança e o adolescente criminoso), educação (disciplinar a
criança ao trabalho) e na repressão (conter crianças e adolescentes delinqüentes)
(SPOSATO, 2001)32. Vale observar a ementa das principais leis: o Código de Menores
de 1927 previa a proteção e assistência; o Código de Menores de 1979 previa, além da
proteção e assistência, a vigilância.
Esta preocupação com a criminalidade infanto-juvenil (que se manifesta de tempos em
tempos no discurso favorável a diminuição da maioridade penal) vem funcionando
durante este tempo, mais como um instrumento de marginalização da população pobre
do que uma ampliação e um reconhecimento dos direitos civis dos jovens (Alvarez,
1997).
É, portanto, na tentativa de romper com as antigas concepções higienistas,
assistencialistas e repressoras que predominaram no tratamento à infância e juventude
no Brasil, que o Estatuto da Criança e do Adolescente é promulgado em 1990 (lei
8.069). O ECA colocou a questão da infância e juventude no centro do ordenamento
jurídico brasileiro, em consonância com os movimentos internacionais de direitos e
proteção da criança e do adolescente colocando-os agora, como sujeitos de direitos.
Mesmo com esses avanços o ECA é constantemente criticado por diferentes setores da
sociedade (meios de comunicação, deputados, organizações civis) por não possuir
medidas “punitivas”, mas “somente” as chamadas sócio educativas. Estes setores
reclamam que o ECA mantém impunes os adolescentes autores de atos infracionais,
SPOSATO, K. B. Pedagogia do medo: adolescentes em conflito com a lei e as propostas de
redução da idade penal. Cadernos Adenauer, Rio de Janeiro, v .6, p.31-49, 2001.
32
motivo pelo qual se faria necessária a redução da idade penal para conter supostas
“ondas” de criminalidade em cuja atual configuração de violência urbana seriam os
jovens seus principais atores e responsáveis. Assim, crianças e adolescentes brasileiros
são vistos historicamente como objeto de intervenção das instâncias de correção e das
chamadas instituições de ortopedia social (ADORNO, 2002).
Nesse sentido, emergem as diferentesPropostas de Emenda à Constituição Federal ou
Projetos de Decretos Legislativos que tramitamna Câmara dos Deputados e no Senado
Federal desde 199333. Esses projetos propõem reduzir a imputabilidade penal dos atuais
dezoito para dezesseis anos de idade, ou, em alguns casos, até quatorze ou doze anos,
modificando assim a redação do artigo 228 da Constituição Federal.
Conforme expomos a seguir, o PDS n° 539 de 2012 é inconstitucional. Tal proposta não
pode ser objeto de deliberação, visto que: i) a afirmação da idade penal faz parte dos
direitose garantias constitucionais fundamentais de natureza individual, portanto,
irrevogáveis; ii) o Brasil ésignatário dos tratados internacionais - a exemplo da
Convenção sobre os Direitos da Criança da ONU de 1989 – que confirmam os 18 anos
como marco de idade penal; iii) as taxas de incidência infracional estão caindo desde o
início do século XX, iv) a ‘irresponsabilidade penal da criança e do adolescente’ é um
mito.
I – A maioridade penal é Cláusula Pétrea.
A redução da idade penal é imbuída de uma questão constitucional fundamental: ela é
cláusula pétrea, sendo parte dos direitos e garantias fundamentais individuais de nossa
Constituição Federal de 1988. É o que consta do art. 60, §4º, da Carta Maior:
Art. 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta:
§ 4º - Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a
abolir:
33
PEC 171/1993 Deputado Benedito Domingos.
I - a forma federativa de Estado;
II - o voto direto, secreto, universal e periódico;
III - a separação dos Poderes;
IV - os direitos e garantias individuais.
Ora, se consta da Carta Magna que as garantias constitucionais individuais não podem
ser revogadas senão por meio de nova Constituinte Originária; e se os direitos e
garantias individuais estão espalhados ao longo da Constituição Federal, a exemplo do
constante de seu art. 228 (idade penal aos 18 anos de idade); concluí-se que esse marco
etário poderá ser alterado somente a partir da vigência de nova Constituição Federal,
não vindo um plebiscito ou uma emenda constitucional a ter força suficiente para sua
revogação.
Em outra medida, cabe dizer que a Constituição de 1988 inseriu a resposta do Estado
frente
atos
infracionais
cometidos
por
adolescentes
no
sistema
de
garantiasconstitucionais e penais. Isto, no plano jurídico, define que:
1) Como crianças e adolescentes gozam de todos os direitos
fundamentais atribuídos a quaisquer cidadãos (art. 5°, CF, e art. 3º,
ECA), além dos direitos especiais constantes do Estatuto da Criança e do
Adolescente, que ainda reserva ao Estado a única opção de promoção de
atos discriminatórios positivos, sendo-lhe vedado executar ações que
tenham a finalidade protetiva, que ampliem os direitos das crianças e
adolescentes (art. 5º, ECA)
2) reconhece que a resposta do Estado contra o adolescente comporta
privação de liberdade (art. 227, § 3°, V, CF): na democracias não há
prisão sem o devido processo legal e o sistema constitucional de
garantias (art. 5º, incisos XXXVII a LXVIII, CF). AConstituição
Federal, ainda, guarda norma expressa sobre a reserva da prisão como
conseqüência de prática de crime (art. 5°, LXVII), sendo autorizadas
apenas duas exceções constitucionais, que não se aplicam, por definição,
a crianças e adolescentes34.
Prisão civil de curta duração para devedores de alimentos e depositários infiéis; situações jurídicas
nas quais crianças e adolescentes, porque são incapazes civilmente, nunca podem estar.
34
Desse modo, a Constituição Federal confere a crianças e adolescentes todas as garantias
de natureza penal e processual penal conferida aos adultos, mas em respeito à condição
peculiar de crianças e adolescentes em fase de desenvolvimento, assegurou-lhe mais
garantias (garantias especiais, exclusivas de crianças e adolescentes), também em
relação à resposta do Estado quando estes cometem atos infracionais. Trata-se de
conquistas sociais admitidas e assumidas pela sociedade, que, por sua vez, deve abrir
mão do retrocesso e lançar mão de criatividade e ações em busca da superação de novos
desafios, muitos deles decorrentes da própria assunção do contemporâneo marco
regulatório dos direitos humanos universais.
A essa dinâmica atribui-se a expressão vedação do retrocesso social (SILVA, 2010)35,
segundo a qual a sociedade brasileira não pode abandonar as conquistas sociais, em
especial aquelas positivadas na Carta Federal e reconhecida a todo e qualquer cidadão
brasileiro. Em outra ordem, é como se o Parlamento Federal decidisse impor um
plebiscito para que a sociedade decida se deseja rever o caráter universal do sistema
único de saúde, colocando-o em cheque. Não há, portanto, lei ou mecanismo subjacente
à Constituição Federal que possa veicular decisões contrárias às conquistas históricas do
povo brasileiro.II – O valor constitucional dos documentos internacionais assinados
pelo Brasil.A Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança – ratificada
internamente pelo Decreto 99.710/90 – estabelece que criança (no Brasil, compreendida
como as fases de criança e adolescente) é o sujeito que se encontra até os 18 anos de
idade. Trata-se do primeiro marco etário para definições de direitos, deveres e políticas
públicas correspondentes. Esse documento internacional alinha-se a outros, como as
Regras Mínimas das Nações Unidas para a Administração da Justiça de Menores
(Regras de Beijing, 1985), e as Diretrizes das Nações Unidas para a Prevenção da
Delinquência Juvenil (Diretrizes de Riad, 1990). Todos esses documentos confirmam
que a idade penal deve dividir a fase adulta da fase infanto-adolescente, e, portanto,
distinguir os tratamentos estatais perante a prática delituosa.A Constituição Federal, por
sua vez, estabelece em seu art. 5º, § 3º, que: Os tratados e convenções internacionais
35
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Malheiros, 2010.
sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional,
em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes
às emendas constitucionais. Nesse sentido, se as premissas são:
a) A Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança é documento
subscrito e ratificado internamente pelo Brasil;
b) Conforme apregoa a Carta Magna Brasileira, todo documento
internacional assinado no exterior e ratificado em âmbito interno terá valor
constitucional;
Logo:
c) A Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança e os demais
tratados, pactos e diretrizes dos quais o Brasil é signatário são documentos
com status constitucional.
Nessa medida, se trata de documentos de valor constitucional, podem ser revogados ou
contrariados apenas se não se tratarem de cláusula pétrea, seguindo as premissas e o
raciocínio do primeiro item dessa arrazoado. E, como tratam de garantias
constitucionais – que reforçam as já previstas pela Assembléia Constituinte -,
asseguram, indubitavelmente, a perenidade dessa norma e desse direito de qualquer
adolescente brasileiro, independentemente de ter cometido ato infracional. Nasce com o
direito de ser tratado de modo diferente, de receber, portanto, uma discriminação
positiva.
Segundo Machado36 (2006, p.107):“Neste passo, cumpre frisar que, se o direito de
liberdade da pessoa física criança ou adolescente possui as especificidades já referidas
no item II supra, é de ver que a imaturidade/vulnerabilidade do sujeito de direito, na
Democracia
não
pode
ser
invocada
para
discriminá-lo
negativamente.
A
desequiparação jurídica que a Constituição de 1988 criou para crianças e adolescentes
é a desequiparação jurídica protetiva, que é própria da atual fase de evolução da
“MACHADO, MARTHA .T. Sistema Especial de proteção da liberdade do adolescente na
Constituição brasileira de 1988 e no Estatuto da Criança e do Adolescente. In: ILANUD, ABMP,
SEDH, UNFPA (Orgs) Justiça Adolescente e Ato Infracional: socioeducação e responsabilização.São Paulo,
2006, p.87-123”.
36
proteção aos direitos humanose que vem adotada na Convenção dos Direitos da
Criança e do Adolescente (ONU, 1989).”
Dentre estas garantias, estabeleceu-se a inimputabilidade penal para a pessoa até dezoito
anos de idade incompletos, que vem expressa nos artigos 228 e 227, § 3 º, V, última
parte, do texto constitucional. Este marco normativo diferencia-se da inimputabilidade
penal que vigorava no o paradigma menorista, pois,segundo Machado(ibid, p.108):
“[...]era uma inimputabilidade penal que impunha a crianças e adolescentes tratamento
penal severamente mais gravoso que aquele reservado aos adultos (impunha uma
medida de segurança perpétua, sem incidência da reserva legal, do contraditório e da
ampla defesa, entre outras salvaguardas.”
Portanto, a inimputabilidade penal atual impede a aplicação da sanção criminal (das
penas reservadas aos adultos). E isso configura não apenas preceito penal, mas
constitucional pétreo, de modo que se permite alteração apenas se promulgada nova
Carta Magna.
Ao assim determinar, a Assembleia Constituinte de 1988 ponderou sobre os valores
individuais e sociais na situação específica de crime cometido por adolescente, optando
pela enorme capacidade de autotransformação, que é própria do ser humano, impondo a
prevalência de medidas protetivas e educativas e instituindo as garantias de
excepcionalidade e brevidade da privação de liberdade (art.227, § 3º, V), que o ECA
tratou de concretizar. Destarte: “Importante destacar que a excepcionalidade não é só
das medidas privativas de liberdade (no ECA, internação e semi-liberdade), mas sim
uma excepcionalidade da própria imposição de qualquer medida sócio-educativa...E
veja-se que a excepcionalidade do sistema de responsabilização de crianças e
adolescentes vem e consonância com o princípio da intervenção mínima, contido nos
documentos da ONU: Diretrizes de Riad; Assembleia Geral Resolução 45/112-1990),
art 5º, caput, ‘e’ e ‘f ‘, e art 6º; Regras de Tóquio (AG 45/110 – 1990 – medidas não
privativas de liberdade) – art. 2.6” (ibid, p.109-110).
Sobre esse aspecto, também nos diz Dallari: “A previsão de tratamento jurídico
diferente daquele que se aplica aos adultos é um direito dos menores de 18 anos, que
são pessoas, indivíduos,sujeitos de direitos. De acordo com o artigo 60, § 4º, da
Constituição, não poderá ser objeto de deliberação proposta de emenda constitucional
tendente a abolir garantias individuais” (DALLARI, 2001, p. 25).
III – As taxas de incidência infracional estão caindo desde o iníciodo século XX.
Em poucas palavras, podemos informar que as taxas de incidência de ato infracional
têm caído significativamente ao longo do século XX. É o que extraímos da literatura.
Segundo Marcio Antonio Cabral dos Santos, “entre 1900 e 1916, o coeficiente de
prisões por dez mil habitantes era distribuído da seguinte forma”: 307,32 crimes
cometidos por adultos e 275,14 delitos cometidos por crianças e adolescentes, o que
sugere uma proporção de quase 50% para cada faixa etária (SANTOS: 214)37.
Atualmente, temos a proporção de 10% dos crimes cometidos pela adolescência, o que
significa drástica redução da participação desses jovens nas ações delituosas, por
diversos motivos, entre elas, o próprio aumento da idade penal (à época da primeira
constatação, vigorava o Código Penal da Republica – 1890 -, pelo qual se instituía a
responsabilização penal especial entre os 09 e 17 anos de idade), bem como os novos
modelos de Estado que acentuaram seu papel de executor de políticas públicas sociais,
fundamentais para o desenvolvimento humano.
Vale frisar que atualmente, os dados da Secretaria Especial de Direitos Humanos
indicam um estabilização das taxas de atos infracionais privados de liberdade desde
2007: cerca de 16 mil adolescentes. Ainda, sobre este aspecto, a pesquisa do CNJ da
série “Pensando o Direito” (2010)38 constatou que:“...os dados coletados junto aos
Tribunais de Justiça e Superior Tribunal de Justiça em matéria de medida
socioeducativa de internação, e posteriormente, a observação de casos junto às Varas
da Infância e Juventude de São Paulo, Porto Alegre, Recife e Salvador, permitiram
concluir que, apesar das propostas garantidoras do Estatuto, a prática forense nem
sempre está com ela alinhada. Foi possível constatar que a medida de internação é
sistematicamente imposta com baixa fundamentação legal. Em muitos casos, sem a
devida consideração dos requisitos legais exigidos pelo ECA.”
37
38
SANTOS, Marcio Antonio Cabral dos. História das Crianças no Brasil. São Paulo: Contexto, 2006.
ECA: Apuração do Ato Infracional Atribuído a Adolescentes. Série Pensando o Direito, Nº
26/2010. Universidade Federal da Bahia (UFBA) e Secretaria de Assuntos Legislativos do
Ministério da Justiça (SAL).
IV – O mito da irresponsabilidade penal do adolescente
Por último, vale citarmos mais uma característica importante acerca do debate sobre a
redução da inimputabilidade penal: o mito da irresponsabilidade penal do adolescente.
Segundo o Volpi39, esta idéia se baseia na concepção de que o adolescente é incitado a
cometer um ato infracional porque a atual legislação é branda quanto a sua punição.
Confunde-se então, inimputabilidade com impunidade e se esquece que existem as
medidas sócio-educativas que até o momento ainda não foram implementadas
integralmente em nosso país, para responsabilização dos adolescentes.Assim sendo,
estas propostas reafirmam uma perspectiva criminalizadora dos jovens no Brasil, pois a
educação para a cidadania defendida pelo ECA continua em posição de subordinação à
perspectiva punitiva e criminalizadora dos antigos Códigos de Menores, uma vez que a
mentalidade jurídica no Brasil permanece predominantemente encarceradora 40.
Por outro lado, as taxas juvenis de vitimização quase duplicaram (ou mais) em relação
àpopulação total. Em 2010, enquanto a taxa de homicídio do total da população negra
foi de 36,0, a dos jovens negros foi de 72,0.Entre os jovens, a diferença entre brancos e
negros foi mais drástica: as taxas de homicídio de jovens brancos caíram no período
analisado de 40,6 para 28,3; enquanto a dos jovens negros cresceu de 69,6 para 72,041.
VOLPI, M. Sem liberdade, sem direitos: a privação de liberdade na percepção do adolescente. São Paulo:
Cortez, 2001.
40 Segundo (Kosminsky, 1993, p. 179-80) a identidade da criança internada é construída por duas
forças contraditórias: o processo de padronização e domesticação imposto pela instituição, e pela
afirmação da sua individualidade. Ou seja, essa tensão produzida pelo processo de domesticação e
padronização e, simultaneamente, pela busca da resistência expressa em gestos de rebeldia, é gerada
em uma instituição rigidamente burocratizada, que delimita o campo da sociabilidade infantil. O
problema refere-se ao duplo abandono em que se encontra a criança, pois, impedida de viver com a
família, a criança passa a viver em uma estrutura estatal burocratizada, em que funcionários
entendem suas ações apenas como modalidade de prestação de serviços, de amparo material,
operando nos precários limites da racionalidade institucional. Imersos nesta racionalidade, os
funcionários da instituição ‘especializados’, tratam as crianças no quadro das relações impessoais e
assim, a instituição nega a possibilidade de um agir coletivo entre os jovens e reproduz o estigma de
“futuro marginal”, alimentando o que discursivamente ela procura negar: o abandono e a
marginalidade.
39
41Mapa
da Violência 2012: A Cor dos Homicídios no Brasil / JulioJacoboWaiselfisz – Rio de
Janeiro: CEBELA, FLACSO; Brasília: SEPPIR/PR, 2012.
Assim, a vitimização de jovens negros, que, em 2002, era de 71,7%, no ano de 2010
pulou para 153,9%: morrem, proporcionalmente, duas vezes e meia mais jovens negros
que brancos.Um fato que merece especial atenção no último Mapa da Violência é a
idade das vítimas. Observa-se que não há diferenças significativas de taxas de
homicídio entre brancos e negros até os 12 anos de idade. Entretanto, nesse ponto
inicia-se um duplo processo: por um lado, um íngreme crescimento da violência
homicida, tanto branca quanto negra, que se avoluma significativamente até os
20/21 anos de idade das vítimas. Se esse crescimento se observa tanto entre os brancos
quanto entre os negros, nesse último caso, o incremento é marcadamente mais elevado:
entre os 12 e os 21 anos de idade, as taxas brancas passam de 1,3 para 37,3 em cada
100 mil; aumenta 29 vezes. Já as taxas negras passam, nesse intervalo, de 2,0 para
89,6, aumentando 46 vezes.
Vale frisar que a maior parte das Propostas apresentadas na Câmara dos Deputados e no
Senado Federal, favoráveis à Redução da Maioridade Penal são apresentadas em
momentos de forte mobilização de setores da grande mídia, mas somente quando a
vítima de um ato infracional é de classe média ou alta. Foram os casos das propostas
apresentadas no período 2003-2007, sempre referenciados nos crimes da jovem Liana
Friedenbach, em São Paulo, e do garoto João Hélio, no Rio de Janeiro. Vale frisar
também que estes dois casos aconteceram em São Paulo e Rio de Janeiro, cidades nas
quais estes dois meios de comunicação possuem suas sedes e repercutiram estes crimes
de modo exacerbado. A revista Veja São Paulo de 19/11/2003 colocou a foto de Liana
como capa de sua edição semanal com os dizeres “Até Quando?”; e a Veja Nacional
colocou a foto de João Hélio na capa de sua edição de 14/02/2007 com a frase “Não
Vamos Fazer Nada?”. (CAMPOS, 2009)
Ora, se as propostas de inimputabilidade penal forem relacionadas em consonância com
os dados acima, podemos concluir que, após 21 anos da promulgação do Estatuto, a
perspectiva punitiva da criminalização permanece presidindo as decisões e registramos
que a história de séculos de punições e mortes não se muda só com a lei, mas também
com a sua legitimidade social42.
É preciso defender as conquistas democráticas do Estatuto da Criança e do Adolescente
aprofundando-as para assegurar o efetivo respeito à integridade das crianças e
PASSETI, E. Crianças Carentes e políticas públicas. In: PRIORE, M. (Org). História da criança no
Brasil. São Paulo: Contexto, 1999.
42
adolescentes, bem como os encarar, enfim, como sujeitos de direitos na contínua
conciliação entre democracia e segurança pública.
Acreditamos que a redução da idade penal no Brasil, como ponderou Adorno (2002)43,
também se apresenta para nós como uma questão problemática. Os jovens no Brasil
foram introduzidos no mundo adulto muito cedo, vivenciaram experiências
precocemente, como trabalho, sexualidade, num contexto de desigualdade social, de
desigualdade de direitos, efeitos estes agravados num contexto de globalização.
Esses jovens, imersos num processo da 'criança sem infância’, talvez não tenham o dito
discernimento que tanto o direito penal moderno, como os redatores das propostas
favoráveis a redução da idade penal, a mídia e outros setores da sociedade afirmam
veemente que os adolescentes já possuem. Mas, ainda assim, afirmamos que possuem o
discernimento necessário à vida, cujo exercício é prejudicado – e então, algumas
possíveis causas para as práticas infracionais – por fatores indiretos costumeiramente
denominados exclusão social, vulnerabilidade e risco social, impossibilidade de
participação política etc.Não foram esgotadas, no Brasil, as formas de atenção que se
pode oferecer a estes jovens, seja pelas escolas, pelas instituições de assistência, pela
família, pela maior distribuição da riqueza, pela aplicação efetiva do ECA.
Portanto, uma eventual redução da maioridade penal aparece de forma cruel no Brasil,
pois, num país atingido por fortes desigualdades sociais e desigualdades de direitos,as
propostas favoráveis à redução da maioridade penal são cúmplices deste processo de
criminalização da pobreza, jogando para o aparelho carcerário-punitivo os grupos e
indivíduos
mais
vulneráveis
psicologicamente,
socialmente,
economicamente,
culturalmente.(SOUZA e CAMPOS, 2007)44.
Assim, com a aprovação do decreto legislativo, chegar-se-ia à conclusão de que os
jovens são “irrecuperáveis” atestando nossa incapacidade de lidar com o problema da
violência juvenil. Desse modo, a Doutrina deProteção Integral45 consagrada no ECA é
ADORNO, S. Adolescentes, crime e violência. In: ABRAMO, H.W; FREITAS. M.V. de;
SPOSITO, M.P (Orgs). Juventude em Debate. 2. ed. São Paulo: Cortez, 2002.
44 SOUZA, L.F. de. ; CAMPOS, M. S. . Redução da Maioridade Penal: Uma Análise dos Projetos
que tramitam na Câmara dos Deputados. In: Leonardo Sica (coord). (Org.). Revista Ultima Ratio.
1ed.Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2007, v. 1, p. 231-259.
43
45
“Doutrina das Nações Unidas de Proteção Integral à Criança”, conforme Emílio Garcia Mendez, engloba
a Convenção das Nações Unidas dos Direitos da Criança, As Regras Mínimas das Nações Unidas
fundamental paraa construção de políticas de prevenção e
enfrentamento à
criminalidade e, na forma mais gravosa, o homicídio dos jovens brasileiros.
V – Da Impossibilidade de Plebiscito para Reduzir a Maioridade Penal
O Projeto de Decreto Legislativo pretende submeter à plebiscito uma restrição a direito
fundamental consubstanciada na privação da liberdade de adolescentes, matéria está
insuscetível de disposição pela maioria, uma vez que isso irá inevitavelmente configurar
abuso de poder.
Ao promover consulta pública para a romper com direitos fundamentais reputados
pétreos pela Constituição da República, o Projeto atual irá abalar a própria estrutura
constitucional brasileira e, não obstante apresentar-se sob a roupagem de democrático,
irá na verdade ruir a própria democracia.
Os constitucionalistas apontam que o que caracteriza as democracias modernas é
justamente a autoimposição de limites, como garantia de sua própria sobrevivência. Se
não há limites para a democracia política ou formal, ou seja, se os princípios e garantias
constitucionais podem ser alterados a qualquer momento pela maioria, sem qualquer
limite, a própria democracia coloca-se em risco, pois ela mesma poderá ser abolida pelo
voto da maioria.
O Projeto, talcomo se coloca, não põe somente em risco a redução da maioridade penal
e por consequência a liberdade individual de adolescentes, a maioria deles
marginalizados e criminalizados, mas a própria segurança jurídica conferida pela
Constituição. O Projeto abre um precedente extremamente perigoso para a exclusão
indeterminada de direitos fundamentais sob o discurso da democracia direta.
para Administração da Justiça de Menores, As Regras Mínimas das Nações Unidas para a proteção
dos jovens privados de liberdade e as Diretrizes das Nações Unidas para a prevenção da
delinqüência juvenil. Este corpo de legislação internacional modifica total e definitivamente a velha
doutrina da situação irregular. A Doutrina da Proteção Integral foi adotada pela Constituição da
República, que a consagra em seu art. 227, tendo sido acolhida pelo plenário do Congresso
Constituinte pela extraordinária votação de 435 votos contra 8.
Desse modo, se houver alguma alteração constitucional resultante da presente proposta,
o caminho para a instalação de um estado autoritário estará pavimentado, onde a tirania
da maioria, por vezes manipulada para votar sem maiores reflexões sobre as
consequências de suas decisões, prevalece sobre a Constituição.
Nesse sentido, vale recordar a lição de Ferrajoli a respeito:
O garantismo, como técnica de limitação e disciplina dos poderes públicos,,
voltado da determinar o este não devem e o que devem decidir, pode bem se
concebido como a conotação (não formal, mas) estrutural e substancial da
democracia: as garantias, sejam liberais ou sociais, exprimem de fato os
direitos fundamentais dos cidadãos contra os poderes do Estado, os
interesses dos fracos respectivamente aos dos fortes, a tutela das minorias
marginalizadas ou dissociadas em relação às maiorias integradas, as
razões de baixo relativamente às razões do alto.46
Conclusão
Ante todo o articulado, ANCED, Associação pela Reforma Prisional, Conectas DH,
IDDD, Pastoral Carcerária, Instituto Sou da Paz, ITTC, Instituto dos Defensores de
Direitos Humanos, Justiça Global, Rede Justiça Criminal, RENADE e Frente Nacional
Drogas e Direitos Humanos manifestam-se pela rejeição integral do PDS n. 539/2012.
Cf. Ferrajoli, Luigi. Direito e Razão: teoria do garantismo penal. São Paulo: EditoraRevista dos
Tribuanis, 2002. P. 693.
46
Parecer Técnico à Proposta de Emenda à Constituição n° 33 de 2012 do Senado
Federal
A Proposta de Emenda à Constituição n° 33 de 2012 visa reduzir a inimputabilidade
penal para dezesseis anos, alterando a redação dos arts. 129 e 228 da Constituição
Federal, nos seguintes termos:
Art. 1º - O inciso I, do art. 129 da Constituição Federal passa a
vigorar com a seguinte redação:
Art. 129 – São funções institucionais do Ministério Público:
I - promover, privativamente, a ação penal pública e o
incidente de desconsideração de inimputabilidade penal de
menores de dezoito e maiores de dezesseis anos. (NR)
Art. 2º - Acrescente-se um Parágrafo Único ao art. 228 da
Constituição Federal com a seguinte redação:
“Art.
228
.........................................................................................
-
Parágrafo Único – Lei complementar estabelecerá os casos em
que o Ministério Público poderá propor, nos procedimentos
para a apuração de ato infracional praticado por menor de
dezoito e maior de dezesseis anos, incidente de
desconsideração da sua inimputabilidade, observando-se:
I - Propositura pelo Ministério Público especializado em
questões de infância e adolescência;
II - julgamento originário por órgão do judiciário especializado
em causas relativas à infância e adolescência, com
preferência sobre todos os demais processos, em todas as
instâncias;
III - cabimento apenas na prática dos crimes previstos no
inciso XLIII, do art. 5º desta Constituição, e múltipla
reincidência na prática de lesão corporal grave e roubo
qualificado;
IV - capacidade do agente de compreender o caráter
criminoso de sua conduta, levando em conta seu histórico
familiar, social, cultural e econômico, bem como de seus
antecedentes infracionais, atestado em laudo técnico,
assegurada a
contraditório;
ampla
defesa
técnica
por advogado e o
V - efeito suspensivo da prescrição até o trânsito em
julgado do incidente de desconsideração da inimputabilidade.
VI - cumprimento de pena em estabelecimento separado dos
maiores de dezoito anos.
Art. 2º - Esta Emenda Constitucional entra em vigor na data
de sua publicação.
I – Sobre a equivalência entre Redução da Maioridade Penal e a “Desconsideração
da menoridade penal”
A despeito de constar de sua justificativa a intenção de manter intacta a maioridade
penal apenas aos 18 anos, a PEC 33/2012, na realidade, ao cunhar a possibilidade de
“desconsideração da menoridade penal” de acordo com as hipóteses a serem criadas
pelo legislador ordinário, reduz a maioridade penal.
Nos termos da proposição, a redução da maioridade penal, na prática, será mais ou
menos extensa de acordo com o talante do legislador ordinário e com a conjuntura
política que o animar.
A tentativa salomônica de construir “uma alternativa ao conflito de posições que já
está posto pelas diferentes correntes de opinião” não contempla, nem de perto, a
defesa elaborada por aquelas e aqueles engajados na luta pela promoção dos
direitos e garantias fundamentais esculpidos na Constituição Federal e em rechaço
a qualquer espécie de retrocesso.
A PEC em comento consiste, no limite, na abertura de uma fenda no sistema de
garantias para a redução da maioridade penal, que, se aprovada, estará sempre passível
de se estender a número cada vez mais amplo de casos.
Por consubstanciar tentativa inequívoca de redução da maioridade penal e pelos
motivos subsequentes, a PEC 33/2012 deve ser integralmente rejeitada.
II – Histórico das Propostas de Redução da Maioridade Penal
Desde o século XIX, a questão da criminalidade infanto juvenil no Brasil perpassou
uma série de discursos e práticas no saber jurídico, nas práticas institucionais (tanto em
termos assistenciais e pedagógicos, como numa perspectiva punitiva e reformadora)
voltadas aos adolescentes autores de atos infracionais, sempre na pretensa tentativa de
solucionar a questão da criminalidade das crianças e adolescentes ou, de outro modo, a
questão do “menor” (expressão anacrônica que sintomaticamente ainda é evocada).
De um modo geral, as diferentes formas de organização do sistema de justiça criminal
(Roda dos Expostos, Código Criminal do Império, o Código Penal de 1890, o Código de
Menores de 1927, a FUNABEM e as FEBEM´s) basearam-se na construção de um
aparato médico-jurídico-assistencial, que se dividiu em prevenção (vigiar a criança),
recuperação (reabilitar a criança e o adolescente criminoso), educação (disciplinar a
criança ao trabalho) e na repressão (conter crianças e adolescentes delinquentes)
(SPOSATO, 2001)47. Vale observar a ementa das principais leis: o Código de Menores
de 1927 previa a proteção e assistência; o Código de Menores de 1979 previa, além da
proteção e assistência, a vigilância.
Esta preocupação com a criminalidade infanto-juvenil (que se manifesta de tempos em
tempos no discurso favorável à diminuição da maioridade penal), funciona, na
realidade, mais como um instrumento de marginalização da população pobre do que
uma ampliação e um reconhecimento dos direitos civis dos jovens (Alvarez, 1997).
É, portanto, na tentativa de romper com as antigas concepções higienistas,
assistencialistas e repressoras que predominaram no tratamento à infância e juventude
no Brasil, que o Estatuto da Criança e do Adolescente é promulgado em 1990 (Lei nº
8.069).
O advento do ECA alçou a questão da infância e juventude no centro do ordenamento
jurídico brasileiro, em consonância com os movimentos internacionais de direitos e
SPOSATO, K. B. Pedagogia do medo: adolescentes em conflito com a lei e as propostas de
redução da idade penal. Cadernos Adenauer, Rio de Janeiro, v .6, p.31-49, 2001.
47
proteção da criança e do adolescente, colocando-os agora, como sujeitos de direitos,
tendo sido aplaudido em fóruns internacionais.
Apesar dos avanços normativos nele contidos, o ECA é alvo constante de críticas por
supostamente fomentar a impunidade na medida em que estabeleceria apenas “medidas
sócio educativas”.
É nesse cenário que se propugna pela redução da idade penal, com o fim de conter
supostas “ondas” de criminalidade em cuja atual configuração de violência urbana
seriam os jovens os principais atores e responsáveis. Assim, crianças e adolescentes
brasileiros são vistos historicamente como objeto de intervenção das instâncias de
correção (ADORNO, 2002).
Nesse sentido, emergem as diferentes Propostas de Emenda à Constituição Federal ou
Projetos de Decretos Legislativos que tramitam na Câmara dos Deputados e no Senado
Federal desde 199348. Esses projetos propõem reduzir a imputabilidade penal dos atuais
dezoito para dezesseis anos de idade, ou, em alguns casos, até quatorze ou doze anos,
modificando assim a redação do artigo 228 da Constituição Federal.
Conforme expomos a seguir, o PEC 33/2012 é inconstitucional por quatro motivos
principais: i) a afirmação da idade penal faz parte dos direitos e garantias
constitucionais fundamentais de natureza individual, portanto, irrevogáveis; ii) o Brasil
é signatário dos tratados internacionais - a exemplo da Convenção sobre os Direitos da
Criança da ONU de 1989 – que confirmam os 18 anos como marco de idade penal; iii)
as taxas de incidência infracional estão caindo desde o início do século XX, iv) a
‘irresponsabilidade penal da criança e do adolescente’ é um mito.
III – A maioridade penal é Cláusula Pétrea.
A redução da idade penal é imbuída de uma questão constitucional fundamental: ela é
cláusula pétrea, sendo parte dos direitos e garantias fundamentais individuais de nossa
Constituição Federal de 1988. É o que consta do art. 60, §4º, da Carta Maior:
48
PEC 171/1993, de autoria do Deputado Benedito Domingos.
Art. 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta:
§ 4º - Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a
abolir:
I - a forma federativa de Estado;
II - o voto direto, secreto, universal e periódico;
III - a separação dos Poderes;
IV - os direitos e garantias individuais.
Ora, se consta da Constituição da República que as garantias constitucionais individuais
não podem ser revogadas senão por meio de nova Constituinte Originária; e se os
direitos e garantias individuais estão espalhados ao longo da Constituição Federal, a
exemplo do constante de seu art. 228 (idade penal aos 18 anos de idade); concluí-se que
esse marco etário poderá ser alterado somente a partir da vigência de nova Constituição
Federal, não vindo um plebiscito ou uma emenda constitucional a ter força suficiente
para sua revogação.
Em outra medida, cabe dizer que a Constituição de 1988 inseriu a resposta do Estado
frente a atos infracionais cometidos por adolescentes no sistema de garantias
constitucionais e penais. Isto, no plano jurídico, define que:
1) Como crianças e adolescentes gozam de todos os direitos
fundamentais atribuídos a quaisquer cidadãos (art. 5°, CF, e art. 3º,
ECA), além dos direitos especiais constantes do Estatuto da Criança e do
Adolescente, que ainda reserva ao Estado a única opção de promoção de
atos discriminatórios positivos, sendo-lhe vedado executar ações que
tenham a finalidade protetiva, que ampliem os direitos das crianças e
adolescentes (art. 5º, ECA).
2) a resposta do Estado contra o adolescente comporta privação de
liberdade (art. 227, § 3°, V, CF): nas democracias não há prisão sem o
devido processo legal e o sistema constitucional de garantias (art. 5º,
incisos XXXVII a LXVIII, CF). A Constituição Federal, ainda, guarda
norma expressa sobre a reserva da prisão como consequência de prática
de crime (art. 5°, LXVII), sendo autorizadas apenas duas exceções
constitucionais, que não se aplicam, por definição, a crianças e
adolescentes49.
Desse modo, a Constituição Federal confere a crianças e adolescentes todas as garantias
de natureza penal e processual penal conferida aos adultos, mas em respeito à condição
peculiar de crianças e adolescentes em fase de desenvolvimento, assegurou-lhe mais
garantias (garantias especiais, exclusivas de crianças e adolescentes), também em
relação à resposta do Estado quando estes cometem atos infracionais. Trata-se de
conquistas sociais admitidas e assumidas pela sociedade, que, por sua vez, deve abrir
mão do retrocesso e lançar mão de criatividade nas ações em busca da superação de
novos desafios, muitos deles decorrentes da própria assunção do contemporâneo marco
regulatório dos direitos humanos universais.
A essa dinâmica atribui-se a expressão vedação do retrocesso social (SILVA, 2010)50,
segundo a qual a sociedade brasileira não pode abandonar as conquistas sociais, em
especial aquelas positivadas na Carta Federal e reconhecida a todo e qualquer cidadão
brasileiro. Em outra ordem, é como se o Parlamento Federal decidisse impor um
plebiscito para que a sociedade decida se deseja rever o caráter universal do sistema
único de saúde, colocando-o em cheque. Não há, portanto, lei ou mecanismo subjacente
à Constituição Federal que possa veicular decisões contrárias às conquistas históricas do
povo brasileiro.
IV – O valor constitucional dos documentos internacionais assinados pelo Brasil.
A Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança – ratificada internamente pelo
Decreto 99.710/90 – estabelece que criança (no Brasil, compreendida como as fases de
criança e adolescente) é o sujeito que se encontra até os 18 anos de idade. Trata-se do
primeiro marco etário para definições de direitos, deveres e políticas públicas
correspondentes. Esse documento internacional alinha-se a outros, como as Regras
Prisão civil de curta duração para devedores de alimentos e depositários infiéis; situações jurídicas
nas quais crianças e adolescentes, porque são incapazes civilmente, nunca podem estar.
49
50
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Malheiros, 2010.
Mínimas das Nações Unidas para a Administração da Justiça de Menores (Regras
de Beijing, 1985) e as Diretrizes das Nações Unidas para a Prevenção da
Delinquência Juvenil (Diretrizes de Riad, 1990). Todos esses documentos confirmam
que a idade penal deve dividir a fase adulta da fase infanto-adolescente, e, portanto,
distinguir os tratamentos estatais perante a prática delituosa. A Constituição Federal, por
sua vez, estabelece em seu art. 5º, § 3º, que: Os tratados e convenções internacionais
sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional,
em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes
às emendas constitucionais. Nesse sentido, se as premissas são:
a) A Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança é documento subscrito
e ratificado internamente pelo Brasil;
b) Conforme apregoa a Carta Magna Brasileira, todo documento
internacional assinado no exterior e ratificado em âmbito interno terá valor
supralegal;
Logo:
c) A Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança e os demais
tratados, pactos e diretrizes dos quais o Brasil é signatário são documentos
com status constitucional.
Assim, sendo documento imbuído de valor constitucional, poderá ser revogado ou
contrariado apenas se não se tratar de cláusula pétrea, seguindo as premissas e o
raciocínio do primeiro item desse arrazoado. E, como esses tratados e pactos
internacionais tratam de garantias constitucionais – que reforçam as já previstas pela
Assembleia Constituinte -, a perenidade dessas normas e desses direitos é assegurada
para todo adolescente brasileiro, independentemente de ter cometido ato infracional de
qualquer natureza. As crianças e adolescentes tem, pois, o incontestável direito de ser
tratado de modo diferente, de receber, portanto, uma discriminação positiva.
Segundo Machado51 (2006, p.107): “Neste passo, cumpre frisar que, se o direito de
liberdade da pessoa física criança ou adolescente possui as especificidades já referidas
“MACHADO, MARTHA .T. Sistema Especial de proteção da liberdade do adolescente na
Constituição brasileira de 1988 e no Estatuto da Criança e do Adolescente. In: ILANUD, ABMP,
51
no item II supra, é de ver que a imaturidade/vulnerabilidade do sujeito de direito, na
Democracia
não
pode
ser
invocada
para
discriminá-lo
negativamente.
A
desequiparação jurídica que a Constituição de 1988 criou para crianças e adolescentes
é a desequiparação jurídica protetiva, que é própria da atual fase de evolução da
proteção aos direitos humanos e que vem adotada na Convenção dos Direitos da
Criança e do Adolescente (ONU, 1989).”
Dentre estas garantias, estabeleceu-se a inimputabilidade penal para a pessoa até dezoito
anos de idade incompletos, que vem expressa nos artigos 228 e 227, § 3 º, V, última
parte, do texto constitucional. Este marco normativo diferencia-se da inimputabilidade
penal que vigorava no paradigma menorista, pois, segundo Machado (ibid, p.108):
“[...]era uma inimputabilidade penal que impunha a crianças e adolescentes tratamento
penal severamente mais gravoso que aquele reservado aos adultos (impunha uma
medida de segurança perpétua, sem incidência da reserva legal, do contraditório e da
ampla defesa, entre outras salvaguardas.”
Portanto, a inimputabilidade penal atual impede a aplicação da sanção criminal (das
penas reservadas aos adultos). E isso configura não apenas preceito penal, mas
constitucional pétreo, de modo que se permite alteração apenas se promulgada nova
Carta Magna.
Ao assim determinar, a Assembleia Constituinte de 1988 ponderou sobre os valores
individuais e sociais na situação específica de crime cometido por adolescente, optando
pela enorme capacidade de autotransformação, que é própria do ser humano, impondo a
prevalência de medidas protetivas e educativas e instituindo as garantias de
excepcionalidade e brevidade da privação de liberdade (art.227, § 3º, V), que o ECA
tratou de concretizar. Destarte: “Importante destacar que a excepcionalidade não é só
das medidas privativas de liberdade (no ECA, internação e semi-liberdade), mas sim
uma excepcionalidade da própria imposição de qualquer medida sócio-educativa...E
veja-se que a excepcionalidade do sistema de responsabilização de crianças e
adolescentes vem em consonância com o princípio da intervenção mínima, contido nos
SEDH, UNFPA (Orgs) Justiça Adolescente e Ato Infracional: socioeducação e responsabilização. São Paulo,
2006, p.87-123”.
documentos da ONU: Diretrizes de Riad; Assembleia Geral Resolução 45/112-1990),
art 5º, caput, ‘e’ e ‘f ‘, e art 6º; Regras de Tóquio (AG 45/110 – 1990 – medidas não
privativas de liberdade) – art. 2.6” (ibid, p.109-110).
Portanto, de acordo com Dallari: “A previsão de tratamento jurídico diferente daquele
que se aplica aos adultos é um direito dos menores de 18 anos, que são pessoas,
indivíduos, sujeitos de direitos. De acordo com o artigo 60, § 4º, da Constituição, não
poderá ser objeto de deliberação proposta de emenda constitucional tendente a abolir
garantias individuais” (DALLARI, 2001, p. 25).
V – As taxas de incidência infracional e vitimização de crianças e adolescentes
Em poucas palavras, podemos informar que as taxas de incidência de ato infracional
têm caído significativamente ao longo do século XX.
É o que extraímos de parte significativa da literatura que analisou a criminalidade
praticada por jovens no Brasil. Segundo Marcio Antonio Cabral dos Santos, “entre 1900
e 1916, o coeficiente de prisões por dez mil habitantes era distribuído da seguinte
forma: 307,32 crimes cometidos por adultos e 275,14 delitos cometidos por crianças e
adolescentes, o que sugere uma proporção de quase 50% para cada faixa etária”
(SANTOS: 214)52.
Atualmente, este percentual caiu significativamente. Tem-se a proporção de 10% dos
crimes cometidos por adolescentes, o que significa drástica redução da participação
desses jovens nas ações delituosas, por diversos motivos, dentre os quais, o próprio
aumento da idade penal (à época da primeira constatação, vigorava o Código Penal da
Republica – 1890 -, pelo qual se instituía a responsabilização penal especial entre os 09
e 17 anos de idade), bem como os novos modelos de Estado que acentuaram seu papel
de executor de políticas públicas sociais, fundamentais para o desenvolvimento humano
das crianças e adolescentes.
52
SANTOS, Marcio Antonio Cabral dos. História das Crianças no Brasil. São Paulo: Contexto, 2006.
Vale frisar que atualmente, os dados da Secretaria Especial de Direitos Humanos
indicam uma estabilização das taxas de menores infratoress privados de liberdade desde
2007: cerca de 16 mil adolescentes. Ainda, sobre este aspecto, a pesquisa do CNJ da
série “Pensando o Direito” (2010)53 constatou que: “...os dados coletados junto aos
Tribunais de Justiça e Superior Tribunal de Justiça em matéria de medida
socioeducativa de internação, e posteriormente, a observação de casos junto às Varas
da Infância e Juventude de São Paulo, Porto Alegre, Recife e Salvador, permitiram
concluir que, apesar das propostas garantidoras do Estatuto, a prática forense nem
sempre está com ela alinhada. Foi possível constatar que a medida de internação é
sistematicamente imposta com baixa fundamentação legal. Em muitos casos, sem a
devida consideração dos requisitos legais exigidos pelo ECA.”
Por outro lado, as taxas juvenis de vitimização quase duplicaram (ou mais) em relação à
população total.
Em 2010, enquanto a taxa de homicídio do total da população negra foi de 36,0, a dos
jovens negros foi de 72,0. Entre os jovens, a diferença entre brancos e negros foi mais
drástica: as taxas de homicídio de jovens brancos caíram no período analisado de 40,6
para 28,3; enquanto a dos jovens negros cresceu de 69,6 para 72,054.
Assim, a vitimização de jovens negros, que, em 2002, era de 71,7%, no ano de 2010
pulou para 153,9%: morrem, proporcionalmente, duas vezes e meia mais jovens negros
que brancos. Um fato que merece especial atenção no último Mapa da Violência é a
idade das vítimas. Observa-se que não há diferenças significativas de taxas de
homicídio entre brancos e negros até os 12 anos de idade. Entretanto, nesse ponto
inicia-se um duplo processo: por um lado, um íngreme crescimento da violência
homicida, tanto branca quanto negra, que se avolumam significativamente até os
20/21 anos de idade das vítimas.
53
ECA: Apuração do Ato Infracional Atribuído a Adolescentes. Série Pensando o Direito, Nº
26/2010. Universidade Federal da Bahia (UFBA) e Secretaria de Assuntos Legislativos do
Ministério da Justiça (SAL).
Mapa da Violência 2012: A Cor dos Homicídios no Brasil / Julio Jacobo Waiselfisz – Rio de
Janeiro: CEBELA, FLACSO; Brasília: SEPPIR/PR, 2012.
54
Se esse crescimento se observa tanto entre os brancos quanto entre os negros, nesse
último caso, o incremento é marcadamente mais elevado: entre os 12 e os 21 anos de
idade, as taxas brancas passam de 1,3 para 37,3 em cada 100 mil; aumenta 29
vezes. Já as taxas de negros passam, nesse intervalo, de 2,0 para 89,6, aumentando
46 vezes.
Os dados elencados, portanto, apontam a estabilização da criminalidade praticada por
crianças e adolescentes. Além disso, os dados de vitimização confirmam que a questão a
ser encarada do ponto de vista da política pública é a mortalidade de jovens, sobretudo,
dos jovens negros.
VI – O mito da irresponsabilidade penal do adolescente
Por último, vale citarmos mais uma característica importante acerca do debate sobre a
redução da idade penal: o mito da irresponsabilidade penal do adolescente. Segundo
Volpi55, esta ideia se baseia na concepção de que o adolescente é incitado a cometer um
ato infracional porque a atual legislação é branda quanto a sua punição. Confunde-se
então, inimputabilidade com impunidade e se esquece que existem as medidas sócioeducativas que até o momento ainda não foram implementadas integralmente em nosso
país, para responsabilização dos adolescentes. Assim sendo, estas propostas reafirmam
uma perspectiva criminalizadora dos jovens no Brasil, pois a educação para a cidadania
defendida pelo ECA continua em posição de subordinação à perspectiva punitiva e
criminalizadora dos antigos Códigos de Menores, uma vez que a mentalidade jurídica
no Brasil permanece predominantemente encarceradora56.
VOLPI, M. Sem liberdade, sem direitos: a privação de liberdade na percepção do adolescente. São Paulo:
Cortez, 2001.
56 Segundo (Kosminsky, 1993, p. 179-80) a identidade da criança internada é construída por duas
forças contraditórias: o processo de padronização e domesticação imposto pela instituição, e pela
afirmação da sua individualidade. Ou seja, essa tensão produzida pelo processo de domesticação e
padronização e, simultaneamente, pela busca da resistência expressa em gestos de rebeldia, é gerada
em uma instituição rigidamente burocratizada, que delimita o campo da sociabilidade infantil. O
problema refere-se ao duplo abandono em que se encontra a criança, pois, impedida de viver com a
família, a criança passa a viver em uma estrutura estatal burocratizada, em que funcionários
entendem suas ações apenas como modalidade de prestação de serviços, de amparo material,
operando nos precários limites da racionalidade institucional. Imersos nesta racionalidade, os
funcionários da instituição ‘especializados’, tratam as crianças no quadro das relações impessoais e
55
É inegável que as medidas de internação constituem-se em efetiva restrição de liberdade
em estabelecimento próprio destinado a isso, onde convivem somente adolescentes que
praticaram atos infracionais. Apesar das diferenças existentes entre as prisões e as
instituições destinadas à internação de adolescentes, as semelhanças são cada vez mais
brutais.
Ora, se as propostas de inimputabilidade penal forem relacionadas em consonância com
os dados acima apresentados, podemos concluir que, após 21 anos da promulgação do
Estatuto, a perspectiva punitiva da criminalização permanece presidindo as decisões e
registramos que a história de séculos de punições e mortes não se muda só com a lei,
mas também com a sua legitimidade social57.
É preciso defender as conquistas democráticas do Estatuto da Criança e do Adolescente
aprofundando-as para assegurar o efetivo respeito à integridade das crianças e
adolescentes, bem como os encarar, enfim, como sujeitos de direitos na contínua
conciliação entre democracia e segurança pública.
Acreditamos que a redução da idade penal no Brasil, como ponderou Adorno (2002)58,
também se apresenta para nós como uma questão problemática. Os jovens no Brasil
foram introduzidos no mundo adulto muito cedo, vivenciaram experiências
precocemente, como trabalho, sexualidade, num contexto de desigualdade social, de
desigualdade de direitos, efeitos estes agravados num contexto de globalização.
Esses jovens, imersos num processo da 'criança sem infância’, talvez não tenham o dito
discernimento que tanto o direito penal moderno, como os redatores das propostas
favoráveis a redução da idade penal, a mídia e outros setores da sociedade afirmam
veemente que os adolescentes já possuem. Mas, ainda assim, afirmamos que possuem o
discernimento necessário à vida, cujo exercício é prejudicado – e então, algumas
possíveis causas para as práticas infracionais – por fatores indiretos costumeiramente
assim, a instituição nega a possibilidade de um agir coletivo entre os jovens e reproduz o estigma de
“futuro marginal”, alimentando o que discursivamente ela procura negar: o abandono e a
marginalidade.
PASSETI, E. Crianças Carentes e políticas públicas. In: PRIORE, M. (Org). História da criança no
Brasil. São Paulo: Contexto, 1999.
58 ADORNO, S. Adolescentes, crime e violência. In: ABRAMO, H.W; FREITAS. M.V. de;
SPOSITO, M.P (Orgs). Juventude em Debate. 2. ed. São Paulo: Cortez, 2002.
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denominados exclusão social, vulnerabilidade e risco social, impossibilidade de
participação política etc.
Não foram esgotadas, no Brasil, as formas de atenção que se pode oferecer a estes
jovens, seja pelas escolas, pelas instituições de assistência, pela família, pela maior
distribuição de direitos, pela aplicação efetiva do ECA.
Ademais, o peculiar estágio de desenvolvimento vivenciado até os 18 anos deve ser
considerado de modo fundamental nessa discussão É um consenso entre os estudiosos
das temáticas que envolvem a adolescência que esta é uma fase complexa e marcante. É
um período de experimentações, novidades, descobertas, conflitos, sofrimento,
crescimento,
amadurecimento,
crises,
construções.
O adolescente passa por
desequilíbrios e instabilidades que requerem a sua proteção integral e o respeito a sua
condição especial de pessoa em desenvolvimento, pois, este é um período de vivências
de contradições e ambivalência caracterizado por tensões com o meio familiar e
social. 59
Assim, com a aprovação da proposta de emenda à Constituição chegar-se-ia à conclusão
de que os jovens são “irrecuperáveis”, atestando nossa incapacidade de lidar com o
problema da violência juvenil. Desse modo, a Doutrina de Proteção Integral60
consagrada no ECA é fundamental para a construção de políticas de prevenção e
enfrentamento à criminalidade e, na forma mais gravosa, a vitimização dos jovens
pobres brasileiros.
Portanto, uma eventual redução da maioridade penal aparece de forma cruel no Brasil,
pois, num país atingido por fortes desigualdades sociais e desigualdades de direitos, as
CALDERONI, V. Adolescentes em Conflito com a Lei: considerações críticas sobre a medida de
internação. Revista Liberdades. nº5, set-dez 2010.p. 19-53.
59
60
“Doutrina das Nações Unidas de Proteção Integral à Criança”, conforme Emílio Garcia Mendez, engloba
a Convenção das Nações Unidas dos Direitos da Criança, As Regras Mínimas das Nações Unidas
para Administração da Justiça de Menores, As Regras Mínimas das Nações Unidas para a proteção
dos jovens privados de liberdade e as Diretrizes das Nações Unidas para a prevenção da
delinqüência juvenil. Este corpo de legislação internacional modifica total e definitivamente a velha
doutrina da situação irregular. A Doutrina da Proteção Integral foi adotada pela Constituição da
República, que a consagra em seu art. 227, tendo sido acolhida pelo plenário do Congresso
Constituinte pela extraordinária votação de 435 votos contra 8.
propostas favoráveis à redução da maioridade penal são cúmplices deste processo de
criminalização da pobreza, jogando para o aparelho carcerário-punitivo os grupos e
indivíduos mais vulneráveis psicologica, social, economica e culturalmente. (SOUZA e
CAMPOS, 2007)61.
VII – Conclusão
Ante todo o articulado, ANCED, Associação pela Reforma Prisional, Conectas DH,
IDDD, Pastoral Carcerária, Instituto Sou da Paz, ITTC, Instituto dos Defensores de
Direitos Humanos, Justiça Global, Rede Justiça Criminal, RENADE e Frente Nacional
Drogas e Direitos Humanos manifestam-se pela rejeição integral da PEC 33/2012.
SOUZA, L.F. de. ; CAMPOS, M. S. Redução da Maioridade Penal: Uma Análise dos Projetos que
tramitam na Câmara dos Deputados. In: Leonardo Sica (coord). (Org.). Revista Ultima Ratio. 1ed.Rio
de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2007, v. 1, p. 231-259.
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