UNIVERSIDADE DE CAXIAS DO SUL ANA CAROLINA AZEVEDO CASEMIRO CERTEZAS E DÚVIDAS SOBRE O PROCESSO DE DIGITALIZAÇÃO DAS RÁDIOS AM DE BENTO GONÇALVES CAXIAS DO SUL 2014 ANA CAROLINA AZEVEDO CASEMIRO CERTEZAS E DÚVIDAS SOBRE O PROCESSO DE DIGITALIZAÇÃO DAS RÁDIOS AM DE BENTO GONÇALVES Trabalho de Conclusão de Curso de Comunicação Social - Habilitação em Jornalismo apresentado ao Centro de Ciências da Comunicação da Universidade de Caxias do Sul, como requisito para a obtenção do título de bacharel. Orientador: Prof. Dr. Alvaro Fraga Moreira Benevenuto Junior CAXIAS DO SUL 2014 ANA CAROLINA AZEVEDO CASEMIRO CERTEZAS E DÚVIDAS SOBRE O PROCESSO DE DIGITALIZAÇÃO DAS RÁDIOS AM DE BENTO GONÇALVES Trabalho de Conclusão de Curso de Comunicação Social - Habilitação em Jornalismo apresentado ao Centro de Ciências da Comunicação da Universidade de Caxias do Sul, como requisito para a obtenção do título de bacharel. Banca Examinadora _____________________________________ Prof. Dr. Alvaro Fraga Moreira Benevenuto Junior Universidade de Caxias do Sul – UCS _____________________________________ Prof. Ms Jacob Raul Hoffmann Universidade de Caxias do Sul – UCS _____________________________________ Prof. Ms Ronei Teodoro da Silva Universidade de Caxias do Sul – UCS Dedico este trabalho a meus pais, Ana, Orlando e Rozimeri (mãe do coração), pelo amor, pelos recursos e por permitirem que eu descobrisse as alegrias e pesares da vida por meus próprios passos. Ao Jonathan, que esteve a meu lado na maior parte desses 10 anos de vida acadêmica e que compartilhará comigo para todo o sempre um tesouro chamado Joana. À minha filha, que diariamente inunda minha vida de inseguranças e medos antes desconhecidos, mas que me ensina a todo instante o real sentido do amor e da família. Ao meu noivo, Felix, que suportou os momentos de total desespero e acreditou que eu chegaria aqui quando pensei repetidas vezes em desistir. AGRADECIMENTOS Agradeço aos professores do curso de Comunicação Social Habilitação em Jornalismo pelo conhecimento transmitido, o qual me conduziu até aqui. Especialmente aos Doutores Paulo Ribeiro, que alimentou a cada aula minha paixão pelo texto, e Luiz Artur Ferraretto, que, em sua breve passagem pela Universidade de Caxias do Sul, despertou em mim o interesse pelo rádio. Agradeço, especialmente, ao Prof. Dr. Alvaro Benevenuto pela sensibilidade demonstrada nestes meses e por ter, em vários momentos, extrapolado seu papel de orientador para atuar como um verdadeiro mestre. Sua serenidade foi, certamente, coautora deste trabalho. Aos gestores da Rádio Difusora e Rádio Viva de Bento Gonçalves, pela disponibilidade e pela conversa franca, essenciais para que se pudesse relatar as expectativas e projetos das emissoras diante da migração para o FM. Ao meu noivo Felix Polo, por relevar meus destemperos nos momentos de ansiedade e por secar minhas lágrimas nos de angústia. Às amigas Fernanda Monte Mezzo Forest e Josiane Ribeiro, pelas orientações e palavras de estímulo. Por fim, agradeço ao Café Melitta, que testemunhou cada linha desta monografia. RESUMO Esta monografia apresenta um relato sobre o processo de digitalização do rádio e migração do AM para o FM, com ênfase nas emissoras Difusora e Viva, de Bento Gonçalves. Para tanto, pontua a trajetória do rádio desde sua invenção, passando pela chegada ao Brasil e sua ascensão meteórica até a chegada da televisão. Para situar o rádio nos dias atuais, pontua-se o advento da internet, das webradios e das rádios comunitárias. A partir do estudo das legislações pertinentes, descreve-se o processo de digitalização e como as discussões a respeito evoluíram no Brasil, chegando-se ao decreto que autoriza a migração das emissoras de AM para FM. Para entender como a mudança impactará na radiodifusão do município de Bento Gonçalves, foram ouvidos executivos das duas emissoras AM locais. Procede-se à análise das entrevistas e, a partir disso, entende-se que existe elevada preocupação com as questões técnicas. A produção de conteúdo, por outro lado, parece estar à mercê dos indicativos do mercado. Palavras-chaves: Rádio. Internet. Digitalização. Migração. SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO .............................................................................................................. 8 2 O RÁDIO E HISTÓRIA ................................................................................................ 13 3 NOVIDADES NO AR: A INTERNET ............................................................................ 30 4 A DIGITALIZAÇÃO DO RÁDIO .................................................................................... 43 4.1 DAB – DIGITAL AUDIO BROADCASTING ........................................................... 47 4.2 IBOC – IN BAND ON CHANNEL .......................................................................... 50 4.3 DRM – DIGITAL RADIO MONDIALE .................................................................... 53 4.4 ISDB-TSB – INTEGRATED SERVICES DIGITAL BROADCASTING, TERRESTRIAL, SEGMENTED BAND ........................................................................ 54 4.5 HORA DE DEFINIR O SISTEMA .......................................................................... 55 4.6 MIGRAÇÃO DO AM PARA O FM ......................................................................... 62 5 A PESQUISA ............................................................................................................... 65 5.1 OS MÉTODOS CONSAGRADOS......................................................................... 67 5.2 MÉTODO APLICADO ........................................................................................... 69 5.2.1 Técnicas ........................................................................................................ 72 5.3 CONTEXTO LOCAL ............................................................................................. 74 5.3.1 As rádios AM ................................................................................................. 78 5.4 ENTREVISTAS ..................................................................................................... 81 5.5 ANÁLISE DAS ENTREVISTAS ............................................................................. 89 6 NOTAS CONCLUSIVAS .............................................................................................. 92 1 INTRODUÇÃO O rádio, em sua origem, foi um aparelho que permitiu a transmissão de sons por meio de ondas eletromagnéticas. Levando música, notícia e entretenimento sem exigir atenção exclusiva do ouvinte, o rádio elevou-se ao status de companheiro para todas as horas, algo não experimentado por nenhum outro meio de comunicação. As primeiras transmissões de som sem uso de fios ocorreram nos últimos anos do século XIX, conforme Ferraretto (2001). Os créditos do invento são, ainda hoje, divididos entre o italiano Guglielmo Marconi e o brasileiro Landell de Moura, que realizaram experimentos com sucesso na Itália e no Brasil, respectivamente. Inicialmente seu uso foi direcionado a transmissões oficiais por meio de alto-falantes instalados no alto das igrejas e nos prédios públicos. A indústria da radiodifusão, no sentido de produção e transmissão de conteúdos, com a ideia de que cada família poderia ter um aparelho de rádio, propagouse no ano de 1920. Ferraretto (2001) situa como marco a fundação da KDKA, nos Estados Unidos. A chegada do novo meio de comunicação ao Brasil ocorreria dois anos depois, nas comemorações do centenário da Independência, quando a própria Westinghouse, empresa proprietária da KDKA, promoveu as primeiras transmissões no país. O rádio teve ascensão meteórica no Brasil, especialmente pelos índices de analfabetismo da população, na primeira metade do século XX1, o que desfavorecia a penetração dos meios de comunicação impressos. A chegada da televisão, porém, decretou o fim da Era do Rádio, já que “o espetáculo começa a migrar para o novo meio” (FERRARETTO, 2001, p.137). 1 Conforme informações do portal da Fundação Getúlio Vargas na internet, o Censo de 1940 apontava para uma taxa de analfabetismo de 56,17% entre a população com idade superior a 15 anos. Fonte: http://cpdoc.fgv.br/producao/dossies/JK/artigos/Educacao/Anos1950. Acesso: 23 jun. 2014. 9 As grandes estrelas das radionovelas e dos programas de auditório rapidamente migraram para o novo veículo e restou ao rádio aproveitar sua vantagem na transmissão de música e a dinamicidade na cobertura jornalística, enquanto a concorrente ainda não contava com a possibilidade dos chamados links ao vivo. Na atualidade, diante da internet, do processo de digitalização e da convergência das mídias, a definição original de rádio não mais se aplica. A mensagem sonora já não é formatada somente em hertz, mas também em bits. Tampouco está limitada à transmissão em ondas, pois está também nos satélites e na rede mundial de computadores. Conforme Kischinhevsky (2007), aspectos como a recepção, as tecnologias de transmissão e a produção de conteúdo foram rapidamente alteradas pela internet. No Brasil, o rádio prepara-se para a transição do analógico para o digital, com estudos e testes desenvolvidos desde 2005 em busca do melhor sistema para operação no Brasil: o IBOC, padrão criado e implantado nos Estados Unidos, ou o DRM, que funciona na Europa. Em meio a essas indefinições prestes a completar uma década, o governo brasileiro optou por interromper provisoriamente o processo de digitalização para autorizar a migração das emissoras AM para FM. A decisão teve rápidos desdobramentos, com decreto presidencial publicado em novembro de 2013, normas regulamentadoras definidas em março de 2014, audiências coletivas em cada unidade da federação para agrupar as solicitações e promessa de que as primeiras autorizações venham a público ainda neste ano. Mais que uma questão mercadológica no sentido de melhorar a qualidade de áudio das rádios, a migração – que ainda não é obrigatória – abre campo para a extinção do AM, liberando espaço no espectro para outros usos, como a internet, a televisão digital e o próprio rádio digital, no futuro. Considerando o contexto histórico acima, que coloca o rádio brasileiro em um momento de decisiva transição, o objetivo deste trabalho monográfico é relatar o andamento da digitalização, culminando no anúncio da migração e com ênfase no planejamento das rádios AM de Bento Gonçalves. Os objetivos específicos a são 10 resgatar a história do rádio, pontuando acontecimentos que impactaram, de alguma forma, o modo de produção e transmissão de conteúdo; detalhar o processo de digitalização do rádio, elencando todos os modelos implantados em diversos países e aqueles que vêm sendo testados no Brasil; compreender como as indefinições acerca da migração resultaram em um Decreto de Lei autorizando a migração das rádios AM para FM; e, por fim, relatar a analisar como as emissoras AM do município de Bento Gonçalves estão se preparando financeira e estruturalmente para a migração. O município de Bento Gonçalves, localizado na Encosta Superior do Nordeste do Rio Grande do Sul, dista 124 quilômetros da capital do Rio Grande do Sul, Porto Alegre. De acordo com dados do IBGE de 2013, sua população estimada é de 111.384 habitantes. Os principais setores da economia atualmente são o moveleiro, vinícola, metalúrgico, de transportes e a fruticultura. Bento Gonçalves possui colocação elevada no Índice de Desenvolvimento Socioeconômico (Idese), tendo liderado o ranking no ano de 2010 entre os municípios com população acima de 100 mil habitantes no Rio Grande do Sul. Além de sua importância econômica para o estado, esse é o município de residência da autora da pesquisa, o que justifica a escolha pelas rádios locais AM como estudo de caso. As hipóteses que nortearam esta pesquisa foram três: 1) Por se tratar de um processo irreversível, as emissoras AM de Bento Gonçalves estão envolvidas; 2) O investimento em equipamentos e regularização da documentação para migração será robusto; 3) O movimento de migração pode impactar no perfil do conteúdo ofertado pelas emissoras. Para atingir o objetivo deste trabalho, foi realizada uma revisão bibliográfica sobre as origens do rádio, sua chegada ao Brasil e como ele se desenvolveu no país até os dias atuais. Fez-se necessário analisar, também, a legislação pertinente ao tema 11 da digitalização e da migração. Criou-se um instrumento de pesquisa em forma de questionário aberto para a realização de entrevistas presenciais com os diretores das duas emissoras AM localizadas em Bento Gonçalves: Rádio Difusora 890 AM e Rádio Viva 1070 AM. A apresentação deste trabalho monográfico foi feita em sete capítulos. O capítulo de número 1 é a Introdução, onde se apresenta o objeto de estudo, pontuando brevemente os conceitos que permeiam este trabalho: rádio, internet, digitalização, migração, o município de Bento Gonçalves e as rádios entrevistadas. No segundo capítulo, Rádio e história, conduz-se um recorte histórico sobre a trajetória do rádio no mundo e no Brasil, iniciando pela polêmica sobre o real inventor do rádio: Marconi ou Landell de Moura? A seguir, descreve-se o período de transmissões experimentais no Brasil, até a primeira transmissão oficial, em 1822, e a fundação do primeiro Rádio Clube, no ano seguinte. Pontua-se os primeiros decretos envolvendo o serviço de radiodifusão no país, o advento da televisão, a chegada das rádios FM, da transmissão via satélite e a criação das rádios comunitárias. Novidades no ar: a internet é o capítulo 3, que contextualiza o período de estagnação do rádio brasileiro coincidente com a chegada da internet no país, abordando-se as origens dessa tecnologia e as possibilidades de uso que foram desenvolvidas, principalmente a criação dos programas que possibilitaram o uso doméstico da internet. A seguir, apresenta-se o uso inicial dado pelas emissoras brasileiras de rádio para a internet, até a criação das primeiras webradios, que alteraram rapidamente os processos de produção e transmissão de conteúdos. Pontuase brevemente a inexistência de mecanismos de regulação da internet que colocam as webradios em patamares diferentes do rádio convencional. Por fim, apresenta-se o Marco Civil da internet, primeira tentativa de definir direitos e deveres dos usuários e provedores da web. No quarto capítulo, A digitalização do rádio, aborda-se a perda de espaço do rádio nos lares brasileiros, onde predomina a presença da televisão e se registra elevação gradual no número de computadores. Em um cenário de convergência das 12 mídias, reforçada pela internet, a digitalização do rádio surge como um recurso para sua revitalização e recuperação da audiência. São apresentados os modelos implantados com êxito em diferentes partes do mundo e como iniciaram os testes no Brasil para eleger um sistema apropriado para o país. São citados os testes e audiências realizados e a indefinição sobre o tema, que culminou do adiamento da digitalização e anúncio da migração das rádios AM para FM, bem como suas consequências. No capítulo 5, é desenvolvida a pesquisa em si, descrevendo-se seus objetivos, hipóteses e a metodologia utilizada para a obtenção dos resultados. Detalham-se os métodos e técnicas aplicados para, então, estabelecermos o contexto local que envolve a pesquisa. Abordam-se as origens e características do município de Bento Gonçalves, escolhido como cenário desse estudo, enumerando-se também os veículos de imprensa existentes no município. Após, remonta-se o histórico das rádios AM da cidade para, então, pormenorizar as entrevistas realizadas com Volnei Pertile, diretor da Rádio Difusora 890 AM, e Marcos Piccoli, diretor do Grupo RSCOM, detentor da Rádio Viva 1070 AM. Por fim, é feita uma breve análise das falas dos entrevistados. As Notas conclusivas, tema do capítulo 6, exploram informações apresentadas anteriormente sobre a história do rádio, as promessas para seu futuro e as dificuldades do processo de digitalização. Com isso, procede-se a uma avaliação das certezas e dúvidas identificadas nas rádios entrevistadas. Com base nas entrevistas abertas, foi possível determinar os aspectos que recebem maior atenção e investimentos por parte dos radiodifusores, indicando, por exemplo, que as questões envolvendo conteúdo estão em segundo plano. Cabe pontuar que o presente estudo não tem caráter conclusivo, mas representa um recorte do momento atual do rádio brasileiro com ênfase nas emissoras AM de Bento Gonçalves. Portanto, decisões governamentais e mudanças do próprio cenário mercadológico apresentadas. podem, a qualquer momento, alterar as percepções 2 RÁDIO E HISTÓRIA Nos dicionários da Língua Portuguesa Aurélio, Houaiss, Michaelis e Priberam, as definições de rádio predominantes são “osso do antebraço”, “elemento metálico branco, brilhante, alcalinoterroso, intensamente radioativo, quimicamente semelhante ao bário” e “aparelho de radiofonia que recebe ondas hertzianas”. A versão online do Michaelis ainda amplia suas significações com a definição de “atividade artística, educativa e informativa da radiofonia”. Das três definições mais vistas, apenas uma está relacionada ao objeto desse estudo. Não trataremos aqui sobre elementos químicos ou partes do corpo humano, mas a respeito de um aparelho que revolucionou a comunicação à distância, ao possibilitar a emissão de mensagens sonoras sem fio de um transmissor para diversos receptores simultâneos. Para melhor compreender o passado e o presente do rádio, deve-se considerar que existem dois aspectos a serem avaliados: de um lado, está a tecnologia que permite a transmissão de sons usando ondas eletromagnéticas; de outro, estão os usos dessa tecnologia e sua evolução como veículo de comunicação massivo nesses mais de 120 anos transcorridos desde que o padre Landell de Moura realizou a primeira transmissão pública por meio de ondas hertzianas no Brasil ou, do outro lado do Oceano Atlântico, desde que Marconi fez sua demonstração pública e confirmada de radiotelegrafia, na Itália. Ferraretto (2001, p. 86) situa a primeira transmissão radiofônica comprovada e eficiente no ano de 1906, em Massachussets, Estados Unidos. O dono do feito foi o canadense Reginald Aubrey Fesseden, que, “usando um alternador desenvolvido pelo sueco Ernest Alexanderson, transmitiu o som de um violino, de trechos da Bíblia e de uma gravação fonográfica”. Ele é, contudo, mais um entre os vários pesquisadores de diversas nacionalidades apontados como o criador do rádio. A pesquisa de Ferraretto (2001) situa a origem dessa tecnologia no legado de Samuel Morse, com o telégrafo desenvolvido entre 1832 e 1837, e Alexander Graham Bell, detentor da patente do telefone, em 1876. Nos anos que se seguiram, muitos 14 pesquisadores de diversos países desenvolveram estudos sobre a eletricidade e suas características. Mas foi na última década do século XIX, como aponta Prado (2012), que o italiano Guglielmo Marconi utilizou seus estudos sobre as ondas hertzianas para produzir ondas de rádio. Em palestra feita na Fundação Nobel em dezembro de 1909, Marconi explicou os objetivos de seus estudos: Na minha casa perto de Bolonha, na Itália, iniciei, em 1895, testes externos e experiências com o objetivo de determinar se seria possível, por meio de ondas hertzianas, transmitir a uma distância telegráfica sinais e símbolos, sem o auxílio de fios de ligação. Depois de alguns experimentos preliminares com ondas hertzianas, fiquei muito convencido de que, se essas ondas ou ondas semelhantes poderiam ser confiavelmente transmitidas e recebidas por distâncias consideráveis, um novo sistema de comunicação se tornaria disponível, possuindo enormes vantagens sobre os refletores e métodos óticos, que são muito dependentes para o seu sucesso da clareza da atmosfera (NOBEL, 1909, tradução nossa). Assim, Marconi é citado como o responsável pelas pesquisas que trouxeram à realidade a radiotelegrafia. Em 1896, ele conseguiu realizar “a primeira demonstração pública e confirmada de radiotelegrafia” (FERRARETTO, 2001, p. 82), transmitindo uma mensagem em Código Morse. Com isso, obteve em Londres a patente sobre o telégrafo sem fio. Embora seu nome tenha ficado para a História, Marconi é considerado um homem visionário, mas não o pai dessa invenção, pois “baseou-se nas teorias já estudadas por outros cientistas para aperfeiçoar suas ideias” (PRADO, 2012, p.30). Ainda que o seu trabalho seja apontado como o resultado exitoso das pesquisas de seus antecessores, Prado reconhece seus méritos: O sucesso de Marconi deu início a uma revolução mundial no campo das comunicações. Outros inventores passaram a ocupar-se do rádio, várias nações reivindicaram a primazia da invenção (na França era atribuída a Brianey, nos Estados Unidos a Lodge, na Alemanha a Staby). O próprio governo italiano viria a demonstrar interesse tardio e oferecer a Marconi o navio Carlos Alberto para outras experiências (2012, p.32). 15 Embora a primeira transmissão sonora radiofônica comprovada e eficiente seja atribuída, como citado anteriormente, a Reginald Aubrey Fesseden pelo experimento realizado em 1906, a emissão de sons via rádio teria sido feita antes disso. Antes até da transmissão do Código Morse por Marconi, o padre gaúcho Roberto Landell de Moura “chegou a obter resultados por vezes superiores aos dos cientistas estrangeiros” (FERRARETTO, 2001, p. 83). Mas suas descobertas nunca chegaram a ter a repercussão obtida pelo italiano. Prado situa: Diferentemente do ocorrido com Landell de Moura, Marconi conseguiu ser reconhecido e foi agraciado em 1909, recebendo, juntamente com o alemão Karl Ferdinand Braun, o Nobel de Física. Braun é o descobridor dos semicondutores, dentre eles, o sulfeto de chumbo natural, um mineral conhecido como galena, base do histórico rádio de galena (2012, p.33). O padre Roberto Landell de Moura nasceu em Porto Alegre, onde iniciou seus estudos, tendo concluído sua formação em Roma, no Colégio Pio Americano e estudado Química na Universidade Gregoriana. De volta ao Brasil, por volta de 1886 e instalado no Rio de Janeiro, celebrou missas na presença do Imperador Dom Pedro II. Alencar situa que, na Capital Federal, o padre encontrou-se em algumas ocasiões com o Imperador do Brasil D. Pedro II, tendo lhe falado sobre suas pesquisas acerca da transmissão do som. O assunto fascinava D. Pedro II a ponto de ele ter financiado, em 1856, parte dos trabalhos de Alexander Graham Bell nos Estados Unidos. Nos anos que se seguiram, ele exerceu o ministério sacerdotal em cidades do Rio Grande do Sul e São Paulo. Instalado na capital paulista entre 1893 e 1894 – portanto, pelo menos dois anos antes da demonstração pública de Marconi – Landell de Moura teria realizado “as suas primeiras experiências com transmissão e recepção de sons por meio de ondas eletromagnéticas [...]” (FERRARETTO, 2001, p. 83). Precisamente em 1894, de acordo com Alencar, o padre realizou a primeira transmissão pública por meio de ondas hertzianas, entre o alto da Avenida Paulista e o alto de Sant'Anna, em São Paulo, cobrindo uma distância de oito quilômetros. Apesar de seus avanços, o padre era vítima da descrença e, em certa ocasião, declarou: 16 Quero mostrar ao mundo que a Igreja Católica não é inimiga da Ciência e do progresso humano. Indivíduos, na Igreja, podem, neste ou naquele caso, haverse oposto a esta verdade; mas fizeram-no por cegueira. A verdadeira fé católica não a nega. Embora me tenham acusado de participante com o diabo e interrompido meus estudos pela destruição de meus aparelhos, hei de sempre afirmar: isto é assim e não pode ser de outro modo... Só agora compreendo Galileu exclamando: E pur se muove! (ALENCAR apud FORNARI, 1960). Foi somente em março de 1901 que Landell obteve, no Brasil, a Carta Patente número 3.279. “O objeto da invenção é um aparelho que se presta à transmissão a distância com fio e sem fio condutor, tanto através do espaço e da terra, como do elemento aquoso” (FERRARETTO, 2001, p.84). Em vida, Landell de Moura não obteve apoio, reconhecimento ou recursos financeiros para suas atividades científicas. Num esforço para levar adiante suas descobertas, rumou aos Estados Unidos, onde conseguiu, em 1904, outras três cartas patentes: para o telégrafo sem fio; para o telefone sem fio e para o transmissor de ondas sonoras. Depois disso, sem conseguir efetivar parcerias que pudessem levar adiante suas ideias, o padre voltou ao Brasil e retomou sua vida eclesiástica e acadêmica. O mérito pela primeira transmissão de voz coube a Fesseden, em 1906. Mas, na forma como conhecemos atualmente, o rádio foi imaginado “[...] a partir de 1916, quando o russo radicado nos Estados Unidos, David Sarnoff, anteviu a possibilidade de cada indivíduo possuir em casa um aparelho receptor” (FERRARETTO, 2001, p.23). Sarnoff era funcionário da empresa que Guglielmo Marconi fundou com atuação na Grã-Bretanha e Estados Unidos, sendo uma espécie de pioneira nas comunicações presente em vários países. A pesquisa de Ferraretto (2001) situa que o russo registrou suas intenções para a direção da empresa por meio de um memorando, concebendo a ideia de aproveitar o rádio como meio de comunicação de massa, pois até então a ferramenta havia sido utilizada para o envio de mensagens de uma pessoa à outra ou de uma pessoa a um público reunido em torno de uma caixa receptora. 17 A ideia permaneceu por alguns anos nas gavetas da corporação, somente tendo sido levada adiante por outra empresa, a Westinghouse Eletric and Manufacturing Company, a partir da criação da KDKA, em novembro de 1920. Conforme Ferraretto, “nascia com a KDKA oficialmente a indústria de radiodifusão, no sentido de produção e transmissão de conteúdos, um novo campo para investimento de capital” (2001, p.89). No Brasil, a partir de 1919, já havia algumas experiências de radioamadorismo, como o Rádio Clube de Pernambuco, em Recife. Porém, a chegada efetiva do rádio veio por intermédio da própria Westinghouse, que “numa investida da estratégia de busca de novos mercados [...] enviou, a título de demonstração, duas estações transmissoras de 500W ao Brasil” (FEDERICO, 1982, p. 15). A década de 1920 é descrita por Federico (idem) como uma época de transmissões experimentais e iniciais em todo o mundo. A autora enumera a chegada do rádio nessa época em pelo menos 12 países, além do Brasil: Alemanha, Bélgica, Canadá, Inglaterra, Espanha, Argentina, França, Itália, Portugal, Japão, Polônia e Suécia. A primeira demonstração em terras brasileiras ocorreu por ocasião do centenário da Independência, em 1922, com uma estação de radiotelefonia montada no alto do Corcovado: Essa estação teve receptores alto-falantes colocados estrategicamente nos recintos da exposição do centenário da nossa independência, pelos quais os visitantes puderam ouvir o pronunciamento do Presidente Epitácio Pessoa que a inaugurou. Esses receptores em forma de corneta propiciaram ainda a audição da canção O Aventureiro, da obra O Guarani, de Carlos Gomes (FEDERICO, 1982, p. 33). Ferraretto destaca que “a demonstração promovida pelo capital norteamericano atingiria o seu objetivo, despertando o interesse dos pioneiros do rádio no Brasil” (2001, p.94). Presente na ocasião, o antropólogo Edgar Roquette-Pinto, que ocupava o cargo de secretário na Academia Brasileira de Ciências, prontamente vislumbrou aquela revolucionária invenção utilizada com objetivo cultural e educativo. 18 Para implantar a primeira emissora de rádio com funcionamento regular no país, Roquette-Pinto contou com o apoio dos membros da Academia – especialmente de seu presidente, Henrique Morize. Fundada em 20 de abril de 1923, a Rádio Sociedade do Rio de Janeiro passou a operar durante uma hora por dia2. Logo no começo, o Governo designou o Departamento de Correios e Telégrafos, vinculado ao Ministério da Viação, como responsável pela emissão de licenças para os primeiros proprietários de aparelhos de rádio. Naturalmente, os primórdios do rádio no Brasil foram marcados por um período de adaptação, sem uma programação totalmente definida e com público ainda muito insipiente. Além disso, a ideia de Roquette-Pinto de que o Rádio iria “trabalhar pela cultura dos que vivem em nossa terra e pelo progresso do Brasil” (FERRARETTO, 2001, p.97) não se concretizou tão cedo. Magaly Prado (2012) esclarece que apenas a elite brasileira tinha condições financeiras de acesso ao aparelho nessa fase inicial do rádio. Além do custo alto, as pessoas pagavam uma mensalidade para ouvir a emissora, já que era a contribuição dos associados que cobria os custos da operação. Os interessados nessa nova tecnologia da época esbarravam, ainda, na escassez de aparelhos no país. Em 1922, quando da demonstração da Westinghouse, apenas 80 aparelhos foram trazidos junto com os dois transmissores. Além deles, de acordo com Federico, havia “alguns do tipo alto-falantes e outros do tipo galena (fabricados em casa) com fones de ouvido. Esses aparelhos individuais foram distribuídos a pessoas de destaque no Distrito Federal” (1982, p.46). Além das contribuições mensais e do preço elevado dos aparelhos de rádio, houve outros fatores que elitizaram esse meio de comunicação nos seus primeiros anos. Segundo Federico (1982), havia taxas a serem pagas por quem desejasse 2 Para efetuar essas transmissões, conforme Ferraretto (2001), a Rádio Sociedade do Rio de Janeiro obteve autorização do governo para utilizar, durante uma hora por dia, a estação de transmissão da Praia Vermelha – uma das duas instaladas no Rio de Janeiro por ocasião do centenário da Independência. Sensibilizado pela utilidade dos equipamentos para radiotelefonia, o governo acabou adquirindo a estação instalada na Praia Vermelha. A outra, no Corcovado, já havia sido desmontada e regressara aos Estados Unidos. 19 escutar de casa as transmissões radiofônicas da Rádio Sociedade. Antes de instalar o aparelho, devia-se protocolar junto ao Ministério da Viação um requerimento de licença pelo qual se cobrava uma estampilha, ou taxa administrativa. Também era necessário um certificado de idoneidade emitido pela própria Rádio Sociedade, para o qual também havia custos. A autora esclarece que isso se devia ao temor do Governo da então Capital Federal de que os ouvintes interceptassem correspondências radiotelefônicas em seus aparelhos domésticos. Todos esses requisitos formais, que deviam ser preenchidos pelos ouvintes para usufruírem dos benefícios da radiodifusão, eram não só desencorajantes como onerosos. Portanto, só uma minoria economicamente privilegiada poderia despender não só o dinheiro necessário como o tempo para a obtenção de todos os deferimentos (FEDERICO, 1982, p.47). E, como se não bastasse, a programação era basicamente constituída por música clássica e discursos altamente eruditos – o que se agravava pela falta de regularidade das transmissões. Conforme Ferraretto, a primeira sequência de programas organizados pela Rádio Sociedade contemplava “notícias de interesse geral, conferências literárias, artísticas e científicas, números infantis, poesia, música vocal e instrumental” (2001, p. 96). As dificuldades existiam porque o rádio brasileiro estabeleceu-se a partir de uma dupla determinação, segundo Lia Calabre: “um veículo de comunicação privado, portanto subordinado às regras do mercado econômico, mas, ao mesmo tempo, controlado pelo Estado” (2004, p.12). Nesse período, os pioneiros do rádio ainda não haviam percebido a possibilidade de exploração da publicidade, o que mudou em 1924: Esta nova consciência das possibilidades lucrativas do veículo tem suas origens na Rádio Clube do Brasil, fundada em 1º de junho de 1924 por Elba Dias, um dos técnicos que auxiliara na estruturação da Rádio Sociedade. A emissora foi a primeira a obter autorização para transmitir publicidade (FERRARETTO, 2001, p.100). 20 A década de 1920 foi marcada, portanto, pelo surgimento das primeiras emissoras de rádio e por uma exploração ainda pouco estruturada desse meio de comunicação. A grande virada da radiodifusão no país se deu entre 1931 e 1932, com a publicação de dois decretos governamentais. O primeiro, de número 20.047 e publicado em de 27 de maio de 1931, “regula a execução dos serviços de radiocomunicações no território nacional3” (BRASIL, 1931). Esse decreto caracterizou como serviços da radiocomunicação, “a radiotelegrafia, a radiotelefonia, a radiofotografia, a radiotelevisão, e quaisquer outras utilizações de radioeletricidade, para a transmissão ou recepção, sem fio, de escritos, sinais, imagens ou sons de qualquer natureza por meio de ondas hertzianas” (idem). O outro, de número 21.111, regulamentou o decreto anterior e ainda contemplou a inserção de comerciais até um limite de 10% da programação, como descrito em seu parágrafo de número 73: Art. 73. Durante a execução dos programas é permitida a propaganda comercial, por meio de dissertações proferidas de maneira concisa, clara e conveniente à apreciação dos ouvintes, observadas as seguintes condições: a) o tempo destinado ao conjunto dessas dissertações não poderá ser superior a dez por cento (10%) do tempo total de irradiação de cada programa; b) cada dissertação durará, no máximo, trinta (30) segundos; c) as dissertações deverão ser intercaladas nos programas, de sorte a não se sucederem imediatamente; d) não será permitida, na execução dessas dissertações, a reiteração de palavras ou conceitos (BRASIL, 1932). Nessa época, Ferraretto (2001, p. 101) elenca a existência de emissoras nos estados da Bahia, Ceará, Maranhão, Minas Gerais, Pará, Paraná, Pernambuco, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e São Paulo. O advento da publicidade 3 No decreto 20.047, é usado, pela primeira vez em um documento legal, o termo radiodifusão. Ferraretto elucida que, antes dele, as emissoras de rádio eram enquadradas na legislação da telefonia e da telegrafia sem fios (2001, p. 103). 21 mudou o modo de fazer rádio, que passou a ser visto como um novo e promissor meio de comunicação. O projeto inicial de Roquette-Pinto de uma rádio voltada à educação não foi de todo perdido. Nos anos que se seguiram, o fundador da primeira emissora de rádio no Brasil promoveu mudanças em sua programação que conquistaram maior simpatia popular – até que, em 1936, ele doou a Rádio Sociedade do Rio de Janeiro ao Ministério da Educação e Saúde. Magaly Prado cita que a doação foi feita sob a condição de que “o governo mantivesse os ideais de programação baseados na transmissão de educação e cultura (2012, p. 55)”. Esse é considerado o marco do surgimento do rádio educativo no país. O momento seguinte do rádio é diretamente influenciado pela conjuntura política – a priori, do país; depois, do mundo. “A decretação, em novembro de 1937, do Estado Novo, que implantou uma ditadura com forte esquema de censura, afetou o setor do rádio, que se retraiu, para, logo em seguida, continuar seu processo de crescimento” (CALABRE, 2004, p. 19). A consolidação do rádio no país deve-se ao papel que o veículo cumpriu na transmissão de informações durante a Segunda Guerra Mundial (1939/1945). Paralelamente a esse impulso e ao consequente aumento da comercialização, o rádio foi, conforme Federico, “encontrando novos caminhos, nova programação, novos públicos e novas modalidades de atuação junto a eles” (1982, p. 66). Ao longo da década de 1940, o rádio ganhou mais e mais anunciantes, o que suscitou o desenvolvimento das agências de propaganda. Segundo Calabre, os maiores patrocinadores dessa fase do rádio eram as multinacionais que se instalavam no país (2004, p. 15). Também legado estrangeiro – nesse caso, dos Estados Unidos – foi a primeira tentativa de uma rede de rádios do país, a Rede Verde-amarela, da empresa Byington & Cia (mais tarde absorvida pela multinacional Motorola, conforme situa Ferraretto). Com emissoras em São Paulo e no Rio de Janeiro, a rede “realizaria a primeira cobertura 22 esportiva de um Campeonato Mundial de Futebol, na França, em 1938” (FERRARETTO, 2001, p. 109). Porém, com linhas de baixa qualidade e sem a concessão pelo governo de canais de ondas curtas para levar a informação em rede, a empreitada fracassou. Com isso, segundo Ferraretto, “o Brasil só contaria com redes a partir dos anos 70, quando a estrutura de telecomunicações do país permitiu a interligação de emissoras via satélite” (idem). A programação radiofônica em seus tempos áureos dividia-se basicamente em quatro segmentos de conteúdo, elencados por Lia Calabre (2004): as radionovelas, que arrebatavam legiões de brasileiros até a década de 1950, em algumas emissoras chegavam a ter até seis diferentes títulos veiculados diariamente; a música, por meio da transmissão de discos em emissoras de pequeno porte ou da contratação de grandes orquestras e cantores que se apresentavam ao vivo nas emissoras de maior expressão; os programas de humor, variedade e calouros, que disputavam com os dois anteriores a liderança da audiência; e, por fim, o jornalismo. Nos primeiros anos do rádio, como acontecia na Rádio Sociedade do Rio de Janeiro, as notícias eram lidas dos jornais e, posteriormente, comentadas. Depois, já nessa fase, as emissoras contavam com os serviços de agências de notícia internacionais e nacionais. Até que passaram a ter suas próprias equipes de reportagem. “Ao longo dos aos 1940, as emissoras foram se especializando [...]. Muitas vezes uma mesma emissora possuía vários informativos, cada qual com seu caráter específico” (CALABRE, 2004, p. 43). Foi nesse contexto que nasceu, na Rádio Nacional4, o Repórter Esso – programa jornalístico que marcou época no rádio no Brasil, permanecendo no ar em 4 Criada em 1936, a Rádio Nacional foi a principal responsável pela popularização do rádio no país. Em sua fundação, fez propostas irrecusáveis aos principais artistas da época, reunindo um elenco estelar do Rio de Janeiro e São Paulo, como remonta Prado (2012). Em 1940, foi encampada pela ditadura Vargas. Porém, mesmo estatizada, permaneceu funcionando com modelo comercial e “paradoxalmente, reinou absoluta na „Época de Ouro‟ da radiofonia brasileira, transformada na rádio padrão do país” (PRADO, 2012, p.113). 23 três emissoras diferentes entre os anos de 1941 e 1968 e tendo sido também veiculado na televisão entre os anos de 1953 e 1970. “A maior contribuição do Esso foi a introdução, no Brasil, de um modelo de texto linear, direto, corrido e sem adjetivações, apresentando um noticiário ágil e estruturado” (FERRARETTO, 2001, p. 127). Magaly Prado (2012, p.121) divide o Repórter Esso em duas fases distintas e igualmente pautadas por guerras. Na primeira, enquanto durou a Segunda Guerra Mundial, o programa apoiava os Aliados “desenvolvendo reportagens direto do front” e servindo como uma espécie de correspondente oficial do Brasil. Depois, na Guerra Fria, as notícias nacionais ganharam espaço e, efetivamente, ocorreu a supressão da linguagem pomposa e adjetivada, que predominava no rádio até então, em detrimento de um texto mais claro e conciso. Entre uma fase e outra, ocorre o fato responsável por desencadear uma mudança iniciada na Rádio Nacional e que depois foi adotada pelas demais emissoras. Heron Domingues, o locutor oficial do Repórter Esso na Rádio Nacional, implanta e dirige, a partir de 1948, “a Seção de Jornais Falados e Reportagens da Nacional, o primeiro departamento de uma emissora no país dedicado ao jornalismo” (FERRARETTO, 2001, p.129). Esse novo modelo fez toda a diferença para a sobrevivência desse veículo de comunicação nas décadas seguintes, quando o rádio passa a dividir espaço com a televisão. O início da década de 1950 tem especial relevância na história das comunicações no Brasil. No primeiro ano desse período, Assis Chateaubriand inicia as transmissões da primeira emissora de televisão da América Latina, a TV Tupi. Ao mesmo tempo, ocorre a chegada do transistor, “que livrou o aparelho de fios e tomadas, proporcionando a criação de uma nova linguagem, apropriada para um veículo com alta mobilidade, que acompanhava o ouvinte onde quer que ele estivesse” (PRADO, 2012, p. 215). Nos anos que se seguiram, o rádio perdeu gradativamente seu prestígio junto ao público e precisou reinventar-se, aproveitando-se de sua mobilidade para isso. Ocorre que a concorrência com a televisão na área do entretenimento era inviável, 24 afinal, a nova tecnologia saciava toda a curiosidade do público de conhecer o rosto de seus ídolos, o que antes só se fazia por meio das revistas publicadas pelas emissoras ou estando na plateia das transmissões radiofônicas. Ferraretto pontua que o rádio foi vendo seus mais prestigiados artistas transferindo-se para a televisão e também vivenciou a perda das verbas publicitárias. “O espetáculo começa a migrar para o novo meio [...]” (2001, p. 137). Em 27 de agosto de 1962, foi promulgada a legislação da radiodifusão, incluída no Código Brasileiro de Telecomunicações. Esse decreto regulou a atividade de radiodifusão e determinou em seu artigo 4º como serviços de telecomunicações: [...] a transmissão, emissão ou recepção de símbolos, caracteres, sinais, escritos, imagens, sons ou informações de qualquer natureza, por fio, rádio, eletricidade, meios óticos ou qualquer outro processo eletromagnético (BRASIL, 1962). O Código ainda classificou as telecomunicações de acordo com o fim a que se destinam, caracterizando a radiodifusão como serviço “destinado a ser recebido direta e livremente pelo público em geral, compreendendo radiodifusão sonora e televisão” (BRASIL, 1962). No campo da prática, o transistor trouxe novo fôlego para o rádio, já que “deslocado de um lugar de destaque na sala de estar, agora ocupado pelo televisor, o receptor radiofônico passa com a transistorização, em definitivo, a acompanhar os ouvintes” (FERRARETO, 2001, p. 138). Ferraretto ainda situa que, na década de 1950, o rádio passa a basear sua programação no trinômio jornalismo, esporte e serviço à população – o que se consolidou nos anos de 1960 e 1970, muito em função da Ditadura Militar: 25 O golpe militar de 1964, que levou à investigação e à cassação de muitos dos 5 grandes astros da Rádio Nacional e ao fechamento da Rádio Mayrink Veiga , de orientação legalista, juntamente com questões internas das emissoras, representou um momento de ruptura definitivo na história do rádio brasileiro. O governo militar investiu na integração televisiva do país e as emissoras foram adotando o modelo de rádios locais, com notícias e prestação de serviços, músicas gravadas e esportes (CALABRE, 2004, p. 50). É também nesse período e 30 anos depois de sua descoberta que iniciam as transmissões regulares e comerciais em frequência modulada (FM). A tecnologia foi inventada em 1933 pelo engenheiro americano Edwin Armstrong, “permitindo a sintonização com qualidade sonora muito melhor, embora com alcance apenas em linha de visibilidade” (PRADO, 2012, p.95). Nos Estados Unidos, sua expansão se dá nos anos seguintes à Segunda Guerra Mundial – o que, no Brasil, vai ocorrer somente ao longo dos anos 1970. Magaly Prado aponta que, inicialmente, a FM não começou no Brasil como emissora, mas como link para as estações de AM – ou seja, uma ligação entre o estúdio e o transmissor, o que anteriormente era feito por linha telefônica. Somente em 1968, quando o governo proibiu seu uso como link, é que a transmissão em Frequência Modulada passou efetivamente a ser realizada, mas “afastando-se da rádio educativa e ainda não atingindo a rádio pop, as FM apareceram primeiramente para fornecer música ambiente” (PRADO, 2012, p. 261). 5 Segundo informações do acervo do jornal O Globo, a Rádio Sociedade Mayrink Veiga foi fundada em 21 de janeiro de 1926, tendo sido um dos berços da Era do Rádio. A emissora deu espaço para os maiores craques da Música Popular Brasileira da época: Francisco Alves, Silvio Caldas, Vicente Celestino, as irmãs Carmem e Aurora Miranda, Noel Rosa, Gastão Formenti, Carlos Galhardo e Moreira da Silva, entre outros. A emissora foi líder de audiência até o surgimento da Rádio Nacional e teve programas que marcaram época na história do rádio no Brasil. Em 1962, a Mayrink participou da chamada Cadeia da Legalidade (uma rede de rádios organizada por Leonel Brizola para defender a democracia), o que serviria como justificativa para o regime militar fechá-la em 1965. Fonte: http://acervo.oglobo.globo.com/rio-de-historias/radio-mayrink-veiga-abre-os-seus-microfones-para-osastros-da-era-do-radio-8849357. Acesso: 19 abr. 2014. 26 Seguindo o modelo econômico vigente na época, considerado uma nova expressão do capitalismo6, os grupos que conseguem se consolidar entre as décadas de 1970 e 1980, “articulam-se no campo da propriedade cruzada dos meios, controlando, de modo simultâneo, jornais, emissores e rádio e/ou estações de TV” (FERRARETTO, KLÖCKNER, 2010, p. 544). São conglomerados que se profissionalizam e fortificam sua presença diante do consumidor, não deixando espaço para a concorrência com empresas de menor porte. Na segunda metade da década de 1970, fortificou-se o processo de segmentação do rádio. Espelhadas no modelo norte-americano, as estações de FM conquistam o público jovem. Colabora para essa divisão natural a qualidade técnica de áudio superior das FMs. “[...] as estações de amplitude modulada concentram-se no jornalismo, nas coberturas esportivas e na prestação de serviço à população. [...] Nas FMs, predomina a música” (FERRARETO, 2001, p. 155). A passagem da radiodifusão comercial brasileira para a era das redes via satélite ocorreu em março de 1982, quando a Bandeirantes AM, de São Paulo, começou a gerar e retransmitir seu radiojornal Primeira Hora. Até então, o que havia era a retransmissão de programas gravados entre emissoras de um mesmo grupo, mas ainda não se contava com a tecnologia necessária para a transmissão simultânea em rede. “Em 1985 o país passa a contar com um satélite próprio de comunicações, o Brasilsat A1, tendo o A2 sido lançado no ano seguinte. Está formado, então, um sistema nacional de telecomunicações via satélite” (FERRARETTO, 2001, p. 166). Nos anos 1990, já havia diversas redes nacionais e regionais, que logo se deparariam com o desafio de dosar a programação nacional com os conteúdos locais. Foram anos de aprendizado. Conforme Magaly Prado (2012, p. 399), “após ajuste do horário com momentos dedicados à programação em rede e outros exclusivos aos 6 Conforme Ferraretto (FERRARETTO, KLÖCKNER, 2010, p. 543), essa nova expressão econômica ocorre quando o capitalismo liberal dá lugar ao monopólico, em que um pequeno número de grandes empresas disputa a preferência do consumidor e “o autor vai se preocupar com a consolidação do seu setor, motivo pelo qual cria entidades como a Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert), fundada em 27 de novembro de 1962”. 27 assuntos locais, a preocupação recaiu à linguagem [...]. A questão do sotaque veio à tona”. Ao mesmo tempo em que o rádio no Brasil enfrentava seus últimos desafios antes do advento da internet (que iria modificar completamente o modo de produzir e transmitir conteúdo), multiplicaram-se as emissoras comunitárias, que atuariam por quase 20 anos através de meios alternativos até serem regulamentadas pelo governo. Entre os anos 1970 e 1990, o rádio comercial e o rádio comunitário desenvolvem-se paralelamente, em um cenário onde os avanços tecnológicos contemplam as emissoras convencionais, mas o fazer popular foi ganhando gradativa importância. “Surgem e se desenvolvem na América Latina, a partir da década de 1970, as primeiras experiências de comunicação popular, que passam a receber diferentes denominações: comunitária, alternativa, dialógica, participativa, grupal, libertadora, de resistência” (COGO, 1998, p. 29). Conforme Cogo (1998, p. 39), o novo modelo emergiu principalmente no interior dos movimentos e organizações sociais – especialmente dentro da Igreja Católica e dos sindicatos de trabalhadores – “em meio a uma conjuntura de profunda insatisfação por parte do povo e de profundas restrições à liberdade de expressão”. A legislação vigente impedia o acesso de grupos populares a concessões de rádio e televisão. Sendo assim, a rádio comunitária teve seu início ocupando espaço em emissoras comerciais geralmente de propriedade da Igreja Católica ou por meio de altofalantes instalados em favelas paulistas. A primeira experiência brasileira nesse sentido, como registra Cogo, deu-se em 1983, na Zona Leste de São Paulo, precisamente na favela de Nossa Senhora Aparecida, na região de São Miguel Paulista. O alto-falante que inicialmente percorria a comunidade propagando avisos de utilidade pública, acabou sendo fixado na sede do centro comunitário e, posteriormente, no alto da igreja. 28 Com isso, Denise Cogo conta que os alto-falantes foram transformados em rádio popular, seguindo o exemplo bem-sucedido que vinha sendo utilizado em Lima, no Peru. Feita pelas pessoas da comunidade, a rádio passou a transmitir uma programação melhor elaborada e sistematizada, com horário fixo aos sábados pela manhã. Os programas eram constituídos “basicamente de notícias, entrevistas e serviços informativos elaborados com a colaboração de várias comunidades da favela” (1998, p. 104). Foi somente em 1998 que o Governo Federal instituiu o serviço de radiodifusão comunitária, por meio do decreto número 9.612, que a define como “radiodifusão sonora, em frequência modulada, operada em baixa potência e cobertura restrita, outorgada a fundações e associações comunitárias, sem fins lucrativos, com sede na localidade de prestação do serviço” (BRASIL,1998). Entende-se por baixa potência o limite de 25 watts e altura do sistema irradiante não superior a trinta metros. Inicialmente, o decreto 9.612 determinou que a outorga dessas estações tinha validade de três anos, podendo ser renovada. Posteriormente, em 2002, esse prazo foi ampliado para 10 anos. As emissoras comunitárias foram criadas para colaborar com o desenvolvimento das comunidades, com a transmissão de conteúdos educativos, artísticos, culturais e informativos, além da participação ativa da comunidade. Tanto que a lei previu que “qualquer cidadão da comunidade beneficiada terá direito a emitir opiniões sobre quaisquer assuntos abordados na programação da emissora, bem como manifestar ideias, propostas, sugestões, reclamações ou reivindicações” (BRASIL, 1998). Na prática, porém, não foi dessa forma que elas se desenvolveram. Em sua pesquisa com rádios comunitárias paulistas, realizada entre 2004 e 2005, Bruno Araújo Torres demonstrou que existem inúmeras emissoras clandestinas que, “por operarem em baixa frequência, com programação cultural e sem fins lucrativos, se autodenominam comunitárias” (2010, p. 256). 29 Além do que, mesmo entre as emissoras legalmente instaladas, a participação do público ocorre de forma muito restrita, descaracterizando o conceito de rádio comunitária. Segundo Torres (2010, p.263), 94% dos entrevistados responderam que o ouvinte poderia participar da programação por telefone, carta ou e-mail. Somente 4% disseram que o ouvinte poderia participar ativamente da programação, fazendo ou produzindo programas de acordo com seu gosto. A conclusão do autor é que “o exercício da cidadania por meio do rádio se encontra ameaçado em função da apropriação privada por comerciantes e políticos de um espaço que deveria ser público”. 3 NOVIDADES NO AR: A INTERNET A internet chegou ao Brasil em um cenário de estagnação do rádio no país, depois de longos anos de uso político e concessões outorgadas em espécie de apadrinhamento. De acordo com Kischinhevsky (2007), o modelo de radiodifusão brasileiro é essencialmente privado e está nas mãos de empresários com fortes ligações político-regionais. Durante o governo de Getúlio Vargas, houve um forte controle da imprensa exercido pelo Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP), criado no Brasil em dezembro de 1939 e extinto em 1945, com o fim do Estado Novo. Entretanto, foi durante a Ditadura Militar, e mesmo no primeiro governo civil, após esse período, que ocorreu a multiplicação das emissoras, num modelo de troca de favores apontado por Kischinhevsky como o grande responsável pela expansão do rádio entre o fim da década de 1960 e o fim dos anos 1980. Um levantamento feito pelo autor pontua que “em 1985, havia no país, entre emissoras instaladas e em fase de implantação, quase 3.400 estações de rádio, 35% delas concedidas ao longo dos 21 anos de Ditadura Militar” (2007, p. 93 e 94). Esse fenômeno ampliou-se ainda mais no período de transição democrática, quando o Brasil foi governado por José Sarney. Kischinhevsky relata que integrantes do governo Sarney admitiram que “dias antes da promulgação da Constituinte de 1988, mais de 400 outorgas para operação de rádio e TV foram concedidas”. Apesar de serem escusas as relações de apoio político em troca de concessões de radiodifusão, o resultado dessa prática foi que o rádio pôde chegar ao interior do país: Esse regime de concessões de critério político, privilegiando empresários ligados a parlamentares da base de sustentação do governo, levou à interiorização das emissoras. Enquanto na Argentina e no Uruguai, as estações se concentram em torno de Buenos Aires e Montevidéu, no Brasil as grandes capitais reúnem nem uma parcela ínfima do total. Segundo relatório da agência de publicidade McCann-Erickson, a maioria absoluta das 1.440 emissoras AM e 31 925 emissoras FM em operação no país, em 1989, estava instalada fora dos grandes centros urbanos (KISCHINHEVSKY, 2007, p. 94). Depois de tantos anos relacionadas ao interesse político, as outorgas de rádio foram suspensas no governo de Fernando Collor de Melo, o que teve prosseguimento com Itamar Franco e no início do governo de Fernando Henrique Cardoso. A partir de 1996, tentou-se retomar as concessões por meio de licitação, processo que se desenrolou a passos lentos e contribuiu para estratificar um cenário de estagnação do rádio. Kischinhevsky (2007) situa que, de 1990 a 1998, o número de emissoras permaneceu praticamente inalterado. Do ponto de vista mercadológico, Nelia Del Bianco (1999, p.185) aponta que o gerenciamento das emissoras de rádio vinha se transformando em decorrência dos novos equipamentos digitais e do uso do satélite. Com isso, “emissoras tradicionais procuram fórmulas inovadoras para manter posições [...]. Outras lutam para recuperar o prestígio do passado, incorporar a tecnologia emergente e vencer as incertezas”. Com uma fatia cada vez menor do bolo publicitário, o rádio atravessava dificuldades e foi beneficiado pela tecnologia de transmissão via satélite. No início da década de 1990, as emissoras buscavam dosar da melhor forma suas programações locais com a transmissão em rede. O modelo ganhou espaço rapidamente, pois possibilitou a redução de custos operacionais com mão de obra e também ampliou as oportunidades de faturamento, pela transmissão de publicidade em cadeia. Além das questões práticas, Del Bianco (1999, p. 197) aponta que as redes deram início a uma nova fase no modelo de gestão, com “uma nova geração de empresários do rádio: o manager, aquele que faz do meio o seu negócio e o explora de maneira racional e profissional”. A autora ainda coloca os anos 1990 como a época onde o rádio buscou novos meios de sustento, a partir da criação de eventos para os ouvintes, promoções patrocinadas, sorteios e lançamento de produtos personalizados, como CDs 32 promocionais. Essas ferramentas foram os meios utilizados para diferenciação entre as emissoras e, tendo entrado no país nesse contexto, logo a internet seria mais um deles. Pesquisadores como Luiz Artur Ferraretto, Nair Prata e Nelia Del Bianco situam a chegada da internet como o quarto grande fato na história radiofônica do país. A conexão do mundo pela rede mundial de computadores deu real sentido ao termo globalização e marcou tanto o rádio quanto o nascimento da televisão, a transistorização e a chegada das emissoras em Frequência Modulada (FM). O rádio já havia atravessado seus momentos de desprestígio, quando perdeu espaço na sala de estar para os aparelhos televisores; depois, recobrou seu fôlego quando se miniaturizou e pôde funcionar apenas com o uso de algumas pilhas; ainda, ganhou novos contornos e usos atraindo o público jovem por meio da música em transmissões mais audíveis pelo FM. Entretanto, o cenário que se desenha na década de 1990, com o surgimento de novas tecnologias, foi o mais transformador para o rádio pelas incógnitas que carregava. A internet teve sua origem nos anos 1970, sem relações com comunicação de massa. Ao contrário, a tecnologia foi criada com objetivos bélicos. Segundo Nair Prata, a iniciativa foi do Departamento de Defesa Americano e teve o intuito de interligar virtualmente as faculdades de centros de pesquisa daquele país para canalizar as descobertas e informações obtidas pelos pesquisadores e que pudessem fortalecer o os Estados Unidos durante a Guerra Fria. A Arpanet, como foi chamada esta primeira rede, logo deu origem a outras, que existiam sem ligação entre si. A pesquisa de Luciana Miranda Costa revela que o uso comercial da internet foi liberado em 1987 e, em 1990, a Arpanet saiu de operação, ficando a administração da internet sob responsabilidade da National Science Foundation. Com computadores já preparados para a conexão com a internet, “os 33 Estados Unidos acabaram registrando uma rápida adaptação das emissoras de rádio para a Internet” (COSTA7). A rede mundial de computadores ganhou novas possibilidades de uso nos anos seguintes, o que provocou uma verdadeira revolução nas comunicações. A pesquisadora Sônia Virgínia Moreira (1999) situa para esse fenômeno a criação do World-Wide Web (www), em 1991, que foi concebido para interligar computadores de laboratório. Ela traça um panorama de como a nova tecnologia modificou as comunicações na época: A Internet está conseguindo unir meios de comunicação distintos, com conteúdos variados e destinados a audiências em qualquer ponto do globo, bastando para tanto ter um endereço eletrônico (...) e um leitor, ouvinte, espectador interessado – agora simplesmente usuário – na outra ponta do sistema (BIANCO, MOREIRA, 1999, p. 210 e 211). O que possibilitou o uso da internet nas empresas e residências, ampliando rapidamente sua popularidade, foi a criação de um programa chamado Mosaic, um ambiente gráfico semelhante ao Windows antes do qual somente era “possível exibir textos na web” (MARTINS, 2008, p. 35). No Brasil, a exploração comercial da internet foi liberada em 1995. No que tange ao rádio, sua entrada para a rede mundial de computadores inicialmente ocorreu com a criação de home pages na internet. Com isso, as emissoras buscavam ampliar os meios de interação com o público e, consequentemente, a publicidade. Ferraretto (2010, p. 545) pontua que, na última década do século 20, já sob a vigência da internet, começa o processo de convergência dos meios “entre tecnologias tradicionais – os meios de comunicação de massa existentes e a telefonia fixa – com inovações então recém-introduzidas no país como a TV por assinatura, a telefonia móvel e a internet”. 7 Pesquisa disponível no site http://www.oparanasondasdoradio.ufpa.br. 34 Conforme Del Bianco (1999), a rede Transamérica foi a primeira a entrar na rede mundial de computadores, em abril de 1996. Nesse mesmo ano, conforme Moreira (1999, p. 213), o total de emissoras brasileiras com endereço na Internet chegava a cerca de 20. Com isso, “os anunciantes e ouvintes que têm acesso a essa rede podem mandar mensagens ou escolher a melhor música por computador. Interatividade de verdade” (DEL BIANCO, 1999, p. 200). As grandes emissoras investiram em suas páginas na internet, apesar das ferramentas disponibilizadas estarem limitadas a informações básicas – endereço, telefone, grade de programação, tabela de preços para publicidade e um canal para o envio de mensagens. Nair Prata situa melhor esse marco da chegada da internet no país: A web comercial brasileira comemorou dez anos no dia 31 de maio de 2005, data de criação do Comitê Gestor da Internet no Brasil, entidade responsável pela rede mundial de computadores no país. Apesar de a primeira conexão à web ter sido feita em janeiro de 1991, e em 1994 a Embratel ter começado a oferecer acesso à rede, a criação do Comitê Gestor é o marco inaugural da internet comercial no Brasil (2008, p. 39). No mesmo ano em que a internet chegava ao Brasil, 1995, nos Estados Unidos a companhia Real Networks lançou o RealAudio, o primeiro recurso disponível para transmissões ao vivo pela internet em tempo real. Com isso, nasceu o conceito de webradio, que foi trazido para o Brasil três anos depois. Como elucida Kischinhevsky (2007, p. 116), a ferramenta consiste em um plugin que digitaliza e comprime o som, que depois é transmitido através de modems com velocidade acima de 14.400 bps. Antes do RealAudio, o usuário de internet precisava fazer o download de arquivos para escutar posteriormente. Com a tecnologia disponível na época, a chamada internet discada, esse processo poderia levar horas. 35 O formato de áudio em MP3, que permitiu a compressão do som em até 12 vezes, contribuiu ainda mais para a troca de conteúdos via web. O recurso foi popularizado a partir de 1997 pela empresa Sony Company, criadora de um formato padrão de MP3 que todas as empresas do mundo adotaram. As mudanças foram percebidas com intensidade pela indústria fonográfica. Os rápidos aperfeiçoamentos tecnológicos no campo da informática representaram, segundo Kischinhevsky (2007, p. 116), “um salto e tanto para uma rede de computadores que, até 1989, permitia apenas trocas de arquivos de textos e que só em 1996 passou a comportar vídeo”. Nair Prata (2008, p. 18) aponta que a internet reconfigurou os gêneros conhecidos e trouxe novas possibilidades de interação, levando a novas formas de radiofonia. Dito isso, a autora defende que se deveriam traçar novos conceitos de radiodifusão, os quais contemplem o conceito de convergência – isto é, “todos os veículos de comunicação funcionando num mesmo suporte, a internet”. A autora defende que: O advento da internet (...) faz surgir uma nova forma de radiofonia, onde o usuário não apenas ouve as mensagens transmitidas, mas também as encontra em textos, vídeos, fotografias, desenhos, hipertextos. Além do áudio, há toda uma profusão de elementos textuais e imagéticos que resignificam (sic) o velho invento de Marconi (2008, p. 50). Aspectos como a recepção, as tecnologias de transmissão e a produção de conteúdo foram rapidamente alteradas pela Internet. Kischinhevsky (2007, p. 66) enumera algumas dessas transformações. Primeiramente, o receptor tornou-se também emissor, na medida em que surgem novas e facilitadas formas de interação. Além do que, a internet reabre o campo de atuação para o rádio e, rapidamente, “um número cada vez maior de emissoras está migrando para a Internet, que não oferece limites geográficos, bastando um computador com acesso à banda larga”. 36 A transmissão de conteúdo pela Internet passou a ser o grande diferencial das emissoras diante do público. O rádio na internet ultrapassa as limitações da transmissão convencional. Ainda que desconsidere os problemas que ocorreriam no futuro com conexões ruins de internet, Sônia Moreira exalta que a superposição de emissoras no dial, os ruídos e os sinais fracos deixaram de existir. Martins (2008) pontua que, nos Estados Unidos, a primeira emissora comercial a transmitir pela internet de forma contínua e ao vivo foi a Rádio Klif, do Texas, em 1995. Já no Brasil, a novidade chegou três anos depois, com a Rádio Totem, em outubro de 1998. É importante observar que essa emissora nasceu e permaneceu somente no ambiente da internet. Costa8 revela que ela foi fundada pelo empresário Eduardo Oliva, que, na época, era o representante da Real Networks para o mercado brasileiro e pretendia demonstrar os usos e possibilidades dos programas da empresa. A emissora enfrentou, desde o princípio, uma limitação característica da webradio: o número de acessos simultâneos, que varia de acordo com a configuração técnica do servidor. No caso da Totem, a capacidade era de 500 usuários simultâneos. Por isso, logo a emissora aproveitou uma das vantagens da webradio sobre o rádio convencional, que é a possibilidade de oferecer múltiplos canais em um mesmo ambiente. Nesse caso, a Totem chegou a possuir 11 canais com estilos musicais variados, além de programas, notícias e atalhos para videoclipes e entrevistas. Sendo assim, a emissora correspondia ao entendimento de Nair Prata acerca de webradio, sendo “uma grande constelação de elementos significantes sonoros, textuais e imagéticos abrigados no suporte internet” (2008, p. 61). A Rádio Totem saiu do ar em 2001, por falta de recursos, mas deixou sua herança para a webradio brasileira. Dois anos após sua fundação, por volta de 2000, havia 191 emissoras brasileiras na web, entre as operadoras do espectro hertziano com presença na internet ou de existência exclusiva na internet. 8 Em http://www.oparanasondasdoradio.ufpa.br/00radiototem.htm. Acesso: 14 abr. 2014. 37 No novo suporte, o rádio viu-se diante de novos elementos e novas possibilidades de interação. Segundo Ferraretto (2010, p. 545), foi somente ao longo da primeira década do século 21 que a convergência se amplia, com a criação de portais de conteúdo na internet, “englobando conteúdos gerados – ou retrabalhados a partir destes – por seus veículos tradicionais de imprensa, rádio e/ ou televisão”. Com o modelo convergente que se construía, integrando serviços sonoros, visuais e escritos, configurava-se um modelo de rádio multimídia. Naturalmente, as características clássicas do rádio sofreram transformações. Embora avaliasse o modelo convergente como algo ainda em fase de construção, Martins enumerou e reavaliou cada uma dessas características: 1. Linguagem Oral: Essa característica deixa de existir, pois a webradio é também textual e imagética; 2. Penetração: Essa característica se expande, pois a webradio tem alcance mundial, podendo ser acessada em todo o planeta; 3. Mobilidade: A webradio ainda se parece com o velho rádio dos anos 40, mas é uma questão apenas de tempo. Com certeza, brevemente o rádio na internet terá a mobilidade que possui hoje o aparelho receptor de ondas hertzianas; 4. Baixo Custo: A webradio ainda é inacessível para boa parte da população, excluída digitalmente. Com o tempo, também se espera que a webradio tenha o baixo custo do receptor tradicional; 5. Imediatismo: Essa característica se mantém na webradio; 6. Instantaneidade: Essa característica ganha novidades na webradio, pois os arquivos, tanto de áudio quanto de vídeo, permitem o acesso posterior do usuário; 7. Sensorialidade: Essa característica permanece apenas com relação ao aspecto sonoro da webradio. No tocante aos recursos textuais e imagéticos, a sensorialidade perde o sentido; 8. Autonomia: A webradio ainda é presa a fios e tomadas, mas o emissor pode falar a toda a sua audiência como se estivesse falando com cada um em particular (2008, p. 54 e 55). Nos anos decorridos desde a publicação da autora, houve muitos avanços no campo das tecnologias disponíveis e da acessibilidade. Em relação à mobilidade, a webradio passou de uma ferramenta atrelada a personal computers ligados a uma rede de internet para um dispositivo cada vez mais acessado via telefone celular. Na atualidade, portanto, a questão da mobilidade já não figura mais como uma 38 desvantagem em relação ao rádio hertziano – desde que o usuário tenha disponível uma rede de internet sem fio. O custo também é outro fator que veio adaptando-se com o decorrer dos anos. Embora o rádio hertziano ainda seja absolutamente mais barato e acessível, vem-se registrando um crescimento no número de pessoas conectadas à internet – e, consequentemente, com acesso ao webradio. Levantamento da Associação Brasileira de Telecomunicações (Telebrasil) registrou 133,7 milhões de acessos à internet em banda larga, em 2013, o que equivale a crescimento de 55% no ano. O aumento foi impulsionado, principalmente, pela banda larga móvel das redes 3G e 4G, responsáveis por 111,4 milhões de conexões. Já na banda larga fixa, os acessos somaram 22,3 milhões no fim de 2013 (EBC, 2014). Também existe a questão da interatividade com o público, que se ampliou com o advento da internet, apesar dos anos necessários para a maturação da ideia de que o ouvinte poderia interferir até mesmo gerando conteúdo radiofônico: A opinião do público, que antes aparecia na forma de enquetes, de telefonemas e até mesmo de cartas, torna-se mais constante, incluindo as já citadas mensagens de e-mails, chat, MSN ou celular. Várias emissoras incentivam a participação da audiência – o chamado ouvinte-repórter – também com informações. Há, ainda, as que colocam questões, disponibilizando números de telefone associados a programas de computador, permitindo mensurar quantos dos que ligarem possuem esta ou aquela posição a respeito de um determinado assunto. Todas estas práticas têm alterado, na contemporaneidade, o conteúdo das irradiações (FERRARETTO, 2010, p. 550). Com tantos elementos novos alterando o modo de fazer e acessar o rádio, naturalmente sua definição não é mais a mesma apresentada no capítulo 2 deste trabalho. Nem as definições do dicionário, nem a definição de Guglielmo Marconi ou Landell de Moura expressam o que é o rádio na atualidade. Dessa forma, Martins (2008, p. 71) sugere uma nova conceituação, com base na agregação de elementos textuais e imagéticos à radiofonia: “Meio de comunicação que transmite informação 39 sonora, invisível, em tempo real. A informação sonora poderá vir acompanhada de textos e imagens, mas estes não serão necessários para a compreensão da transmissão”. Perceba-se que o conceito proposto situa a presença de novos elementos, mas os caracteriza como acessórios da mensagem radiofônica, de forma que o usuário ainda poderá ater-se a outras atividades enquanto escuta sua programação musical ou informativa por meio de aparelhos portáteis e conectados à internet. Além do que, o novo rádio não extingue o antigo – que, em essência, transmite informação sonora, invisível e em tempo real. É importante ressaltar que, delimitando como rádio os elementos citados acima, a autora compreende que formatos de áudio armazenados pelo usuário para uso posterior estão à margem da definição de rádio. Ou seja, para Martins (2008), playlists pessoais ou podcasts não são rádio, mas serviços de arquivamento de áudio tal qual são as fitas cassete, os discos ou CDs. Kischinhevsky (2007) situa a criação do podcast em 2004, tendo-se popularizado a partir do ano seguinte, tornando o próprio ouvinte um potencial emissor de conteúdos digitais. O serviço consiste no download de gravações em formato MP3 para um aparelho portátil, utilizando o formato RSS (Real Simple Syndication), que funciona como um agregador de conteúdo com atualizações automáticas. Em análise, no entanto, Kischinhevsky não exclui esse formato da definição de rádio. Apenas distingue o podcast do rádio comercial online pela ausência de regras. Ainda assim, reconhece que “a despeito do alto grau de liberdade de circulação de formas simbólicas via podcasts, há algum grau de hierarquização [...] nos diretórios, que geralmente operam com classificações de gêneros que remetem ao rádio convencional” (2007, p. 118). Já Ferraretto inclui o podcast nas modalidades possíveis de rádio da atualidade e indica, inclusive, que ele poderia ser melhor explorado pelas emissoras comerciais. Segundo o autor, não se pode ignorar que o rádio não é o mesmo de antes do 40 surgimento e consolidação da internet, em todas as etapas de processo de comunicação. Citando Eduardo Meditsch, Ferraretto (2010, p. 540) resume “que o termo rádio passava a indicar, de modo crescente, uma linguagem específica independente do suporte técnico ao qual se associava”. No caso específico do podcast, de desconsiderarmos o suporte e avaliarmos somente a linguagem, Ferraretto identifica os mesmos aspectos verificados no rádio hertziano: forma determinada e conjugada de manipulação da palavra falada, da música, dos efeitos sonoros e do silêncio. Se o broadcasting corresponde à estratégia mercadológica de difusão e o narrowcasting, expressão mais comum no mercado dos Estados Unidos, à de segmentação, o podcasting e as web radios (sic), tocados por amadores e mesmo por profissionais, passam ao largo em uma espécie de hipersegmentação (FERRARETTO, 2010, p. 548). O território livre da web mostrou-se com grande alternativa para as emissoras que não conseguem obter outorga governamental. O cenário que se desenhou para a webradio é oposta ao que se impôs ao rádio convencional que, desde o seu princípio, foi fortemente regulado pelo Estado nas duas pontas: nos primeiros anos do rádio no Brasil, os usuários precisavam apresentar um atestado de idoneidade para possuir aparelhos domésticos. A indústria radiofônica, por sua vez, sempre dependeu de licenças estatais e, até a década de 1990, esteve à mercê dos interesses políticos. Já na internet, não existem meios de regulamentação ou limitações de conteúdo. Em função disso, o espaço virtual tornou-se atrativo não somente para o surgimento de rádios comerciais online, mas também de emissoras comunitárias “altamente segmentadas ou de conteúdo ideológico específico [...]. Emissoras analógicas que migram para a web, mesmo tendo a concessão, sabem que na internet é possível fazer qualquer tipo de programação sem interferência estatal” (MARTINS, 2008, p. 226). 41 O ambiente virtual desenvolveu-se sem censura, mas a discussão em torno da liberdade de expressão versus as melhores práticas existe desde o advento da internet – que, no Brasil, completará 20 anos em 2015. Nesse período, destacaram-se as tentativas da sociedade civil de regulamentar a atividade online, como o guia publicado pela instituição Repórteres Sem Fronteiras em parceria com a Organização para Segurança e Cooperação na Europa (OSCE): 1. Qualquer lei sobre o fluxo de informação online deve estar ancorada no direito à liberdade de expressão conforme definido no artigo 19 da Declaração Universal dos Direitos Humanos. 2. Em uma sociedade democrática e aberta, é de livre arbítrio dos cidadãos decidir o que pretendem acessar e visualizar na internet. Filtrar ou criar índices de conteúdo online por iniciativa governamental é inaceitável. Filtros só podem ser instalados pelos próprios internautas. 3. Qualquer solicitação para registrar websites com autoridades governamentais não é aceitável. Ao contrário de licenças como frequências de transmissão, uma infraestrutura abundante como a internet não justifica exigência de licenças. 4. Um provedor de serviços técnicos não pode ser responsabilizado pela conduta de hospedagem ou conteúdo, a menos que o site de hospedagem se recuse a obedecer a ordens judiciais. 5. Todo o conteúdo da internet deve estar de acordo com a legislação do país de origem dos arquivos (origem do upload) e não de acordo com a legislação do país onde é feito o download. 6. A internet combina vários tipos de mídia e novas ferramentas de publicação como blogs. Redatores de internet e jornalistas online devem ser protegidos legalmente sobre o princípio básico do direito de livre expressão e direitos complementares de privacidade e sigilo de fonte (MARTINS, 2008, p. 43). No Brasil, é recente a primeira lei que define direitos e deveres dos usuários e provedores da web. Conhecido como Marco Civil da Internet, a lei número 12.965 tramitou na Câmara dos Deputados por quase três anos até ser aprovada pelo Legislativo, em março de 2014, e pelo Senado, em abril do mesmo ano. Em cinco capítulos e 32 artigos, a lei “estabelece princípios, garantias, direitos e deveres para uso da internet no Brasil” (BRASIL, 2014). O Marco Civil da Internet não trata especificamente da produção de conteúdo, tampouco se aprofunda nas questões de direitos autorais. Contudo, prevê a livre iniciativa, a livre concorrência e a defesa do consumidor. Também determina uma série 42 de princípios como a garantia da liberdade de expressão, comunicação e manifestação de pensamento, nos termos da Constituição. No que diz respeito a aspectos técnicos, há incisos que podem colaborar com a qualidade de transmissão do conteúdo radiofônico pela web, como o que determina “a preservação da estabilidade, segurança e funcionalidade da rede, por meio de medidas técnicas compatíveis com os padrões internacionais e pelo estímulo ao uso de boas práticas” (BRASIL, 2014). Outro princípio previsto no Marco Civil da Internet é a questão da Neutralidade da Rede, disposto no Art. 9: O responsável pela transmissão, comutação ou roteamento tem o dever de tratar de forma isonômica quaisquer pacotes de dados, sem distinção por conteúdo, origem e destino, serviço, terminal ou aplicativo, sendo vedada qualquer discriminação ou degradação do tráfego que não decorra de requisitos técnicos necessários à prestação adequada dos serviços, conforme regulamentação (BRASIL, 2014). Conforme o portal da Agência Brasil na internet, esse princípio diz que a rede deve ser igual para todos, devendo o usuário pagar apenas pela velocidade contratada, não podendo haver sanções de acordo com o tipo de conteúdo acessado. O portal de notícias G1 complementa que a neutralidade de rede não impede a oferta de pacotes com velocidade diferenciada, mas “pressupõe que os provedores não podem ofertar conexões diferenciadas, por exemplo, para acesso somente a e-mails, vídeos ou redes sociais” (G1, 2014). Ainda de acordo com informações coletadas no portal G1, o princípio da Neutralidade será regulamentado pelo Executivo, com a previsão de sua aplicação e exceções, após consulta feita à Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) e o Comitê Gestor da Internet (CGI). 4 A DIGITALIZAÇÃO DO RÁDIO Na era da convergência, tudo acontece ao mesmo tempo, em plataformas interligadas e que se acessam ao simples clique de um botão. A internet foi a principal catalizadora desse fenômeno, incorporando todos os demais meios de comunicação e inserindo-os em uma comunicação em rede. Porém, convergência não se limita à presença na web, mas também aos dispositivos móveis. Ou, como situa Del Bianco (2012, p. 16), é um fenômeno caracterizado “por um sistema de informação em rede, formado pela conjunção da informática, telecomunicações, optoeletrônica, computadores e que incluiu dispositivos móveis e meios tradicionais de comunicação”. A convergência pressupõe mudanças na forma de fazer, de transmitir e receber a comunicação. Conforme Del Bianco (2012), não basta que se altere o modelo de produção, marketing, venda e distribuição dos serviços de informação e comunicação. É preciso disponibilizar as mesmas informações através de diferentes plataformas de rede e em formato de texto, vídeo e som. Ou seja, “decorre também em alterar a lógica como operam as indústrias midiáticas, ou seja, na forma como processam a informação e o entretenimento para o público desses meios” (2010, p. 558). A autora exemplifica: A evolução da tecnologia tem ampliado radicalmente todos os meios de comunicação frente às opções à disposição dos consumidores, incluindo o centenário meio rádio. No passado, o rádio era limitado ao que estava disponível nas frequências AM e FM. Hoje as possibilidades de escuta se estenderam com as plataformas digitais: internet, players de MP3, celulares, satélite e rádio digital. Situação que levou o instituto americano de pesquisa Arbitron denominar de “rádio sem limites”. As próprias operadoras de televisão por assinatura a cabo ou por satélite anteciparam a demanda, oferecendo canais de áudio variados. Atualmente, operadoras como a Claro TV e Sky retransmitem a programação de dezenas de emissoras de rádio do país e oferecem, também, outros canais musicais próprios, segmentados por estilo 44 musical e sem intervalos comerciais. A NET, por sua vez, disponibiliza um único canal de música, mas oferece em seu portal na internet a opção de gravar a programação para audição posterior. Enquanto isso, o rádio analógico amargura dias de declínio. Concebido no final do século XIX e aperfeiçoado com a invenção do transistor e transmissão em frequência modulada, ele teve seu ápice no Brasil até a chegada da televisão. Depois, adaptou-se à concorrência com o aparelho que emitia som e imagem e sobreviveu nas décadas seguintes oferecendo música, jornalismo e variedades ao ouvinte. Atualmente, apenas aguarda os novos horizontes que a digitalização poderá oferecer. A implantação de um novo modelo ocorrerá num momento em que o rádio convencional perde espaço na vida dos brasileiros. Kischinhevsky compara o momento atual do rádio ao processo de declínio enfrentado pelo disco de vinil nos anos de 1980, quando a indústria fonográfica se preparava para lançar no mercado um aparato de tamanho reduzido e qualidade de áudio indiscutivelmente superior: o compact disc (CD). Não havendo possibilidade de resistência, os velhos long plays tornaram-se item de colecionador. Da mesma forma, as novas tecnologias digitais sentenciam o rádio hertziano de uma forma ainda não conhecida e, embora ainda não se saiba qual padrão o sucederá, “seu fim já vem sendo acertado” (2007, p.15). De acordo com o Censo Demográfico 2010, o rádio está perdendo cada vez mais espaço nos lares brasileiros, onde se sobressai o número de aparelhos de televisão, além de uma elevação gradual no número de computadores. Entre 2000 e 2010, a parcela das 57,3 milhões de residências brasileiras que possuem computador aumentou de 10,6% para 38,3%. Também aumentou a presença de televisores (existentes em 95% dos lares), geladeiras (93,7%) e máquinas de lavar roupas (47,2%). Já a percentagem de lares que possuem rádio diminuiu de 87,9% para 81,4%, como mostra a Tabela 1. 45 Para entendimento desses resultados, cabe pontuar que o Censo considera como rádio apenas os aparelhos convencionais, inclusive a pilha. Não inclui, portanto, rádios integrados a telefone celular ou MP3 player, por exemplo. TABELA 1 - BENS DURÁVEIS, SEGUNDO AS GRANDES REGIÕES E AS UNIDADES DA FEDERAÇÃO – 2010 46 Ao mesmo tempo, a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios realizada em 2011, e publicada em 2013, reforçou que o número de internautas no país e o número de celulares vem crescendo progressivamente, inclusive entre pessoas com mais de 50 anos de idade. O estudo investigou, entre outros aspectos, o acesso à internet. Perguntou-se para todos os moradores entrevistados com 10 anos ou mais de idade, com base na data da entrevista, se tinham acessado a Internet nos últimos três meses em qualquer local. Os resultados da pesquisa mostram que, em 2011, 77,7 milhões de pessoas de 10 anos ou mais de idade acessaram a internet no período determinado – representando 46,5%. Dois anos antes, na mesma pesquisa, o número de internautas equivalia a 41,6% da população-alvo. Nos anos de 2008 e 2005, esses totais foram estimados em 34,7% e 20,9% da população-alvo, respectivamente. A título de contextualização, de 2005 para 2011, a população em idade ativa com mais de 10 anos cresceu 9,7%, enquanto o contingente de pessoas que utilizaram a Internet aumentou 143,8%. Ou seja, de acordo com o PNAD, em seis anos o número de internautas no país cresceu 45,8 milhões. Em relação a faixas etárias, de 2005 para 2008, o aumento da proporção de pessoas que acessaram a Internet foi maior entre pessoas de 10 a 24 anos. No período de 2008 para 2011, foi maior entre pessoas de 25 a 39 anos de idade. Já o percentual de pessoas com mais de 50 anos, que acessavam a Internet, passou de 7,3%, em 2005, para 18,4%, em 2011. A digitalização do rádio é a transmissão de dados na forma de bits e bytes – ou seja, combinações binárias em substituição às ondas eletromagnéticas. A principal diferença entre o modelo analógico e o digital é a qualidade de som, além da possibilidade de transmissão de outros dados simultaneamente. MARTINS (2008) considera esta a grande mudança acarretada pela digitalização: novos tipos de serviço que podem ser prestados oferecem novas possibilidades de interação com o ouvinte, por meio da transmissão de imagens, mapas, gráficos e textos. 47 Del Bianco (2004, p. 2) reforça que esta pode ser a mudança mais radical experimentada pelo rádio desde a invenção do transistor e da Frequência Modulada. A digitalização “abre as portas para o rádio integrar-se ao processo de convergência entre as telecomunicações, os meios de comunicação de massa e a informática que está dando origem a um novo sistema de comunicação em rede identificado por seu alcance global”. Para a autora, a distribuição de áudio digital é uma estratégia de revitalização e também um meio de garantir a sobrevivência do rádio diante de tantas outras mídias. A discussão sobre a digitalização do rádio iniciou-se mundialmente em 1996 – quando, durante a Feira Industrial de Hannover, apresentou-se o protótipo de radiodifusão digital portátil pertencente ao consórcio Digital Audio Broadcasting (DAB). Para Kischinhevsky (2007), essa foi a primeira possibilidade real de substituição das interferências que ocorrem no rádio analógico por um som digital, semelhante ao de um CD. Embora tenha sido levado a público em 1996, o autor situa que o sistema vinha sendo testado desde 1980 e havia sido adotado de forma experimental em 1995 pela BBC de Londres. Depois dele, surgiram outros modelos e aperfeiçoamentos, cada qual com suas características de operação e suas limitações. Abaixo, serão detalhadas as particularidades de cada opção atualmente oferecida ao modelo analógico para a melhor compreensão das dificuldades que levam o Brasil a não ter, até hoje, definido qual deles implantar no país. 4.1 DAB – DIGITAL AUDIO BROADCASTING O padrão europeu foi o primeiro a ser colocado em operação, na BBC de Londres. Foi desenvolvido por um consórcio de empresas coordenado pela União Europeia de Radiodifusão. É empregado apenas para transmissões em FM e deu 48 origem, nos anos seguintes, a outras variações, como uma versão que opera via satélite, a DSR (Digital Sattelite Radio). Conforme Del Bianco (2004, p. 3), cada transmissor possui seis canais de programa. Seis estações diferentes partilham o mesmo transmissor, antena, faixa de frequências e, consequentemente, a mesma área de cobertura de sinal. Com emissoras partilhando da mesma frequência e transmissor, os custos de transmissão caem, “sem contar que o DAB favorece a formação de rede e cobertura nacional, regional, local e até internacional”. Por outro lado, é alto o preço dos aparelhos receptores: entre US$ 800 e US$ 1.800. Além disso, o DAB é um sistema out-of-band. Ou seja, exige uma faixa de frequência exclusiva, pois não funciona simultaneamente com as emissoras analógicas. Também é considerado um problema o fato de que a difusão é feita por um transmissor multiplex, gerenciado por um operador de rede que pode ser privado. Ou seja, “não haveria como garantir diferencial técnico quando o transmissor não é propriedade das emissoras e sim de uma entidade independente, uma provedora de meios de transmissão” (DEL BIANCO, 2004, p. 4). Com o passar dos anos, porém, o DAB não conquistou a popularidade desejada, alcançando níveis distintos de aceitação nos diferentes países da Europa e Ásia em que foi implantado: Na Suécia, o governo cessou os investimentos na tecnologia DAB, depois de gastar mais de 100 milhões de coroas suecas (aproximadamente 33 milhões de reais nos dias atuais); Na Alemanha, transmite-se em DAB desde 1999 e já existem 80 rádios transmitindo para 500 mil receptores. Ainda assim, o número representa somente 1% dos receptores ativos de rádio do país; A Espanha, o rádio digital opera desde 1999, quando o governo distribuiu licenças para grupos sem tradição no segmento, no intuito de 49 reestruturar o setor. Contudo, não houve apoio ao barateamento dos aparelhos e, com isso, a meta de se atingir 80% da população em 2006, prorrogada para 2011, não foi alcançada. A Inglaterra, com uma programação diversificada para o rádio digital, teve os melhores resultados com a implantação do DAB. Ainda assim, em 2008, a penetração equivalia a um quinto da audiência. De acordo com Nair Prata, “em relatório divulgado em 2008, a Digital Radio Working Group recomendou ao governo criar critérios e condições que possam ser cumpridos pelas emissoras britânicas de modo a permitir o apagão do analógico até 2020”. De acordo com o portal www.worlddab.org, a ramificação do DAB em outros padrões ocorreu por questões técnicas. Quando o DAB original (Digital Audio Broadcasting) foi desenvolvido, no final de 1980, era baseado em MPEG Audio Layer II (MP2), o que ainda é utilizado na radiodifusão atualmente. Com o passar dos anos, porém, surgiram novos padrões de compressão, como o MP3, mais utilizado atualmente, e o MP4, também denominado Advanced Audio Coding (AAC). A integração do AAC no sistema DAB permitiu maior eficiência, ou seja, a mesma qualidade de áudio em taxas de bits mais baixas. Nasceu, assim, o DAB+. Outra inovação importante foi a adição de recursos de vídeo, permitindo ao DAB evoluir para uma plataforma de televisão móvel digital e rádio digital multimídia, com o lançamento do DMB (Digital Multimedia Broadcasting)9. Atualmente, o portal WorldDAB indica o uso do padrão DAB+ para novos mercados, por fornecer o sistema de compressão de áudio mais eficiente. Com isso, cada estação de rádio usa menos do multiplex, potencialmente resultando em menores custos de transmissão e mais espaço em cada canal. 9 De qualquer modo, o portal WorldDAB afirma que, tanto para DMB quanto DAB+, a base técnica permanece DAB. Em outras palavras, a camada física é ainda a mesma, apenas há novas aplicações, novos protocolos de transporte e uma camada de controle de erro de codificação foram adicionados. Todas as três tecnologias, portanto, podem ser utilizadas no mesmo aparelho. 50 Mesmo assim, Del Bianco (2012) relata críticas à qualidade do som do padrão DAB – o que ocorre, segundo especialistas, como consequência da divisão excessiva de estações dentro de uma mesma frequência. É sabido que cada espectro comporta até seis emissoras, porém, elas dividem os bits. Na prática, conforme relata a autora, as empresas “utilizam uma taxa de bits em níveis demasiado baixos para se atingir a qualidade desejável”. Ademais, a própria existência de inúmeras ramificações do DAB cria outras dificuldades: O problema do DAB atual é a falta de unificação dos padrões disponíveis. Além do tradicional, há o DAB + (permite maior eficiência com menos bits) e o multimídia DMB (Digital Multimedia Broadcasting) uma plataforma de áudio e televisão digital móvel. Em todo mundo existem mais de um mil diferentes receptores de DAB, 190 de DMB. Os receptores de DAB + receptores são mais recentes no mercado (2010, p.564). 4.2 IBOC – IN BAND ON CHANNEL O padrão de rádio digital dos Estados Unidos, desenvolvido pelo consórcio iBiquity Digital, recebeu o nome comercial de High Definition Radio (HD Radio). Ao contrário do padrão europeu, é um in band – ou seja, permite a transmissão simultânea nas mesmas frequências utilizadas atualmente no AM e FM. Kischinhevsky ressalta que a promessa do modelo era equiparar a qualidade do som de Ondas Médias ao da Frequência Modulada e a do FM a de um CD. Segundo o autor, “dados e voz são veiculados nos mesmos canais e faixas das estações analógicas10” (2007, p. 110). 10 O portal da HD Radio na internet, www.hdradio.com, explica aos usuários seu funcionamento na prática: “Vamos dizer que sua estação de rádio local favorito é em 96.9FM. Com a tecnologia HD Radio, a mesma estação está sendo transmitida em som digital em 96,9 HD1. Além disso, você pode acessar todo conteúdo novo em até três estações adicionais: 96,9 HD2, HD3, e HD4” (tradução nossa). 51 Por essas características, aliadas à possibilidade de transmissão simultânea de áudio e dados, Martins (2008, p. 59) considera que o padrão permite “às emissoras se digitalizarem com um processo rápido e simples de migração”. Del Bianco (2004, p. 04) completa: “trata-se de um sistema híbrido que facilitará a transição entre essas tecnologias até a substituição total dos atuais aparelhos pelos digitais”. Em outro artigo, a mesma autora pontua ainda que “é possível utilizar a infraestrutura existente, desde torres e transmissores, sendo necessário adquirir novo excitador de radiodifusão digital e alguns equipamentos e periféricos” (2012, p. 566). Se o DAB enfrentou, na Europa, problemas pelo alto custo dos aparelhos receptores e pela baixa qualidade do som emitido, o IBOC teve outros problemas em sua fase de testes, conforme Del Bianco (2004). Inicialmente, o sinal digital interferia nas transmissões analógicas, mas esse problema foi resolvido pelo consórcio com a redução da taxa de compressão do áudio digital e, “diante da comprovação de que os problemas técnicos foram superados, o sistema IBOC foi aprovado em 2002 pela FCC (Federal Communications Commission), órgão regulador da radiodifusão nos Estados Unidos” (2004, p. 04). O HD Radio está em funcionamento desde 2003 nos Estados Unidos. Sem necessidade de conexão com a internet ou taxa mensal, o padrão IBOC é encontrado em aparelhos domésticos, portáteis e já está sendo instalado na linha de montagem em mais de 170 modelos de 34 montadoras11. Os aparelhos fornecem informações na tela, como a arte de um álbum, informações sobre a música, o tráfego e condições meteorológicas. Assim como o DAB, o IBOC também enfrentou dificuldades de aceitação pelo público, ocasionadas por dois fatores principais, segundo Del Bianco. Inicialmente, a necessidade de trocar o aparelho por outro considerado caro não agradou aos usuários. Por volta de 2008, o mais barato custava 80 dólares. Além disso, faltavam atrativos no conteúdo, considerando que “apenas metade das estações oferecem mais de duas ou 11 Esses dados e os apresentados no parágrafo seguinte foram coletados no portal www.hdradio.com em 25 de abril de 2014 (tradução nossa). 52 três programações diferentes no mesmo canal digital que, muitas vezes, não é diferente das frequências analógicas” (2012, p. 567). Em artigo de agosto de 2013, publicado no portal do consórcio iBiquity, o presidente e CEO Bob Struble comparou as dificuldades do HD Radio à eterna pergunta sobre quem nasceu primeiro: o ovo ou a galinha. O executivo pontua que as emissoras estão relutantes em investir na criação de novos conteúdos antes que haja um número significativo de receptores no mercado. Ao mesmo tempo, “os fabricantes não investirão em novos aparelhos até que haja conteúdo para apoiá-los” (tradução nossa). Ainda no mesmo artigo, Bob Struble explica os fatores que impulsionaram as vendas de HD Radio, que passaram de 3,3 milhões de unidades, em 2012, para 5,4 milhões, em 2013: De 2010 a 2013, o que vemos é 50% de crescimento anual, a maior parte impulsionado pela captação automotiva: quase 30% dos carros novos serão lançados com receptores de HD Radio em 2013 e, no próximo ano, não haverá uma concessionária de automóveis nos Estados Unidos que não tenham modelos equipados com HD Radio. Prevemos resultados semelhantes para os próximos anos [...]. Com cerca de 15 milhões de receptores de HD Radio vendidos até agora, nós ainda precisamos de mais alguns ovos para nos tornarmos mercado totalmente em massa e para as emissoras rentabilizarem totalmente seus investimentos. Em relação às falhas técnicas detectadas no passado, como os sistemas analógico e digital ainda funcionam simultaneamente, se o HD Radio perde o sinal digital da emissora, o aparelho irá alternar automaticamente para a transmissão em sinal analógico na mesma frequência. Quando o sintonizador alcança novamente o sinal digital, ele retoma a transmissão. No que diz respeito ao preço dos receptores, atualmente variam de US$ 49,99, para versões portáteis mais simples, até US$ 7.000, para modernos aparatos para home theather com Blu-ray, toca-discos e outros dispositivos de entretenimento. Existem, ainda, versões com GPS integrado (HD RADIO, 2014, tradução nossa). 53 4.3 DRM – DIGITAL RADIO MONDIALE O modelo europeu DRM (Digital Radio Mondiale) surgiu em 1997, como uma alternativa às limitações do DAB, que funciona como um sistema out-of-band, exigindo frequências exclusivas para transmissão, além de digitalizar somente estações de FM. Segundo o portal do DRM na internet, ele foi projetado para ser “um substituto digital de alta qualidade para a transmissão de rádio analógica atual em bandas AM e FM / VHF, e, como tal, pode ser operado com a mesma canalização e alocações de espectro como atualmente empregados” (DRM, 2014, tradução nossa). Ainda segundo informações do portal, o Consórcio DRM é uma organização internacional sem fins lucrativos, composta por empresas de radiodifusão, fornecedores, fabricantes de equipamentos, universidades, sindicatos da radiodifusão e institutos de pesquisa. Atualmente, conta com 93 membros e 90 apoiadores de 39 países ativos. Inicialmente, seu objetivo era a digitalização das bandas de radiodifusão AM até 30MHz (longa, média e onda curta). Acompanhando o sistema dos Estados Unidos, o DRM atua in band, sem a necessidade de atribuir novas frequências e mantendo o status das atuais emissoras. Del Bianco (2012) aponta, ainda, que se trata do único sistema digital aberto do mundo para ondas AM (curtas, médias e longas), que cobre transmissões para bandas abaixo de 30MHz. Segundo a autora, “a versão do DRM para o AM tem sido apresentada como um sistema mais robusto, com som equivalente à qualidade de CD, além de permitir redução significativa no uso da potência dos transmissores” (2012, p.568). 54 O DRM, tal qual o seu antecessor na Europa, ganhou uma versão DRM+, lançada em 200512. O sistema utiliza a mesma codificação de áudio, serviços de dados, multiplexagem e esquemas de sinalização que o standard DRM para as ondas curta, média e longa até 30 MHz, mas opera em frequências mais elevadas entre 30 e 174 MHz, incluindo as bandas de broadcast I e II. O padrão DRM+ apresenta vantagens sobre a FM convencional, porque utiliza menor potência de transmissão para uma igual cobertura; abre novas possibilidades de áudio como o suporte surround, aumentando a eficiência do espectro e a oferta de serviços de dados, a exemplo de guia de programação e informação adicional (2012, p. 568). Conforme Del Bianco (2012), a evolução desse padrão tem sido vista como alternativa para as emissoras europeias que resistem em adotar o DAB por razões como “a área de cobertura, custos e o desejo de permanecer no controle de suas operações de transmissão sem terceirização”. 4.4 ISDB-TSB – INTEGRATED SERVICES DIGITAL BROADCASTING, TERRESTRIAL, SEGMENTED BAND A concepção tecnológica do sistema japonês faz parte do ISDB, o sistema de televisão digital do Japão. Barbosa Filho (2005, p.145) elenca que ele é flexível e apresenta características que lhe permitem a recepção móvel de áudio e dados, “sendo considerado o mais robusto entre os sistemas em operação no mundo”. Martins (2008, p.59) complementa que o sistema é considerado uma convergência tecnológica de 12 O padrão DRM acabou sendo dividido em dois grupos, como enumerado em seu portal na internet: o DRM30, especificamente para utilizar as bandas de radiodifusão AM abaixo de 30MHz, e o DRM+, que utiliza o espectro de 30MHz para VHF Banda III, centrado na banda de transmissão em FM II. 55 rádio com televisão digital, pois, “diferentemente dos demais, permite o rádio no mesmo canal de TV digital”. Porém, ele permanece em uso apenas no Japão. 4.5 HORA DE DEFINIR O SISTEMA A escolha do modelo de transmissão digital a ser adotado no Brasil é uma prerrogativa do Estado, por meio do Ministério das Comunicações. Em setembro de 2005, respondendo a manifestações dos radiodifusores junto ao Ministério das Comunicações, a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) expediu as primeiras autorizações permitindo o início das operações em caráter digital para fins científicos ou experimentais. Entretanto, nessa discussão há outros fatores que pesam tanto ou mais do que os prós e contras de cada modelo em estudo. Del Bianco (2012) traça os dois movimentos opostos que se originaram com o processo de digitalização no Brasil: De um lado os empresários manifestam suas preferências, antecipando-se a qualquer possibilidade de debate público sobre a questão; e de outro, setores da sociedade civil pressionando o Ministério das Comunicações para que estabeleça parâmetros de adoção de um padrão técnico de digitalização que contemple a diversidade de exploração e financiamento do sistema de radiodifusão. Esses segmentos entendem que adoção de uma tecnologia não pode ser fator de aprofundamento de diferenças de padrões técnicos, de produção e financiamento de emissoras, ou mesmo de exclusão de modelos de exploração com finalidade educativa, cultural, institucional e comunitária (2012, p. 569). Desde o princípio, o padrão IBOC foi o eleito pela Associação Brasileira de Rádio e Televisão (Abert), que vem debatendo o tema da digitalização do rádio desde 1991. Del Bianco situa que, precisamente, desde 1998, a entidade incluiu o assunto em 56 seu congresso nacional anual e que nos anos seguintes buscou entender as particularidades de cada um entre os padrões disponíveis. Ainda em 1998, a Deutsche Telekon, empresa de equipamentos de radiodifusão alemã, apresentou a membros da entidade o sistema europeu. Na época, o DAB lhes foi apresentado por meio de “um protótipo nas modalidades de recepção fixa e móvel” (DEL BIANCO, 2004, p.05). Dois anos depois, estiveram presentes em um seminário técnico representantes da Ibiquity, que defendem o IBOC, e da Dibeg, responsáveis pela divulgação do ISDB-Tn. Tendo em mãos o material dos três modelos, a Abert organizou, em 2001, um grupo técnico para estudar a implantação do rádio digital no Brasil. Logo, a entidade divulgaria a escolha que reflete o posicionamento dos radiodifusores brasileiros: Pelas manifestações de técnicos da Abert publicadas em várias edições do jornal da entidade, é forte a preferência pelo IBOC e por várias razões. Primeiro: porque sua implantação não implicará em atribuir novas faixas para transmissão digital, o que garante a posição conquistada historicamente pelos donos das emissoras além de preservar a base de ouvintes associada àquele dial. Segundo: porque as emissoras teriam de fazer baixos investimentos para aderir ao sistema, considerando que o processo de produção radiofônica atualmente está praticamente digitalizado. Acredita-se que não seria necessário trocar torres e nem mudar os locais de transmissão, embora algumas emissoras precisarão de um novo excitador de radiodifusão digital e alguns equipamentos periféricos. Terceiro: o novo sistema provê uma fonte adicional de renda com a comercialização de serviços de datacasting (DEL BIANCO, 2004, p.6). Na primeira audiência pública sobre a Implantação do Rádio Digital no Brasil, realizada no Senado Federal em agosto de 2006, o então Superintendente de Serviços de Comunicação de Massa da Anatel, Yapir Marotta, apresentou a radiodifusores e senadores os modelos em avaliação e as primeiras emissoras a receberem autorizações de testes. Conforme apresentado pela Anatel no Congresso de Tecnologia de Rádio, Televisão e Telecomunicações, foram avaliados os padrões que apresentavam 57 conformidade com as recomendações da União Internacional de Telecomunicações (UIT). Eram eles: Digital Audio Broadcasting (DAB); Integrated Services Digital Broadcasting -Terrestrial Sound Broadcasting (ISDB-TSB); HD Radio (OM IBOC e FM IBOC) e Digital Radio Mondiale (DRM). A escolha dos modelos a serem testados no país deu-se em decorrência dos apontamentos feitos pelos radiodifusores. Desde o início do processo, as entidades representativas do setor indicaram desejar a digitalização em mesma frequência; a transmissão simulcast para manter o sistema analógico enquanto o digital se consolida; e a redução dos custos na implantação do sistema digital, com a possibilidade de se usar a infraestrutura existente. Determinou-se, então, que os dois padrões que entrariam em fase de testes no Brasil eram o IBOC OM/FM e o DRM em OM. Conforme os dados de agosto de 2006, foram concedidas 20 autorizações: 10 para testes em FM com o padrão IBOC; oito para testes em emissoras de Ondas Médias com padrão IBOC; e duas para testes com o padrão DRM, que não contempla a faixa de FM. Nem todas as emissoras conseguiram realizar os testes e, entre aquelas que o fizeram, nenhuma havia entregado o relatório final no prazo determinado de 12 meses, sendo que apenas parte delas encaminhou ao Ministério das Comunicações requerimento de prorrogação. Os testes, que deveriam ter sido encerrados entre 2007 e 2008, deveriam englobar algumas avaliações pretendidas pela Anatel, envolvendo o desempenho do sistema digital e sua compatibilidade com o sistema analógico. Isso porque, desde seus primeiros estudos, a Anatel já alertava os radiodifusores sobre a necessidade de se avaliar as consequências da transmissão simultânea. Segundo a agência, as condições técnicas existentes deveriam ser minuciosamente analisadas, pois a “a transmissão simultânea analógico-digital, por ocupar os canais adjacentes, poderá provocar reflexos na canalização distribuída pelos Planos Básicos” (ANATEL, 2006). Dessa forma, os testes deveriam apontar o nível de robustez quanto a perturbações provocadas por ruídos radioelétricos, a interferências de outras transmissões e a multipercursos; a extensão da área de cobertura; a qualidade do 58 áudio digital e se poderiam ocorrer interferências provocadas pelo sinal digital nas transmissões analógicas existentes, incluindo a da própria estação. O que ocorreu é que as informações fornecidas até então não atendiam aos critérios estipulados, especialmente no que tange à compatibilidade do sistema digital com os canais distribuídos pelos Planos Básicos. Ademais, a Anatel concluiu que “o aproveitamento da infraestrutura existente não oferece as condições favoráveis de linearidade para a transmissão digital, retardando o cronograma de testes e suscitando pedidos de prorrogação” (ANATEL, 2006). A inconsistência dos primeiros testes levou a Anatel a criar uma metodologia, padronizando critérios e procedimentos compatíveis com as condições brasileiras. Firmou-se, em 2008, parceria com a Abert para a repetição de novos testes e medições, de modo a reunir resultados mais representativos do que aqueles obtidos individualmente. Esses testes foram realizados com apoio da Universidade Presbiteriana Mackenzie, de São Paulo, que orientou cientificamente os trabalhos. De acordo com o relatório apresentado em dezembro de 2008, os testes não envolveram a comparação entre sistemas. Dez emissoras de OM e dez de FM foram autorizadas a executar o Serviço Especial para Fins Científicos e Experimentais para realizar avaliações. Todas as estações autorizadas implementaram o HD Radio, nas versões disponíveis para OM e FM. Ao final do processo, as conclusões da nova bateria de testes foram divididas em três campos, conforme detalhado abaixo (ANATEL, 2008): a) Sobre padrão IBOC – “In-Band On-Channel”: É o mais adequado para a digitalização das estações brasileiras de OM e É o que proporciona a transição de tecnologia com o menor impacto, tanto FM; para as emissoras quanto para o público em geral, já que a emissora opera no seu próprio canal; o ouvinte pode continuar a sintonizar sua rádio no sistema analógico por 59 algum tempo em função das transmissões híbridas; cada radiodifusor poderá iniciar a transição de acordo com sua disponibilidade e estratégia. b) Sobre o sistema HD Radio: Dispõe de uma versão para a faixa de OM e uma versão para a faixa de No atual estágio de desenvolvimento tecnológico, melhora o desempenho FM; com relação à modulação analógica, mas na faixa de OM ainda demanda melhorias na robustez; Mesmo já tendo sido adotado oficialmente em seu país de origem, continua em processo de evolução e deverá desenvolver versões mais robustas, mais imunes ao ruído urbano, crescente nos grandes centros; Na versão para FM, apresenta um bom desempenho em baixa potência, inclusive nos níveis de potência aplicáveis às Rádios Comunitárias; Não foram observadas interferências nos casos testados; Foi considerada uma opção para o padrão de rádio digital a ser adotado no Brasil e, no presente momento, é a única alternativa em situação operacional. c) Quanto ao processo de digitalização das estações: A digitalização das estações de OM e FM é uma necessidade real diante do aparecimento das novas tecnologias competidoras na distribuição de conteúdo, assim como dos crescentes desafios à qualidade de recepção analógica e do fato de que somente o Rádio ainda é analógico; É necessário que se promova um conhecimento mais aprofundado e estruturado da tecnologia; 60 É necessário promover a qualificação de profissionais; É necessário que haja um estreito acompanhamento dos constantes avanços da tecnologia que permitam melhorar o desempenho do sistema; É importante a continuidade da operação das emissoras com os sistemas híbridos instalados e, ainda que sejam permitidas novas autorizações aos radiodifusores interessados em promover o treinamento dos profissionais envolvidos, possibilitar a pesquisa e a geração de novos conteúdos, estimular inovações na linguagem da radiodifusão, bem como permitir a implementação e avaliação imediata das novas versões desenvolvidas. Apesar de as conclusões do documento apontarem claramente para a adoção do IBOC no Brasil, falhas técnicas pesaram contra o modelo. Del Bianco (2012, p.570) relata que o relatório menciona sérios problemas de propagação do IBOC e que “o digital não proporciona a mesma cobertura do rádio AM analógico com qualidade”. Dessa forma, em vez de autorizar a implantação do HD Radio no país, em fevereiro de 2010, o ministro das Comunicações da época, Hélio Costa, recuou e determinou que fossem realizados testes também com a tecnologia DRM. Ao mesmo tempo, em 31 de março de 2010, foi publicada uma portaria no Diário Oficial da União criando o Sistema Brasileiro de Rádio Digital. A lei, que contém apenas quatro artigos, teve sua criação às vésperas da saída do ministro Hélio Costa do governo, deixando registrados os objetivos a serem alcançados com a digitalização, independente do modelo a ser escolhido. A principal finalidade é garantir a operação eficiente da radiodifusão sonora tanto em Ondas Médias (OM) quanto em Frequência Modulada (FM). Entre outras finalidades, a lei prevê que a transferência de tecnologia de transmissores e receptores para a indústria brasileira seja livre de royalties, sempre que possível. Fica determinado, ainda, que o modelo eleito possibilite “a emissão de simulcasting, com boa qualidade de áudio e com mínimas interferências em outras estações” (BRASIL, 2010, grifo nosso). 61 A decisão do então ministro Hélio Costa levou a um chamamento público, com edital publicado em 13 de junho de 2011, convidando sistemas de rádio digital a se candidatarem a testes no Brasil. Apresentaram-se para a bateria de testes o DRM e HD Radio e os relatórios foram sistematizados pelo Inmetro. Foram testadas emissoras de várias classes e potências, em diferentes cidades do Brasil. A necessidade de análise e interpretação dos seus resultados dos testes levou à criação do Conselho Consultivo do Rádio Digital, por meio da Portaria número 365/2012. Com o objetivo de “assessorar o Ministro de Estado das Comunicações na implantação do Rádio Digital no Brasil” (MINISTÉRIO DAS COMUNICAÇÕES, 2012), o grupo conta com 19 conselheiros, sendo sete representantes de órgãos/entidades públicos, dois parlamentares, sete entidades representativas do setor de radiodifusão e três do setor industrial. O conselho discute os serviços e aplicativos a serem agregados ao áudio transmitido; a política industrial para a produção de equipamentos; a gestão do espectro; a transmissão simultânea dos sinais analógico e digital; e a escolha do padrão tecnológico de rádio digital no Brasil. De acordo com informações do portal da Abert na internet, a discussão da digitalização do rádio continua no Conselho Consultivo de Rádio Digital. A entidade acredita que as questões técnicas envolvendo a determinação da relação de potência entre a transmissão analógica e digital sejam definidas até o fim 2014. Contudo, a Abert espera não somente a definição de um padrão digital para a radiodifusão, mas que evoluam também as discussões envolvendo o modelo de negócios e serviços para o rádio digital além de uma a política industrial positiva com a massificação de receptores digitais. “Infelizmente, não há como prever o resultado final das discussões nem quando elas terminarão, pois a questão principal é a viabilização da digitalização do rádio e não apenas a determinação de um padrão tecnológico de rádio digital” (ABERT, 2014). 62 4.6 MIGRAÇÃO DO AM PARA O FM Enquanto permanece indefinido o modelo de radiodifusão digital a ser adotado no país e os detalhes técnicos e mercadológicos do processo, a presidente do Brasil, Dilma Rousseff, decidiu atender a uma antiga reivindicação dos radiodifusores brasileiros, autorizando, no dia 07 de novembro de 2013, a migração das emissoras AM para FM. O decreto presidencial, de número 8.139, dispõe sobre as condições para extinção do serviço de radiodifusão sonora em Ondas Médias de caráter local e sobre a adaptação das outorgas vigentes para execução desse serviço. A proposta foi encaminhada ao Governo Federal pela Abert, com respaldo das entidades estaduais, em virtude das dificuldades enfrentadas pela faixa AM por causa das interferências no sinal. De acordo com o decreto, as emissoras interessadas deverão apresentar requerimento ao Ministério das Comunicações solicitando a adaptação de suas outorgas no prazo máximo de um ano. As emissoras que tiverem o pedido deferido terão que devolver à União os canais utilizados para a execução do serviço de radiodifusão sonora em ondas médias. Contudo, o Ministério das Comunicações poderá autorizar, por um prazo de até cinco anos, a transmissão simultânea do sinal da entidade em ondas médias e frequência modulada a título de adaptação. Segundo o Portal Brasil, site oficial do Governo Federal, a estimativa da Abert é que 90% das 1.78413 emissoras AM passarão a operar na faixa FM. A publicação afirma que, “nesta frequência, as rádios ganharão qualidade de áudio e de conteúdo, competitividade e poderão ser acessadas por meio de telefones celulares” (PORTAL BRASIL, 2014). 13 Em outra notícia, disponível no link http://www.brasil.gov.br/governo/2013/11/as-radios-am-sao-umverdadeiro-patrimonio-do-brasil-afirma-dilma, o número de rádios AM do Brasil aparece como 1.772. De acordo com informação fornecidas por e-mail pela assessoria de imprensa da Abert, o número oficial é 1.784 rádios AM (número de 2013). 63 A mudança resultará em custos para as emissoras, no que tange à diferença no valor de outorga14 e aos equipamentos de transmissão. Mesmo assim, o processo deve ocorrer em curto prazo. Conforme o Governo Federal, “a expectativa é que, a partir de agosto, sejam anunciadas as primeiras emissoras autorizadas a fazer a migração, e, até o fim do ano, algumas estações comecem a operar na nova faixa” (BRASIL, 2014). De fato, quatro meses após o anúncio feito pela presidente Dilma Rousseff, estavam definidas as regras para a migração das emissoras AM para a faixa FM. A portaria publicada no Diário Oficial da União no dia 13 de março de 2014 regulamentou o decreto assinado em dezembro e definiu como os radiodifusores deverão proceder para pedir a mudança da frequência. O texto também esclareceu a forma como os processos serão analisados pelo Ministério das Comunicações e pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel). De acordo com a publicação, o pedido de migração deve ser realizado por meio de formulário em sessões públicas, promovidas pela Secretaria de Serviços de Comunicação Eletrônica, realizadas especialmente para essa finalidade. As audiências encerraram no dia 09 de abril de 2014 e, até essa data, haviam sido protocolados 1.386 pedidos de migração – o que corresponde à cerca de 80% das emissoras AM do país. Porém, conforme determinado no decreto presidencial, as emissoras que não fizeram durante as audiências realizadas em cada estado, ainda têm prazo até 10 de novembro de 2014 para apresentar ao Ministério das Comunicações o pedido de adaptação de outorga. A partir de abril de 2014, quando encerraram as sessões para pedido de migração, a Anatel passou a realizar estudos de viabilidade técnica em cada unidade da federação para determinar se há espaço para a migração de todas as emissoras interessadas em cada município. De acordo com informações publicadas no site da 14 Para operar legalmente no Brasil, considerando o processo licitatório da radiodifusão implantado a partir de 1996, cada rádio deve passar por um processo de licitação que envolve o pagamento de uma outorga de funcionamento, cujo valor final é variável e balizado por fatores como a posição geográfica da localidade a ser implantado o serviço, bem como população e grupo de enquadramento. Ao solicitar a migração do AM para o FM, as emissoras terão que arcar com a diferença monetária dessa mudança de outorga. 64 Associação Gaúcha de Emissoras de Rádio e Televisão (Agert), “nos casos em que não haja espaço no espectro, a agência deverá analisar a necessidade de uso da faixa estendida de FM (de 76 MHz a 88 MHz), que deve ser liberada com a digitalização da TV” (AGERT, 2014). Aquelas rádios que não protocolaram o pedido no período das sessões terão seus casos analisados individualmente somente depois que a Anatel concluir os estudos de viabilidade técnica naquele Estado. A Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert) esclarece que o pedido de migração não é obrigatório, mas aquelas emissoras de ondas médias locais (potência igual ou inferior a 1 kW) que não se interessarem na adaptação de outorga para FM deverão “alternativamente e pelo mesmo prazo de um ano, fazer um requerimento ao Ministério das Comunicações para o reenquadramento para caráter regional” (ABERT, 2014). No Rio Grande do Sul, conforme informações da Agert, do total de 170 emissoras AM, 140 pediram a migração (AGERT, 2014). 5 A PESQUISA Em seu livro sobre métodos e técnicas de pesquisa social, Antônio Carlos Gil reconhece a observação como uma importante fonte de conhecimento. Contudo, por si só, ela tem valor científico restrito, já que lhe faltam mecanismos de verificação. O autor esclarece que somente por meio das ferramentas da ciência é que se pode oferecer um caminho seguro de conhecimento, já que é esta a definição etimológica da palavra ciência: conhecimento. Na atualidade, essa definição já não encontra consenso entre estudiosos e pesquisadores, que admitem outros tipos de conhecimento, não necessariamente de caráter científico, ou seja, que não possibilitam a verificação de resultados, como o conhecimento popular, religioso ou mesmo filosófico. Sendo assim, Gil estrutura uma definição mais abrangente para ciência, conceituando-a como “uma forma de conhecimento objetivo, racional, sistemático, geral, verificável e falível” (1999, p.20). Em outras palavras, “uma forma de conhecimento que tem por objetivo formular, mediante linguagem rigorosa e apropriada [...] leis que regem os fenômenos” (idem). Essa forma de produção do conhecimento só foi possível graças à revolução científica, fenômeno que ocorreu paralelamente ao Renascimento Europeu, no século XVIII, quando o modelo econômico baseado em feudos deu lugar ao surgimento de grandes cidades, que se desenvolveram em função de um novo modelo, baseado em transações de mercado. Apoiando-se nesse contexto histórico, Mascarenhas (2012) situa que estudiosos da época, como Copérnico, Galileu, Bacon e Descartes, passaram a dissociar o conhecimento científico do religioso e filosófico, criando um método experimental baseado em critérios mais metódicos e racionais. Esse novo modo de fazer ciência baseia-se em um “conjunto de procedimentos que tem como objetivo construir conhecimento de modo preciso e objetivo, por meio de um experimento” (MASCARENHAS, 2012, p.5). Com base nisso, o autor também traça uma definição de ciência próxima à de Gil, caracterizando-a como “fruto da acumulação de 66 conhecimentos duradouros das épocas passadas, ampliados e aperfeiçoados ao longo do tempo” (idem). Gil classifica as ciências em duas grandes categorias, a partir das quais se desdobram outras subclassificações: formais e empíricas. A primeira diz respeito ao que o autor entende como entidades ideais, sendo a matemática sua principal representante. As ciências empíricas, por sua vez, tratam de “fatos e de processos” (GIL, 1999, p.21) e são, ainda, subdivididas como naturais ou sociais. Entre as naturais, estão contempladas ciências como Física, Química, Astronomia e Biologia. Já as sociais, grupo sobre o qual diz respeito esta monografia, incluem Psicologia, História, Antropologia, Ciência Política e Economia. O surgimento das ciências sociais, como situa Mascarenhas, deu-se no século XIX, em meio à Revolução Industrial, que suscitou a necessidade de estudos na área da educação e direito, por exemplo, acompanhando o rápido desenvolvimento econômico verificado no período. Foi assim que diversos temas sociais – tanto econômicos quanto culturais e políticos – viraram objeto de estudo científico. Pouco a pouco, as ciências sociais aprenderam a usar as ferramentas metodológicas existentes para conduzir estudos que fossem além do senso comum (MASCARENHAS, 2012, p.6). Como visto, a possibilidade de verificação e confrontamento de resultados é o que difere o conhecimento científico dos demais tipos de conhecimento. Contudo, entre os tipos de saber científico, Gil (1999, p.23) aponta que os fenômenos humanos não podem ser quantificados com o mesmo grau de precisão das ciências naturais. Ainda assim, seguindo-se técnicas – um caminho para se chegar a determinado fim, procedimentos lógicos previamente determinados ou método, como explica Gil – podese chegar à solução de um problema. 67 5.1 OS MÉTODOS CONSAGRADOS Gil define como método “o caminho para se chegar a determinado fim” e, no escopo da ciência, “o conjunto de procedimentos intelectuais e técnicos adotados para se atingir o conhecimento” (1999, p.26). A premissa de qualquer pesquisa científica é a definição de um problema e, a partir disso, a escolha de um ou mais métodos que tenham afinidade com o problema em questão. Existe uma variedade muito grande de métodos de pesquisa, que foram consagrados ao longo da história por terem apresentado efetividade na aplicação de pesquisas com raízes semelhantes. Metaforicamente, os métodos são como moldes. Determinado objeto de estudo pode ser compatível com um, vários ou mesmo nenhum método já conhecido de pesquisa. Veronese e Guareschi (2006), em seu artigo sobre Hermenêutica de Profundidade, oferecem uma síntese sobre a questão: “A indicação metodológica, portanto, tem de ser criteriosa e adequada para aquele objeto específico que se investiga” (2006, p.2). Para entendermos melhor cada método e sua aplicabilidade, autores como Gil e Mascarenhas os diferenciam dividindo-os em cinco grupos, que respeitam critérios de acordo com a abordagem e procedimentos. São eles: Os que proporcionam as bases lógicas da investigação. Podemos representá-los como a boca de um funil. São métodos desenvolvidos a partir de “elevado grau de abstração” (GIL, 1999, p.27), que dão liberdade ao pesquisador para que ele opte pelo alcance de sua pesquisa no que diz respeito à profundidade de investigação e validade de suas conclusões. Gil inclui entre esses métodos o dedutivo, indutivo, hipotético-dedutivo, dialético e fenomenológico, caracterizando que a escolha entre um ou outro depende de variáveis como “a natureza do objeto que se pretende pesquisar, dos recursos materiais disponíveis, do nível de abrangência do estudo e sobretudo (sic) da inspiração filosófica do pesquisador” (1999, p.27). 68 Cada um deles [métodos acima expostos] vincula-se a uma das correntes filosóficas que se propõem a explicar como se processa o conhecimento da realidade. O método dedutivo relaciona-se ao racionalismo, o indutivo ao empirismo, o hipotéticodedutivo ao neopositivismo, o dialético ao materialismo dialético e o fenomenológico, naturalmente, à fenomenologia (GIL, 1999, p.27). Os que indicam a abordagem do problema. Esses métodos vão indicar se o estudo será uma análise aprofundada sobre determinado tema ou se trará conclusões estatísticas, parâmetros numéricos. Ou seja, se a pesquisa será quantitativa ou qualitativa, como indica Mascarenhas (2012). A primeira será conduzida na quantificação dos dados obtidos para posterior análise. O autor aponta a necessidade, nesse tipo de pesquisa, do uso de técnicas estatísticas, como porcentagens, médias e desvio padrão, “para tornar o estudo mais imparcial, evitando, assim, a influência do pesquisador sobre os resultados”. Já na pesquisa qualitativa, a mais comum quando se trata de estudos comportamentais, por exemplo, o levantamento de dados ocorre simultaneamente à análise, pois as informações estatísticas são apenas o caminho para se compreender o objeto da pesquisa. Mascarenhas aponta esses como estudos descritivos, em que “a influência do pesquisador sobre a pesquisa não é evitada; muito pelo contrário, é considerada fundamental”. Com base nas definições acima, pode-se identificar que esta será uma pesquisa qualitativa. Os que indicam o objetivo geral da pesquisa. De acordo com essa ramificação, Mascarenhas aponta que as pesquisas podem ser exploratórias ou descritivas. A essas definições, Gil acrescenta a de pesquisa explicativa, que objetiva identificar fatores que contribuem ou determinam a ocorrência do fenômeno em questão. É um tipo aprofundado de pesquisa, onde os riscos de erros são agravados, mas que também é de grande valia para a ciência moderna. Embora reconheça a relevância dos estudos exploratórios – calcados em levantamentos bibliográficos – e descritivos – que estabelecem relações entre as variáveis que caracterizam uma população ou fenômeno –, Gil indica que o maior valor científico está mesmo é nos estudos explicativos. “Pode-se dizer que o conhecimento científico está assentado nos resultados oferecidos pelos estudos explicativos” (GIL, 1999, p.44). 69 Os que indicam o propósito da pesquisa. Aqui, Mascarenhas aborda como possibilidades a pesquisa aplicada, a avaliação de resultados, a avaliação formativa, a proposição de planos e a pesquisa-diagnóstico. E, por fim, os que revelam os procedimentos técnicos adotados. 5.2 MÉTODO APLICADO O objetivo geral deste trabalho monográfico é relatar o andamento da digitalização no Brasil, culminando no anúncio da migração e com ênfase no planejamento das rádios AM de Bento Gonçalves. Para alcançá-lo, a análise de conteúdo é o método que norteará essa pesquisa monográfica que, em última instância, pretende compreender o processo de migração das duas emissoras AM situadas no município de Bento Gonçalves, contextualizando a mudança com a proposta de digitalização do rádio no Brasil. Esse método de pesquisa está abrigado sob o guardachuva da hermenêutica, descrita pela professora francesa Laurence Bardin (2000) como uma arte antiga, usada para interpretar textos sagrados ou misteriosos muito antes que as ciências sociais formalizassem técnicas modernas de análise das comunicações. O objetivo era, então, o de desvendar o real sentido por trás de textos carregados de simbolismos e polissemias. As hipóteses que nortearam esta pesquisa foram três: 1) Por se tratar de um processo irreversível, as emissoras AM de Bento Gonçalves estão envolvidas; 2) O investimento em equipamentos e regularização da documentação para migração será robusto; 3) O movimento de migração pode impactar no perfil do conteúdo ofertado pelas emissoras. Na atualidade, Veronese e Guareschi (2006) apontam a Hermenêutica de Profundidade como um paradigma de ampla abertura metodológica, que oportuniza ao pesquisador analisar o contexto sócio-histórico e espaço-temporal que cerca o 70 fenômeno pesquisado, podendo “empreender análises discursivas, de conteúdo, semióticas ou de qualquer padrão formal que venha a ser necessário [...], conferindo um caráter potencialmente crítico à pesquisa” (2006, p.87). Trata-se de construir uma análise plausível, dentro de um paradigma compreensivo; não de acessar e revelar a verdade, mas de fazer uma leitura qualificada da realidade tal qual ela se apresenta, no nível do sentido apreendido do fenômeno, no campo investigado (idem). É essa atitude interpretativa que se pretende conferir a presente monografia através da análise do discurso, aliada a outros métodos práticos de validação, que serão abordados adiante. Historicamente, como situa Bardin, a análise de conteúdo desenvolveu-se nos Estados Unidos, no século XX, como uma ferramenta comparativa aplicada a publicações na imprensa. A partir da Primeira Guerra Mundial, a prática difundiu-se com o estudo da propaganda dos governos no período. A mais clássica definição da análise de conteúdo, aceita durante muitas décadas entre os estudiosos do tema, é a de B. Berelson e data desse período de solidificação da técnica – mais exatamente em 1948. Diz Berelson que a análise de conteúdo é uma “técnica de investigação que tem por finalidade a descrição objectiva (sic), sistemática e quantitativa do conteúdo manifesto da comunicação” (Bardin apud Berelson, 2000, p.19). Após a Segunda Guerra Mundial, a análise de conteúdo como método de pesquisa cai em desuso, até receber um novo olhar mais abrangente e com aceitação de quesitos quanti e qualitativos. Na análise quantitativa, o que serve de informação é a frequência com que surgem certas características do conteúdo. Na análise qualitativa é a presença ou a ausência de uma dada característica de conteúdo ou de um conjunto de características num determinado fragmento de mensagem que é tomado em consideração (Bardin apud George, 2000, p. 21). 71 Com aperfeiçoamentos técnicos no que diz respeito à combinação de abordagens quanti e qualitativas, a análise de conteúdo volta a ser mais frequentemente aplicada. A partir da segunda metade do século XX, admite-se que o fator decisivo não é necessariamente a informação quantitativa, mas a possibilidade de inferência, seja ela ou não quantitativa. Inferência é a dedução lógica de conhecimentos que se obtém a partir do tratamento de mensagens captadas a respeito de seu emissor ou seu meio. “Se a descrição é a primeira etapa necessária e se a interpretação é a última fase, a inferência é o procedimento intermediário, que vem permitir a passagem, explícita e controlada, de uma à outra”, (Bardin, 2000, p.39). Considerando-se a evolução da técnica, Bardin descreve duas funções para a análise de conteúdo, que podem coexistir ou, ao contrário, serem dissociadas, de acordo com cada objeto de pesquisa. a) Função heurística: a análise de conteúdo enriquece a tentativa exploratória, aumenta a propensão à descoberta. b) Função de administração de prova. Hipóteses sob a forma de questões ou de afirmações provisórias servindo de directrizes (sic), apelarão para o método de análise sistemática para serem verificadas no sentido de uma confirmação ou de uma infirmação. Em suma, não se trata de um instrumento único, mas, metaforicamente, de um canivete com funções diversas que estão à disposição do pesquisador para apoiá-lo no processo de pesquisa e oferecer parâmetros de resultado aceitáveis para a comunidade científica. No que tange à organização da análise de conteúdo, Bardin aponta três fases cronológicas que apoiam o pesquisador na organização do material a ser investigado: a pré-análise, a exploração do material e o tratamento dos resultados, quando se dá a inferência e posterior interpretação dos dados obtidos. Bardin aponta como missões da pré-análise a escolha dos documentos, a formulação de hipóteses e objetivos que norteiem a pesquisa e, por fim, a elaboração de indicadores a serem avaliados. A pré-análise só estará concluída, abrindo caminho ao pesquisador para a exploração efetiva, após uma leitura atenta do material e escolha 72 das amostras a serem consideradas de acordo com critérios que devem ser exemplarmente expostos pelo pesquisador. “A análise pode efectuar-se (sic) numa amostra desde que o material a isso se preste. A amostragem diz-se rigorosa se a amostra for uma parte representativa do universo inicial” (BARDIN, 2000, p.97). 5.2.1 Técnicas Basicamente, foram duas as técnicas aplicadas nesta monografia: pesquisa bibliográfica e entrevista. A pesquisa bibliográfica feita nos capítulos anteriores embasa a abordagem das entrevistas e contextualiza a trajetória do rádio desde sua invenção até os dias de hoje, passando pela chegada ao Brasil e todas as transformações que ocorreram desde então. Esgotado o referencial teórico publicado sobre digitalização do rádio, a pesquisa teve continuidade com os relatórios do Conselho Consultivo do Rádio Digital disponíveis no site do Ministério das Comunicações. Com isso, pôde-se estabelecer a evolução das tentativas de se estabelecer um sistema digital para o país – processo que, em dado momento, foi estagnado em detrimento da autorização de migração das emissoras AM. Portanto, foram consultados os decretos e projetos de lei envolvendo a regulamentação da radiodifusão no Brasil, o processo de digitalização e a autorização para migração das rádios AM para FM. Embora existam pesquisas exclusivamente bibliográficas, que se apoiam somente em livros e estudos já publicados – muitas das quais desenvolvidas a partir da análise de conteúdo, como aponta Gil (1999) –, nesta monografia foi necessária a complementação por meio de entrevistas, uma prática rotineira no exercício do jornalismo e que consiste na aplicação de perguntas a sujeitos que possam colaborar com dados importantes para o desenrolar da investigação. Amplamente utilizada em pesquisas sociais, a entrevista é definida por Gil (idem) como uma forma de diálogo assimétrico, em que uma das partes tem o interesse de coletar dados relevantes e a outra se presta a servir como fonte de informação. 73 Para esta pesquisa, optou-se pela realização de entrevistas pessoalmente e não por telefone. Para que se pudesse descrever a percepção das emissoras locais de AM sobre a migração e de que forma elas vêm se organizando para a mudança, foram entrevistados presencialmente representantes das duas rádios AM de Bento Gonçalves: na Difusora 890, o diretor da emissora, Volnei Pertile; na Viva 1070, o diretor do Grupo RSCOM, Marcos Piccoli. As entrevistas foram realizadas na sede das rádios – na Difusora, no dia 30 de maio de 2014; na Viva, no dia 19 de maio de 2014. A grande vantagem em comparação ao envio de questionários por e-mail é o grau de fidedignidade das respostas. No contato presencial, o entrevistado tem a possibilidade de indagar questões mal entendidas e, também, responde-as espontaneamente, já que existe um conhecimento prévio da temática da entrevista, mas não das questões a serem feitas. Gil elenca a existência de cinco tipos possíveis de entrevista – a) informal, onde se pretende basicamente conhecer o entrevistado e sua visão sobre o problema pesquisado; b) focalizada, quando se permite ao entrevistado que fale livremente sobre um tema previamente determinado; c) estruturada, quando se desenvolve um questionário fixo de perguntas que é aplicado a vários entrevistados da mesma forma e d) por pautas, quando o pesquisador elabora um questionário até certo ponto flexível, já que possibilita ao entrevistado falar livremente sobre os pontos abordados, mas dá ao entrevistador certa liberdade para conduzir as perguntas para o tema de maior interesse. Esse último foi o tipo aplicado, considerando que o escopo inicial de perguntas foi se adaptando às respostas dos entrevistados, o que configura um questionário aberto de entrevista. Três questões principais nortearam as entrevistas: 1) Como a rádio está lidando com o processo de migração do AM para o FM; 2) Quais os investimentos financeiros que a rádio já fez e que pretende fazer para a migração; 3) De que forma a migração deverá impactar a programação da rádio. Outros questionamentos surgiram no decorrer dos diálogos, enriquecendo a abordagem. Com isso, foi possível compreender até que 74 ponto as emissoras ouvidas estão preparadas para a migração e quais aspectos do processo ainda são percebidos genericamente. 5.3 CONTEXTO LOCAL Bento Gonçalves é um município da Encosta Superior do Nordeste do Rio Grande do Sul, distante 124 quilômetros da capital do Rio Grande do Sul, Porto Alegre. De acordo com dados do IBGE de 2013, sua população estimada é de 111.384 habitantes. De colonização predominantemente italiana, Bento Gonçalves e os demais municípios próximos desenvolveram-se a partir de 1875, quando receberam milhares de famílias estrangeiras que fugiam das dificuldades na enfrentadas pela Europa como consequência da Revolução Industrial. As transformações políticas, sociais e econômicas do período, conforme Caprara e Luchese (2005), foram decorrência da expansão do capitalismo e fizeram surgir um número expressivo de desempregados. O Brasil, por sua vez, estava em pleno processo de adaptação ao fim da escravidão, enfrentando um “processo de modificação e modernização das estruturas sociais e econômicas vigentes” (CAPRARA, LUCHESE, 2005, p.14), bem como a afirmação do capitalismo. Em função disso, a mão-de-obra era escassa e a imigração tornou-se um projeto do governo imperial, que investiu em propaganda na Europa para atrair trabalhadores. Essas pessoas, segundo relatam Caprara e Luchese (2005), tinham predominantemente três destinos: as fazendas de café, o trabalho urbano em São Paulo e a colonização de terras devolutas em pontos longínquos do Brasil, como 75 Encosta Nordeste da então denominada Província de São Pedro do Rio Grande do Sul15. Os primeiros imigrantes a aportarem na província foram os alemães, a partir de 1824, instalados no Vale dos Sinos, na região de São Leopoldo. O incentivo à vinda de italianos ocorreu a partir da redução da imigração alemã, especialmente após a criação das colônias Conde d‟Eu e Dona Isabel, em 1870, e da colônia de Nova Palmira, em 1875 – atualmente, Garibaldi, Bento Gonçalves e Caxias do Sul, respectivamente. A Colônia Dona Isabel recebeu, primeiramente, 48 famílias francesas, que não se estabeleceram em virtude da precariedade da colônia. Os primeiros italianos a se instalarem foram 20 famílias de trentinos que chegaram à colônia no dia 24 de dezembro de 1875. Dois anos depois, a população era de “2.431 habitantes, sendo 749 austríacos, 1.660 italianos, 12 franceses e 10 brasileiros” (CAPRARA, LUCHESE, 2005, p. 40). A colônia desenvolveu-se por meio da agricultura até 1890, quando conquistou sua emancipação, por meio do Ato Imperial nº 474, publicado no dia 11 de outubro. Com isso, as colônias Dona Isabel e Conde d‟Eu, juntas, formariam o município de Bento Gonçalves. O território de Conde d‟Eu emancipou-se de Bento Gonçalves no dia 31 de outubro de 1900, quando foi criado o município de Garibaldi. Economicamente, Bento Gonçalves teve três etapas básicas em seu processo de desenvolvimento, como situam Caprara e Luchese (2005): a agricultura de subsistência (1875-1910); o desenvolvimento da vitivinicultura (1910-1950); e a instalação de cooperativas e empresas de industrialização (a partir de 1950). Na verdade, “desde o início a videira foi cultivada pelos imigrantes pensando num porvir onde o vinho pudesse afirmar-se como produto de importância econômica regional” (2005, p. 215). O que ocorreu é que, com o passar do tempo, o vinho de Bento 15 Caprara e Luchese esclarecem que, nessas terras devolutas, foram criadas colônias organizadas pelos poderes imperiais, provinciais ou mesmo particulares. A vinda de imigrantes para essas colônias era incentivada pelo governo como forma de povoar e motivar a produtividade agrícola. Além disso, as autoras situam que a vinda de europeus também objetivava o “branqueamento do Brasil” (2005, p.17). 76 Gonçalves ganhou espaço nacional, elevando o município à condição de Capital Brasileira da Uva e do Vinho. Conforme o site oficial da prefeitura de Bento Gonçalves, por volta de 1950, a população era de 22.600 habitantes. As principais atividades econômicas eram as do setor agrícola. Contudo, começaram a surgir várias indústrias, como de acordeões, laticínios, móveis, curtume, fábrica de sulfato e vinícolas. Em 1967, foi realizada a primeira edição da Fenavinho, a Festa Nacional do Vinho, que teve sua última edição realizada em 2011, devido a dificuldades financeiras. Atualmente, o município possui quatro distritos: Faria Lemos (com 517 famílias residentes), Tuiuty (com 698 famílias), São Pedro (com 186 famílias) e Vale dos Vinhedos (com 467 famílias) (PREFEITURA, 2014). Os principais setores da economia são o moveleiro, vinícola, metalúrgico, de transportes e a fruticultura. O município possui colocação elevada no Índice de Desenvolvimento socioeconômico (Idese), tendo liderado o ranking no ano de 2010 entre os municípios com população acima de 100 mil habitantes no Rio Grande do Sul. A imprensa local desenvolveu-se a partir de 1900, de acordo com a pesquisa do radialista Alceu Salvi Souto (1997) por ocasião do aniversário de 50 anos da Rádio Viva. Segundo ele, até meados da década de 1950, quando o rádio chegou a Bento Gonçalves, foram inúmeros os jornais que circularam no município. O primeiro deles foi o Bento Gonçalves, publicado em 02 de setembro de 1900, em edição única. Depois dele, circularam diversos outros jornais no município antes da chegada do rádio, como “o Recreio, em 1907; A Thesoura, em 1911; Il Corriere D‟Italia, em 1913; O Echo da Serra, em 1914; O Estado, em 1915; O Intruso, em 1916; A Ordem e O Sabe-Tudo, em 1922; O Semanário, em 1925 e O Nordeste, em 1941” (1997, p. 19). Depois disso, instalou-se a primeira emissora de rádio de Bento Gonçalves e, naturalmente, também outros jornais e revistas foram editados. A imprensa local atualmente é formada por (PREFEITURA, 2014): 77 Dois jornais de circulação bissemanal: Jornal Semanário, com tiragem às quartas-feiras e sábados, e Jornal Gazeta, com tiragem às terças-feiras e sextas-feiras. Ambos com distribuição paga por meio de assinaturas e venda em banca. Ambos possuem página no Facebook e apenas o Jornal Semanário possui site com publicação periódica de notícias; Um jornal com circulação semanal: Jornal SerraNossa, publicado às sextas-feiras e distribuído gratuitamente em pontos localizados no comércio, indústria e serviços. Possui página no Facebook e site com publicação periódica de notícias; Outros cinco jornais com publicação mensal ou periodicidade não informada; Sucursais de jornais estaduais: Correio do Povo, Jornal do Comércio, Pioneiro/Zero Hora e O Sul; Sucursais de emissoras de televisão: RBS TV, Rede Pampa, TV Cidade e UCS TV; Duas rádios FM comerciais: Rádio Rainha FM 90.9, pertencente ao mesmo grupo do Jornal Semanário, e Rádio Oi FM 92.5, integrante do Grupo RSCOM; Uma rádio educativa: UCS FM 89.9, pertencente à Universidade de Caxias do Sul; Duas rádios AM: Rádio Viva 1070 AM, pertencente ao Grupo RSCOM, e Rádio Difusora 890 AM. 78 5.3.1 As rádios AM A história das duas rádios AM de Bento Gonçalves, atualmente em operação, confunde-se a tal ponto que, para compreender a trajetória da Rádio Difusora é preciso antes pontuar a história da Rádio Viva News – que foi a primeira emissora do município e operou durante aproximadamente 30 anos com o nome de Rádio Difusora de Bento Gonçalves. Por ocasião dos 50 anos da Rádio Viva, o radialista Alceu Salvi Souto realizou extensa pesquisa que, ainda hoje, é a única fonte bibliográfica sobre a imprensa do município. Seus levantamentos revelam que, aos 24 anos, um jornalista chamado Luís Neves deixou sua cidade-natal, Alegrete, para consolidar a carreira na capital Porto Alegre. Atuou inicialmente no Diário de Notícias e Correio do Povo, sendo nomeado diretor da Agência Nacional16 no estado. Nessa época, segundo Souto (1997), Luís Neves habilitou-se junto ao Departamento de Correios e Telégrafos, recebendo autorização para instalar uma emissora de rádio em Bento Gonçalves ou Caxias do Sul. Preferiu a primeira opção, pois não havia ainda nenhuma emissora no município. Em 10 de outubro de 1947, estava autorizada a abertura da Rádio Difusora de Bento Gonçalves e, cerca de 40 dias depois, ocorriam as primeiras transmissões, como detalha Souto: 16 A Agência Nacional foi um órgão de comunicação criado pelo governo Getúlio Vargas, que funcionava como gerador de notícias oficiais “sobre assuntos de interesse da nação, ligados a sua vida econômica, industrial, agrícola, social, cultural e artística”. Tinha grandes equipes de redatores e repórteres espalhados pelo país. Dessa forma, atuava como uma espécie de assessoria de imprensa, conteúdo para os jornais de todo o país. No período da Ditadura Vargas, de 1937 a 1945, considera-se que a agência tenha sido mais um dos mecanismos de controle do Estado à imprensa, embora não explicitamente, como atuava o Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP). Depois, no período democrático, “não apresentou como sendo sua função a censura à imprensa nem outra conduta que lhe provesse de controle ou autoridade mediante as demais empresas de comunicação” (CASTRO, 2013, p. 53). Disponível em http://www.historia.uff.br/stricto/td/1718.pdf. Acesso: 25 jun. 2014. 79 E foi justamente às 9h30min do dia 21 de novembro de 1947 (sexta-feira), sob os acordes do Hino Nacional Brasileiro, com a presença do prefeito nomeado, intendente Antônio Galileu Contino, autoridades e convidados, que vai ao ar pela primeira vez o som da ZYQ 5, Rádio Difusora de Bento Gonçalves, atuando na frequência (sic) de 1.570 kHz, com transmissor de 100 watts de potência (1997, p 62). Inicialmente, a rádio transmitia das 9h às 23h. Souto (1997) indica que as ondas da Rádio Difusora iam longe, alcançando até cidades fronteiriças como Uruguaiana, Itaqui e Santana do Livramento. Nos anos que se seguiram, a Difusora passou pelo controle de diversos empresários, políticos e religiosos. Souto pontua essas passagens. Seis anos após sua fundação, em 1953, Luís Neves vendeu a emissora para um grupo de quatro pessoas que, por sua vez, convidaram dois bancários a tomarem parte na sociedade. Já em 1957, a Mitra Diocesana de Caxias do Sul assumiu o controle acionário, pagando o irrisório valor de três mil cruzeiros, “mas o preço efetivamente pago foi de cr$ 2.500,00, isto porque no saldo do caixa da emissora restavam cr$ 500,00 que o Sr. Luís Matheus Todeschini deixou como donativo para a Igreja Cristo Rei” (1997, p.197). Na alteração acionária seguinte, ocorrida em 1981, o controle da Rádio Difusora passou da Mitra Diocesana para um grupo político formado por quatro pessoas, entre as quais o ex-prefeito de Bento Gonçalves, Darcy Pozza, que futuramente se elegeria por mais dois mandatos (1997 a 2004). Em 1983, porém, entra para a administração da rádio o atual proprietário, o engenheiro Carlos Domingos Piccoli e outros três sócios, incluindo seu irmão Antônio Luís Piccoli. Ocorreu, então, a virada que levou a rádio à fase atual: A programação fica 24 horas no ar. Novos equipamentos foram adquiridos e no ano de 1986, para acompanhar o desenvolvimento do setor das comunicações, houve a mudança no nome, quando a Rádio Difusora Bento Gonçalves passou a se chamar Rádio Viva. A fase atual da Rádio Viva começou em março de 1993, quando assumiu a frequência (sic) de 1070 kilohertz e a potência de 1 kilowatt, com o prefixo ZYK 357 (1997, p.327). 80 Souto conta que, em fins da década de 1980, do grupo político, apenas Darcy Pozza ainda detinha uma fatia acionária da rádio. Nos anos seguintes, os sócios adquiriram novas rádios e ganharam novas concessões. A rádio transformou-se em um grupo inicialmente denominado Rede Serrana de Comunicações e chamado de Grupo RSCOM a partir de 1983. Entre os anos de 2009 e 201217, numa tentativa de acompanhar o mercado e a evolução das rádios all-news (ou totalmente noticiosas), a Viva migrou para o canal FM do grupo e passou a chamar-se Viva News 92.5. Para isso, a emissora musical jovem que operava no dial foi extinta. Porém, questões comerciais levaram o grupo a firmar parceria com um grupo de comunicadores a partir de outubro de 2013, dando origem à Rádio Oi! 92.5, de perfil musical popular. A Viva News, então, voltou a operar no dial 1070 AM, como Rádio Viva. Foi o rompimento da sociedade entre o engenheiro Carlos Domingos Piccoli e o político Darcy Pozza que deu origem à atual Rádio Difusora de Bento Gonçalves. A sociedade, que contemplava somente as três concessões comerciais do grupo localizadas em Bento Gonçalves, foi desfeita em 2009. À Pozza, restou a frequência 890 AM, que operava como Rádio Viva e passou a funcionar como Rádio Difusora. Piccoli permaneceu com a emissora 1070 AM, que passou de Rádio Bento a Rádio Viva, e comprou de Pozza sua parte na emissora 92.5 FM. Atualmente, o Grupo RSCOM é formado por um jornal semanal com distribuição gratuita e circulação em Caxias do Sul: Jornal Comércio do Povo; quatro rádios FM em Bento Gonçalves, Farroupilha, Flores da Cunha e Montenegro; uma rádio comunitária em Bento Gonçalves; uma rádio AM em Bento Gonçalves e uma rádio na cidade de Conegliano, Itália. 17 Fonte: entrevista com o diretor do Grupo RSCOM, Marcos Piccoli, realizada no dia 19 de maio de 2014. 81 A Rádio Viva 1070 AM é a emissora do grupo que solicitou ao Ministério das Comunicações a migração para o FM. A rádio caracteriza-se como “uma emissora de caráter comunitário, comprometida com o bem-estar e o desenvolvimento social da comunidade” (VIVA, 2014). Sua programação contempla música, esporte, jornalismo e serviços de utilidade pública, além de atuar “na transmissão de eventos e campanhas realizadas pelas comunidades, cobertura dos campeonatos do esporte amador e profissional ou realizando a promoção de campanhas próprias e de datas comemorativas”. A Rádio Viva 1070 AM tem em sua área de abrangência as cidades de Bento Gonçalves, Barão, Carlos Barbosa, Caxias do Sul, Cotiporã, Farroupilha, Garibaldi, Monte Belo do Sul, Pinto Bandeira, Salvador do Sul, Santa Tereza, São Pedro da Serra, São Valentim do Sul e Veranópolis. Já a Rádio Difusora 890 AM, em sua nova fase, alcança quase 40 municípios da Serra Gaúcha, com programação transmitida 24 horas por dia. A rádio, de propriedade do político Darcy Pozza, é gerenciada pelo empresário Volnei Pertile desde 2009. Depois de alguns anos de embate entre as duas emissoras, atualmente a Rádio Difusora é quem divulga ter 67 anos de história. Com o slogan A Rádio que Faz Amigos, a Difusora possui programação variada, que contempla noticiários e entretenimento, seguindo um modelo de rádio-revista baseado no tripé informação/música/entretenimento. Todo o conteúdo veiculado tem suporte do departamento de jornalismo que, mesmo fora dos programas noticiosos, veicula notícias ao longo da programação. 5.4 ENTREVISTAS Atualmente, 1.784 emissoras operam na frequência de AM em todo o Brasil, divididas de acordo com o alcance: local, regional ou nacional. Esse cenário sofrerá 82 rápidas modificações em decorrência do decreto presidencial número 8.139 de 07 de novembro de 2013, que dispõe sobre as condições para extinção do serviço de radiodifusão sonora em Ondas Médias de caráter local e sobre a adaptação das outorgas vigentes para execução desse serviço. As rádios AM, que representam 40% do total de aproximadamente 4,5 mil emissoras legalmente instituídas no país, mostraram interesse imediato na migração. Cerca de 80% delas oficializaram o pedido de migração para o FM, incluindo as duas emissoras AM sediadas e operantes em Bento Gonçalves: Rádio Difusora 890 e Rádio Viva 1070. Elas protocolaram seus pedidos de migração junto ao Ministério das Comunicações em março de 2014, durante reunião realizada na sede da Anatel em Porto Alegre. Desde então, aguardam a análise de seus processos e a definição dos valores a serem pagos ao MiniCom como diferença entre as outorgas de AM e FM. A portaria número 127, de 12 de março de 2014, fornece um indicativo de como será feita essa cobrança. O documento, que define os procedimentos para pedido de migração e indica como os processos vão ser analisados pelo MiniCom e pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), traz em seu artigo 5º: Art. 5º Constatada a habilitação técnica e jurídica da requerente, a SCE expedirá notificação para a requerente efetuar o pagamento do valor relativo à adaptação da outorga, que corresponderá à diferença entre os preços mínimos de outorga estipulados pelo Ministério das Comunicações para os serviços de radiodifusão sonora em frequência modulada e os serviços de radiodifusão sonora em ondas médias nos grupos de enquadramento referentes à respectiva localidade. No momento, a principal apreensão dos radiodifusores no que concerne ao processo de migração é a inexistência de informações sobre o montante que caberá a cada emissora a título de diferença de outorga. O diretor do Grupo RSCOM, Marcos Piccoli, afirma que já estão ocorrendo desistências por parte de emissoras de pequeno porte, mesmo antes de ser conhecido o custo total da migração, por conta das 83 incertezas que cercam o processo. Piccoli, que também ocupa o cargo de Diretor de Novas Tecnologias na Associação Gaúcha de Emissoras de Rádio e Televisão (Agert), entende que o mercado vem mostrando desconfiança sobre o processo, a ponto de considerar que o Ministério das Comunicações pretende fazer caixa com a migração. O Ministério quer fazer a digitalização e a migração, mas não estabelece critérios para isso. Existe uma lei que não diz nada. Recentemente, surgiram alguns indicativos de que o valor a ser cobrado para uma emissora do interior, por exemplo, será algo em torno de R$ 20 a R$ 30 mil – totalmente viável. Mas são apenas especulações. Uma publicação no Diário Oficial da União de 8 de agosto de 2013 dá a entender que a cobrança será de acordo com o potencial socioeconômico da cidade. Nesse caso, embora Bento Gonçalves tenha um mercado péssimo para a mídia de rádio, a cidade é pujante. Sendo assim, se o critério for este, o valor da migração tende a ser muito alto para nós (PICCOLI, 2014). O diretor da Rádio Difusora, Volnei Pertile, espera que os valores sejam divulgados até agosto de 2014, período no qual se iniciariam também os estudos técnicos para determinar se existe espaço para a migração das duas emissoras de Bento Gonçalves sem necessidade uso da faixa estendida18. A questão da outorga, entretanto, não impedirá a migração da emissora, conforme seu diretor. Pertile considera, inclusive, que esta será a menor fatia do investimento necessário para ir ao FM. “A concessão é apenas a primeira parte. Depois de paga, vem o investimento em equipamentos”. (PERTILE, 2014). A possibilidade de não haver espaço no espectro atual para as duas rádios AM de Bento Gonçalves é a questão técnica que mais preocupa o diretor da Rádio Viva, Marcos Piccoli. O Ministério das Comunicações já anunciou que realizará estudos técnicos em cada unidade da federação onde existem rádios interessadas em migrar 18 O Serviço de Radiodifusão Sonora em Frequência Modulada atualmente ocupa a faixa de 88 a 108 MHz. As faixas de 54 a 88 MHz, por sua vez, são destinadas aos canais baixos de televisão e ficarão totalmente desocupadas a partir de julho de 2016, quando se encerrará o período de transição da TV analógica para o Sistema Brasileiro de Televisão Digital. A Faixa Estendida de FM compreende a incorporação dos canais 5 e 6 UHF, ou seja, as frequências de 76 a 88 MHz. 84 para o FM para determinar se o uso da faixa estendida será ou não necessário, considerando que devem ser respeitados os limites de segurança para que não ocorram interferências entre as rádios. Conforme o MiniCom, nas localidades onde não houver espaço no espectro atual, as emissoras terão de aguardar a liberação dos canais 5 e 6 da televisão analógica, o que vai ocorrer com a digitalização da TV no país. “Hoje, as FMs são sintonizadas na faixa de 87.9 MHz a 107.9 MHz. Com a liberação dos canais, essa frequência será estendida de 76 MHz a 107.9 MHz” (MINISTÉRIO DAS COMUNICAÇÕES, 2014). A tendência é que as cidades menores e mais afastadas de regiões metropolitanas tenham menos empecilhos à migração. Porém, existe uma preocupação de que em Bento Gonçalves seja necessário recorrer à faixa estendida, como revela Piccoli: Em Bento, fizemos um estudo preliminar que foi entregue ao Ministério das Comunicações, apontando a existência de apenas um canal disponível em função da configuração técnica de potências das emissoras existentes. Naturalmente, o Ministério fará seu próprio estudo, mas digamos que o resultado seja o mesmo, aí entramos em um leilão, pois há duas rádios pleiteando a migração. É importante sabermos, antes de mais nada, se há somente um canal disponível para Bento Gonçalves ou dois. E qual valor? Que tipo de equipamento estará disponível? E, caso haja apenas um canal, qual das emissoras irá ficar com ele? Se alguém tiver que ficar na faixa estendida, em que canal será? Que receptor existe para isso? Como meu ouvinte vai sintonizar uma rádio na faixa estendida? A única certeza no momento é que protocolamos o interesse de migrar (PICCOLI, 2014). O diretor da Rádio Difusora, Volnei Pertile, é mais otimista em relação à faixa estendida: Talvez isso adie o processo em seis meses ou um ano, mas se voltarmos quatro ou cinco anos, quando se falava em TV digital, também havia grande 85 preocupação de que os aparelhos não iriam funcionar ou o público não iria se adaptar. Hoje, não existe nenhum problema: em alguns lugares o sinal analógico ainda funciona paralelamente ao digital, mas o processo se desenvolveu. Isso não preocupa, desde que a qualidade do áudio seja 100%. A Difusora não sabe ainda se estará na faixa normal ou na estendida. Quem sabe em agosto saibamos (PERTILE, 2014). O decreto presidencial número 8.139 indica a possibilidade de transmissão simultânea por até cinco anos em AM e FM para as emissoras que migrarem na faixa estendida. Além disso, a lei determina que o Ministério das Comunicações adote “as providências necessárias para que os terminais estejam aptos a receberem os sinais da faixa estendida de frequência modulada” (BRASIL, 2013). Mesmo assim, o diretor do Grupo RSCOM questiona a aceitação do público à faixa estendida. Marcos Piccoli diz que os investimentos da empresa em troca de transmissores e pagamento de outorga não preocupa tanto quanto a inexistência de receptores adaptados à faixa estendida no mercado: Na faixa atual, há antenas e transmissores disponíveis no mercado e haverá uma linha de financiamento pelo BNDES com juros reduzidos para a compra de equipamentos pela rádio. A questão financeira interessa, claro, mas o que mais nos preocupa são os receptores. Se eu estiver na faixa estendida, como vou fazer com que todos os receptores da cidade sejam substituídos? As pessoas já não compram rádio há muitos anos. Ninguém vai trocar de celular porque a minha rádio foi para a faixa estendida (PICCOLI, 2014). Apesar dos muitos questionamentos em relação às condições técnicas e valores de outorga, ambas as rádios de Bento Gonçalves confiam que o início da migração será breve, com anúncio das primeiras emissoras aptas a transmitir em FM ainda nesse ano. Já o caso de Bento Gonçalves, segundo Pertile, não deverá ter novidades até o próximo ano: 86 Algumas emissoras com potência mínima poderão migrar logo, mas há uma certeza de que nas capitais isso não poderá ocorrer. Pela potência da Difusora, creio que o nosso caso fique para o ano que vem. Existe a possibilidade de que a rádio migre com 30 kW de potência, o que representa um alcance excelente, mas temos que avaliar se é possível enquadrar essa potência no atual espectro sem passar por cima de outras emissoras da região. Estamos preparados e acredito que, depois da liberação, em três ou quatro meses poderemos estar operando (PERTILE, 2014). Da mesma forma, Piccoli diz que pelas dimensões do país, existem regiões onde a migração será simples e poderá ocorrer brevemente. Segundo ele, os fornecedores estão preparados para a migração com antenas e transmissores disponíveis para a faixa atual. Entretanto, ele aponta que o Ministério não alcançará o objetivo central da migração – liberar espaço no espectro e oferecer novas condições de atuação para o mercado radiofônico – enquanto o processo não chegar aos grandes centros, onde está o principal problema de atuação da rádio AM e onde a faixa estendida precisará ser utilizada: A sobrevivência do rádio, pelo menos nas regiões metropolitanas, é ir para o FM em função da interferência cada vez maior no sinal da AM. Mas não há canais disponíveis. Além do que, salvo melhor juízo, o Ministério das Comunicações e a Anatel estão muito preocupados com as telefônicas e o 4G, que interferem na TV digital, e também com a radiodifusão comunitária. O resto parece não ser prioridade. Não tenho dúvida de que haverá a migração das primeiras emissoras ainda nesse ano, pelo menos no interior, mas não vai resolver o problema, pois ele não está lá (PICCOLI, 2014). Em relação à potência, a Rádio Difusora 890 opera com 5 kW e a Viva 1070, com 2,5 kW. Ambas são consideradas emissoras de caráter regional e pretendem receber concessões de mesmo alcance no FM. Apesar disso, Piccoli situa que a grande vantagem está na qualidade do som, já que o AM sofre pela interferência de outros aparelhos e pela baixa qualidade dos receptores. Ademais, a migração multiplicará os meios de acesso às emissoras, já que o AM não está presente na maioria dos celulares, 87 bem como nos tablets e outros dispositivos, estando limitadas ao acesso online ou por aparelhos convencionais, cada vez menos utilizados pelo consumidor. No que diz respeito à produção, as rádios Difusora e Viva vislumbram de forma diferente as necessidades de suas emissoras no FM no que tange ao conteúdo e a equipes. O projeto da Rádio Difusora para a migração é balizado pela abertura de sucursais, como detalha o diretor Volnei Pertile: Nossa programação é bastante extensa, temos um departamento de jornalismo forte que faz a cobertura local, regional e estadual, participando de eventos em todo o estado. Já temos uma sucursal em Garibaldi e temos projeto de inserir outras na região, como Caxias, Veranópolis ou mesmo municípios menores, como Cotiporã ou São Valentim do Sul. Nossa estrutura atual já permite a cobertura de quatro ou cinco eventos simultâneos. Temos pessoal e equipamento técnico para isso. Algumas emissoras trabalham com sistema de custos reduzido e são poucas que contam com comunicador no ar 24 horas por dia. Nossa equipe já é forte, mas com a migração deverá crescer em 40% ou 50% (PERTILE, 2014). Atualmente, a rádio segue um modelo popular de programação e tem, em seu corpo de funcionários, os dois locutores mais antigos em atividade no município: Alceu Salvi Souto e Elmo Marques. Embora considere a possibilidade de agregar profissionais com características mais sóbrias para o quadro de comunicadores, Volnei Pertile entende que os locutores antigos devem ser mantidos na equipe: Para mim, ter radialistas como Alceu Salvo Souto e Elmo Marques é motivo de orgulho, pois eles carregam a história do rádio. Não abro mão dessas pessoas de jeito nenhum e, mesmo se um dia eles não quiserem, eu proporia que fizessem ao menos cinco ou 10 minutos por dia, mesmo que fosse de suas casas. Não mudarei nada disso. Podem ser adequadas algumas programações, criando programas sobre a história da rádio, por exemplo. É claro que precisamos inovar, mas eu penso que um equipamento pode ser substituído e virar museu, mas o ser humano não, ele carrega uma história e precisamos valorizá-la (PERTILE, 2014). 88 Já o diretor do Grupo RSCOM revela que os investimentos recentes do grupo são no sentido de ampliar a produção e conteúdo em plataformas variadas. A exemplo disso, em 2014, a empresa implantou um estúdio de vídeo para a gravação de programas e boletins a serem veiculados pelo portal do grupo na internet: o www.leouve.com.br. Essas mudanças, segundo Marcos Piccoli, não vêm sendo promovidas apenas como resposta à migração, mas como um recurso contra a queda de audiência do rádio convencional: As mudanças não se justificam somente pela migração da Viva 1070. Uma pesquisa realizada pela Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República (SECOM) apontou que o rádio perdeu quase 30% da audiência nos últimos anos. Ou seja, o jovem não ouve rádio, migrou para outras plataformas. Então, não estamos pensando apenas na Viva 1070, mas em todos os veículos do grupo RSCOM. Definimos que, nos próximos anos, vamos investir em novas mídias. Estamos buscando ter vídeo e uma estrutura de web mais robusta para comportar nossas mídias, de modo a estarmos onde o consumidor está: a internet. A tendência da mídia é estar na nuvem. O modelo de publicidade ainda é muito complexo, mas é isso: o off-line vai perder espaço. Temos visto que o que faz a diferença no dia a dia é o conteúdo, então estamos investindo também em reportagem para todas as emissoras do grupo de modo a termos conteúdo de qualidade independente da plataforma (PICCOLI, 2014). Com o alcance das redes sociais e o poder da interatividade na programação da rádio, Piccoli ainda adianta que o grupo deve aperfeiçoar os canais de interação com o público: Principalmente em função das redes sociais, o ouvinte tem cada vez mais poder diante da produção de conteúdo. Precisamos estar preparados para receber esse tipo de demanda ligada à interatividade. As redes sociais têm o problema de que muitas pessoas se mascaram e fazem um mau uso, mas precisamos interagir através de todas as plataformas e a web proporciona muitas ferramentas nesse sentido – não somente redes sociais, mas portais e aplicativos oferecem ao ouvinte rádios de todo o mundo para acesso livre. Estamos ainda buscando o melhor formato para oferecer essa estrutura, o que demandará mais pessoas e equipamentos. Atualmente, não temos uma equipe específica para a interatividade. É o comunicador do ar que faz a interação com o ouvinte e com o comercial (PICCOLI, 2014). 89 Em consonância com as expectativas dos gestores entrevistados, a Anatel anunciou, no dia 13 de junho, a abertura de uma consulta pública para o recebimento de contribuições para a mudança no Plano Básico de Distribuição de Canais de Radiodifusão Sonora em Frequência Modulada (PBFM) no Rio Grande do Norte, possibilitando a migração das rádios AM daquele estado. Essa deve ser a primeira de uma série de consultas que a agência procederá em todo o país. As sugestões “devem ser encaminhadas por meio de formulário eletrônico [...] até às 24h do dia 4 de julho” (AGERT, 2014). Ainda de acordo com notícia publicada no portal da Abert, “foram contemplados todos os 24 canais de FM solicitados pelas emissoras AM durante sessão pública realizada no estado para pedidos de migração. Na proposta, também foram excluídos canais de FM, mas todos estavam vagos” (idem). 5.5 ANÁLISE DAS ENTREVISTAS A partir das falas dos entrevistados Volnei Pertile, diretor da Rádio Difusora 890 AM, e Marcos Piccoli, diretor da Rádio Viva 1070 AM, é relevante pontuar que, a priori, as rádios estão preparadas para os investimentos operacionais que a migração demandará, como a substituição de antenas e aquisição de novos transmissores, seja através de recursos próprios ou lançando mão das opções de financiamento disponibilizadas pelo BNDES. Ademais, as emissoras pretendem efetivar a migração para o FM, independentemente do valor anunciado pelo Ministério das Comunicações (Minicom) a título de diferença de outorga. Ambas consideram a relevância da migração como alternativa para a sobrevivência comercial e ferramenta para uma reconquista dos ouvintes que atualmente acessam o conteúdo apenas pelas redes sociais e internet. Estabelecidas as questões financeiras que permeiam a migração, o aspecto técnico que mais preocupa as emissoras entrevistadas é a possibilidade de uso da faixa 90 estendida, caso seja definido pelo Minicom que a faixa atual do espectro não comporte duas novas emissoras. Fatalmente, esse cenário imporia a troca de todos os receptores, pois, na atualidade, nenhum aparelho de rádio sintoniza a faixa estendida. Por parte das rádios, seria necessário um planejamento sofisticado para a migração, já que caberia a elas convencer o ouvinte a adquirir novos aparelhos – que, sequer, estão disponíveis no mercado brasileiro atualmente. Ou, num cenário ainda mais complexo, seria indicada uma parceria com a indústria automotiva, garantindo que os carros saíssem de fábrica equipados com rádio em faixa estendida. Para todas essas questões de adaptação, as emissoras contam com a autorização do governo para transmissão simultânea durante cinco anos, possibilidade que a lei aventa, mas não garante. Com expectativa compartilhada entre as emissoras ouvidas de que as primeiras migrações ocorrerão ainda em 2014 em algumas cidades com maior facilidade de estudos técnicos, é pertinente salientar que um projeto contemplando o aspecto do conteúdo deveria estar em plena execução pelas rádios. A melhor qualidade de som aliada à multiplicidade de pontos de acesso, traz à tona uma questão: as rádios migrarão para o FM levando consigo o estilo de programação do AM? Cada uma a sua maneira, as rádios declaram estar se preparando para a entrada no FM, mas o fato é que ainda não se prospectam inovações no modo de fazer rádio. Os investimentos levados a efeito estão mais ligados à ampliação da cobertura da emissora para outras plataformas e outros municípios do que propriamente à idealização de conteúdos diferenciados. Considerando um cenário em que a maior audiência do rádio se dá nos horários de pico, quando o ouvinte está no trânsito com o rádio ligado e off-line das redes sociais, parece existir um cenário propício à produção de conteúdos dinâmicos, em outros formatos. Entretanto, há pouco espaço para novas vozes e a grade ainda está concentrada nos programas bem sucedidos no passado: radiojornal, debates, transmissão esportiva, plantão policial e música popular. 91 Ocorre questionar por quanto tempo as emissoras manterão o modelo tradicional e se intencionam oferecer novas experiências para o ouvinte no FM. 6 NOTAS CONCLUSIVAS O rádio nasceu com a promessa de ser um fiel companheiro do ouvinte, levando informação e divertimento, quando muitos não sabiam ler e quando a televisão era um invento inimaginável. Imponente, muitas vezes talhado em madeira nobre, reinou como protagonista na sala de estar da família brasileira, reunindo pais, filhos e vizinhos ao seu redor até a chegada de um aparelho que deu rostos àquelas vozes. A televisão roubou o status quo do rádio, mas não ameaçou sua popularidade prontamente. Sem lugar de honra na estante, ele ganhou ainda mais importância a partir da transistorização. Portátil, tornou-se um acompanhante de seu público. Chegou aos carros, aos ônibus e, à pilha, pôde ser levado aos estádios de futebol. A chegada da televisão, a partir da década de 1950, marcou o fim da era do rádio ao ameaçar dois dos quatro pilares que sustentavam sua programação: as radionovelas e os programas de variedades, calouros e humor. Com a agregação de imagem ao som, esses programas naturalmente tiveram aceitação imediata na nova tecnologia disponível. O início das transmissões regulares e comerciais do FM no Brasil, a partir de 1968, incitou novas mudanças no rádio e impulsionou o processo de segmentação que se intensificara nas décadas de 1970 e 1980. Com qualidade superior de áudio, as estações em Frequência Modulada, que iniciaram suas atividades transmitindo música ambiente e tinham como público-alvo empresas e consultórios médicos, logo cativam jovens ouvintes e assumem sua vocação musical. Com essa realidade imposta, coube ao rádio AM aproveitar-se do trinômio composto por aparelhos de baixo custo, alcance superior de sinal e instantaneidade de transmissão – que a televisão ainda não oferecia por limitações técnicas – para fidelizar o ouvinte com sua programação jornalística/esportiva. Em sua história no Brasil, o rádio teve primórdios imponentes, mas logo enfrentou a pressão para manter sua relevância como meio de comunicação. Obteve 93 algumas conquistas que alavancaram sua penetração no país, como os exemplos citados anteriormente: o transistor, que levou para as ruas o pesado aparelho até então prostrado na casa das pessoas, e as emissoras FM, que trouxeram qualidade à música transmitida pelo rádio. Na maior parte do tempo, contudo, o que o rádio fez foi resistir aos avanços de outras mídias, perdendo gradativamente espaço e importância no mercado. A partir de 2000, os lares passaram a ter mais televisores do que rádios, segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD). Nos anos que se seguiram, a internet e a telefonia móvel impactaram irremediavelmente o setor radiofônico. Enquanto o IBGE afere uma curva ascendente em relação à presença de telefones celulares e computadores, o número de lares com aparelho convencional de rádio vem caindo expressivamente. Em 2002, havia rádio em 87,8% das residências pesquisadas; em 2012, eram 80,9%. Embora os números não indiquem simplesmente que não se ouve mais rádio, eles expressam que o brasileiro o faz utilizando outras ferramentas que não o aparelho convencional. O processo de digitalização chega nesse contexto em que o rádio está perdendo espaço não apenas para outros veículos de comunicação, mas para outras formas de fazer rádio. Muito se questiona sobre qual o real objetivo da digitalização, que envolverá altíssimos investimentos e poderá não resultar em retorno para os radiodifusores, já que se pode ouvir rádio pela internet e pelos celulares. Nelia Del Bianco elucida a questão, indicando que não digitalizar significa deixar de participar do código comum que é a base da convergência, abrindo mão da possiblidade de chegar ao ouvinte com melhor qualidade de som e novos conteúdos agregados. As primeiras autorizações para testes com rádio digital no Brasil foram expedidas pela Anatel em 2005 e, nesses nove anos, o governo não pôde ainda definir sequer o modelo digital mais adequado para implantação no país. A morosidade que se imprimiu aos estudos e testes do rádio digital no Brasil indica que nem o governo nem o mercado estão preparados para tamanha revolução. O desdobramento mais recente 94 sobre o assunto ocorreu na última reunião do Conselho Consultivo do Rádio Digital, em junho de 2013. Na ocasião, foram definidos novos testes com os padrões HD Radio e DRM em 10 emissoras FM de São Paulo, cinco emissoras AM em todo o país e 40 emissoras comunitárias de Santa Catarina. O cronograma dos trabalhos previa a importação de equipamentos até outubro de 2013 e a realização dos testes entre novembro daquele ano e janeiro de 2014. O processo foi estancado a partir do anúncio da migração das rádios AM e a publicação do decreto presidencial de novembro de 2013. Desde então, todo o esforço do Ministério das Comunicações e Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) tem sido no sentido de sistematizar os pedidos de migração e proceder com os estudos técnicos que determinarão a disponibilidade de espaço no espectro, de acordo com o plano básico de distribuição dos canais. As emissoras de rádio AM representam atualmente 40% do total das 4,5 mil emissoras de rádio legalmente instituídas no Brasil e o pedido de migração foi protocolado por 80% delas. O decreto presidencial que autoriza a migração foi publicado em novembro de 2013 e os procedimentos para a solicitação da adaptação de outorga foram definidos pelo Ministério das Comunicações em março de 2014, determinando como os processos serão analisados. Ainda pesa para as rádios AM de Bento Gonçalves a indefinição dos custos dessa operação. Tanto a Rádio Difusora 890 quanto a Rádio Viva 1070, emissoras AM sediadas no município e consultadas para este trabalho, protocolaram junto ao Minicom seus pedidos de migração e afirmam estar preparadas para os investimentos em equipamento de transmissão. Entretanto, ambas mostram-se apreensivas em relação à diferença entre o valor da outorga AM e FM, que deverá ser paga ao governo e cujos parâmetros não foram divulgados até a presente data. O Ministério das Comunicações defende que a mudança acarretará uma recuperação da audiência dessas emissoras, prejudicada não apenas pelas interferências de transmissão sofridas pelo AM, mas também porque elas não estão acessíveis ao ouvinte em celulares, tablets ou, mesmo, nos receptores automotivos mais modernos. 95 Mas é preciso situar que, tanto a digitalização quanto a migração da AM para FM, são apenas condições técnicas para o reposicionamento do rádio no mercado. É somente através de um conteúdo atrativo, diferenciado e identificado com a regionalidade do ouvinte que esse rádio poderá manter seu espaço ou, eventualmente, recuperar parte da audiência perdida. Em décadas passadas, o conteúdo do rádio foi repensado para sobreviver à televisão, para aproveitar a miniaturização e para dividir espaço com a FM quando de seu surgimento. Porém, nesse momento de migração que prenuncia o fim do rádio AM, não se percebe uma sistematização de projetos e investimentos voltados ao conteúdo. Nas emissoras estudadas, a realidade é de uma preocupação muito mais latente com os custos operacionais da migração. Rádio Difusora 890 e Rádio Viva 1070 estão acompanhando o processo de migração e se declaram financeiramente preparadas – seja com reservas próprias ou por meio de financiamento bancário – para a compra de novos transmissores e antenas. O temor principal diz respeito ao valor que será cobrado pelo Ministério das Comunicações a título de diferença da outorga necessária para operação. Esses valores ainda não foram definidos pelo governo, embora exista a expectativa da migração das primeiras emissoras ainda este ano. Enquanto se mostra latente a apreensão pelas questões técnicas que envolvem a migração, parece estar em segundo plano a preocupação com a programação a ser transmitida, dando a entender que o modelo permanecerá o mesmo, transferindo-se a emissora do AM para o FM. Mesmo que intencionem algum incremento na programação, não parece claro para as emissoras de que forma isso ocorrerá. De um lado, a Rádio Difusora planeja a abertura de novas sucursais para uma maior cobertura das cidades a seu alcance. De outro, a Viva anuncia que já está investindo em uma estrutura mais robusta de web que comporte os conteúdos da emissora e garanta a rápida interatividade com o ouvinte. Ambas estão fortemente 96 presentes no Facebook e apostam em sua relevância na captação e fidelização do público nos próximos anos. De fato, as rádios movimentam um número expressivo de seguidores em suas fan pages na rede social, mas não se pode precisar quanto desse público virtual reverte-se em audiência para a emissora, ou mesmo se esse público já teve acesso à emissora pelo menos uma vez. Esse comportamento tipicamente convergente garante a visibilidade das rádios, mas não sua sobrevivência como meio de comunicação. Tanto Difusora quanto Viva estão fortemente ligadas à cultura do rádio dos anos 1980, com estilo popular de locução, grade de programação similar, vozes imponentes e trejeitos típicos do AM. Percebe-se um baixo grau de renovação das equipes, em que os âncoras da programação permanecem sendo os mesmos radialistas que conduzem o rádio local nos últimos 20 anos. Aos novos profissionais, cabem somente as funções ligadas à produção e reportagem. Naturalmente, sabe-se que as funções de ar exigem experiência e desenvoltura, além de prudência na emissão de opiniões. Isso justifica a permanência dos radialistas de carreira, mas não a estagnação do fazer radiofônico. Também predomina entre as emissoras a locução masculina. Até junho de 2014, inexistiam mulheres na apresentação da programação das duas rádios. Com a promoção da repórter Marina Teles à produção e apresentação do radiojornal do meiodia na Rádio Viva, ela é a única representante feminina nos microfones das emissoras estudadas. A Sociedade Brasileira de Engenharia de Televisão (SET) prevê que primeira fase da migração deva ser concluída entre 24 e 27 de agosto de 2014, com expectativa de anúncio das primeiras emissoras autorizadas a migrar durante seu congresso anual. Ou seja, supõe-se que o processo da migração correrá em curto prazo, liberando espaço no espectro para outros usos ainda desconhecidos. Porém, a melhor qualidade de som, aliada à multiplicidade de pontos de acesso, traz à tona a necessidade de capacitação de equipes e geração de novos 97 conteúdos, já que a migração por si só não reverterá a queda de público e mídia do setor radiofônico. Até o momento, as rádios AM de Bento Gonçalves que solicitaram migração têm-se ocupado mais com os custos dos equipamentos. Não está nos planos imediatos das emissoras uma análise em profundidade do conteúdo atualmente produzido, no intuito de verificar quanto da programação realmente supre as expectativas do ouvinte. Também parece necessário um planejamento de mídia para a execução de novos projetos e para a atração de anunciantes que viabilizem todo o investimento feito em transmissores e antena para a migração. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AGERT. 140 emissoras fizeram o pedido de migração para o FM no Estado. Associação gaúcha de Emissoras de Rádio e Televisão. 30 de mar. 2014. Disponível em: < http://www.agert.org.br/index.php?option=com_content&view=article&id=16683:140emissoras-fizeram-o-pedido-de-migracao-para-o-fm-no-estados&catid=2:noticias > Acesso em: 16 mai. 2014 ABERT. Anatel abre primeira consulta pública para migração do rádio AM. Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão. Brasília, 16 jun. 2014. Disponível em: < http://www.abert.org.br/web/index.php/notmenu/item/22917-anatelabre-primeira-consulta-publica-para-migracao-do-radio-am > Acesso em: 22 jun. 2014. ______. Migração AM: Passo-a-passo e Perguntas Frequentes. Brasília, 10 abr. 2014. Disponível em: < http://www.abert.org.br/web/index.php/migracao-am > Acesso em: 5 mai. 2014. ______. Relatório dos testes realizados em estações de OM e FM que utilizam o padrão Iboc. In: Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão. Brasília, 2 dez. 2008. 556 p. Disponível em: < http://www.anatel.gov.br/Portal/verificaDocumentos/documento.asp?numeroPublicacao= 223480&assuntoPublicacao=Relat%F3rio%20IBOC%20%20Abert/Mackenzie&caminhoRel=In%EDcio-Radiodifus%E3oApresenta%E7%E3o&filtro=1&documentoPath=223480.pdf > Acesso em: 3 mai. 2014. ALENCAR, Marcelo S.; LOPES, Waslon T. A.; ALENCAR, Thiago T.. O Fantástico Padre Landell de Moura e a Transmissão sem Fio. Disponível em: < http://www.memoriallandelldemoura.com.br/imagen/documentos/fantastico_landell.pdf > Acesso em: 17 mar. 2014. ALVES, José Eustáquio Diniz. As Características dos Domicílios Brasileiros entre 1960 e 2000. Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE. Escola Nacional de Ciências Estatísticas, Rio de Janeiro, 2004. Disponível em: < http://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv3124.pdf > Acesso em: 22 abr. 2014. BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70, 2000. 225 p. 99 BENTO GONÇALVES. Órgãos de comunicação e divulgação em Bento Gonçalves: jornais locais. Disponível em: < http://www.bentogoncalves.rs.gov.br/municipio/enderecos-e-telefones/orgaos-decomunicacao-e-divulgacao > Acesso em: 21 jun. 2014 BRASIL. Câmara dos Deputados. Decreto nº 21.111, de 1º de março de 1932. Regulamentação da radiocomunicação. Legislação informatizada. Disponível em: < http://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1930-1939/decreto-21111-1-marco-1932498282-publicacaooriginal-81840-pe.html > Acesso em: 14 mar. 2014. ______. Decreto nº 20.047, de 27 de maio de 1931. Regula a execução dos serviços de radiocomunicações no território nacional. Legislação informatizada. Disponível em:< http://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1930-1939/decreto-20047-27-maio1931-519074-publicacaooriginal-1-pe.html > Acesso em: 14 mar. 2014. ______. Lei nº 4.117, de 27 de agosto de 1962. Institui o Código Brasileiro de Telecomunicações. Disponível em:< http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l4117.htm > Acesso em: 14 mar. 2014. ______. Lei nº 12.965, de 23 abril de 2014. Estabelece princípios, garantias, direitos e deveres para o uso da Internet no Brasil. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2014/lei/l12965.htm > Acesso em: 23 abr. 2014. ______. Portaria nº 126, de 12 de março de 2014. Dispõe sobre a implantação e o funcionamento do processo eletrônico no âmbito do Ministério das Comunicações. In: Diário Oficial da União, Brasília, 2014. Disponível em: < http://www.jusbrasil.com.br/diarios/67511183/dou-secao-1-13-03-2014-pg-74 > Acesso em: 12 mai. 2014 ______. Censo Demográfico 2010: Resultados Preliminares da Amostra. IBGE. Censos Demográficos. Disponível em: < http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/censo2010/resultados_preliminares_ amostra/default_resultados_preliminares_amostra.shtm > Acesso em: 22 abr. 2014. 100 ______. Decreto nº 8.139, de 7 de novembro de 2013. Decreto de migração de AM para FM. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato20112014/2013/Decreto/D8139.htm > Acesso em: 12 mai. 2014. ______. Lei nº 9.612, de 19 de fevereiro de 1998. Institui o Serviço de Radiodifusão Comunitária e dá outras providências. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9612.htm > Acesso em: 6 abr. 2014. ______. Portaria nº 290, de 30 de março de 2010. Institui o Sistema Brasileiro de Rádio Digital. Ministério das Comunicações. Disponível em: < http://www.mc.gov.br/component/content/article/273-lex/portarias/25477-portaria-n-290de-marco-de-2010 > Acesso em: 3 mai. 2014. ______. Portaria nº 365, de 14 de agosto de 2012. Cria o Conselho Consultivo do Rádio Digital. Ministério das Comunicações. Disponível em: < http://www.mc.gov.br/component/content/article/273-lex/portarias/25593-portaria-n-365de-14-de-agosto-de-2012 > Acesso em: 3 mai. 2014. ______. Congresso Nacional. Projeto de Lei. Estabelece princípios, garantias, direitos e deveres para o uso da Internet no Brasil. Disponível em: < http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=912989&filena me=PL@126/201 > Acesso em: 23 abr. 2014. ______. Governo define regras para migração das emissoras AM para FM. In: Portal Brasil, 12 mar. 2014. Disponível em: < http://www.brasil.gov.br/infraestrutura/2014/03/governo-define-regras-para-migracaodas-emissoras-am-para-fm > Acesso em: 12 mai. 2014. CALABRE, Lia. A era do rádio. 2.ed. Rio de Janeiro: J. Zahar, 2004. 59 p. CAPRARA, Bernardete S.; LUCHESE, Terciane Ângela. FUNDAÇÃO CASA DAS ARTES; BENTO GONÇALVES (RS). Da colônia Dona Isabel ao município de Bento Gonçalves 1875 a 1930: história. Bento Gonçalves, RS: Fundação Casa das Artes, 2005. 583 p. CASAGRANDE, Amélio Leonardo. Histórias da nossa história: Bento Gonçalves. Bento Gonçalves, RS: Ed. do Autor, 1994. 68 p. 101 COGO, Denise Maria. No ar... uma rádio comunitária. São Paulo: Paulinas, 1998. 226 p. DEL BIANCO, Nélia R.; MOREIRA, Sônia Virgínia (org.). Rádio no Brasil: tendências e perspectivas. Rio de Janeiro: Universidade do Estado do Rio de Janeiro, 1999. 231 p. ______. E tudo vai mudar quando o Digital chegar. In: BARBOSA FILHO, André, PIOVESAN, Ângelo e BENETON, Rosana (orgs). Rádio, sintonia do futuro. São Paulo: Paulinas, 2004. Disponível em: < http://www.bocc.ubi.pt/pag/bianco-nelia-radiodigital.pdf > Acesso em: 22 abr. 2014. ______. Rádio e o cenário da convergência tecnológica. In: DEL BIANCO, Nelia R. (org.). O Rádio Brasileiro na Era da Convergência. São Paulo: INTERCOM, 2012. DRM. What is DRM? In: DRM Digital Radio. Disponível em: < http://www.drm.org/?page_id=99 > Acesso em: 30 abr. 2014. EBC. Brasil registra crescimento de 55% de acessos à internet em 2013. Portal EBC, 31 de janeiro de 2014. Disponível em: < http://www.ebc.com.br/noticias/brasil/2014/01/brasil-registra-133-milhoes-de-acessos-ainternet-banda-larga-em-2013 > Acesso em: 14 abr. 2014. ______. Entenda o Marco Civil da Internet ponto a ponto. Portal EBC, 22 de abril de 2014. Disponível em: < http://www.ebc.com.br/tecnologia/2014/04/entenda-o-marcocivil-da-internet-ponto-a-ponto > Acesso em: 23 abr. 2014. FEDERICO, Maria Elvira Bonavita. História da comunicação: rádio e TV no Brasil. Petrópolis, RJ: Vozes, 1982. 167 p. FERRARETTO, Luiz Artur. Rádio: o veículo, a história e a técnica. 2. ed. Porto Alegre: Sagra Luzzatto, 2001. 375 p. FILHO, André Barbosa. As Políticas Públicas de Comunicação para o Rádio Brasileiro: Regulação Digitalização e Integração. Conexão – Comunicação e Cultura, UCS, Caxias do Sul, v. 4, n. 7, p. 135-148, jan./jun. 2005. Disponível em: < http://www.ucs.br/etc/revistas/index.php/conexao/article/viewFile/166/157 > Acesso em: 22 abr. 2014. 102 FILHO, Barbosa André. As políticas de comunicação para o rádio brasileiro: Regularização, digitalização e integração. Disponível em: < http://www.ucs.br/etc/revistas/index.php/conexao/article/viewFile/166/157 > Acesso em: 22 abr. 2014 G1. Sanção ao Marco Civil da Internet é publicada no 'Diário Oficial'. São Paulo, 24 abr. 2014. Disponível em: < http://g1.globo.com/politica/noticia/2014/04/sancao-aomarco-civil-da-internet-e-publicada-no-diario-oficial.html > Acesso em: 25 abr. 2014 GIL, Antonio Carlos. Métodos e técnicas de pesquisa social. 5.ed. São Paulo: Atlas, 1999. 206 p. HD Radio Digital AM & FM. [website] Disponível em < http://hdradio.com > Acesso em: 25 abr. 2014. iBiquity Digital. [website] Disponível em: < http://www.ibiquity.com > Acesso em: 25 abr. 2014. JAMBEIRO, Othon; FERREIRA, Fabio. O Brasil na sociedade da informação: Estado regulador e telecomunicações. Conexão: Comunicação e Cultura, Caxias do Sul, v. 2, n. 4, p. 103-117, jul. 2003. KISCHINHEVSKY, Marcelo. O rádio sem onda: convergência digital e novos desafios na radiofusão. Rio de Janeiro: E-Papers, 2007. 136 p. LEINER, Barry M. et. al. Breve historia de internet. Internet Society. Disponível em: < http://www.internetsociety.org/es/breve-historia-de-internet > Acesso em: 14 abr. 2014. MAROTTA, Yapir. Testes de Rádio Digital: posição em agosto de 2006. In: Congresso de Tecnologia de Rádio, Televisão e Telecomunicações. Anatel: 2006. Disponível em: < http://www.anatel.gov.br/Portal/verificaDocumentos/documento.asp?numeroPublicacao= 287169&assuntoPublicacao=Testes%20de%20R%E1dio%20Digital&caminhoRel=null&fi ltro=1&documentoPath=287169.pdf > Acesso em: 23 abr. 2014. 103 MARTINS, Nair Prata Moreira. Webradio: novos gêneros, novas formas de interação. Disponível em < http://www.bibliotecadigital.ufmg.br/dspace/bitstream/handle/1843/AIRR7DDJD8/nair_prata_tese.pdf?sequence=1 > Acesso em 25 abr. 2014. MASCARENHAS, Sidnei A. (Org.). Metodologia científica. São Paulo: Pearson, 2012. Disponível em : < https://ucsvirtual.ucs.br/startservico/PEA/ >. Acesso em: 5 mai. 2014. MINICOM. MiniCom divulga lista com os números de protocolos das emissoras que solicitaram a migração para FM. In: AGERT, Associação gaúcha de Emissoras de Rádio e Televisão, 6 de maio de 2014. Disponível em: < http://www.agert.org.br/index.php?option=com_content&view=article&id=16704:minicom -divulga-lista-com-os-numeros-de-protocolos-das-emissoras-que-solicitaram-amigracao-para-fm&catid=2:noticias > Acesso em: 16 mai. 2014 MINISTÉRIO DAS COMUNICAÇÕES. 80% das emissoras solicitaram mudança para a faixa FM. In: ABERT - Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão.11 de abr. 2014. Disponível em: < http://www.abert.org.br/web/index.php/notmenu/item/2261880-das-emissoras-solicitaram-mudanca-para-a-faixa-fm > Acesso em: 26 mai. 2014. ______. Migração das rádios AM para a faixa FM. 28 mar. 2014. Disponível em: < http://www.comunicacoes.gov.br/acoes-e-programas/radiodifusao/migracao-das-radiosam > Acesso em: 29 mai. 2014. MLA. Guglielmo Marconi - Nobel Lecture: Wireless Telegraphic Communication. Nobelprize.org. Nobel Media AB 2013. Web. Disponível em: < http://www.nobelprize.org/nobel_prizes/physics/laureates/1909/marconi-lecture.html > Acesso em: 17 Mar. 2014. O PARÁ NAS ONDAS DO RÁDIO. Disponível em: < http://www.oparanasondasdoradio.ufpa.br > Acesso em: 14 abr. 2014. PEREIRA; Lívia Daniela Antunes. et al. A implantação do rádio digital no Brasil. In: XV Congresso de Ciências da Comunicação na Região Sudeste, Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação, 2010, Vitória. Artigo. Bauro: Universidade Estadual Paulista, 2010. 14 p. Disponível em: < http://www.intercom.org.br/papers/regionais/sudeste2010/resumos/R19-1171-1.pdf > Acesso em: 23 abr. 2014 104 PIERANTI, Octavio. Rádio Digital no Brasil. In: Ministério das Comunicações, Apresentações Conselho Consultivo. Apresentação. Governo Federal, 2013. Disponível em: < http://www.mc.gov.br/apresentacoes-conselho-consultivo > Acesso em: 5 mai. 2014 PORTAL BRASIL. Dilma decreta migração de rádios AM para FM. Agência Brasil, 7 nov. 2013. Disponível em: < http://www.brasil.gov.br/infraestrutura/2013/11/dilmadecreta-migracao-de-radios-am-para-fm > Acesso em: 12 mai. 2014. PRADO, Magaly. História do rádio no Brasil. São Paulo: Da Boa Prosa, 2012. RÁDIO. In: Dicionário Priberam da Língua Portuguesa. Acesso em: < http://www.priberam.pt/dlpo/r%C3%A1dio > Acesso em: 14 mar. 2014 ______. In: Michaelis Dicionário Moderno. Disponível em: < http://michaelis.uol.com.br/moderno/portugues/index.php?lingua=portuguesportugues&palavra=r%E1dio > Acesso em: 14 mar. 2014. RÁDIO VIVA 1070. Viva FM: Grupo RSCOM. Disponível em: < http://www.radioviva1070.com.br/ > Acesso em: 20 mai. 2014. RIBEIRO, Stênio. Brasil registra crescimento de 55% de acessos à internet em 2013. Portal EBC, 31 jan. 2014. Disponível em: < http://www.ebc.com.br/noticias/brasil/2014/01/brasil-registra-133-milhoes-de-acessos-ainternet-banda-larga-em-2013 > Acesso em: 14 abr. 2014. SET. Deflagrado o processo de migração das emissoras de rádio AM para FM. Sociedade Brasileira de Engenharia de Televisão, 24 de março de 2014. Disponível em: < http://migre.me/k2RyU > Acesso em: 26 mai. 2014. SOUTO, Alceu Salvi. Rádio Viva: uma história de 50 anos - uma rádio de muitas vidas. Bento Gonçalves, RS: Arte & Texto, 1997. STRUBLE, Bob. Beating the Chicken and Egg Dilemma. In: iBiquity Digital. [website] Disponível em: < 105 http://www.ibiquity.com/about_us/bobs_column_thoughts_on_radios_digital_future > Acesso em: 28 abr. 2014. TORRES, Bruno Araújo. Um perfil das rádios comunitárias no Brasil. In: FERRARETTO, Luiz Artur; KLÖCKNER (org.). E o rádio?: Novos horizontes midiáticos [recurso eletrônico]. Porto Alegre: Edipucrs, 2010. p. 255-267. Disponível em: < www.pucrs.br/orgaos/edipucrs > Acesso em: 14 mar. 2014. VERONESE, Marília Veríssimo; GUARESCHI, Pedrinho Arcides. Hermenêutica de Profundidade na pesquisa social. In: Ciências Sociais Unisinos. Unisinos, 2006. v. 42, n. 2, p. 85-93 WORLD DMB. Defining the future of digital radio. Disponível em: < http://www.worlddab.org/ > Acesso em: 14 abr. 2014.