Entrevista com o Ministro Marco Farani, diretor da Agência Brasileira de Cooperação, realizada no dia 27 de janeiro de 2012, concedida ao Núcleo de Cooperação Técnica do BPC. Núcleo de Cooperação Técnica: Qual a importância da Cooperação Sul-Sul (CSS) para a política externa brasileira? Marco Farani: A cooperação Sul-Sul é uma importante ferramenta de política externa. A partir da cooperação Sul-Sul o Brasil pode oferecer, a outros países em desenvolvimento, suas boas práticas e suas experiências face a desafios comuns, já testadas aqui, num país em desenvolvimento. Espera-se, assim, com a cooperação SulSul, ajudá-los a enfrentar os desafios do combate à pobreza e do subdesenvolvimento, caminhando para a construção da justiça social. Essa atuação ajuda a construir uma musculatura para política externa brasileira, dando a ela concretude. Pela cooperação internacional Sul-Sul, o Brasil passa a ocupar espaços na agenda internacional que estavam desocupados. Por exemplo, o campo da agricultura tropical, o campo da saúde tropical, políticas de desenvolvimento social, entre outros. Em todos esses já temos uma bagagem aqui testada e produzimos resultados importantes, incluindo milhões de pessoas na economia. Acredito que o Brasil pode ter na cooperação uma ferramenta à sua disposição para consolidar relações e, assim, materializar uma política externa virtuosa, sempre baseada nos princípios da não intervenção e da solução pacífica dos conflitos. NCT: Qual a importância da Cooperação Sul-Sul para os BRICS e entre os BRICS? MF: Entre os BRICS nós não temos cooperação. Nós não temos nenhuma cooperação com a China, com a Índia e com a Rússia tampouco. A África do Sul, recentemente incluída nos BRICS, é uma exceção. Com ela temos algumas iniciativas de cooperação, com o Brasil participando como parte prestadora. No entanto, entre os países do BRICS não há uma tradição de cooperação técnica. No entanto, os BRICS tem um importante papel a desempenhar na política internacional, fundamentado no tamanho de suas economias e em sua influência política internacional crescente. Portanto, espera-se dos BRICS uma atuação mais consistente no campo da ajuda ao desenvolvimento. NCT: Durante as reuniões do Fórum de Busan, houve alguma coalizão ou posicionamento conjunto por parte dos países do BRICS? Existe algum interesse comum aos países desse bloco no que tange à CSS? MF: Em Busan, houve algo inédito: todos os países presentes, inclusive Brasil, China, Índia e Rússia, apoiaram a declaração final. A declaração reconhece e incorpora no processo de reflexão a cooperação Sul-Sul, vista agora como uma ferramenta de desenvolvimento. Esse é o grande feito de Busan. Além da cooperação Sul-Sul, também foram incorporados outros atores: a Sociedade Civil, o setor privado e as ONGs de modo geral. Busan reflete o interesse de toda a comunidade internacional doadores e receptores - de trabalharem de forma construtiva, crescente e harmônica no campo da cooperação em suas mais diversas áreas e modalidades. NCT: Ao final do Quarto Fórum foi determinada a formação de uma Parceria Global para o Desenvolvimento. A princípio, o objetivo seria estabelecer uma estrutura multilateral que integre também agentes de CSS, como o Brasil e os outros países BRICS. Dessa forma, o que essa Parceria representa para o Brasil e para a ABC? Poderíamos identificar aí uma janela institucional que favoreça os interesses do Sul? MF: Nós ainda não sabemos se vamos participar da Parceria Global para o Desenvolvimento. Em princípio, acredito que o Brasil deveria participar. A primeira reunião ocorrerá em fevereiro. Nós enviaremos um observador para depois decidir. Se interessa ao Brasil participar ou não dependerá de como o processo será conduzido. Agora, acredito que é um grande espaço para a atuação do Brasil, um espaço para liderança do Brasil junto a outros grandes países emergentes no campo da cooperação Sul-Sul na definição de conceitos, prática, modus operandi da cooperação Sul-Sul e transparência etc. NCT: Qual é a posição brasileira acerca da estrutura multilateral adequada à cooperação para o desenvolvimento? MF: Ainda não se sabe como se dará a Parceria Global para o Desenvolvimento, como ela evoluirá ou a que visa, quais os seus objetivos. Assim, nós vamos primeiro observar como o processo será construído, para onde vai, qual o seu objetivo. Dessa forma poderemos decidir se participaremos ativamente, apenas como observadores ou, eventualmente, se prosseguiremos fazendo a cooperação a nosso modo.