XII Congresso Acadêmico sobre Defesa Nacional
Academia da Força Aérea – Pirassununga, 14 a 18 de Setembro de 2015
Área Temática: Indústria nacional de defesa: possibilidades e limitações.
Título: A Cooperação Sul-Sul como Estratégia para Revitalização da Indústria de
Defesa Brasileira: o caso do míssil A-DARTER
Equipe do Curso de Relações Internacionais da UFPB:
Professor Responsável: Augusto W. M. Teixeira Júnior. Doutor em Ciência Política pela
UFPE. Professor do Departamento de Relações Internacionais da UFPB. Coordenador do
Grupo de Estudos Estratégicos e Segurança Internacional (GEESI/UFPB). Contato:
[email protected].
Aaron Campos Marcelino. Graduando do bacharelado em Relações Internacionais da UFPB.
Contato: [email protected].
Ana Carolina de Oliveira Assis. Graduanda do bacharelado em Relações Internacionais da
UFPB. Contato: [email protected].
Érick Patrício de Magalhães Vieira. Graduando do bacharelado em Relações Internacionais da
UFPB. Contato: [email protected].
Marvin Edgar Rios Guerra Hijo. Graduando do bacharelado em Relações Internacionais da
UFPB. Contato: [email protected].
Yalle Catherinne V. de Carvalho. Graduanda do bacharelado em Relações Internacionais da
UFPB. Contato: [email protected].
Resumo: A Indústria de Defesa brasileira perpassa por um processo de revitalização cujo
principal objetivo é que o setor consiga assumir plena capacidade operacional e produza
materiais e equipamentos de defesa de qualidade, para que possam ser utilizados pelas Forças
Armadas brasileiras. Para isso, é de demasiada importância as relações com os países
considerados estratégicos, os quais também desenvolvem este setor, onde o Brasil busca
cooperar a fim de conseguir o conhecimento necessário para a produção de um material de
defesa específico. Ainda assim, o acesso a tecnologias consideradas sensíveis é bastante
difícil, principalmente quando se trata de países que estão no topo da linha de produção
mundial. Logo, a chamada cooperação Sul-Sul se torna uma possível alternativa, a exemplo
da cooperação Brasil-África do Sul no desenvolvimento do míssil de 5ª geração A-Darter, a
qual se torna uma alternativa viável para a superação deste obstáculo.
Palavras-chave: Indústria de Defesa, cooperação Sul-Sul, míssil A-Darter; Brasil; África do
Sul.
1
Introdução
A Indústria de Defesa é uma ferramenta de grande importância no exercício da
soberania do país. Esta é responsável principalmente pela produção de material bélico
nacional que deverá ser operacionalizado pelas Forças Armadas do país para que estas possam
realizar desde suas funções básicas até as mais complexas – o próprio esforço da guerra, ou a
capacidade de retaliação de possíveis agressores. Quando a produção nacional não consegue
atender as demandas das Forças Armadas do seu país (BRASIL, 2012), estas muitas vezes
têm de recorrer ao mercado externo para a aquisição de materiais e equipamentos necessários
para a realização de suas funções básicas, o que aumenta sua vulnerabilidade estratégica.
Logo, pode-se dizer que uma Indústria de Defesa relativamente autônoma consegue agregar
em demasia, até de forma basilar, a atuação das Forças Armadas (FFAA) no território
nacional, ao mesmo tempo em que estas se tornam menos vulneráveis a cortes de
suprimentos, materiais ou equipamentos dos fornecedores estrangeiros, principalmente se for
necessário entrar em conflito armado. Por fim, ser capaz de produzir materiais de defesa
(MDs) de alto grau tecnológico poderá trazer vantagens de cunho tático e estratégico para as
FFAA, onde tais vantagens podem agregar capacidades a favor das mesmas num cenário de
emprego contra um possível agressor externo.
Atualmente a ID brasileira passa por um processo de revitalização, onde busca-se
recuperar a plena capacidade operacional do setor, e aumentar a sua autonomia de produção,
consequentemente que acarretará num melhor fornecimento para as FFAA brasileiras. O fim
do regime militar na década de 1980, a crise financeira e econômica que o Brasil sofria,
associado com o fim da Guerra Fria (que acarretou numa retração significativa do comércio
de armas mundial), contribuiu para que o setor de ID no país não conseguisse se sustentar,
vindo muitas empresas a falir.
Tal situação passa a se reverter em meados dos anos 2000, e mais tarde com a
aprovação da Estratégia Nacional de Defesa (END, aprovada em 2008 e reeditada em 2012),
que fora de grande importância para estabelecer as diretrizes estratégicas necessárias para
sistematizar o processo de revitalização da ID brasileira. Uma das diretrizes consistia na
estratégia de diversificação de parcerias, onde o país buscaria parceiros que fossem
considerados estratégicos para a compra, serviços ou produção conjunta de material bélico,
dando ênfase à transferência de tecnologia e a obtenção de know-how nos acordos. A
obtenção de tecnologias consideradas sensíveis sempre foi considerada um desafio, e de
demasiada dificuldade de obtenção dos centros produtores de armas mundial, onde esta
estratégia se prova ser uma alternativa a estes desafios.
O presente artigo, portanto, procura compreender se a cooperação sul-sul pode ser uma
opção vantajosa para o desenvolvimento da indústria de defesa brasileira. Para isso, se terá
como estudo de caso a cooperação entre Brasil e África do Sul no desenvolvimento do míssil
de 5ª geração denominado de A-Darter. Logo, o artigo se dividirá em dois tópicos, onde o
primeiro versará sobre este tipo de parceria de cooperação hemisférica Sul-Sul. Logo em
seguida será visto de que forma este tipo de cooperação auxilia o desenvolvimento do
processo de revitalização da Indústria de Defesa brasileira, a partir da análise do estudo de
caso.
2
1.
Cooperação Sul-Sul: uma alternativa aos centros tradicionais produtores de
materiais de defesa?
A Cooperação Internacional para o Desenvolvimento (CID) pode ser definida como
um conjunto de atividades empreendidas por atores, tanto estatais como não-estatais, a fim de
melhorar e impulsionar o desenvolvimento de países em que se encontram em situações
vulneráveis de progresso econômico, social e político (AYLLÓN, 2011).
Essa cooperação pode ser observada principalmente desde o período da Guerra Fria,
no momento após a independência de vários países e a situação de inúmeros outros que se
encontravam em desenvolvimento. As Economias que se encontravam em um estágio mais
avançado (Norte e Ocidente) empregaram um sistema de ajuda financeira e cooperação
técnica para que os países mais retardatários (Sul) atingissem o desenvolvimento. Em paralelo
a isso, um novo canal de CID foi surgindo nas décadas seguintes de 1970, esse eixo horizontal
seria o Sul-Sul, no qual, os países em desenvolvimento estavam dispostos à cooperarem entre
si a fim de obterem recursos financeiros e força política (IPEA, 2011).
Um grande marco para o aprofundamento da integração entre os países do eixo SulSul foi a aproximação do Brasil com a África, a qual foi selada em diversas áreas temáticas e
em variadas organizações internacionais. Uma das questões entre as mais abordadas no que
tange a essa cooperação é a relação do Brasil com a África do Sul. Essa atenção especial é
dada aos dois países, pois, além de serem economias emergentes com crescente comércio
bilateral, os dois mostram-se engajados em propostas multilaterais como os BRICS
(juntamente com Rússia, Índia e China) e o fórum IBAS (juntamente com a Índia),
engajamento esse que demonstra a preocupação com a discussão sobre a CID dos países
emergentes (IPEA, 2011).
Entretanto, pode-se verificar que a empreitada política e econômica brasileira se
estende para vários países através de outras organizações, como a ZOPACAS (Zona de paz e
cooperação do Atlântico Sul) e a CPLP (Comunidade dos países de língua portuguesa). Um
exemplo disso é a cooperação técnica do Brasil com Angola e Moçambique (ABDENUR &
RAMPINI, 2015).
Com a intenção de proporcionar ajuda mútua, aumento do intercâmbio comercial, uma
região estável com a redução da influência externa, como também desenvolvimento e
integração dos países para criação de uma identidade sul-atlântica, o Brasil engajou-se em
acordos em diversas áreas com os países africanos banhados pelo atlântico sul, uma dessas
áreas de extrema relevância para o país é a de Defesa (SILVA, 2014).
Em relação à questão da Defesa, diversos aspectos estão inseridos neste campo, como
por exemplo: rotas marítimas comerciais, a questão do petróleo no Atlântico, entre outras.
Então, tornou-se essencial para o Brasil priorizar - ainda mais, do ponto de vista estratégico e
geopolítico, o Atlântico Sul (AGUILAR, 2013). Se na perspectiva geopolítica o Atlântico Sul
e a África fazem sentido nos marcos de uma geoestratégia brasileira, na ótica do
desenvolvimento das capacidades e indústria de defesa é necessário avaliar o nível de
progresso tecnológico no qual o continente se encontra afim de verificar as possibilidades
efetivas de cooperação.
Em sua obra seminal, Keith Krause (1995) apresenta uma útil classificação dos países
na estrutura do sistema de transferência de armas. A seguir apresentamos a versão gráfica da
explanação de Krause.
3
FIGURA 1: Camadas da Produção da Tecnologia de Defesa.
Fonte: Krause (1995).
A partir de sua tipologia, verifica-se a seguinte estratificação:
(1) Produtores de primeira linha: aqueles que inovam na fronteira tecnológica;
(2) Produtores de segunda linha: aqueles que, através da transferência de
capacidades, produzem armas de primeira linha e as adaptam às necessidades
específicas do mercado;
(3) Produtores de terceira-linha: aqueles que copiam e reproduzem as tecnologias já
existentes, mas não desenvolvem a capacidade de inovação ou adaptação;
(4) Clientes mais fortes: aqueles que adquirem armas mais modernas;
(5) Clientes mais fracos: aqueles que não adquirem armas modernas, ou que as tem,
mas, não as utilizam.
A partir desta classificação, a maioria dos países africanos que integram a ZOPACAS
ficam entre as três últimas opções, ou apenas clientes ou produtores de terceira-linha.
Entretanto, entre esses países a África do Sul não segue a tendência e se destaca no sistema de
transferência de armas no Sul global. Ainda segundo a classificação feita por Krause, nota-se
4
que Brasil e África do Sul caminham há certo tempo na mudança de produtores de terceira
linha para produtores de segunda linha, produzindo armas e as distribuindo para o mercado
(KRAUSE, 1995).
Na literatura contemporânea, as opiniões sobre a participação brasileira na cooperação
em matéria de Defesa com os países africanos estão divididas. Os autores que possuem uma
visão mais positiva sobre esse assunto acreditam que a política externa brasileira usa essa
modalidade de cooperação com o propósito de aumentar a projeção de influência do Brasil no
meio internacional, criar novas oportunidades econômicas e parcerias políticas, fortalecendo
dessa forma a Segurança Nacional através das cooperações com países menos desenvolvidos.
Além disso, também se acredita que a cooperação Sul-Sul é um modo de promover o
desenvolvimento de uma forma eficiente, afinal através dela se encontra uma maior
aplicabilidade de soluções concebidas nos países do Sul (exemplificado por a tecnologia para
a produção de alimentos em zonas tropicais), um deslocamento das atividades de pesquisa nos
países industrializados para o setor privado, impossibilitando dessa forma a sua transferência
gratuita ou a baixo custo; e também a ausência ou grau baixo das condicionalidades
(macroeconômicas e governança) ligadas à assistência provida pelos países em
desenvolvimento.
A opinião acima é ainda complementada de forma mais crítica, quando os autores
afirmam que esse empenho do Brasil em transferência de técnicas acessíveis e eficazes na
produção do desenvolvimento não visa lucro ou estabelecimento de condicionalidades, sendo
dessa forma guiado mais por interesses comuns em prol do desenvolvimento, sem implicar na
reprodução de afastamento Norte-Sul característica da Guerra Fria. Pode-se adicionar ainda
no ponto de possibilidade, que esse tipo de cooperação vem a incluir também um esboço de
cooperação material e institucional entre as Forças Armadas dos diversos países1.
Por outro lado, existem pesquisadores que enxergam mais desafios do que
possibilidades ao olhar para a cooperação Sul-Sul. Alguns acreditam que essa cooperação não
acarretará em benefícios significantes, pois as partes não tem uma indústria de defesa
avançada, e dessa forma se geraria mais gastos do que o desejado desenvolvimento. Por
exemplo, Sérgio Luiz Cruz Aguilar coloca que "Como a relação entre o Brasil e a maioria dos
países africanos é assimétrica, a cooperação pouco acrescenta ao poder militar brasileiro"
(AGUILAR, 2013). Ademais, essa cooperação sul-sul também é vista mais como um meio
pelo qual o Brasil procura um prestígio e apoio para que eventualmente ocupe um assento
permanente no Conselho de Segurança da ONU (AYLLÓN & LEITE, 2009) do que como
uma estratégia efetiva para o desenvolvimento conjunto de capacidades militares.
Entretanto, a cooperação Sul-Sul estabelecida entre o Brasil e a África do Sul não
apenas destoa do padrão verificado pela literatura exposta acima, como apresenta a
oportunidade de verificar como articulações desta natureza podem maximizar capacidades em
nichos específicos da tecnologia militar, no caso, missilística.
2. Estudo de caso: cooperação e desenvolvimento do míssil A-Darter
O projeto para o desenvolvimento do míssil A-Darter foi uma iniciativa do governo sulafricano, o qual teve seu processo atrasado por falta de fundos. A partir da convergência de
interesses, know-how e recursos, o Brasil representou um papel de grande importância para o
do projeto e para que ambos obtivessem ganhos mútuos.
1
Os autores que veem mais possibilidades que desafios e tendo suas visões citadas acima, estão Ariana Erthal e
Danilo Marcondes (2014), Vinícius Côrrea Coelho (2010) e Bruno Ayllón Pino e Iara Costa Leite (2009).
5
De acordo com Silva (2011), as relações entre os dois países passaram a aumentar
gradualmente com o fim do regime de apartheid2 na África do Sul, sendo a década de 1990
importante para o reestabelecimento do diálogo entre os dois países. Em 2000 fora celebrado
o Acordo de Cooperação Técnica entre Brasil e África que mais tarde se provaria importante
para as negociações entre os dois países para o desenvolvimento do referido míssil. Associado
a isso, a eleição e os mandatos do presidente Lula possibilitaram uma agenda política que,
além de buscar procurar enfrentar as questões sensíveis no campo militar-doméstico, entre as
quais a revitalização da ID; também era voltada para o incremento das relações com países
africanos, o que fora um dos fatores que possibilitou a realização deste projeto (BRASIL,
1985).
Outro fator importante fora a assinatura do Acordo de Cooperação em Assuntos de
Defesa no ano de 2003, assinado pelo então Ministro da Defesa e embaixador brasileiro, José
Viegas Filho, e pelo também Ministro da Defesa da África do Sul, Misuoua Lekota (SILVA,
2011). Durante os diálogos entre ambas as partes, pode-se destacar a participação de algumas
empresas importantes, as quais viriam a ser os principais atores envolvidos no projeto do
programa A-Darter, dentre elas do lado brasileiro, a Avibras e Mectron, e do lado sulafricano, as empresas Kentron e Denel, e a agência ARMSCOR. Por fim, no ano de 2006, o
contrato de produção conjunta fora fechado pela ARMSCOR e a Força Aérea Brasileira
(SILVA, 2011).
O míssil A-Darter, que é o produto da parceria tecnológico militar entre o Brasil e
África do Sul é um míssil de quinta geração. Tem aproximadamente 3 metros de comprimento
e 90 quilos. Ele é caracterizado pela ausência de asas para manobras, onde no lugar destas
encontra-se um motor-foguete, o qual tem a capacidade de direcionar o seu empuxo. O míssil
também é capaz de realizar manobras para atingir alvos durante o ataque e busca de um
inimigo, tendo o alcance de 12 km de distância. O A-Darter também possui múltiplos
sensores de infravermelho responsáveis por realizar o imageamento térmico do cenário
operacional e possui uma grande capacidade de detecção e de rastreio de alvos. É dotado da
capacidade LOAL (Lock-On After Launch), sendo mais aptos para a superação de
contramedidas3 provenientes de possíveis alvos4. Um míssil com esse nível tecnológico
poderá somar as capacidades operacionais da FAB num primeiro momento, dando assim
vantagem no aparato bélico no que tange ao combate aéreo e sua tecnologia tem inovações
que são dominados por pouco países5.
A parceria dos dois países se deu na busca por tentar obter mais autonomia na
produção de armamento, pois esse tipo de produção é mais restrito a países que tem um bom
índice de inovação tecnológica,. Essa busca por autonomia caracteriza a tentativa de não ser
dependente de países do norte, normalmente países onde esse tipo de indústria já é
consolidada (FERNANDES et al., 2013). A cooperação Sul-Sul nesse sentido pareceu ser
uma alternativa bem viável.
O intercâmbio entre o Brasil e a África do Sul na questão da produção de mísseis ArAr ocorreu também em benefício da indústria brasileira. Com o trabalho para o
2
As relações entre os dois países estariam então abaladas por conta deste regime, e só vieram a serem retomadas
com o fim do mesmo. Ver o decreto 91.524 de agosto de 1985
3
Manobras ou ferramentas escapatórias de aeronaves rastreadas por mísseis. Uma medida comumente
implementada por uma aeronave que é rastreada por um míssil é a utilização de flares, que são compostos
inflamáveis utilizados para “confundir” o sistema de rastreamento heatseeker de mísseis terra-ar ou ar-ar. Os
mísseis de quinta-geração, como é o caso do A-Darter, tendem a superar possíveis contramedidas como tal, o
que é uma grande vantagem tática e ofensiva, principalmente no que tange o abate de aeronaves inimigas.
4
Disponível em: < http://odebrecht.com/pt-br/comunicacao/releases/mectron-participa-de-campanha-delancamento-de-misseis-da-forca-aerea>, Acessado em 09/07/2015.
5
Disponível em:
http://www.fab.mil.br/noticias/mostra/21345/CONSTRUINDO-O-FUTURO---Novom%C3%ADssil-da-FAB-est%C3%A1-90-conclu%C3%ADdo, Acessado em 09/07/2015.
6
desenvolvimento e produção destes vetores foram necessários investimentos com a
capacitação de profissionais para tal. Isso beneficiou tanto a empresas privadas quanto a
equipes da FAB que tiveram de se especializar para a produção. Segundo o Coronel Tavares,
o foco consistia em que o conhecimento fosse passado para o parque industrial brasileiro. O
investimento feito pelo Brasil permitiu todas as etapas de desenvolvimento na África do Sul,
as quais foram repetidas no Brasil por uma “equipe-espelho”6.
Os resultados desta cooperação apresentam ganhos mútuos para as empresas
envolvidas ao longo do projeto, como também para as Forças Aéreas de ambos os países.
Durante o projeto, a empresa Denel obteve liderança, tanto pelo fato deste ser um projeto da
década de 1990 do governo sul-africano, como também é uma empresa experiente no ramo de
fabricação de mísseis. Atualmente, das empresas brasileiras envolvidas que receberam
transferência de tecnologia durante o projeto, pode se citar a Mectron, uma empresa que faz
parte do grupo Odebrecht e foi a principal responsável pela coordenação e participação do
projeto do lado brasileiro. A Mectron também possui experiência no ramo de produção de
mísseis7, e avalia-se que atualmente as equipes brasileiras estariam em estágio de
conhecimento tecnológico similar para com a contraparte sul-africana.
FIGURA 2: Cronograma dos Projetos da Mectron.
Fonte: Poder Aéreo (2009)8.
6
Idem.
Disponível em: <http://www.defesanet.com.br/gripenbrazil/noticia/18085/Mectron-participa-da-integracao-demissil-do-Gripen/>, Acessado em 09/07/2015. Segundo a reportagem, a participação da Mectron só foi possível
porque a indústria brasileira já tinha um conhecimento mínimo e uma maturidade tecnológica necessários para o
desenvolvimentos de mísseis ar-ar.
8
Disponível em: < http://www.aereo.jor.br/2009/09/28/cronograma-dos-projetos-da-mectron/>, Acessado em
09/07/2015.
7
7
Outras empresas como a Avibrás e Opto Eletrônica, foram respectivamente
responsáveis por fornecer o motor do foguete e o sensor infravermelho, conhecido como
“seeker head”9.
FIGURA 3: Esquema interno do míssel A-Darter.
Fonte: Denel (Poder Aéreo, 2013)10.
Portanto, pode-se notar a complexidade do processo do programa de desenvolvimento
do míssil, mas os resultados finais são positivos, principalmente quando as empresas
brasileiras adquirem o know-how necessário para a produção deste tipo de material. Com o
êxito deste projeto, a Indústria de Defesa brasileira terá acesso à capacidade de produção de
uma ferramenta ofensiva de grande importância para a garantia da segurança do espaço aéreo
brasileiro. Uma produção mais autônoma do míssil A-Darter no Brasil possibilitará uma
maior autonomia da FAB no que tange o seu objetivo operacional de garantir o controle do
espaço aéreo brasileiro, pois mísseis tecnologicamente mais avançados aumentam as chances
de abate de uma possível aeronave hostil engajada.
Entende-se que equipar os caças brasileiros com o A-Darter agregará à capacidade
ofensiva aos caças brasileiros, sendo útil para promover dissuasão e controle do espaço aéreo
brasileiro. Funções estas que estão diretamente atreladas à defesa da soberania do país e na
garantia da segurança nacional.
Os testes já realizados pela Força Aérea sul-africana foram um sucesso,
principalmente no que tange sua capacidade de LOAL11. Tendo em vista que o projeto está
90% concluído, e são necessários apenas que se façam alguns ajustes e a certificação do
produto, o emprego do míssil A-Darter nos caças brasileiros está prevista para 2016.
Futuramente serão utilizados para equipar os Gripen NG, adquiridos pelo Brasil a fim de
substituir os antigos Mirrage 200012 e atualmente os F-5 BR como vetor de superioridade
9
Disponível em: <http://www.airforce-technology.com/projects/a-darter-air-to-air-missile/>, Acessado em
09/07/2015.
10
Disponível em: <http://www.aereo.jor.br/wp-content/uploads//2012/03/A-Darter-esquema-internoimagem-Denel.jpg> Acessado em 09/07/2015.
11
Disponível
em:
<http://www.defenceweb.co.za/index.php?option=com_content&view=article&id=38741%3Aa-darter-contractmoves-missile-programme-forward&catid=35%3AAerospace&Itemid=107>, Acessado em 09/07/2015.
12
Disponível em: <http://www.fab.mil.br/noticias/mostra/21345/CONSTRUINDO-O-FUTURO---Novom%C3%ADssil-da-FAB-est%C3%A1-90-conclu%C3%ADdo>, Acessado em 09/07/2015.
8
aérea. Por fim, as empresas envolvidas com o projeto dividirão os lucros oriundos das futuras
vendas dos mísseis.
Graças a estratégia de diversificação de parcerias, o Brasil tem mais opções para
buscar o desenvolvimento do seu setor, como forma de recorrer à dificuldade de acesso ao
conhecimento de produção para certos materiais de Defesa. A África do Sul provou ser uma
alternativa viável para cooperação em produção de material de defesa. Porém é importante
ressaltar que a África do Sul é um país que se encontra próximo, ou efetivamente no mesmo
nível do Brasil no que tange sua capacidade de produção de material bélico, principalmente
quando se vê a esquematização proposta por Keith Krause (1995).
Conclusão
Entende-se que a partir da cooperação Sul-Sul com a África do Sul o Brasil terá acesso
a um tipo de equipamento avançado e de extrema importância para a garantia da soberania do
espaço aéreo brasileiro. Esta parceria com o país africano não só possibilitará à Indústria de
Defesa brasileira a produzir o míssil A-Darter, como abre possibilidades para que as empresas
envolvidas na produção de mísseis no Brasil criem novos modelos, e talvez até mais
tecnologicamente avançados no futuro. Muito dificilmente o know-how para a produção de
mísseis tecnologicamente avançados seria disponibilizado por países avançados com suas
indústrias bélicas consolidadas, os quais dominam e controlam tecnologias sensíveis.
Este estudo de caso indica que a cooperação Sul-Sul se torna uma alternativa viável
para o desenvolvimento da Indústria de Defesa brasileira, assim como contribui para o
processo de revitalização da mesma. O Brasil não somente obterá o equipamento, como
também obtém o conhecimento necessário para sua produção no setor de indústria bélica. Este
elemento é de grande importância para agregar autonomia ao setor e à FAB. Apesar dos
ganhos vislumbrados para a economia e a indústria de defesa dos países envolvidos, o
benefício que essa cooperação tecnológica proporciona no âmbito militar é expressivo, pois o
trabalho conjunto de ambos tem como um dos focos principais no desenvolvimento do míssil
A-Darter a defesa de suas sociedades (FERNANDES ET AL., 2013).
Embora esteja previsto para que o míssil seja implementado nos caças brasileiros em
2016, por ainda estar no seu desenvolvimento final, o míssil A-Darter será uma ferramenta
essencial para garantir a segurança do espaço aéreo brasileiro, justamente pelo fato de agregar
de forma positiva a capacidade ofensiva aos caças brasileiros, principalmente no futuro
quando os caças GRIPEN NG começarem a ser efetivamente operacionalizados no Brasil.
Além dos benefícios operacionais, as possibilidades para o desenvolvimento de mísseis de 5ª
geração brasileiros estão disponíveis graças ao conhecimento adquirido, sendo, se não, a
maior conquista do resultado desta cooperação.
9
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Ciências Humanas, Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), Campinas, 2011.
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A Cooperação Sul-Sul como Estratégia para Revitalização da