Direito Grego Ana Rosa de Brito Medeiros [email protected] • Fábio Cerqueira: “Habitualmente, considera-se a civilização romana como a matriz do direito moderno. Todavia, é na Grécia que ocorreu a revolução intelectual que gerou o conceito de um direito que valha de forma igual para todos os cidadãos.” • José Cretella: “Na Grécia antiga, pela primeira vez, o direito é objeto de profundos e específicas indagações filosóficas, deixando de ser privativo dos sacerdotes, dos monarcas e dos moralistas, para ser cultivado por filósofos e juristas.” • • Conceito de Justiça Isidor Stone : • “As palavras traduzidas como “justiça” e “lei” são dikas e themistas. Essas palavras são as formas plurais de diké e themis. No singular são termos abstratos: o primeiro designa costume, a lei ou a justiça, enquanto o segundo refere-se aos que é decente ou correto conforme o estabelecido pelo costume, a tradição ou o precedente. O que Odisseu encontra na terra dos ciclopes confirma suas apreensões. Ela não é organizada como uma comunidade. Cada um vivia solitário em sua caverna individual, úmida e fedorenta, com suas mulheres, seus filhos e seus rebanhos.” • Assim os pais contavam aos filhos, para que os mesmos começassem a se interessar por justiça e lei, a fim de não passarem pelas mesmas privações dos ciclopes. • Aristóteles pregava que “o homem, quando não aperfeiçoado, é o melhor dos animais; mas quando isolado da lei e da justiça, é o pior de todos” • Segundo Michael Gagarin há três estágios de desenvolvimento do Direito em uma sociedade: • Sociedade pré-legal: Onde não há critérios estabelecidos sobre os litígios; • Sociedade proto-legal: O avanço chega com procedimentos para dirimir as disputas, porém não existem regras definidas ainda; • Sociedade legal: Estágio mais avançado de uma sociedade em crescimento. O Estado intervém nas querelas, através de normas e sanções. Há também a construção embrionária de um Direito positivado em códices. • GRÉCIA • O Direito grego percorreu estas três etapas preconizadas por Gagarin, tanto é que, no início o direito era apenas falado, e só depois houve o advento das escritas legais. • O Direito grego praticamente nasce das aspirações de Homero, pois suas obras e epopeias trazem regras de conduta, bem como as possíveis penas para a violação dessas regras, daí porque podemos afirmar que em Homero assiste-se a gestação do Direito Grego • Os gregos limitaram-se a tarefa de legislar e administrar a justiça pela resolução de conflitos. • Por conta da precariedade dos materiais de escrita da época o conhecimento que se teve desse direito só foi possível pelas contínuas transcrições e reproduções e até citações por autores posteriores. Direito grego • A escrita grega surgiu e se desenvolveu ao longo da história dessa civilização, estando intimamente ligada ao direito grego. • Apesar de ser o berço da filosofia, da democracia, do teatro, a civilização grega preferia falar a escrever e, por outro lado, se recusava em aceitar a proliferação do direito e da figura do advogado que, quando existia, não podia ser pago. Direito grego • • • • • • • Foram encontradas leis sobre: Casamento Sucessão Adoção Legitimidade de filhos Escravos Cidadania. • Os gregos tinham direito processual, foi encontrado no estudo de árbitros públicos e privados (mediação). • • • A lei ateniense era essencialmente retórica. Não existiam pessoas com as denominações de advogados, juízes e promotores. LOGÓGRAFOS = escritores de defesas, advogados embrionários. • Atribui-se aos gregos a criação do juri popular. O tribunal de Heliaia era um tribunal popular, que julgava todas as causas, exceto os crimes de sangue, que ficava sobe a alçada do Areópago (uma assembléia de magistrados, tribunal criminal). Críticas • Os escritores do século IV eram, na maioria, oradores e professores. • Os gregos não foram grandes juristas, não souberam construir uma ciência do direito, nem sequer desenvolver uma maneira sistemática às suas instituições de Direito privado. Fontes • Fontes das leis escritas gregas: • Fontes epigráficas: documentos publicados de maneira pública e permanente (escritos em pedra, bronze, madeira) que sobreviveram até o dia de hoje. • Fontes literárias são: • Discurso dos oradores áticos: Antífonas, Lísias, Isaeus, Isócrates, Demóstenes, Esquino, Licurgo, Hipérides e Dinarco. • Filósofos do direito • A tradição tem em Zeleuco o primeiro legislador que escreveu leis (cerca de 662 a.C), e em Dreros em Creta a primeira inscrição legal (meio ou segunda metade do século VII a.C). • No meio do século VI, a única cidade sem escrita era Esparta. Órgãos do Governo/ Instituições Gregas • Assembléia do povo (Ekklêsia): - formada por todos cidadãos gregos acima de 20 anos e de posse dos direitos políticos. Tinha atribuições legislativas, executivas e judiciárias (delibera, elege e julga). Cujo presidente é o epistatés dos prítanes; • Conselho (Boulê) - 500 cidadãos acima de 30 anos, escolhidos por sorteio entre os cidadãos de reputação ilibada, com a função de examinar, preparar e controlar as leis. • Os prítanes: é o representante de cada um dos dez grupos que formam o Conselho, além da própria Assembléia. Eram escolhidos diariamente, sem repetição, sendo um deles eleito o guardião do templo; • Estrategos (guerra): eram 10 cidadãos eleitos pela assembléia; casados e natos, administravam as guerras, distribuiam impostos e tinham papel de polícia. • Magistrados (ações municipais): Os magistrados eram candidatos eleitos anualmente, com função processual e de promover cultos. RETÓRICA GREGA COMO INSTRUMENTO DE PERSUASÃO JURÍDICA • Cabia aos próprios lesados abrirem processos, defender-se, tomar a palavra, levantar testemunhas. • O sucesso da defesa ou da acusação cabia a arte de persuadir do próprio indivíduo. E para que isso ocorresse muitos valiam de um artifício muito usado, que era o uso de escritores profissionais para redigirem o discurso, os chamados logógrafos, que muitos consideram como os primeiros advogados da história. Tal prática não era permitida por lei, mas foi se tornando ineficaz por causa do seu descumprimento sendo então uma lei morta. • Os logógrafos escreviam um discurso que os clientes deveriam tomá-los como de sua própria autoria, devendo ser eles os mais naturais possíveis para que seja admitido como discurso do próprio litigante. • Uma particularidade dos gregos é a retórica de persuasão, que até então não era muito analisada pelos especialistas, mas que não deve ser deixada de lado quando se estuda o direito grego. • O julgamento era presidido por um magistrado que não interferia no processo. DRÁCON- ATENAS • Drákõn, tornou-se um célebre legislador grego no século VII a.C. • Por ser de família aristocrática, em 621 a.C. recebeu poderes extraordinários para desenvolver leis que amortecessem os conflitos sociais. • Confiado a ele a missão de codificar todas as leis orais, Drácon as escreveu uma a uma, findando assim com um grande código de leis rígidas e baseadas nas regras tradicionais arbitradas pelos juízes da época. • Uma das mudanças radicais foi a transferência do direito de vingança para o Estado. Destarte, tornou-se proibido a conduta de fazer justiça com as próprias mãos. • Código de Drácon ficou muito conhecido devido a sua rigidez quase sobrehumana, além de apenar todos os crimes sérios com a morte. Não havia meio termo na legislação draconiana, se o crime era sério ou não, só havia a punição da morte para o infrator. Nada de detenção ou sanção pecuniária. • Por isso até hoje o termo “draconiano” ostenta um peso imenso. Fala-se de draconiano quando a situação é muito dura, rígida, áspera, cruel etc. DRÁCON • Sabe-se que o código draconiano ficou vigente por sete anos. • Curiosidade: Sabemos da existência do Código Draconiano graças a uma inscrição em pedra que sobreviveu até nossos dias. O primeiro artigo de sua legislação era: “Dever-se-á honrar os deuses e os heróis do país e oferecer-lhes sacrifícios anuais sem afastar-se dos ritos seguidos pelos ancestrais”. • Curiosidade: Foi Drácon quem primeiro diferenciou o homicídio involuntário do homicídio voluntário e a legítima defesa. • Curiosidade: A legítima defesa que era chamada de “lei sagrada, lei não escrita, mas que nasceu com o homem, lei anterior aos legistas, à tradição, aos livros, e que a natureza nos oferece gravada em seu código imortal [...] lei pensada num perigo iminente, preparado pela astúcia ou pela violência, sob o punhal da cupidez ou do ódio, diante disso todo meio de salvação é legítima”. SOLON-ATENAS • Trinta anos após a regência da legislação draconiana, surge Sólon, um homem do povo e para o povo. • Sob seu regime, Sólon cria um novo código de leis, além de promover reformas institucionais, econômica e social. • Franco Massara: • “Sólon inventou então aquela operação econômica que hoje nós diríamos “desvalorização da moeda”. Mandou recolher todas as moedas existentes, fundiu-as e cunhou outras mais leves no peso mas naturalmente maiores em quantidade; depois restituiu aos cidadãos conservando para cada moeda o valor nominal que possuía antes da fusão e... do aligeiramento. Os devedores viram as dívidas aligeiradas em 27 por cento e os credores consolaram-se com o aumento do número de moedas em cuja possessão reentravam. Em termos simples: tornaram-se todos mais ricos, ou menos pobre, do que antes.” SÓLON • Foi um avanço na cultura jurídica da Grécia a libertação do cárcere por motivos de dívidas. • Passou a ser lei “Nenhum homem livre, cidadão da mesma Atenas, poderá sofrer a humilhação da escravidão por dívidas.” • Curiosidade: A pessoa que era presa por dívidas era chamada de Katakeímenos. • Curiosidade: Para Aristóteles, Sólon foi o fundador da Democracia. • Sólon é considerado um dos sete sábios da Grécia Antiga. • Sólon não era apenas um grande homem de Estado e economista hábil, era também um poeta de traços profícuos. Certa vez escreveu os seguintes versos sobre idade: • Sete anos depois do primeiro sopro, o menino muda todos os dentes; • Fortificado por igual período, mostra os primeiros sinais viris. • Em um terceiro, seus membros crescem, a barba surge em seu rosto incerto. • Depois de um quarto período igual, sua força e seu vigor alcançam o apogeu. • Quando se passam cinco vezes sete anos, o homem deve pensar em se casar. • Aos quarenta e dois, é bastante sábio para fugir de atos vis, estultice e medo. • Quando tem sete vezes sete anos, ao juízo, somam-se perspicácia e eloquência. • E mais sete anos de habilidade, elevam-nos à perfeição. • Quando esses períodos somam nove, embora enfraquecidas as faculdades resistem. • Quando Deus lhe concede dez vezes sete, o homem idoso se prepara para o céu. • Sólon cria a figura do testamento, algo que não existia na legislação grega e talvez em nenhuma do mundo àquela época. • Sólon modificou a lei que permitia vender a filha. Mudou, mas ressalvou que se a mesma tivesse cometido um delito grave, assim poderia ser vendida. • A lei de Sólon prescrevia que só podia acompanhar o cortejo fúnebre quem era da família. • Só era permitido enterrar o morto com até três vestidos, acima desse número era crime. • A lei ateniense era clara: • “Se um ateniense aceita suborno, ou se ele mesmo a oferece a um outro (ateniense), ou corrompe alguém com promessas em detrimento das pessoas ou de qualquer dos cidadãos individualmente, por quaisquer meios ou dispositivos, será destituído de seus direitos, ele e seus filhos, e sua propriedade será confiscada.” • Para Michael Gagarin, o Direito Grego era dividido da seguinte maneira: – Direito Criminal ou Penal; – Direito de Família; – Direito Público; – Direito Processual. Justiça criminal – Areópago • Areópago, tribunal surgido no governo de Sólon, reconhecido como a mais alta corte de justiça da Grécia. • A missão do Areópago era defender de forma perene a lei, a Constituição e os costumes. • Foi a primeira casa de justiça da Grécia, no início composto por cinquenta e um juízes com competência para julgar todos os delitos • Curiosidade: A tradição fornece a Atena à criação do Areópago. Reza a lenda que a deusa Atena criou o tribunal para julgar Orestes, irmão de Ifigênia e filho de Agamêmnon e de Clitmnestra. Vingando a morte do pai, Orestes, assassinou a mãe e seu amante. A deusa o manietou e criou o tribunal para julgá-lo. Justiça Criminal – Efetos • Tribunal que tinha competência para julgar os casos de homicídio não premeditados. Tinha a composição de cinquenta e um membros, escolhidos entre os Senadores. • Seus julgamentos eram divididos entre quatro câmaras: Pritaneu, Palládion, Delfínio e Freátis. Justiça Cível – juízes dos demos • Os juízes dos demos – campo – tinham o dever e a competência de instaurar inquéritos preliminares, facilitando assim, a vida nas regiões mais bucólicas. Era também intenção desses inquéritos triar o que deveria ir a julgamento e o que não deveria. Justiça Cível – Arbitragem • Era fornecido pelo Estado a figura do Árbitro público. • O campo de atuação da arbitragem era na solução de controvérsias, geralmente de questões simples. • O árbitro era escolhido pelo magistrado, diferentemente da arbitragem moderna, onde os litigantes elegem um arbitro para dirimir a querela. Justiça Cível – Heliaia • O tribunal de Heliastas era verdadeiramente um tribunal de justiça aberto a todos do povo. • Esta corte de justiça demonstra que o povo grego tinha soberania em matéria judiciária. • Alguns historiadores defendem apenas o nomé de Heliéia para este tribunal, porém encontramos em várias fontes distintas as demais nomeclaturas supracitadas. • O nome talvez seja proveniente do monte em que se reuniam os jurados do tribunal, localizado ao oeste da Ágora. Apesar de apostarmos mais, na tese que defende essa denominação com base no deusHélios, sol. Como se reuniam sempre em campo aberto, tendo o sol como testemunha, resolveram colocar o nome de tribunal dos Heliastas em homenagem ao astro rei. • Arnaldo Godoy comenta o referido tribunal: • “O tribunal dos Heliastas tinha competência para acompanhar e julgar causas em geral, de âmbito público e privado, e muitos de seus membros eram pessoas de idade, de pequena e média condição. Anualmente os arcontes sorteavam seis mil jurados entre os cidadãos inscritos, maiores de trinta anos. Os sorteados eram designados juízes heliastas e prestavam juramento. Eram dívididos em dez seções de quinhentos membros; os restantes mil jurados eram suplentes.”