Antonio Cruz (ABr) Edição nº3 - Julho 2014 Reportagem Cobertura esportiva na ebc Um Jogo para além da copa Patrimônio da Emissora Gustavo Gindre fala da importância de fixar a grade de programação Presidenta do Conselho Direitos de Transmissão Ana Fleck e a moralização da gestão esportiva no país Trabalhadores da EBC criticam monopólio dos direitos de transmissão feito com dinheiro público Revista do Conselho editorial Índice Curador Editora-executiva Priscila Crispi Editores Mariana Martins e Guilherme Strozi Reportagem e artigos Alberto Perdigão Ana Fleck Eliane Gonçalves Gesio Passos Guilherme Strozi Gustavo Gindre Joseti Marques Mariana Martins Priscila Crispi Takashi Tome Fotografia Agência Brasil (Antonio Cruz, Elza Fiúza, Marcelo Camargo, Marcello Casal, Tania Rego, Valter Campanato), Anizio Silva/ Creative Commons, Arquivo Gecom/EBC, Arquivo Gemark/ EBC, Arquivo pessoal, Divulgação CVB, Divulgação ESPN, El Gráfico magazine/Domínio Público, Felipe Canova/Creative Commons. Giovana Tiziani/EBC, Reprodução Mídia Ninja, Reprodução Rádios EBC Projeto gráfico e diagramação Luciana Durans CONSELHO CURADOR | EBC Ana Luiza Fleck Saibro (Presidente) Rita de Cássia Freire Rosa (Vice-Presidente) Ana Maria da Conceição Veloso Cláudio Salvador Lembo Clelio Campolina Diniz Daniel Aarão Reis Filho Eliane Gonçalves Evelin Maciel Heloisa Maria Murgel Starling Henrique Paim Ima Célia Guimarães Vieira João Jorge Santos Rodrigues José Antônio Fernandes Martins Maria da Penha Maia Fernandes Mário Augusto Jakobskind Marta Suplicy Murilo César Oliveira Ramos Paulo Ramos Derengoski Rosane Maria Bertotti Takashi Tome Thomas Traumann Wagner Tiso SECRETARIA EXECUTIVA DO CONSELHO CURADOR Guilherme Strozi Mariana Martins Priscila Crispi Raquel Fiquene DIRETORIA-EXECUTIVA | EBC Diretor-Presidente Nelson Breve Diretora Vice-Presidente de Gestão e Relacionamento Sylvio Andrade Diretor-Geral Eduardo Castro Procurador-Geral Marco Antônio Fioravante Diretora de Jornalismo Nereide Beirão Diretor de Produção Rogério Brandão Diretor de Conteúdo e Programação Ricardo Soares Diretor de Administração e Finanças Clóvis Curado Diretor de Negócios e Serviços Antonio Carlos Gonçalves Ouvidora-Geral Joseti Marques Secretária-Executiva Sílvia Sardinha Empresa brasil de comunicação 2 Dia a dia do Conselho Pra onde a bola rola Grata a oportunidade em que o editorial da 3ª edição da Revista do Conselho Curador é escrito. Entra em campo para mais uma Copa do Mundo de Futebol, pela segunda vez na história, realizada no Brasil. Como torcedores, estamos envolvidos com esse sentimento indefinível que é a relação das pessoas com os símbolos dos seus afetos, no caso com a Seleção Brasileira. Como colaboradores na construção e consolidação de um sistema público de comunicação, nós, do Conselho Curador, precisamos ir mais além. Devemos trazer à reflexão o tipo de cobertura esportiva a ser praticada pelos canais públicos, em especial pelos veículos da EBC. Em seus diferentes aspectos, longe de configurar atividade de nível secundário, a prática desportiva representa uma atividade social relevante, devendo, por isso mesmo, constituir tema permanente de debate. Pela dimensão do futebol como fenômeno de massa em nosso País, como elemento repleto de significações simbólicas, consideramos apropriado patrocinar essa discussão nesse momento. Esperamos contribuir para que a cobertura de eventos esportivos pelos canais públicos possa ser diferente em relação a dos canais privados. Que possamos assistir a um entretenimento de qualidade e a um jornalismo livre, que estimule o debate de ideias, de críticas e dê espaço ao contraditório. O leitor também poderá acompanhar discussões sobre outros temas nas demais editorias da Revista. Gustavo Gindre fala sobre a grade de programação como bem imaterial das emissoras de TV. Takashi Tome levanta a discussão sobre a Faixa do 700 MHz. Eliane Gonçalves reúne outros empregados da EBC para debater direitos de transmissão. Gésio Passos comenta o plano de cargos e salários da casa. Alberto Perdigão fala sobre a estrutura das TVs estaduais. Joseti Marques explora as singularidades da comunicação pública. Por fim, apresentamos um balanço de nossas atividades neste primeiro semestre e eu falo um pouquinho também sobre gestão esportiva. Seja bem-vindo, participe e aproveite a leitura! Ana Luiza Fleck Saibro Trabalhadores e Trabalhadoras 04 Matéria de capa 10 Notas do Conselho Curador Espaço Público 06 08 25 Cartas dos leitores Olá pessoal do Conselho Curador da EBC! Continuem no caminho de estimular a cobertura dos jogos da Série C do Campeonato Brasileiro de futebol! É ponto positivo para os amantes do futebol, como eu. Mas, por favor: é preciso tirar o foco dos times cariocas, tanto na Série C, quanto nas análises dos jogos da Série A, que ocorrem no jornal Repórter Brasil. Às vezes fico desapontado achando que estão menosprezando os times das outras regiões do país. Abraços! Nikolas Pirani sociólogo e consultor do IPEA - Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada Programação em debate 27 Coluna acadêmica Fala, conselheiro! Palavra da Ouvidoria 31 Fala, conselheira! 29 33 35 Moro em Itapiranga, Santa Catarina, e gostaria de ver mais programas sobre agricultura sustentável e produção de alimentos orgânicos na TV Brasil! Não programas lentos e chatos como geralmente são, mas programas feitos por jovens do campo, bem dinâmicos e com o que há de mais atual nessa área aqui no Brasil. Obrigada pelo espaço! Carolina Spina Grings Zootecnista, especialista em controle de qualidade de produtos de origem animal e artista plástica Trabalhadores e Trabalhadoras Valorização profissional Arquivo GECOM/EBC para consolidação da EBC 4 Empresa brasil de comunicação A Gésio Passos jornalista, SUCOM/Portal EBC pós seis anos de sua fundação, a desempenho ineficiente, reconhecimento nulo de Empresa Brasil de Comunicação formação e titularidade, entre outros problemas. (EBC) luta pelo reconheciMas o que mais preocupa na proposta da Emmento do papel da comunicação pública na presa é de que uma nova carreira seja baseada democracia brasileira. A busca por autonomia apenas na meritocracia. A centralidade de uma e relevância social é um dos grandes desafios relação produtivista-individualista é incompatída empresa que busca sua consolidação, prinvel com os princípios da comunicação pública. cipalmente para os seus mais de 2 mil funcioEssa opção dos dirigentes não reconhece a natunários efetivos. reza coletiva do trabalho desenvolvido na EBC. Trabalhadoras e trabalhadores que já Da pauta à exibição, do pregão à execução, todo construiam a comunicação pública brasileira este trabalho coletivo é essencial para a realizamuito antes da EBC. Jovens que acreditam na ção da comunicação social. empresa como espaço de realização profissioUma proposta construída entre os empreganal e de aldos de Brasília, Rio, São ternativa aos Paulo e Maranhão busca monopólios um plano que valorize a nacionais. carreira e a trajetórias dos Todos esses funcionários, garantindo A atual carreira que lutaram um piso salarial compatídos trabalhadores pelo resgate vel com o serviço realizado caráter do, relações democráticas gera desestímulo público da de trabalho, uma carreira e desigualdades EBC duranpalpável, incentivo à quate a greve lificação profissional e dentro da empresa. histórica de avaliações democráticas e 2013. inclusivas do trabalho. M a s , Este é o momento de após seis construção de bases sólidas meses desta para o desenvolvimento da grande mobilização, os mesmos empregados EBC, principalmente quando se inicia a liberacontinuam a lutar por mudanças que garanção dos recursos da Contribuição para Fomento tam condições para que a EBC possa cumprir da Radiodifusão Pública. A valorização dos emseu papel de excelência - mesmo com retaliapregados é essencial para garantir a autonomia e ções e práticas anti-sindicais vigentes dentro relevância da empresa pública, sendo parte perda empresa. manente de seu desenvolvimento. Em ano eleitoNeste momento, a direção da EBC coral não nos custa lembrar o quanto a direção de loca em debate - após pressão de anos dos uma empresa como a EBC é passageira. trabalhadores – um novo plano de carreiras para seus funcionários. E cabe ao Conselho As propostas dos empregados podem ser visCurador – como guardião dos princípios da tas no site: http://bit.ly/carreiraEBC. empresa, se inserir neste debate. A atual carreira dos trabalhadores gera desestímulo e desigualdades dentro da empresa. Baixos salários, grande evasão dos recémconcursados, 41 níveis de progressão, o que praticamente inviabiliza o alcance ao topo pelos trabalhadores, desconsideração do tempo de serviço dos empregados, avaliação de Revista do Conselho Curador 5 Dia a dia do Conselho Giovana Tiziani/EBC Conselho Curador Um terço das vagas da sociedade será renovada Por: Guilherme Strozzi O Conselho Curador da EBC já começou o ano de 2014 com mudanças. Passaram a integrar o pleno, automaticamente com a posse nos ministérios, Thomas Traumann e José Henrique Paim, ministros da Secretaria de Comunicação Social da Presidência e da Educação, respectivamente, no lugar de Helena Chagas e Aloísio Mercadante. A primeira reunião do ano, em fevereiro, teve como pauta principal a análise do Plano de Trabalho da EBC. Após debate, o colegiado considerou que o documento deixou de fora contribuições e diretrizes apontadas pelo Conselho ao longo do ano anterior e adiou a deliberação sobre o documento. No mês seguinte, seguindo as recomendações do Conselho Cura- dor, a direção da EBC apresentou um plano que previa 66 projetos para a plataforma TV, sete para a rádio, sete para a web e dois especiais. O Conselho aprovou o documento e uma resolução, para que os próximos Planos de Trabalho sejam apresentados até 15 dias antes da última reunião anual do colegiado. Também foi criado um Grupo de Trabalho para fazer o acompanhamento do novo plano junto à diretoria. A aprovação do Plano Editorial da Agência Brasil foi outra importante ação do Conselho em 2014. O documento foi formatado pela Diretoria de Jornalismo, com auxílio da Câmara de Jornalismo e Esportes do Conselho. O colegiado recomendou que a Agência Brasil enfrente a necessidade de melhorar as diretrizes Marcello Casal Jr. (ABr) Conselheiros votam lista tríplice para escolha de novos membros 6 Empresa brasil de comunicação Exibição de novo programa da TV Brasil durante reunião do colegiado na sede da EBC em São Paulo do seu posicionamento estratégico em relação a outros veículos de informação do país. O pleno também reforçou a necessidade da implantação do Comitê Editorial de Jornalismo pela EBC. Após dois anos no cargo, a ouvidora-geral, Regina Lima, se despediu da função em 2014. Joseti Marques, ex-ouvidora-adjunta, assumiu o cargo em março. Para a indicação ao cargo, a EBC seguiu recomendações feitas pelo Conselho Curador para o perfil deste profissional. O colegiado também sugeriu a apresentação de um plano de trabalho da Ouvidoria para as atividades pelos próximos dois anos. E o foco especial do Conselho Curador neste semestre foi na Consulta Pública para a escolha de cinco novos (as) conselheiros (as). O processo ocorreu devido ao término dos mandatos dos conselheiros José Martins, Maria da Penha, Daniel Aarão, João Jorge e Murilo Ramos. O modelo de seleção foi fruto de uma Audiência e uma Consulta Pública sobre a melhor forma de escolha de novos membros. No final, foram homologadas 205 entidades e 58 candidatos aptos a concorrerem às vagas. Na reunião do dia 16 de abril, o Conselho Curador definiu os nomes para cinco listas trí- plices, que foram enviadas para a Presidência da República, responsável pela designação final dos novos integrantes. As listas foram definidas por áreas consideradas com perfis importantes para a composição do colegiado: jovens; indígenas; pesquisadores; profissionais que atuam na área de Direitos Humanos e Diversidade; e profissionais da Comunicação, empresários e produtores audiovisuais. O Conselho Editorial da Faixa da Diversidade Religiosa da EBC voltou a se reunir neste semestre. O encontro, em abril, contou com a presença dos responsáveis pela produção dos dois programas que vão compor a Faixa da Diversidade Religiosa da EBC: o “Caminhos da Fé”, de cunho jornalístico, e o “Retratos de Fé”, de cunho cultural e ritualístico. As estreias estão previstas para o segundo semestre na TV Brasil. A última reunião do colegiado no semestre foi realizada em maio, na sede da EBC, em São Paulo. Na ocasião foi apresentado o projeto da Escola Nacional de Comunicação Pública. A escola, elaborada pela EBC em parceria com a Unesco, pretende ser um centro de pesquisas sobre comunicação pública no Brasil. A coordenação do projeto é feita por Joseti Marques, que também é ouvidora-geral da EBC. Revista do Conselho Curador 7 Notas do Conselho Curador Notas do Conselho Curador Por: Mariana Martins Cobertura das Eleições pela EBC é tema de audiência pública Em 2014, será a segunda vez que a EBC vai cobrir as eleições para os cargos do poder executivo, dentre eles o cargo de presidente da república. Para discutir o tema e ampliar as contribuições do Conselho e da sociedade neste sentido, o colegiado organizou em São Paulo, na sede do Sindicato dos Engenheiros no estado, no dia 13 de maio, uma audiência pública sobre “Eleições e Mídia Pública: a cobertura eleitoral pelos veículos da EBC”. Questões de equidade de gênero, cobertura de movimentos sociais, relações com as pesquisas eleitorais e com o próprio governo durante a cobertura das eleições foram apontadas como pontos sensíveis a serem tratados com cuidado pela Empresa. As contribuições completas desta audiência podem ser vistas aqui. 1º Pré-Fórum Brasil de Comunicação Pública O Conselho Curador da EBC faz parte da Frente Parlamentar pela Liberdade de Expressão e o Direito a Comunicação com Participação Popular (Frentecom) e, no âmbito deste espaço, vem ajudando a construir o Fórum Brasil de Comunicação Pública 2014. O fórum será realizado nos dias 12 a 14 de novembro deste ano, mas ao longo do ano três eventos preparatórios serão realizados. O I Pré-Fórum foi realizado no dia 15 de abril na sede do Interlegis, em Brasília. O evento discutiu a digitalização da comunicação com foco no espaço destinado para o campo público. Participaram do Pré-Fórum, além de entidades e parlamentares da FrenteCom, representantes da Anatel e Ministério das Comunicações. Todos os eventos ligados ao Fórum Brasil de Comunicação Pública são transmitidos ao vivo. Para mais informações, siga o perfil do Conselho Curador no Facebook. 8 Empresa brasil de comunicação Presidenta do Conselho participa de audiência pública sobre Lei da Mídia Democrática A presidenta do Conselho Curador Ana Luiza Fleck Saibro, participou no dia 21 de fevereiro de audiência pública no Ministério Público Federal (MPF), em São Paulo, para debater o projeto de lei que regulamenta o funcionamento de meios de comunicação, conhecida como Lei da Mídia Democrática. A nova lei, proposta por iniciativa popular, terá de reunir cerca de 1,3 milhão de assinaturas para ser validada e começar a tramitar no Congresso Nacional. De acordo com a proposta, fica proibida a concessão de meios de comunicação a pessoas com cargo eletivo – como deputados e senadores – e a grupos religiosos. Também é vedada a manutenção de mais de cinco canais de comunicação por uma mesma empresa. Saiba mais sobre o projeto na página da Campanha Para Expressar a Liberdade na internet http:// www.paraexpressaraliberdade.org.br Conselho Curador cobra equipamentos de segurança para jornalistas da EBC O Conselho Curador enviou, pela primeira vez, em 13 de fevereiro, um ofício à direção da EBC questionando a empresa sobre a aquisição dos Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) para uso dos empregados dos da EBC. No documento, o colegiado reitera sua recomendação, aprovada em suas 45ª e 47ª Reuniões Ordinárias, de que o material seja disponibilizado a todos os trabalhadores que fazem a cobertura de protestos e outros conflitos sociais que ameacem a integridade e a vida dos profissionais. O assunto voltou a ser tema da reunião extraordinária de maio, visto que a empresa, até então, não havia providenciado os referidos equipamentos. A diretoria, então, informou que até o dia 05 junho entregaria os EPIs aos funcionários para que durante a cobertura da Copa do Mundo e em qualquer cobertura de risco a integridade física dos profissionais esteja assegurada. Conselho pede suspensão do leilão da Faixa de 700MHz à Anatel e Ministério das Comunicações Motivado pelos debates durante do 1º Pré-Fórum Brasil de Comunicação Pública 2014, o Conselho Curador da EBC enviou ofício ao Ministério das Comunicações e à Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) solicitando o cancelamento do Leilão dos 700 MHz. O documento ressaltou a importância da destinação da Faixa de 700 MHZ garantir questões expostas pelo Decreto 5820/2006, que institui a implantação da TV Digital no Brasil, e que prevê a reserva canais para a Comunicação Pública. O Conselho entende que essa reserva de canais no espectro é fundamental para o fortalecimento da comunicação pública no país. Contribuição de Fomento à Radiodifusão Pública oriunda do Fistel A EBC conseguiu na Justiça o direito de receber das empresas de telecomunicações Oi, Claro e TIM o pagamento da Contribuição para o Fomento da Radiodifusão Pública, oriunda do Fistel. As empresas depositavam, até o ano passado, os valores em uma conta judicial, o que continua sendo feito somente pela operadora Vivo. Mas, por enquanto, a EBC não tem autorização do Congresso Nacional nem do Tesouro Nacional para gastar os R$ 480 milhões que estão no caixa, uma vez que o orçamento da empresa não previu este aumento de gastos. Uma minuta de Decreto da Casa Civil pretende destinar 5% para a TV Senado, 5% para a TV Justiça e 7,5% para outras entidades (por intermédio da EBC), o que incluiria Rádios e TVs Comunitárias, além de Tvs Educativas e o Canal da Cidadania. Revista do Conselho Curador 9 matéria de capa O lugar do Por: Priscila Crispi esporte na Antonio Cruz (ABr) Reportagem ganhadora do Prêmio Tim Lopes de Jornalismo Investigativo aborda direitos da infância no país da Copa comunicação pública 10 Empresa brasil de comunicação Revista do Conselho Curador 11 matéria de capa 12 Empresa brasil de comunicação Reprodução Rádios EBC A cobertura esportiva sobre o tema, que não limite seu foco aos eventos esno Brasil é um serportivos. Na sua visão, entre o espetáculo e o interesse viço tão incorpopúblico, a balança acaba sempre pendendo para o prirado ao cotidiano de redações meiro, enquanto deveria-se buscar o equilíbrio. e público que discuti-la pode Para Juca Kfouri, jornalista, abordar os assuntos parecer redundante. Mas, é o que estão ao redor do entretenimento não significa abcaso de se pensar: a dimensão dicar da emoção, mas certamente qualifica a cobertura. cultural, econômica e política “Quem disse que não pode falar de Brasil na editoria de do desporto tem sido alvo de esporte? ‘Ah, está politizando uma coisa que é entreteanálise profunda pelas equipes nimento’. É entretenimento na hora que está acontecenjornalísticas? O debate em tordo o jogo, mas está dentro de um todo que não pode não no dos direitos de transmissão aparecer”, diz. está esgotado? Qual o papel da No duelo entre jornalismo e entretenimento, não é mídia na engrenagem que faz questão fechada os momentos em que ambos devem o negócio esportivo prospeaparecer isolados e quando podem andar juntos.“Um rar? Tantas questões em aberto evento esportivo tem interesse jornalístico, mas acaba apontam sendo espetáculo. Temos que para a netratar o esporte como evento cessidade [nas transmissões], e como code levar a bertura jornalística nos jornais. Quem disse que discussão São duas coisas diferentes”, em torno afirma Carlos Gomes, gerennão pode falar de da coberte do Núcleo de Esportes da Brasil na editoria de tura de EBC. esportes Para a Diretora de Jornalisesporte? mais a sémo da EBC, Nereide Beirão, rio. os limites não são tão claros. Murilo “Não dá pra diferenciar muiRamos, to uma coisa da outra. Temos membro repórter no campo, matérias do Conselho Curador da Emque entram antes dos jogos e entrevistas que acontecem presa Brasil de Comunicação logo depois. Tentamos colocar informações, inclusive, (EBC), acredita que o esporte durante as transmissões”, explica. é, quase sempre, tratado na A questão vai além de demarcações conceituais e base do palpite. “Uma visão toca, na prática, em escolhas editoriais e na alocação de impregnada no meio jornalísequipes dentro das empresas de comunicação. Na EBC, tico faz com que você fique três plataformas cobrem sistematicamente o universo olhando muito mais para o esesportivo: o Portal EBC, as rádios e a TV Brasil (saiba petáculo e não se aproxime do mais no box sobre a programação esportiva da EBC). esporte como um assunto do Rádios e TV contam com um Núcleo integrado, perdia, como é a economia ou a tencente à Diretoria de Jornalismo e responsável pela educação. É como se você cotransmissão dos eventos esportivos. A equipe produz, brisse educação superior só fatambém, reportagens para os jornais da casa e seus prolando de vestibular”, compara. gramas esportivos, incluindo questões culturais, sociais Segundo o conselheiro, que é e econômicas relacionadas ao esporte. “Eventualmente, professor da Faculdade de Coa gente ajuda, principalmente com essas matérias de municação da Universidade de contexto. Mas a maioria do material é do esporte”, gaBrasília, falta nos noticiários rante Nereide. brasileiros um olhar processual Equipe apresenta “No Mundo da Bola”, programa mais tradicional do rádio esportivo brasileiro, no ar desde a década de 30 Segundo Leonardo Rodrigues, repórter da TV Brasil e ex-editor da editoria de esportes do Portal EBC, a redação dos telejornais trabalha em forma de parceria com o Núcleo de Esportes: “na verdade, a equipe de esportes da TV Brasil é muito pequena, não dá conta de toda demanda da cobertura, então a gente complementa”. Para o jornalista, o ideal seria que a empresa ampliasse a equipe de profissionais que cuidam especificamente de esportes dentro da casa, possibilitando que os mesmos repórteres abordem as questões de fundo dos eventos. “Acho ruim essa divisão porque a cobertura de esportes não pode estar descolada. Isso diz um pouco sobre a EBC não ter um olhar clínico para o esporte”, afirma. No caso do Portal, ligado à Diretoria-Geral, uma só profissional – hoje, Nathália Mendes – integra e publica os conteúdos esportivos produzidos por toda casa, além de apurar informações exclusivas para a editoria de esportes do veículo. Para ela, a cobertura esportiva de uma empresa acompanha as suas prioridades editoriais, que no caso da emissora pública é a de subsidiar a formação de opinião do cidadão. “Acredito que não necessariamente devemos negar o entretenimento, mas, enquanto tivermos que optar por um dos dois, por questões operacionais, somos chamados ao compromisso jornalístico”, diz. Carlos Gomes, porém, pontua que a exibição de jogos e campeonatos é imprescindível. “O caminho para o esporte na TV pública é ter eventos esportivos, devemos caminhar nessa linha, mas investindo mais em esportes amadores. Temos que ter uma TV que é vista e o esporte pode trazer isso”, defende. O gestor afirma que, em 2013, os maiores índices de audiência na TV Brasil vieram da exibição da Série C do Campeonato Brasileiro. Para ele, o público que é conquistado pelo espetáculo, acaba ficando para ver outras programações da emissora. Marcelo Martins, morador de Cambé, no Paraná, é um exemplo que confirma a opinião de Carlos. “Não conhecia (a TV Brasil), comecei pelo Brasileiro da série C, e achei que tem alguns programas interessantes, assim vamos tendo mais uma opção de entretenimento”, conta o telespectador. Negócios A transmissão de eventos esportivos em emissoras de rádio ou TV vai além da discussão da audiência e tem ligação umbilical com a transformação de práticas lúdicas em esporte de alto desempenho. “O primeiro cara que colocou uma partida no jornal transformou o esporte em profissional. No início, todos os esportes eram amadores. Com os espectadores é que se passa a ter o espetáculo e não só pessoas jogando”, explica Ronaldo Helal, professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro e coordenador do Laboratório de Estudos em Mídia e Esporte. Em um artigo publicado em 1994, na Revista USP, da Universidade de São Paulo, o antropólogo Roberto Damatta defende que: “não foi por mero acaso que o esporte como um domínio social (e como uma indústria cultural) tenha surgido acasalado com o advento da sociedade industrial de mídia e de massa”. Nesse sentido, a relação entre esporte e mídia gerou não só a profissionalização das modalidades, com o estabelecimento de regramentos claros e instâncias organizativas, mas também um produto cultural que movimenta um mercado poderoso, em todo o mundo. Revista do Conselho Curador 13 PROGRAMAÇÃO RÁDIOS EBC 1. Bate-Bola (na Nacional AM do Rio de Janeiro e de Brasília) às 12h30, de segunda a sexta-feira. Cobertura do esporte local, nacional e internacional, com convidados, matérias, resultados, polêmicas e análises. 2. No Mundo da Bola (em rede com as rádios Nacionais da Amazônia, Rio de Janeiro e Brasília) - das 20h05 às 21h00, aos sábados. É o programa mais tradicional do rádio esportivo brasileiro, no ar desde a década de 30. Apresentado no Rio de Janeiro, com participação direta de Brasília, traz notícias, análises e entrevistas relacionadas ao futebol. 3. Stadium (em rede com as rádios Nacionais e a rádio MEC do Rio de Janeiro) - das 14h00 às 15h00, aos sábados. Inspirado no tradicional programa de TV, com o mesmo nome, estreou em abril deste ano. Programa informativo e educativo voltado para o esporte olímpico e paralímpico, que revela experiências inovadoras desse universo. 4. Boletins, flashes e entradas dos repórteres e comentaristas durante toda a programação das emissoras Nacional AM do Rio e de Brasília. 5. Jornadas esportivas: transmissão para toda a rede pública de rádios de jogos de futebol do Campeonato Carioca, Campeonato Brasileiro séries A, B e C, Copa do Brasil, Libertadores, Sul-Americana e jogos da seleção brasileira; além das competições de basquete NBB e Liga de Basquete das Américas. PROGRAMAÇÃO TV BRASIL 1. Mais Ação – quinta-feira às 17h30. Produzido pela Rede Minas de Televisão, o programa viaja por todo o país em busca de roteiros ecoturísticos para prática de esportes de ação e aventura. Exibe, ainda, a cobertura de eventos esportivos, o perfil de atletas em destaque e notícias do universo do esporte. 2. No Mundo da Bola – domingo às 21h00. Inspirado no tradicional programa de rádio, com o mesmo nome, debate o futebol no Brasil e no mundo, com comentaristas e convidados no Rio de Janeiro e em São Paulo, que analisam diversas competições. Outros estados também participam do programa, com matérias e análises de jornalistas locais. Comentaristas falam sobre os assuntos da atualidade e respondem perguntas dos telespectadores. 3. Stadium – sábado às 14h00. Revista semanal que se baseia nas coberturas dos esportes olímpicos e paralímpicos, com destaque para ações sociais que o esporte proporciona nas comunidades pelo Brasil. É um dos programas mais antigos da TV brasileira dedicado ao esporte, abrindo espaço à atletas sem patrocínio. 4. Jornadas esportivas: transmissão da Série C do Campeonato Brasileiro – sábados e domingos, 18h30. 5. Comentários de futebol no Repórter Brasil Tarde, gerado do Rio, às segundas e quartas. No telejornal da noite são eventuais, dependendo do assunto. PROGRAMAÇÃO PORTAL EBC O portal conta com uma editoria de esportes e duas subeditorias: Série C e Copa 2014. Oferece os seguintes conteúdos: 1. Cobertura esportiva consolidada de todos os veículos EBC – rádios, TV Brasil e Agência Brasil - oferecendo conteúdo multimídia em um mesmo lugar. 2. Conteúdo próprio, pautas especiais e assuntos “quentes”, que estão repercutindo na internet e em redes sociais. 3. Transmissões de jogos ao vivo a partir dos players das rádios EBC e de emissoras da rede pública de rádios. 4. Informações dos campeonatos brasileiros, especialmente a Série C, com o acompanhamento do dia a dia dos clubes participantes, dedicando um canal exclusivo de notícias para cada um dos times. 5. Serviço: disponibiliza informações como tabelas e classificação de vários campeonatos. 14 Empresa brasil de comunicação Esportes de alto desempenho movimentam mercado com cessão de direitos de transmissão, patrocínios e venda de atletas tivas de cobertura esportiva. Para denunciar os esquemas de corrupção por trás do negócio esportivo, um bom jornalismo investigativo. Para driblar a impossibilidade de acesso aos jogos, promoção de campeonatos alternativos, até mesmo de várzea. Para combater o monopólio dos direitos de transmissão, cobertura política do tema e, quem sabe, ações judiciais. “Não tenho nenhuma preocupação de dizer que, hoje, a cobertura esportiva de TV aberta é mais chapa branca que a cobertura política. As empresas de comunicação (...) não são críticas em relação à Fifa, à CBF, porque de alguma maneira se associaram a elas para obterem os direitos de transmissão”, diz. O jornalista ressalta: “o mundo do esporte hoje é o mais propício à lavagem de dinheiro, pela intangibilidade dos valores que você trabalha nas transações. É nossa função contar isso pro público”, afirma. Divulgação ESPN PROGRAMAÇÃO ESPORTIVA DOS VEÍCULOS DA EBC Segundo a empresa de consultoria Pluri, o esporte brasileiro movimenta cerca de R$ 67 bilhões, ou seja, 1,6% do Produto Interno Bruto do país e o equivalente ao PIB da Sérvia. Para 2016, a projeção é que, após os Jogos Olímpicos, esse número cresça, passando a representar 1,9% do total da riqueza produzida no Brasil. Grande parte da renda de clubes de alto desempenho que alimentam esse mercado vem, justamente, de veículos de comunicação. A transmissão de eventos esportivos é um modelo de negócio interdependente, centrado na venda dos direitos de transmissão das competições. (Confira valores para exibição das maiores competições esportivas do país no box sobre direitos de transmissão). Para se ter uma ideia, 32% da receita total do Sport Club Corinthians Paulista – um dos times de futebol que mais faturou na transmissão de seus jogos no ano passado – veio da negociação desses direitos. A fatia é a maior entre todos os ativos de seu orçamento. A regulamentação brasileira, diferente de outros países, como a Argentina, não privilegia veículos públicos na exibição de jogos, nem mesmo de seleções nacionais. Com o orçamento reduzido e uma distribuição de sinal ainda pouco atrativa para times e entidades organizadoras, como a Confederação Brasileira de Futebol (CBF), emissoras públicas acabam ficando de fora da disputa. “É um absurdo uma emissora pública ter que pagar pra dar ao público acesso aos eventos. Nós sequer podemos entrar nos estádios”, protesta Philipe Deschamps, coordenador da equipe de transmissões do Núcleo de Esportes da EBC. Juca Kfouri ressalta a importância de investir em formas alterna- Reprodução Rádios CVB matéria de capa Juca Kfouri, jornalista, acredita que a compra dos direitos de transmissão por emissoras de TV compromete o jornalismo esportivo Revista do Conselho Curador 15 matéria de capa Direitos de transmissão da TV aberta: Futebol: • Série A do Campeonato Brasileiro: a partir de 2011, os clubes passaram a negociar diretamente com a Globo a transmissão dos jogos em que participam, sem a mediação do Clube dos 13, que até então era responsável pela venda dos direitos do Brasileirão. Para cada clube há um valor definido. O Sport Club Corinthians, por exemplo, recebeu R$ 102,5 milhões no ano de 2013, com a negociação de seus direitos. O acordo entre os clubes e a emissora foi válido por três anos, até a temporada de 2014. • Série B do Campeonato Brasileiro: comercializada pela empresa de marketing esportivo Sport Promotion, a segundona tem valor variável, dependendo das emissoras interessadas e dos times participantes – times grandes elevam o preço do Campeonato. Em 2013, somente a Sociedade Esportiva Palmeiras faturou R$ 76,2 milhões com o repasse dos direitos de transmissão, licenciados para a Rede TV!. • Série C do Campeonato Brasileiro: também comercializada pela Sport Promotion, a série C foi licenciada para a TV Brasil em 2014 no valor de R$ 9,3 milhões, em caráter de exclusividade. O contrato dá direito à exibição nacional em TV aberta e internacional, via TV Brasil Internacional, além da prestação dos serviços de produção para entrega do sinal em áudio e vídeo. Basquete: • O Novo Basquete Brasil (NBB) é organizado pela Liga Nacio- nal de Basquete em parceria com a Rede Globo, que comercializa os patrocínios juntamente à entidade. O acordo inclui, também, a posse exclusiva dos direitos de transmissão dos jogos para a emissora. Segundo a assessoria de imprensa da Liga Nacional de Basquete, não houve ainda uma negociação específica com outras emissoras para sublicenciamento dos direitos do NBB, não sendo possível, por isso, definir um valor exclusivo para exibição do campeonato. Carlos Gomes concorda com a importância do jornalismo investigativo no esporte. Pondera, porém, que o orçamento de uma empresa pública não cobre todas as suas necessidades. “Eu acho que tudo que a gente puder fazer pra esclarecer e trazer informação ao público, a gente deveria. Precisamos de um programa de grandes reportagens esportivas. Mas, nosso orçamento não dá pra tudo. Tem coisas que são mais importantes”, defende. Sobre a necessidade de ampliação do leque de coberturas, Nathália comenta: “o que acredito que ainda falta à EBC é tomar uma decisão definitiva pela cobertura esportiva, com planejamento, linha editorial, equipe ampliada, pautas diferenciadas – e isso em todas as praças”. Para ela, assim como para Kfouri, a Empresa deveria inovar e transmitir campeonatos de modalidades que não são comuns na TV. Além disso, explorar novos formatos na cobertura do que está amarrado pelos direitos de transmissão, apostando em divisões inferiores. Série C Desde de 2013, a TV Brasil transmite com exclusividade a Série C do Campeonato Brasileiro de futebol. A decisão pela exibição, segundo o ouvidor-adjunto da EBC, Marcio Bueno, foi “um gol de placa”. Para ele, a iniciativa da TV Brasil contempla uma parcela importante da população, valorizando clubes e torcidas esquecidos pela mídia, além de trazer visibilidade para toda grade de programação da emissora. Anizio Silva/Creative Commons Vôlei: • Procurada, a assessoria de imprensa da Confederação Brasileira de Voleibol informou que não poderia ceder informações de como são organizadas as Superligas de Vôlei e como ocorre a comercialização dos direitos de transmissão dos jogos em função de uma cláusula de confidencialidade no contrato. Em suas demonstrações contábeis do ano de 2013, porém, pode-se conferir o valor de R$ 8,3 milhões em receitas extraordinárias recebidas pela Confederação referentes a direitos de transmissão cedidos. A Globosat Programadora e a Globo Comunicação Participações aparecem como fontes pagadoras em “contas a receber” para 2014, somando um montante de R$ 3,1 milhões, referentes a direitos de transmissão. *Fontes: Sport Clube Corinthians, Sociedade Esportiva Palmeneiras, EBC, Liga Nacional de Basquete e Confederação Brasileira de Voleibol. 16 Empresa brasil de comunicação Jogo do Santa Cruz contra o Fortaleza, times da Série C do Campeonato Brasileiro, que a EBC transmite com exclusividade “Mas, para atingir esses objetivos, as nossas transdeiras, escudos, hinos e uniformes. Considerando essas missões precisam de mudanças profundas. Da maneira premissas, a transmissão do jogo analisado neste relatócomo estamos trabalhando, o resultado pode ser o inverrio, foi no mínimo problemática”, aponta. so daquele que se pretende alcançar”, alerta Marcio, em Além da comparação insistente com times do Susua análise, publicada no relatório da Ouvidoria do mês deste brasileiro, que soou como desprezo para torcedode abril, sobre a primeira transmissão do campeonato res nordestinos, Marcio destaca a falta de investimento em 2014. O trabalho da equipe que narrou e comentou da EBC na transmissão do campeonato, uma vez que o a partida recebeu manifestações negativas de usuários narrador e os comentaristas dos jogos não comparecem nos canais da Ouvidoria. aos estádios, mas assistem às partidas diante de um apaEm 2013, a Ouvidoria recebeu um total de 7017 relho, no Rio de Janeiro. mensagens e, destas, 199 referiam-se a esportes e camLeonardo Rodrigues concorda, e lembra que, a despeonatos. No primeiro trimestre de 2014, foram 1585 peito das enormes torcidas da Série C, a empresa perde contatos, sendo 24 deles sobre a cobertura esportiva da oportunidades de trabalhar mais o campeonato em seus EBC. É um público participante e apaixonado. conteúdos – como na comemoração dos aniversários Um dos reclamantes é Marcelo Martins, que comdos times, que a EBC deixou passar batido. “A escolha prova a tese de que, sim, da Série C, pra mim, é toa Série C atrai novos pútalmente acertada, mas falta blicos, mas eles chegam planejamento. Compramos atentos e criteriosos quanto os direitos e jogamos [as à qualidade do conteúdo transmissões] na programaA escolha da Série que é veiculado. Marcelo ção sem nenhuma preocuC, pra mim, é totalmente escreveu em sua mensagem pação. Temos um prograpara a Ouvidoria que, para ma de esporte que debate acertada, mas falta se transmitir o Brasileirão, o futebol de São Paulo e planejamento (...) deve haver preparação. Rio, enquanto deveríamos “Meus amigos, não invisestar discutindo a Série C”, Temos um programa tam dinheiro em algo que pondera. de esporte que debate não saibam fazer. Os profisNesse sentido, a forsionais reclamam dos times mação da Rede Nacional o futebol de São da Série C, dizendo que são de emissoras públicas tem Paulo e Rio, enquanto ruins, mas toda a equipe é se mostrado uma opção nota zero”, protesta. eficiente na promoção da deveríamos estar Entrevistado, o paranaregionalização e da diverdiscutindo a Série C ense comenta que espera sidade. Durante a transmisda TV Brasil mais profissão do jogo analisado pela sionalismo e dinamismo Ouvidoria, por exemplo, na cobertura de eventos foi um repórter da emissora esportivos. “Acho que [os local que trouxe o contracomentários] são muito pessoais, os briefings das parponto às críticas do comentarista, explicando a tradição tidas são malfeitos, e, principalmente falta informação por trás do escudo do time, que o profissional da casa dos comentaristas convidados sobre os clubes, que não acabara de desmerecer. estão atentos à realidade atual dos times”, diz. “As emissoras parceiras participam da cobertura, Marcio Bueno ressalta, em seu relatório, essa falta produzem material e entram no ar com a gente. Usamos de preparo e isenção, por parte da equipe esportiva da esses repórteres também pra respeitar o regionalismo e EBC, no trato com os times participantes da terceirona. valorizar os sotaques. O principal motivador da decisão “Em toda a programação, a TV Brasil se propõe a não da EBC de comprar os direitos da Copa do Mundo, por expressar – e a combater – todas as formas de preconexemplo, foi construir a Rede de rádios, que pode ser ceito e a respeitar as identidades regionais o que, por usada pra outros fins da comunicação pública”, explica extensão, inclui as preferências clubísticas, suas banPhilipe Deschamps. Revista do Conselho Curador 17 matéria de capa Além do futebol A discussão da predominância do futebol na cobertura esportiva precisa passar pela importância dessa modalidade na construção da identidade nacional. Isso porque, antes de ser amado pelo povo e ser símbolo de brasilidade, o futebol foi uma arma poderosa na construção da ideia de nação. “No início da década de 30, após a Semana da Arte Moderna, se começa a pensar na ideia de Brasil. Você tem uma ruptura no pensamento, com Rubens Braga, que fala que a mistura de raças é uma coisa boa do país, e não ruim. Mário Filho, Gilberto Freire e Nelson Rodrigues começaram, então, naquele momento de forte concentração política, a pensar no futebol como elemento de unificação”, explica o professor da UERJ, Ronaldo Helal. mesma atenção que o futebol. “Alguns esportes não estão na mídia e são populares. O brasileiro gosta de vôlei, basquete, regatas. No rio, onde moro, tem mais futevôlei e vôlei na rua que futebol. O negócio é que gente nunca sabe o que vem primeiro – a popularidade do esporte ou a cobertura midiática dele, os dois se alimentam”, comenta. Nereide Beirão acredita que a divulgação de novas modalidades esportivas incentiva a prática delas, e que essa é uma função social importante da comunicação pública. “Na medida que a gente dá espaço de divulgação para esportes desconhecidos, você acaba incentivando a democratização e a prática de vários esportes. Nesse sentido, fazemos um pouco de política pública”, diz. El Gráfico magazine/Domínio Público Valter Campanato(ABr) Com a vitória nos anos de 1958, 1962 e 1970, Seleção Brasileira passa a ser um símbolo importante de identidade nacional O acadêmico relembra que a relação entre a valorização do negro, como matriz do povo, e o futebol, que ganhava ares tipicamente brasileiros, solidificou a paixão nacional pela Seleção: “Gilberto Freire tinha uma coluna semanal em um jornal e escreve, em 1938, um texto muito famoso: ‘O futebol mulato’, onde ele explica porque nosso futebol é melhor que os outros – por causa da nossa mistura de raças”. As vitórias da Seleção Brasileira nas Copas que se seguiram consolidaram a mitologia de que nosso futebol é diferente e a seleção passou a ser a grande paixão de todo brasileiro. 18 Empresa brasil de comunicação Mas, segundo o pesquisador, a globalização e a ida precoce dos jogadores brasileiros para times do exterior estão modificando a forma como o torcedor enxerga a seleção. “Com a globalização e o declínio dos estados nação, um fenômeno novo passa a acontecer: os torcedores se ligam mais aos seus times locais que à Seleção. Na minha opinião, a Seleção ainda é a pátria de chuteiras, só que chuteiras cada vez menores. Sua influência diminuiu muito”. Para o sociólogo, existem outros esportes tradicionalmente praticados por brasileiros, mas que não recebem a Jogos indígenas e outras modalidades esportivas não profissionais aparecem nos jornais da EBC A diretora afirma que, na cobertura da EBC, não é dado um peso maior ao futebol. Segundo ela, a Empresa cultiva a tradição de cobrir esporte amador, olímpico e paralímpico. “Damos os gols do Campeonato Brasileiro, com atenção especial para a Série C, e cobrimos os regionais mais pro seu final, além de partidas destaque de campeonatos de futebol internacionais. Mas, também fazemos uma cobertura sistemática de outros esportes, do meio para o final dos torneios”, explica. Alguns exemplos de competições alternativas divulgadas pelos veículos da EBC são as ligas de basquete, jogos militares, de inverno e indígenas. Apesar de ter a função, determinada pela Lei que a criou, de ser complementar aos sistemas privado e estatal de comunicação, a EBC não deve deixar de noticiar o que os veículos comerciais também dão, na visão de Nereide. “Nosso papel é fazer o que as comerciais não fazem, mas não deixar de lado o que todo mundo faz, afinal, o cidadão não tem a obrigação de ver outros jornais além do nosso pra se informar. O que a gente tem que fazer é dar de uma forma diferente e acrescentar, ampliar”, esclarece. Philipe concorda: “não é porque a mídia comercial não cobre golf, surf, que vamos fazer. Não é importante pra gente porque são esportes de elite”. O coordenador conta que, nas rádios, os programas esportivos abordam esportes olímpicos, escolares, indígenas e outros, mas confirma que a maioria dos programas falam de futebol. “Tentamos permear a programação com outras modalidades, mas o ouvinte vai desligar se não falarmos de futebol”, defende. Na opinião dele e do colega Carlos, a falta de interesse do público por outros esportes está ligada à falta de políticas de Estado para o setor. “Hoje, existe uma ditadura Revista do Conselho Curador 19 do futebol nas emissoras comerciais. Mas o veículos fazendo e a comunicação pública, que deveria interesse do brasileiro pelo futebol é mesmo cumprir esse papel de maneira mais contundente, não maior que pelos outros esportes. Não temos faz”, aponta. uma política pública de esportes, então, o Juca Kfouri comenta que a Copa do Mundo no Brafutebol é uma questão de cultura esportiva, sil é uma oportunidade rara para a comunicação pública não tem como fugir disso”, diz o gerente. fazer telejornalismo esportivo com independência, liberEm oposição, Leonardo defende que a dade e senso crítico. “E esse papel é um papel que só aqui falta de investimento por parte do governo se pode fazer. Não se fará em nenhuma TV comercial, não pode ser desculpa para a falta de coberporque irá contra demais os interesses dos patrocinadotura da comunicação pública. “Nosso jornares”, explica. lismo não deve se pautar só por aquilo que “Vamos ter duas Copas do Mundo no Brasil, uma no está emanando do poder público, acho isso, campo e outra nas ruas. Vamos ter que olhar pra essas inclusive, sintomático. Em que pese que os duas copas. Vamos ter, provavelmente, uma lindíssima outros esportes não têm a popularidade do festa dentro dos estádios, e uma situação de tensão fora futebol, eles deles, agravada ou não, de têm adeptos. Só acordo com o desenvolporque não tem vimento da própria compolítica pública petição”, aposta Kfouri, e pra eles, não completa: “é missão de uma Tentamos permear vamos cobrir? TV pública discutir como é a programação com Pelo contrário, que estamos recebendo uma vamos denunCopa e vamos receber uma outras modalidades, ciar que não Olimpíada, se até hoje semas o ouvinte vai tem”, propõe. quer uma política esportiva Para o repórter, a gente tem”. O Ministério desligar se não a EBC deve dos Esportes foi procurado falarmos de futebol. exercitar um para esclarecer questões da olhar indepenpolítica de esportes no Bradente das ações sil, mas não quis dar entredo governo, o vista à Revista do Conselho que refletiria Curador. Para a jornalista da casa e coordenadora da Radioano aumento da qualidade, inclusive, do gência Nacional, Juliana Nunes, a cobertura da Copa do jornalismo esportivo da casa. “Acho que a Mundo pela EBC (saiba mais no box sobre a programagente deveria ser mais crítico com as coisas. ção dos veículos da Empresa durante o período do munExiste uma preocupação das chefias de dar dial) tem sido um aprendizado pras equipes. “Alguns teouvidos a todos os lados, que é justa, mas mas temos coberto bem, outros não, mas vamos sair mais pode ser aplicada de maneira errada. A gente prontos pra fazer a conexão entre a cobertura factual e as vai ouvir o órgão público e eles não querem questões de fundo”, acredita. falar, então não damos a notícia. Isso não inviabiliza a cobertura. Às vezes não temos a No contorno do campo resposta oficial, mas tem uma crítica imporAs manifestações de junho passado contra a realitante ali colocada”, conta. zação da Copa do Mundo da Fifa no Brasil colou, defiLeonardo acredita que a falta de ousadia nitivamente, o noticiário político com o esportivo. Nas na produção das notícias pôde ser observada bancadas dos jornais, comentaristas até tentam focar sua na cobertura da Copa do Mundo, que a EBC abordagem no esquema tático da Seleção Brasileira, mas vem realizando. “Não sei se existe uma não há como deixar de mencionar os protestos, que, muipressão do governo para não sermos tão tas vezes, influenciam o que acontece dentro do campo. críticos com a Copa, mas a gente vê outros 20 Empresa brasil de comunicação Felipe Canova/Creative Commons matéria de capa Manifestações no Brasil, desde junho passado, apontam insatisfação com gastos públicos para realização da Copa Para dar conta desse contexto, a EBC aposta na co“Não somos o país do futebol, mas somos provabertura jornalística de ações políticas na área do esporte. velmente o país da Copa. Em nenhum outro lugar do A Agência Brasil, por exemplo, não acompanha eventos mundo, você vê o tipo de confraternização que se vê no esportivos sistematicamente, mas a política pública em Brasil em dia de jogo da Seleção na Copa”, conta Kfoutorno do fortalecimento do ri. Para ele, a intenção do esporte. Lana Cristina, gegoverno de realizar uma grande festa, que contasse rente da Agência, esclarece que o tamanho da equipe com o apoio apaixonado do até influência, mas a depovo, acabou se tornando (...) É missão de uma cisão pela não cobertura é um fator de mobilização: “é TV pública discutir como mesmo editorial. “Eventuclaro que as manifestações almente, em grandes evennão foram contra a Copa é que estamos recebendo tos, damos os resultados e o das Confederações, mas ela uma Copa e vamos receber que ocorre em seu entorno foi a gota d’água que transou, ainda, quando há um bordou o copo, de um país uma Olimpíada, se até que olhou pra seis novos assunto de destaque envolhoje sequer uma política vendo a classe de atletas”, estádios e disse: ‘opa! Se explica. somos capazes de fazer areesportiva a gente. “Três semanas antes nas tão belas, porque não somos capazes de fazer esda Copa, publicamos matérias em torno do evento, colas, hospitais e sistemas tratando de assuntos como de transporte público desse tipo?’”. acessibilidade, mobilidade, Revista do Conselho Curador 21 matéria de capa Rádios: Portal: • Rede de rádio, composta por 25 emissoras parceiras, transmite 50 jogos, no total. Os jogos são transmitidos direto do IBC, Centro de Mídia, no Rio de Janeiro, exceto nos jogos do Brasil, onde a EBC tem local reservado nos estádios; • T ransmissão das coberturas dos jogos pelas rádios, ao vivo, via web, com acesso liberado somente para o Brasil; • Jornadas esportivas: a equipe de narradores e comentaristas, que contará também com profissionais da TV Brasil, entra ao vivo 2h antes e 1h30 depois dos jogos do Brasil; •D ivulgação de conteúdo colaborativo, recebido via portal ou redes sociais. • Programas de esporte das rádios entram diariamente, também direto do IBC. Eles podem ser retransmitidos pelas parceiras ou não, conforme seu interesse. Agência: TV Brasil: •M atérias relacionadas ao contexto da Copa do Mundo, produzidas também pela equipe de jornalismo das Rádios EBC, com temas como saúde, educação, segurança, telecomunicações e mobilidade urbana (desde abril de 2014). •Rede entra nos jornais com cobertura local, preparativos em cada estado e o acompanhamento dos torcedores brasileiros e turistas, os festejos comemorativos e as manifestações populares; • Imagens cedidas pela Globo nos jornais e programas esportivos, com o máximo de 3 minutos e 36 segundos de exibição; • Reportagens e programas especiais da TV Brasil e emissoras parceiras sobre o contexto do mundial abordando temas como comunicação e direitos de transmissão, mobilidade, cuidados com a saúde e educação no período da Copa, segurança pública, manifestações, economia, turismo e outros aspectos que impactam a vida do cidadão. TV Brasil Internacional: • Brasileiros no exterior: um programa sobre a realização da Copa do Mundo no Brasil; • Programetes com informações de serviço para turistas estrangeiros que desejam visitar o Brasil durante o mundial; • Brasil Hoje: discussões sobre o contexto da Copa em programação diária desde maio. 22 •C riação do site ebc.com.br/copa para agrupar conteúdos de toda EBC e disponibilizar a tabela atualizada da competição, em tempo real; Empresa brasil de comunicação •C obertura dos jogos do Brasil com dois repórteres e um fotógrafo; •C obertura sobre o impacto do mundial nas cidades-sede; Especial Direitos das crianças no país da Copa recebeu o Prêmio Tim Lopes de Jornalismo Investigativo Multimídia: •S érie Direitos das crianças no país da Copa: especial, ganhador do Concurso Tim Lopes de Jornalismo Investigativo, sobre os impacto do evento na vida de crianças e adolescentes, principalmente em relação à prostituição infantil e ao turismo sexual. As reportagens foram produzidas nas cidades-sede da Copa sendo exibidas no Rádio, na Agência Brasil e na TV Brasil, em maio. Além disso, um hotsite foi feito para os conteúdos do especial: http:// www.ebc.com.br/timlopes2014. ocorrem nesses lugares, e como a Copa pode ter aprofundado o problema. Além disso, as reportagens procuravam observar se o direito à prática de esportes vem sendo garantido ou não no país e como o racismo opera no contexto esportivo. A proposta foi ganhadora do Concurso Tim Lopes de Jornalismo Investigativo 2014, da Agência Andi, que premia com um valor em dinheiro sugestões de pautas que promovam os direitos da infância. “Nos escrevemos, ganhamos o prêmio, mas o projeto inicial já previa a contrapartida da EBC, foi uma coprodução. Houve um investimento grande da Empresa, no mínimo o dobro que recebemos”, diz Juliana Nunes. Tania Rego(ABr) DESTAQUES DA COBERTURA DA COPA DO MUNDO (Confira a cobertura completa aqui): comunicação, proteção de crianças e adolescentes, serviço, segurança, saúde, educação e turismo”, conta Lana. A mesma linha de cobertura para o mundial foi seguida pelas equipes de radiojornalismo e telejornalismo da casa. Coordenado pela Radioagência Nacional, o especial “Direitos das crianças no país da Copa” foi um destaque na cobertura social do evento. Foram realizadas matérias nas 12 cidades sedes para verificar quais violações relacionadas aos direitos de crianças e adolescentes O projeto, que foi produzido durante cinco meses, contou com o apoio de 30 pessoas de várias áreas da Empresa, entre jornalistas, produtores, sonoplastas, fotógrafos, narradores e profissionais que construíram a plataforma online de disponibilização do conteúdo. “O especial nasceu pra ser das Rádios, depois fomos agregando com a Agência Brasil. Trocamos figurinhas com o Caminhos da Reportagem [programa de grandes reportagens da TV Brasil] e fizemos um curso na Andi com eles. Foi um momento de aprendizado e troca de experiências”, lembra Juliana, que acredita que, num trabalho multimídia é importante definir o veículo prioritário para, então, se adequar o material aos outros, através da edição. Coordenando empregados de várias equipes, Juliana teve algumas dificuldades para organizar as equipes de modo que as pessoas tivessem dedicação exclusiva, mas aprendeu que a produção multimídia e integrada é essencial na cobertura aprofundada dos temas. “Precisamos avançar para priorizar coberturas especiais. Isso demanda muito, porque desfalca as equipes. Mas precisa haver esse entendimento de uma nova forma de trabalhar, sair das caixinhas. É legal você misturar, quem cobre esportes e quem cobre infância, política pública, senão você fica com um olhar só”, diz. Revista do Conselho Curador 23 matéria de capa No Conselho Na visão de Murilo, o Conselho Curador é um aliado atento na construção de uma estratégia para cobertura de esportes dentro da EBC: “acho que esse debate está inserido no pleno. É só lembrar que foi um parecer do Conselho que validou a compra da Série C e que aprovou a Política de Esportes da Empresa. Enxergamos a problemática dos direitos de transmissão na época, e hoje ainda temos essa sensibilidade para o tema”. Você sabia? As reuniões do Conselho Curador são transmitidas Para Murilo Ramos, conselheiro, a comunicação pública ainda não tem uma cobertura esportiva diferencial Os documentos que regulamentam a linha editorial da EBC para o tratamento do esporte são os planos de trabalho anuais (confira o de 2014 aqui), o Plano de Cobertura da Copa do Mundo, o Plano Editorial da Agência Brasil, o Manual de Jornalismo e a citada Política de Esportes. Trazem valores como priorização do esporte na cobertura jornalística, complementariedade dos sistemas de comunicação, integração de plataformas, inclusão social e cultura, pluralidade de temas e modalidades, inovação, abordagem diferenciada e diferenciação entre o esporte de alto desempenho e o amador, devendo a prioridade da cobertura ser dada ao esporte que o cidadão pratica e não ao que vê. “Acho que ainda não fazemos isso. Essa não é uma crítica pela crítica e não se limita à EBC, o jornalismo esportivo em geral faz tudo da maneira clássica – e a EBC não faz diferente”, diz Murilo. 24 Empresa brasil de comunicação ao vivo pelo endereço: www.conselhocurador.ebc.com.br/transmissaoaovivo Acompanhe a próxima no dia 13 de agosto a partir das 9h Revista do Conselho Curador 25 Espaço Público Espaço Público EBC: entre estádios, escolas ea comunicação pública Shutterstock Por: Espaço Público (Núcleo de Estudos de Comunicação Pública dos Trabalhadores e Trabalhadoras da EBC) 26 Empresa brasil de comunicação N a última semana de maio, o jornal Folha de São Paulo estampou em sua primeira página a notícia de que os R$ 25,8 bilhões investidos com a Copa custavam menos de um mês de investimento federal na área da educação. A comparação marca uma mudança de olhar da grande imprensa em relação à Copa do Mundo, talvez embalada pela pressão dos patrocinadores do jornal, muitos deles coincidentes com os da Fifa. Mas deixando de lado os humores da grande impressa, é preciso constatar que a comparação é oportuna. Ajuda a dissipar dúvidas sobre as prioridades das políticas públicas no País. Educação, claro, é direito, é constitucional e é estruturante da sociedade brasileira. Comparação justíssima. O exercício feito pelo jornal pode ser aplicado em outros campos e ajudar a revelar outras verdades na definição das prioridades públicas do Governo Federal. Por exemplo, comparando os gastos realizados na Copa e os investimentos na Comunicação Pública, campo do qual a Empresa Brasil de Comunicação ( e suas duas emissoras de TV, oito de rádio, um portal, uma agência e uma radioagência) é a principal representante. Ao contrário do que acontece com educação, é melhor começar o exercício com modéstia e usar como parâmetro apenas o investimento realizado para construção dos estádios (R$ 8 bilhões, ou pouco menos de 1/3 do investimento total). Apenas essa parte do montante de recursos investido seria suficiente para manter a EBC inteira, segundo seu orçamento atual, por mais de 16 anos. Assustou? Faça as contas você mesmo: com o contingenciamento anunciado no início do ano, o or- çamento da EBC para 2014 é de R$ 494 milhões. Claro que haverá os que argumentam que, no caso dos estádios, além dos investimentos diretos feito pelos Estados e União, parte dos recursos vieram do BNDES que, apesar dos juros subsidiados, é dinheiro que volta aos cofres públicos. Mas, se a conta vale como parâmetro para mostrar a prioridade por um lado, porque não serviria para mostrar o abandono da política de comunicação pública pelo outro? E depois de todo o investimento público realizado para o Brasil sediar a Copa, os brasileiros não poderão assistir a nenhum dos jogos pela emissora pública. Os rígidos critérios de exclusividade e lucro impostos pela Fifa foram aceitos sem barulho ou protestos pelos principais protagonistas na discussão sobre o fomento e a consolidação da Comunicação Pública no Brasil. Regras que foram aceitas como leis naturais, contra as quais não cabe questionamento. É assim, tal qual a lei da gravidade, que o Brasil costuma tratar o que diz respeito à comunicação. Não se contesta. Acata-se. Fica a pergunta: qual teria sido a repercussão de um único pedido de liminar na justiça movido pela EBC questionando a exclusividade da emissora privada na transmissão de um evento financiado quase que inteiramente por recursos públicos? Talvez nenhuma. Talvez alguma. Poderia até não dar em nada. Mas, no mínimo, teríamos registrado nos autos a indignação contra mais um dos tantos absurdos que se escondem sob o rótulo do “padrão Fifa”. Se isso tudo não fosse triste, poderia ser motivo de riso. Mas isso, claro, se a Comunicação Pública já tivesse aprendido a fazer piada. Revista do Conselho Curador 27 Programação em debate programação: um patrimônio da emissora sua grade de programação, que, em determiuma grade de programação é a relação com nado momento, no auge da TV aberta, chegou o conteúdo independente, que não deve a organizar a sociabilidade brasileira com seu ser confundido com a mera terceirização “novela-novela-jornal-novela”. da produção. Quanto mais previsível for a Pode parecer paradoxal, mas é justamengrade de programação, mais fácil se torna te no momento em que crescem as opções de lidar com produtores independentes e seus vídeo por demanda (VoD) que a grade de proprazos de produção. gramação se torna mais importante para uma Como sugestão, a TV Brasil poderia emissora. Já que os serviços de VoD ainda não estudar com mais cuidado o modelo dos dispõem de ferramentas muito sofisticadas para “commissioning editors”, adotado com sugerir conteúdos a partir de nossos gostos, consucesso por emissoras públicas como a sumir audiovisual por demanda requer um esbritânica BBC e a canadense CBC. Nesse forço de seleção modelo, a emisde conteúdo por sora define o que parte do especespera da grade de tador. Já a grade programação em de programação um determinado (...) Diante do permite justahorário. Por exemmente suprimir plo, o que uma crescimento da TV paga esse esforço, reemissora pública (...) e da possibilidade de duzindo o tempo espera para o seu prévio ao consuconteúdo infantil? transmitir mais de uma mo. Que público deve grade simultaneamente A partir desser alcançado? sa simplificação, Quanto mais pre(...) faz sentido ter uma a grade fideliza cisas forem esTV pública de caráter o espectador, gesas informações, rando expectamaior a chance do generalista? tiva positiva em conteúdo atender torno das marcas as expectativas. e formatos que a De posse desse emissora ofere“mandato”, cabe ce. Quanto mais ao “commissioestável e previsível (embora de forma alguma ning editor” se relacionar com produtoras imutável) for esta grade, maior a chance de independentes capazes de suprir a demanda construir uma relação de fidelização. da emissora. É o “commissioning editor” Mas, a construção de uma grade de prograque gerenciará o processo de seleção e mação sólida e confiável tem como pressuposto acompanhará a produção do conteúdo, gaa definição da linha editorial do veículo. É prerantindo sua aderência ao “mandato” conciso que a emissora saiba o que pretende ser. ferido pela emissora. Por exemplo, diante do crescimento da TV paga Em resumo, é preciso que a TV Brasil (cujos canais tendem naturalmente à segmenveja a sua grade de programação como um tação) e da possibilidade de transmitir mais de de seus principais bens intangíveis e que uma grade simultaneamente, na TV digital abertome as medidas necessárias para valorizar ta, faz sentido ter uma TV pública de caráter geeste seu patrimônio. neralista? Ou seria interessante apostar em grades segmentadas, com conteúdo específico, por exemplo, para jornalismo e o público infantil? Outra questão essencial para a definição de Arquivo Pessoal Grade de Programação em debate Gustavo Gindre Especialista em regulação da atividade audiovisual Shutterstock T radicionalmente, analisamos os ativos de uma emissora de TV a partir dos seus bens físicos (imóveis, equipamentos, veículos, etc) e intangíveis (talentos, marcas, formatos, etc). Entre os bens intangíveis um dos mais negligenciados é a grade de programação. No Brasil, é notório que boa parte das emissoras abertas não sabe administrar sua grade de programação, com mudanças contínuas e desconexas, que não revelam a existência de uma política por detrás. É fato que a TV Globo deve seu sucesso a uma série de fatores, internos e externos, tão amplos que vão desde a excelência tecnológica à entrada ilegal de capital estrangeiro. Mas, um dos elementos que contribuiu fortemente para sua liderança ao longo de décadas foi a estabilidade de Empresa brasil de comunicação 29 Empresa brasil de comunicação Revista do Conselho Curador 29 Coluna acadêmica Coluna acadêmica Arquivo Pessoal A TV pública é uma só é preciso conhecê-lo ampla e profundamente, estado ferir nas decisões sobre como investir o recurso público por estado, emissora por emissora. Que modelo jurídico que se injeta naquelas emissoras ou sobre que conteú-institucional tem? Qual é o modelo administrativo-fidos oferecer ao público, o seu legitimo dono (TVs Pernanceiro adoto? Quem decide sobre a programação, que nambuco e Piratini são exceções). interesses pautam o jornalismo? As respostas subsidiaHipótese 2. A questão é política, é antirrepublicana, riam a elaboração de uma lei que acolheria as diferenças é antidemocrática. Atinge, sobretudo, os estados das rede um país continental e apartado, e de emissoras, em giões mais pobres e desempoderadas, exatamente onde geral, com baixíssima audiência, porque dessintonizamais se faz necessária a comunicação pública, aquela das em relação ao interesse público. que facilita o diálogo entre governos e cidadãos, e que Uma resposta possível facilita a expansão da participação e do controle social. Neste sentido, parece um paliativo incoerente que Descoladas de um projeto de desenvolvimento das pesa EBC, por meio da TV Brasil, pretenso (e didático) soas, as emissoras públicas, financiadas com o dinheiro modelo de TV pública, proponha uma rede nacional de público, seguirão a serviço do crescimento do poder emissoras não-públipolítico e econômico cas. Porque, se amplia de alguns, e dos mespara si alguns milímos. metros de audiência, A respeito da reforça, com o uso do questão, parece muito Melhor seria, talvez, recurso público que a reduzido e cômodo propor às emissoras mantém, projetos espensar que se trata de taduais de emissoras um problema dos Esintegrantes da rede, como estatais governamentados, que estes são condição à manutenção tais. Melhor, talvez, autônomos, capazes fosse guiar-se pelo que de encontrar, em seus do convênio, que passem indica o § 3º do incigovernos, a solução a cumprir uma agenda de so IX do Artigo 8º e, de transferir o conespecialmente, no que trole das emissoras desgovernamentalização estabelecem os incisos estatais para a socieVIII e IX do Artigo 2º dade – ou de divida Lei 11.652/2008 di-lo com ela. Como que constitui a EBC. também soa falacioMelhor seria, talso admitir que tais vez, propor às emissoras integrantes da rede, como conemissoras estariam melhorando pelo fato de passarem a dição à manutenção do convênio, que passem a cumprir transmitir sinal digital, quando, na verdade, a moderniuma agenda de desgovernamentalização, de troca da zação que se espera é a de cunho político, mais difícil. chapa branca pela chapa colorida e plural do interesse Por onde começar, então, a buscar tantas respostas? público. Um passo a ser dado, a cada mês - uma lei estadual, a criação de conselhos e de uma diretoria execuUma possível resposta tiva democrática e representativa, a mudança nos conO primeiro passo pode ser admitir que os governos teúdos etc -, de forma que, ao final de um ou dois anos, estaduais, independentemente do partido que o esteja tivéssemos uma rede de televisão efetivamente pública. controlando, não estão dispostos a fazer o que não siDefende-se, portanto, a partir de reflexões realizanalizam pretender fazer. O segundo, aceitar que o uso das no singelo Grupo de Estudo em TV Pública, da Uniindevido das TVs públicas é também ineficiente e ineversidade de Fortaleza, a adoção de uma política públificaz, podendo figurar entre os crimes de improbidade e ca da EBC para os Estados, que promova a inclusão de de responsabilidade. O terceiro, entender a necessidade emissoras estatais no espectro da comunicação pública. da regulamentação imediata do Artigo 223 da ConstituiE que enseje também a inclusão do público nas grades ção Federal, independentemente da luta por um marco de programação e, por efeito, nas tabelas de audiência. legal para a democratização da comunicação. Afinal, a TV pública é uma só. Aceitas as premissas do problema a ser enfrentado, Shutterstock Alberto Perdigão Mestre em políticas públicas e sociedade, coordenador do Grupo de Estudo em TV Pública da Universidade de Fortaleza A discussão sobre o projeto brasileiro de TV pública está prestes a completar 12 anos, e ainda não se vê claramente uma política pública de âmbito nacional capaz de ampliar o caráter público das emissoras estatais e de fortalecê-las enquanto ferramentas de cidadania ativa e de democracia participativa. O que se verificam nos Estados depois de três gestões do governo federal ditos democráticos e populares, são emissoras que se afastam do interesse público, governamentalizadas e patrimonializadas desde os governos militares, e esvaziadas de orçamento e gestão desde os governos neoliberais. O presente artigo tem a intenção de propor a discussão de um problema que parece despercebido aos brasileiros, enquanto nossos vizinhos da geografia e da história na América Latina avançam, embalados numa multiplicidade de soluções sustentadas pela volta da democracia à região e pelo advento da TV digital. Duas hipóteses Hipótese 1. O problema é generalizado, é crônico, é grave. Atinge especialmente as emissoras estaduais ex-educativas que, não raro, migraram administrativamente das secretarias de educação e/ou de cultura para os gabinetes dos governadores. Não se abriram as portas para que conselhos da sociedade ou de trabalhadores pudessem inter- Empresa brasil de comunicação 31 Empresa brasil de comunicação Revista do Conselho Curador 31 Palavra da Ouvidoria O que nos torna singulares E Giovana Tiziani/EBC Palavra da Ouvidoria Joseti Marques ouvidora-geral m 2012, quando da entrada dos primeiros empregados concursados na EBC, fui convidada a fazer uma palestra para o Projeto de Ambientação, com a incumbência de apresentar a Ouvidoria aos recém-chegados. Eu também havia chegado há pouco tempo, em meados de 2011, na função de ouvidora-adjunta para a TV Brasil. Aliás, éramos todos recém-chegados, a começar pela própria EBC, que mal completara seu quarto ano de existência no cenário da radiodifusão, tendo surgido qual criança que nasce de parto difícil e demorado, exibindo uma marca que a torna para sempre singular entre as demais – é pública. Uma empresa de radiodifusão nascida pública em um país que por mais de meio século aprendeu a ver a si mesmo, a realidade e o mundo pelas antenas da televisão privada. 32 Empresa brasil de comunicação As experiências profissionais ganizam os fatos da realidade, formando parte eventualmente acumuladas naquele importante da experiência da sociedade e da auditório teriam que ser depuradas pessoa. Uma pesquisa da Secretaria de Comupara que o novo pudesse surgir em nicação Social da Presidência da República, disua singularidade e plenitude, fazenvulgada em março deste ano, revelou que 97% do jus a mais uma conquista de cidada população brasileira tem o hábito de se infordania que se inaugurava com a EBC mar pela televisão. Toda atividade humana está – o direito à diversidade das fontes sujeita ao hábito, e a experiência tanto biográfide informação e à multiplicidade de ca quanto histórica é passível de um processo de conteúdos audiovisuais para a soacumulação. O acervo social do conhecimento ciedade brasileira. Perguntei àquela acumulado e compartilhado por essa e outras plateia, jovem em sua ampla maiofontes se transmite de uma geração a outra. ria, se havia ali alguém que alguma Contei então uma história vivenciada – e vez já teria divulgada – recorrido a pelo profesuma Ouvisor Laurindo doria. Leal Filho, Assistir TV é Os deLalo, primeipoimentos ro Ouvidor certamente parte do foram muida EBC e processo de acumulação tos: cursos apresentador de inglês, do programa de conhecimentos, bancos, Ver TV, na principalmente no que INSS... TV Brasil. Exemplos Em uma vitange aos telejornais, que que aponsita com seus selecionam e organizam tavam claalunos à redaramente ção do Jornal os fatos da realidade para duas Nacional, da direções: TV Globo, a da conele conta que fiança no ouviu do ediatendimentor-chefe que to de Ouvidoria, e a certeza de que ele editava o telejornal considerando um púOuvidorias existem para fazer valer blico médio semelhante ao personagem de deo direito do cidadão em relação à senho animado para adultos, Homer Simpson, qualidade de serviços e produtos, um engraçado beberrão de personalidade idiotanto em empresas públicas quanto tizada, sem princípios, oportunista. Muitos artiprivadas. Perguntei então se achagos foram produzidos a partir dessa desastrosa vam importante ter uma Ouvidoria declaração do editor-chefe do telejornal que há de TV, serviço gratuito sujeito à lei décadas é detentor da maior audiência no país, implacável do controle remoto. Não não cabendo mais comentários. houve respostas, mas os olhares Mas, naquele momento, percebi que ficou questionadores eram um sinal basevidente para os recém-chegados servidores da tante promissor. EBC a importância de cada um deles no proAssistir TV é certamente parte do cesso e a relevância de uma Ouvidoria Pública processo de acumulação de conheciem uma empresa cuja missão é contribuir para mentos, principalmente no que tange a formação da consciência crítica do cidadão. aos telejornais, que selecionam e or- Revista do Conselho Curador 33 Fala, conselheirO! a questão esquecida pelo Arquivo EBC 700 MHz: creto 5.820/2006), foi reservado um conjunto de canais comunitários adequados aos interesses e para as emissoras públicas, valendo-se do fato de que necessidades da população e às caracterísa TV Digital, ao contrário da analógica, permitia uma ticas locais. melhor ocupação do espectro. Posteriormente, o MinisQuando os poderes públicos estabeletério das Comunicações reservou exatamente a faixa de cem que um determinado pedaço do solo 700 MHz para essa finalidade, por meio da Portaria nº deve ser reservado às finalidades públicas, 24/2009. Entretanto, agora em 2014, dentro da operação essa decisão deve ser respeitada também de “limpeza de faixa dos 700MHz” com a consequente pelas autoridades subsequentes, pois nem realocação dos canais de TV, somente os canais já imsempre é possível, dentro de um determiplantados estão sendo considerados, ignorando os insnado espaço de tempo, erigir as obras e as trumentos e compromissos anteriores. O discurso adoinstalações previstas. Devido à necessidatado, no caso, de de observar é exclusivao amplo debate mente o da e outros regraracionalidade mentos, é caraceconômica. terística normal Nada jusdas instituições Entretanto, agora em tifica esse públicas, e as de 2014, dentro da operação olvidamento interesse públidos canais co, não consede “limpeza de faixa reservados às guir implemendos 700MHz” com a TVs públicas. tar os projetos Se é imperacom a mesma consequente realocação tivo o uso dos velocidade dos dos canais de TV, somente 700MHz para entes privados. outras finaliExatamente os canais já implantados dades, que o devido a essa estão sendo considerados, seu uso pelos assimetria é que agentes privao Poder Público ignorando os instrumentos dos contribua deve proteger o e compromissos anteriores. para erigir interesse social as emissoras contra o avanço públicas preprivado. vistas, mesmo Essa necesaquelas que sidade de equilíainda não fobrio entre os inram concretizadas por falta de recursos. E que os cateresses públicos e privados serve também nais públicos sejam deslocados de forma conjunta, para para nortear a nossa compreensão acerca do que seja possível, por meio do uso de equipamentos em uso do espectro radioelétrico. Atualmente, comum (antena multi-canais, etc.), minimizar os custos o Poder Público encontra-se empenhado desta implantação, em nome da racionalidade econômiem dar uma melhor destinação à faixa dos ca ao qual os entes públicos também têm direito. 700MHz. Ocorre que essa faixa havia sido O ser humano passou décadas maravilhado com as anteriormente destinada à implantação, em modernidades, esquecendo-se de preservar os rios e as modalidade aberta, de canais de TV públimatas, e hoje pagamos um preço elevado por esse escas ou de relevante interesse público, tais quecimento. Assim como ocorre com o uso do solo, o como as comunitárias e universitárias, hoje espectro radioelétrico guarda muitas semelhanças. desfrutadas somente por aqueles que podem pagar por uma assinatura de TV. Quando foi instituída a TV Digital no Brasil (de- Shutterstock poder público Takashi Tome conselheiro S ob diversos aspectos, o espectro radioelétrico guarda semelhanças com a questão do uso do solo. Ambos, como recurso natural limitado, acabam por ser objeto de inevitáveis disputas, com a consequente necessidade de gestão pelo Poder Público. Ao longo da História, o uso do solo passou por diversos estágios, como quando a propriedade era exclusiva da nobreza, na época feudal, ou, no pós-feudalismo, quando ocorreu a ocupação caótica das urbes. Atualmente, é consensual o entendimento de que a ocupação do solo deve seguir um equilíbrio entre a sua exploração privada e o uso público. Por mais eficiente que seja, do ponto de vista econômico, a exploração pelos entes privados, caso fosse admitida somente essa modalidade, provavelmente degradaria mais rapidamente a qualidade da vida da população, por destruição da mata nativa, dos rios limpos, da ausência de parques, escolas e de outros espaços públicos, cujo valor inestimável, por vezes não faz parte das equações econométricas. Nesse sentido, o Estatuto das Cidades (Lei 10.257/2001) traz um belo ordenamento, ao impor o interesse público na ocupação do solo, tais como a justa distribuição dos benefícios e ônus decorrentes do processo de urbanização, além da oferta de equipamentos urbanos e 34 Empresa brasil de comunicação 35 Revista do Conselho Curador 35 Amodernização inconclusa: pela reestruturação da Ana Fleck Presidente do Conselho Curador Shutterstock GESTÃO ESPORTIVA Arquivo EBC Fala, conselheira! A Constituição Federal de 1988 configurou o primeiro referencial de um novo paradigma no processo desportivo nacional. Todas as Cartas Magnas anteriores silenciavam acerca de matéria desportiva, exceto a de 1967, que se limitava a atribuir à União competência para legislar e estabelecer normas gerais sobre desporto. Pela primeira vez na história, portanto, a Lei Maior do País introduzia conceitos com vistas à regulamentação do setor. De fato, com a nova Constituição surgiram, entre outras, as noções da autonomia de organização e funcionamento das associações e entidades desportivas dirigentes, a destinação prioritária de recursos públicos para a promoção do desporto educacional, além da proteção às manifestações desportivas de criação nacional. Não deixava dúvidas, portanto, o texto constitucional, sobre a opção feita pelo País com relação ao caminho a meios de transmissão eletrônicos, torser trilhado pelo desporto a partir de ennaram o desporto peça fundamental da tão. Os princípios consagrados revelavam engrenagem da indústria de entretenia gradual retirada do Estado das atividades mento nacional e internacional. Em esdesportivas de alto rendimento, a serem pecial o futebol deixou de ser atividaapoiadas apenas em casos específicos, de com mera conotação clubística ou como as Olimpíadas, por exemplo, e a de afirmação de caráter nacionalista e entrega de sua organização à iniciativa de se transformou em negócio altamente pessoas físicas e jurídicas. rentável. Cristalizava-se, assim, uma nova visão Evidentemente, o arcabouço jurído fenômeno desportivo que iria embasar, dico que regulava o setor teve de se já na década de 90, a tradução desses prinadequar às conveniências do mercado. cípios para o plano infraconstitucional. Por isso mesmo, a legislação brasileiO pontapé inicial para o processo de ra procurou introduzir preceitos com reestruturação do sistema desportivo bravistas à profissionalização da gestão sileiro foi a edição da Lei nº 8.672, de 06 das entidades e da atividade esportiva de julho de 1993, a chamada “Lei Zico”, como um todo. assim denoNo entanto, minada em essa nova menreferência talidade que ao ex-jogase instalava no dor, então Também não pode- País deparou-se Secretário com um cenámos nos acostumar rio de graves de Esportes do Govercom o fato de torcermos disfunções na no Federal. estrutura e orpor uma seleção brasi- ganização do Cinco anos depois, o leira de futebol forma- esporte, espeentão Micialmente do da exclusivamente por futebol. nistro Extraordinário Já em 2002, atletas que jogam fora dos Esporo panorama do Brasil. tes, Edson revelado no Arantes do curso das invesNascimentigações da CPI to, subdo Futebol do meteu ao Senado Federal Congresso Nacional revisão da legislação evidenciou completa falta de transpadesportiva, que se converteu na Lei n° rência administrativa, gestão temerá9.615, de 24 de março de 1998, a “Lei ria das entidades, além da ocorrência Pelé”. de crimes como lavagem de dinheiro, Em verdade, esses dois diplomas legais evasão de divisas, sonegação de triconfiguraram a adequação da legislação butos e apropriação indébita. Não por desportiva brasileira aos novos tempos vicoincidência, e resultado de um movidos pelo desporto, não apenas no País, delo de gestão esgotado, assistia-se ao mas em todo o mundo. A partir da década empobrecimento do futebol, à fuga de de 80, a consolidação do capitalismo como capital para investimento, à insolvência sistema político e econômico hegemônidos clubes. co e a profunda evolução tecnológica dos Identificada essa realidade, a CPI apresentou propostas legislativas que deram origem à edição, em 2003, da “Lei da Moralização do Futebol Brasileiro” e do “Estatuto dos Direitos do Torcedor”. Os inovadores textos legais tiveram como fundamento a necessidade de modernização da legislação que regula o desporto profissional, com vistas à concepção de mecanismos que estimulassem administrações transparentes e eficientes, e propiciassem o estabelecimento de relações justas entre federações, clubes, atletas e torcedores. Passados tantos anos, no entanto, esses instrumentos normativos de reestruturação do esporte brasileiro estão a merecer de aperfeiçoamentos, em face do que vem demonstrando a realidade cotidiana da gestão esportiva. No futebol, por exemplo, medidas em vigor não se mostram eficientes para conter o êxodo de jogadores para o exterior, a face mais visível dessas disfunções. Além disso, não se pode deixar de considerar que gestões “amadoras” impossibilitam planejamento e ações de longo prazo, e a incapacidade de gerar receitas superiores às despesas faz com que a única fonte realmente significativa de recursos para os clubes seja a venda de atletas. Dessa forma, o clube diminui seu potencial de receita, porque os jogadores importantes são vendidos para fazer frente às despesas. De outra parte, é preciso impedir a continuação das verdadeiras dinastias que se perpetuam na direção das entidades dirigentes. A alternância no poder, além de procedimento de cunho democrático, pode prevenir a prática de abusos continuados. Lembre-se que tais entidades, conquanto de natureza privada, pelo serviço que prestam, pela abrangência de seu envolvimento social, desempenham uma função que é, em sua essência, pública. Já que os efeitos e a repercussão de suas atividades são públicos, é necessário que, mediante algum mecanismo de controle e acompanhamento, suas ações se tornem visíveis à coletividade. O fato é que a modernização do futebol brasileiro ainda permanece inconclusa. A realidade desse esporte, bem como a de outras modalidades, reclama a identificação dos fatores que impedem o desenvolvimento de sua capacidade socioeconômica, bem como a indicação dos possíveis caminhos que viabilizem a reversão dessa tendência. Não parece razoável que times como Flamengo e Corinthians, que, somados, contam com mais de cinquenta milhões de torcedores, não tenham condições econômicas, pelo menos aproximadas, às dos grandes times europeus. Também não podemos nos acostumar com o fato de torcermos por uma seleção brasileira de futebol formada exclusivamente por atletas que jogam fora do Brasil. A extraordinária dimensão do desporto como atividade de relevância econômica e social em nosso País indica a necessidade do estabelecimento de mecanismos de regulação, de fiscalização e de fomento eficientes, agéis, que permitam a desejável expansão de todas as suas potencialidades. 38 Empresa brasil de comunicação Revista do Conselho Curador