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Campinas, terça-feira, 27 de novembro de 2012
Clássico cinquentão
/ LITERATURA / Laranja Mecânica, de Anthony Burgess, ganha edição comemorativa no Brasil
Divulgação
Fábio Trindade
PONTO DE VISTA
DA AGÊNCIA ANHANGUERA
[email protected]
LALÁ RUIZ
Jornalista do
Grupo RAC
As altas doses de “ultraviolência” de Laranja Mecânica, do
inglês Anthony Burgess
(1917-1993), considerada
uma das histórias mais controversas da literatura contemporânea ao mostrar as
atrocidades de um grupo de
adolescentes que mata, rouba e estupra, completou 50
anos de existência em 2012.
Com o passar das décadas, o
futuro em que Alex, líder da
gangue de delinquentes conhecida como Droogs, é capturado pela polícia e passa
por um novo experimento
destinado a conter impulsos
destrutivos — o tratamento
Ludovico —, e que o transforma em um indivíduo fraco e
sem alma, parece, atualmente, ter ficado no passado, já
que a violência cometida por
ele soa discreta perto das atrocidades que o mundo oferece
nem tanto tempo depois.
Obra dividida em três
partes conta com
ilustrações exclusivas
Isso, certamente, não tira
o fascínio da trama de Laranja Mecânica, mundialmente
conhecida e apreciada principalmente após ser transportada para as telonas em 1971,
por Stanley Kubrick, com
Malcolm McDowell no papel
principal. Uma edição comemorativa foi lançada pela Editora Aleph, disponível nas livrarias desde a semana passada, com material inédito e
ilustrações exclusivas para a
edição brasileira de Angeli,
Dave McKean e Oscar Grillo.
A obra inclui ainda uma entrevista em que o autor comenta a ironia de ser lembrado justamente por esse livro,
já que, para ele, tal fato é estranho. “De todos os meus romances, esse é o que menos
gosto”, admite.
O livro é dividido em três
partes, com sete capítulos cada e, para acompanhar a
obra original, cada artista escolheu uma delas para ilustrar. O quadrinista e ilustrador britânico Dave McKean,
que foi colaborador de Neil
Gaiman em Sandman, Mr.
Punch e Sinal e Ruído, ficou
com a parte um, que retrata
as violentas ações de Alex e
seus draguis em uma sociedade corrompida pela violência
juvenil.
Já a parte dois, que mostra
a prisão e o tratamento Ludovico, ficou a cargo de Angeli,
criador de Rê Bordosa, Os Escrotinhos e Bob Cuspe. Ele
ilustrou, para se ter uma
ideia, a aflitiva e conhecida
cena em que Alex é forçado a
assistir uma série de filmes
com olhos presos para permanecerem sempre abertos (confira nesta página).
Desfecho
A última parte, a dos resultados do tratamento sobre a vida do rapaz já liberto, privado de suas escolhas individuais e o caminho que ele tomará dali para frente, coube
a Oscar Grillo, artista plástico
e ilustrador argentino. Tudo,
claro, em duas cores: preto e
laranja.
SERVIÇO
Laranja Mecânica - Edição
Especial 50 Anos (Editora
Aleph)
G Tradução: Fábio Fernandes
G Formato: 16 x 23 cm, 352
páginas, com acabamento em
capa dura
G Preço de capa: R$ 79,00
Uma leitura
desafiadora e
um filme
marcante
Anthony Burgess criou uma das histórias mais controversas da literatura contemporânea ao mostrar atrocidades cometidas por adolescentes
Divulgação
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Tanto o livro quanto o filme
Laranja Mecânica marcaram
muito a minha adolescência.
Descobri a obra-prima de
Anthony Burgess em uma das
muitas visitas à biblioteca
municipal da cidade de Itu, onde
morava. E a leitura tornou-se um
delicioso desafio. Burgess criou
uma gíria para os personagens e
o livro foi todo escrito a partir
dela. Mas, depois do primeiro
capítulo, as consultas ao
glossário no final da obra se
tornaram-se menos frequentes.
Quando arrumei meu primeiro
emprego, comprei um exemplar,
que passou pelas mãos de
muitos amigos e hoje está todo
amarelado e com as páginas
descoladas em uma das minhas
estantes. Mas não me desfaço
dele por nada. Já a estreia do
filme foi um acontecimento no
Brasil. Censurado pela ditadura
militar, o longa-metragem de
Stanley Kubrick foi liberado para
a exibição no País em 1978 —
com cortes e umas bolas pretas
cobrindo as “protuberâncias”
dos rapazes na tela. Assisti a
essa cópia nos anos 80 num
cinema de Itu. Era muito
ridículo, principalmente porque
a velocidade das tais bolas não
acompanhava o movimento dos
atores. Mais tarde, Laranja
Mecânica foi liberado sem
cortes, para alívio geral. Até
hoje, é um dos meus filmes
favoritos.
SAIBA MAIS
O que traz a edição especial
de Laranja Mecânica?
Capa da edição comemorativa lançada pela Aleph: nas livrarias
Ilustração do cartunista brasileiro Angeli integra a publicação
Obra foi adaptada para o cinema por Kubrick em 1971
Cedoc/RAC
belo par de olhos
azuis recheando a
cara de psicopata de
Alex De Large (Malcolm
McDowell) em close, nos
primeiros segundos da
versão cinematográfica de
Laranja Mecânica
(Inglaterra, 1971), deixa
claro que suas intenções
para aquela noite são as
mais ultraviolentas
possíveis. Para mostrar bem
que não se trata de um
delinquente qualquer, mas
de uma mente
estranhamente inteligente,
viciada em pornografia e
Beethoven, nos primeiros
minutos do longa, o jovem
invade uma casa futurista e
corta maliciosamente,
cantarolando Singin’ In The
Rain, o macacão vermelho
de uma mulher para depois,
em frente ao marido
espancado no chão,
estuprá-la. O diretor
Stanley Kubrick corta a
cena antes do ato em si —
podemos ver estupros mais
fortes até na novela das
nove, como aconteceu
O
G A edição brasileira, assim
como a inglesa, apresenta a
versão restaurada do livro,
realizada pelo editor Andrew
Biswell. Alguns pequenos
trechos e palavras foram
reintegrados, outros eliminados
ou substituídos.
G A obra traz apontamentos e
notas culturais, redigidos pelo
editor inglês Andrew Biswell. Por
exemplo: Página 50 — Elvis
Presley. Burgess escreveu na
margem do manuscrito original:
“Esse nome será conhecido
quando o livro sair?”
G Um ensaio e dois artigos
escritos por Anthony Burgess
entre 1961 e 1973 explicam a
origem do nome Laranja
Mecânica e o porquê de escrever
o livro, além de comentar o filme
de Stanley Kubrick.
G Em nota ao programa da
peça de 1990, Burgess
menciona os motivos que o
levaram a escrever a versão de
Laranja Mecânica para o teatro,
além de comentar a trama e a
montagem.
Malcolm McDowell interpretou Alex De Large no longa-metragem do diretor Stanley Kubrick
recentemente em Salve
Jorge — mas essa cena em
específico é uma das mais
perturbadoras do filme
porque ela volta a
assombrá-lo quando ele já
está indefeso, após ser
“curado” pelo governo.
Tudo, de fato, em Laranja
Mecânica, é estranhamente
atual e caótico, com
crueldades sem restrições e
pessoas manipuladas por
todos os lados. Com quatro
indicações ao Oscar,
incluindo Melhor Filme,
Diretor e Roteiro, o vigoroso
filme, estranhamente, não
levou nada. Malcolm,
brilhante e assustador,
sequer foi lembrado pela
Academia. Talvez tudo seja
apenas uma laranja
mecânica. (FT/AAN)
G A edição traz uma extratos
de uma entrevista inédita
concedida em outubro de 1972,
na qual Burgess faz uma reflexão
sobre a natureza da liberdade,
do bem e do mal.
G Reprodução de seis páginas
do original datilografado de
Burgess, com anotações e
desenhos.
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Laranja Mecânica