Anais do VII Seminário de Iniciação Científica SóLetras – CLCA – UENP/CJ - ISSN 18089216 UMA ANÁLISE DA OBRA LITERÁRIA E CINEMATOGRÁFICA LARANJA MECÂNICA Renato de Azevedo Silva (PG-CLCA -UENP/CJ) [email protected]; [email protected] Adenize Aparecida Franco (Orientadora-UENP/JCR) [email protected] Introdução "Se as portas da percepção fossem abertas, tudo apareceria ao homem como realmente é: infinito" William Blake O livro Laranja Mecânica, escrito por Anthony Burgess foi eleito, pela Revista Time como um dos cem melhores romances em língua inglesa do século XX. A especificidade da obra literária está principalmente na estética, já que o enredo e os personagens, apesar de bem desenvolvidas, são simples. O trato na linguagem criada por ele, a nadsat, possibilita a exposição da temática adolescente, marca principal da obra. A obra cinematográfica homônima, dirigida por Stanley Kubrick também configura entre as grandes obras-primas do século passado, no que concerne à sétima arte. O diretor é considerado um romancista frustrado, primeiro por ter objetivado tornar-se escritor e, segundo, por a maioria de seus longas-metragens serem adaptados de obras literárias. Segundo Vítor Manuel Aguiar e Silva (1990) há diversas relações entre o cinema e a literatura, tanto que se evidencia uma vasta lista de filmes que são inspirados em textos literários. Tanto a narrativa cinematográfica quanto a literária narram frequentemente uma história, uma sequência de eventos ocorridos a personagens, num espaço e num tempo. Características essas, que para Arnaldo Franco Júnior (2009) correspondem aos elementos narrativos. As duas artes são temporais e aptas, por isso mesmo, a construir narrativas. Anelise Reich Corseuil (2005) ressalva que o que diferencia as duas artes é justamente a linguagem de que se utilizam. Enquanto o discurso literário é exclusivamente verbal, o cinematográfico é predominantemente audiovisual. Por isso, a adaptação deve ser analisada como obra independente do romance de que se origina. Obra essa, capaz de recriar, criticar, parodiar e atualizar o texto literário. 1035 Anais do VII Seminário de Iniciação Científica SóLetras – CLCA – UENP/CJ - ISSN 18089216 O crítico André Bazin (1991) utiliza um termo para classificar o cinema que adapta narrativas de outras linguagens ou mesmo incorpora seus estilos de narrar: cinema impuro. Ele destaca que alguns romances são utilizados apenas como sinopses bem desenvolvidas para as adaptações, já que são obras conhecidas e seus personagens são tão conhecidos que existem quase que independente da obra. Em casos assim, grande parte do valor da obra cinematográfica está na liberdade de criação do diretor e roteirista. Conclui ainda, que quando se pensa em adaptar, não se tem em mente a ideia de transcrever a obra literária para o cinema. O autor ainda destaca que por pior que seja a adaptação, ela não influenciará na obra original, já que está acabada e assim permanecerá. Se a adaptação tornar-se de qualidade superior à maioria dos filmes, poderá servir para introduzir o telespectador à obra literária, o que é um ganho à literatura. Se tornar-se superior ou mesmo equivalente, os envolvidos terão sido geniais e haverá a distanciação da narrativa do livro, o que é um ganho ao cinema. Este artigo objetiva analisar o livro Laranja Mecânica, de Anthony Burgess e o filme homônimo dirigido por Stanley Kubrick, contextualizando o momento em que foram produzidos, procurando expor os elementos literários presentes na obra fílmica responsáveis por torná-la uma produção artística singular. Anthony Burgess - É um livro – disse eu. – É um livro o que você está escrevendo. – Fiz aquela velha goloz, bem grossa. – Sempre tive a maior admiração por aqueles que sabem escrever livros. – Então olhei a folha de cima, e lá estava o nome – LARANJA MECÂNICA [...] Alex No prefácio à obra Laranja Mecânica, Fábio Fernandes (2004b) expõe que Anthony Burgess tornou-se um romancista tarde. Por volta dos 39 anos publica seu primeiro romance Time for a Tiger, em 1956. Quatro anos, em 1960, quando retorna à Inglaterra, recebe a notícia de que, em menos de um ano, morreria devido a um tumor cerebral. Desta forma, decide publicar o maior número de livros, no espaço de tempo até sua morte, para que sua mulher ficasse amparada pelos direitos autorais, assim que ele morresse. Nesse um ano escreveu cinco obras e meia. O livro inacabado era justamente Laranja Mecânica. Importante destacar, que após esse período, o autor não morreu, como previsto. A narrativa da obra estava pronta, porém, Burgess acreditava que por se tratar de uma narrativa futurística, havia a 1036 Anais do VII Seminário de Iniciação Científica SóLetras – CLCA – UENP/CJ - ISSN 18089216 possibilidade de ficar datada em alguns aspectos, principalmente naqueles relacionados à linguagem dos adolescentes da obra1. Como era fascinado por gírias, dialetos e neologismos, opta por fazer um trabalho linguístico, misturando idiomas gerando a linguagem nadsat2, deixando a obra repleta de termos aparentemente incompreensíveis ao leitor. Essa incompreensão agiu como um mecanismo para fazer com que a Inglaterra futurista que havia criado, fosse mais crível. O futuro idealizado pelo autor é aquele em que a violência adolescente atingiu um nível tão insuportável que gerou uma repressão igual por parte do governo, com técnicas de lavagem cerebral. Ao extrapolar elementos específicos da sociedade como gangues e o sistema penitenciário, em vez de propor uma alteração completa na sociedade, Burgess torna o universo de Laranja Mecânica mais reconhecível para o leitor e mais próximo da realidade. Afinal, a violência está cada vez mais próxima de nós no cotidiano (FERNANDES, 2004b) O padrão da ficção científica está menos na ciência e na tecnologia do que nas inovações de caráter semiótico: o leitor deve deparar-se com algo que saia da realidade, mesmo que na obra em análise, isso se caracterize na incorporação da linguagem do personagem principal, uma realidade não reconhecível, incorporada, no contexto da obra, como comum. O estranhamento inicia-se pelo título (A Clockwork Orange, no original) retirado de uma gíria cockney: “as queer as a clockwork orange”, uma expressão que significa “tão estranho quanto uma laranja mecânica”, sendo que o termo queer, pode ser tanto estranho, quanto homossexual. Essa estranheza é marcada pela linguagem durante a obra toda, o que o autor considerou fundamental, para a experiência de leitura do livro. Na obra cinematográfica, não há referência quanto ao título. É pela obra literária que temos explícito a explicação do narrador. Quando Alex e seus amigos invadem a casa de um escritor, este está escrevendo uma obra que se intitula Laranja Mecânica e o personagem principal estranha tal título fazendo a seguinte observação, ao ler um trecho: A tentativa de impor ao homem, uma criatura evoluída e capaz de atitudes doces, que escorra suculento pelos lábios barbados de Deus no fim, afirmo que a tentativa 1 Se o autor fizesse uso das gírias inglesas da época, em menos de 10 anos a obra se tornaria defasada temporalmente. 2 A criação dessa linguagem ocorre quando Burgess tem que fazer uma viagem a Leningrado fazendo-o estudar russo. Desta forma, tem a inspiração de criar uma linguagem misturando o russo, o inglês popular e o falar dos ciganos (FERNANDES, 2004a). 1037 Anais do VII Seminário de Iniciação Científica SóLetras – CLCA – UENP/CJ - ISSN 18089216 de impor leis e condições que são apropriadas a uma criação mecânica, contra isto levanto minha caneta-espada. (BURGESS, 2004, p.24) Próximo ao fim da narrativa, Alex, novamente na casa do escritor, agora em outras circunstâncias, procura a obra dele e lê com mais atenção as costas do livro, fazendo o seguinte comentário: Mas havia duas ou três prateleiras de livros ali também, e lá estava, como achei que estaria, um exemplar de Laranja Mecânica, e nas costas do livro, assim como na lombada, estava a imya do autor – F. Alexander. Meu Bom Bog, pensei, é outro Alex. Então folheei, em pé, metido no pijama dele e com os nogas de fora mas sem sentir sequer um malenk de frio, pois o chalé estava inteirinho aquecido, e eu não conseguia videar do que tratava o livro. Parecia escrito num estilo tipo assim bizumni, cheio de Ah e Oh e aquela kal total, mas o que parecia sair dali era que todos os plebeus hoje em dia estavam sendo transformados em máquinas e que na verdade eles eram – você, eu, ele e o cacete a quatro – mais como algo que cresce naturalmente, como uma fruta. F. Alexander parecia pensar que todos nós crescemos no que ele chamou de árvore-do-mundo no pomar-do-mundo que tipo assim Bog ou Deus plantou, e que estávamos ali porque Bog ou Deus precisava de nós para saciar seu amor sedento, ou uma kal dessas. Eu não gostei nem um pouco do shom disso, Ó, meus irmãos, e me perguntei o quão bizumni aquele F. Alexander realmente era, talvez tivesse ficado bizumni por causa do empacotamento de sua mulher. Mas aí ele me chamou para baixo com uma goloz tipo assim vek saudável, cheia de alegria e amor e aquela kal total, então para baixo Vosso Humilde Narrador foi. (BURGESS, 2004, p.158-9) Anthony Burgess é um escritor inglês bastante conhecido. A obra em análise está entre as 100 melhores em língua inglesa do século passado, segundo a Revista Times. Sua obra mais interessante trata sobre a introdução à linguagem de James Joyce, Joysprick. Stanley Kubrick “Ainda que exista uma grande hipocrisia a respeito da violência, todas as pessoas estão fascinadas por ela. Afinal, o homem é o assassino mais cruel que jamais pisou o planeta” Stanley Kubrick Assis Brasil3 (1967) declara que o renomado diretor americano, de notada característica cinematográfica inglesa, afirmou que se inspirava no estilo do escritor William Faulkner, expondo que se não tivesse deixado de lê-lo, teria tornado-se romancista. A influência literária em Kubrick é facilmente notada quando se analisa com mais calma seus 3 Interessante observar que seu texto foi publicado em 1967, antes mesmo do lançamento do filme Laranja Mecânica. O que interessa aqui são as características literárias que o diretor já apresenta desde o início de sua carreira. 1038 Anais do VII Seminário de Iniciação Científica SóLetras – CLCA – UENP/CJ - ISSN 18089216 roteiros. Seus dois primeiros filmes têm uma marca faulkneriana. De modo bastante amplo, Faulkner apenas embaralha o tempo, construindo uma narrativa que não obedece à ordem cronológica. Randal Jonhson (apud ROSSO, 2010) expõe que tal característica é bastante notória na obra inicial de Kubrick, porém essa característica vai se perdendo, já que sua obra vai ganhando linearidade, comum às narrativas clássicas. Outra característica literária importante é a narração in off presente em maior ou menor grau em todas as suas narrativas. Analisando a ficha técnica dos 12 principais longas-metragens do diretor, no site The Internet Movie Database (IMDb) pode-se ter uma clara noção desta influência. Antes de tudo, é importante observar que ele sempre esteve envolvido na feitura do roteiro de seus filmes, com exceção de Spartacus (1960), seja criando a história [o que acontece apenas em seu primeiro longa A morte passou por perto (1955)] ou roteirizando-os. Outro dado importante, é que a maioria de seus filmes foram adaptados de obras literárias. O grande golpe (1956), do romance de Lionel White, Clean Break; Glória feita de sangue (1957), de Paths of glory, de Humprey Cobb; Spartacus (1960), do romance homônimo de Howard Fast; Lolita (1962), do romance de mesmo nome, de Vladimir Nabokov; Dr. Fantástico (1964), do romance Red Alert, de Peter George; 2001 – uma odisséia no espaço (1968), do conto The Sentinel, de Arthur C. Clarke; Laranja Mecânica (1971), do romance homônimo de Anthony Burgess; Barry Lyndon (1975), de As Aventuras de Barry Lyndon, de William Makepeace Thackeray; O Iluminado (1980), do romance igualmente nominado de Stephen King; Nascido para matar (1987), do romance The short timers, de Gustav Hasford e De olhos bem fechados (1999), baseado no conto Traumnovelle, de Arthur Schnitzler. É importante notar que, em alguns dos filmes, Kubrick teve a colaboração dos próprios escritores para a feitura do roteiro. Em Dr. Fantástico, além de o roteiro ser baseado na obra de Peter George, o autor do romance colabora no roteiro do filme. Aconteceu isso também com Arthur C. Clarke e o filme seguinte de Kubrick, 2001 – uma odisséia no espaço que foi um projeto colaborativo de ambos, tanto que foi decidido que a narrativa do filme seria vagamente baseada na obra de Clarke. Primeiramente, o escritor estava ajudando no roteiro do filme, quando em dado momento, o diretor teve a ideia de transformar em um romance que seria publicado depois do lançamento do filme. Em Nascido para matar, Gustav Hasford também colabora como roteirista, apesar de haver uma controvérsia quando às suas partes no roteiro terem sido utilizadas no filme. Em artigo da edição especial da Revista Bravo!, sobre 100 filmes essenciais, é destacado que além de ser um gênio no trato de seu roteiro e direção, Stanley Kubrick se caracterizava por transformar seus enredos em gêneros os mais diversos. Explorou da ficção 1039 Anais do VII Seminário de Iniciação Científica SóLetras – CLCA – UENP/CJ - ISSN 18089216 científica aos filmes de época, da sátira política à guerra, da comédia de costumes ao noir, chegando ao humor negro e ao drama familiar. Laranja Mecânica, seu filme mais cultuado, chama a atenção justamente por não se encaixar especificamente em um único gênero narrativo. Tem muito de ficção científica por se passar em um futuro próximo, mas também é uma comédia de costumes por retratar os aspectos cotidianos desta nova sociedade, sob um enfoque político, sem deixar de expor, quando pode, o humor negro. Como lembra Érico Borgo (2009), a obsessão pela técnica cinematográfica nasceu quando trabalhava como fotógrafo para a revista Look, nos anos 1940. No RapaduraCast (2008) sobre a biografia de Stanley Kubrick é citado que essa obsessão pela técnica cinematográfica perduraria durante todo sua filmografia. Laranja Mecânica: literatura e cinema - Parem o filme! Por favor, por favor, parem! Não consigo suportar mais. – E então a goloz do Dr. Brodsky disse: - Parar? Parar, você disse? Ora, nós mal começamos. – E ele e os outros smekaram muito. Diálogo entre Alex e Dr. Brodsky Fábio Fernandes (2004b) explica que a intenção de Burgess era que o leitor fizesse uma imersão radical no texto, vivenciando a narrativa como participante dos tempos sombrios que descreve. O narrador fala com o leitor como alguém que acabou de conhecer. O foco narrativo é narrador protagonista, já narra sua própria história. Para o cinema, o narrador foi transposto em quase toda a sua essência. Existem cenas em que se percebe a introdução da terceira pessoa do discurso, quando percebemos situações que não estão sendo vivenciadas pelo narrador. Uma adaptação aceitável na obra cinematográfica. Jacques Aumont (1995) destaca que narrador cinematográfico caracteriza-se por vários elementos como a edição, montagem e movimento de câmera. O livro está dividido em três partes que são visivelmente definidas no filme. Cada uma delas, dividida em sete capítulos. A obra foi construída desta forma (21 capítulos), pois na cultura angloamericana a idade adulta só é atingida aos 21 anos e, Laranja Mecânica é, antes de tudo, o que os alemães chamam de bildungsroman, um romance de formação. A trajetória de Alex, da adolescência à maturidade ou o início de uma possível compreensão das responsabilidades adultas só se completa no vigésimo primeiro capítulo. A divisão de cada 1040 Anais do VII Seminário de Iniciação Científica SóLetras – CLCA – UENP/CJ - ISSN 18089216 parte em sete capítulos é baseada no monólogo clássico de Shakespeare, sobre as idades do homem, na peça As you Like it (FERNANDES, 2004b). Nos Estados Unidos, o livro foi lançado sem o último capítulo, do total de vinte e um. Isso porque os editores consideram-no incoerente em relação ao restante da obra. O filme de Kubrick teve seu roteiro baseado nessa versão lançada em solo americano. A obra cinematográfica, como se pode concluir, não teria como ser extremamente fiel à versão lançada por Burgess, já que o último capítulo não apareceria na narrativa fílmica. Importante destacar que a linguagem nadsat mantém na obra de Kubrick. Angela Errigo (2008) expõe que Laranja Mecânica é considerado o filme mais controverso de Stanley Kubrick, classificando-o como uma ficção científica social. Expõe ainda: A brutalidade institucionalizada que resulta na punição de Alex e a ‘reabilitação’ que o transforma em um covarde sem vontade própria são tão assustadoras quantos os crimes dos druguis, e também mais provocadoras, como uma sátira corrosiva da hipocrisia, corrupção e sadismo da sociedade. Vendo uma chance de sair da prisão, Alex torna-se voluntário para uma terapia de aversão experimental com fins políticos. Submete-se a uma terrível ‘cura’ behaviorista – amarrado, com os olhos mantidos abertos a força – que suprime sua tendência violenta, mas também retira sua humanidade. Incapaz de cometer maldades, ele se torna um indivíduo enfraquecido. De volta ao mundo, não aprecia a sua ‘liberdade’. Traído por seus antigos camaradas, que, ironicamente, tornaram-se policiais, recebe uma retribuição hilariantemente intimidadora em um encontro com uma de suas vítimas (p. 530). Uma das grandes diferenças entre as duas obras analisadas está nos personagens. Alex, o narrador-protagonista, no livro tem 14 anos, enquanto que o ator que o interpreta Malcolm McDowell tem aproximadamente 28 anos, mas com uma aparência de 21. Tal ocorrência acaba por desconfigurar a obra. Interessante notar que a linguagem nadsat é bastante infantil, fazendo mais sentido na obra literária. No que diz respeito à linguagem cinematográfica, o filme ficou datado em alguns detalhes, como os discos de vinil, a máquina de escrever; porém, em vários aspectos a obra mantém seu tom futurista, como no trato das gangues adolescente que descarregam sua agressividade através de uma crueldade sem restrições, sendo assustadoramente contemporâneo tal trato. A trilha sonora, de Walter Carlos, misturando elementos de composições de Beethoven e outros compositores a elementos futuristas, torna tal parte da narrativa um caso de estudo à parte. O filme expõe perfeitamente o contexto histórico que a obra literária, que tanto mostra uma realidade posterior ao momento em que o livro foi publicado, quanto uma relação à qualquer época em que é lido. O momento expresso no livro, em alguns momentos, 1041 Anais do VII Seminário de Iniciação Científica SóLetras – CLCA – UENP/CJ - ISSN 18089216 beiram ao apocalíptico. A sociedade de Laranja Mecânica está fragmentada. As gangues são formadas por 4 a 6 integrantes. O individualismo é acentuado em todos os momentos. Ainda mais por ser um livro em que o narrador é protagonista. Outra observação no que diz respeito ao livro e ao filme é que sendo considerados ficções científicas, elas não são aquelas que se distanciam de nossa realidade. Define-se ficção científica geralmente como narrativas fantásticas. Muitas vezes, o senso comum acaba considerando ficção científica como narrativas que apresentam espaço, tempo e personagens extremamente diferentes daquilo que conhecemos na realidade, muitas vezes, de forma futurista. Laranja Mecânica é uma ficção com um enredo num futuro próximo, tanto que todo o sistema político e social expostos são bem próximos de nossa realidade. São mostrados os adolescentes, numa relação muito próxima dos adolescentes da década de 50 (basta comparar com o enredo de Juventude Transviada), quanto os do século XXI (um exemplo atual é o filme Elefante). O sistema penitenciário também tem uma característica bastante próxima. Importante destacar como a violência é tratada nas duas obras. Alex passa pelo tratamento Ludoviko, exposição de que o governo agride a sociedade com sua política de ressocialização de detentos. Os vídeos a que são expostos, junto à vacina que recebe faz com que ele comece a passar por um processo em que vai sentir horror à violência. Conclusão “Eu estava realmente curado” Alex Esta análise das obras literária e cinematográfica Laranja Mecânica faz-nos refletir sobre a importância de conhecer o texto literário responsável pela adaptação fílmica, bem como a singularidade que cada obra tem separadamente. A narrativa feita por Burgess é uma ode à adolescência, expondo todas as nuances da realidade deste grupo social, sendo um trabalho único da linguagem e de como o adolescente encontra-se na sociedade. Seu final otimista é uma excelente maneira de mostrar o amadurecimento do ser humano. A adaptação para as telas do romance distópico de Anthony Burgess, por Stanley Kubrick, é bastante corajosa, principalmente por que muitos críticos acreditavam que 1042 Anais do VII Seminário de Iniciação Científica SóLetras – CLCA – UENP/CJ - ISSN 18089216 tal feito seria impossível devido às especificidades literárias da obra. O filme é extremamente independente da obra literária, tanto que, pelo menos no Brasil, é muito mais conhecido. Sua visão amarga sobre o sadismo físico e moral, sobre o controle e a hipocrisia das autoridades e a fragilidade das identidades individuais, refém de padrões considerados adequados à sociedade, consterna e obriga o telespectador à reflexão. Referências bibliográficas AGUIAR E SILVA, Vítor Manuel. Teoria e Metodologia Literárias. Lisboa: Universidade Aberta, 1990. AUMONT, Jacques. A estética do filme. Trad. Marina Appenzeller. Rev. Nuno Cesar P. de Abreu. Campinas-SP: Papirus, 1995. BAZIN, André. O cinema: ensaios. Tradução: Eloisa de Araújo Ribeiro. 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