1
De bacharel à jurista: perfil dos artífices da codificação civil**
Daniela Silva Fontoura de Barcellos*
Resumo: Tomando por base o processo de reforma do Código Civil brasileiro
entre 1942 e 1969, o presente trabalho pretende analisar os recursos
mobilizados para a ascensão à categoria de projetador legislativo. Para isto,
utilizam-se dados relativos à: origem social e formação escolar (I), às carreiras
política(II) e acadêmica(III) dos projetadores legislativos. Tendo sido a reforma
do Código Civil a mais longa do século XX, parte-se da hipótese de que a
tarefa performativa é um diferencial no âmago das elites jurídicas nacionais.
Assim, pretende-se isolar os atributos mobilizados pelos juristas das três
comissões projetadoras, comparando-as entre si. A pesquisa funda-se em
entrevistas, biografias, memórias, homenagens, necrologias e documentos
privados.
Palavras-Chave: Elites jurídicas. Sociologia do Direito. Reforma legislativa.
Introdução
Os processos de transformação das leis civis oferecem uma dupla
perspectiva de análise das relações entre direito e política1. Por um lado, a
função legislativa favorece sistematicamente as prerrogativas do executivo,
constituindo-se num verdadeiro laboratório para a instauração de uma nova
ordem jurídica (VAUCHEZ, 2005, p. 271), especialmente em períodos
autoritários ou de transição. De outro, permite romper com uma aparente
“neutralidade” da qual o direito se investe pondo em evidência o fato de que a
legislação afina-se com os interesses daqueles que a instituem (BOURDIEU,
1986, p. 3).
**
Uma versão deste trabalho foi apresentada no Seminário Nacional de Ciência Política
realizado na UFRGS. Este trabalho consiste numa versão em andamento da tese de doutorado
intitulada “Código Civil: relações entre a política e a academia”, sob orientação do prof. Odaci
Coradini realizada no programa de Pós-Graduação em Ciência Política da UFRGS.
*
Pesquisadora da FGV Direito-Rio, Mestre em Direito Civil pela UFRGS e doutoranda em
Ciência Política UFRGS.
1
Trata-se da análise das relações entre direito e política em micro-escala, ou seja, no âmbito
das relações pessoais, tal como é usual no estudo de trajetos e, mais amplamente, no uso do
método biográfico. (vide, por exemplo, PENEFF, 1994)
2
Entre os anos 1942 a 1969, três comissões de juristas foram convidadas
pelo Ministério da Justiça para reformar o Código Civil, sendo que somente a
última teve seu trabalho convertido em lei. Os treze juristas que participaram
das disputas pelo “monopólio de dizer o direito” civil integram uma elite2
jurídica, ainda que a institucionalização do espaço jurídico estivesse em
processo de formação. Dotados de múltipla inserção social (BOLTANSKI,
1973), os projetadores legislativos ocuparam, de forma sucessiva ou
cumulativa, altos postos privativos de bacharéis em direito. Dentre eles
destacam-se funções relativas a: professor de direito, advogado, parecerista e
juiz3. Além disso, são também “doutrinadores”, expressão empregada no
Direito para designar os produtores de conhecimento técnico-jurídico. Ao lado
das ocupações jurídicas, os projetadores de leis civis exerceram outras
atividades de natureza político-partidária, associativa, jornalística e literária. E é
a combinação destas diversas atividades nas esferas do direito, da política e
das letras que produz o “expert instituinte” (CASTEL, 1991, p. 177) brasileiro,
ou seja, aquele que utiliza o conhecimento técnico para produzir diretamente
normas jurídicas.
Para a análise dos trajetos dos juristas integrantes das comissões de
alteração do Código Civil, privilegio a inserção social e as formas de
recrutamento. Para isso, analiso os dados relativos à: (I) origem social e
formação escolar, (II) carreira política e (III) acadêmica. Em paralelo, procuro
2
Utilizo o termo elite em sentido amplo, ou seja, como grupos de indivíduos que ocupam
posições chave em uma sociedade e que dispõem de poderes, de influência e de privilégios
inacessíveis ao conjunto de seus membros (HEINZ, 2006, p. 8).
3
Refiro-me aqui genericamente aos cargos de juiz, desembargador e ministro dos Tribunais
Superiores. Embora os cargos de ministro dos Tribunais Superiores (STF, STJ, TSE, TST e
STM) não sejam todos privativos, constituem tradicionalmente um nicho de exclusividade dos
bacharéis em direito na medida em que se exige, no mínimo, o chamado “notório saber
jurídico”.
3
demonstrar que as tomadas de posição no plano político e a possibilidade de
trânsito social destes agentes são determinantes no seu recrutamento como
legisladores.
I-
Origem social e formação escolar
Os treze juristas em análise integram as gerações de intelectuais
analisadas por Pécaut (1980). Nascidos entre 1891 a 1933, os legisladores são
filhos de pais com profissões diversas. Uma parte significativa possui pais com
profissões liberais (advogados, médicos, e professores) ou vinculadas ao
comércio. Apenas Orozimbo Nonato possui o pai vinculado ao exército, na
patente de major. Estas informações estão sistematizadas no quadro n. 1.
Quadro n. 1: Origem social dos projetadores do Código Civil
Nome
Ano de nac.
Nascimento
Nome e profissão do pai
José Philadelpho de Barros
1894
Rio de Janeiro
José Carneiro de Barros e Azevedo,
(DF)
profissão desconhecida.
Rio de Janeiro
Norival Guimarães,
(DF)
profissão desconhecida.
Sabará (MG)
Raymundo Nonato da Silva,
Azevedo
Hahnemann Guimarães
Orozimbo Nonato da Silva
1901
1891
major.
Orlando Gomes dos Santos
1909
Salvador (BA)
Mario Gomes dos Santos,
comerciante.
Theophilo de Azeredo Santos
1929
Arcos (MG)
Raimundo
de
Azeredo
Santos,
comerciante.
Caio Mário da Silva Pereira
Erbert Vianna Chamoun
1913
1923
Belo Horizonte
Leopoldo da Silva Pereira,
(MG)
professor de português e de latim.
Rio de Janeiro
Dados desconhecidos.
(DF)
Miguel Reale
1910
S.
Bento
do
Alfonso Reale,
Sapucaí (SP)
médico.
Torquato da Silva Castro
1907
Recife (PE)
Dados desconhecidos.
Clóvis Veríssimo do Couto e
1930
Porto
Waldemar do Couto e Silva,
Silva
(RS)
Alegre
professor de direito e advogado.
4
José Carlos Moreira Alves
1933
Taubaté (SP)
Luiz de Oliveira Alves,
profissão desconhecida.
Agostinho Neves Arruda Alvim
Sylvio Marcondes Machado
1897
?
São
Paulo
José Manuel de Arruda Alvim,
(SP)
profissão desconhecida.
(SP)
Dados desconhecidos.
Nota: Quadro demonstrativo da origem social dos agentes. Os dados biográficos foram obtidos
na composição de dados constantes em: dicionários biográficos (Dicionário Histórico Biográfico
Brasileiro, Quem é Quem no Brasil, Enciclopédia Britânica); biografias dos ministros do STF
(www.stf.gov.br), livros de biográficos ou autobiográficos, currículos do sistema Lattes ou
arquivados nas Faculdades de Direito e em órgãos públicos; discursos de posse em
instituições de consagração (Academia Brasileira de Letras, Academia Brasileira de Letras
Jurídicas, Instituto dos Advogados, Ordem dos Advogados,...); discursos de concessão de
títulos acadêmicos e medalhas jurídicas; necrologias e elogios fúnebres; apresentação de
obras; entrevistas com os legisladores ou pessoas de suas relações. Alguns dados ainda são
desconhecidos da autora, pois a pesquisa encontra-se em andamento.
Quanto à origem geográfica, os agentes são predominantemente
provenientes dos três centros de poder da República Velha: Rio de Janeiro,
São Paulo e Minas Gerais. Estes três estados, além de concentrarem o poder
político, também dão origem a maior parte dos juristas que ocupam altos
cargos estatais.
Tomando como exemplo a origem social dos Ministros do Supremo
Tribunal durante o período republicano, vemos que as origens sociais dos
mesmos
guardam
uma
exata
proporcionalidade
com
a
dos
juristas
projetadores, sugerindo certo padrão na origem social das elites jurídicas. Mais
interessante ainda é observar que há um projetador com origem em cada um
dos seguintes estados: do Rio Grande do Sul, Pernambuco e Bahia. Estas são,
respectivamente, as três origens mais freqüentes dos Ministros do Supremo
Tribunal, logo atrás dos estados mais incidentes. Estas constatações são
reproduzidas na distribuição das origens dos agentes redatores do Código Civil
e ministros, como demonstra a tabela n. 1.
5
Tabela nº.1: Tabela comparativa da origem geográfica dos Ministros do STF, do STJ e dos
redatores dos anteprojetos de Código Civil.
Estado de origem
Ministros do STF
Ministros do STJ
Projetadores do CC
Alagoas
2
4
0
Amazonas
1
2
0
Bahia
14
13
1
Ceará
4
7
0
1
0
0
0
1
0
Goiás
1
2
0
Maranhão
5
2
0
Mato Grosso
2
1
0
Minas Gerais
30
25
3
Pará
1
3
0
Paraíba
5
5
0
Paraná
1
5
0
Pernambuco
11
4
1
Piauí
5
3
0
Rio de Janeiro
31
12
3
Rio Grande do Norte
1
3
0
Rio Grande do Sul
16
11
1
Santa Catarina
1
3
0
São Paulo
23
14
4
Sergipe
5
4
0
Total
160
124
13
Espírito Santo
Exterior
4
Nota: Tabela comparativa do local de nascimento dos Ministros do STF, STJ e dos
projetadores do Código Civil. Em relação aos ministros, a tabela abrange todo o período
republicano atualizado até outubro de 2008. Na contagem dos ministros do STJ, estão inclusos
os ministros integrantes do antigo Tribunal Federal de Recursos, transformado em Superior
Tribunal de Justiça em 1988. Já entre os projetadores estão os 13 juristas participantes da
redação de pelo menos um dos anteprojetos de Código Civil no período de 1942 a 1969. Os
dados em relação aos ministros foram retirados do STF e do STJ, disponíveis,
respectivamente, em: www.stf.gov.br e www.stj.gov.br, acesso em 1/10/2008. Os dados dos
projetadores foram retirados de várias fontes, tal como explica a nota 4. Os estados do Acre,
Amapá, Distrito Federal, Mato Grosso do Sul, Rondônia, Roraima e Tocantins não aparecem
na tabela, pois não possuem ministros nem projetadores com origem em seu território. Os
ministros que nasceram no Rio de Janeiro, época em que este era o Distrito Federal, foram
computados no estado do Rio de Janeiro.
4
Trata-se do atual Ministro Felix Fisher, nascido em 30/09/1947 em Hamburgo, Alemanha, e
naturalizado brasileiro. O mesmo bacharelou-se no Rio de Janeiro em Ciências Econômicas na
UFRJ (1971) e em Direito pela UEG, hoje UERJ (1972). Exerceu sua carreira vida profissional,
sempre ligada ao direito, no Estado do Paraná.
6
Todos os agentes em análise realizam seus estudos pré-universitários e
a graduação em direito no estado de origem5. Em geral, o doutorado, a livredocência e a tese de cátedra também ocorrem no mesmo local. Exceções são
os percursos de Philadelpho de Azevedo e de Teophilo Santos que realizaram
estudos em Paris. O primeiro cursou Ciência Política na École de Sciences
Politiques em 1927, treze anos após sua formatura. O segundo ganhou bolsa
de estudos do governo francês e foi doutorar-se na Université de Paris II, um
ano após sua graduação em direito. No entanto, ambos os casos mostram a
circulação internacional, traço marcante destes agentes, conforme analisado
infra.
Os projetadores oriundos dos estados periféricos (Pernambuco, Rio
Grande do Sul e Bahia) não realizam deslocamento espacial permanecendo no
estado de origem durante toda a carreira profissional. Esta constatação indica
também uma maior probabilidade dos nascidos nas regiões centrais
ascenderem aos postos federais privativos de bacharéis em direito, tais como:
Advogado da União (antigo Consultor-Geral da República)6, Procurador-Geral
da República e Ministro dos Tribunais Superiores.
5
Até mesmo Caio Mario, que se mudara durante a infância para o Rio de Janeiro, acabou
retornado a Belo Horizonte para cursar direito. A mudança de sua família para a capital ocorreu
devido ao fato de seu pai ter ido lecionar humanidades no colégio São José (PEREIRA, 2001,
p.6).
6
O cargo de Consultor-Geral da República foi extinto e substituído pelo cargo de AdvogadoGeral da União através da Lei Complementar 73/1993, publicada no D.O. de 11/02/1993.
7
Quadro n. 2: Estudos básicos, secundários e superiores.
Nome
Estudos
primários
secundários
José Philadelpho de Barros
Azevedo
Colégio D. Pedro II, Rio de
Janeiro.
Hahnemann Guimarães
Colégio D. Pedro II, Rio de
Janeiro.
Orosimbo Nonato da Silva
Primário na cidade de Sabará.
Colégio Morais, Belo Horizonte.
(humanidades)
Orlando Gomes dos Santos
Escola Campo Grande, em
Salvador.
Escola Cócio Barcelos, Rio de
Janeiro.
Grupo Escolar Afonso Pena,
Belo Horizonte.
Instituto Padre Machado, Belo
Horizonte.
Colégio
Marconi,
Belo
Horizonte. (clássico)
Grupo Escolar Barão do Rio
Branco,
Belo
Horizonte
(primário).
Local desconhecido.
Nossa Senhora da Glória,
Itajubá.
Istituto Médio Ítalo Brasiliano
Dante Alighieri, São Paulo.
Local desconhecido.
Colégio Anchieta, Porto Alegre.
(primário e secundário)
Theophilo de Azeredo Santos
Caio Mário da Silva Pereira
Erbert Vianna Chamoun
Miguel Reale
Torquato da Silva Castro
Clóvis Veríssimo do Couto e
Silva
José Carlos Moreira Alves
Agostinho Neves Arruda Alvim
Sylvio Marcondes Machado
e
Instituto Lafayette, Rio de
Janeiro. (primário, ginasial e
científico)
Local desconhecido.
Local desconhecido.
Formação acadêmica
Graduado na UFRJ (1914) e
aluno da SciencePo, Paris
(1927).
Graduado UFRJ (1923), livredocente em Direito Romano
(1931) e catedrático de Direito
Civil
(1933)
na
mesma
instituição.
Graduado na UFMG (1911),
livre-docente e catedrático na
mesma instituição (1925).
Graduado na UFBA (1930).
Graduado na UFMG (1935),
doutorado em Paris II (1936) e
doutor na UFMG.
Graduado na UFMG (1935) e
doutor na mesma instituição.
Graduado na UFRJ.
Graduado na USP (1933) e
doutor na mesma instituição
(1941).
Graduado na UFPE.
Graduado na UFRGS (1955),
catedrático
na
mesma
instituição (1966).
Graduado na UFRJ (1955),
doutor na mesma instituição
(1957).
Graduado na USP.
Graduado na USP.
Nota: Quadro demonstrativo dos locais de estudos pré-universitários, universitário e de pósgraduação dos agentes projetadores do Código Civil. A maior parte das faculdades teve seus
nomes alterados ao longo dos anos. Para simplificar, utiliza-se a sua sigla atual.
A circulação internacional7 é traço marcante nas carreiras dos juristas
projetadores. Eles tiveram oportunidade de integrar organismos internacionais,
estudar no exterior, comparecer a congressos ou, ainda, representar o Brasil
7
Dezalay e Garth defendem que a circulação internacional de idéias entre os bacharéis é um
condicionante do campo do Direito, pois permite estabelecer fronteiras, estruturas, e orienta as
estratégias implementadas pelos atores nacionais.
8
em encontros e reuniões internacionais. Miguel Reale, por exemplo, teve
alguns colóquios internacionais para discussão de seu pensamento. Um deles
ocorreu em Portugal e outros dois no Brasil. O I Colóquio Luso-Brasileiro de
Pesquisa Filosófica (Rio de Janeiro) e o VI Congresso Brasileiro de Filosofia
(São Paulo), ambos realizados em 1999, não estão mencionados no quadro n.
3, pois não configuram exemplos de deslocamento dos agentes. No entanto, os
anais publicados8 no congresso de São Paulo demonstram a presença de
estudiosos vários estados do Brasil (Rio de Janeiro, São Paulo, Distrito
Federal, Pernambuco, Paraíba, Bahia, Minas Gerais, Paraná, Rio Grande do
Sul, Ceará, Amazonas) e do exterior (Portugal, Itália, Espanha, Estados
Unidos, Argentina, Japão), o que indica a circulação internacional das idéias
filosóficas de Reale. Outros exemplos da circulação internacional dos juristas
em análise encontram-se no quadro n. 3.
Quadro n. 3: Circulação Internacional
Nome
Viagens de estudos
ou para ministrar
aulas
Congressos, cargos ou condecorações
Orozimbo Nonato da Silva
Não
Grã-Cruz da Ordem Nacional do Mérito de Itália
e Portugal.
Hahnemann Guimarães
Não
Representante
do
Brasil
na
Conferência
Internacional do Ensino Superior em Paris,
França. (1937)
Congresso Internacional de Direito Privado em
Montevidéu, Uruguai (1940).
Chefe da delegação brasileira ao Congresso
Internacional de aeronáutica civil em Chicago,
EUA. (1944)
José Philadelpho de
École
de
Azevedo
Politiques,
França. (1927)
8
Sciences
Membro da Seção Brasileira do Comité Juridique
Paris,
International de l’ Aviation, sediada em Paris,
França. (1930)
Meio Século de Filosofia. Anais do VI Congresso Brasileiro de Filosofia (6 de setembro
de 1999). São Paulo: IBF, 2003. vol. I e II.
9
Representante
do
Brasil
na
“Semaine
Internationale de Droit” em Paris, França. (1937)
Representante do Brasil na Union Internationale
des Avocats em Paris, França. (1937)
Representante do Brasil no II Congresso de
Direito Comparado em Haia, Holanda. (1937)
Representante do Brasil no 8º Congresso
Científico Americano em Washington, EUA.
(1940).
Membro da Inter-american Bar Association em
Washington, EUA. (1940)
Juiz da Corte Internacional de Justiça em Haia,
Holanda. (1946-1961)
Caio
Mário
da
Silva
Pereira
Professor
para
convidado
lecionar
Direito
Comparado
na
Apresentador de trabalho no IV Congresso
Internacional de Direito Comparado em Paris,
França. (1953)
Univeristé de Paris I,
IX Conferência Interamericana de Advogados
França. (1953)
em Dallas, EUA. (1956).
Estudou common law
Conferencisita em Yale, EUA (1956).
em
I Jornadas Latino-americanas de Direito Privado
universidades
americanas. (1953)
em Buenos Aires, Argentina (1960).
Comission
Internationale
de
Juristes
em
Genebra, Suíça (1965).
Theophilo
de
Azeredo
Estudou com bolsa de
Atual presidente do Comitê Internacional de
estudos na Université
Arbitragem
de Paris II (1955-1956)
Comércio com sede em Paris, França (2008).
Orlando Gomes
Não possui
Não possui.
Miguel Reale
Estudou na Itália.
Chefe da delegação brasileira na Organização
Santos
da
Câmara
Internacional
do
Internacional do Comércio em Genebra, Suíça.
(1951)
Fundador da Associação Interamericana de
Filosofia (1954).
Chefe da delegação brasileira dos seguintes
Congressos
Santiago,
Interamericanos
Chile
(1957);
de
Filosofia:
Washington,
EUA
(1959); e Buenos Aires, Argentina (1961).
Vice-presidente do Congresso Interamericano de
Filosofia em Québec, Canadá. (1967)
Colóquio Tobias Barreto para discussão do
pensamento de Miguel Reale, em Porto e Viana
9
do Castelo, Portugal. (1996)
José Carlos Moreira Alves
9
Assessor da delegação do Brasil da reunião dos
10
Ministros da Justiça dos países hispânicos, lusoamericanos e filipinos em Madrid, Espanha.
(1970).
Delegado
do
Brasil
nas
conferências
diplomáticas da Convenção Universal sobre o
direito do autor e da Convenção de Berna,
realizada em Paris, França. (1971)
Chefe da missão especial para representar o
governo
brasileiro
no
50° aniversário
da
Proclamação da República da Turquia (1973).
Clóvis Veríssimo do Couto
Professor convidado na
e Silva
Université de Paris II.
Professor convidado em
Florença.
Torquato da Silva Castro
Residiu no Japão para cuidar dos interesses de
um cliente de seu escritório de advocacia que
possuía uma mineradora (1957).
Nota: Quadro demonstrativo da circulação internacional dos notáveis. Os dados são relativos a
viagens de estudo, de representação oficial do país ou de trabalho dentro das profissões
jurídicas. Não estão computadas viagens de mero turismo.
II – Carreira profissional e distinções
Após a formação universitária, os projetadores civis incorporam um
léxico de práticas comuns aos bacharéis de direito que, além maximizar sua
inserção no espaço profissional, tornam-se reconhecidos socialmente como
juristas. Dentre as características distintivas desta elite estão o exercício da
docência em direito, a circulação internacional e o pertencimento a instituições
11
de consagração, como o Instituto dos Advogados Brasileiros10 e Academia
Brasileira de Letras Jurídicas11.
Arinos (apud Venâncio Filho, 1997, p. 8) distingue o bacharel do jurista
através de duas posturas distintas. Ao primeiro, cabe a o bacharelismo, que
consiste na aplicação dedutiva da técnica jurídica aplicada à realidade. Já o
juridicismo, pertencente ao segundo tipo, é uma postura inovadora e criadora
de formas de interpretar o direito e de sistematizá-lo, seja para ao sentido
progressista, seja para o reacionário. Dezalay e Garth (2002, p. 51-52),
inspirados na tradicional separação entre os produtores e práticos de direito, e
diante da indiferenciação destas atividades na América Latina, criam a
categoria analítica de “políticos-bacharéis”. Estes se caracterizam por serem
generalistas dotados de sabedoria prática para ocupar postos-chave dentro da
hierarquia social, notadamente os de natureza intelectual, política e
empresarial.
Miceli (1979) ressalta que a partir do Estado Novo, época em que o
diploma em direito deixa de ser um bem raro, os bacharéis passam a investir
na diversificação de carreiras, de forma concomitante ou alternada. Para isso,
se fazem valer de postos em jornais, revistas, escolas secundárias e de
relações sociais intensas, especialmente em certas instâncias de consagração.
10
Fundado em 1843, o Instituto dos Advogados Brasileiros – IAB, inicialmente chamado de
IAOB surge como uma instituição que congregava exclusivamente, e representava, toda a
comunidade jurídica do país. Com a criação da Ordem dos Advogados do Brasil, através do
Decreto nº 19.408, de 18 de novembro de 1930, o IAB passa a ser um instituto de consagração
de “notáveis” juristas. (BONELLI, 1999, p. 61-81).
11
A Academia Brasileira de Letras Jurídicas foi fundada em março de 1974 ao estilo da
academia francesa. A missão da academia é zelar pela pureza do idioma pátrio na literatura
jurídica, acompanhar a evolução do pensamento jurídico universal e contribuir para a sua
construção, congregando cordialmente, em torno desse ideal, juristas de todo o Brasil.
12
Para a identificação da presença destas características no grupo em análise,
veja o quadro n.4 que demonstra esta diversificação progressiva.
Quadro n. 4: Primeiro emprego e experiência docente
Nome
Orozimbo Nonato da Silva
Hahnemann Guimarães
José
Philadelpho
Azevedo
de
Primeiro emprego
Professor de Economia
e Estatística Rural na
Escola
Mineira
de
Agricultura e Veterinária
(1923).
Professor de Latim no
Colégio do Professor
Accioly.
Professor substituto de
Filosofia no Colégio D.
Pedro II (1915-1917).
Orlando Gomes
Advogado.
Caio Mário da Silva Pereira
Revisor
Forense.
Theophilo
Santos
Taquígrafo.
de
Azeredo
da
Revista
Sylvio Marcondes Machado
Advogado Comercialista.
Miguel Reale
Advogado.
José Carlos Moreira Alves
Professor regente de
Direito Civil e de Direito
Romano na Faculdade
de
Direito
da
Universidade
Gama
Filho, RJ (1957-1964).
Experiência docente
Livre-docente e catedrático de Direito Civil
UFMG (1931-1940).
Professor de Direito Civil na PUC-RJ (1940).
Catedrático de Latim D. Pedro II (1926-1937).
Livre Docente em Direito Romano da UFRJ
(1932).
Catedrático de Direito Civil da UFRJ (1933).
Catedrático de Psicologia, Lógica e História da
Filosofia no Colégio D. Pedro II (1917)
Livre-docente no D. Pedro II (1930).
Livre Docente em Direito Civil da Faculdade
Nacional de Direito da UFRJ (1932).
Catedrático de Direito Civil da UFRJ (1933).
Professor livre-docente de Introdução à
Ciência do Direito da Faculdade de Direito da
UFBA (1933).
Professor de Instituições de Direito Social da
Faculdade de Ciências Econômicas da UFBA
(1934).
Professor de Direito Civil da UFBA (1936).
Catedrático de Direito Civil da UFBA (1937).
Professor de Francês e Português no Colégio
Mineiro de BH. (1936-1939).
Professor de Francês Clássico na Faculdade
de Filosofia de UFM.
Professor catedrático de Direito Civil da
UFMG.(1950).
Professor de Direito Comparado no curso de
doutorado da UFMG (1951).
Professor de Direito Civil da UFRJ.
Professor de Direito Comercial da Faculdade
Nacional de Direito (UFRJ).
Professor
de
Direito
Comercial
da
Universidade do Estado da Guanabara
(UERJ).
Professor da Universidade Estácio de Sá.
Professor da Faculdade de Direito do Largo
São Francisco (USP)
Professor da Faculdade de Direito do Largo
São Francisco. (USP)
Professor de Direito Romano da Faculdade de
Direito Cândido Mendes, RJ (1960-1968)
Professor de Direito Romano no doutorado da
PUC-RJ (1962.)
Professor de Direito Civil e Processual Civil da
PUC-RJ (1962-1968).
Professor da EBAPE- FGV (1964-1968).
Professor livre-docente e catedrático de direito
civil e direito romano na Universidade do
Brasil (1965-1968).
Professor catedrático na USP (1968-1974).
Professor da Universidade Mackenzie, SP
13
Agostinho de Arruda Alvim
?
(1969-1974)
Professor cedido da USP à UnB (1974-).
Professor da PUC-São Paulo.
Erbert Vianna Chamoun
Advogado.
Professor da UERJ.
Professor da UFRJ.
Professor da PUC-RJ.
Clóvis Veríssimo do Couto
e Silva
Advogado.
Torquato da Silva Castro
Agricultor.
Professor da PUC-RS.
Professor da UFRGS.
Professor da UFPE.
Nota: Quadro demonstrativo do primeiro emprego e da experiência docente dos agentes
projetadores. As universidades têm a abreviação correspondente a seu nome atual.
Além de professores, os legisladores civis ocuparam postos diversos nas
carreiras jurídicas, jornalísticas12 e políticas. Ademais, realizam a produção de
artigos e livros jurídicos, filosóficos13 e literários14.
Ainda hoje, os manuais de direito civil de Caio Mario da Silva Pereira e
de Orlando Gomes são os mais freqüentemente indicados nas faculdades de
direito brasileiras. Com o advento no novo Código Civil, parte dos seus
ensinamentos ficou desatualizada. Assim, mesmo após a morte destes autores,
suas obras continuam a serem reeditadas com adaptações feita por outros
autores, menos consagrados. Estas obras estão no quadro 5.
12
Miguel Reale fundou o jornal integralista Acção (1936), a Revista Panorama (1936) da qual
foi diretor (1937). Além disso, foi colunista semana do jornal “O Estado de São Paulo”. José
Philadelpho de Azevedo colaborou no Jornal do Commercio na seção vida jurídica entre os
anos de 1936 a 1938.
13
Miguel Reale é fundador do Instituto Brasileiro de Filosofia (1949), o qual presidiu até sua
morte (2006). Igualmente fundador da Sociedade Interamericana de Filosofia. Sua teoria
tridimensional do direito é mundialmente conhecida e sua obra filosófica foi traduzida para o
francês, italiano e espanhol. Como exemplo citamos: Filosifia del Diritto, traduzida para o
italiano por Luigi Bagolini e G. Ricci (1956); Filosofia del Derecho, traduzida para o espanhol
por Angel Herreros (1979); Situation de la théorie de l’État dans les domaines de la
connaissance juridique, traduzida por Jacques Douchez (1953).
14
Destacamos como exemplos Miguel Reale, membro da Academia Brasileira de Letras, e
Orlando Gomes, membro da Academia de Letras da Bahia (1968). Este que escreveu um livro
de crônicas intitulado O Veranista.
14
Quadro n. 5: Manuais de direito de autoria dos coordenadores da segunda comissão
jurídica elaboradora do anteprojeto de Código Civil
Nome
Caio Mário da Silva
Pereira
Manuais de Direito Civil
Introdução ao direito civil: teoria geral do direito civil. 22ª. ed.
em 2008. Atualizado por Maria Celina Bodin de Moraes.
Teoria geral das obrigações. 21ª. ed. em 2006. atualizado por
Guilherme Calmon Nogueira da Gama.
Contratos. 12ª. ed. 2005. Atualizado por Regis Fichtner.
Direitos reais. 19. ed. em 2007. Atualizado por Carlos Edson
Monteiro Rêgo Filho.
Direito de família. 16ª. ed. em 2007. Atualizado por Tânia da
Silva Pereira.
Sucessões. 16 ed. em 2007. Atualizado por Carlos Roberto
Barbosa Moreira.
Introdução ao Direito Civil. 19ª. ed. em 2007. Atualizado por
Orlando Gomes
Edvaldo Brito e Reginalda Paranhos de Brito.
Obrigações. 17ª em ed. 2007. Atualizado por Edvaldo Brito.
Contratos. 26ª. ed. Em 2008. Atualizado por Antônio Junqueira
de Azevedo e Francisco Paulo de Crezenzo Mariano.
Direito de família. 14ª. ed. em 2001. Atualizada por Humberto
Theodoro Gomes.
Direitos reais. 19ª ed; em 2007. Atualizado por Edson Fachin.
Sucessões. 14ª. ed em 2007. Atualizado por Mario Roberto
Carvalho de Faria.
Nota: Quadro demonstrativo dos manuais de direito de Gomes e Pereira, com respectiva edição e
atualizador. Dados atualizados até outubro de 2008.
Outra característica marcante é o exercício de diversas atividades com a
carreira de advogado. Sempre que possível esta se acumulava com a função
de professor. Caso houvesse impedimento de cumulação de carreiras, por
exigência de dedicação exclusiva, ocorre sua retomada após a aposentadoria
ou a exoneração em cargos públicos que impedem a militância na advocacia.
Este é o caso de Nonato, por exemplo, que, após aposentar-se do cargo de
Ministro do STF, dedica-se à carreira de advogado e parecerista no Rio de
Janeiro, em uma banca integrada por Theophilo de Azeredo Santos, seu exaluno na Universidade de Minas Gerais, e Idelfonso Mascarenhas da Silva
(Lisboa, 2003, p. 51).
15
O antigo cargo de Consultor-Geral da República, equivalente ao atual
cargo de Advogado Geral da União foi ocupado por três projetadores do
Código Civil: Hahnemann Guimarães, Orozimbo Nonato da Silva e Caio Mario
da Silva Pereira. Os dois primeiros se sucederam durante o governo Vargas e
Caio Mario foi Consultor-Geral da República no ano de 1961, durante governo
Jânio Quadros. Estes dados estão disponíveis no quadro n. 6.
Quadro n. 6: Carreiras públicas dos Projetadores Legislativos
Nome
Origem
Hahnemann Guimarães
Rio
Janeiro
(DF)
de
Rio
Janeiro
(DF)
Sabará
(MG)
de
José Philadelpho
Azevedo
de
Barros
Orozimbo Nonato da Silva
Carreiras Públicas Federais
Caio Mário da Silva Pereira
Belo
Horizonte
(MG)
Orlando Gomes
Salvador
(BA)
Arcos (MG)
São Paulo
(SP)
Porto
Alegre (RS)
Rio
de
Janeiro
(DF)
Taubaté
(SP)
Theophilo de Azeredo Santos
Agostinho de Arruda Alvim
Clóvis Veríssimo do Couto e
Silva
Erbert Vianna Chamoun
José Carlos Moreira Alves
Consultor Geral da República de Vargas (19411945)
Procurador Geral da República (1945-1946)
Juiz do Tribunal Superior Eleitoral, no governo
Dutra (1946)
Ministro do STF, durante o governo Dutra (1946)
Vice-Presidente do TSE (1950-1953)
Ministro do STF, no governo Vargas (1942)
Consultor Geral da República, no governo Vargas
(1940-1941)
Ministro do STF, nomeado por Vargas (1941-1960)
Vice-Presidente do STF (1951-1954) reeleito
(1954-1956)
Presidente do STF (1956-1958)
Consultor Geral da República de Jânio (1961)
Chefe de Gabinete do Ministro da Educação,
Pedro Aleixo (1966)
Não
Não
Não
Não
Não
Coordenador da Comissão de Estudos Legislativos
do Ministério da Justiça (1969-1972);
Chefe do Gabinete do Ministro da Justiça Alfredo
Buzaid. (1970-1971);
Procurador Geral da República (1972-1975);
Coordenador da Comissão de Estudos Legislativos
do Ministério da Justiça (1974-1975);
Ministro do STF, no governo Geisel (1975);
Juiz substituto do TSE (1975-1978);
Juiz efetivo do TSE (1978-1980);
Vice-Presidente do TSE (1980-1981);
Vice-Presidente do STF (1982-1985);
Presidente do STF (1985-1987);
16
Miguel Reale (1910-2006)
Sylvio Marcondes Machado
Torquato de Castro (1907-1988)
S. Bento do
Sapucaí
(SP)
SP
Recife (PE)
Presidente da Primeira Turma do STF (1987-);
Juiz Substituto do TSE (1994-1998).
Membro do Conselho Federal de Cultura (19741989)
Não.
Não.
Nota: Quadro demonstrativo das carreiras públicas federais dos projetadores civis.
A forte rede de relações sociais e o hetero-reconhecimento pelos pares.
Assim, os juristas das comissões elaboradoras do Código Civil recebem
diversos prêmios jurídicos, homenagens e títulos doutor honoris causa. Dentre
eles, destaca-se o Prêmio Teixeira de Freitas concedido anualmente pelo
Instituto dos Advogados Brasileiros aos melhores trabalhos jurídicos. Instituída
no ano de 1929, premiando Clóvis Beviláqua, autor do Código Civil de 1916, a
medalha Teixeira de Freitas foi concedida a 6 dos 13 juristas projetadores.
Outra instância de consagração relevante é a Academia Brasileira de Letras
Jurídicas.
Outra instituição de consagração fundamental é a Academia Brasileira
de Letras Jurídicas. Sociedade civil fundada em 6 de setembro de 1975, e
declarada de utilidade pública federal em 1983, a academia segue o estilo do
modelo francês. Suas cadeiras simbólicas em número de cinqüenta têm um
patrono cada e são ocupadas perpetuamente por escritores juristas brasileiros
eleitos por maioria absoluta. Cinco dos treze projetadores são membros, sendo
Orozimbo Nonato patrono da cadeira 28. Torquato de Castro, afiliado pela
Academia Pernambucana de Letras Jurídicas, fundada por ele em 1976 e
Sylvio Marcondes dos Santos detentor da cadeira 43 da Academia Paulista de
Letras.
Orlando Gomes foi igualmente da Academia de Letras da Bahia e da
Miguel Reale, além de ser membro da Academia Brasileira de Letras Jurídicas
e da Academia Paulista de Letras Jurídicas é membro da Academia Brasileira
de Letras. Estas informações estão explicitadas no quadro n. 7.
Quadro n. 7: Medalhas e distinções recebidas pelos Projetadores legislativos
17
Nome
Hahnemann Guimarães
José Philadelpho de Barros
Azevedo
Orozimbo Nonato da Silva
Caio Mário da Silva Pereira
Orlando Gomes dos Santos
Theophilo de Azeredo Santos
Agostinho Neves Arruda Alvim
Clóvis Veríssimo do Couto e
Silva
Erbert Vianna Chamoun
José Carlos Moreira Alves
Miguel Reale
Sylvio Marcondes Machado
Torquato de Castro (1907-1988)
Medalha
Teixeira de
Freitas
Não
Não
Membro da ABLJ
Doutor
Honoris Causa
Sim, 1956.
Sim, 1961.
Sim, 1974.
Sim, 1983.
Não
Não
Patrono da cadeira 28
Sim, cadeira 28
Sim, cadeira 1
Não
Não
Sim, cadeira 42
Não
Não
Não
Sim, 1968.
Não
Não
Não
Sim, cadeira 44
Sim, cadeira 26
Não
afiliado pela APLJ
Desconhecido.
Não
Não
1
Não
15 títulos
Desconhecido.
Nota: Quadro demonstrativo de prêmios, medalhas e distinções recebidas pelos projetadores
legislativos. Os dados foram obtidos com base no site do IAB (www.iabnacional.org.br), nas
Revistas da Academia Brasileira de Letras Jurídicas e nos dados biográficos obtidos conforme
explicado na nota 4.
III – A hiperpolitização e a expertise instituinte
Os juristas elaboradores dos Anteprojetos de Código Civil participaram
de outras comissões legislativas, sempre a convite dos políticos no poder.
Assim, há uma estreita relação entre as simpatias ou militâncias políticas, as
amizades e os convites para integrar as comissões legislativas. Evidencia-se
que os recursos mobilizados são provenientes de diversas redes (DURIEZ e
SAWICKI, 2003) freqüentemente sobrepostas à noção de multiposicionalidade
dos agentes (Boltanski).
A primeira tentativa de reforma do Código Civil veio a lume no governo
Vargas. Os juristas Orozimbo Nonato, Philadelpho Azeredo e Hahnemann
Guimarães. Alinhados à política getulista; elaboraram, a pedido do governo, um
projeto de reforma do Código Civil que retirasse a parte relativa à matéria
contratual e, juntamente com dispositivos do Código Comercial, criasse um
Código das Obrigações. Obviamente, esta manobra tinha um duplo objetivo:
18
tornar as mudanças legislativas de Vargas ainda mais profundas e promover
uma alteração desapercebida do Código Comercial. Tal empreitada não obteve
sucesso, tendo havido manifestações da sociedade e dos juristas contra esta
unificação.
Apesar de não terem sido terem falhado no projeto de codificação, o
feito desta primeira comissão foi realizar a modificação da Lei de Introdução ao
Código Civil Brasileiro, consubstanciada pelo Decreto-lei 4.657, de 4 de
setembro de 1942, durante o mandato de Alexandre Marcondes Filho no
Ministério da Justiça. Além desta comissão, Nonato participou da reforma da
Lei de Falências (Decreto-lei 7.661, de 21 de junho de 1945) juntamente com
Alexandre Marcondes Filho, Philadelpho Azevedo, Hahnemann Guimarães e
Sylvio Marcondes.
Os elaboradores do anteprojeto de Reforma do Código civil converteram
seu prestígio para ascender à posição de Ministro do Supremo Tribunal
Federal.
Antes disso, Orozimbo Nonato havia sido nomeado por Vargas para o
cargo de Consultor-Geral da República15, tendo permanecido no cargo até
1941, quando ascende a Ministro do STF. Em função disso, Hahnemann
Guimarães (1941-1945) substitui Nonato no cargo de Consultor Geral da
República.
Guimarães, na condição de Consultor Geral da República do governo
Vargas, integrou a comissão presidida pelo Ministro da Justiça Agamenon
Magalhães e integrada pelos seguintes juristas: José Linhares (ministro do
STF) José Miranda Valverde (OAB), Vicente Piragibe e Antonio Lafaiete de
Andrada (Juízes do Tribunal de Apelação). Esta lei correspondeu à tentativa de
Vargas em superar as dificuldades enfrentadas pelo Estado Novo para adaptarse as (ABREU, 2001)
15
Consultor Geral da República é o mais assessor jurídico do Presidente da República,
submetido à sua direta, pessoal e imediata supervisão. É um cargo em comissão nomeado,
pelo Presidente da República, dentre bacharéis em Direito “de notável saber jurídico e ilibada
reputação” e possui status de Ministro.
19
Os juristas da primeira comissão alinham-se a Vargas e ocupam um
conjunto de cargos públicos até chegarem ao ápice, como Ministros do
Supremo Tribunal Federal, conforme sistematizado no quadro n. 9.
Quadro n.9 : Carreiras públicas dos primeiros projetadores
Nome
Orozimbo Nonato da
Silva
José Philadelpho de
Barros Azevedo
Hahnemann
Guimarães
Cargos diversos
Delegado de Polícia em Aiuruoca e Turvo
(1912)
Promotor de Justiça (1912).
Juiz municipal em Rio Branco e Entre Rios
(1913).
Advogado-Geral do Estado de MG (1933).
Desembargador do TAMG (1934) .
Membro do TRE-MG.
Consultor Geral da República (1940).
Procurador Geral do DF (1934-1936).
Prefeito nomeado do Rio de Janeiro, DF
(1945-1946).
Juiz da Corte internacional de Justiça, com
sede em Haia, Holanda.(1946-1951).
Membro do Comitê Juridique International
de l’aviation (Paris, com sede no RJ)
Consultor Geral da República (1941-1945)
Procurador Geral da República (19451946).
Integrante do TSE (1945)
Ministro STF
Ministro do STF,
nomeado por Vargas
(1941).
Ministro do STF,
nomeado por Vargas
(1942).
Ministro do STF,
nomeado por Eurico
Gaspar Dutra
(1946-1967).
Fonte: Elaboração própria, com base nos dados do DHBB e do site do STF (www.stf.gov.br).
Dentre
os
segundo
grupo
de
projetadores,
destacam-se
os
coordenadores da comissão elaboradora do Código Civil, Gomes e o
coordenador da comissão elaboradora do Código das Obrigações, Caio Mario
das Silva Pereira. É o jurista atípico entre os codificadores. Gomes, filho de um
caixeiro, é o projetador de origem mais humilde e que, no plano político,
posiciona-se à esquerda. Em 1937 foi preso pelo Estado Novo por dar aulas
sobre a União SOVIÉTICA. Em 1946, concorreu a senador pelo Partido
Socialista Brasileiro no ano de 1946. No direito, escreveu sobre sociologia do
direito e direito do trabalho. Aproximou-se timidamente da linha alternativa do
direito, embora não simpatizasse com a matriz política que lhe dá origem16.
16
AMARAL, Francisco. “Evocação a Orlando Gomes”; Revista Brasileira de Direito
Comparado. n. 17 (1999), p. 10.
20
Caio Mario da Silva Pereira é liberal e udenista, alinhando-se a Milton
Campos. Tanto o projeto de Código Civil de Gomes quanto o de direito das
obrigações de Pereira foram retirados de pauta, durante a ditadura militar.
Assim, Miguel Reale é convidado para escrever o Código Civil, mas opta
por convidar outros cinco juristas conservadores para empreenderem a tarefa
com ele. Reale possui um perfil exemplar de uma das gerações de juristas
brasileiros que transitam na permeável fronteira entre a política e a
universidade, alternando postos nas faculdades de direito e na vida pública.
Essa alternância é percebida na visão pessoal de Reale como “uma constante
luta entre a vocação teórica do professor e a nunca vencida vocação
política”.(REALE, 1986, p. 38.) Por ocasião do convite feito pelo presidente
Vargas
para
integrar
o
Conselho
Administrativo
do
Estado,
aceitou
imediatamente. Em suas Memórias (Reale, v. I, 1987, p. 164.), Reale assim se
manifesta: “não vacilei um instante sequer, pois em meu sem sempre atuaram
duas valências, uma jurídica, outra política, ambas em busca de sincronia”
Reale foi um dos membros mais importantes do Integralismo, ao lado do
próprio Plínio Salgado, seu conterrâneo de São Bento do Sapucaí, e de
Gustavo Barroso. Enquanto membro da AIB, Reale foi seu principal ideólogo, o
que lhe deu a posição de chefe de doutrina. A militância de Reale no
integralismo dura quase dez anos, de 1932 a 1941. É em maio deste ano que
rompe definitivamente com o Integralismo, tanto quanto Gustavo Barroso. Isso
porque Plínio Salgado, antes de seguir para o exílio em Portugal, confia a
chefia do Integralismo a Raymundo Padilha17, A partir desse episódio, tanto
Miguel quanto Barroso rompem com o integralismo, por haverem sido
preteridos na ordem hierárquica do movimento. (Memórias, vol. I, 1987, p. 143144.)
No quadro ç são sistematizadas as experiências legislativas dos juristas
projetadores do Código Civil.
17
Então funcionário do Banco do Brasil em Campinas e futuro deputado federal e governador
do Rio de Janeiro. (REALE, 1987, vol. I, p. 143.)
21
Quadro 9: Experiência legislativa
Nome
Comissões Legislativas
Orozimbo Nonato da Silva
Integrante da comissão redatora da Lei de Introdução ao Código Civil.
Comissão elaboradora do Anteprojeto de Obrigações.
José
Philadelpho
de
Barros Azevedo
Hahnemann Guimarães
Integrante da comissão redatora da Lei de Introdução ao Código Civil.
Comissão elaboradora do Anteprojeto de Obrigações.
Integrante da comissão redatora da Lei de Introdução ao Código Civil.
Comissão elaboradora do Anteprojeto de Obrigações.
Comissão elaboradora da lei de falências.
Comissão de projeto de lei da supressão da enfiteuse.
Integrante da Comissão de elaboração da Lei eleitoral (DL 7.566/45).
Comissão elaboradora do CC (Lei 10.406/2002)
Autor do livro de Direito das Sucessões do Novo Código Civil.
Agostinho de Arruda Alvim
Torquato de Castro
Orlando Gomes da
Miguel Reale
Caio Mário da Silva
Pereira
Comissão elaboradora do CC (Lei 10.406/2002)
Integrante da Comissão designada pelo IA-MG para redigir a
Constituição Estadual de MG, aprovada em1935.
Através do IA-MG foi encarregado pelo presidente da comissão
de elaboração do CPC da parte referente às provas (1935)
Integrante da comissão de reforma do sistema tributário estadual
(Pereira, 2001, p. 213)
Integrante da comissão de elaboração da Lei de Organização judiciária
d e MG convertida em lei (1940)
Projetou a lei 4.591/1964 sobre condomínios e incorporações.
Cordenador da comissão do anteprojeto de Código das
Obrigações (1965)
Integrante da comissão elaboradora do Anteprojedo de CC
(1965)
Erbert Vianna Chamoun
Comissão elaboradora do CC (Lei 10.406/2002)
Theophilo
Santos
Comissão elaboradora do CC (Lei 10.406/2002)
Autor, jubtamente com o professor Temistocles Brandão Cavalcanti do
Anteprojeto de Lei que cria o Conselho Nacional de Seguros Privadfos e
Capitalização. (Decreto-Lei nº 73, de 21 de novembro de 1966)
de
Azeredo
Clóvis Veríssimo do Couto
e Silva
José Carlos Moreira Alves
Sylvio
Machado
Nota:
Marcondes
Comissão elaboradora do CC (Lei 10.406/2002)
Comissão elaboradora do CC (Lei 10.406/2002)
Lei dos Direitos Autorais (Lei 5.988/1973)
Membro da comissão revisora do Código Penal. (1982)
Presidente da comissão revisora do Anteprojeto das contravenções
penais. (1982)
Comissão elaboradora do CC (Lei 10.406/2002)
Conclusão
A partir de uma micro-análise do fenômeno da recodificação civil é
possível pôr em evidência um conjunto de propriedades e relações necessárias
para a ascensão à função de legislador civil. Além do conhecimento técnico-
22
jurídico exigido destes professores e práticos do direito, deve acrescentar-se a
afinidade política com o governo em exercício.
Os dados obtidos indicam que o fato d a terceira comissão ter seu
projeto aceito extrapola a importância pessoal dos seus membros, na medida
em que os demais projetadores possuem características semelhantes.
Trabalhos futuros podem afinar a análise a fim de isolar certas propriedades
dos integrantes das três comissões legislativas e seus múltiplos grupos de
interesse, a fim de demonstrar certos princípios de dominação e de eventual
diferenciação de perfil entre as comissões. A partir do estudo dos trajetos dos
agentes da recodificação civil, a mais árdua do século XX, fica evidente que a
tarefa performativa é um caráter distintivo dentro da própria elite jurídica
brasileira.
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