A REESTRUTURAÇÃO BANCÁRIA E SUAS CONSEQUÊNCIAS SOCIAIS: a
ofensiva neoliberal e o iitinerário das inovações técnico-organizacionais no Banco do
Brasil
Júlio Ramon Teles da Ponte
1
Resumo: O presente trabalho tem como objetivo analisar a
reestruturação bancária vivenciada pelo Banco do Brasil-BB no final
do século XX e início do século XXI. No âmbito da ofensiva neoliberal
no Brasil, iniciada nos anos noventa do século passado,
contextualizaremos a dinâmica da reestruturação bancária
resgatando as estratégias técnico-organizacionais implementadas
pela empresa no período de 1990 a 2002, ponderando as
consequências socais de tais políticas para o funcionalismo do
Banco. Por fim, concluiremos com algumas considerações sobre a
perspectiva do trabalho em geral - e do bancário particular - em meio
á crise do sociometabolismo do capital ora em evidência.
Palavras-chave:
Reestruturação
bancária,
capital
rentista,
neoliberalismo, trabalho bancário.
Abstract: This work aims to analyze the restructuring bank
experienced by the Banco do Brasil at the end of the twentieth century
and the 21st century. In the context of offensive neoliberal in Brazil,
began in the 1990s of the last century, explain the dynamics of bank
restructuring rescuing the technical-organizational strategies
implemented by the company in the period 1990 to 2002, considering
the social consequences of such policies for the functionalism of the
Bank. Finally, we will conclude with some considerations about the
prospect of work in general - and the particular banking - in the midst
of crisis will socio-metabolism capital now in evidence.
Key words: Bank capital restructuring, rentista, neoliberalism, work
banking.
1
Doutorando. Universidade Federal do Rio Grande do Norte. E-mail: [email protected]
1. INTRODUÇÃO
A reestruturação técnico-organizacional empreendida pelo Baco do Brasil, a partir da
última década do século passado, definiu o rumo da empresa enquanto subordinada ao
capital rentista, inserindo a instituição numa dinâmica tipica da concorrência intercapitalista
financeira. Esta nova postura do Banco do Brasil, mais próxima dos imperativos do mercado
e mais distantes das funções públicas outrora outorgadas à instituição, teve, quiçá, na
Reforma Bancária de 1964 seus primeiros indicativos. De fato, com a criação do Banco
Central do Brasil, o BB perderia inúmeras funções que o caracterizava enquanto “Banco
Governamental”, em especial de agente fiscalizador do mercado bancário brasileiro. Em
1986, o fim da Conta Movimento, caixa do tesouro nacional mantida sob controle do BB,
decreta a necessidade imperiosa da passagem do Banco do Brasil para uma ênfase maior
no mercado, diversificando os produtos e serviços oferecidos à clientela. No entanto, foi a
partir do ajuste realizado em meados dos anos noventa do século passado, sob a égide
neoliberal que assolava o país, que o BB encarna peremptoriamente sua condição de
“Banco de mercado”, “ágil” e “enxuto”.
Inegavelmente, o avanço tecnológico incorporado pelo universo bancário, nos últimos
quinze anos, em consórcio com a reestruturação técnico-organizacional foram decisivos
para o novo perfil assumido pelo Banco do Brasil. Com as novas possibilidades advindas da
automação bancária, surgiram, igualmente, novas necessidades exigidas para inserção na
disputa intercapitalista financeira.
Assim, o Banco, agora convicto de sua vocação
capitalista, empreende uma corrida para alcançar sua modernização tecnológica,
transformando o tradicional saber-fazer bancário. Ao absorver as inovações bancárias da
automação, o BB incorpora internamente uma dinâmica de qualificação-desqualificante,
desfigurando os antigos elementos identitários entre funcionários e empresa. O Banco, com
ênfase nos imperativos do mercado, passa a ser regido conforme as estratégias do capital.
Com efeito, em 1995, o Banco explicita o excesso de força-de-trabalho por intermédio da
adoção da primeira versão do Plano de Desligamento Voluntário-PDV, enquanto estratégia
de eliminação de “obstáculos internos” à lucratividade. Neste cenário, uma tentativa de
“mudança cultural” é empreendida pela Direção da empresa, enquanto tentativa hegemônica
de convencimento para os funcionários sobre a importância dos novos desafios do Banco
centrados na rentabilidade e na contenção das despesas.
A partir de meados dos anos noventa do século passado, percebe-se, no discurso
oficial do Banco, uma necessidade de mudança do “paradigma do paternalismo” para o
“paradigma da profissionalização”. Na realidade, tal “mudança de paradigma” pode ser
traduzida na quebra da “estabilidade do emprego” do bancário do BB, incutindo-lhe uma
obrigatoriedade de mudança de perfil, enquanto pré-requisito básico para sua permanência
na empresa. Inegavelmente, tal pré-requisito pode ser entendido como uma adaptação às
novas exigências da empresa centradas no imperativo do capital rentista sob a dominância
do projeto neoliberal implementado no setor público brasileiro. A intensa dinâmica de
automação bancária, por sua vez,
confere ao bancário uma nova rotina de trabalho
marcada pela simplificação das tarefas, intensificação do trabalho conjugada com a tensão
exaustiva para cumprimento de metas impostas pela concorrência interbancária. Em
verdade, essa adaptação do bancário ao novo perfil exigido pelo “novo” Banco do Brasil
impõe o imperativo da subsunção real do trabalhador bancário à acumulação do capital.
2. RETROSPECTIVA DAS INOVAÇÕES TÉCNICO-ORGANIZACIONAIS NO BB (1990 a
2002)
Na era de Collor de Mello (1990-1992) foi franca a disposição em realizar mudanças
mais profundas no BB, com clara intenção de transformar profundamente as estrutras da
empresa, com o propósito de modificar “a postura do funcionário”, que deveria adaptar-se às
novas condições do mercado interbancário. Na verdade, à época começou-se a introduzir,
inclusive pela mídia, a imagem segundo a qual o que “fosse público, era ineficiente”, então,
dever-se-ia “tornar eficaz”, “privatizar” ou “extinguir”. Inequivocamente, esta foi a patente do
ideário neoliberal que se instalara na vida pública brasileira, estabelecendo a hipertrofia do
imperativo mercadológico.
Em 1990, o BB implementa o programa, agora chamado de “O Novo Rosto do Banco
do Brasil”. Este programa tinha como pretensão uma radical mudança na empresa, com
vistas a sua suposta inserção no mercado global. A rigor, com o advento do “Novo Rosto”,
diversas agências tiveram seus quadros reduzidos, gerando uma quantidade de funcionários
sem localização definida à mercê da definição da Direção Geral da empresa. De fato estes
funcionários eram enquadrados enquanto “a disposição”, futuramente, ficariam conhecidos
como “excedentes”. O princípio da estabilidade consentida dentro da empresa começa a ser
fragilizado. Neste período foi criado o “cadastro de funcionários sob observação”, destinado
a incluir funcionários cujos desempenhos “eram insatisfatórios”, segundo às administrações
locais, classificando-os como “recuperáveis ou irrecuperáveis”. Além disso, o sistema de
Plano de Cargos e Salários (PCS) da empresa foi modificado, havendo um congelamento
das promoções automáticas. Na realidade, muitos funcionários foram coagidos à
aposentadoria e muitos outros se sentiram forçados a pedir transferência para as mais
diversas partes do país. A crise de instabilidade política que assolou o governo Collor, em
1992 levou ao impedimento do Presidente. De fato, com isto, respirariam mais tranqüilos os
funcionários do BB, pelo menos por dois anos (1992 a 1993). Os programas de
reestruturação do BB somente voltariam a partir da era FHC (1994).
Em 1994, o Banco lança o seu Programa de Qualidade Total do Banco do Brasil –
PQTBB. Salientava-se, à época, a necessidade de mudança organizacional, com a
“mudança na qualidade dos serviços e qualidade de vida”. Houve, neste sentido, um pesado
investimento no aparato ideológico, com vídeos, cursos, palestras e treinamentos. De fato,
foram constituídas, também, as primeiras equipes de autodesenvolvimento (EADs),
formadas por funcionários de carreira cujo objetivo era disseminar a “política da qualidade”
aos demais funcionários. Os gerentes atuaram enquanto disseminadores (facilitadores) do
programa, promovendo inúmeros eventos do PQTBB.
Em 1995, há um radical agravamento do clima entre os funcionários.
A antiga
“parceria” com os sindicatos se torna insustentável quando da divulgação dos critérios para
listar funcionários excedentes. Primeiramente, seriam os empregados mais novos os
selecionados para as listas, em seguida, cada unidade do banco teria “autonomia” para
indicar seus próprios excedentes. De fato, em muitas agências foram promovidas “eleições”
para indicação de nomes, noutros lugares as próprias administrações das unidades
indicavam os nomes sob critérios não divulgados. Nesta época, ampliaram-se os casos de
debilidades físicas e mentais dentre os funcionários do Banco. Na realidade, ocorrem,
inclusive, vários casos de suicídios cometidos até no interior de unidades do próprio Banco.
De fato, o mais curioso é que tais conseqüências já haviam sido previstas por uma empresa
de assessoria externa, contratada pela direção do Banco para conceber um plano de ação
para o “ajuste do quadro”.
De fato, um dos elementos que veio agravar ainda mais às condições de trabalho do
funcionário no Banco, á época, foi à exigência da “multifuncionalidade”. A rigor, diversos
cargos de gerência média foram extintos, ocasionando um maior número de tarefas para os
bancários sem comissão. Assim, exigia-se destes segmentos mais “dinamismo” e mais
“responsabilidade” na condução das rotinas de trabalho. A partir da segunda metade dos
anos noventa, há um abalo substancial entre os gestores do banco e os funcionários sem
comissão. De fato, os gerentes, de forma maciça, assumiram de vez o discurso da empresa,
alegando que tais mudanças eram necessárias e inevitáveis para a preservação da
instituição. Na realidade, muitos comissionados, excediam-se entusiasticamente, afirmando
que no BB não havia lugar para os “incompetentes” e os “sem compromisso” com a
empresa.
Em 1996, há um combate ainda mais intenso e penoso aos funcionários do Banco. O
antigo PDV (Plano de Demissão Voluntária) é convertido em PAQ (Plano de Adequação dos
Quadros). A mudança consistiu em menos incentivos financeiros para os optantes pela
demissão voluntária. As punições, sob o ponto de vista disciplinar, aos que permaneciam na
condição de excedentes sem que optassem pelo novo plano ou pedissem transferência para
outras regiões do país ficaram ainda mais violentas. Na realidade, o horizonte dos
considerados “excedentes” ficava cada vez mais sombrio, revelando a intransigência do
Banco em não abrir mão das esperadas demissões involuntárias aos funcionários que
teimavam em “não colaborar” com a empresa. Nas unidades do Banco, muitos
comissionados, prestavam-se a missões um tanto quanto sórdidas, como reeditar
frequentemente listas de excedentes, incentivando à adesão ao PAQ.
Em março de 1996, é lançado o programa “O Banco do Brasil na Hora da Verdade”,
programa destinado a atuar em diferentes frentes tais como: recomposição do capital do
banco - para adequação ao acordo de Basiléia -, reforma das políticas de gestão de
negócios, reformulação administrativa, novos critérios para concessão de crédito e
modernização tecnológica, inclusive, foram investidos 1,6 bilhão de reais entre 1996 a 2000
nesta rubrica. Em junho, efetivar-se-iam as primeiras demissões involuntárias dos
funcionários considerados “excedentes” do Banco do Brasil. De fato, agora, o que era
pesadelo se revestiu em realidade. Foram ao todo 595 demissões involuntárias de 96 a 97.
Estava, assim, consumada a extinção do estatuto da estabilidade no Banco do Brasil.
O “Profissionalização” consistiu num projeto que visa conscientizar o trabalhador
bancário para o “aperfeiçoamento contínuo”. Tenta impor à necessidade constante da
requalificação, tendo em vista a consecução de um trabalhador “novo” e “proativo”. Além
disso, tenta conscientizar os funcionários que o seu “sucesso” (ou fracasso) profissional
dependem unicamente dele. Cabe agora ao funcionário gestar o seu próprio mérito. À
empresa, cabe uma atribuição coadjuvante, como fomentadora dos funcionários,
disponibilizando fascículos do “Profissionalização” como material didático direcionado à
qualificação do empregado.
Ainda em 1996, é implementado um novo programa de qualidade por parte da Direção
do BB, chamado de “Programa de Qualidade”. De fato, o PQ trazia o pragmatismo como
marca. Não se observava mais o apelo à antiga parceria voluntária, negligenciando a
preocupação com a suposta “qualidade de vida” do trabalhador bancário. Na realidade, o
novo PQ centrava
predominantemente na otimização das tarefas executadas. Neste
sentido, são constituídas mais uma vez as EADs – equipes de autodesenvolvimento, com o
foco na disseminação dos preceitos do novo programa, baseado exclusivamente “na
melhoria dos processos de trabalho”.
Este programa, por intermédio da coação, praticamente obrigava a participação dos
funcionários em cursos, palestras e seminários. De fato, o funcionário que por ventura
faltasse a algum evento dessa natureza era severamente advertido. Assim, mesmo em
eventos promovidos nos finais de semana, o funcionário era obrigado a justificar sua
ausência por escrito. Na realidade, o PQ não contou com a adesão voluntária da grande
maioria dos bancários, as próprias EAD’s (equipe de autodesenvolvimento), em sua maioria,
eram compostas, agora, por membros da alta e média gerência, dispostos, tão somente a
reproduzirem o discurso oficial da empresa. O PQ buscava abarcar a subjetividade do
trabalhador de uma forma claramente forçada. O discurso sindical foi amplamente
combatido, a empresa questionou, inclusive, a legitimidade do representante sindical por
local de trabalho (os delegados sindicais). Observava-se, então, que O BB abandona o
preceito do voluntarismo quanto à participação em programas desta natureza.
A rigor,
parece que os avanços da abertura democrática, ocorridos a partir de 1984, não tiveram
reflexos significativos dentro da instituição, em que persistem, de forma dominante, os
atributos oriundos do militarismo em consórcio com as práticas do taylorismo-fordismo
periférico.
Em 1997, o clima de medo era constante nas unidades do Banco. Ficou marcado este
período pela implementação do novo Plano de Cargos e Salários da empresa. Desta feita,
congelou-se definitivamente os salários básicos, havendo a instituição do pagamento por
“Remuneração Variável”, baseada na incorporação de prêmios por desempenho pessoal e
desempenho por agência. Aliado a isto, houve um reajuste significativo dos salários dos
maiores cargos comissionados (gerenciais). Na verdade, houve, neste sentido, o claro
incentivo à competição intrafirma, tanto individual como por agência, patrocinado pelo
programa de reestruturação levado a cabo pela empresa. Os prêmios dados por
participação nos lucros, seguiam o critério “de quem ganha mais recebe mais”. De certa
maneira, era uma tentativa de se moldar à política salarial do BB aos bancos da rede
privada, quiçá visando, para o futuro, uma provável privatização da empresa. A rigor, das
agências eram cobradas permanentes metas, que iam desde conquistas de clientes até
vendas de produtos.
Já em 1998, o quadro perdura-se, porém, com um agravante. O “sucesso” das políticas
de demissão em massa, levadas a cabo pelas direções nos períodos anteriores, surtem
efeito neste período: muitas agências apresentam deficiências em seus quadros. Mesmo
com todo empenho dos funcionários, o atendimento à clientela ficou prejudicado em muitos
lugares. Segui-se, então, um deslocamento de pessoal para cobrir às agências
prejudicadas. Tal fato ficou tão evidente que o BB se viu obrigado a realizar diversos
concursos regionalizados.
No entanto, há de se ressaltar, que a política de incorporação de novos quadros, não
representa, de fato, uma desvantagem competitiva para a empresa. Ao contrário, do ponto
de vista do capital, tal política representa uma redução de custos, posto que a maioria dos
funcionários demitidos nos anos anteriores era composta por bancários com mais de vinte
anos de carreira. Assim, tais reposições, representam um enxugamento da folha salarial.
Vale ressaltar, que o funcionário mais antigo já havia incorporado diversas vantagens
salariais diretas e indiretas não repassadas para os novos funcionários.
Nos anos seguintes (1999 e 2000), serão mantidas às políticas referidas acima:
concorrência intrafirma, remuneração variável, lucratividade das agências e manutenção do
“Profissionalização”. No ano de 1999, porém, o BB não reconhece mais a estabilidade do
representante sindical por local de trabalho (delegados sindicais), constatando a intenção de
enfraquecer o movimento sindical. Vale ressaltar, que de 1994 a 2002 os funcionários do BB
e dos demais bancos oficiais não tiveram, praticamente, reajustes salariais.
A partir de meados da década de noventa do século passado, os gerentes e
comissionados do BB eram coagidos pelas Superintendências Estaduais a se fazerem
presentes nas assembléias sindicais para votarem contra quaisquer propostas de
paralisação, mesmo que estas fossem parciais.
Assim, dificultava-se à ação sindical
enquanto meio reivindicatório para recomposição dos salários defasados. A rigor, impõem-se
mais uma tarefa indigesta aos gestores do Banco, a saber, lutar contra a atividade sindical e
incentivar as soluções, de eventuais insatisfações, no âmbito das próprias unidades do BB.
Tal postura é também “importada” do típico modelo sindical japonês/americano, em que as
demandas trabalhistas são resolvidas, em geral, por sindicatos-empresa.
Em 2001, o BB reinsere a política de demissão involuntária. Agora, o sistema de
avaliação do banco é utilizado para efetivar tais demissões sem justa causa. Assim, de
forma curiosa, a grande maioria dos demitidos são funcionários com mais de quinze anos de
Banco, sendo as unidades desfalcadas recompostas por novos funcionários, que compõem,
de fato, um verdadeiro exército de reserva para este fim. A rigor, caberia aos comissionados,
de forma monástica, a confecção das avaliações dos seus subordinados, facultando-lhes a
concordância ou discordância. Neste sentido, há um incentivo para que tais avaliações
espelhem a “realidade” funcional do avaliando, representando um incentivo para que não se
tenha receio quanto à aplicação de conceitos considerados baixos. O que ficou patente foi o
poder gerencial no âmbito do Banco, agora, revigorado com as faculdades de vigiar e punir
com demissões.
No ano de 2002, foi criado o sistema TAO (Talentos), permitindo que o próprio
funcionário, por intermédio de sua chave pessoal no correio eletrônico do Banco, pudesse
impostar informações adicionais sobre sua qualificação e habilidades. Os dados obtidos por
esse meio, eram considerados relevantes quando da seleção de candidatos aos cargos
comissionados. Na realidade, gesta-se um mecanismo capaz facultar uma espécie de
autodistinção.
3. CONCLUSÃO
O avanço tecnológico submetido aos imperativos da dominação “abstrata, impessoal e
quase objetiva” do capital, impõe no setor bancário, analogamente ao que ocorre na esfera
produtiva, uma crescente substituição do trabalho vivo pelo trabalho morto, bem como uma
simplificação do tradicional saber-fazer permitindo o avanço da rentabilidade do capital
rentista pela intensificação do trabalho e pela terceirização. Assim, há uma impossibilidade
do Banco do Brasil em negar esta tendência de redundância do trabalho vivo no âmbito do
universo bancário, uma vez que “optou” pela subordinação à acumulação rentista e ao
imperativo do mercado.
Nesse cenário, o movimento sindical bancário parece não mais encontrar respostas à
altura às ofensivas do capital rentista. A crescente redução do número de bancários no
Brasil enfraquece a representatividade dos sindicatos de bancários, redundando num menor
poder de reação às determinações do capital. No entanto, percebe-se que a opção pela
estratégia de conciliação com o patronato, em negociações “mesocorporativas”, conferiu um
enfraquecimento à capacidade combativa do movimento sindical bancário na atualidade,
diminuindo as possibilidades de reações coletivas dos bancários. Inegavelmente, a classe
bancária hodierna encarna uma tendência crescente à submissão subjetiva à reprodução do
capital rentista, sem que os sindicatos esbocem uma contra-ofensiva eficaz às estratégias
de subsunção à dominação abstrata do capital. A rigor, parece mesmo que a discussão
acerca das possibilidades emancipatórias do ser humano ante ao metabolismo capital, já
não fazem parte das agendas dos movimentos sindicais modernos, em muitos casos, sendo
eles próprios subsumidos pela lógica impessoal do capital.
Então, qual a saída possível?
Na atualidade, as formas convencionais de
enfrentamento/resistência às forças hegemônicas capitalistas dão mostras evidentes de
suas insuficiências para conter a nova ofensiva do capital em crise. Deve-se, portanto, para
a consecução de uma via emancipatória, avançar na ampliação compreensiva acerca do
sistema metabólico do capital. Tal compreensão passa, imperiosamente, pelos conteúdos
teóricos marxistas que permitam conferir suporte à crítica da reprodução do valor. Por outro
lado, o constante adiamento dessa crítica organizada e centrada na produção do capital
impele vigorosamente à sociedade mundial para uma perspectiva caótica da barbárie
moderna.
Diante
da
incontrolabilidade
do
sistema
do
capital,
as
soluções
que
são
recorrentemente esboçadas, sobretudo, em momentos de crise, apenas revelam um esforço
final de glorificação do capitalismo e de suas personificações. Explicitamente, o que
assistimos nos dias atuais não são simples ajustes às falhas do mercado ou contratempos
que podem ser resolvidos definitivamente. Estamos diante da crise estrutural do sistema que
tomou impulso nos últimos trinta anos, mas que tenta agir de uma maneira taciturna. Ainda
há um sério agravante: além de sua abrangência global, a reprodução do capital agride
profundamente nossa relação com a natureza, pondo em questão as condições
fundamentais da sobrevivência humana.
Assim, percebemos que o sistema do capital encontra seus limites históricos. As fraudes
e corrupções que se generalizam e o desemprego massivo que aterroriza a humanidade
exigem, não apenas controles sobre bancos e instituições financeiras, como muitos
apregoam, mas sobre o próprio modo de produção capitalista.
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KURZ, Robert. Dominação sem sujeito: sobre a superação de uma crítica social redutora. In
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MARX, Karl. Elementos Fundamentales para la Crítica de la Economía Política (Grundrisse)
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O Rendimento e suas Fontes. In
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MÉSZÁROS, István. Para além do capital – Rumo a uma teoria da transição. Tradução de
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OLIVEIRA, Aécio Alves de. Para uma socioeconomia política da transição: possibilidades e
limites da economia solidária. Fortaleza: Tese de Doutorado defendida junto ao Programa de
Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Federal do Ceará, 2006.
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