UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
FACULDADE DE DIREITO
DEPARTAMENTO DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL
DISCRICIONARIEDADE ADMINISTRATIVA
EM MATÉRIA DE POLÍTICAS PÚBLICAS
Curso de Pós Graduação
Controle Jurisdicional de Políticas Públicas
Profa. Titular Ada Pellegrini Grinover
Prof. Titular Kazuo Watanabe
Profa. Dra. Suzana Henrique da Costa
JULIANA MAIA DANIEL
Nº USP 3736441
“As Constituições feitas para não serem
cumpridas, as leis existentes para serem
violadas, tudo em proveito de indivíduos e
oligarquias, são fenômeno corrente em
toda a história da América do Sul”.
(Sérgio Buarque de Holanda)1
1HOLANDA, Sérgio Buarque de. Raízes do Brasil. 2a. ed.. Rio de Janeiro: José Olympio, 1948, p. 273.
SUMÁRIO: I – Introdução; II – Discricionariedade Administrativa (do Estado
Liberal ao Estado Social); II.1 -Considerações Preliminares: a clássica
distinção entre atos vinculados e atos discricionários da Administração
Pública; II.2 - Da atribuição legislativa de liberdade de decisão à
Administração Pública; III – Discricionariedade Administrativa (conceito,
fundamentos e limites); III.1 – Subsunção da atividade administrativa à lei;
III.2 - Da atribuição legislativa de liberdade de decisão à Administração
Pública; III.3 - Discricionariedade vs. Arbitrariedade (o conceito à luz da
Constituição Dirigente); III.4 - Da possibilidade de controle pelo Poder
Judiciário; IV – Discricionariedade administrativa na formulação de políticas
públicas; IV.1 – Do conceito de políticas públicas; IV.2 – Discricionariedade
na peça orçamentária; V – Conclusão; VI - Bibliografia
I - INTRODUÇÃO
Não é de hoje que se discute o tema da discricionariedade administrativa e sua
possibilidade de controle pelo Poder Judiciário. Parafraseando o professor Celso Antônio
Bandeira de Mello, já se verteram rios de tinta sobre esse tema.2 Apesar dos esforços dos
estudiosos e toda a produção acadêmica a respeito, até hoje a doutrina não alcançou –
tampouco os Tribunais o fizeram – um entendimento uníssono. Ao contrário, observa-se
uma “evolução cíclica”,3 um interminável debate sobre a discricionariedade administrativa,
cuja abordagem varia desde a clássica distinção entre atos discricionários e atos vinculados
da Administração Pública, até a teoria alemã dos conceitos jurídicos indeterminados e os
limites da intervenção judicial.
A situação agrava-se à medida que a discricionariedade do agente público na tomada
de decisões é analisada à luz dos direitos sociais e sua implementação através de políticas
públicas, sobretudo nos países em desenvolvimento, cuja insuficiência estrutural atinge
principalmente os direitos fundamentais dos cidadãos, deixando evidente a carência de
instrumentos para a efetividade dos direitos previstos na Constituição Federal.
Nesse contexto de efetivação dos direitos da Carta Política – historicamente marcado
pela “abertura normativa”, em que raras são as situações de regulação da conduta da
administração por meio de uma estrita vinculação –, a clássica distinção entre “atos
discricionários” e “atos vinculados” da Administração Pública já não basta para identificar
as hipóteses de arbitrariedade que autorizariam a intervenção judicial. Sem dúvida, o
modelo clássico de discricionariedade administrativa que atribui uma margem bastante
significativa de liberdade ao administrador, torna-se arma contra a cidadania, na medida em
que serve a interesses diversos do interesse público propriamente dito, isto é, as demandas
sociais do Estado Democrático de Direito.4
2MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Discricionariedade administrativa e controle jurisdicional. 2ª ed. 3ª tiragem.
São Paulo: Malheiros, 1998, p. 09.
3KRELL, Andreas. Discricionariedade administrativa, conceitos jurídicos indeterminados e controle judicial. Revista
Esmafe: Escola da Magistratura Federal da 5ª Região, n. 8, dez. 2004, pp. 178.
4 DAL BOSCO, Maria Goretti; VALLE, Paulo Roberto Dalla. Novo conceito da discricionariedade em políticas
públicas
sob
um
olhar
garantista,
para
assegurar
direitos
fundamentais.
Obtido
em
http://www.conpedi.org/manaus/arquivos/anais/manaus/direito_humano_adm_pub_maria_dal_bosco_e_paulo_valle.pdf
(artigo integrante da tese de doutorado da autora, intitulado “Políticas Públicas e improbidade: uma aproximação
garantista”). Acesso em 09 de junho de 2010.
Indo além, o problema reside não só no exercício inadequado do “poder
discricionário” justificado através do mito do juízo de “oportunidade e conveniência” da
Administração, supostamente impassível de controle pelo Poder Judiciário, mas sobretudo
nas omissões arbitrárias incorridas pelo agente público que tal abertura normativa permitiria.
Realmente, sob qualquer ângulo que se analise o tema da discricionariedade
administrativa, a discussão se move sempre entre dois pólos principiológicos: de um lado, o
acesso irrestrito aos Tribunais, responsáveis pelo controle da correta aplicação do Direito;
de outro, a indispensável autonomia da Administração Pública para exercer a função5 de
escolher, dentro dos parâmetros legais, a melhor opção a ser seguida pelo Poder Público
diante de uma situação concreta.6
Sem embargo sobre tudo o que já foi escrito sobre o tema, ainda resta espaço para
aparar algumas arestas sobre os limites da atuação discricionária da Administração Pública e
a consequente possibilidade de controle pelo Poder Judiciário, sobretudo no que se refere à
tutela jurisdicional das políticas públicas. Tudo, pois, voltado aos deveres do EstadoAdministração, isto é, no exercício legítimo e parcimonioso da discricionariedade, sempre
com o intuito de defender, a sério, o caráter vinculante do direito fundamental à boa
administração pública e combater as arbitrariedades por ação e omissão.7
Obviamente que o presente trabalho não tem o escopo de esgotar o assunto,
tampouco de uniformizar o entendimento pacificando a discussão. Pretende-se, pois lançar
um rápido olhar sobre o instituto, na tentativa de incitar novo debate à luz das demandas
atuais da sociedade brasileira.
5O Prof. Celso Antônio Bandeira de Mello ressalta o caráter funcional da atividade administrativa - “por isso se diz
função administrativa” - do qual decorre que o chamado “poder discricionário” nada mais é que o cumprimento de um
dever de alcançar a finalidade legal (MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Discricionariedade administrativa e controle
jurisdicional. 2ª ed. 3ª tiragem. São Paulo: Malheiros, 1998, p. 15).
6SUNDFELD, Carlos Ari; CÂMARA, Jacintho Arruda. Controle judicial dos atos administrativos:as questões técnicas
e os limites da tutela de urgência, 2002, p. 24.
7FREITAS, Juarez de. O controle dos atos administrativos e os princípios fundamentais. 4ª ed, São Paulo: Malheiros,
2009, p. 362. Nas palavras do autor, “o controle sistemático dos atos administrativos (vinculados e discricionários)
encontra-se vinculado cogentemente ao direito fundamental à boa administração pública, autêntico feixe de princípios
e regras que se entende como direito à administração eficiente e eficaz, proporcional cumpridora de seus deveres, com
transparência, motivação, imparcialidade e respeito à moralidade, à participação social e à plena responsabilidade
por suas condutas omissivas e comissivas” (p. 362).
II – Discricionariedade Administrativa
Do Estado Liberal ao Estado Social
II.1. Considerações Preliminares: a clássica distinção entre atos vinculados e atos
discricionários da Administração Pública
Primeiramente, é importante ressaltar que atos da Administração8 e seu controle têm
relação íntima com o desenvolvimento do Estado de Direito e do constitucionalismo de cada
país, guardando, cada qual, características próprias de acordo com suas condições históricas,
políticas, socioeconômicas e culturais. Este, aliás, é o primeiro equívoco de boa parte da
doutrina que se dedicou ao estudo do tema até hoje, muitas vezes importando ideias e
conceitos inaplicáveis ao constitucionalismo brasileiro.
Daí a razão para a inadequação atual da rígida distinção entre “atos vinculados” e
“atos discricionários” 9 da administração. De acordo com esse modelo, haveria atuação
vinculada quando a norma a ser cumprida já predetermina de modo completo e objetivo
qual o único comportamento possível que deve ser tomado pelo administrador em uma dada
situação concreta (cuja hipótese também vem descrita em lei). Em outras palavras, no ato
administrativo vinculado a atuação do agente público seria regulada por alta densidade
normativa retirando-lhe qualquer liberdade, isto é, restaria jungido a cumprir os comandos
legais. Exemplo clássico de atos vinculados da Administração seriam as concessões de
benefício previdenciário em que, verificados os pressupostos legais – e.g., quando o
servidor completa 70 anos -, deveriam necessariamente ser conferidas pelo administrador.
Opostamente, haveria atuação discricionária quando a lei não teria previsto exatamente
todos os elementos para a atuação do administrador, reservando-lhe uma margem de
liberdade de apreciação subjetiva em uma dada situação concreta, segundo critérios de
conveniência e oportunidade.10
Embora não seja totalmente equivocada, trata-se de visão incompleta: se de um lado
não se nega a existência de atividades administrativas fortemente vinculadas e outras com
boa dose de discricionariedade, por outro seria utópico acreditar na vinculação ou
discricionariedade absoluta do agente público no direito brasileiro.8 Como toda criação de
Direito, a atuação administrativa situar-se-á entre os pólos da inteira liberdade e rigorosa
vinculação, sem que as extremas possibilidades jamais se realizem. 11 Afinal, da mesma
8São requisitos de validade do ato administrativo: (i) a competência; (ii) a finalidade pública; (iii) a observância da
forma prescrita em lei (guardadas as devidas ressalvas em relação aos formalismos exacerbados); (iv) a motivação,
indicando os fatos e fundamentos jurídicos do ato; e (v) o objeto determinável, possível e dotado de juridicidade.
9De se destacar que não é o “ato”, em si, que é vinculado ou discricionário, mas sim a competência do agente. O ato
será apenas o “produto” dela (MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Discricionariedade administrativa e controle
jurisdicional. 2ª ed. 3ª tiragem. São Paulo: Malheiros, 1998). Também nesse sentido Renato Alessi, para quem a
discricionariedade não é um poder particular da Administração, mas no modo de exercício do poder geral de atuação
conferido a esta (Principi di Diritto Amministrativo, Vol. I, Milano: Giuffrè, 1965, p. 206.
10MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. São Paulo: Malheiros, 1989, p. 143 e seguintes. V.
também MEDAUAR, Odete. Direito Administrativo Moderno. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 125 e
seguintes.
11WOLFF, Hans Julius; BACHOF, Otto. Verwaltungsrecht, Vol. I. Munique: C. H. Beck'ache Verlag, 1974, p. 186.
Apud FREITAS, Juarez de. O controle dos atos administrativos e os princípios fundamentais. 4ª ed, São Paulo:
Malheiros, 2009, p. 365.
forma que a vinculação não sucumbe a um “guia ou prontuário repleto e não-lacunoso para
solução dos casos”12, a discrição completamente desvinculada resulta em arbitrariedade, o
que jamais encontra respaldo na Carta Constitucional. Em outras palavras, a vinculação da
Administração aos termos da lei apresenta uma variação meramente gradual, inexistindo
diferenças na natureza do ato administrativo e discricionário. O que há, em verdade, é uma
diferença “quantitativa e não qualitativa”13 no grau de liberdade de decisão concedida pelo
legislador.
Nessa esteira, torna-se indispensável uma breve digressão sobre a origem e evolução
do “poder discricionário” da Administração Pública e seu respectivo controle, tornando mais
fácil o estudo do tema e sua adequada conceituação e limites à luz do ordenamento pátrio.
III.2 Da atribuição legislativa de liberdade de decisão à Administração Pública
A discricionariedade – do verbo latino discernere, que significa separar, distinguir ou
avaliar – tem origem na impossibilidade de disciplinar, por lei, todos os aspectos da vida
social em que a Administração atua, sendo indispensável atribuir ao agente público certa
margem de flexibilidade para regular a vida social e atingir o interesse público.
Considerada no início como genuína expressão da soberania do monarca, a
discricionariedade assume novos contornos a partir da Revolução Francesa, da teoria da
Separação dos Poderes de Montesquieu14 e do advento do Estado Liberal. Passou-se, então,
a impor limites às atividades dos órgãos estatais, em defesa dos direitos individuais dos
cidadãos.
Nesse processo, o grande desafio do Estado de Direito era conciliar a indispensável
liberdade decisória do Executivo com a observância da legalidade, na tentativa de apagar
qualquer resquício de arbitrariedade monárquica.15 Não raras vezes a discricionariedade era
associada à arbitrariedade, sendo necessário amplo debate até a conclusão de
impossibilidade do Parlamento de atender às dinâmicas exigências do mundo moderno.
Reconheceu-se, pois, a necessidade do Poder Legislativo, através de maior “abertura
normativa”, conceder ao administrador certa margem de flexibilidade para o alcance de
determinado fim, sobretudo nas situações em que as circunstâncias da realidade dificilmente
são previsíveis. Nessa órbita de livre decisão prevaleceria a avaliação e vontade do
administrador, que seria pouco ou nada sindicável pelo Poder Judiciário. Tal controle, ainda
12Vale ressaltar ainda que a vinculação não se dá inteira e exclusivamente em relação ao princípio da legalidade, mas
sim de forma mais abrangente, harmonizado com o plexo de princípios constitucionais fundamentais. Assim, por
exemplo, constatados os requisitos de aposentadoria, o Estado-Administração tem o dever de efetuá-las em tempo útil,
sob pena de responsabilização civil (nesse sentido, v. REsp 1.044.158-MS, de relatoria do Min. Castro Meira). É
exatamente por essa razão que mesmo os atos administrativos vinculados devem ser motivados (FREITAS, Juarez de. O
controle dos atos administrativos e os princípios fundamentais. 4ª ed, São Paulo: Malheiros, 2009, p. 365).
13KRELL, Andreas. Discricionariedade administrativa, conceitos jurídicos indeterminados e controle judicial. Revista
Esmafe: Escola da Magistratura Federal da 5ª Região, n. 8, dez. 2004, p. 185.
14“Tout seroit perdu si le même homme ou le même corps des principaux, ou des nobles, ou du peuple, exerçoient ces
trois pouvoirs: celui de faire des lois, celui d'executer les résolutions publiques, et celui de juger les crimes ou les
différends des particuliers” (MONTESQUIEU. De L'esprit des lois. Paris: Garnier Frères, Libraires Éditeurs, 1869, p.
143).
15KRELL, Andreas. Discricionariedade administrativa, conceitos jurídicos indeterminados e controle judicial. Revista
Esmafe: Escola da Magistratura Federal da 5ª Região, n. 8, dez. 2004, p. 179
quando existente, visava resgatar as liberdades e garantias individuais ameaçadas pelo
Estado, em cumprimento ao seu propósito de government by law.
A partir da evolução do Estado Liberal para o Estado Social,16 com o reconhecimento
não apenas das liberdades e garantias individuais (liberdade de, na terminologia de Norberto
Bobbio), 17 mas também dos direitos sociais, que exigem uma atuação estatal para sua
realização (a liberdade para), 18 o “poder discricionário” do administrador assume nova
roupagem. Admite-se, ainda, a margem de liberdade do administrador, indispensável para
atingir o interesse público, mas o arbítrio estatal passa a ser evitado através da reserva de lei
e do princípio democrático. Nessa esteira, a busca de melhorias sociais e econômicas dá-se
sem sacrifício das garantias jurídico-formais do Estado de Direito. E governar passou a ser
não mais a gerência de fatos conjunturais, mas sobretudo o planejamento do futuro, com o
estabelecimento de políticas a médio e longo prazo. Para executá-las, contudo, exige-se
maior racionalização técnica, o que acaba por revelar-se incompatível com as instituições
clássicas do Estado Liberal. E é assim que, “com o Estado Social, o 'government by policies'
substitui o 'government by law'”.19
Nessa missão, o Estado trabalha com normas de programação finalista, que servem
de base jurídica na implementação de políticas públicas pelas organizações burocráticas
governamentais. Esses standards legais têm por função impor metas, resultados e fins para o
próprio Estado, muitas vezes sem especificar os meios pelos quais devem ser alcançados,
concedendo ao Poder Executivo - que detém as informações estratégicas e o know-how da
organização dessas políticas20 - uma maior liberdade de decisão na implementação dessas
normas. Como bem lembra Andreas Krell, muitos desses textos legais deixam de trazer
consigo as hipóteses de ação, prescrevendo apenas a perseguição de determinados fins.21 À
medida que os Parlamentos criam textos legais com pouca densidade regulativa, concede-se
amplos espaços de decisão ao administrador para escolher os meios adequados para a
solução dos casos concretos, cujos limites são pautados pelo princípio da “reserva de lei”.
16 Sem dúvida, a função do Estado de Direito Moderno não é apenas negativa ou defensiva, mas positiva: deve
assegurar, positivamente, o desenvolvimento da personalidade, intervindo na vida social, econômica e cultural. O
Estado de Direito atual não se concebe mais como anti-estatal (BERCOVICI, Gilberto. A problemática da constituição
dirigente: algumas considerações sobre o caso brasileiro. In “Revista de Informação Legislativa”, Brasília, a. 36, n.
142, abr-jun. 1999, p. 37.
17BOBBIO, Norberto. Teoria Geral da Política (org. Michelangelo Bovero; trad. Daniela Beccaccia Versiani). Rio de
Janeiro: Campus, 2000.
18“A 'liberdade para' atribui ao indivíduo não apenas a faculdade, mas também o poder para fazer. Se houvesse
apenas as liberdades negativas, todos seriam igualmente livres, mas nem todos teriam igual poder. Para equiparar os
indivíduos, quando os reconhecemos como pessoas sociais também no poder, é preciso que sejam reconhecidos outros
direitos, tais como os direitos sociais, os quais devem colocar cada indivíduo em condições de ter o poder para fazer
aquilo que é livre para fazer” (BOBBIO, Norberto. Teoria Geral da Política (org. Michelangelo Bovero; trad. Daniela
Beccaccia Versiani). Rio de Janeiro: Campus, 2000, p. 504).
19GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988 (initerpretação e crítica). 2ª ed., São Paulo: RT,
p. 1991, pp. 13-14.
20DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 17ª ed.. São Paulo: Atlas, 2004, p. 128.
21 O autor afirma que, no campo do planejamento administrativo, o tradicional “esquema se-então” normativo é
substituído quase que na totalidade pelo “esquema fim-meio”. Realmente, a estrutura normativa dos diplomas
reguladores de áreas como educação, saúde pública, fomento econômico, planejamento espacial, controle urbanístico e
proteção ambiental nem sempre são programadas na tradicional forma condicional (“se A acontecer, então seja B”),
característica do Direito Privado e do Direito Penal. (KRELL, Andreas. Discricionariedade administrativa, conceitos
jurídicos indeterminados e controle judicial. Revista Esmafe: Escola da Magistratura Federal da 5ª Região, n. 8, dez.
2004, p. 181-182).
Como se verá adiante, essa atribuição de maior discricionariedade à administração
pública – principalmente nos ordenamentos dos países em desenvolvimento – não raro serve
de palco para o comportamento arbitrário do agente, que transforma os critérios subjetivos
de oportunidade e conveniência em refúgio para uma atuação que pouco ou nada se amolda
aos fins legais que deveriam ser perseguidos pela Administração. Assim, a saúde, a
educação, a moradia e diversos outros direitos sociais estampados na Constituição de 1988
na forma de “normas programáticas”, continuam sufocados ou precariamente atendidos, em
nome da discrição na fixação de prioridades administrativas.22
Torna-se indispensável, portanto, trazer à baila um novo conceito de
discricionariedade, adequado aos fins previstos na Carta Política, sob pena de transformá-la
e mero papel destituído de vinculação – “lírica constitucional”, nas palavras de Robert
Alexy. 23 O capítulo seguinte se destinará a delimitar o conceito de discricionariedade para,
então, trazê-lo no plano da implementação de políticas públicas e verificar as situações que
autorizariam o controle desses atos pelo Poder Judiciário.
22FREITAS, Juarez de. O controle dos atos administrativos e os princípios fundamentais. 4ª ed, São Paulo: Malheiros,
2009, p. 374. Desde já vale destacar as palavras do autor sobre as normas programáticas da Constituição e o dever da
Administração Pública de observá-las: “não se infirma a fundamentalidade de um direito por sua difícil concretização.
Gradualmente, deve-se rumar para a efetividade, não se devendo desistir, em momento algum, da reiterada e insistente
proteção do direito fundamental”.
23 Expressão utilizada por Robert Alexy em Grundrechte im demokratischem Verfassungsstaat in Aulis Aarnio; Robert
Alexy; Gunnar Bergholtz (eds.), “Justice, Morality and Society: A tribute to Aleksander Peczenik, Lund: Juristförlaget,
1997, p. 29. Apud SILVA, Virgílio Afonso da. O Judiciário e as políticas públicas: entre transformação social e
obstáculo à realização dos direitos sociais. In Cláudio Pereira de Souza Neto & Daniel Sarmento, Direitos sociais:
fundamentação, judicialização e direitos sociais em espécies. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, pp. 587-599.
III – Discricionariedade Administrativa
Conceito, Fundamentos e Limites
III.1. Subsunção da atividade administrativa à lei
O surgimento do Estado Democrático de Direito trouxe consigo a confluência de
duas concepções políticas: a primeira, de origem “Roussoniana”, consiste na máxima de
que “todo poder emana do povo”. 24 A segunda, por sua vez, remonta à Montesquieu e
consiste na tripartição do exercício do poder. 25 Nesse sentido, as atividades estatais –
notadamente as administrativas – nada mais são que o cumprimento dessa vontade geral
fixada no texto constitucional e, claro, na lei.
A primeira conclusão que daí se extrai – e que não é nenhuma novidade – é que a
atividade administrativa é essencialmente uma atividade infralegal. A atuação administrativa
está, portanto, sempre adstrita à lei, independentemente do grau de vinculação. Como
exposto no capítulo anterior, inexiste a clássica antítese entre atos vinculados e atos
discricionários, sendo tanto um quanto outro atos de mesma natureza, distinguindo-se
apenas quantitativamente de acordo com o grau de liberdade de decisão concedida pelo
legislador à Administração.
Essa adstrição da Administração à lei garante-lhe situação diversa em relação aos
administrados: enquanto esses, em princípio, podem fazer tudo o que a lei não proíbe, a
Administração só pode fazer o que lhe é permitido.26
A diferenciação reside no fato de que o agente estatal atua sempre no interesse de
outrem, isto é, na coletividade (interesse público). Daí resulta, pois, o caráter funcional da
atividade administrativa. Em outras palavras, a lei traz sempre consigo uma finalidade, cujo
alcance deve ser perseguido pelo administrador, sendo essa a sua função. A partir dessa ideia
verifica-se que, ao contrário de boa parte da doutrina, que fala em “poder discricionário da
Administração”, o que há, antes, é um “dever discricionário”. Sem dúvida, a Administração
não tem a possibilidade de exercitar ou não um poder ao seu bel prazer – ela tem o dever de
fazê-lo. Diferentemente do Direito Privado, portanto, o eixo metodológico do Direito
Público não gira em torno da noção de poder, mas sim de dever, para cumprimento da
finalidade legal prevista pelo legislador.27
24Constituição Federal, art. 1º, § 1º: “Todo poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou
diretamente, nos termos desta Constituição”.
25Constituição Federal, art. 2º. “São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo
e o Judiciário”.
26MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Discricionariedade administrativa e controle jurisdicional. 2ª ed. 3ª tiragem.
São Paulo: Malheiros, 1998, p. 13.
27MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Op. cit., p. 14.
III.2 Discricionariedade como opção legislativa
Assim como a administração tem por função o cumprimento da lei, o legislador, ao
elaborá-la, busca regular a conduta do agente público diante das várias possíveis situações a
ocorrerem no mundo do “ser”. Nem sempre, contudo, é possível prever as várias situações
concretas, estabelecendo de antemão a situação de fato que ensejará uma dada conduta e o
respectivo comportamento que deve ser tomado pelo agente. Normalmente, o que ocorre –
principalmente no campo das políticas públicas – é a impossibilidade de regular todas as
hipóteses que autorizariam uma dada atuação do agente estatal para atingir a finalidade
prevista. Em outras situações, ainda, a própria finalidade da norma é expressada através de
conceitos indeterminados, restando uma relativa liberdade ao administrador, seja em relação
a praticar ou não o ato diante de uma situação, seja em relação ao momento adequado para
fazê-lo, seja, ainda, quanto à forma que revestirá o ato, ou, por fim, em relação à
providência que deve ser tomada, possibilitando-o decidir entre pelo menos duas
alternativas abertas e igualmente legítimas. Nessas situações haverá, pois, a
discricionariedade.
Em português claro: a discricionariedade atribuída ao administrador pode ter causa28
(i) na hipótese da norma, a partir da descrição de forma imprecisa da situação fática que visa
regular; (ii) no comando da norma, deixando ao administrador alternativas de conduta
quanto a realizar ou não um ato, quanto ao momento adequado para fazê-lo ou quanto à
medida mais satisfatória diante das circunstâncias; (iii) na finalidade da norma, quando esta
vem expressa por conceitos imprecisos, vagos, conceitos de valor.29
28MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Op. cit., p. 19.
29 A discricionariedade atribuída ao agente público pode decorrer da utilização de um conceito indeterminado,
sobretudo na finalidade da norma, quando expressada por meio de conceitos plurissignificativos (e.g., “segurança
jurídica”, “bem estar social”, etc.). De se ressaltar, contudo, que a discricionariedade não se confunde com a
interpretação. Em verdade, a interpretação antecede a discrição, e solucionará apenas a delimitação de um dado conceito
empírico contido na norma, adequando-o ao caso concreto. Tais conceitos – no pensamento de Ernst Forsthoff – têm de
ser determinados em sua significação concreta partindo do contexto em que se encontram e com efeitos normativos,
realizando-se, pois, a interpretação. Assim, o processo de interpretação é vinculado a critérios preexistentes, no qual a
vontade do agente é irrelevante (FORSTHOFF, Ernst. Tratado de Derecho Administrativo. Madrid: Instituto de Estudios
Políticos, 1958, pp. 123-130). O autor prossegue na distinção afirmando que a interpretação não é capaz de delinear os
conceitos de valor. Estes, quando presentes, mesmo após realizada a interpretação, surgirá, no momento da subsunção, a
vontade do agente (e, portanto, a discricionariedade), que se localizará exatamente entre a zona de certeza positiva e a
zona de certeza negativa de seu significado. No mesmo sentido, veja-se COSTA, Regina Helena. Conceitos Jurídicos
indeterminados e discricionariedade administrativa. In “Justitia”, São Paulo, 51 (145), jan-mar. 1989, p. 50; e
PEREIRA, André Gonçalves. Erro e ilegalidade no acto administrativo. Lisboa: Ática, 1962; e KRELL, Andreas.
Discricionariedade administrativa, conceitos jurídicos indeterminados e controle judicial. Revista Esmafe: Escola da
Magistratura Federal da 5ª Região, n. 8, dez. 2004. Ainda sobre a teoria dos conceitos jurídicos indeterminados, vale a
contraposição do quanto exposto acima com o pensamento de Garcia de Enterría, para quem tais conceitos não se
confundem com discricionariedade. Para este autor, a indeterminação do enunciado do conceito não corresponde a uma
indeterminação de sua aplicação. Ao contrário, afirma que os conceitos indeterminados só permitiriam uma única
solução justa em cada caso: ou há boa-fé, ou não há; ou o preço é justo, ou não é. Por outro lado, o exercício do poder
discricionário permitiria uma pluridade de soluções justas, isto é, uma opção entre soluções igualmente válidas para o
Direito (ENTERRÍA, Garcia de; FERNANDEZ, Tomás. Curso de Derecho Administrativo. Tomo I, 2ª. ed., Madrid:
Civitas, 1977). O Prof. Eros Roberto Grau também é adepto da ideia de que os conceitos jurídicos indeterminados em
nada se relacionam com a discricionariedade. Para ele, a discricionariedade seria liberdade de escolha baseada em juízo
de oportunidade, e só poderia resultar de expressa atribuição legal à autoridade administrativa, e não da circunstância
dos termos da lei serem ambíguos, equívocos ou suscetíveis de receber qualificações diversas. Todavia, o Professor
critica a conclusão de García de Enterría, de sorte que a interpretação dos conceitos jurídicos indeterminados não
ensejariam uma única solução justa. Na concepção do Prof. Eros, interpretação não é ciência, mas prudência (GRAU,
De todo modo, é preciso ter em mente que a lei pressupõe sempre um mandamento
ótimo (“a lei não contém disposições inúteis”) de forma que, ao regular a conduta do agente
estatal, atribui-lhe o dever de adotar a melhor solução para uma dada situação concreta,
visando atingir o objetivo nela contido. Assim, quando a norma jurídica vinculadamente
estabelece um único comportamento perante situação definida em termos objetivos,
ninguém duvida que sua pretensão seja um comportamento ótimo, e que foi considerado
possível pré-definir a conduta qualificada como ideal para atender ao interesse que se
propôs tutelar. Consequentemente, não é razoável supor que, quando a lei regula uma dada
situação em termos dos quais resulta discricionariedade, ela teria aberto mão desse
propósito. Sem dúvida, a lei o fez não só diante da impossibilidade de regular uma dada
situação de forma mais objetiva, vinculada; mas sim porque a sua finalidade só poderia ser
atingida a partir da atribuição dessa margem de liberdade ao agente estatal para que este,
analisando a situação concreta, pudesse adotar o comportamento plenamente adequado.
Em outras palavras, quando a lei regula discricionariamente uma dada situação, ela o
faz deste modo exatamente porque não aceita do administrador outra conduta que não seja
aquela capaz de satisfazer excelentemente a finalidade legal. Trata-se, pois, de uma opção
legislativa 30 diante da impossibilidade de se conhecer todas as situações de fato que
permitam antever um único comportamento ótimo e adequado para todas elas (daí porque,
por exemplo, o legislador faz uso dos conceitos indeterminados). A liberdade administrativa
atribuída pela norma discricionária nada mais é que o “cumprimento de um dever jurídico
funcional de acertar, na situação concreta, a providência ideal para atingir a finalidade
legal e satisfazer o interesse da coletividade”31.
De se ressaltar que a discricionariedade – que é competência atribuída ao agente,
sendo o ato o resultado de sua aplicação – pressupõe uma situação concreta, não sendo
possível falar em discricionariedade em abstrato. Em outras palavras, la liberté de choix et
la liberté d'abstention32 da Administração somente ocorrerá quando houver necessidade de
escolha, tomada de decisão.33 Cabe ao agente administrativo, diante de dada situação fática,
Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988 (initerpretação e crítica). 2ª ed., São Paulo: RT, p. 1991, pp.
13-14).
30Nesse sentido, vale mencionar novamente a clara lição do Prof. Celso Antônio Bandeira de Mello: “Se a lei regula
vinculadamente a conduta administrativa, está com isto declarando saber qual o comportamento único que, a seu juízo,
atenderá com exatidão, nos casos concretos, ao interesse público por ela almejado. Daí que pré-selecionou o ato a ser
praticado e o fez obrigatório, excluindo qualquer interferência do administrador na apreciação dos fatos deflagradores
da aplicação da norma e qualquer avaliação quanto à providência mais adequada para atender à finalidade legal.
Uma vez que, no comum dos casos de discricionariedade, teria sido perfeitamente possível redigir a lei em termos
vinculados, tem-se que concluir que a única razão lógica capaz de justificar a outorga de discrição reside em que não
se considerou possível fixar, de antemão, qual seria o comportamento administrativo pretendido como imprescindível e
reputado capaz de assegurar, em todos os casos, a única solução prestante para atender com perfeição ao interesse
público que inspirou a norma. Daí a outorga da discricionariedade para que o administrador – que é quem se defronta
com os casos concretos – pudesse, ante a fisionomia própria de cada qual, atinar com a providência apta a satisfazer
rigorosamente o intuito legal”. Com efeito, não se pode supor que a lei preveria ora soluções ótimas, ora soluções ruins
para as situações concretas. Assim, diante da impossibilidade de prever um único comportamento ótimo para uma dada
situação (ou mesmo de antever todas as situações que gerariam um dado comportamento do agente público), optou pela
atribuição de discricionariedade. (Op. Cit., p. 33).
31 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Op. Cit., p. 33. O núcleo da discricionariedade está, realmente, na
possibilidade de apreciação da melhor solução para o atendimento do interesse público, o que demonstra, por si, estar
afastada a hipótese de vinculação do comportamento da Administração (ENTERRÍA, Garcia de; FERNANDEZ, Tomás.
Curso de Derecho Administrativo. Tomo I, 2ª. ed., Madrid: Civitas, 1977, p. 273).
32BÉNOIT, Francis-Paul. Le Droit Administratif Français. Paris: Dalloz, 1968, p. 482.
33“De igual manera que la luz cobra solo color quando entre em contato com la materia, así, también, hablando
metaforicamente, sucede com los valores, que sólo cobran color em relación com un material empírico” (FORSTHOFF,
utilizando-se de um juízo de valor, examinar as condutas que lhe são possíveis e
juridicamente permitidas praticar e escolher dentre elas a mais adequada, a que melhor
traduz a conveniência e a oportunidade para o interesse público.
Feitas tais considerações, é oportuna nova menção ao Prof. Celso Antônio Bandeira
de Mello, cuja definição sintetiza de forma magistral todas as considerações feitas até então:
“Discricionariedade, portanto, é a margem de liberdade que remanesça ao administrador
para eleger, segundo critérios consistentes de razoabilidade, um, dentre pelo menos dois
comportamentos cabíveis, perante cada caso concreto a fim de adotar a solução mais
adequada à satisfação da finalidade legal, quando, por força da fluidez das expressões da
lei ou da liberdade conferida no mandamento, dela não se possa extrair objetivamente,
uma solução unívoca para a situação vertente".34
III.3 Discricionariedade vs. Arbitrariedade – o conceito à luz da Constituição
Dirigente
Do quanto exposto no tópico anterior, percebe-se que a discricionariedade observa
limites claros que remontam, para a doutrina clássica, à finalidade legal. Realmente, se por
um lado a absoluta vinculação – ainda que possível – nem sempre resulta em boa
administração, a atribuição de discricionariedade ao administrador não lhe garante um
salvo-conduto.35 Exatamente porque seu propósito não é outro senão permitir o alcance da
finalidade legal, não se pode tomar a discricionariedade como um pretexto para decisões
ineficientes, sejam as que não atendam o interesse público implícito na finalidade legal,
sejam as que o atendam de maneira deficiente.36
Indo além, a atuação da administração pública encontra limites hoje não só na
finalidade legal, mas na Constituição e no primado harmônico dos direitos fundamentais.
buscando sempre a efetividade do direito à boa administração pública.37
Tal raciocínio tem origem na constituição dirigente – como é nossa Carta Política de
1988 – cujo escopo é estabelecer um fundamento constitucional para a política. Vale dizer, a
Constituição não substitui a política, mas torna-se a sua premissa material. O poder estatal
transforma-se, nessa medida, em um poder com fundamento na Constituição, e seus atos
devem ser considerados constitucionalmente determinados. Assim, mesmo na ausência de
Ernst. Tratado de Derecho Administrativo. Madrid: Instituto de Estudios Políticos, 1958, p. 126).
34MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Op. Cit., p. 48. Nas palavras do autor, “a relação existente entre um indivíduo e
a lei é meramente uma relação de não contradição, enquanto que a relação existente entre a Administração e a lei, é
não apenas uma relação de não contradição, mas é também uma relação de subsunção”.
35 BENJAMIN, Antonio Herman. Os princípios do Estudo de Impacto Ambiental como Limites da Discricionariedade
Administrativa. BDJUR, obtido em http://www.bdjur.stj.gov.br, acesso em 10 de junho de 2010.
36“La discrecionalità no ncostituisce una potestà particolare dell'amministrazione, sibbene semplicemente un modo di
essere della potestà di azione giuridica conferita dalla legge, nei modi che si non visti, all'amministrazione: modo di
essere, cioè, che si riferisce all'imprecisione dei limiti posti alla potestà di azione conferita in guisa, cioè, di consentire
una sfera di apprezzamento dell'opportunità dell'azione in relazione ao pubblico interesse” (ALESSI, Rrenato.
Introduzione ad un corso di Diritoo Amministrativo. Terza edizione, Milano, Giuffrè, 1960, p. 213).
37FREITAS, Juarez de. O controle dos atos administrativos e os princípios fundamentais. 4ª ed, São Paulo: Malheiros,
2009, p. 371.
densa regulação normativa de uma dada situação, a Constituição fornece ao administrador
uma direção permanente, uma exigência de sua atuação.38
Não se olvide que todas as normas constitucionais, inclusive as programáticas, são
dotadas de eficácia vinculante. 39 Para além de mera “lírica constitucional”, 40 tais normas
geram efeitos imediatos e objetivos desde o início de sua vigência, seja porque revogam
atos normativos anteriores que disponham em sentido colidente com o princípio que
consubstanciam; seja porque carreiam um juízo de inconstitucionalidade para os atos
normativos editados posteriormente que com elas sejam incompatíveis. 41 Uma vez
detentoras de eficácia jurídica, as normas programáticas têm, assim, possibilidade de ter
alcançados os seus objetivos, ou seja, possuem perspectiva de efetividade.42
Daí porque pouco importa se o ato administrativo é “vinculado” ou “discricionário”.
Todas as possibilidades, em maior ou menor escala, têm de guardar fundamentação na
intimidade do sistema, para evitar dois fenômenos simétricos igualmente nocivos: tanto a
vinculação dissociada da subordinação a outros princípios além da estrita legalidade, quanto
a discricionariedade tendente a dar as costas à vinculação ao sistema, minando, pela
arbitrariedade interditada, a própria racionalidade do ordenamento.43 É assim que os direitos
fundamentais previstos na Carta Constitucional consistem em verdadeiros parâmetros no
controle da discricionariedade. Nesse sentido, vale lembrar a lição de Robert Alexy, para
quem o texto das disposições de direitos fundamentais vincula a argumentação por meio da
38Assim, o programa constitucional não tolhe a liberdade do legislador nem a discricionariedade do governo, tampouco
impede a renovação da direção política e a confrontação partidária. Essa definição de linhas de direção política tornouse o cumprimento dos fins que uma república democrática constitucional fixou em si mesma. Cabe ao governo
selecionar e especificar sua atuação a partir dos fins constitucionais, indicando os meios ou instrumentos adequados
para sua realização (CANOTILHO, Joaquim José Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 3ª ed.,
Coimbra: Almedina, pp. 1.191 e 1.192). Citando Canotilho, v. também: BERCOVICI, Gilberto. problemática da
constituição dirigente: algumas considerações sobre o caso brasileiro. In “Revista de Informação Legislativa”, Brasília,
a. 36, n. 142, abr-jun. 1999, p. 39.
39O próprio art. 5º, § 1º da Constituição Federal estabelece que “as normas definidoras dos direitos e garantias
fundamentais têm aplicação imediata”. Nos dizeres de José Afonso da Silva: “Temos que partir, aqui, daquela premissa
já tantas vezes enunciada: não há norma alguma destituída de eficácia. Todas elas irradiam efeitos jurídicos
importando sempre uma inovação da ordem jurídica preexistente à entrada em vigor da Constituição a que aderem e a
nova ordenação instaurada. O que se pode admitir é que a eficácia de certas normas constitucionais não se manifesta
na plenitude dos efeitos jurídicos pretendidos pelo constituinte enquanto não se emitir uma normação jurídica
ordinária ou complementar executória, prevista ou requerida” (SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das normas
constitucionais. 3ª. ed., São Paulo: Malheiros, 1998, pp. 81-82).
40Expressão utilizada por Robert Alexy em Grundrechte im demokratischem Verfassungsstaat in Aulis Aarnio; Robert
Alexy; Gunnar Bergholtz (eds.), “Justice, Morality and Society: A tribute to Aleksander Peczenik, Lund: Juristförlaget,
1997, p. 29. Apud SILVA, Virgílio Afonso da. O Judiciário e as políticas públicas: entre transformação social e
obstáculo à realização dos direitos sociais. In Cláudio Pereira de Souza Neto & Daniel Sarmento, Direitos sociais:
fundamentação, judicialização e direitos sociais em espécies. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, pp. 587-599.
41BARROSO, Luis Roberto. O Direito Constitucional e a efetividade de suas normas: limites e possibilidades na
Constituição brasileira. 3ª. ed., Rio de Janeiro: Renovar, 1996, pp. 117-118.
42Não se pode confundir eficácia jurídica com eficácia social. Como visto acima, a partir do momento do início de sua
vigência, todas as normas têm eficácia jurídica imediata. Já a efetividade, ou eficácia social, refere-se à implementação
do programa finalístico que orientou a atividade legislativa. A norma só será efetiva quando seu objetivo for alcançado
por força de sua eficácia, ou seja, quando ocorrer a concretização do comando normativo no mundo real (SILVA, José
Afonso da. Aplicabilidade das normas constitucionais. 3ª. ed., São Paulo: Malheiros, 1998, pp. 65-66). Boa parte da
confusão pode ser atribuída à Constituição Federal que, como visto na nota 39 acima, atribui “aplicabilidade imediata as
normas definidoras de direitos fundamentais”. Como leciona o prof. José Afonso da Silva, muitas dessas normas,
embora de eficácia jurídica vinculante, têm eficácia social limitada. Isso não significa, contudo, que seu cumprimento
não deva ser sempre buscado pelo agente estatal.
43FREITAS, Juarez de. O controle dos atos administrativos e os princípios fundamentais. 4ª ed, São Paulo: Malheiros,
2009, p. 376.
criação de um ônus argumentativo a seu favor.44
Desse raciocínio extrai-se que se o agente estatal, no momento de decisão ante a
situação concreta, realizar uma escolha que não se coadune com os princípios estabelecidos
na Constituição, sua conduta não estará pautada pela discricionariedade, e sim pela
arbitrariedade – o que não pode ser tolerado. Esse, pois, o ponto crucial do presente trabalho:
sempre que a conduta da administração ultrapassar os limites da discricionariedade – limites
esses que vão além da finalidade legal, englobando os princípios fundamentais e o dever de
boa administração – o Poder Judiciário, uma vez provocado, está autorizado a intervir.45
Nessa ordem de considerações, os dois principais vícios no exercício da
discricionariedade administrativa revelam-se (i) na arbitrariedade por ação, situação em que
o agente público ultrapassa os limites impostos à competência discricionária, optando por
solução sem lastro em regra válida ou desviando-se da finalidade constitucional-legal; e (ii)
na arbitrariedade por omissão, hipótese em que o agente deixa de exercer a escolha
administrativa ou a exerce de forma insuficiente. Nessa segunda modalidade igualmente
patológica, o (não) comportamento do agente estatal traduz-se como descumprimento das
diligências impositivas.46 Tanto numa quanto noutra situação deverá ocorrer o controle pelo
Judiciário.
Desde já cumpre mencionar que essa possibilidade de controle não significa, a priori,
a judicialização invasiva ou a falta de deferência à esfera administrativa. O mérito
administrativo (assim entendido como os juízos de conveniência e oportunidade) pode até
permanecer “incontrolável”, não podendo ser substituído pelo entendimento judicial,47 mas
o demérito – tanto o excesso arbitrário quanto a omissão antijurídica – o será, sempre.48
44ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais (trad. Virgílio Afonso da Silva). São Paulo: Malheiros, 2008, p.
553.
45 A interferência ocorrerá basicamente de duas formas: caso se trate de conduta comissiva da Administração Pública
que contrarie a norma constitucional, seu ato será declarado inconstitucional e, portanto, nulo; se a conduta for omissiva,
isto é, caso a Administração deixe de agir quando deveria fazê-lo por força constitucional – arbitrariamente, portanto –
o Judiciário determinará a consecução daquele ato.
46FREITAS, Juarez de. O controle dos atos administrativos e os princípios fundamentais. 4ª ed, São Paulo: Malheiros,
2009, p. 372.
47 A possibilidade do controle em nada se confunde com o “ativismo judicial” em seu sentido pejorativo aplicado por
parte da doutrina. Sobre o tema, v. entrevista do constitucionalista Luis Roberto Barroso à Revista Consultor Jurídico
sobre os 20 anos da Constituição brasileira: “Na medida em que o assunto está na Constituição, ele sai da esfera
política, da deliberação parlamentar, e se torna matéria de interpretação judicial. Então, em uma primeira abordagem,
a Constituição de 88 contribui sim para que o Judiciário tenha um papel muito mais ativo na vida do país. Mas há um
segundo motivo para isso. O atual sistema político brasileiro levou a um descolamento entre a sociedade civil e a
classe política. Há algumas demandas da sociedade que não são atendidas a tempo pelo Congresso Nacional. E o que
acontece? Nos espaços em que havia demandas sociais importantes e o Legislativo não atuou, o Judiciário se expandia.
Aqui penso ser oportuno fazer uma distinção entre judicialização e ativismo judicial, que são ideias que estão próximas,
mas não se confundem. Judicialização é um fato, que identifica a circunstância que muitas questões que antes eram
próprias da política passaram a ser decididas pelo Judiciário, foram transformadas em pretensões veiculadas perante
juízes e tribunais. O ativismo é uma atitude, que identifica uma interpretação expansiva da Constituição, incluindo no
seu âmbito de alcance questões que não foram nela expressamente contempladas” (Obtido em
http://www.conjur.com.br/2009-mar-07/luis-roberto-barroso-traca-historico-direito-constitucional-tv. Acesso em 10 de
junho de 2010).
48FREITAS, Juarez de. O controle dos atos administrativos e os princípios fundamentais. 4ª ed, São Paulo: Malheiros,
2009, p. 370.
III.4 Da possibilidade de controle pelo Poder Judiciário
Muito embora a análise detalhada da possibilidade e limites do controle judicial da
atuação administrativa não seja o propósito do presente trabalho, cumpre trazer algumas
considerações a respeito do tema para adequá-lo às hipóteses em que a discricionariedade
torna-se arbitrariedade do agente estatal, legitimando o controle.
De início, destaca-se que a legitimidade do Poder Judiciário para intervenção decorre
do próprio sistema constitucional, originado da common law. Com efeito, o próprio art. 5º,
XXXV da Constituição Federal, ao estabelecer que “a lei não excluirá da apreciação do
Poder Judiciário lesão ou ameaça de direito”, legitima a possibilidade de intervenção do
juiz, caso provocado. Indo além, tal legitimidade de controle decorre também dos deveres
de imparcialidade e motivação a que o juiz está adstrito.49
Uma vez legitimado, não resta dúvida acerca da possibilidade de intervenção do
Judiciário na hipótese de discricionariedade excessiva por parte da administração (o vício da
arbitrariedade por ação acima exposto). Realmente, se o agente estatal atua contrariamente à
finalidade prevista na lei ou na Constituição, a doutrina e os Tribunais não têm grandes
dificuldades em reconhecer a possibilidade de intervenção para declarar a
inconstitucionalidade do ato e sua nulidade, uma vez que a própria Carta Constitucional
prevê mecanismos para sindicabilidade dessas situações.50 O problema reside, contudo, nas
hipóteses de omissão arbitrária da Administração Pública, isto é, nas situações em que o
agente estatal deixa de cumprir o dever prescrito na norma, geralmente de caráter
programático.
Não é difícil prever que a maior ocorrência de omissões arbitrárias dá-se exatamente
no campo das políticas públicas, cuja implementação exige um dever prestacional por parte
do Estado-Administração e, como tal, impacta nos cofres públicos.51 A realidade nua e crua
49A verificação da legitimidade do Judiciário para intervir nas decisões do executivo e decidir na área de políticas
públicas depende de como a separação de poderes é concebida em determinada constituição. Na Constituição de 1988,
contudo, não restam mais dúvidas: “deixar o Judiciário de fora do debate com base apenas em uma ideia anacrônica
de separação de poderes é uma estratégia que não será considerada aqui. O mesmo pode ser dito acerca do argumento
baseado exclusivamente na falta de legitimidade democrática do Judiciário. Ambos os argumentos – separação de
poderes e ausência de legitimidade democrática – costumam ser usados de uma forma extremamente maniqueísta, a
qual pretendo aqui evitar. Por isso, e por outras razões argumentativas, pretendo aqui presumir que um amplo controle
de constitucionalidade é um ponto inquestionável do sistema constitucional e que, nesse sentido, deve ser aceito que os
juízes têm legitimidade para interferir em questões legislativas e governamentais” (SILVA, Virgílio Afonso da.. O
Judiciário e as políticas públicas: entre transformação social e obstáculo à realização dos direitos sociais. In Cláudio
Pereira de Souza Neto & Daniel Sarmento, Direitos sociais: fundamentação, judicialização e direitos sociais em
espécies. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, pp. 591-592).
50Assim, por exemplo, a Ação Direta de Inconstitucionalidade por ação ou a Ação por Descumprimento de Preceito
Fundamental, esta última de caráter subsidiário àquela. Reconhecida a inconstitucionalidade da atuação estatal, o ato
será declarado nulo. Tradicionalmente, tais ações visam tutelar as chamadas liberdades públicas, ou direito de defesa,
que são os direitos fundamentais de primeira geração, que têm como objetivo garantir uma esfera de autonomia aos
indivíduos, no interior da qual o Estado não deve intervir. Os direitos dessa natureza normalmente não causam grandes
problemas aos juízes ou à relação entre os poderes políticos e o poder judiciário, especialmente nos países acostumados
a algum controle de constitucionalidade. Nessas situações, sempre que o Executivo ou o Legislativo forem além da
barreira do “não-fazer”, é tarefa dos juízes garantir os direitos individuais, declarando tais medidas como inválidas e
assegurando a volta do status quo ante (SILVA, Virgílio Afonso da. Op. cit, pp. 588-589).
51 Não raro a doutrina diferencia os direitos individuais dos direitos sociais afirmando que os primeiros não exigem um
dever prestacional do Estado e, como tais, não exigem alocação de recursos fundamentais. Tal afirmação, na visão de
é que, na maior parte dos casos, o governo e as maiorias parlamentares são a expressão de
um mesmo partido político ou uma coalizão de partidos. Logo, destaca-se a verdadeira
autonomia do Legislativo diante do Poder Executivo, pois grande parte das leis aprovadas
são de iniciativa do próprio governo. Esse, por sua vez, dispõe de um grande poder
regulamentar e de planejamento, autorizado pela Constituição e atribuído pela legislação
ordinária.52
Diante dessa realidade, torna-se necessária uma atuação mais presente do Poder
Judiciário no controle de políticas públicas que realizam direitos fundamentais sociais,
afastando as atuações da Administração que se desviam das prioridades deixando de
assegurar tais direitos aos cidadãos. Por essa razão é que o Judiciário, no controle de
políticas públicas, deve ser visto como uma das funções da soberania do Estado em ação,
atuando no suprimento da ausência do legislador ou da Administração.
Na esteira do quanto já foi dito, cumpre destacar a significativa mudança no
entendimento dos Tribunais acerca do tema da discricionariedade administrativa em matéria
de políticas públicas e a possibilidade de controle dos atos do agente estatal pelo
Judiciário.53
Se no início prevalecia o posicionamento de que não se poderia obstaculizar as
atividades do administrador definidas segundo critérios de conveniência e oportunidade –
impassíveis, portanto, de controle jurisdicional – atualmente observa-se uma tendência
Abramovich e Courtis, é falaciosa. Segundo tais autores, a realização e a proteção de direitos sempre custam dinheiro,
seja no caso dos direitos sociais, seja no dos direitos civis e políticos. Nesse sentido, recursos públicos são
indispensáveis também para a proteção da liberdade de imprensa, do direito de propriedade, do direito de associação,
etc., uma vez que a realização desses direitos depende da criação e manutenção de instituições públicas, judiciárias e de
segurança, que necessariamente implicam em gastos para o Estado (ABRAMOVICH, Vitor; COURTIS, Christian. Los
derechos sociales como derechos exigibles. Madrid: Trotta, 2002, p. 23). Todavia, como bem lembra o Prof. Virgílio
Afonso da Silva, os direitos sociais e econômicos distinguem-se sim dos direitos civis e políticos pelos gastos que sua
realização pressupõe. Muito embora a realização e garantia de qualquer direito implique em gasto estatal, não se pode
negar que a realização dos direitos sociais e econômicos custa “mais dinheiro” (SILVA, Virgílio Afonso da. Op. cit., pp.
591-592).
52DAL BOSCO, Maria Goretti; VALLE, Paulo Roberto. Novo conceito de discricionariedade em políticas públicas sob
um
olhar
garantista,
para
assegurar
direitos
fundamentais,
p.
25.
Obtido
em
http://www.conpedi.org/manaus/arquivos/anais/manaus/direito_humano_adm_pub_maria_dal_bosco_e_paulo_valle.pdf
(artigo integrante da tese de doutorado da autora, intitulado “Políticas Públicas e improbidade: uma aproximação
garantista”). Acesso em 09 de junho de 2010.
53Nesse sentido, vale destacar uma polêmica de repercussão considerável que envolveu alguns atores espanhóis da
década de 1990 acerca do conceito de discricionariedade que deveria ser tomado pelo País após o fim do regime
franquista. De um lado estavam Parejo Alfonso e Sánchez Morón, sustentando a impropriedade de um rígido controle
jurisdicional da Administração, sob a justificativa de que o Poder Executivo ganhara, a partir da ditadura franquista,
legitimidade suficiente para representar a vontade dos administrados. De acordo com esses autores, a decisão judicial
que modificasse uma decisão administrativa significaria a substituição do administrador pelo juiz. O controle pelo
Judiciário resumir-se-ia, então, na supervisão, censura e correção da ação do outro poder declarando sua ilegalidade,
mas nunca determinando a indenização para reposição dos prejuízos aos administrados. Com entendimento
diametralmente oposto estava Tomás-Ramon Férnandez, para quem o sistema autorizaria não apenas anular as decisões
administrativas arbitrárias, mas também o ressarcimento dos danos causados ao particular, em autêntica substituição da
decisão administrativa. A questão começa a resolver-se com Garcia de Enterría, ao afirmar que a discricionariedade
deve submeter-se sempre ao interesse público visado pela norma jurídica marcada por um conceito indeterminado. Na
visão de Enterría, deve o juiz controlar a aplicação do conceito pela Administração sem que isso signifique em controle
absoluto da discricionariedade, tampouco em substituição completa da decisão administrativa pela decisão judicial
(DAL BOSCO, Maria Goretti; VALLE, Paulo Roberto. Novo conceito de discricionariedade em políticas públicas sob
um
olhar
garantista,
para
assegurar
direitos
fundamentais,
pp.
11-12.
Obtido
em
http://www.conpedi.org/manaus/arquivos/anais/manaus/direito_humano_adm_pub_maria_dal_bosco_e_paulo_valle.pdf.
Acesso em 09 de junho de 2010).
majoritária em direção oposta,54 embora nem sempre o faça observando-se os limites do
Judiciário no controle do ato administrativo.
Em outras palavras, o controle sistemático e articulado dos atos administrativos há de
ser calcado não só nas regras, mas também nas normas constitucionais e nos princípios de
direito, ultrapassando-se, pois, a rigidez das antigas classificações de atos administrativos e
destacando-se a inaceitabilidade de atos exclusivamente políticos: tanto os atos
administrativos vinculados quanto os discricionários devem guardar vinculação forte com o
sistema positivado. Numa visão sistemática consentânea com a supremacia da ordem
consitucional, o mérito do ato, por via reflexa, pode ser inquirido, efetuando-se o controle
da arbitrariedade por ação ou omissão do agente estatal. Essa a razão pela qual o controle
sistemático deve ser realizado com maior rigor, uma vez que a discrição existe para que o
agente concretize com maior presteza as finalidades vinculantes da Constituição Dirigente.
Logo, obrigatoriamente, os atos administrativos – vinculados ou não – devem ser
constitucionalmente justificáveis. Obviamente que, quanto maior a liberdade, maior deve
ser o controle, nos recíprocos contrapesos entre os Poderes.55
Por outro lado, não se pode confundir o aprofundamento do controle com um excesso
paralisante, uma vez que não se trata de exigir uma escolha unívoca, adotando a lógica do
“tudo-ou-nada”. O que se busca é que a escolha do agente estatal no exercício de sua
competência seja válida e legítima, sendo a melhor escolha possível (e não “a” única
escolha possível) dentre as várias opções legítimas que lhe são disponibilizadas. O controle
deve ser proporcional, abrangendo com maior cuidado a íntegra da motivação dos atos
administrativos.56
54Isso não significa, contudo, que ainda não se encontre uma doutrina e jurisprudência mais resistente, para os quais os
atos administrativos ainda seriam impassíveis de controle em seu mérito. Tal posicionamento é sustentado com base na
rígida separação de poderes (assim entendida como a impossibilidade do Poder Judiciário intervir no Poder Executivo),
bem como em uma suposta falta de legitimidade do Judiciário à luz do princípio democrático, uma vez que seus
representantes não seriam eleitos pelo povo. De todo modo, a tendência – principalmente dos tribunais superiores – é de
analisar o mérito do ato administrativo e, caso verificada a existência de arbitrariedade por parte da Administração
Pública, anulá-lo. Essa é a conclusão verificada por Andressa Lialn Fidelis em monografia defendida na Escola de
Formação da Sociedade Brasileira de Direito Público – SBDP, intitulada A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal
no controle da Administração Pública: uma releitura do controle dos atos administrativos discricionários (São Paulo,
2008, obtido em http://www.sbdp.org.br – acesso em 05 de maio de 2010). Como já visto no presente trabalho, no
campo das políticas públicas o controle do mérito do ato administrativo (comissivo ou omissivo) resulta, não raro, na
imposição de um dever ao agente de determinar o fornecimento de um medicamento, custear tratamentos, construir
escolas, hospitais, etc. Atualmente, os Tribunais têm inclusive utilizado de astreintes e, quando possível, a
responsabilização pessoal do agente para compelí-lo ao cumprimento da decisão judicial, seja para implementar uma
política pública (assim entendida em seu caráter universal), seja para conceder uma tutela individualmente pleiteada.
55 FREITAS, Juarez de. O controle dos atos administrativos e os princípios fundamentais. 4ª ed, São Paulo: Malheiros,
2009, pp. 367 e 393.
56FREITAS, Juarez de Op. cit., pp. 367 e 393.
IV – Discricionariedade Administrativa na Formulação de Políticas Públicas
O campo das políticas públicas é, historicamente, o ambiente da discricionariedade
administrativa. 57 Tal fato encontra justificativa em duas razões: a primeira, porque esse
caráter provedor do Estado se mostra mais intensificadamente na efetivação das políticas
sociais; a segunda, porque as normas fundamentadoras dessas políticas encontram abrigo na
Constituição Federal, e são marcadas pelo caráter programático da efetivação dos direitos
fundamentais. Em português claro: ao mesmo tempo em que as políticas públicas têm
fundamento em normas constitucionais de carga semântica consideravelmente aberta,
atribuindo maior discricionariedade ao administrador, exigem deste uma atuação direta para
consecução dos direitos sociais que visa tutelar.
Como já exposto no presente trabalho, o caráter programático dessas normas, cujas
finalidades vêm estatuídas na forma de conceitos de valor, são irredutíveis a uma
objetividade completa. Nessas situações, além de toda a interpretação possível, remanescerá
sempre ao administrador alguma discrição em sua escolha diante da situação concreta. Se
por um lado a carga semântica aberta dos princípios e direitos fundamentais é indispensável
para atingir o comportamento ótimo exigido do administrador na aplicação da norma, por
outro, a margem de liberdade acaba propiciando arbitrariedades pelo agente Estatal.58
De se considerar, ainda, que as políticas públicas visam à consecução dos direitos
sociais que, por exigirem uma atuação direta do Estado, indubitavelmente possuem um
custo mais alto que os direitos civis e políticos. É certo que esses últimos possuem um custo
que não pode ser ignorado, pois exigem a manutenção de um aparato estatal; todavia, a
realização de direitos sociais como a saúde e a educação têm interferência muito maior no
orçamento público. De mais a mais, esses “gastos institucionais” incorridos pelo Estado na
manutenção do aparato para realização dos direitos civis e políticos também são
indispensáveis na efetivação dos direitos sociais, tratando-se, pois, de “gastos diluídos” na
efetivação de todo e qualquer direito, não servindo de base para a comparação entre o custo
dos direitos sociais e econômicos, de um lado, e o custo dos direitos civis e políticos, de
outro.59
57DAL BOSCO, Maria Goretti; VALLE, Paulo Roberto. Op. cit., p. 01.
58Citando Konrad Hesse, a força normativa da Constituição não se limita somente à sua adaptação à realidade concreta,
mas sim de sua efetivação na prática (“vontade de Constituição”), o que resulta na imposição de tarefas ao
administrador que devem ser efetivamente realizadas. De acordo com Hesse, a “vontade de Constituição” possui três
vertentes: a compreensão da necessidade de uma ordem normativa contra o arbítrio, a constatação de que essa ordem
não é eficaz sem o concurso da vontade humana e de que a ordem normativa adquire e mantém sua vigência sempre
mediante atos de vontade (HESSE, Konrad. Escritos de Derecho Constitucional. 2ª. edición. Madrid: Centro de
Estudios Constitucionales, 1992, pp. 19-20).
59SILVA, Virgílio Afonso da. Op. cit., pp. 591-592). V. nota n. 50.
IV.1
Do conceito de políticas públicas
A partir das considerações acima expostas, torna-se evidente a presença da
discricionariedade administrativa no campo das políticas públicas. Assim como o legislador
infraconstitucional atua na “determinação” e “conformação material” da Constituição
Dirigente, o enfoque das políticas públicas destaca o papel da Administração na
“determinação e conformação” material das leis e das decisões políticas a serem executadas
no nível administrativo. Quer-se dizer que as políticas públicas são hoje instrumentos de
ação dos governos, o government by policies em substituição ao government by law.60
Mas, afinal, qual o conceito jurídico de políticas públicas?
De acordo com Maria Paula Dallari Bucci, políticas públicas são programas de ação
governamental que resulta de um processo ou um conjunto de processos juridicamente
regulados – processo eleitoral, processo de planejamento, processo de governo, processo
orçamentário, processo legislativo, processo administrativo, processo judicial – visando
coordenar os meios à disposição do Estado e as atividades privadas para a realização de
objetivos socialmente relevantes e politicamente determinados.61
Como se percebe, o conceito de políticas públicas pressupõe modelos de “ações”,
“programas” ou “atividades” públicas, evidenciando o comprometimento de todas as
funções do Estado com a realização das metas de efetivação dos direitos fundamentais
previstos na Carta Constitucional. Logo, não há, a priori, exclusão de qualquer função do
Estado quanto ao compromisso para promoção e efetivação dessas políticas, uma vez que,
como exposto no capítulo anterior, a Constituição Federal dá a direção e regula a atuação do
Estado, assim compreendido na totalidade dos poderes – Executivo, Legislativo e Judiciário.
Sem dúvidas, mesmo na concepção atual da harmonização dos poderes há divisão de
atribuições distintas dentro do aparato estatal. Na realidade, o que se verifica é que a
elaboração dos planos de governo, que encerram políticas públicas em todas as áreas da
Administração, costuma ficar a cargo do Executivo e do Legislativo. Não raro, porém, tais
poderes são comandados pelas mesmas forças políticas que vencem as eleições. As
possibilidades de escolha atribuídas ao Executivo neste momento são amplas e pequeno é o
número de situações nas quais os investimentos têm finalidade vinculada, como ocorre com
a educação e a saúde.62 E é assim que a omissão arbitrária da administração na realização
dos direitos sociais é dilema corriqueiro no cenário do país, legitimando a intervenção
judicial para coibir o desajuste da escolha de prioridades orçamentárias adotadas pelo
governo.63
60COMPARATO, Fábio Konder. Planejar o desenvolvimento: a perspectiva institucional. In “Para viver a democracia”.
São Paulo: Brasiliense, 1989, p. 102.
61BUCCI, Maria Paula Dallari. O conceito de política pública em Direito. In “Políticas Públicas: reflexões sobre o
conceito jurídico”. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 39.
62DAL BOSCO, Maria Goretti; VALLE, Paulo Roberto Dalla. Op. cit., pp. 09-10.
63Ademais, como lembra Maria Paula Dallari Bucci, o fato de ser a política pública um “quadro normativo de ação”
informado por elementos de poder público, elementos de expertise e elementos que tendem a constituir uma ordem
local – todos da órbita do aparelho burocrático – faz com que a Administração desempenhe um papel relevante na
análise e na elaboração dos pressupostos que dão base à política pública. A ideia de uma sucessão de atos no tempo, em
que o Legislativo e o governo traçam primeiro as diretrizes da política para depois a Administração Pública executá-la,
Vê-se, pois, que a exteriorização da política pública está muito distante de um padrão
jurídico uniforme e claramente apreensível pelo sistema. Isto se reflete em dúvidas quanto à
vinculatividade dos instrumentos de expressão das políticas – o seu caráter cogente em face
de governos e condições políticas que mudam – e quanto à justiciabilidade dessas mesmas
políticas, isto é, a possibilidade de exigir o seu cumprimento em juízo.64
IV.2
A discricionariedade na peça orçamentária
A partir das premissas assentadas nos capítulos anteriores de que (i) tanto a lei quanto
a Constituição Federal – sem esquecer dos princípios do ordenamento pátrio – prevêem fins
a serem perseguidos pelo Estado; que (ii) a atuação administrativa, assim como de todos os
outros poderes, está vinculada a tais finalidades normativas (independentemente do grau de
regulação estabelecida nas normas); que (iii) tais comandos normativos prevêem sempre um
comportamento ótimo do agente estatal para viabilizar o alcance da finalidade da melhor
forma possível diante da possibilidade de escolha à luz da situação concreta; pôde-se
concluir que, caso a conduta dos agentes – seja comissiva, seja omissiva – não esteja
intimamente relacionada com tais premissas, deflagrar-se-á como uma arbitrariedade a ser
combatida pelo Poder Judiciário.
Visto que as políticas públicas revelam-se como o campo de maiores arbitrariedades
cometidas pelos agentes estatais no exercício de sua função, não pode ser outra a conclusão
de que o Judiciário tem o dever de coibir os abusos também nessa seara, na tentativa de
efetiva realização dos direitos sociais. Todavia, falar em política pública implica
necessariamente abordar orçamento, isto é, na escolha de prioridades realizadas pela
Administração.
Todas essas reflexões permitem perquirir se seria possível engendrar ação judicial
cujo foco não fosse os direitos subjetivos previamente definidos ou os que adviessem como
resultado de atividades estatais já bem sucedidas, mas a própria atividade procedimental
realizada para a implementação da policy: as decisões fundamentais à luz das possibilidades
orçamentárias.
Quer-se dizer que deverá ser objeto de controle, por exemplo, a adequação da política
às diretrizes orçamentárias e aos princípios magnos; a destinação das verbas vinculadas à
saúde e à educação; o exame das prioridades. Isso porque, muito embora não se discuta que
é o administrador público quem melhor conhece a realidade administrativa e financeira do
ente público, por outro é necessário evitar que, na prática, a discricionariedade torne-se um
passa a ser mais um tipo ideal que um dado da realidade. Principalmente no campo dos direitos sociais como saúde,
educação e previdência, em que as prestações do Estado resultam da operação de um sistema extremamente complexo
de estruturas organizacionais, recursos financeiros, figuras jurídicas, cuja apreensão é a chave de uma política pública
efetiva e bem-sucedida. Conhecer, portanto, os princípios jurídicos da Administração Pública, os condicionamentos
legais à contratação de funcionários ou serviços, as formas de organização jurídica da Administração direta e indireta,
além dos dados materiais geridos pela Administração em seu cotidiano, são operações que necessariamente fazem parte
do processo de formulação da política pública. Por outro lado, esse processo representa o modo de formação da vontade
administrativa no espaço da ação discricionária – especialmente num país de regime presidencialista, em que os
aparelhos do governo e da Administração se confundem no Poder Executivo (BUCCI, Maria Paula Dallari. Op. cit., p.
250).
64BUCCI, Maria Paula Dallari. Op. cit., p. 257.
“cheque em branco” ao agente estatal para desenvolver as políticas públicas.
Assim, à medida que a discricionariedade do agente atinge a escolha das prioridades
orçamentárias, essa não pode ser imune ao controle judicial sob o manto dos juízos de
“oportunidade e conveniência” ínsitos à Administração. Afinal, é a peça orçamentária que
permite a existência e o manejo dos recursos necessários à efetivação máxima das políticas
públicas. 65 Daí porque toda e qualquer discussão de omissão administrativa na
implementação de políticas públicas recai sobre o orçamento, sobretudo à luz do limite da
“reserva do possível”, tão invocado pela administração para afastar o controle pelo
Judiciário de sua conduta omissiva. Deve-se coibir, pois, as atitudes irresponsáveis, as
omissões arbitrárias que coloquem em xeque a própria efetividade do sistema.
Mas quais seriam, então, as omissões arbitrárias praticadas pelo agente estatal em
matéria de políticas públicas?
A questão é de difícil resposta. Se por um lado não se nega a vinculação do
administrador ao dever de realizar os direitos sociais – a “vontade de Constituição” a que
Hesse se refere – por outro é notório que a Administração não tem condições de acabar com
a totalidade das mazelas sociais, garantindo um serviço público eficiente em saúde,
educação, moradia, previdência, etc. Daí porque parte da doutrina e a jurisprudência fala em
um núcleo de direitos fundamentais inafastável pelo poder público, porque indispensáveis
para a garantia do primado constitucional da dignidade humana. A partir dessa ideia, haveria
um mínimo existencial a ser garantido pelo Estado em toda e qualquer hipótese, 66 cuja
omissão seria inarredavelmente arbitrária.
Muito embora a iniciativa seja louvável, até agora não se alcançou um conceito
objetivo do mínimo existencial, divergindo-se sobre quais direitos fundamentais deveriam
integrar o “mínimo”, participando da delineação do conceito. Admite-se, inclusive, certa
flexibilidade no conceito, que assumiria contornos diversos no tempo e espaço.67
65BARROS, Marcus Aurélio de Freitas. Miradas sobre o controle jurisdicional de políticas públicas: dos preceitos
judiciais à teoria (obtido em http://sisnet.aduaneiras.com.br/lex/doutrinas/arquivos/miradas.pdf – acesso em 11 de
junho de 2010).
66Sem muitas delongas – já que não é este o objeto do presente trabalho – pode-se mencionar que os critérios utilizados
pela doutrina e jurisprudência acerca dos limites do controle jurisdicional em matéria de políticas públicas são: (i) o
mínimo existencial, isto é, um núcleo de direitos fundamentais intangíveis que, por se relacionarem intimamente com o
primado da dignidade humana, deveria necessariamente ser concedido pelo Judiciário em caso de omissão
administrativa; (ii) a razoabilidade, isto é, a análise da situação concreta para verificar se o administrador pautou sua
conduta de acordo com os interesses maiores do indivíduo ou da coletividade; e (iii) a reserva do possível fática e
jurídica: a primeira, estabelecendo que não é possível exigir uma prestação positiva do Estado se não há, de fato,
materialmente, dinheiro em caixa; a segunda, baseada na falta de previsão orçamentária, dentro do sistema vigente, para
o gasto com este ou aquele direito (JACOB, César Augusto Alkmin. A Reserva do Possível: obrigação de previsão
orçamentária e de aplicação da verba – no prelo). No que se refere ao mínimo existencial, este não seria oponível
sequer à falta de recursos da Administração Pública (“reserva do possível”): diante da impossibilidade – devidamente
demonstrada pela Administração – de garantir a efetivação do “direito mínimo” naquele exercício financeiro, poderia o
Poder Judiciário determinar a inclusão, na peça orçamentária, de uma política pública para a realização futura daquele
direito. Nessa esteira, deve-se diferenciar a reserva do possível jurídica da fática. Cite-se, por exemplo, um pequeno
Município do árido sertão nordestino cujos recursos são excessivamente restritos. Diante da impossibilidade fática de
realização daquele direito mesmo futuramente, não há como garantir-se sequer o mínimo existencial. Trata-se, contudo,
de exemplo extremado. De todo modo, sobrexiste a possibilidade de alocação de recursos para efetivação daquele
direito, uma vez que o Município, os Estados e a União são solidariamente responsáveis por sua implementação.
67 Para elucidar melhor a questão, mencione-se o exemplo utilizado pelo Prof. Kazuo em sala de aula: o direito à
indumentária. Muito embora para os povos indígenas habitantes do Estado do Amazonas a indumentária não
configuraria no rol de direitos indispensáveis para assegurar a dignidade humana (por questões inclusive culturais), a
Outra interessante questão que se coloca sobre o exercício abusivo da
discricionariedade administrativa passível de controle pelo Poder Judiciário seria o caso de
intervenção judicial para adequar determinada política pública já realizada pela
Administração aos fins constitucionais. Em outras palavras, questiona-se sobre a
possibilidade do Judiciário, uma vez provocado para tanto, determinar a correção ou
implementação de outra política pública na hipótese do ente estatal já desenvolver uma
política no mesmo setor.
À luz do quanto discutido sobre a exigência de um comportamento ótimo do agente
estatal, a tendência é concluir que sim, o Judiciário pode intervir caso a política adotada pela
Administração não esteja cumprindo de forma eficiente a finalidade legal ou constitucional,
desde que a ineficiência da política já existente reste demonstrada e que a Administração, de
seu turno, não consiga se desincumbir do ônus de provar a falta de recursos para melhoria
dessa política.68
Não se pode esquecer que mesmo a flexibilização da clássica teoria da separação dos
poderes (admitindo-se, hoje, o controle jurisdicional) mantém um núcleo intangível de
atribuições específicas para cada ente Estatal, cuja ultrapassagem seria igualmente nociva ao
sistema. Realmente, não é tarefa da alçada do Judiciário definir políticas públicas, tampouco
substituir o administrador na escolha das prioridades orçamentárias, daí resultando a
necessidade de impor limites ao poder Judiciário ao intervir nas decisões do agente
administrativo, não podendo sobrepor-se sobre a este.
Indo além, nem sempre o Judiciário analisa a tensão discricionariedade vs.
arbitrariedade administrativa e a consequente possibilidade de controle da forma mais
adequada, muitas vezes intervindo em hipóteses que não deveriam ser submetidas a controle
ou, ainda que o fossem, através de justificativa sem o devido rigor jurídico-constitucional.69
indumentária é, sem dúvida, item indispensável para os habitantes da região Sul, em razão das baixas temperaturas.
Elevando-se à última potência, é possível concluir que a delimitação do conceito esbarra no princípio da razoabilidade e,
na situação concreta, da proporcionalidade. Partindo das ideias de Robert Alexy, nenhum direito fundamental é
aprioristicamente superior à outro, sendo indispensável a aplicação do princípio da proporcionalidade à luz do caso
concreto para, então, decidir pela preponderância de um valor em relação a outro.
68 Nesse sentido, veja-se recente decisão do Superior Tribunal de Justiça no julgamento de Recurso Ordinário em
Mandado de Segurança nº 28.962/MG, j. em 25 de agosto de 2009. O Ministro Relator Benedito Gonçalves negou a
concessão do medicamento pleiteado que não constava da lista do SUS por entender que o impetrante não demonstrou
que a resposta em seu tratamento seria melhor com o remédio pleiteado que com os medicamentos fornecidos pelo SUS.
O Ministro chama a atenção, ainda, para a prudência na análise das ações ajuizadas contra os entes públicos com o
escopo de obrigar-lhes indiscriminadamente ao fornecimento de medicamentos de alto custo.
69 A título exemplificativo, cita-se TJSP, Ap. Cível 275.964-5/9-00, julgado em 14 de março de 2005, relator Desembargador Milton Gordo. Com base o raciocínio do Relator, a discricionariedade administrativa estaria seriamente mitigada, vez que o Judiciário estaria apto a determinar o conteúdo de uma política pública de acesso a deficientes – determinando a construção de rampas em uma escola - não sendo possível concluir que o Município, de fato, estivesse se
omitindo quanto a todas as inúmeras opções de efetivação da mesma finalidade legal, qual seja, garantir acesso aos
deficientes. Ademais, o argumento utilizado pelo Relator seria de que a medida (construção de rampa de acesso) teria
custo baixo e, como tal, não interferiria no orçamento do município. A despeito de alguns acórdãos reconhecerem a
existência de políticas públicas específicas para DST/AIDS, nenhum deles tratava pormenorizadamente do desenho
institucional da política pública praticada pelo Estado. Nos casos em que o Estado já empreende uma política pública,
como no analisado, verificou-se que “o Judiciário ignora por completo o modus operandi da mesma, não procurando
adequar a esse suasdecisões, quando possível” (Conforme Pesquisa realizada por estudantes da graduação da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, coordenada pelo Prof. Dr. José Eduardo Faria e Prof. Dr. Diogo R. Coutinho - PET-FD-USP - intitulado O Judiciário e as políticas públicas de saúde no Brasil: o caso AIDS, 2004, p. 24.
Apud SILVA, Virgílio Afonso da. O Judiciário e as políticas públicas: entre transformação social e obstáculo à realiza-
A discussão sobre os limites ao controle jurisdicional assume hoje relevância tão
grande quanto da própria necessidade de implementação das políticas públicas, à medida
que os Tribunais possuem uma postura cada vez mais ativa no controle das omissões
administrativas. Todavia, nem sempre o controle é realizado com o devido rigor jurídico.
Envolvidos pela compaixão social que o tema desperta, juízes e Tribunais concedem, por
exemplo, tratamentos médicos no exterior e medicamentos que não constam da lista da
Anvisa sem sequer considerar o impacto de suas decisões no orçamento público e a
inviabilidade que poderia delas advir na implementação de outras políticas públicas –
eventualmente até na mesma área da saúde – já estabelecidas pela Administração. Vale
destacar, ainda, a existência das demandas individuais que não raras vezes conseguem
decisões para “furar a fila”,70 sem qualquer resultado social na implementação da política
pública propriamente dita. Tudo isso porque decidir sobre o que seja ou não factível nos
limites do orçamento do Executivo implica conhecer detalhes técnicos que não são comuns
à prática dos magistrados.
Nesse ínterim, não há como se compreender a política pública sem compreensão do
regime das finanças públicas. Para tanto, porém, é preciso inseri-las nos princípios
constitucionais que estão além dos limites ao poder de tributar. Precisam estar inseridas no
direito que o Estado recebeu de planejar não apenas suas contas, mas o desenvolvimento
nacional, que inclui e exige a efetivação de condições de exercício dos direitos sociais pelos
cidadãos brasileiros. 71 Assim, o Estado não só deve planejar seu orçamento anual, mas
ção dos direitos sociais. In Cláudio Pereira de Souza Neto & Daniel Sarmento, Direitos sociais: fundamentação, judicialização e direitos sociais em espécies. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, pp. 594).
70Trata-se do que Virgílio Afonso da Silva chama de “ativismo judicial despreparado”: “por exemplo, ao distribuir
tratamentos médicos de forma individual (i.e., sem considerar as políticas governamentais na área), os juízes podem
estar prejudicando outras políticas públicas na área da saúde (ou em outras áreas), mesmo que eles consigam 'resolver'
alguns casos isolados. Isso porque, em um cenário de recursos escassos, o dinheiro tem que ser necessariamente
retirado de outros programas para atender as decisões judiciais”. O autor afirma que, diante da inexistência de
recursos para todas as carências sociais, as decisões do juiz concedendo medicamentos em demandas individuais
implicam no deslocamento de recursos de outras áreas. Assim, muito embora haja boas intenções, as histórias de
sucesso individual nem sempre são histórias de sucesso coletivo. Nessa esteira, conclui que “esses direitos não podem
ser tratados, exceto em casos excepcionais, como se seguissem o mesmo padrão individualista em que se baseiam
relações entre um credor e um devedor. (…) Se, pelas razões expostas, o Judiciário não deve distribuir medicamentos
ou bens similares de forma irracional a indivíduos, ele deveria ser capaz de canalizar as demandas individuais e, em
uma espécie de diálogo constitucional, exigir explicações objetivas e transparentes sobre a alocação de recursos
públicos por meio das políticas governamentais, de forma a estar apto a questionar tais alocações com os poderes
políticos sempre que necessário for” (SILVA, Virgílio Afonso da. O Judiciário e as políticas públicas: entre
transformação social e obstáculo à realização dos direitos sociais. In Cláudio Pereira de Souza Neto & Daniel
Sarmento, Direitos sociais: fundamentação, judicialização e direitos sociais em espécies. Rio de Janeiro: Lumen Juris,
2008, pp. 595-596). Também a profa. Ada Pellegrini Grinover concorda que só há implementação de política pública
quando se pensa coletivamente. Conforme exposto em sala de aula, a profa. diferencia as demandas individuais das
ações coletivas afirmando que as primeiras só têm o condão de implementar políticas públicas quando têm efeito
coletivo reflexamente (por ex., ação ingressada por um deficiente físico visando a construção de rampas de acesso, que
seriam, pois, aproveitadas por todos os deficientes). Não se olvide, porém, que tais ações individuais muitas vezes
funcionam como forma de pressão social na implementação de políticas públicas, como ocorreu no caso da Aids.
Segundo a OMS, “the viability of the Brazilian HIV/AIDS programme, including treatment distribution, owes much to
effective social mobilization, including representation of affected communities in government, non-governmental
organizations, and other fora. The distribution of free antiretrovirals in itself prevented the problems associated with
black market or substandard regimens.” (World Health Organization, Treatment Works. In
http://www.who.int/3by5/en/treatmentworks.pdf). Não se pode negar a pressão social existente no caso decorrente da
propositura de diversas ações individuais visando o acesso gratuito aos medicamentos para tratamento do HIV.
71LOPES, José Reinaldo de Lima. Direito subjetivo e direitos sociais: o dilema do judiciário no Estado social de
direito. In “Direitos humanos, direitos sociais e justiça (org. José Eduardo Faria). São Paulo: Malheiros, 1994, p. 132133).
também suas despesas de capital e programas de duração continuada, colocando em prática
a “vontade de Constituição”.
Assim, se por um lado o orçamento público não pode mais ser considerado esfera
intocável pelo Judiciário, de outro a decisão judicial deve usar da razoabilidade na avaliação
das possibilidades do orçamento, fixando prazos razoáveis e compatíveis com a execução
orçamentária.
V – CONCLUSÃO
Como vimos, o tema da discricionariedade administrativa, tão debatido pela doutrina
e jurisprudência, está longe de alcançar um entendimento uníssono quanto aos seus limites e
possibilidade de controle pelo Poder Judiciário.
De tudo o que já se escreveu, percebe-se que a antinomia atos vinculados vs. atos
discricionários há muito não é capaz de solucionar as questões enfrentadas atualmente pelo
Estado Democrático de Direito, sobretudo quando se trata da discussão de políticas públicas.
Embora não se negue a clássica concepção de que a administração está adstrita à lei,
pautando seus atos pelo princípio da legalidade, tal vinculação também não é suficiente para
a salvaguarda dos direitos fundamentais previstos na Carta Política. Tratando-se a Constituição de 1988 de uma constituição dirigente, torna-se indispensável um novo conceito de discricionariedade, adequado aos fins previstos na Carta Política, sob pena de transformá-la e
mero papel destituído de vinculação.
Deve-se, pois, pensar em uma discricionariedade pautada nos fins constitucionais,
vinculando a atuação do administrador aos direitos fundamentais e ao dever de boa administração. Nessa esteira, não há mais espaço para compreender a discricionariedade como um
pretexto para decisões ineficientes, sejam as que não atendam o interesse público implícito
na finalidade legal, sejam as que o atendam de maneira deficiente.
Numa visão sistemática consentânea com a supremacia da ordem constitucional, o
mérito do ato, por via reflexa, pode ser inquirido, efetuando-se o controle da arbitrariedade
por ação ou omissão do agente estatal. Essa a razão pela qual o controle sistemático deve ser
realizado com maior rigor, uma vez que a discrição existe para que o agente concretize com
maior presteza as finalidades vinculantes da Constituição Dirigente. Logo, obrigatoriamente,
os atos administrativos – vinculados ou não – devem ser constitucionalmente justificáveis.
Obviamente que, quanto maior a liberdade, maior deve ser o controle, nos recíprocos
contrapesos entre os Poderes.
Por outro lado, não se pode confundir o aprofundamento do controle com um
excesso paralisante, uma vez que não se trata de exigir uma escolha unívoca, adotando a
lógica do “tudo-ou-nada”. O que se busca é que a escolha do agente estatal no exercício de
sua competência seja válida e legítima, sendo a melhor escolha possível (e não “a” única
escolha possível) dentre as várias opções legítimas que lhe são disponibilizadas. O controle
deve ser proporcional, abrangendo com maior cuidado a íntegra da motivação dos atos
administrativos.
VI - BIBLIOGRAFIA
ABRAMOVICH, Vitor; COURTIS, Christian. Los derechos sociales como derechos
exigibles. Madrid: Trotta, 2002.
ALESSI, Renato. Principi di Diritto Amministrativo, Vol. I, Milano: Giuffrè, 1965.
ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais (trad. Virgílio Afonso da Silva). São
Paulo: Malheiros, 2008.
BARCELLOS, Ana Paula de. A eficácia dos princípios constitucionais: o princípio da
dignidade da pessoa humana. Rio de Janeiro: Renovar, 2002.
BARROS, Marcus Aurélio de Freitas. Miradas sobre o controle jurisdicional de políticas
públicas:
dos
preceitos
judiciais
à
teoria
(obtido
em
http://sisnet.aduaneiras.com.br/lex/doutrinas/arquivos/miradas.pdf – acesso em 11 de junho
de 2010).
BARROSO, Luis Roberto. O Direito Constitucional e a efetividade de suas normas: limites
e possibilidades na Constituição brasileira. 3ª. ed., Rio de Janeiro: Renovar, 1996.
__________. Entrevista concedida ao Consultor Jurídico sobre os 20 anos da Constituição
Federal de 1988. Obtida em http://www.conjur.com.br/2009-mar-07/luis-roberto-barrosotraca-historico-direito-constitucional-tv - acesso em 10 de junho de 2010.
BOURCIER, Danièle. Modeliser la décision administrative – Réflexions sur quesques
paradigmes. In “Le Droit Administratif en mutation” (org. Jacques Chevalier). Paris: PUF,
1993.
BENJAMIN, Antonio Herman. Os princípios do Estudo de Impacto Ambiental como
Limites
da
Discricionariedade
Administrativa.
BDJUR,
obtido
em
http://www.bdjur.stj.gov.br, acesso em 10 de junho de 2010.
BÉNOIT, Francis-Paul. Le Droit Administratif Français. Paris: Dalloz, 1968.
BERCOVICI, Gilberto. A problemática da constituição dirigente: algumas considerações
sobre o caso brasileiro. In “Revista de Informação Legislativa”, Brasília, a. 36, n. 142, abrjun. 1999.
BOBBIO, Norberto. Teoria Geral da Política: a filosofia política e as lições dos clássicos
(org. Michelangelo Bovero e trad. Daniela Beccaccia Versiani). Rio de Janeiro: Campus,
2000.
BUCCI, Maria Paula Dallari. O conceito de política pública em Direito. In “Políticas
Públicas: reflexões sobre o conceito jurídico”. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 39
CANELA JR., Osvaldo. A efetivação dos direitos fundamentais através do processo coletivo:
um novo modelo de jurisdição. São Paulo: tese defendida na USP, no prelo.
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição.
Coimbra: Livraria Almedinha, 1991.
COMPARATO, Fábio Konder. Planejar o desenvolvimento: a perspectiva institucional. In
“Para viver a democracia”. São Paulo: Brasiliense, 1989, p. 102.
COSTA, Regina Helena. Conceitos Jurídicos indeterminados e discricionariedade
administrativa. In “Justitia”, São Paulo, 51 (145), jan-mar. 1989, p. 50;
CRETELLA JR., José. Controle Jurisdicional do Ato Administrativo. 2a edição, Rio de
Janeiro: Editora Forense, 1992.
DAL BOSCO, Maria Goretti; VALLE, Paulo Roberto Dalla. Novo conceito da
discricionariedade em políticas públicas sob um olhar garantista, para assegurar direitos
fundamentais.
Obtido
em
http://www.conpedi.org/manaus/arquivos/anais/manaus/direito_humano_adm_pub_maria_d
al_bosco_e_paulo_valle.pdf (artigo integrante da tese de doutorado da autora, intitulado
“Políticas Públicas e improbidade: uma aproximação garantista”). Acesso em 09 de junho
de 2010.
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 17ª ed.. São Paulo: Atlas, 2004.
ENTERRÍA, Garcia de; FERNANDEZ, Tomás. Curso de Derecho Administrativo. Tomo I,
2ª. ed., Madrid: Civitas, 1977.
FORSTHOFF, Ernst. Tratado de Derecho Administrativo. Madrid: Instituto de Estudios
Políticos, 1958.
FREITAS, Juarez de. O controle dos atos administrativos e os princípios fundamentais. 4ª
ed., São Paulo: Malheiros, 2009.
GALDINO, Flavio. Introdução à teoria dos custos dos direitos – direitos não nascem em
árvores. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005.
GOUVÊA, Marcos Maselli. O Controle Judicial das Omissões Administrativas. Forense
Jurídica, 2003.
GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988 (initerpretação e
crítica). 2ª ed., São Paulo: RT, 1991.
GRINOVER, Ada Pellegrini. O Controle de Políticas Públicas pelo Poder Judiciário. In "O
Processo: Estudos e Pareceres". 2ª ed., São Paulo: DPJ Editora, 2009.
HESSE, Konrad. Escritos de Derecho Constitucional. 2ª. edición. Madrid: Centro de
Estudios Constitucionales, 1992.
HOLANDA, Sérgio Buarque de. Raízes do Brasil. 2a. ed.. Rio de Janeiro: José Olympio,
1948.
JACOB, César Augusto Alkmin. A Reserva do Possível: obrigação de previsão
orçamentária e de aplicação da verba – no prelo.
KRELL, Andreas. Discricionariedade administrativa, conceitos jurídicos indeterminados e
controle judicial. Revista Esmafe: Escola da Magistratura Federal da 5ª Região, n. 8, dez.
2004.
LOPES, José Reinaldo de Lima. Direito subjetivo e direitos sociais: o dilema do judiciário
no Estado social de direito. In “Direitos humanos, direitos sociais e justiça (org. José
Eduardo Faria). São Paulo: Malheiros, 1994
MEDAUAR, Odete. Controle da Administração Pública. São Paulo: Revista dos Tribunais,
1993.
__________. Direito Administrativo Moderno. 3ª edição, São Paulo: Revista dos Tribunais,
2000.
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. São Paulo: Malheiros, 1989.
MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Discricionariedade e Controle Jurisdicional. 2ª
edição, São Paulo: Malheiros Editores, 1998.
MONTESQUIEU. De L'esprit des lois. Paris: Garnier Frères, Libraires Éditeurs, 1869.
PEREIRA, André Gonçalves. Erro e ilegalidade no acto administrativo. Lisboa: Ática,
1962.
SILVA, Virgílio Afonso da. O Judiciário e as políticas públicas: entre transformação social
e obstáculo à realização dos direitos sociais. In Cláudio Pereira de Souza Neto & Daniel
Sarmento, Direitos sociais: fundamentação, judicialização e direitos sociais em espécies.
Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008.
STEPHEN HOLMES/CASS R. SUSTAIN, The Cost of Rights, 1999, Norton, New York.
SUNDFELD, Carlos Ari; CÂMARA, Jacintho Arruda. Controle judicial dos atos
administrativos:as questões técnicas e os limites da tutela de urgência, 2002, p. 24.
VEDEL, Georges. Droit Administratif. Paris: PUF, 1973.
World
Health
Organization,
Treatment
Works.
http://www.who.int/3by5/en/treatmentworks.pdf - acesso em 14 de junho de 2010).
In
Download

discricionariedade administrativa em matéria de políticas públicas