Atividades e atos administrativos Aulas 03 e 04 Discricionariedade e vinculação Conceitos jurídicos indeterminados Transformações do direito administrativo • Revisão do princípio da supremacia do interesse público • Do princípio juridicidade da legalidade ao princípio • Nova visão do ato administrativo discricionário da Caso gerador: de que se trata? Caso gerador • Ticio foi multado por trafegar acima do limite de velocidade • Limite de velocidade foi fixado em ato regulamentar, a partir de previsão da lei (Código Nacional de Trânsito) • Podia o órgão de trânsito ter fixado a placa em 40 km/h? Quais os limites ao Administrador no exercício de competência regulamentar? Caso Gerador Código Nacional de Trânsito (Lei 9503/97) Art. 61. A velocidade máxima permitida para a via será indicada por meio de sinalização, obedecidas suas características técnicas e as condições do trânsito. §1º. Onde não existir sinalização regulamentadora, a velocidade máxima será de: I – nas vias urbanas: a) oitenta quilômetros por hora, nas vias de trânsito rápido;(...) II – nas vias rurais: 1) nas rodovias, cento e dez quilômetros para automóveis, caminhonetas motocicletas; 2) Noventa quilômetros por hora, para ônibus e microônibus; 3) Oitenta quilômetros por hora, para demais veículos;b) nas estradas, sessenta quilômetros por hora. §2º. O órgão ou entidade de trânsito ou rodoviário local com circunscrição sobre a via poderá regulamentar por meio de sinalização velocidades superiores ou inferiores àquelas estabelecidas no parágrafo anterior. Podia, então, no caso gerador, o limite de velocidade ser fixado em 40 km/h? Em que consiste a discricionariedade do Administrador Público? O que é discricionariedade? • Classicamente: exercício, pelo administrador, de juízo de conveniência e oportunidade no que concerne ao interesse público, nas margens de liberdade conferidas pela lei • Conceito em crescente desprestígio, à luz do dever de motivação e da funcionalização do direito administrativo Discricionariedade e vinculação • Na vinculação, todos os elementos do ato administrativo já estão definidos na lei • Na discricionariedade, há espaço para juízo de valor pelo Administrador (“mérito do ato administrativo”) • Decisão é subjetiva, nos limites da lei, e não pode ser revista pelo PJ Elementos do ato administrativo • • • • • Competência Motivo Objeto Forma Finalidade * Quais admitem discricionariedade? RESP 764.085 ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL – PRETENSÃO RESISTIDA – INTERESSE DE AGIR – CONTRATO DE TELEVISÃO POR ASSINATURA (TV A CABO) – LESÃO A DIREITOS DOS USUÁRIOS – AUSÊNCIA DE FISCALIZAÇÃO – INEXISTÊNCIA DE DISCRICIONARIEDADE – VINCULAÇÃO À FINALIDADE LEGAL – RESERVA DO POSSÍVEL – NECESSIDADE DE DEMONSTRAÇÃO. 1. Os fatos consignados pelo acórdão recorrido, noticiam que a ré resistiu à pretensão do autor da ação civil pública, motivo pelo qual, não há que se falar em ausência do interesse de agir do Ministério Público. 2. Nos termos do art. 19 da Lei. n. 9.472/97, compete à Anatel a obrigação de fiscalizar os serviços públicos concedidos, bem como, de reprimir as infrações aos direitos dos usuários. Com efeito, não há discricionariedade para o administrador público em realizar, ou não, a fiscalização. RESP 764.085 • 3. A discricionariedade, porventura existente, circunscrever-se-ia na escolha do meio pelo qual a fiscalização será exercida. Todavia, ainda assim, o administrador está vinculado à finalidade legal, de modo que o meio escolhido deve ser necessariamente o mais eficiente no desempenho da atribuição fiscalizadora. 4. Isto ocorre porque a discricionariedade administrativa é, antes de mais nada, um dever posto à Administração para que, diante do caso concreto, encontre dentre as diversas soluções possíveis, a que melhor atenda à finalidade legal. 5. A reserva do possível não pode ser apresentada como alegação genérica, destituída de provas da inexistência de recursos financeiros. Requer, ademais, considerações sobre a situação orçamentária do ente público envolvido, o que esbarra na súmula 7 desta Corte Superior. Recurso especial improvido. Princípio da responsividade • É decorrência da noção de Estado democrático • Liame entre a vontade popular e a racionalidade pública => dever da Administração de responder adequadamente às demandas da cidadania (Diogo de Figueiredo Moreira Neto) • Importância da publicidade e da transparência dos atos administrativos para permitir o controle do ato administrativo • “Accountability” => prestação de contas Pode o Poder Judiciário rever o mérito do ato administrativo discricionário? Pode o Poder Judiciário rever o mérito do ato administrativo discricionário? • Doutrina clássica: o mérito do ato administrativo (conveniência + oportunidade) é insindicável pelo PJ, sob pena de violação do princípio da separação dos poderes • Doutrina contemporânea: não refuta a tese acima, mas sustenta que é possível um controle principiológico do ato administrativo discricionário, à luz da razoabilidade, da proporcionalidade e demais princípios constitucionais Caso gerador • Rodovia com previsão de 40 km/h • Motorista ao trafegar na madrugada a 54 km/h foi multado em lombada eletrônica, tendo se insurgido contra a multa, por ofensa à proporcionalidade => medida não seria necessária para o fim de reduzir acidentes de trânsito Decisão de 2ª instância (TJRS) "MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. INFRAÇÃO DE TRÂNSITO. EXCESSO DE VELOCIDADE EM RODOVIA DE MADRUGADA. 54 KM. EQUIPAMENTO ELETRÔNICO. LOMBADA. PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE. NULIDADE. 1. A atividade administrativa, no campo do chamado poder de polícia do trânsito, está submetida não só às normas legais como aos princípios gerais de direito administrativo dentre os quais o da proporcionalidade. As medidas administrativas restritivas não podem ir além do mínimo necessário para a satisfação da finalidade pública. 2. Ausente motivo suficiente para justificar a manutenção da redução de velocidade, em rodovia, a 40 km por hora também durante a madrugada, a multa aplicada pela infração - trafegar a 54 km - constatada por equipamento eletrônico (lombada) não guarda proporção com o fim colimado, que é o da segurança do trânsito. 3. Nulidade reconhecida. 4. Recurso provido." STJ, REsp 451.242 • ADMINISTRATIVO. INFRAÇÃO DE TRÂNSITO. EXCESSO DE VELOCIDADE DETECTADO POR EQUIPAMENTO ELETRÔNICO. MULTA. CABIMENTO. PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE INAPLICÁVEL. INTERESSE PÚBLICO QUE SE SOBREPÕE AO PARTICULAR. • 1. O Código de Trânsito Brasileiro permite ao administrador, no exercício do seu poder de polícia, insindicável pelo Judiciário, regular a velocidade considerando o local e o horário de tráfego. Em conseqüência, não malfere a lei o ato administrativo de polícia que fixa esses limites, porquanto a razoabilidade ou proporcionalidade da velocidade admitida é fruto da técnica do administrador, cuja aferição escapa ao poder judicante na esfera do recurso especial, quer pela invasão da matéria fática, quer pela intromissão indevida no âmbito do administrador. REsp 451.242 • 2. Os redutores eletrônicos de velocidade, em regra, sob a forma de "pardais" e barreiras eletrônicas, são frutos de acentuada preocupação da Administração Pública com os alarmantes índices de acidentes de trânsito causados pelo excesso de velocidade dos condutores de veículos automotores, mercê de legitimados pelo Código de Trânsito Brasileiro. • 3. A atitude do condutor de veículo em ultrapassar a velocidade estabelecida pela administração no exercício do seu poder de polícia desautoriza o cancelamento da multa ao pálio da proporcionalidade, posto implicar essa investida substituição do administrador pelo Judiciário. Supremacia do interesse público. • 4. Recurso especial provido. • (REsp 451.242/RS, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 11.02.2003, DJ 10.03.2003 p. 113) REsp 588253/RJ ADMINISTRATIVO - CÓDIGO DE TRÂNSITO BRASILEIRO - LIMITE DE VELOCIDADE DAS VIAS DE TRÂNSITO - CRITÉRIOS DE FIXAÇÃO - DISCRICIONARIEDADE DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA - NÃO OBSERVÂNCIA DO LIMITE ESTABELECIDO - MULTA PROCEDÊNCIA. - Os critérios adotados pela administração pública para fixação dos limites de velocidades nas vias de trânsito estão relacionadas à discricionariedade estabelecida no próprio CTB, não cabendo ao Poder Judiciário, salvo em caso de ilegalidade ou manifesto abuso de autoridade, adentrar no mérito do ato administrativo que os instituiu. - Recurso especial conhecido e provido. (REsp 588253/RJ, Rel. Ministro FRANCISCO PEÇANHA MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 18.08.2005, DJ 17.10.2005 p. 249) Os conceitos jurídicos indeterminados Caso gerador • 7o, inciso XIV, da Lei nº. 9.782/99: Art. 7º. Compete à ANVISA: (...) XIV - interditar, como medida de vigilância sanitária, os locais de fabricação, controle, importação, armazenamento, distribuição e venda de produtos e de prestação de serviços relativos à saúde, em caso de violação da legislação pertinente ou de risco iminente à saúde. Discricionariedade e conceito jurídico indeterminado • Conceito jurídico indeterminado – sua densificação, pelo Administrador, pode ser revista pelo PJ? Ex. “risco iminente à saúde”, “urgência”, “relevância” • 1ª corrente: sendo uma questão de interpretação, haveria uma única solução => sindicabilidade pelo PJ, à luz da motivação • 2ª corrente: zona de certeza negativa zona de certeza positiva zona de penumbra => espaço de escolha do administrador, insindicável pelo PJ (mesmas considerações acerca do juízo discricionário – revisão só “principiológica”) Discricionariedade técnica • Na discricionariedade técnica, discricionário? Duas correntes há propriamente juízo Sim, desde que haja mais de uma solução tecnicamente viável Não, porque sempre haverá 01 melhor técnica, não havendo espaço para juízo subjetivo STJ, AgRg no RMS 20.200/PA ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. IMPEDIMENTO DE RELATOR. INOVAÇÃO RECURSAL. NÃO-CABIMENTO. CONCURSO PÚBLICO. REEXAME DE PROVA SUBJETIVA. IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES. AGRAVO IMPROVIDO. (...). 2. A banca examinadora de concurso público elabora e avalia as provas com discricionariedade técnica. Assim, não há como o Poder Judiciário atuar para proceder à reavaliação da correção das provas realizadas, mormente quando adotados os mesmos critérios para todos os candidatos. 3. Hipótese que não se cuida de mero erro material, considerado aquele perceptível de plano, sem maiores indagações. Conclusão a respeito do direito líquido e certo invocado demandaria análise pormenorizada da resposta dada pelo recorrente à prova subjetiva, não apenas em confronto com a legislação processual, mas também com a orientação doutrinária a respeito do tema, o que não se insere, como referido acima, no âmbito de atuação do Poder Judiciário. 4. Demonstrado que a hipótese não se afasta dos demais casos já apreciados por esta Corte, não há óbice para que o relator, em decisão monocrática, negue seguimento ao recurso, com base no art. 557 do CPC. 5. Agravo regimental improvido. (AgRg no RMS 20.200/PA, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, QUINTA TURMA, julgado em 25.10.2007, DJ 17.12.2007 p. 225) Caso gerador • Poderia a ANVISA editar ato normativo esclarecendo o que a autoridade reguladora entenderá por “risco iminente à saúde”? Sob qual embasamento jurídico? • Quais os limites ao exercício dessa competência normativa? • Caso provocado, poderá o Poder Judiciário rever esse ato da Administração?