0 UNIVERSIDADE DO EXTREMO SUL CATARINENSE - UNESC CURSO DE PSICOLOGIA CRISTIANE DA SILVA VIEIRA ALVES VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CONTRA AS MULHERES E SUAS CONFIGURAÇÔES CRICIÚMA, JUNHO DE 2010 1 CRISTIANE DA SILVA VIEIRA ALVES VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CONTRA AS MULHERES E SUAS CONFIGURAÇÔES Trabalho de Conclusão de Curso, apresentado para obtenção do grau de Psicólogo no curso de Psicologia da Universidade do Extremo Sul Catarinense, UNESC. Orientadora: Profª Msc. Schirley dos Santos Garcia CRICIÚMA, JUNHO DE 2010 2 CRISTIANE DA SILVA VIEIRA ALVES VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CONTRA AS MULHERES E SUAS CONFIGURAÇÔES Trabalho de Conclusão de Curso aprovado pela Banca Examinadora para obtenção do Grau de Psicólogo, no Curso de Psicologia da Universidade do Extremo Sul Catarinense, UNESC, com Linha de Pesquisa em Gênero e Violência Doméstica Criciúma, 28 de junho de 2010. BANCA EXAMINADORA _____________________________________________________________ Profª Schirley dos Santos Garcia - Mestre - (UNESC) - Orientador ____________________________________________________________ Profª. Myrta Carlota Glauche Jaroszewski (UNESC) _______________________________________________________________ Profª. Maria Salete Francisco de Souza - Especialista - (CRAS) 3 Dedicatória A todas as mulheres que tiveram a coragem de denunciar seus agressores 4 “Violência gera violência, os fracos julgam e condenam, porem os fortes perdoam e compreendem” Augusto Cury 5 AGRADECIMENTOS Obrigada meu Deus, pelo dom da vida; Obrigada, minha flor de maracujá, por todas as vezes que não penteei seu cabelo e você não ficou brava; por todas as vezes que não fui tão “radical” e você não me cobrou e por você existir, pois sem você, nada seria como é Obrigada, marido, por estar em mim e comigo, sempre. Obrigada mãe, por aquele dia em que saístes para trabalhar e eu queria ir junto e me falastes para ficar quietinha que logo voltaria e foi a luta... Por ter sido mãe e pai tentando suprir a falta masculina em nossa casa e mesmo assim soube me educar... Obrigada Sogra, por praticamente me empurrar para aula, mesmo eu odiando os dias frios e de chuva; obrigada por me receber...e você sabe onde... Obrigada irmãos de sangue: Felipe, Muriel Obrigada irmãos de coração: Israel, Edson Obrigada cunhados: (agradecer cunhados é?..tudo bem, eles merecem) Derli, Felipe, Roseli e Gabriela Obrigada, minha amiga, Isabel, pela presença e apoio constante Obrigada Schirley, minha tão paciente orientadora 6 RESUMO A violência doméstica é uma questão histórica, social e cultural, que ainda hoje faz parte da realidade de muitas mulheres em lares brasileiros. É um problema universal que atinge milhares de pessoas num grande número de forma silenciosa e dissimulada. A cada quatro minutos uma mulher é agredida em seu próprio lar por uma pessoa com quem mantém relação de afeto e geralmente o agressor é o próprio marido ou companheiro. Esta pesquisa tem como tema conhecer o perfil da violência doméstica e suas configurações uma vez que são poucas as pesquisas voltadas para está área. O objetivo desta pesquisa é conhecer o contexto histórico e atual da violência doméstica, verificar os fatores e conseqüências relacionados à violência e saber quais as leis que protegem estas mulheres. Configura-se como sendo uma pesquisa de natureza bibliográfica sob uma perspectiva descritiva exploratória numa abordagem qualitativa. Pode-se afirmar com está pesquisa que a A violência doméstica trata-se de um fenômeno antigo e configura-se como uma questão histórica, cultural e que se torna palco de muita tristeza, angustia e dor para muitas mulheres brasileiras e que independe da situação sócia econômica. Palavras-chave: Violência Doméstica. Mulher. Leis de Proteção 7 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS Fundação SEADE -Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados) 8 SUMÁRIO INTRODUÇÃO ............................................................................................................9 1- MULHER E A HISTÓRIA......................................................................................11 1.1 Violência, atualidade e descaso.......................................................................14 2 DEFINIÇÃO DE VIOLÊNCIA .................................................................................19 2.1 Fatores relacionados com a violência.............................................................21 2.2 Conseqüências da violência ............................................................................22 2.3 Perfil do Agressor .............................................................................................23 3 LEI DE PROTEÇÃO A ESTAS MULHERES .........................................................26 3.1 Tipos de Violência Doméstica..........................................................................27 4 METODOLOGIA ....................................................................................................29 5 CONCLUSÃO ........................................................................................................31 REFERÊNCIAS.........................................................................................................33 9 INTRODUÇÃO A violência doméstica é um problema universal que atinge milhares de pessoas, em grande número de vezes de forma silenciosa e dissimulada. Ela não é recente. Segundo Morgado (2001), trata-se de um fenômeno antigo, presente em todas as classes sociais e em todas as sociedades, das mais desenvolvidas às mais vulneráveis economicamente, compreendendo um conjunto de relações sociais que complexificam sua natureza. Trata-se de um problema que atinge ambos os sexos e não costuma obedecer a nenhum nível social, econômico, religioso ou cultural específico. A sua análise é importante e relevante sob dois aspectos: primeiro, devido ao sofrimento indescritível que imputa às suas vítimas, muitas vezes silenciosas e, em segundo, porque, comprovadamente, a violência doméstica pode impedir um bom desenvolvimento físico, psicológico e social da vítima. Considera-se que a violência doméstica contra a mulher é um fenômeno sócio-histórico. Para refletirmos sobre as causas geradoras da violação dos direitos humanos e daquelas que estão relacionadas à violência contra a mulher, surge a necessidade de analisar as relações sociais estabelecidas na atual sociedade. Segundo Lobo (1998) as mulheres entraram no mercado de trabalho para aumentar a renda familiar, causada pela perda do poder de compra dos trabalhadores, a partir de 1984; por conta da dinâmica do crescimento do Brasil, que ocasionou a criação de grande número de novos empregos que exigiam habilidade e comportamento minucioso, características de mão de obra feminina. É nesse contexto histórico que a mulher entrou no mercado de trabalho. Melo (1998) indica grandes disparidades, no que se refere às rendas do trabalho no Brasil e que agrava ainda mais essa desigualdade, quando se faz um recorte de gênero, pois os homens, de maneira geral, obtinham, nesse período, praticamente o dobro das rendas do trabalho feminino. Ainda hoje, as profissões e funções, como o emprego doméstico onde as mulheres predominam, são desvalorizadas em relação aquelas em que há mais homens. Nesse sentido, fica clara a desigualdade, ainda hoje, entre homens e mulheres. Podemos observar, na própria construção da linguagem, onde o termo 10 universal usado para se referir ao ser humano é “Homem”. Faz-se necessária uma nova postura ética de igualdade para o combate ao machismo e a violência contra as mulheres. Segundo a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir, Erradicar a Violência Contra a Mulher, conhecida de Convenção de Belém do Pará realizada em 1994, “toda a mulher tem o direito ao reconhecimento, gozar, exercício e proteção de todos os direitos humanos e liberdades consagradas em todos os instrumentos regionais e internacionais relativos aos direitos humanos e das mulheres”. Segundo o Declaração Universal de Direitos Humanos (1948) Todos os homens nascem livres e iguais em dignidade e direitos [...] Todo homens tem capacidade para gozar os direitos e as garantias estabelecidas nessa declaração, sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento ou qualquer outra condição [...] Todo homem tem direito á vida, à liberdade e à segurança pessoal. Historicamente, é possível afirmar, que muitas foram às conquistas das mulheres em relação à inserção no trabalho, embora ainda muito se precise avançar para assegurar direitos inerentes à condição de igualdade de gênero. E este foi um dos motivos que impulsionou a pesquisar sobre o tema: Violência doméstica e suas configurações. Portanto esta pesquisa tem como objetivo geral conhecer o perfil da violência doméstica e suas configurações bem como através dos objetivos específicos conhecer o contexto histórico e atual da violência doméstica, verificar os fatores e conseqüências relacionados à violência e saber quais as leis que protegem as mulheres vítimas de violência doméstica. Configura-se como sendo uma pesquisa de natureza bibliográfica sob uma perspectiva descritiva exploratória numa abordagem qualitativa. Para o desenvolvimento desta foi necessário pesquisar temas relacionados com a violência sua história e atualidade, tipos de violências causas, conseqüências, Perfil da vítima e agressor e leis de proteção a estas mulheres. 11 1- MULHER E A HISTÓRIA Não é conveniente que o homem esteja só. Vou dar-lhe uma auxiliar semelhante a ele. (Bíblia, Génesis ) Violência doméstica, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), as mulheres são as que correm maiores riscos de serem vítimas desse tipo de violência. Segundo Alves (2009), o poder masculino sobre a esposa e filhos, no Brasil, foi legitimado, por exemplo, pelo Código civil, de 1916, que, inspirado no Direito Romano, identificava o status civil da mulher casada ao dos menores, silvícolas e alienados, tornando as esposas civilmente incapazes. Por meio desta legislação limitou-se o acesso das mulheres ao trabalho e à propriedade. Nesta época as mulheres brasileiras também não tinham direito de voto. A igreja teve uma grande influência na idéia de submissão da mulher ao homem ao longo da história. Na Bíblia Sagrada, no livro de Gênesis, a mulher era construída a partir de uma costela do homem, vindo depois da existência dele, para lhe fazer companhia. No mesmo livro bíblico, o primeiro pecado do mundo é provocado pelo desejo da mulher e pela desobediência de Eva ao oferecer do fruto proibido a Adão. O relato bíblico da perda do paraíso tem na mulher a grande vilã, e o homem como vítima da astuta mulher. Essa descrição bíblica impõe uma condição secundária à mulher, e ainda, atribui-lhe a culpa pela quebra do encanto do paraíso. Quando vista de forma literária, difundiu-se a condição de submissão feminina (ALVES, 2009). Antigamente as mulheres eram consideradas inferiores aos homens e se submetiam as ordens e humilhações que a cultura lhes continha, vista apenas como fonte doadora de amor, uma peça destinada a prestar serviços de alimentação, comodidade. Hoje ainda a mulher vive em uma sociedade desfavorável a ela, onde ainda desempenha um papel de submissão ao homem, embora tenham sido muitas as conquistas a mulher tem a obrigação de fazer os trabalhos domésticos, ainda ganha menos realizando as mesmas funções e ainda é tida como propriedade do marido (BUCHER, 2002) . 12 Historicamente, é possível afirmar, que muitas foram às conquistas das mulheres em relação à inserção no trabalho embora ainda muito se precise avançar para assegurar direitos inerentes a condição de igualdade de gênero. Com a entrada da mulher no mercado de trabalho, as famílias diminuíram o número de filhos e a mulher acumulou as funções externas ao trabalho doméstico, aumentando o estresse e alterando o equilíbrio das famílias (BUCHER, 2002). Ainda hoje, as profissões e funções, como o emprego doméstico onde as mulheres predominam, são desvalorizadas em relação aquelas em que há mais homens. Nesse sentido, fica clara a desigualdade entre homens e mulheres. Podemos observar, na própria construção da linguagem, onde o termo universal usado para se referir ao ser humano é “homem” (ALVES,2009). Historicamente, a consciência de gênero entre as mulheres apareceu pela primeira vez na Europa, particularmente na França e na Inglaterra, em meio às transformações que estavam ocorrendo devido ao capitalismo. Esse novo sistema desencadeou mudanças na organização familiar e se implantou nos ideais liberais de igualdade e na noção de indivíduo (SARDENBERG e COSTA,1994). Ao mesmo tempo em que estava sendo levantada essa bandeira de luta do feminismo, estava surgindo o capitalismo e, com ele, aparecendo uma força imperativa de acumulação regida pela busca crescente de lucros; com isso, todas as relações sociais, inclusive as familiares, assumiam características demarcadas pelas relações sociais de produção necessárias para o desenvolvimento (OLIVEIRA, 1997). O homem, reconhecido socialmente como chefe de família, tinha seu trabalho fora do lar remunerado, isto é, recebia por ele um salário, enquanto para as mulheres eram reservadas as tarefas relativas à reprodução da força de trabalho sem qualquer remuneração (SARDENBERG & COSTA, 1994). Com a Revolução Francesa, considerada a grande revolução burguesa, surge o feminismo. E uma das primeiras manifestações feministas aconteceu na França Revolucionária, liderada por mulheres francesas que exigiram da Assembléia Constituinte o estabelecimento da igualdade dos direitos entre os sexos, inclusive a liberdade de trabalho. Esse movimento feminista veio representar para as mulheres uma tentativa importante de ruptura com a história de submissão a que foram e são ainda impostas (SARDENBERG & COSTA,1994). 13 Mas, o que se observa é que, ao mesmo tempo em que a mulher foi mudando suas atitudes dentro das estruturas sociais, os valores tradicionais continuavam ainda dando autoridade aos homens. Herdeiras de uma cultura hierárquica e excludente e, apesar de se encontrarem maciçamente ativas no mercado de trabalho, as mulheres ainda carregam uma espécie de condenação a um lugar inferior e desvalorizado socialmente. Seja na cultura, como nas mentes dos agentes sociais, alimentam a idéia de que o lugar ideal e natural da mulher é no lar , na família e na reprodução (FONTANA , 2001, p.24). Na medida em que as mulheres foram conquistando avanços na educação e espaço no mercado de trabalho, o modelo tradicional de família (marido ganha-pão e esposa cuidadora), marcado fortemente por uma rígida divisão sexual do trabalho, foi cedendo lugar a modelos de família com menores desigualdades de gênero, embora uma situação de plena equidade ainda esteja longe de ser alcançada. A mulher ainda é vítima de uma cultura machista com conceitos arraigados, conservadores, em que predomina como força maior a figura do macho, detentor da última palavra, verdadeiro rei domiciliar onde se conserva a visão deturpada sobre o sexo feminino, apreciada, e até mesmo estimulada, por gerações em que a moldam como uma figura essencialmente frágil, dependente, sensível e muitas vezes até vista como problemática (SAFFIOTI, 1980). Para o autor é importante entender esses conceitos conservadores como uma construção social baseada na diferenciação biológica dos sexos, a qual se expressa através Introdução de relações de poder e subordinação, representada pela discriminação de funções, atividades, normas e condutas esperadas para homens e mulheres em cada sociedade. Neste sentido fica evidenciada a desigualdade entre homens e mulheres. Na Convenção Interamericana para prevenir Punir e Erradicar a Violência Contra a Mulher, mais conhecida como Convenção de Belém do Pará realizada em 1994, diz que “toda mulher tem direito ao reconhecimento, gozar, exercício e proteção de todos os direitos humanos e liberdades consagradas em todos os instrumentos regionais e internacionais relativos aos direitos humanos e das mulheres” (AGENDE, 2004). 14 1.1 Violência, atualidade e descaso Para refletir sobre as causas geradoras da violação dos direitos humanos e daquelas que estão relacionadas à violência contra a mulher, surge a necessidade de analisar as relações sociais estabelecidas na atual sociedade. Ao combinar os fatores de risco de âmbito individual com as constatações dos estudos culturais, o modelo ambiental contribui para o entendimento das razões pelas quais algumas sociedades e alguns indivíduos são mais violentos que outros, e por que as mulheres, especialmente as casadas, são tão continuamente vítimas de abuso. Fonte: Johns Hopkins University (2000) Existe um bom número de estudos, segundo o The Center of Comunication Programs, da Johns Hopkins University, (2000) que concordam sobre os diversos fatores, encontrados em cada um destes níveis, que aumentam a probabilidade de um homem abusar de sua parceira: • No âmbito individual, estes fatores incluem ter sofrido abuso quando criança, ter presenciado violência conjugal em casa, ter tido um pai ausente ou que rejeitava a família e o uso freqüente de bebidas alcoólicas. • No âmbito da família e dos relacionamentos, certos estudos culturais citaram o controle masculino da riqueza e da tomada de decisões no interior das famílias e os conflitos conjugais como fortes indicadores de abuso futuro. 15 • No âmbito da comunidade, o isolamento das mulheres e a falta de apoio social, bem como a existência de grupos de homens que toleram e legitimam a violência masculina, permitem prever índices mais elevados de violência. • No âmbito da sociedade, existem estudos em todo o mundo que demonstram que a violência contra as mulheres é mais comum onde os papéis de ambos os sexos são rigidamente definidos e cumpridos e onde o conceito de masculinidade está associado à valentia, honra masculina ou dominação. Outras normas culturais relacionadas ao abuso incluem a aprovação do castigo físico de mulheres e crianças, a aceitação da violência como forma de resolução de conflitos interpessoais, e a percepção de que os homens são proprietários das mulheres . De acordo com a Fundação Seade (Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados) citada por Schritzmeyer (2001), constatou-se que, no Brasil, a cada quatro minutos uma mulher é agredida em seu próprio lar por uma pessoa com quem mantém relação de afeto. As estatísticas disponíveis e os registros nas delegacias especializadas de crimes contra a mulher demonstram que 70% dos incidentes acontecem dentro de casa e que o agressor é o próprio marido ou companheiro. Uma pesquisa de opinião pública nacional sobre violência doméstica feita, em 2009, pela Data Pesquisa, do Senado, em todas as capitais verificou que o índice de violência doméstica aumentou entre os anos de 2005 a 2009. A pesquisa revelou também as diferentes razões que impedem a mulher de recorrer à Lei para enfrentar seus agressores. A principal delas é o medo do agressor. Apesar do medo ser a principal causa, outras motivações impedem a denúncia dos agressores. Na opinião de 62% das entrevistadas, pela Data Pesquisa, o fato de a mulher não poder mais retirar a acusação após a queixa faz com que ela desista de denunciar o agressor. 35% acham que a regra não impede a denúncia. A dependência econômica em relação ao agressor, a dificuldade em aceitar que um casamento acabou e o medo de novas agressões, são alguns dos motivos que impedem as vítimas de tornar o seu problema público e tomarem medidas para se protegerem Segundo a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir, Erradicar a Violência Contra a Mulher, conhecida de Convenção de Belém do Pará realizada em 16 1994, “toda a mulher tem o direito ao reconhecimento, gozar, exercício e proteção de todos os direitos humanos e liberdades consagradas em todos os instrumentos regionais e internacionais relativos aos direitos humanos e das mulheres”. Segundo o relatório Nacional de Direitos Humanos (2002, p. 9) Todos os homens nascem livres e iguais em dignidade e direitos [...] Todo homens tem capacidade para gozar os direitos e as garantias estabelecidas nessa declaração, sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento ou qualquer outra condição [...] Todo homem tem direito á vida, à liberdade e à segurança pessoal. Rago (1985, p. 62) diz que a trajetória da mulher em busca de seu espaço na sociedade começa quando “ela não quer mais para si o rótulo de frágil, e um novo modelo normativo de mulher prega novas formas de comportamento e etiqueta”. Conforme destaca Minayo (1994), não se conhece nenhuma sociedade onde a violência não tenha estado presente. A violência tem determinantes históricos e estruturais. Segundo a autora, desde tempos mais antigos existe uma preocupação do ser humano em entender a essência dessa demanda, sua natureza, suas origens e meios apropriados, a fim de atenuá-la, preveni-la e eliminá-la do contexto social. Estudiosos do comportamento violento (DAHLBERG et al, 2003) ressaltam que muitas pessoas cometem atos de violência com base em seus antecedentes culturais e em suas crenças, sem considerar, portanto, que estão praticando a violência. Mulheres que vivem com parceiros violentos têm maiores dificuldades para cuidar de si próprias, procurar emprego, estudar e desenvolver formas de viver com conforto e autonomia, contribuindo ainda mais para sua baixa auto-estima, sofrimento psíquico e social (ECHEBURÚA e CORRAl, 2006). Dados epidemiológicos mostram que esse tipo violência causa mais mortes às mulheres de 15 a 44 anos que o câncer, a malária, os acidentes de carro e as guerras. Suas várias formas de agressão incluem: assassinatos, estupros, abusos físicos, sexuais e emocionais, prostituição forçada, mutilação genital, violência racial, entre muitas outras (GOMES et al, 2005). 17 Embora as mulheres possam agredir seus parceiros masculinos, e a violência também possa se dar entre parceiros do mesmo sexo, a proporção da violência infligida pelo homem à sua companheira é devastadora, comparada aos primeiros. (KRUG, et al, 2002, p. 97) A violência tem se tornado cada vez mais tema de interesse para pesquisadores das áreas da saúde e das ciências sociais, e até mesmo de ciências como a arqueologia, ja que se constatou indícios de acontecimentos que confirmam a ocorrência de episódios de agressão física desde a época dos australopitecos. (MANGUINHOS, 2004) Ao que parece a humanidade praticamente nunca viveu um período onde não estivesse havendo guerras ou conflitos em algum lugar. A violência porém, não está compreendida apenas nos atos de agressão física e crueldade praticados em conflitos ou guerras. Ela está, sob muitos aspectos, inserida em nosso cotidiano de maneira explicita ou disfarçada de muitas formas (agressões físicas, verbais, morais e quaisquer outros comportamentos que tragam prejuízo intencional a outras pessoas).(GAIARSA, 1993) Essa violência tornou-se, de certa forma, parte de nosso cotidiano, algo como qualquer outro transtorno de nosso dia-a-dia. A fome, a miséria, as atrocidades assistidas no decorrer dos dias apresentam-se com naturalidade e indiferença para nossa sociedade e a todo o momento são vistas cenas dessa violência nos mais diversos segmentos de nosso cotidiano. A banalização desta violência faz parte da rotina em muitos lares (SILVA, 2002). Esses fatores contribuem para a falta de atenção devida a violência doméstica. A sociedade esta se mobilizado no enfrentamento da violência entre os cidadãos, mas, contudo, não consegue responder ao desafio da violência doméstica. Dentre as diversas modalidades de violência, a doméstica é uma realidade nos lares e independem de classe social, sexo, crenças ou religião. Entre todos os tipos de violência contra a mulher existente no mundo, aquela praticada no ambiente familiar é uma das mais cruéis, causando um medo constante e tirando a segurança de estar no próprio lar (SILVA, 2002). No Brasil, segundo a Organização Mundial da Saúde, uma em cada cinco mulheres (20%) já sofreu algum tipo de violência física, sexual ou outro abuso praticado por um homem (OMS). A violência contra as mulheres faz parte de uma seqüência crescente de episódios, incluindo mortes por homicídios, suicídios ou a 18 grande presença da ideação suicida, além de doenças sexualmente transmissíveis, doenças cardiovasculares e dores crônicas (SCHRAIBER et al, 2007). Schraiber (1999) ainda chama atenção ao fato de que a preocupação com o problema da violência é recente na história, o que estaria relacionado à modernidade e seus valores de liberdade e felicidade, consolidados na concepção de cidadania e dos direitos humanos. Com base nesses valores, determinadas práticas passaram a ser vistas como formas de violência. A partir da atuação do movimento de mulheres, comportamentos considerados "naturais" passaram a ser classificado como violência (impedir a mulher de trabalhar fora de casa, negar-lhe a possibilidade de sair só ou de ter amigas, impedi-la de escolher o tipo de roupa que deseja usar, impedir sua participação em atividades sociais, desqualificação e humilhações privadas ou em público, as relações sexuais forçadas dentro do casamento). 19 2 DEFINIÇÃO DE VIOLÊNCIA Violência é um termo que deriva do latim violentia significando vis, força e vigor e segundo o dicionário Aurélio violência seria ato violento, qualidade de violento ou até mesmo ato de violentar. A etimologia da palavra violência, porém, mais do que uma simples força, a violência pode ser compreendida como o próprio abuso da força. Essa violência acontece tanto em público como no privado A cada ano é responsável pela morte de milhares de pessoas em todo o mundo. Para cada pessoa que morre devido à violência, muitas outras são feridas ou sofrem devido a vários problemas físicos, sexuais, reprodutivos e mentais A Organização Mundial da Saúde (OMS) define a violência como o uso intencional de força ou de poder físico, de fato ou como ameaça, contra si mesmo, outra pessoa ou grupo ou comunidade, que cause ou tenha muita probabilidade de causar lesões, morte, danos psicológicos, transtornos de desenvolvimento ou privações. Porém esse é um fenômeno complexo, pois a noção do que são comportamentos aceitáveis e inaceitáveis, ou que constituem um dano, está influenciada pela cultura e encontra-se submetida a uma contínua revisão na medida em que os valores e as normas sociais se modificam (OMS, 2002). A violência doméstica é uma das formas mais covardes de violência pois, o lar, onde deveria ser o porto seguro é palco de cenários brutais. A violência familiar é uma questão histórica e cultural, que ainda hoje, infelizmente, faz parte da realidade de muitas mulheres nos lares brasileiros. É um problema universal que atinge milhares de pessoas em grande número de forma silenciosa e dissimulada. Segundo Morgado (2001) trata-se de um fenômeno antigo, presente em todas as classes sociais e em todas as sociedades desde as mais desenvolvidas até às mais vulneráveis economicamente. Trata-se de um problema que atinge ambos os sexos e não costuma obedecer a nenhum nível social, econômico, religioso ou cultural específico Considerada um fenômeno que tem várias causas, a violência é um processo de vitimização que se expressa em: 20 [...] atos com intenção de prejudicar, subtrair, subestimar e subjugar, envolvendo sempre um conteúdo de poder, quer seja intelectual quer seja físico, econômico, político ou social. Atingem de forma mais hostil os seres mais indefesos da sociedade, como as crianças e adolescentes, e também as mulheres sem, contudo, poupar os demais (ROCHA et al., 2001, p.96). De acordo com a declaração das Nações Unidas, de 1993, citada por Grossi (1996, p. 134) é compreendida como “qualquer violência de gênero, que resulta em danos psicológicos, físicos e sexuais, incluindo ameaças, coerção ou privação arbitrária da liberdade.” Segundo Silva (2006), a violência baseada no gênero é aquela decorrente das relações entre mulheres e homens, e geralmente é praticada pelo homem contra a mulher, mas pode ser também da mulher contra mulher ou do homem contra homem. Sua característica fundamental está nas relações de gênero onde o masculino e o feminino, são culturalmente construídos e determinam genericamente a violência A Convenção de Belém do Pará (1994), define: [...] a violência contra a mulher constitui uma violação aos direitos humanos e às liberdades fundamentais e limita total ou parcialmente à mulher o reconhecimento, gozo e exercício de tais direitos e liberdades [...] violência contra a mulher é qualquer ação ou conduta, baseada no gênero, que cause morte, dano físico, sexual ou psicológico à mulher, tanto no âmbito público como no privado. A violência pode ocorrer de maneira dissimulada, mas mesmo em suas formas leves ela se baseia na dominação de um gênero sobre outro. Violência Doméstica, segundo alguns autores, é o resultado de agressão física ao companheiro ou companheira. Qualquer mulher pode ser vitima de violência doméstica, não importando a classe social, raça, etnia, orientação sexual, renda, cultura, nível educacional, idade e religião Ela acontece porque, em nossa sociedade, muita gente ainda acha que o melhor jeito de resolver um conflito é a violência e que os homens são mais fortes e superiores do que as mulheres. É assim que, muitas vezes, os maridos, namorados, pais, irmãos, chefes e outros homens acham que têm o direito de impor suas vontades às mulheres. Ainda segundo Grossi (1996), quando a sociedade destina a mulher a um papel passivo e submisso, cria-se espaço para dominação masculina, através de um lento processo de mutilação feminina, muitas vezes considerada legítimo. Dessa 21 forma, a autora caracteriza a violência física como uma das formas mais exacerbadas de poder masculino. Minayo, (1994) diz que, essa violência não faz parte da natureza humana e que não tem raízes biológicas. Trata-se de um fenômeno biopsicossocial, mas seu limiar de criação e desenvolvimento é a vida em sociedade. Portanto, para entendêla, há que se observar as especificidades históricas, como política, economia, moral e das relações humanas. Já para Adorno (2009) violência é uma forma de ação na qual uma ou mais pessoas tentam impor a sua vontade contra terceiros, utilizando como meio o uso de ameaça ou a força. De acordo com Chauí (1992), acontece violência quando se trata um ser humano não como sujeito, mas como “coisa” e também quando se confunde diferença em desigualdade A violência contra a mulher é um fenômeno extremamente complexo, com raízes profundas nas relações de poder baseadas no gênero, na sexualidade, na auto-identidade e nas instituições sociais. (HEISE, 1995, p. 41), Diante desses fatos, a violência deve ser analisada em toda sua complexidade permitindo com isso melhor conhecimento da temática e maior capacitação para a formulação de políticas com o objetivo de enfrentá-la. 2.1 Fatores relacionados com a violência Para entender a violência, é necessário abordar aspectos individuais, psicológicos, biológicos, bem como componentes familiares, além de fatores culturais, sociais e econômicos. Hermann (2000) cita alguns componentes facilitadores do comportamento violento, entre eles a pobreza, o desemprego e o uso de drogas. Segundo o autor os problemas associados à pobreza não são, em si mesmos, geradores de violência, mas podem favorecer a eclosão de episódios violentos. Já o papel do álcool na violência entre parceiros pode ter várias hipóteses: o efeito desinibidor do álcool, explicado fisiologicamente, contribuiria para a eclosão desse tipo de violência; a expectativa social de que o álcool desinibe as pessoas, 22 fazendo com que elas ajam de modo insensato; poderia estar modelando esse comportamento; algumas pessoas poderiam conscientemente ingerir álcool para poder ter uma desculpa socialmente aceita para seu comportamento violento e talvez o uso pesado de álcool e a prática de agressão sejam apenas fatores de predição de um outro quadro, como personalidade impulsiva. (CAETANO et al, 2001) Existe ainda a questão do ciclo vicioso, onde segundo Cardoso (1997 apud MENEZES, 2000), estar inserido em um ambiente familiar no qual, constantemente, os pais são agressivos entre si, ou mesmo com os filhos, favorece a uma visão naturalizada da violência. São mulheres que cresceram vendo o pai bater na mãe, esta bater nos filhos, o irmão mais velho bater nos mais novos, reproduzindo um ciclo constante de violência. Desta forma, o apanhar passa a não simbolizar desamor, mas sim uma forma de se estruturar como pessoa, em que se submeter ao outro é um modelo de relação aprendido na infância. Ainda para Cardoso (1997 apud MENEZES, 2000, p.128) Sofrer violência na infância torna as pessoas inseguras, com baixa autoestima, com ausência de senso crítico sobre a violência e dificuldades de estabelecer relações positivas. Essas conseqüências repercutem na escolha que a mulher fará de seu futuro marido, bem como na sua reação frente à violência. A violência conjugal manifestada pelas agressões físicas e psicológicas entre marido e mulher no ambiente doméstico foi considerada por muito tempo, como um problema privado do casal. A partir dos anos 1980, a violência entre cônjuges passou a ser considerada como um problema social e de saúde pública, As mobilizações do movimento feminista contribuíram para o surgimento de espaços de apoio destinadas às mulheres que enfrentavam situações de violência (PELLEGRINI e MENEGHEL, 2009). 2.2 Conseqüências da violência As consequências da violência doméstica são delicadas e podem permanecer durante muito tempo. Além das marcas físicas, a violência doméstica costuma causar também vários danos emocionais, como: influências na vida sexual 23 da vítima, lesões graves, baixa auto-estima, dificuldade em criar laços, em construir relações. Em alguns casos, mais tarde, a vítima pode passar a ter papel de agressor, dependendo da gravidade do dano emocional. O Relatório Mundial sobre Violência e Saúde (KRUG et al, 2002, p.110) apresenta as conseqüências da violência, perpetrada pelo parceiro, à saúde da mulher, a saber: Conseqüências Físicas: Lesões Abdominais e Torácicas, Síndromes de Dores Crônicas, Incapacitações Físicas Parciais ou Permanentes, Fibromialgia, Fraturas, Doenças do Aparelho Digestivo, Síndrome do Cólon Irritável, Lesões Oculares, Ferimentos, Escoriações, Hematomas, Fraturas Recorrentes. Conseqüências Sexuais e Reprodutivas: Doenças Sexualmente Transmissíveis, Esterilidade, Dor Pélvica Crônica, Complicações na ravidez, Aborto Espontâneo, Aborto Praticado em Condições Perigosas, Gravidez Indesejada, Disfunção Sexual. Conseqüências Psíquicas e de Comportamento: Abuso de Álcool e outras drogas, Depressão e Ansiedade, Transtornos Alimentares e do Sono, Sentimentos de Culpa e de Vergonha, Fobias e Síndrome do Pânico, Baixa Auto-estima, Estresse Pós-Traumático, Transtornos Psicossomáticos, hábito de fumar, Comportamento Suicida e de Danos Autoinfligidos, Comportamento Sexual de Risco. Conseqüências Mortais: Mortalidade relacionada à AIDS, Mortalidade Materna, Homicídio, Suicídio. O efeito da violência contra a mulher, o maltrato, as humilhações, as agressões físicas, sexuais e psicológicas é devastador sobre a auto-estima da mulher. O medo que elas sentem diariamente, a insegurança pois nunca sabem o que poderá desencadear a fúria do agressor, a vergonha diante dos familiares e dos vizinhos, provoca ansiedade, depressão, dores de cabeça constantes. A violência nas relações de casal, expõe a vítima às doenças sexualmente transmissíveis, à gravidez indesejada, aos abortamentos em situação insegura e conseqüentemente mortalidade por causa materna. (SCHRAIBER, 1999) 2.3 Perfil do Agressor O homem violento, segundo Grossi (1996) impõe sua masculinidade e sujeita, pela força, sua companheira as suas vontades. Trata-se de um fenômeno mundial, que não respeita fronteira, raça ou classe social. O abuso do álcool é um forte agravante da violência doméstica física. 24 Observa-se um sentimento agudo de impotência nos homens desempregados sobretudo naqueles que são vítimas do desemprego de longa duração, na medida em que perderam, talvez em definitivo, seu papel social tradicionalmente considerado o mais importante: o de provedor das necessidades materiais da família [...] o poder apresenta duas faces: da potência e da impotência. (SAFIOTTI, 2003. p. 31) Para Bourdieu (1999) ser homem implica um “dever ser” na sociedade marcado pelas características corporais como a maneira de se manter de pé, de aprumar o corpo, de erguer a cabeça, uma postura e atitude que corresponde a uma maneira de pensar e agir que governa o homem de honra. Entretanto, a função social da identidade masculina construída nas interações pode trazer tensão, devido ao fato de que ser homem, muitas vezes implica no dever de afirmar sua virilidade. Essas atitudes de virilidades devem ser validadas pelos outros homens com o objetivo de ter o reconhecimento por parte dos outros e de fazer parte de um grupo de “verdadeiros homens” (BOURDIEU, 1999). Assim, comportamentos agressivos e baseados na violência podem estar sendo influenciados por estes modelos de “ser” masculinos construídos socialmente, pois atos como violentar, dominar, explorar ou oprimir podem existir devido ao medo “viril” que o homem tem de ser excluído do mundo dos “homens” sem fraquezas e daqueles que são chamados de “duros” tanto com seu próprio sentimento, quanto como sentimento do outro (BOURDIEU, 1999). Por outro lado, os comportamentos estereotipados dos homens marcados pelo machismo e sexismo influenciam o agir, o pensar e o modo de levar a vida. Observa-se que alguns homens apresentam dificuldade em demonstrar afeto e dialogar, isolando-se cada vez mais e não procurando ajuda. Isso contribui para que a relação violenta entre o casal se perpetue (KNAUTH, VÍCTORA & LEAL, 2006). Pesquisas científicas internacionais questionaram a associação entre o uso de drogas e violência doméstica. O Centro Canadense de Estatísticas Judiciais, no ano de 2000, conduziu um estudo que envolveu 7.707 mulheres casadas ou vivendo conjugalmente. Cerca de 4% dessas mulheres tinham sido vítimas de violência doméstica nos últimos 30 dias, na época da pesquisa. Inicialmente, os investigadores observaram que homens violentos eram muito mais freqüentemente descritos como bebedores pesados e 50% dos agressores haviam se alcoolizado no momento em que agrediram suas mulheres. (JOHNSON, 2000). Para Minayo e Deslandes (1998), o uso de álcool pelo homem apresentase como um significativo fator de risco para a violência do parceiro contra sua 25 mulher. Para Gomes (et al, 2002), em relação a esse tipo de associação, violência e drogas, vários estudiosos apontam que o álcool é a substância mais ligada as mudanças de comportamento, provocadas por efeitos psicofarmacológicos que desencadeiam a violência. Segundo dados divulgados no IV Congresso Português de Sociologia (DIAS, s.d), os agressores são principalmente homens. Em geral, o homem violento apresenta algumas características comuns: alcoolismo (álcool não só como circunstância, mas como hábito); desemprego (nível ocupacional reduzido); autoestima baixa; experiência com maus-tratos (as estatísticas colocam este fator entre os 40% e os 50% em termos de relação com essa prática); depressão; progressão da violência (a agressividade vai aumentando gradualmente, a ponto de a violência, ao atingir o limiar físico, se juntar à violência psicológica); e precocidade (surgem algumas reações durante a juventude, como que predizendo o que vai suceder no futuro) (COSTA, 2003) Ainda segundo o autor, vistos de fora, os agressores podem parecer responsáveis, dedicados, carinhosos e cidadãos exemplares. Muitas vezes o homem sente-se culpado, prometendo à companheira melhoria em relação ao futuro. No entanto, não consegue modificar-se e, em consequência, renova o sentimento de culpabilidade, bebe e passa a agredi-la. (COSTA, 2003) 26 3 LEI DE PROTEÇÃO A ESTAS MULHERES A violência contra o parceiro (a) refere-se a qualquer comportamento dentro de uma relação íntima que cause dano físico, psíquico ou sexual aos membros da relação. Este comportamento inclui agressões físicas, violência psicológica, relações sexuais forçadas e outras formas de coação sexual, além de diversos comportamentos dominantes como isolar uma pessoa da família ou amigos, vigiar seus movimentos ou restringir seu direito à informação ou à assistência (KRUG et al, 2002) Diante desse quadro de desordem, em agosto de 2006 foi sancionada, pelo Presidente da República do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva a Lei Maria da Penha, na qual há aumento no rigor das punições às agressões contra a mulher, quando ocorridas no ambiente doméstico ou familiar. Cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a o mulher, nos termos do § 8 do art. 226 da Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres e da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher; dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; altera o Código de Processo Penal, o Código Penal e a Lei de Execução Penal; e dá outras providências. (BRASIL, 2006) Segundo a lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006, ºArt. 7o são formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, entre outras: I - a violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua integridade ou saúde corporal; II - a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da auto-estima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação; III - a violência sexual, entendida como qualquer conduta que a constranja a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos; 27 IV - a violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades; V - a violência moral, entendida como qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria. (BRASIL, 2006) 3.1 Tipos de Violência Doméstica A violência doméstica abrange várias formas de violência que atingem as mulheres. Essas formas de violência são principalmente a violência física, a violência psíquica, a violência sexual. Alguns desses fatores são explicados abaixo. Quadro 1:Formas de Exercício da Violência Doméstica Coagir e ameaçar Intimidar Usar a violência emocional Isolar Minimizar, negar, condenar Instrumentalizar os filhos • Ameaçar provocar lesões na pessoa da vítima; • Ameaçar abandonar, suicidar-se, queixar-se do cônjuge à Segurança Social; • Coagir para prática de condutas ilícitas. • Atemorizar a propósito de olhares, atos, comportamentos; • Partir objetos; • Destruir pertences ou objetos pessoais do outro; • Maltratar os animais de companhia; • Exibir armas; • Desmoralizar; • Fazer com que o outro se sinta mal consigo próprio; • Insultar; • Fazer com que o outro se sinta mentalmente diminuído ou culpado; • Humilhar. • Controlar a vida do outro: com quem fala, o que lê, as deslocações; • Limitar o envolvimento externo do outro; • Usar o ciúme como justificação. • Desvalorizar a violência e não levar em conta as preocupações do outro; • Afirmar que as agressões ou a violência nunca existiram; • Transferir para o outro a responsabilidade pelo comportamento violento; • Afirmar que a culpa é do outro. • Fazer o outro se sentir culpado com relação aos filhos; • Usar os filhos para passar mensagens; • Aproveitar as visitas de amigos para atormentar, hostilizar; • Ameaçar levar de casa os filhos. 28 Utilizar “Privilégios machistas” Utilizar a violência econômica Fonte: Machado e Gonçalves (2003) • Tratar a mulher como criada; • Tomar sozinho todas as decisões importantes; • Ser o que define o papel da mulher e do homem. • Evitar que o outro tenha ou mantenha um emprego; • Forçar o pedido de dinheiro; • Fixar uma mesada; • Apossar-se do dinheiro do outro; • Impedir que o outro conheça ou aceda ao rendimento familiar. A violência contra o parceiro (a) se refere a qualquer comportamento dentro de uma relação íntima que cause dano físico, psíquico ou sexual aos membros da relação. Este comportamento inclui agressões físicas, violência psicológica, relações sexuais forçadas e outras formas de coação sexual, além de diversos comportamentos dominantes como isolar uma pessoa da família ou amigos, vigiar seus movimentos ou restringir seu direito à informação ou à assistência (KRUG et al, 2002). 29 4 METODOLOGIA Esta pesquisa configura-se como sendo de natureza bibliográfica, sob uma perspectiva descritiva exploratória e analítica numa abordagem qualitativa. Com relação à metodologia empregada na presente pesquisa desenvolveu-se o caráter bibliográfico combinado aos aspectos exploratório, analítico, descritivo e qualitativo, pois se percebeu que isso contribuiria ainda mais aos propósitos da pesquisa. Nesta direção, as abordagens qualitativa e exploratória não se opõem ou se excluem mutuamente como objeto de análise, pois a combinação entre ambas contribui para o enriquecimento e resolução do problema de pesquisa apresentado. De acordo com Gonzalez (2002, p.19) pode-se justificar a abordagem qualitativa, pois as experiências qualitativas são questão estritamente pessoal de qualquer ser vivo. São uns tipos de observações disponíveis de forma direta só ao portador da experiência, não a qualquer outra pessoa. Essa privacidade das observações experimentais as faz amplamente diferentes da observação objetiva daqueles que estão fora. Neste contexto a natureza bibliográfica justifica-se, pois, de acordo com Ruiz (1996, p. 57), qualquer espécie de pesquisa, em qualquer área, ”Supõe e exige pesquisa bibliográfica prévia, quer a maneira de atividade exploratória, quer para justificar os objetivos e contribuições da própria pesquisa”. No que concerne aos propósitos do referencial teórico, esta pesquisa pode ser caracterizada como descritiva e analítica, cuja contribuição teórica está focada na compreensão do fenômeno sob investigação por meio da identificação de conceitos e construtos assim como as implicações que configuram a análise. Deve-se destacar que, neste estudo, buscou-se sempre considerar aexistência da relação entre a realidade e o sujeito, haja vista serem estes os focos centrais do trabalho. Portanto, o tipo descritivo ocupa uma posição de destaque neste estudo, pois identifica as proposições básicas do objeto de estudo, assim como seus conceitos e variáveis. 30 A perspectiva exploratória também é uma constante no decorrer da pesquisa, porque, segundo Ruiz (1996, p. 61) “Para a delimitação que evoluirá durante a pesquisa, estreitando cada vez mais seu campo, concorre à pesquisa exploratória”. 31 5 CONCLUSÃO Com a realização desta pesquisa bibliográfica, tornou-se ainda mais possível reconhecer o quanto a violência doméstica é um problema social e de saúde pública, bem como perceber o quanto os danos gerados por esse ato são desastrosos para a vítima. A violência doméstica é um fenômeno que sempre esteve presente na história da humanidade desde os primórdios da formação das sociedades. No entanto, na contemporaneidade percebe-se manifestações no sentido de repressão, punição dos culpados, mas um grande déficit em relação aos atendimentos especializados a estas mulheres vítimas de violência doméstica. Notou-se que a violência doméstica contra mulheres vem sendo um problema social, cultural, ético e extremamente complexo, e se torna pouco visível em virtude do temor por parte das vitimas em denunciar o agressor, tornando-se, muitas vezes, um segredo familiar. Ainda ao estudar o processo histórico da mulher tornou-se possível perceber a importância dos movimentos feministas que combatem a violência doméstica contra as mulheres. Constatou-se que a violência doméstica é o tipo de violência que danifica a subjetividade feminina. Com isso, viu-se o quanto é urgente a prevenção da violência doméstica, não só para evitar que a mulher tenha uma ruptura em sua vida e sofra inúmeros danos, mas também para frear esse ciclo gerador de vítimas. É muito comum que esse ciclo se repita, com cada vez maior violência e intervalo menor entre as fases. A experiência mostra que, ou esse ciclo se repete indefinidamente, ou, pior, muitas vezes termina em tragédia, com uma lesão grave ou até o assassinato da mulher. Com esta pesquisa, pode-se perceber que as mulheres são as mais agredidas, e que na maioria dos casos o agressor é o marido/companheiro, com que ela possui laços afetivos, o que torna mais complicado suas consequências. Também se observou que as famílias as onde ocorre a violência são bastante disfuncionais, onde a violência contra as mulheres é vista como uma conseqüência de um ciclo evolutivo de conflitos e agressões. A violência é muitas vezes considerada como uma manifestação tipicamente masculina, uma espécie de “instrumento para a resolução de conflitos”. 32 Além dos danos causados pela violência em si, constatou-se que existem os possíveis danos secundários gerados por essa agressão: danos psíquicos, físicos, sociais e econômicos. 33 REFERÊNCIAS ALVES, José Eustáquio Diniz.:Pai Soturno, mulher submissa, filho aterrados, 2009. Disponível em<http://opensadorselvagem.org/ciencia-ehumanidades/demografia/pai-soturno-mulher-submissa-e-filhos-aterradosArtigo> Acesso: 12/04/2010 ADORNO, Sergio. Brasil nunca economizou violência para disciplinar. Publicado no Jornal Diário do Nordeste em 05/04/2009. Disponível em < http://www.nevusp.org/portugues/index.php> acesso em 11/04/2010 AGENDE. Ações em Gênero, Cidadania e Desenvolvimento: 10 anos da adoção da Convenção Interamericana para Previnir, Punir e Erradicar a Violência Contra a Mulher . Convenção de Belém do Pará. Brasília, Junho de 2004.. Bíblia Sagrada. Tradução da original mediante a versão de João Ferreira de Almeida. 2ª ed. São Paulo BOURDIEU, P. A dominação masculina. Bertrand Brasil. Rio de Janeiro,1999 BRASIL. LEI Nº 11.340, DE 7 DE AGOSTO DE 2006. Disponível em<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2006/Lei/L11340.htm>Acesso em:11/04/2010 Bucher JSN. A mulher e o trabalho. Rev Promoção de Saúde. 2002 CARDOSO, N.M.B. Mulher e maus tratos. In: STREY, Marlene Neves (Org.). Mulher e estudos de gênero. São Leopoldo: Unisinos, 1997. Apud MENEZES, Ana Luiza Teixeira de. Mulheres: fruto de dominação e fruta para libertação! In: STREY Marlene Neves et al (Org.). Construções e perspectivas em gênero. São Leopoldo: Unisinos, 2000. p. 125-134 CHAUÍ, M. Participando do debate sobre mulher e violência. In: FRANCHETTO, B.; CAVALCANTI, M.L.V.C. e HEIBORN, M.L. (Orgs.). Perspectivas antropológicas da mulher. Rio de Janeiro, Zahar Editora, 1992. CEPIA. Traduzindo a legislação com a perspectiva de Gênero n. 1. Instrumentos Internacionais de Proteção aos Direitos Humanos. Rio de Janeiro, 1999. 34 CONVENÇÃO Interamericana para Prevenir,Punir e Erradicar a Violência Contra a Mulher Convenção de Belém do Pará. 1994 DECLARAÇÃO Universal Dos Direitos Humanos. Adotada e proclamada pela resolução 217 A (III) da Assembléia Geral das Nações Unidas em 10 de dezembro de 1948 DESLANDES, Suely F. Care of children and adolescents suffering domestic violence: analysis of a service. Cad. Saúde Pública, Rio e Janeiro, vol.10, supl.1, p.177-187, 1994. ECHEBURÚA, E., & Corral, P., (2006). Manual de Violencia Familiar. Madrid: Siglo XXI. FONTANA, M. & SANTOS,S.F. Violência contra a mulher. In: Rede Nacional Feminista de Saúde e Direitos Reprodutivos. Saúde da Mulher e Direitos Reprodutivos: Dossiês, S. Paulo, Rede Saúde, dez. 2001.Disponível em < http://www.redesaude.org.br/dossies/html/dossieviolencia> Acesso em 12/04/2010 GAIARSA, José Ângelo. Agressão, Violência e Crueldade. São Paulo: Editora Gente, 1993. GOMES, Romeu; DESLANDES, Suely Ferreira; VEIGA, Márcia Motta et al. Por que as crianças são maltratadas?: Explicações para a prática de maus-tratos infantis na literatura. Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, vol.18, n.3, p.707-714, mayo/jun. 2002. Disponível em: <http://www.scielo.br>. Acesso em 10/05/2010. GOMES, et al, Violência contra a mulher: uma questão transnacional e transcultural das relações de gênero. In Brasil, Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Impacto da violência na saúde dos brasileiros / Ministério da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde, p. 117-140. Brasília: Ministério da Saúde 2005 GROSSI, K. Violência contra a mulher: implicações para os profissionais de saúde. In: LOPES, M. J. M.; MEYER, D. E.; WALDOW, V. R. (Orgs.) Gênero e Saúde. Porto Alegre: Artes Médicas, 1996. p.133-149. HEISE, L.,Gender-based abuse: The global epidemic. Cadernos de Saúde Pública, 10. 1995. 35 História. Ciência e. saúde –Manguinhos, vol.11, no.2, Rio de Janeiro, May/Aug. Arqueologia da agressividade humana: a violência sob uma perspectiva paleoepidemiológica. 2004 JOHNSON, J. The role of alcohol in male partner’s assault on wives. Journal of Drug Issues, Flórida, vol.30, p.725-740, 2000. Disponível em: < http://200.152.193.254/html/geral_comentario.htm> . Acesso em 01/03/2010. KNAUTH, D. R; VÍCTORA, C. G; & Leal, A. F. Liberdade, sexo e drogas: a vulnerabilidade de homens jovens das camadas populares. In Adorno, R. C. F; Alvarenga, A. T; & Vasconcellos, M. P. C. (org), Jovens, Trajetórias, Masculinidades e Direitos. Edusp. São Paulo, 2006 MACHADO, Carla; GONÇALVES, Rui Abrunhosa, Violência e Vítimas de Crimes. Coimbra: Quarteto. 2003 MINAYO, MCS; Deslandes SF. The complexity of relations between drugs, alcohol, and violence. Cad. Saúde Pública 1998; 14:.35-42. MINAYO, M. C. S. A violência social sob a perspectiva da saúde pública. Cadernos de Saúde Pública, 10 (supl. 1): p. 7-18, 1994. OLIVEIRA, M. Homem e mulher a caminho do século XXI. São Paulo, Ática, 1997. PELLEGRINI, Tais Barcellos; MENEGHEL, Stela Nazareth. Um olhar ao homemagressor brasileiro: Estudos sobre a construção da masculinidade e a violência intrafamiliar. Violência e Políticas Públicas. 2009 Disponível em < http://www.apbarap.com.ar/descargas/rap_47/33-Pellegrini.pdf> Acesso: 15/04/2010 RAGO, L.M. Do cabaré ao lar: a utopia da cidade disciplinar. Brasil: 1890 – 1930. Rio de Janeiro: Paz e Terra. 1985 ROCHA, C.R.M; TASSIANO, C.M.L.M; SANTANA, J.S.S. Acompanhamento dos adolescentes na família. In: ABEn. Associação Brasileira de Enfermagem. Adolescer: compreender, atuar, acolher. Brasília (DF): Associação Brasileira de Enfermagem, Ministério da Saúde, 2001. p. 38 –44. KRUG, EG, et al. Relatório mundial sobre a violência e saúde. Genebra: Organização Mundial de Saúde; 2002. 36 SAFIOTTI, Heleieth. I.B. Violência Estrutural e de Gênero- mulher gosta de apanhar? In: BRASIL. Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres. Programa de Prevenção, assistência e combate à violência contra a mulher. Plano Nacional: Diálogos sobre Violência Domestica e gênero: Construindo Políticas Públicas. Brasília: A secretaria, 2003 SAFFIOTI,H. Prefácio. In : Langley,R. & levy, R. Mulheres espancadas, fenômeno invisível . Hucitec , São Paulo, Hucitec,1980. SARDENBERG, C.M.B & COSTA,A.C.A. Feminismos feministas e movimentos sociais. In (orgs.) Brandão & Bingemer. Mulher e relações de gênero. Loyola, 1994 p 81-112. SCHRAIBER, L. B. D`OLIVEIRA, A. F. P. L. Violência contra mulheres: Interfaces com a saúde: Interface-comunicação, saúde, educação, Botucatu, v.3, n. 5, p.1126,1999. SCHRITZMEYER ALP. Abusos imponderáveis: limites dos registros oficiais e das políticas públicas. In: Jornada Psicanalítica – “ABUSO”. São Paulo; 2001. SILVA, Junior Edison Miguel da. A violência de gênero na Lei Maria da Penha . Disponível em:<http://www.direitonet.com.br/artigos/x/29/26/2926>. Acesso em: 23 abril 2010 SILVA, Lygia Maria Pereira da. Violência doméstica contra a criança e o Adolescente. Recife: EDUPE, 2002 37 Presidência da República Casa Civil Subchefia para Assuntos Jurídicos LEI Nº 11.340, DE 7 DE AGOSTO DE 2006. Cria mecanismos para coibir a violência doméstica o e familiar contra a mulher, nos termos do § 8 do art. 226 da Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres e da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher; dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; altera o Código de Processo Penal, o Código Penal e a Lei de Execução Penal; e dá outras providências. O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei: TÍTULO I DISPOSIÇÕES PRELIMINARES o Art. 1 Esta Lei cria mecanismos para coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra o a mulher, nos termos do § 8 do art. 226 da Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Violência contra a Mulher, da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher e de outros tratados internacionais ratificados pela República Federativa do Brasil; dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; e estabelece medidas de assistência e proteção às mulheres em situação de violência doméstica e familiar. o Art. 2 Toda mulher, independentemente de classe, raça, etnia, orientação sexual, renda, cultura, nível educacional, idade e religião, goza dos direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sendo-lhe asseguradas as oportunidades e facilidades para viver sem violência, preservar sua saúde física e mental e seu aperfeiçoamento moral, intelectual e social. 38 o Art. 3 Serão asseguradas às mulheres as condições para o exercício efetivo dos direitos à vida, à segurança, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, à moradia, ao acesso à justiça, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivência familiar e comunitária. o § 1 O poder público desenvolverá políticas que visem garantir os direitos humanos das mulheres no âmbito das relações domésticas e familiares no sentido de resguardá-las de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. o § 2 Cabe à família, à sociedade e ao poder público criar as condições necessárias para o efetivo exercício dos direitos enunciados no caput. o Art. 4 Na interpretação desta Lei, serão considerados os fins sociais a que ela se destina e, especialmente, as condições peculiares das mulheres em situação de violência doméstica e familiar. TÍTULO II DA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER CAPÍTULO I DISPOSIÇÕES GERAIS o Art. 5 Para os efeitos desta Lei, configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial: I - no âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas; II - no âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa; III - em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação. Parágrafo único. As relações pessoais enunciadas neste artigo independem de orientação sexual. o Art. 6 A violência doméstica e familiar contra a mulher constitui uma das formas de violação dos direitos humanos. CAPÍTULO II DAS FORMAS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER o Art. 7 São formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, entre outras: I - a violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua integridade ou saúde corporal; II - a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da auto-estima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, 39 constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação; III - a violência sexual, entendida como qualquer conduta que a constranja a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos; IV - a violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades; injúria. V - a violência moral, entendida como qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou TÍTULO III DA ASSISTÊNCIA À MULHER EM SITUAÇÃO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CAPÍTULO I DAS MEDIDAS INTEGRADAS DE PREVENÇÃO o Art. 8 A política pública que visa coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher far-seá por meio de um conjunto articulado de ações da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios e de ações não-governamentais, tendo por diretrizes: I - a integração operacional do Poder Judiciário, do Ministério Público e da Defensoria Pública com as áreas de segurança pública, assistência social, saúde, educação, trabalho e habitação; II - a promoção de estudos e pesquisas, estatísticas e outras informações relevantes, com a perspectiva de gênero e de raça ou etnia, concernentes às causas, às conseqüências e à freqüência da violência doméstica e familiar contra a mulher, para a sistematização de dados, a serem unificados nacionalmente, e a avaliação periódica dos resultados das medidas adotadas; III - o respeito, nos meios de comunicação social, dos valores éticos e sociais da pessoa e da família, de forma a coibir os papéis estereotipados que legitimem ou exacerbem a violência doméstica o o e familiar, de acordo com o estabelecido no inciso III do art. 1 , no inciso IV do art. 3 e no inciso IV do art. 221 da Constituição Federal; IV - a implementação de atendimento policial especializado para as mulheres, em particular nas Delegacias de Atendimento à Mulher; V - a promoção e a realização de campanhas educativas de prevenção da violência doméstica e familiar contra a mulher, voltadas ao público escolar e à sociedade em geral, e a difusão desta Lei e dos instrumentos de proteção aos direitos humanos das mulheres; VI - a celebração de convênios, protocolos, ajustes, termos ou outros instrumentos de promoção de parceria entre órgãos governamentais ou entre estes e entidades não-governamentais, tendo por objetivo a implementação de programas de erradicação da violência doméstica e familiar contra a mulher; 40 VII - a capacitação permanente das Polícias Civil e Militar, da Guarda Municipal, do Corpo de Bombeiros e dos profissionais pertencentes aos órgãos e às áreas enunciados no inciso I quanto às questões de gênero e de raça ou etnia; VIII - a promoção de programas educacionais que disseminem valores éticos de irrestrito respeito à dignidade da pessoa humana com a perspectiva de gênero e de raça ou etnia; IX - o destaque, nos currículos escolares de todos os níveis de ensino, para os conteúdos relativos aos direitos humanos, à eqüidade de gênero e de raça ou etnia e ao problema da violência doméstica e familiar contra a mulher. CAPÍTULO II DA ASSISTÊNCIA À MULHER EM SITUAÇÃO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR o Art. 9 A assistência à mulher em situação de violência doméstica e familiar será prestada de forma articulada e conforme os princípios e as diretrizes previstos na Lei Orgânica da Assistência Social, no Sistema Único de Saúde, no Sistema Único de Segurança Pública, entre outras normas e políticas públicas de proteção, e emergencialmente quando for o caso. o § 1 O juiz determinará, por prazo certo, a inclusão da mulher em situação de violência doméstica e familiar no cadastro de programas assistenciais do governo federal, estadual e municipal. o § 2 O juiz assegurará à mulher em situação de violência doméstica e familiar, para preservar sua integridade física e psicológica: I - acesso prioritário à remoção quando servidora pública, integrante da administração direta ou indireta; II - manutenção do vínculo trabalhista, quando necessário o afastamento do local de trabalho, por até seis meses. o § 3 A assistência à mulher em situação de violência doméstica e familiar compreenderá o acesso aos benefícios decorrentes do desenvolvimento científico e tecnológico, incluindo os serviços de contracepção de emergência, a profilaxia das Doenças Sexualmente Transmissíveis (DST) e da Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (AIDS) e outros procedimentos médicos necessários e cabíveis nos casos de violência sexual. CAPÍTULO III DO ATENDIMENTO PELA AUTORIDADE POLICIAL Art. 10. Na hipótese da iminência ou da prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, a autoridade policial que tomar conhecimento da ocorrência adotará, de imediato, as providências legais cabíveis. Parágrafo único. Aplica-se o disposto no caput deste artigo ao descumprimento de medida protetiva de urgência deferida. Art. 11. No atendimento à mulher em situação de violência doméstica e familiar, a autoridade policial deverá, entre outras providências: I - garantir proteção policial, quando necessário, comunicando de imediato ao Ministério Público e ao Poder Judiciário; II - encaminhar a ofendida ao hospital ou posto de saúde e ao Instituto Médico Legal; 41 III - fornecer transporte para a ofendida e seus dependentes para abrigo ou local seguro, quando houver risco de vida; IV - se necessário, acompanhar a ofendida para assegurar a retirada de seus pertences do local da ocorrência ou do domicílio familiar; V - informar à ofendida os direitos a ela conferidos nesta Lei e os serviços disponíveis. Art. 12. Em todos os casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, feito o registro da ocorrência, deverá a autoridade policial adotar, de imediato, os seguintes procedimentos, sem prejuízo daqueles previstos no Código de Processo Penal: I - ouvir a ofendida, lavrar o boletim de ocorrência e tomar a representação a termo, se apresentada; II - colher todas as provas que servirem para o esclarecimento do fato e de suas circunstâncias; III - remeter, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, expediente apartado ao juiz com o pedido da ofendida, para a concessão de medidas protetivas de urgência; IV - determinar que se proceda ao exame de corpo de delito da ofendida e requisitar outros exames periciais necessários; V - ouvir o agressor e as testemunhas; VI - ordenar a identificação do agressor e fazer juntar aos autos sua folha de antecedentes criminais, indicando a existência de mandado de prisão ou registro de outras ocorrências policiais contra ele; VII - remeter, no prazo legal, os autos do inquérito policial ao juiz e ao Ministério Público. o § 1 O pedido da ofendida será tomado a termo pela autoridade policial e deverá conter: I - qualificação da ofendida e do agressor; II - nome e idade dos dependentes; III - descrição sucinta do fato e das medidas protetivas solicitadas pela ofendida. o o § 2 A autoridade policial deverá anexar ao documento referido no § 1 o boletim de ocorrência e cópia de todos os documentos disponíveis em posse da ofendida. o § 3 Serão admitidos como meios de prova os laudos ou prontuários médicos fornecidos por hospitais e postos de saúde. TÍTULO IV DOS PROCEDIMENTOS CAPÍTULO I DISPOSIÇÕES GERAIS Art. 13. Ao processo, ao julgamento e à execução das causas cíveis e criminais decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a mulher aplicar-se-ão as normas dos Códigos de 42 Processo Penal e Processo Civil e da legislação específica relativa à criança, ao adolescente e ao idoso que não conflitarem com o estabelecido nesta Lei. Art. 14. Os Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, órgãos da Justiça Ordinária com competência cível e criminal, poderão ser criados pela União, no Distrito Federal e nos Territórios, e pelos Estados, para o processo, o julgamento e a execução das causas decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a mulher. Parágrafo único. Os atos processuais poderão realizar-se em horário noturno, conforme dispuserem as normas de organização judiciária. Art. 15. É competente, por opção da ofendida, para os processos cíveis regidos por esta Lei, o Juizado: I - do seu domicílio ou de sua residência; II - do lugar do fato em que se baseou a demanda; III - do domicílio do agressor. Art. 16. Nas ações penais públicas condicionadas à representação da ofendida de que trata esta Lei, só será admitida a renúncia à representação perante o juiz, em audiência especialmente designada com tal finalidade, antes do recebimento da denúncia e ouvido o Ministério Público. Art. 17. É vedada a aplicação, nos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, de penas de cesta básica ou outras de prestação pecuniária, bem como a substituição de pena que implique o pagamento isolado de multa. CAPÍTULO II DAS MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA Seção I Disposições Gerais Art. 18. Recebido o expediente com o pedido da ofendida, caberá ao juiz, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas: I - conhecer do expediente e do pedido e decidir sobre as medidas protetivas de urgência; caso; II - determinar o encaminhamento da ofendida ao órgão de assistência judiciária, quando for o III - comunicar ao Ministério Público para que adote as providências cabíveis. Art. 19. As medidas protetivas de urgência poderão ser concedidas pelo juiz, a requerimento do Ministério Público ou a pedido da ofendida. o § 1 As medidas protetivas de urgência poderão ser concedidas de imediato, independentemente de audiência das partes e de manifestação do Ministério Público, devendo este ser prontamente comunicado. o § 2 As medidas protetivas de urgência serão aplicadas isolada ou cumulativamente, e poderão ser substituídas a qualquer tempo por outras de maior eficácia, sempre que os direitos reconhecidos nesta Lei forem ameaçados ou violados. 43 o § 3 Poderá o juiz, a requerimento do Ministério Público ou a pedido da ofendida, conceder novas medidas protetivas de urgência ou rever aquelas já concedidas, se entender necessário à proteção da ofendida, de seus familiares e de seu patrimônio, ouvido o Ministério Público. Art. 20. Em qualquer fase do inquérito policial ou da instrução criminal, caberá a prisão preventiva do agressor, decretada pelo juiz, de ofício, a requerimento do Ministério Público ou mediante representação da autoridade policial. Parágrafo único. O juiz poderá revogar a prisão preventiva se, no curso do processo, verificar a falta de motivo para que subsista, bem como de novo decretá-la, se sobrevierem razões que a justifiquem. Art. 21. A ofendida deverá ser notificada dos atos processuais relativos ao agressor, especialmente dos pertinentes ao ingresso e à saída da prisão, sem prejuízo da intimação do advogado constituído ou do defensor público. Parágrafo único. A ofendida não poderá entregar intimação ou notificação ao agressor. Seção II Das Medidas Protetivas de Urgência que Obrigam o Agressor Art. 22. Constatada a prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos desta Lei, o juiz poderá aplicar, de imediato, ao agressor, em conjunto ou separadamente, as seguintes medidas protetivas de urgência, entre outras: I - suspensão da posse ou restrição do porte de armas, com comunicação ao órgão o competente, nos termos da Lei n 10.826, de 22 de dezembro de 2003; II - afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida; III - proibição de determinadas condutas, entre as quais: a) aproximação da ofendida, de seus familiares e das testemunhas, fixando o limite mínimo de distância entre estes e o agressor; b) contato com a ofendida, seus familiares e testemunhas por qualquer meio de comunicação; c) freqüentação de determinados lugares a fim de preservar a integridade física e psicológica da ofendida; IV - restrição ou suspensão de visitas aos dependentes menores, ouvida a equipe de atendimento multidisciplinar ou serviço similar; V - prestação de alimentos provisionais ou provisórios. o § 1 As medidas referidas neste artigo não impedem a aplicação de outras previstas na legislação em vigor, sempre que a segurança da ofendida ou as circunstâncias o exigirem, devendo a providência ser comunicada ao Ministério Público. o § 2 Na hipótese de aplicação do inciso I, encontrando-se o agressor nas condições o o mencionadas no caput e incisos do art. 6 da Lei n 10.826, de 22 de dezembro de 2003, o juiz comunicará ao respectivo órgão, corporação ou instituição as medidas protetivas de urgência concedidas e determinará a restrição do porte de armas, ficando o superior imediato do agressor responsável pelo cumprimento da determinação judicial, sob pena de incorrer nos crimes de prevaricação ou de desobediência, conforme o caso. 44 o § 3 Para garantir a efetividade das medidas protetivas de urgência, poderá o juiz requisitar, a qualquer momento, auxílio da força policial. o § 4 Aplica-se às hipóteses previstas neste artigo, no que couber, o disposto no caput e nos §§ 5 e 6º do art. 461 da Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973 (Código de Processo Civil). o Seção III Das Medidas Protetivas de Urgência à Ofendida Art. 23. Poderá o juiz, quando necessário, sem prejuízo de outras medidas: I - encaminhar a ofendida e seus dependentes a programa oficial ou comunitário de proteção ou de atendimento; II - determinar a recondução da ofendida e a de seus dependentes ao respectivo domicílio, após afastamento do agressor; III - determinar o afastamento da ofendida do lar, sem prejuízo dos direitos relativos a bens, guarda dos filhos e alimentos; IV - determinar a separação de corpos. Art. 24. Para a proteção patrimonial dos bens da sociedade conjugal ou daqueles de propriedade particular da mulher, o juiz poderá determinar, liminarmente, as seguintes medidas, entre outras: I - restituição de bens indevidamente subtraídos pelo agressor à ofendida; II - proibição temporária para a celebração de atos e contratos de compra, venda e locação de propriedade em comum, salvo expressa autorização judicial; III - suspensão das procurações conferidas pela ofendida ao agressor; IV - prestação de caução provisória, mediante depósito judicial, por perdas e danos materiais decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a ofendida. Parágrafo único. Deverá o juiz oficiar ao cartório competente para os fins previstos nos incisos II e III deste artigo. CAPÍTULO III DA ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO Art. 25. O Ministério Público intervirá, quando não for parte, nas causas cíveis e criminais decorrentes da violência doméstica e familiar contra a mulher. Art. 26. Caberá ao Ministério Público, sem prejuízo de outras atribuições, nos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, quando necessário: I - requisitar força policial e serviços públicos de saúde, de educação, de assistência social e de segurança, entre outros; II - fiscalizar os estabelecimentos públicos e particulares de atendimento à mulher em situação de violência doméstica e familiar, e adotar, de imediato, as medidas administrativas ou judiciais cabíveis no tocante a quaisquer irregularidades constatadas; 45 III - cadastrar os casos de violência doméstica e familiar contra a mulher. CAPÍTULO IV DA ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA Art. 27. Em todos os atos processuais, cíveis e criminais, a mulher em situação de violência doméstica e familiar deverá estar acompanhada de advogado, ressalvado o previsto no art. 19 desta Lei. Art. 28. É garantido a toda mulher em situação de violência doméstica e familiar o acesso aos serviços de Defensoria Pública ou de Assistência Judiciária Gratuita, nos termos da lei, em sede policial e judicial, mediante atendimento específico e humanizado. TÍTULO V DA EQUIPE DE ATENDIMENTO MULTIDISCIPLINAR Art. 29. Os Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher que vierem a ser criados poderão contar com uma equipe de atendimento multidisciplinar, a ser integrada por profissionais especializados nas áreas psicossocial, jurídica e de saúde. Art. 30. Compete à equipe de atendimento multidisciplinar, entre outras atribuições que lhe forem reservadas pela legislação local, fornecer subsídios por escrito ao juiz, ao Ministério Público e à Defensoria Pública, mediante laudos ou verbalmente em audiência, e desenvolver trabalhos de orientação, encaminhamento, prevenção e outras medidas, voltados para a ofendida, o agressor e os familiares, com especial atenção às crianças e aos adolescentes. Art. 31. Quando a complexidade do caso exigir avaliação mais aprofundada, o juiz poderá determinar a manifestação de profissional especializado, mediante a indicação da equipe de atendimento multidisciplinar. Art. 32. O Poder Judiciário, na elaboração de sua proposta orçamentária, poderá prever recursos para a criação e manutenção da equipe de atendimento multidisciplinar, nos termos da Lei de Diretrizes Orçamentárias. TÍTULO VI DISPOSIÇÕES TRANSITÓRIAS Art. 33. Enquanto não estruturados os Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, as varas criminais acumularão as competências cível e criminal para conhecer e julgar as causas decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, observadas as previsões do Título IV desta Lei, subsidiada pela legislação processual pertinente. Parágrafo único. Será garantido o direito de preferência, nas varas criminais, para o processo e o julgamento das causas referidas no caput. TÍTULO VII DISPOSIÇÕES FINAIS Art. 34. A instituição dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher poderá ser acompanhada pela implantação das curadorias necessárias e do serviço de assistência judiciária. 46 Art. 35. A União, o Distrito Federal, os Estados e os Municípios poderão criar e promover, no limite das respectivas competências: I - centros de atendimento integral e multidisciplinar para mulheres e respectivos dependentes em situação de violência doméstica e familiar; II - casas-abrigos para mulheres e respectivos dependentes menores em situação de violência doméstica e familiar; III - delegacias, núcleos de defensoria pública, serviços de saúde e centros de perícia médicolegal especializados no atendimento à mulher em situação de violência doméstica e familiar; IV - programas e campanhas de enfrentamento da violência doméstica e familiar; V - centros de educação e de reabilitação para os agressores. Art. 36. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios promoverão a adaptação de seus órgãos e de seus programas às diretrizes e aos princípios desta Lei. Art. 37. A defesa dos interesses e direitos transindividuais previstos nesta Lei poderá ser exercida, concorrentemente, pelo Ministério Público e por associação de atuação na área, regularmente constituída há pelo menos um ano, nos termos da legislação civil. Parágrafo único. O requisito da pré-constituição poderá ser dispensado pelo juiz quando entender que não há outra entidade com representatividade adequada para o ajuizamento da demanda coletiva. Art. 38. As estatísticas sobre a violência doméstica e familiar contra a mulher serão incluídas nas bases de dados dos órgãos oficiais do Sistema de Justiça e Segurança a fim de subsidiar o sistema nacional de dados e informações relativo às mulheres. Parágrafo único. As Secretarias de Segurança Pública dos Estados e do Distrito Federal poderão remeter suas informações criminais para a base de dados do Ministério da Justiça. Art. 39. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, no limite de suas competências e nos termos das respectivas leis de diretrizes orçamentárias, poderão estabelecer dotações orçamentárias específicas, em cada exercício financeiro, para a implementação das medidas estabelecidas nesta Lei. Art. 40. As obrigações previstas nesta Lei não excluem outras decorrentes dos princípios por ela adotados. Art. 41. Aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher, o independentemente da pena prevista, não se aplica a Lei n 9.099, de 26 de setembro de 1995. o Art. 42. O art. 313 do Decreto-Lei n 3.689, de 3 de outubro de 1941 (Código de Processo Penal), passa a vigorar acrescido do seguinte inciso IV: “Art. 313. ................................................. ................................................................ IV - se o crime envolver violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos da lei específica, para garantir a execução das medidas protetivas de urgência.” (NR) 47 o Art. 43. A alínea f do inciso II do art. 61 do Decreto-Lei n 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), passa a vigorar com a seguinte redação: “Art. 61. .................................................. ................................................................. II - ............................................................ ................................................................. f) com abuso de autoridade ou prevalecendo-se de relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade, ou com violência contra a mulher na forma da lei específica; ........................................................... ” (NR) Art. 44. O art. 129 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), passa a vigorar com as seguintes alterações: “Art. 129. .................................................. .................................................................. o § 9 Se a lesão for praticada contra ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou companheiro, ou com quem conviva ou tenha convivido, ou, ainda, prevalecendo-se o agente das relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade: Pena - detenção, de 3 (três) meses a 3 (três) anos. .................................................................. o § 11. Na hipótese do § 9 deste artigo, a pena será aumentada de um terço se o crime for cometido contra pessoa portadora de deficiência.” (NR) o Art. 45. O art. 152 da Lei n 7.210, de 11 de julho de 1984 (Lei de Execução Penal), passa a vigorar com a seguinte redação: “Art. 152. ................................................... Parágrafo único. Nos casos de violência doméstica contra a mulher, o juiz poderá determinar o comparecimento obrigatório do agressor a programas de recuperação e reeducação.” (NR) Art. 46. Esta Lei entra em vigor 45 (quarenta e cinco) dias após sua publicação. o o Brasília, 7 de agosto de 2006; 185 da Independência e 118 da República. LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA Dilma Rousseff Este texto não substitui o publicado no D.O.U. de 8.8.2006 48