0
UNIVERSIDADE DO EXTREMO SUL CATARINENSE - UNESC
CURSO DE PSICOLOGIA
CRISTIANE DA SILVA VIEIRA ALVES
VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CONTRA AS MULHERES E SUAS
CONFIGURAÇÔES
CRICIÚMA, JUNHO DE 2010
1
CRISTIANE DA SILVA VIEIRA ALVES
VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CONTRA AS MULHERES E SUAS
CONFIGURAÇÔES
Trabalho de Conclusão de Curso, apresentado
para obtenção do grau de Psicólogo no curso
de Psicologia da Universidade do Extremo Sul
Catarinense, UNESC.
Orientadora: Profª Msc. Schirley dos Santos
Garcia
CRICIÚMA, JUNHO DE 2010
2
CRISTIANE DA SILVA VIEIRA ALVES
VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CONTRA AS MULHERES E SUAS
CONFIGURAÇÔES
Trabalho de Conclusão de Curso aprovado pela
Banca Examinadora para obtenção do Grau de
Psicólogo, no Curso de Psicologia da
Universidade do Extremo Sul Catarinense,
UNESC, com Linha de Pesquisa em Gênero e
Violência Doméstica
Criciúma, 28 de junho de 2010.
BANCA EXAMINADORA
_____________________________________________________________
Profª Schirley dos Santos Garcia - Mestre - (UNESC) - Orientador
____________________________________________________________
Profª. Myrta Carlota Glauche Jaroszewski (UNESC)
_______________________________________________________________
Profª. Maria Salete Francisco de Souza - Especialista - (CRAS)
3
Dedicatória
A todas as mulheres que tiveram a coragem de
denunciar seus agressores
4
“Violência gera violência, os fracos julgam e
condenam,
porem
os
fortes
perdoam
e
compreendem”
Augusto Cury
5
AGRADECIMENTOS
Obrigada meu Deus, pelo dom da vida;
Obrigada, minha flor de maracujá, por todas as vezes que não penteei seu cabelo e
você não ficou brava; por todas as vezes que não fui tão “radical” e você não me
cobrou e por você existir, pois sem você, nada seria como é
Obrigada, marido, por estar em mim e comigo, sempre.
Obrigada mãe, por aquele dia em que saístes para trabalhar e eu queria ir junto e
me falastes para ficar quietinha que logo voltaria e foi a luta... Por ter sido mãe e pai
tentando suprir a falta masculina em nossa casa e mesmo assim soube me educar...
Obrigada Sogra, por praticamente me empurrar para aula, mesmo eu odiando os
dias frios e de chuva; obrigada por me receber...e você sabe onde...
Obrigada irmãos de sangue: Felipe, Muriel
Obrigada irmãos de coração: Israel, Edson
Obrigada cunhados: (agradecer cunhados é?..tudo bem, eles merecem)
Derli, Felipe, Roseli e Gabriela
Obrigada, minha amiga, Isabel, pela presença e apoio constante
Obrigada Schirley, minha tão paciente orientadora
6
RESUMO
A violência doméstica é uma questão histórica, social e cultural, que ainda hoje faz
parte da realidade de muitas mulheres em lares brasileiros. É um problema universal
que atinge milhares de pessoas num grande número de forma silenciosa e
dissimulada. A cada quatro minutos uma mulher é agredida em seu próprio lar por
uma pessoa com quem mantém relação de afeto e geralmente o agressor é o
próprio marido ou companheiro. Esta pesquisa tem como tema conhecer o perfil da
violência doméstica e suas configurações uma vez que são poucas as pesquisas
voltadas para está área. O objetivo desta pesquisa é conhecer o contexto histórico
e atual da violência doméstica, verificar os fatores e conseqüências relacionados à
violência e saber quais as leis que protegem estas mulheres. Configura-se como
sendo uma pesquisa de natureza bibliográfica sob uma perspectiva descritiva
exploratória numa abordagem qualitativa. Pode-se afirmar com está pesquisa que a
A violência doméstica trata-se de um fenômeno antigo e configura-se como uma
questão histórica, cultural e que se torna palco de muita tristeza, angustia e dor
para muitas mulheres brasileiras e que independe da situação sócia econômica.
Palavras-chave: Violência Doméstica. Mulher. Leis de Proteção
7
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
Fundação SEADE -Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados)
8
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ............................................................................................................9
1- MULHER E A HISTÓRIA......................................................................................11
1.1 Violência, atualidade e descaso.......................................................................14
2 DEFINIÇÃO DE VIOLÊNCIA .................................................................................19
2.1 Fatores relacionados com a violência.............................................................21
2.2 Conseqüências da violência ............................................................................22
2.3 Perfil do Agressor .............................................................................................23
3 LEI DE PROTEÇÃO A ESTAS MULHERES .........................................................26
3.1 Tipos de Violência Doméstica..........................................................................27
4 METODOLOGIA ....................................................................................................29
5 CONCLUSÃO ........................................................................................................31
REFERÊNCIAS.........................................................................................................33
9
INTRODUÇÃO
A violência doméstica é um problema universal que atinge milhares de
pessoas, em grande número de vezes de forma silenciosa e dissimulada. Ela não é
recente. Segundo Morgado (2001), trata-se de um fenômeno antigo, presente em
todas as classes sociais e em todas as sociedades, das mais desenvolvidas às mais
vulneráveis economicamente, compreendendo um conjunto de relações sociais que
complexificam sua natureza. Trata-se de um problema que atinge ambos os sexos e
não costuma obedecer a nenhum nível social, econômico, religioso ou cultural
específico.
A sua análise é importante e relevante sob dois aspectos: primeiro, devido
ao sofrimento indescritível que imputa às suas vítimas, muitas vezes silenciosas e,
em segundo, porque, comprovadamente, a violência doméstica pode impedir um
bom desenvolvimento físico, psicológico e social da vítima.
Considera-se que a violência doméstica contra a mulher é um fenômeno
sócio-histórico. Para refletirmos sobre as causas geradoras da violação dos direitos
humanos e daquelas que estão relacionadas à violência contra a mulher, surge a
necessidade de analisar as relações sociais estabelecidas na atual sociedade.
Segundo Lobo (1998) as mulheres entraram no mercado de trabalho para aumentar
a renda familiar, causada pela perda do poder de compra dos trabalhadores, a partir
de 1984; por conta da dinâmica do crescimento do Brasil, que ocasionou a criação
de grande número de novos empregos que exigiam habilidade e comportamento
minucioso, características de mão de obra feminina. É nesse contexto histórico que
a mulher entrou no mercado de trabalho.
Melo (1998) indica grandes disparidades, no que se refere às rendas do
trabalho no Brasil e que agrava ainda mais essa desigualdade, quando se faz um
recorte de gênero, pois os homens, de maneira geral, obtinham, nesse período,
praticamente o dobro das rendas do trabalho feminino.
Ainda hoje, as profissões e funções, como o emprego doméstico onde as
mulheres predominam, são desvalorizadas em relação aquelas em que há mais
homens. Nesse sentido, fica clara a desigualdade, ainda hoje, entre homens e
mulheres. Podemos observar, na própria construção da linguagem, onde o termo
10
universal usado para se referir ao ser humano é “Homem”. Faz-se necessária uma
nova postura ética de igualdade para o combate ao machismo e a violência contra
as mulheres.
Segundo a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir, Erradicar a
Violência Contra a Mulher, conhecida de Convenção de Belém do Pará realizada em
1994, “toda a mulher tem o direito ao reconhecimento, gozar, exercício e proteção de
todos os direitos humanos e liberdades consagradas em todos os instrumentos
regionais e internacionais relativos aos direitos humanos e das mulheres”.
Segundo o Declaração Universal de Direitos Humanos (1948)
Todos os homens nascem livres e iguais em dignidade e direitos [...] Todo
homens tem capacidade para gozar os direitos e as garantias estabelecidas
nessa declaração, sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor,
sexo, língua, religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional
ou social, riqueza, nascimento ou qualquer outra condição [...] Todo homem
tem direito á vida, à liberdade e à segurança pessoal.
Historicamente, é possível afirmar, que muitas foram às conquistas das
mulheres em relação à inserção no trabalho, embora ainda muito se precise avançar
para assegurar direitos inerentes à condição de igualdade de gênero. E este foi um
dos motivos que impulsionou a pesquisar sobre o tema: Violência doméstica e suas
configurações. Portanto esta pesquisa tem como objetivo geral conhecer o perfil da
violência doméstica e suas configurações bem como através dos objetivos
específicos conhecer o contexto histórico e atual da violência doméstica, verificar os
fatores e conseqüências relacionados à violência e saber quais as leis que protegem
as mulheres vítimas de violência doméstica. Configura-se como sendo uma pesquisa
de natureza bibliográfica sob uma perspectiva descritiva exploratória numa
abordagem qualitativa. Para o desenvolvimento desta foi necessário pesquisar
temas relacionados com a violência sua história e atualidade, tipos de violências
causas, conseqüências, Perfil da vítima e agressor e leis de proteção a estas
mulheres.
11
1- MULHER E A HISTÓRIA
Não é conveniente que o homem esteja só. Vou dar-lhe uma
auxiliar semelhante a ele.
(Bíblia, Génesis )
Violência doméstica, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS),
as mulheres são as que correm maiores riscos de serem vítimas desse tipo de
violência.
Segundo Alves (2009), o poder masculino sobre a esposa e filhos, no
Brasil, foi legitimado, por exemplo, pelo Código civil, de 1916, que, inspirado no
Direito Romano, identificava o status civil da mulher casada ao dos menores,
silvícolas e alienados, tornando as esposas civilmente incapazes. Por meio desta
legislação limitou-se o acesso das mulheres ao trabalho e à propriedade. Nesta
época as mulheres brasileiras também não tinham direito de voto.
A igreja teve uma grande influência na idéia de submissão da mulher ao
homem ao longo da história. Na Bíblia Sagrada, no livro de Gênesis, a mulher era
construída a partir de uma costela do homem, vindo depois da existência dele, para
lhe fazer companhia. No mesmo livro bíblico, o primeiro pecado do mundo é
provocado pelo desejo da mulher e pela desobediência de Eva ao oferecer do fruto
proibido a Adão. O relato bíblico da perda do paraíso tem na mulher a grande vilã, e
o homem como vítima da astuta mulher. Essa descrição bíblica impõe uma condição
secundária à mulher, e ainda, atribui-lhe a culpa pela quebra do encanto do paraíso.
Quando vista de forma literária, difundiu-se a condição de submissão feminina
(ALVES, 2009).
Antigamente as mulheres eram consideradas inferiores aos homens e se
submetiam as ordens e humilhações que a cultura lhes continha, vista apenas como
fonte doadora de amor, uma peça destinada a prestar serviços de alimentação,
comodidade. Hoje ainda a mulher vive em uma sociedade desfavorável a ela, onde
ainda desempenha um papel de submissão ao homem, embora tenham sido muitas
as conquistas a mulher tem a obrigação de fazer os trabalhos domésticos, ainda
ganha menos realizando as mesmas funções e ainda é tida como propriedade do
marido (BUCHER, 2002) .
12
Historicamente, é possível afirmar, que muitas foram às conquistas das
mulheres em relação à inserção no trabalho embora ainda muito se precise avançar
para assegurar direitos inerentes a condição de igualdade de gênero. Com a entrada
da mulher no mercado de trabalho, as famílias diminuíram o número de filhos e a
mulher acumulou as funções externas ao trabalho doméstico, aumentando o
estresse e alterando o equilíbrio das famílias (BUCHER, 2002).
Ainda hoje, as profissões e funções, como o emprego doméstico onde as
mulheres predominam, são desvalorizadas em relação aquelas em que há mais
homens. Nesse sentido, fica clara a desigualdade entre homens e mulheres.
Podemos observar, na própria construção da linguagem, onde o termo universal
usado para se referir ao ser humano é “homem” (ALVES,2009).
Historicamente, a consciência de gênero entre as mulheres apareceu pela
primeira vez na Europa, particularmente na França e na Inglaterra, em meio às
transformações que estavam ocorrendo devido ao capitalismo. Esse novo sistema
desencadeou mudanças na organização familiar e se implantou nos ideais liberais
de igualdade e na noção de indivíduo (SARDENBERG e COSTA,1994).
Ao mesmo tempo em que estava sendo levantada essa bandeira de luta
do feminismo, estava surgindo o capitalismo e, com ele, aparecendo uma força
imperativa de acumulação regida pela busca crescente de lucros; com isso, todas as
relações sociais, inclusive as familiares, assumiam características demarcadas pelas
relações sociais de produção necessárias para o desenvolvimento (OLIVEIRA,
1997). O homem, reconhecido socialmente como chefe de família, tinha seu trabalho
fora do lar remunerado, isto é, recebia por ele um salário, enquanto para as
mulheres eram reservadas as tarefas relativas à reprodução da força de trabalho
sem qualquer remuneração (SARDENBERG & COSTA, 1994).
Com a Revolução Francesa, considerada a grande revolução burguesa,
surge o feminismo. E uma das primeiras manifestações feministas aconteceu na
França Revolucionária, liderada por mulheres francesas que exigiram da Assembléia
Constituinte o estabelecimento da igualdade dos direitos entre os sexos, inclusive a
liberdade de trabalho. Esse movimento feminista veio representar para as mulheres
uma tentativa importante de ruptura com a história de submissão a que foram e são
ainda impostas (SARDENBERG & COSTA,1994).
13
Mas, o que se observa é que, ao mesmo tempo em que a mulher foi
mudando suas atitudes dentro das estruturas sociais, os valores tradicionais
continuavam ainda dando autoridade aos homens.
Herdeiras de uma cultura hierárquica e excludente e, apesar de se
encontrarem maciçamente ativas no mercado de trabalho, as mulheres
ainda carregam uma espécie de condenação a um lugar inferior e
desvalorizado socialmente. Seja na cultura, como nas mentes dos agentes
sociais, alimentam a idéia de que o lugar ideal e natural da mulher é no lar ,
na família e na reprodução (FONTANA , 2001, p.24).
Na medida em que as mulheres foram conquistando avanços na
educação e espaço no mercado de trabalho, o modelo tradicional de família (marido
ganha-pão e esposa cuidadora), marcado fortemente por uma rígida divisão sexual
do trabalho, foi cedendo lugar a modelos de família com menores desigualdades de
gênero, embora uma situação de plena equidade ainda esteja longe de ser
alcançada. A mulher ainda é vítima de uma cultura machista com conceitos
arraigados, conservadores, em que predomina como força maior a figura do macho,
detentor da última palavra, verdadeiro rei domiciliar onde se conserva a visão
deturpada sobre o sexo feminino, apreciada, e até mesmo estimulada, por gerações
em que a moldam como uma figura essencialmente frágil, dependente, sensível e
muitas vezes até vista como problemática (SAFFIOTI, 1980). Para o autor é
importante entender esses conceitos conservadores como uma construção social
baseada na diferenciação biológica dos sexos, a qual se expressa através
Introdução de relações de poder e subordinação, representada pela discriminação
de funções, atividades, normas e condutas esperadas para homens e mulheres em
cada sociedade. Neste sentido fica evidenciada a desigualdade entre homens e
mulheres.
Na Convenção Interamericana para prevenir Punir e Erradicar a Violência
Contra a Mulher, mais conhecida como Convenção de Belém do Pará realizada em
1994, diz que “toda mulher tem direito ao reconhecimento, gozar, exercício e
proteção de todos os direitos humanos e liberdades consagradas em todos os
instrumentos regionais e internacionais relativos aos direitos humanos e das
mulheres” (AGENDE, 2004).
14
1.1 Violência, atualidade e descaso
Para refletir sobre as causas geradoras da violação dos direitos humanos
e daquelas que estão relacionadas à violência contra a mulher, surge a necessidade
de analisar as relações sociais estabelecidas na atual sociedade. Ao combinar os
fatores de risco de âmbito individual com as constatações dos estudos culturais, o
modelo ambiental contribui para o entendimento das razões pelas quais algumas
sociedades e alguns indivíduos são mais violentos que outros, e por que as
mulheres, especialmente as casadas, são tão continuamente vítimas de abuso.
Fonte: Johns Hopkins University (2000)
Existe um bom número de estudos, segundo o The Center of
Comunication Programs, da Johns Hopkins University, (2000) que concordam sobre
os diversos fatores, encontrados em cada um destes níveis, que aumentam a
probabilidade de um homem abusar de sua parceira:
• No âmbito individual, estes fatores incluem ter sofrido abuso quando criança,
ter presenciado violência conjugal em casa, ter tido um pai ausente ou que
rejeitava a família e o uso freqüente de bebidas alcoólicas.
• No âmbito da família e dos relacionamentos, certos estudos culturais citaram o
controle masculino da riqueza e da tomada de decisões no interior das famílias
e os conflitos conjugais como fortes indicadores de abuso futuro.
15
• No âmbito da comunidade, o isolamento das mulheres e a falta de apoio social,
bem como a existência de grupos de homens que toleram e legitimam a
violência masculina, permitem prever índices mais elevados de violência.
• No âmbito da sociedade, existem estudos em todo o mundo que demonstram
que a violência contra as mulheres é mais comum onde os papéis de ambos os
sexos são rigidamente definidos e cumpridos e onde o conceito de
masculinidade está associado à valentia, honra masculina ou dominação.
Outras normas culturais relacionadas ao abuso incluem a aprovação do
castigo físico de mulheres e crianças, a aceitação da violência como forma de
resolução de conflitos interpessoais, e a percepção de que os homens são
proprietários das mulheres .
De acordo com a Fundação Seade (Fundação Sistema Estadual de
Análise de Dados) citada por Schritzmeyer (2001), constatou-se que, no Brasil, a
cada quatro minutos uma mulher é agredida em seu próprio lar por uma pessoa com
quem mantém relação de afeto. As estatísticas disponíveis e os registros nas
delegacias especializadas de crimes contra a mulher demonstram que 70% dos
incidentes acontecem dentro de casa e que o agressor é o próprio marido ou
companheiro.
Uma pesquisa de opinião pública nacional sobre violência doméstica feita,
em 2009, pela Data Pesquisa, do Senado, em todas as capitais verificou que o
índice de violência doméstica aumentou entre os anos de 2005 a 2009.
A pesquisa revelou também as diferentes razões que impedem a mulher
de recorrer à Lei para enfrentar seus agressores. A principal delas é o medo do
agressor.
Apesar do medo ser a principal causa, outras motivações impedem a
denúncia dos agressores. Na opinião de 62% das entrevistadas, pela Data
Pesquisa, o fato de a mulher não poder mais retirar a acusação após a queixa faz
com que ela desista de denunciar o agressor. 35% acham que a regra não impede a
denúncia. A dependência econômica em relação ao agressor, a dificuldade em
aceitar que um casamento acabou e o medo de novas agressões, são alguns dos
motivos que impedem as vítimas de tornar o seu problema público e tomarem
medidas para se protegerem
Segundo a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir, Erradicar a
Violência Contra a Mulher, conhecida de Convenção de Belém do Pará realizada em
16
1994, “toda a mulher tem o direito ao reconhecimento, gozar, exercício e proteção de
todos os direitos humanos e liberdades consagradas em todos os instrumentos
regionais e internacionais relativos aos direitos humanos e das mulheres”.
Segundo o relatório Nacional de Direitos Humanos (2002, p. 9)
Todos os homens nascem livres e iguais em dignidade e direitos [...] Todo
homens tem capacidade para gozar os direitos e as garantias estabelecidas
nessa declaração, sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor,
sexo, língua, religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional
ou social, riqueza, nascimento ou qualquer outra condição [...] Todo homem
tem direito á vida, à liberdade e à segurança pessoal.
Rago (1985, p. 62) diz que a trajetória da mulher em busca de seu espaço
na sociedade começa quando “ela não quer mais para si o rótulo de frágil, e um
novo modelo normativo de mulher prega novas formas de comportamento e
etiqueta”.
Conforme destaca Minayo (1994), não se conhece nenhuma sociedade
onde a violência não tenha estado presente. A violência tem determinantes
históricos e estruturais. Segundo a autora, desde tempos mais antigos existe uma
preocupação do ser humano em entender a essência dessa demanda, sua natureza,
suas origens e meios apropriados, a fim de atenuá-la, preveni-la e eliminá-la do
contexto social. Estudiosos do comportamento violento (DAHLBERG et al, 2003)
ressaltam que muitas pessoas cometem atos de violência com base em seus
antecedentes culturais e em suas crenças, sem considerar, portanto, que estão
praticando a violência.
Mulheres que vivem com parceiros violentos têm maiores dificuldades
para cuidar de si próprias, procurar emprego, estudar e desenvolver formas de viver
com conforto e autonomia, contribuindo ainda mais para sua baixa auto-estima,
sofrimento psíquico e social (ECHEBURÚA e CORRAl, 2006).
Dados epidemiológicos mostram que esse tipo violência causa mais
mortes às mulheres de 15 a 44 anos que o câncer, a malária, os acidentes de carro
e as guerras. Suas várias formas de agressão incluem: assassinatos, estupros,
abusos físicos, sexuais e emocionais, prostituição forçada, mutilação genital,
violência racial, entre muitas outras (GOMES et al, 2005).
17
Embora as mulheres possam agredir seus parceiros masculinos, e a
violência também possa se dar entre parceiros do mesmo sexo, a proporção
da violência infligida pelo homem à sua companheira é devastadora,
comparada aos primeiros. (KRUG, et al, 2002, p. 97)
A violência tem se tornado cada vez mais tema de interesse para
pesquisadores das áreas da saúde e das ciências sociais, e até mesmo de ciências
como a arqueologia, ja que se constatou indícios de acontecimentos que confirmam
a ocorrência de episódios de agressão física desde a época dos australopitecos.
(MANGUINHOS, 2004)
Ao que parece a humanidade praticamente nunca viveu um período onde
não estivesse havendo guerras ou conflitos em algum lugar. A violência porém, não
está compreendida apenas nos atos de agressão física e crueldade praticados em
conflitos ou guerras. Ela está, sob muitos aspectos, inserida em nosso cotidiano de
maneira explicita ou disfarçada de muitas formas (agressões físicas, verbais, morais
e quaisquer outros comportamentos que tragam prejuízo intencional a outras
pessoas).(GAIARSA, 1993)
Essa violência tornou-se, de certa forma, parte de nosso cotidiano, algo
como qualquer outro transtorno de nosso dia-a-dia. A fome, a miséria, as
atrocidades assistidas no decorrer dos dias apresentam-se com naturalidade e
indiferença para nossa sociedade e a todo o momento são vistas cenas dessa
violência nos mais diversos segmentos de nosso cotidiano. A banalização desta
violência faz parte da rotina em muitos lares (SILVA, 2002).
Esses fatores contribuem para a falta de atenção devida a violência
doméstica. A sociedade esta se mobilizado no enfrentamento da violência entre os
cidadãos, mas, contudo, não consegue responder ao desafio da violência doméstica.
Dentre as diversas modalidades de violência, a doméstica é uma realidade nos lares
e independem de classe social, sexo, crenças ou religião. Entre todos os tipos de
violência contra a mulher existente no mundo, aquela praticada no ambiente familiar
é uma das mais cruéis, causando um medo constante e tirando a segurança de estar
no próprio lar (SILVA, 2002).
No Brasil, segundo a Organização Mundial da Saúde, uma em cada cinco
mulheres (20%) já sofreu algum tipo de violência física, sexual ou outro abuso
praticado por um homem (OMS). A violência contra as mulheres faz parte de uma
seqüência crescente de episódios, incluindo mortes por homicídios, suicídios ou a
18
grande presença da ideação suicida, além de doenças sexualmente transmissíveis,
doenças cardiovasculares e dores crônicas (SCHRAIBER et al, 2007).
Schraiber (1999) ainda chama atenção ao fato de que a preocupação com
o problema da violência é recente na história, o que estaria relacionado à
modernidade e seus valores de liberdade e felicidade, consolidados na concepção
de cidadania e dos direitos humanos. Com base nesses valores, determinadas
práticas passaram a ser vistas como formas de violência. A partir da atuação do
movimento de mulheres, comportamentos considerados "naturais" passaram a ser
classificado como violência (impedir a mulher de trabalhar fora de casa, negar-lhe a
possibilidade de sair só ou de ter amigas, impedi-la de escolher o tipo de roupa que
deseja usar, impedir sua participação em atividades sociais, desqualificação e
humilhações privadas ou em público, as relações sexuais forçadas dentro do
casamento).
19
2 DEFINIÇÃO DE VIOLÊNCIA
Violência é um termo que deriva do latim violentia significando vis, força e
vigor e segundo o dicionário Aurélio violência seria ato violento, qualidade de
violento ou até mesmo ato de violentar. A etimologia da palavra violência, porém,
mais do que uma simples força, a violência pode ser compreendida como o próprio
abuso da força. Essa violência acontece tanto em público como no privado
A cada ano é responsável pela morte de milhares de pessoas em todo o
mundo. Para cada pessoa que morre devido à violência, muitas outras são feridas
ou sofrem devido a vários problemas físicos, sexuais, reprodutivos e mentais
A Organização Mundial da Saúde (OMS) define a violência como o uso
intencional de força ou de poder físico, de fato ou como ameaça, contra si mesmo,
outra pessoa ou grupo ou comunidade, que cause ou tenha muita probabilidade de
causar lesões, morte, danos psicológicos, transtornos de desenvolvimento ou
privações. Porém esse é um fenômeno complexo, pois a noção do que são
comportamentos aceitáveis e inaceitáveis, ou que constituem um dano, está
influenciada pela cultura e encontra-se submetida a uma contínua revisão na medida
em que os valores e as normas sociais se modificam (OMS, 2002).
A violência doméstica é uma das formas mais covardes de violência pois,
o lar, onde deveria ser o porto seguro é palco de cenários brutais. A violência familiar
é uma questão histórica e cultural, que ainda hoje, infelizmente, faz parte da
realidade de muitas mulheres nos lares brasileiros. É um problema universal que
atinge milhares de pessoas em grande número de forma silenciosa e dissimulada.
Segundo Morgado (2001) trata-se de um fenômeno antigo, presente em
todas as classes sociais e em todas as sociedades desde as mais desenvolvidas até
às mais vulneráveis economicamente. Trata-se de um problema que atinge ambos
os sexos e não costuma obedecer a nenhum nível social, econômico, religioso ou
cultural específico
Considerada um fenômeno que tem várias causas, a violência é um
processo de vitimização que se expressa em:
20
[...] atos com intenção de prejudicar, subtrair, subestimar e subjugar,
envolvendo sempre um conteúdo de poder, quer seja intelectual quer seja
físico, econômico, político ou social. Atingem de forma mais hostil os seres
mais indefesos da sociedade, como as crianças e adolescentes, e também
as mulheres sem, contudo, poupar os demais (ROCHA et al., 2001, p.96).
De acordo com a declaração das Nações Unidas, de 1993, citada por
Grossi (1996, p. 134) é compreendida como “qualquer violência de gênero, que
resulta em danos psicológicos, físicos e sexuais, incluindo ameaças, coerção ou
privação arbitrária da liberdade.”
Segundo Silva (2006), a violência baseada no gênero é aquela decorrente
das relações entre mulheres e homens, e geralmente é praticada pelo homem contra
a mulher, mas pode ser também da mulher contra mulher ou do homem contra
homem. Sua característica fundamental está nas relações de gênero onde o
masculino e o feminino, são culturalmente construídos e determinam genericamente
a violência
A Convenção de Belém do Pará (1994), define:
[...] a violência contra a mulher constitui uma violação aos direitos humanos
e às liberdades fundamentais e limita total ou parcialmente à mulher o
reconhecimento, gozo e exercício de tais direitos e liberdades [...] violência
contra a mulher é qualquer ação ou conduta, baseada no gênero, que cause
morte, dano físico, sexual ou psicológico à mulher, tanto no âmbito público
como no privado.
A violência pode ocorrer de maneira dissimulada, mas mesmo em suas
formas leves ela se baseia na dominação de um gênero sobre outro.
Violência Doméstica, segundo alguns autores, é o resultado de agressão
física ao companheiro ou companheira. Qualquer mulher pode ser vitima de
violência doméstica, não importando a classe social, raça, etnia, orientação sexual,
renda, cultura, nível educacional, idade e religião
Ela acontece porque, em nossa sociedade, muita gente ainda acha que o
melhor jeito de resolver um conflito é a violência e que os homens são mais fortes e
superiores do que as mulheres. É assim que, muitas vezes, os maridos, namorados,
pais, irmãos, chefes e outros homens acham que têm o direito de impor suas
vontades às mulheres.
Ainda segundo Grossi (1996), quando a sociedade destina a mulher a um
papel passivo e submisso, cria-se espaço para dominação masculina, através de um
lento processo de mutilação feminina, muitas vezes considerada legítimo. Dessa
21
forma, a autora caracteriza a violência física como uma das formas mais
exacerbadas de poder masculino.
Minayo, (1994) diz que, essa violência não faz parte da natureza humana
e que não tem raízes biológicas. Trata-se de um fenômeno biopsicossocial, mas seu
limiar de criação e desenvolvimento é a vida em sociedade. Portanto, para entendêla, há que se observar as especificidades históricas, como política, economia, moral
e das relações humanas.
Já para Adorno (2009) violência é uma forma de ação na qual uma ou
mais pessoas tentam impor a sua vontade contra terceiros, utilizando como meio o
uso de ameaça ou a força.
De acordo com Chauí (1992), acontece violência quando se trata um ser
humano não como sujeito, mas como “coisa” e também quando se confunde
diferença em desigualdade
A violência contra a mulher é um fenômeno extremamente complexo, com
raízes profundas nas relações de poder baseadas no gênero, na
sexualidade, na auto-identidade e nas instituições sociais. (HEISE, 1995, p.
41),
Diante desses fatos, a violência deve ser analisada em toda sua
complexidade permitindo com isso melhor conhecimento da temática e maior
capacitação para a formulação de políticas com o objetivo de enfrentá-la.
2.1 Fatores relacionados com a violência
Para entender a violência, é necessário abordar aspectos individuais,
psicológicos, biológicos, bem como componentes familiares, além de fatores
culturais, sociais e econômicos. Hermann (2000) cita alguns componentes
facilitadores do comportamento violento, entre eles a pobreza, o desemprego e o
uso de drogas. Segundo o autor os problemas associados à pobreza não são, em si
mesmos, geradores de violência, mas podem favorecer a eclosão de episódios
violentos. Já o papel do álcool na violência entre parceiros pode ter várias hipóteses:
o efeito desinibidor do álcool, explicado fisiologicamente, contribuiria para a eclosão
desse tipo de violência; a expectativa social de que o álcool desinibe as pessoas,
22
fazendo com que elas ajam de modo insensato; poderia estar modelando esse
comportamento; algumas pessoas poderiam conscientemente ingerir álcool para
poder ter uma desculpa socialmente aceita para seu comportamento violento e
talvez o uso pesado de álcool e a prática de agressão sejam apenas fatores de
predição de um outro quadro, como personalidade impulsiva. (CAETANO et al,
2001)
Existe ainda a questão do ciclo vicioso, onde segundo Cardoso (1997
apud MENEZES, 2000), estar inserido em um ambiente familiar no qual,
constantemente, os pais são agressivos entre si, ou mesmo com os filhos, favorece
a uma visão naturalizada da violência. São mulheres que cresceram vendo o pai
bater na mãe, esta bater nos filhos, o irmão mais velho bater nos mais novos,
reproduzindo um ciclo constante de violência. Desta forma, o apanhar passa a não
simbolizar desamor, mas sim uma forma de se estruturar como pessoa, em que se
submeter ao outro é um modelo de relação aprendido na infância.
Ainda para Cardoso (1997 apud MENEZES, 2000, p.128)
Sofrer violência na infância torna as pessoas inseguras, com baixa autoestima, com ausência de senso crítico sobre a violência e dificuldades de
estabelecer relações positivas. Essas conseqüências repercutem na escolha
que a mulher fará de seu futuro marido, bem como na sua reação frente à
violência.
A violência conjugal manifestada pelas agressões físicas e psicológicas
entre marido e mulher no ambiente doméstico foi considerada por muito tempo,
como um problema privado do casal. A partir dos anos 1980, a violência entre
cônjuges passou a ser considerada como um problema social e de saúde pública, As
mobilizações do movimento feminista contribuíram para o surgimento de espaços de
apoio destinadas às mulheres que enfrentavam situações de violência (PELLEGRINI
e MENEGHEL, 2009).
2.2 Conseqüências da violência
As consequências da violência doméstica são delicadas e podem
permanecer durante muito tempo. Além das marcas físicas, a violência doméstica
costuma causar também vários danos emocionais, como: influências na vida sexual
23
da vítima, lesões graves, baixa auto-estima, dificuldade em criar laços, em construir
relações. Em alguns casos, mais tarde, a vítima pode passar a ter papel de
agressor, dependendo da gravidade do dano emocional.
O Relatório Mundial sobre Violência e Saúde (KRUG et al, 2002, p.110)
apresenta as conseqüências da violência, perpetrada pelo parceiro, à saúde da
mulher, a saber:
Conseqüências Físicas: Lesões Abdominais e Torácicas, Síndromes de
Dores Crônicas, Incapacitações Físicas Parciais ou Permanentes,
Fibromialgia, Fraturas, Doenças do Aparelho Digestivo, Síndrome do Cólon
Irritável, Lesões Oculares, Ferimentos, Escoriações, Hematomas, Fraturas
Recorrentes.
Conseqüências Sexuais e Reprodutivas: Doenças Sexualmente
Transmissíveis, Esterilidade, Dor Pélvica Crônica, Complicações na ravidez,
Aborto Espontâneo, Aborto Praticado em Condições Perigosas, Gravidez
Indesejada, Disfunção Sexual.
Conseqüências Psíquicas e de Comportamento: Abuso de Álcool e
outras drogas, Depressão e Ansiedade, Transtornos Alimentares e do Sono,
Sentimentos de Culpa e de Vergonha, Fobias e Síndrome do Pânico, Baixa
Auto-estima, Estresse Pós-Traumático, Transtornos Psicossomáticos, hábito
de fumar, Comportamento Suicida e de Danos Autoinfligidos,
Comportamento Sexual de Risco.
Conseqüências Mortais: Mortalidade relacionada à AIDS, Mortalidade
Materna, Homicídio, Suicídio.
O efeito da violência contra a mulher, o maltrato, as humilhações, as
agressões físicas, sexuais e psicológicas é devastador sobre a auto-estima da
mulher. O medo que elas sentem diariamente, a insegurança pois nunca sabem o
que poderá desencadear a fúria do agressor, a vergonha diante dos familiares e dos
vizinhos, provoca ansiedade, depressão, dores de cabeça constantes. A violência
nas relações de casal, expõe a vítima às doenças sexualmente transmissíveis, à
gravidez indesejada, aos abortamentos em situação insegura e conseqüentemente
mortalidade por causa materna. (SCHRAIBER, 1999)
2.3 Perfil do Agressor
O homem violento, segundo Grossi (1996) impõe sua masculinidade e
sujeita, pela força, sua companheira as suas vontades. Trata-se de um fenômeno
mundial, que não respeita fronteira, raça ou classe social.
O abuso do álcool é um forte agravante da violência doméstica física.
24
Observa-se um sentimento agudo de impotência nos homens
desempregados sobretudo naqueles que são vítimas do desemprego de
longa duração, na medida em que perderam, talvez em definitivo, seu papel
social tradicionalmente considerado o mais importante: o de provedor das
necessidades materiais da família [...] o poder apresenta duas faces: da
potência e da impotência. (SAFIOTTI, 2003. p. 31)
Para Bourdieu (1999) ser homem implica um “dever ser” na sociedade
marcado pelas características corporais como a maneira de se manter de pé, de
aprumar o corpo, de erguer a cabeça, uma postura e atitude que corresponde a uma
maneira de pensar e agir que governa o homem de honra. Entretanto, a função
social da identidade masculina construída nas interações pode trazer tensão, devido
ao fato de que ser homem, muitas vezes implica no dever de afirmar sua virilidade.
Essas atitudes de virilidades devem ser validadas pelos outros homens com o
objetivo de ter o reconhecimento por parte dos outros e de fazer parte de um grupo
de “verdadeiros homens” (BOURDIEU, 1999). Assim, comportamentos agressivos e
baseados na violência podem estar sendo influenciados por estes modelos de “ser”
masculinos construídos socialmente, pois atos como violentar, dominar, explorar ou
oprimir podem existir devido ao medo “viril” que o homem tem de ser excluído do
mundo dos “homens” sem fraquezas e daqueles que são chamados de “duros” tanto
com seu próprio sentimento, quanto como sentimento do outro (BOURDIEU, 1999).
Por outro lado, os comportamentos estereotipados dos homens marcados
pelo machismo e sexismo influenciam o agir, o pensar e o modo de levar a vida.
Observa-se que alguns homens apresentam dificuldade em demonstrar afeto e
dialogar, isolando-se cada vez mais e não procurando ajuda. Isso contribui para que
a relação violenta entre o casal se perpetue (KNAUTH, VÍCTORA & LEAL, 2006).
Pesquisas científicas internacionais questionaram a associação entre o
uso de drogas e violência doméstica. O Centro Canadense de Estatísticas Judiciais,
no ano de 2000, conduziu um estudo que envolveu 7.707 mulheres casadas ou
vivendo conjugalmente. Cerca de 4% dessas mulheres tinham sido vítimas de
violência doméstica nos últimos 30 dias, na época da pesquisa. Inicialmente, os
investigadores observaram que homens violentos eram muito mais freqüentemente
descritos como bebedores pesados e 50% dos agressores haviam se alcoolizado no
momento em que agrediram suas mulheres. (JOHNSON, 2000).
Para Minayo e Deslandes (1998), o uso de álcool pelo homem apresentase como um significativo fator de risco para a violência do parceiro contra sua
25
mulher. Para Gomes (et al, 2002), em relação a esse tipo de associação, violência e
drogas, vários estudiosos apontam que o álcool é a substância mais ligada as
mudanças de comportamento, provocadas por efeitos psicofarmacológicos que
desencadeiam a violência.
Segundo dados divulgados no IV Congresso Português de Sociologia
(DIAS, s.d), os agressores são principalmente homens. Em geral, o homem violento
apresenta algumas características comuns: alcoolismo (álcool não só como
circunstância, mas como hábito); desemprego (nível ocupacional reduzido); autoestima baixa; experiência com maus-tratos (as estatísticas colocam este fator entre
os 40% e os 50% em termos de relação com essa prática); depressão; progressão
da violência (a agressividade vai aumentando gradualmente, a ponto de a violência,
ao atingir o limiar físico, se juntar à violência psicológica); e precocidade (surgem
algumas reações durante a juventude, como que predizendo o que vai suceder no
futuro) (COSTA, 2003)
Ainda segundo o autor, vistos de fora, os agressores podem parecer
responsáveis, dedicados, carinhosos e cidadãos exemplares. Muitas vezes o homem
sente-se culpado, prometendo à companheira melhoria em relação ao futuro. No
entanto, não consegue modificar-se e, em consequência, renova o sentimento de
culpabilidade, bebe e passa a agredi-la. (COSTA, 2003)
26
3 LEI DE PROTEÇÃO A ESTAS MULHERES
A violência contra o parceiro (a) refere-se a qualquer comportamento
dentro de uma relação íntima que cause dano físico, psíquico ou sexual aos
membros da relação. Este comportamento inclui agressões físicas, violência
psicológica, relações sexuais forçadas e outras formas de coação sexual, além de
diversos comportamentos dominantes como isolar uma pessoa da família ou amigos,
vigiar seus movimentos ou restringir seu direito à informação ou à assistência
(KRUG et al, 2002)
Diante desse quadro de desordem, em agosto de 2006 foi sancionada,
pelo Presidente da República do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva a Lei Maria da
Penha, na qual há aumento no rigor das punições às agressões contra a mulher,
quando ocorridas no ambiente doméstico ou familiar.
Cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a
o
mulher, nos termos do § 8 do art. 226 da Constituição Federal, da
Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação
contra as Mulheres e da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e
Erradicar a Violência contra a Mulher; dispõe sobre a criação dos Juizados
de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; altera o Código de
Processo Penal, o Código Penal e a Lei de Execução Penal; e dá outras
providências. (BRASIL, 2006)
Segundo a lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006, ºArt. 7o são formas de
violência doméstica e familiar contra a mulher, entre outras:
I - a violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua
integridade ou saúde corporal;
II - a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause
dano emocional e diminuição da auto-estima ou que lhe prejudique e
perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas
ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça,
constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância
constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, ridicularização,
exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe
cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação;
III - a violência sexual, entendida como qualquer conduta que a constranja a
presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada,
mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a
comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a
impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao
matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação,
chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de
seus direitos sexuais e reprodutivos;
27
IV - a violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que configure
retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos,
instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou
recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas
necessidades;
V - a violência moral, entendida como qualquer conduta que configure
calúnia, difamação ou injúria. (BRASIL, 2006)
3.1 Tipos de Violência Doméstica
A violência doméstica abrange várias formas de violência que atingem as
mulheres. Essas formas de violência são principalmente a violência física, a
violência psíquica, a violência sexual. Alguns desses fatores são explicados abaixo.
Quadro 1:Formas de Exercício da Violência Doméstica
Coagir e ameaçar
Intimidar
Usar a violência
emocional
Isolar
Minimizar, negar,
condenar
Instrumentalizar os
filhos
• Ameaçar provocar lesões na pessoa da
vítima;
• Ameaçar abandonar, suicidar-se, queixar-se
do cônjuge à Segurança Social;
• Coagir para prática de condutas ilícitas.
• Atemorizar a propósito de olhares, atos,
comportamentos;
• Partir objetos;
• Destruir pertences ou objetos pessoais do
outro;
• Maltratar os animais de companhia;
• Exibir armas;
• Desmoralizar;
• Fazer com que o outro se sinta mal consigo
próprio;
• Insultar;
• Fazer com que o outro se sinta mentalmente
diminuído ou culpado;
• Humilhar.
• Controlar a vida do outro: com quem fala, o
que lê, as deslocações;
• Limitar o envolvimento externo do outro;
• Usar o ciúme como justificação.
• Desvalorizar a violência e não levar em
conta as preocupações do outro;
• Afirmar que as agressões ou a violência
nunca existiram;
• Transferir para o outro a responsabilidade
pelo comportamento violento;
• Afirmar que a culpa é do outro.
• Fazer o outro se sentir culpado com relação
aos filhos;
• Usar os filhos para passar mensagens;
• Aproveitar as visitas de amigos para
atormentar, hostilizar;
• Ameaçar levar de casa os filhos.
28
Utilizar “Privilégios machistas”
Utilizar a violência econômica
Fonte: Machado e Gonçalves (2003)
• Tratar a mulher como criada;
• Tomar sozinho todas as decisões
importantes;
• Ser o que define o papel da mulher e do
homem.
• Evitar que o outro tenha ou mantenha um
emprego;
• Forçar o pedido de dinheiro;
• Fixar uma mesada;
• Apossar-se do dinheiro do outro;
• Impedir que o outro conheça ou aceda ao
rendimento familiar.
A violência contra o parceiro (a) se refere a qualquer comportamento
dentro de uma relação íntima que cause dano físico, psíquico ou sexual aos
membros da relação. Este comportamento inclui agressões físicas, violência
psicológica, relações sexuais forçadas e outras formas de coação sexual, além de
diversos comportamentos dominantes como isolar uma pessoa da família ou amigos,
vigiar seus movimentos ou restringir seu direito à informação ou à assistência
(KRUG et al, 2002).
29
4 METODOLOGIA
Esta pesquisa configura-se como sendo de natureza bibliográfica, sob uma
perspectiva descritiva exploratória e analítica numa abordagem qualitativa. Com
relação à metodologia empregada na presente pesquisa desenvolveu-se o caráter
bibliográfico combinado aos aspectos exploratório, analítico, descritivo e qualitativo,
pois se percebeu que isso contribuiria ainda mais aos propósitos da pesquisa.
Nesta direção, as abordagens qualitativa e exploratória não se opõem ou se
excluem mutuamente como objeto de análise, pois a combinação entre ambas
contribui para o enriquecimento e resolução do problema de pesquisa apresentado.
De acordo com Gonzalez (2002, p.19) pode-se justificar a abordagem qualitativa,
pois
as experiências qualitativas são questão estritamente pessoal de qualquer
ser vivo. São uns tipos de observações disponíveis de forma direta só ao
portador da experiência, não a qualquer outra pessoa. Essa privacidade das
observações experimentais as faz amplamente diferentes da observação
objetiva daqueles que estão fora.
Neste contexto a natureza bibliográfica justifica-se, pois, de acordo com Ruiz
(1996, p. 57), qualquer espécie de pesquisa, em qualquer área, ”Supõe e exige
pesquisa bibliográfica prévia, quer a maneira de atividade exploratória, quer para
justificar os objetivos e contribuições da própria pesquisa”.
No que concerne aos propósitos do referencial teórico, esta pesquisa pode
ser caracterizada como descritiva e analítica, cuja contribuição teórica está focada
na compreensão do fenômeno sob investigação por meio da identificação de
conceitos e construtos assim como as implicações que configuram a análise.
Deve-se
destacar que,
neste estudo, buscou-se
sempre considerar
aexistência da relação entre a realidade e o sujeito, haja vista serem estes os focos
centrais do trabalho. Portanto, o tipo descritivo ocupa uma posição de destaque
neste estudo, pois identifica as proposições básicas do objeto de estudo, assim
como seus conceitos e variáveis.
30
A perspectiva exploratória também é uma constante no decorrer da pesquisa,
porque, segundo Ruiz (1996, p. 61) “Para a delimitação que evoluirá durante a
pesquisa, estreitando cada vez mais seu campo, concorre à pesquisa exploratória”.
31
5 CONCLUSÃO
Com a realização desta pesquisa bibliográfica, tornou-se ainda mais
possível reconhecer o quanto a violência doméstica é um problema social e de
saúde pública, bem como perceber o quanto os danos gerados por esse ato são
desastrosos para a vítima.
A violência doméstica é um fenômeno que sempre esteve presente na
história da humanidade desde os primórdios da formação das sociedades. No
entanto, na contemporaneidade percebe-se manifestações no sentido de repressão,
punição dos culpados, mas um grande déficit em relação aos atendimentos
especializados a estas mulheres vítimas de violência doméstica. Notou-se que a
violência doméstica contra mulheres vem sendo um problema social, cultural, ético e
extremamente complexo, e se torna pouco visível em virtude do temor por parte das
vitimas em denunciar o agressor, tornando-se, muitas vezes, um segredo familiar.
Ainda ao estudar o processo histórico da mulher tornou-se possível
perceber a importância dos movimentos feministas que combatem a violência
doméstica contra as mulheres.
Constatou-se que a violência doméstica é o tipo de violência que danifica
a subjetividade feminina. Com isso, viu-se o quanto é urgente a prevenção da
violência doméstica, não só para evitar que a mulher tenha uma ruptura em sua vida
e sofra inúmeros danos, mas também para frear esse ciclo gerador de vítimas. É
muito comum que esse ciclo se repita, com cada vez maior violência e intervalo
menor entre as fases. A experiência mostra que, ou esse ciclo se repete
indefinidamente, ou, pior, muitas vezes termina em tragédia, com uma lesão grave
ou até o assassinato da mulher.
Com esta pesquisa, pode-se perceber que as mulheres são as mais
agredidas, e que na maioria dos casos o agressor é o marido/companheiro, com que
ela possui laços afetivos, o que torna mais complicado suas consequências.
Também se observou que as famílias as onde ocorre a violência são bastante
disfuncionais, onde a violência contra as mulheres é vista como uma conseqüência
de um ciclo evolutivo de conflitos e agressões. A violência é muitas vezes
considerada como uma manifestação tipicamente masculina, uma espécie de
“instrumento para a resolução de conflitos”.
32
Além dos danos causados pela violência em si, constatou-se que existem os
possíveis danos secundários gerados por essa agressão: danos psíquicos, físicos,
sociais e econômicos.
33
REFERÊNCIAS
ALVES, José Eustáquio Diniz.:Pai Soturno, mulher submissa, filho aterrados,
2009. Disponível em<http://opensadorselvagem.org/ciencia-ehumanidades/demografia/pai-soturno-mulher-submissa-e-filhos-aterradosArtigo>
Acesso: 12/04/2010
ADORNO, Sergio. Brasil nunca economizou violência para disciplinar. Publicado
no Jornal Diário do Nordeste em 05/04/2009. Disponível em <
http://www.nevusp.org/portugues/index.php> acesso em 11/04/2010
AGENDE. Ações em Gênero, Cidadania e Desenvolvimento: 10 anos da adoção
da Convenção Interamericana para Previnir, Punir e Erradicar a Violência Contra a
Mulher . Convenção de Belém do Pará. Brasília, Junho de 2004..
Bíblia Sagrada. Tradução da original mediante a versão de João Ferreira de
Almeida. 2ª ed. São Paulo
BOURDIEU, P. A dominação masculina. Bertrand Brasil. Rio de Janeiro,1999
BRASIL. LEI Nº 11.340, DE 7 DE AGOSTO DE 2006. Disponível
em<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2006/Lei/L11340.htm>Acesso em:11/04/2010
Bucher JSN. A mulher e o trabalho. Rev Promoção de Saúde. 2002
CARDOSO, N.M.B. Mulher e maus tratos. In: STREY, Marlene Neves (Org.). Mulher
e estudos de gênero. São Leopoldo: Unisinos, 1997. Apud MENEZES, Ana Luiza
Teixeira de. Mulheres: fruto de dominação e fruta para libertação! In: STREY
Marlene Neves et al (Org.). Construções e perspectivas em gênero. São
Leopoldo: Unisinos, 2000. p. 125-134
CHAUÍ, M. Participando do debate sobre mulher e violência. In: FRANCHETTO,
B.; CAVALCANTI, M.L.V.C. e HEIBORN, M.L. (Orgs.). Perspectivas antropológicas
da mulher. Rio de Janeiro, Zahar Editora, 1992.
CEPIA. Traduzindo a legislação com a perspectiva de Gênero n. 1. Instrumentos
Internacionais de Proteção aos Direitos Humanos. Rio de Janeiro, 1999.
34
CONVENÇÃO Interamericana para Prevenir,Punir e Erradicar a Violência Contra a
Mulher Convenção de Belém do Pará. 1994
DECLARAÇÃO Universal Dos Direitos Humanos. Adotada e proclamada pela
resolução 217 A (III) da Assembléia Geral das Nações Unidas em 10 de dezembro
de 1948
DESLANDES, Suely F. Care of children and adolescents suffering domestic
violence: analysis of a service. Cad. Saúde Pública, Rio e Janeiro, vol.10, supl.1,
p.177-187, 1994.
ECHEBURÚA, E., & Corral, P., (2006). Manual de Violencia Familiar. Madrid: Siglo
XXI.
FONTANA, M. & SANTOS,S.F. Violência contra a mulher. In: Rede Nacional
Feminista de Saúde e Direitos Reprodutivos. Saúde da Mulher e Direitos
Reprodutivos: Dossiês, S. Paulo, Rede Saúde, dez. 2001.Disponível em <
http://www.redesaude.org.br/dossies/html/dossieviolencia> Acesso em 12/04/2010
GAIARSA, José Ângelo. Agressão, Violência e Crueldade. São Paulo: Editora
Gente, 1993.
GOMES, Romeu; DESLANDES, Suely Ferreira; VEIGA, Márcia Motta et al. Por que
as crianças são maltratadas?: Explicações para a prática de maus-tratos
infantis na literatura. Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, vol.18, n.3, p.707-714,
mayo/jun. 2002. Disponível em: <http://www.scielo.br>. Acesso em 10/05/2010.
GOMES, et al, Violência contra a mulher: uma questão transnacional e transcultural
das relações de gênero. In Brasil, Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em
Saúde. Impacto da violência na saúde dos brasileiros / Ministério da Saúde,
Secretaria de Vigilância em Saúde, p. 117-140. Brasília: Ministério da Saúde 2005
GROSSI, K. Violência contra a mulher: implicações para os profissionais de saúde.
In: LOPES, M. J. M.; MEYER, D. E.; WALDOW, V. R. (Orgs.) Gênero e Saúde.
Porto Alegre: Artes Médicas, 1996. p.133-149.
HEISE, L.,Gender-based abuse: The global epidemic. Cadernos de Saúde Pública,
10. 1995.
35
História. Ciência e. saúde –Manguinhos, vol.11, no.2, Rio de Janeiro, May/Aug.
Arqueologia da agressividade humana: a violência sob uma perspectiva
paleoepidemiológica. 2004
JOHNSON, J. The role of alcohol in male partner’s assault on wives. Journal of Drug
Issues, Flórida, vol.30, p.725-740, 2000. Disponível em: <
http://200.152.193.254/html/geral_comentario.htm> . Acesso em 01/03/2010.
KNAUTH, D. R; VÍCTORA, C. G; & Leal, A. F. Liberdade, sexo e drogas: a
vulnerabilidade de homens jovens das camadas populares. In Adorno, R. C. F;
Alvarenga, A. T; & Vasconcellos, M. P. C. (org), Jovens, Trajetórias,
Masculinidades e Direitos. Edusp. São Paulo, 2006
MACHADO, Carla; GONÇALVES, Rui Abrunhosa, Violência e Vítimas de Crimes.
Coimbra: Quarteto. 2003
MINAYO, MCS; Deslandes SF. The complexity of relations between drugs,
alcohol, and violence. Cad. Saúde Pública 1998; 14:.35-42.
MINAYO, M. C. S. A violência social sob a perspectiva da saúde pública.
Cadernos
de Saúde Pública, 10 (supl. 1): p. 7-18, 1994.
OLIVEIRA, M. Homem e mulher a caminho do século XXI. São Paulo, Ática, 1997.
PELLEGRINI, Tais Barcellos; MENEGHEL, Stela Nazareth. Um olhar ao homemagressor brasileiro: Estudos sobre a construção da masculinidade e a
violência intrafamiliar. Violência e Políticas Públicas. 2009
Disponível em < http://www.apbarap.com.ar/descargas/rap_47/33-Pellegrini.pdf>
Acesso: 15/04/2010
RAGO, L.M. Do cabaré ao lar: a utopia da cidade disciplinar. Brasil: 1890 – 1930.
Rio de Janeiro: Paz e Terra. 1985
ROCHA, C.R.M; TASSIANO, C.M.L.M; SANTANA, J.S.S. Acompanhamento dos
adolescentes na família. In: ABEn. Associação Brasileira de Enfermagem.
Adolescer: compreender, atuar, acolher. Brasília (DF): Associação Brasileira de
Enfermagem, Ministério da Saúde, 2001. p. 38 –44.
KRUG, EG, et al. Relatório mundial sobre a violência e saúde. Genebra:
Organização Mundial de Saúde; 2002.
36
SAFIOTTI, Heleieth. I.B. Violência Estrutural e de Gênero- mulher gosta de
apanhar? In: BRASIL. Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres. Programa
de Prevenção, assistência e combate à violência contra a mulher. Plano Nacional:
Diálogos sobre Violência Domestica e gênero: Construindo Políticas Públicas.
Brasília: A secretaria, 2003
SAFFIOTI,H. Prefácio. In : Langley,R. & levy, R. Mulheres espancadas, fenômeno
invisível . Hucitec , São Paulo, Hucitec,1980.
SARDENBERG, C.M.B & COSTA,A.C.A. Feminismos feministas e movimentos
sociais. In (orgs.) Brandão & Bingemer. Mulher e relações de gênero. Loyola, 1994
p 81-112.
SCHRAIBER, L. B. D`OLIVEIRA, A. F. P. L. Violência contra mulheres: Interfaces
com a saúde: Interface-comunicação, saúde, educação, Botucatu, v.3, n. 5, p.1126,1999.
SCHRITZMEYER ALP. Abusos imponderáveis: limites dos registros oficiais
e das políticas públicas. In: Jornada Psicanalítica – “ABUSO”. São Paulo;
2001.
SILVA, Junior Edison Miguel da. A violência de gênero na Lei Maria da Penha .
Disponível em:<http://www.direitonet.com.br/artigos/x/29/26/2926>. Acesso em: 23
abril 2010
SILVA, Lygia Maria Pereira da. Violência doméstica contra a criança e o
Adolescente. Recife: EDUPE, 2002
37
Presidência da República
Casa Civil
Subchefia para Assuntos Jurídicos
LEI Nº 11.340, DE 7 DE AGOSTO DE 2006.
Cria mecanismos para coibir a violência doméstica
o
e familiar contra a mulher, nos termos do § 8 do
art. 226 da Constituição Federal, da Convenção
sobre a Eliminação de Todas as Formas de
Discriminação contra as Mulheres e da Convenção
Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a
Violência contra a Mulher; dispõe sobre a criação
dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar
contra a Mulher; altera o Código de Processo
Penal, o Código Penal e a Lei de Execução Penal;
e dá outras providências.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a
seguinte Lei:
TÍTULO I
DISPOSIÇÕES PRELIMINARES
o
Art. 1 Esta Lei cria mecanismos para coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra
o
a mulher, nos termos do § 8 do art. 226 da Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação
de Todas as Formas de Violência contra a Mulher, da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir
e Erradicar a Violência contra a Mulher e de outros tratados internacionais ratificados pela República
Federativa do Brasil; dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a
Mulher; e estabelece medidas de assistência e proteção às mulheres em situação de violência
doméstica e familiar.
o
Art. 2 Toda mulher, independentemente de classe, raça, etnia, orientação sexual, renda,
cultura, nível educacional, idade e religião, goza dos direitos fundamentais inerentes à pessoa
humana, sendo-lhe asseguradas as oportunidades e facilidades para viver sem violência, preservar
sua saúde física e mental e seu aperfeiçoamento moral, intelectual e social.
38
o
Art. 3 Serão asseguradas às mulheres as condições para o exercício efetivo dos direitos à
vida, à segurança, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, à moradia, ao acesso à justiça, ao
esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivência
familiar e comunitária.
o
§ 1 O poder público desenvolverá políticas que visem garantir os direitos humanos das
mulheres no âmbito das relações domésticas e familiares no sentido de resguardá-las de toda forma
de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
o
§ 2 Cabe à família, à sociedade e ao poder público criar as condições necessárias para o
efetivo exercício dos direitos enunciados no caput.
o
Art. 4 Na interpretação desta Lei, serão considerados os fins sociais a que ela se destina e,
especialmente, as condições peculiares das mulheres em situação de violência doméstica e familiar.
TÍTULO II
DA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER
CAPÍTULO I
DISPOSIÇÕES GERAIS
o
Art. 5 Para os efeitos desta Lei, configura violência doméstica e familiar contra a mulher
qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual
ou psicológico e dano moral ou patrimonial:
I - no âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de convívio permanente de
pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas;
II - no âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por indivíduos que são ou
se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa;
III - em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a
ofendida, independentemente de coabitação.
Parágrafo único. As relações pessoais enunciadas neste artigo independem de orientação
sexual.
o
Art. 6 A violência doméstica e familiar contra a mulher constitui uma das formas de violação
dos direitos humanos.
CAPÍTULO II
DAS FORMAS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR
CONTRA A MULHER
o
Art. 7 São formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, entre outras:
I - a violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua integridade ou saúde
corporal;
II - a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause dano emocional e
diminuição da auto-estima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise
degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça,
39
constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz,
insulto, chantagem, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio
que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação;
III - a violência sexual, entendida como qualquer conduta que a constranja a presenciar, a
manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso
da força; que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a
impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto
ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o
exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos;
IV - a violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que configure retenção,
subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos
pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas
necessidades;
injúria.
V - a violência moral, entendida como qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou
TÍTULO III
DA ASSISTÊNCIA À MULHER EM SITUAÇÃO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR
CAPÍTULO I
DAS MEDIDAS INTEGRADAS DE PREVENÇÃO
o
Art. 8 A política pública que visa coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher far-seá por meio de um conjunto articulado de ações da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios e de ações não-governamentais, tendo por diretrizes:
I - a integração operacional do Poder Judiciário, do Ministério Público e da Defensoria Pública
com as áreas de segurança pública, assistência social, saúde, educação, trabalho e habitação;
II - a promoção de estudos e pesquisas, estatísticas e outras informações relevantes, com a
perspectiva de gênero e de raça ou etnia, concernentes às causas, às conseqüências e à freqüência
da violência doméstica e familiar contra a mulher, para a sistematização de dados, a serem unificados
nacionalmente, e a avaliação periódica dos resultados das medidas adotadas;
III - o respeito, nos meios de comunicação social, dos valores éticos e sociais da pessoa e da
família, de forma a coibir os papéis estereotipados que legitimem ou exacerbem a violência doméstica
o
o
e familiar, de acordo com o estabelecido no inciso III do art. 1 , no inciso IV do art. 3 e no inciso IV do
art. 221 da Constituição Federal;
IV - a implementação de atendimento policial especializado para as mulheres, em particular
nas Delegacias de Atendimento à Mulher;
V - a promoção e a realização de campanhas educativas de prevenção da violência doméstica
e familiar contra a mulher, voltadas ao público escolar e à sociedade em geral, e a difusão desta Lei e
dos instrumentos de proteção aos direitos humanos das mulheres;
VI - a celebração de convênios, protocolos, ajustes, termos ou outros instrumentos de
promoção de parceria entre órgãos governamentais ou entre estes e entidades não-governamentais,
tendo por objetivo a implementação de programas de erradicação da violência doméstica e familiar
contra a mulher;
40
VII - a capacitação permanente das Polícias Civil e Militar, da Guarda Municipal, do Corpo de
Bombeiros e dos profissionais pertencentes aos órgãos e às áreas enunciados no inciso I quanto às
questões de gênero e de raça ou etnia;
VIII - a promoção de programas educacionais que disseminem valores éticos de irrestrito
respeito à dignidade da pessoa humana com a perspectiva de gênero e de raça ou etnia;
IX - o destaque, nos currículos escolares de todos os níveis de ensino, para os conteúdos
relativos aos direitos humanos, à eqüidade de gênero e de raça ou etnia e ao problema da violência
doméstica e familiar contra a mulher.
CAPÍTULO II
DA ASSISTÊNCIA À MULHER EM SITUAÇÃO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR
o
Art. 9 A assistência à mulher em situação de violência doméstica e familiar será prestada de
forma articulada e conforme os princípios e as diretrizes previstos na Lei Orgânica da Assistência
Social, no Sistema Único de Saúde, no Sistema Único de Segurança Pública, entre outras normas e
políticas públicas de proteção, e emergencialmente quando for o caso.
o
§ 1 O juiz determinará, por prazo certo, a inclusão da mulher em situação de violência
doméstica e familiar no cadastro de programas assistenciais do governo federal, estadual e municipal.
o
§ 2 O juiz assegurará à mulher em situação de violência doméstica e familiar, para preservar
sua integridade física e psicológica:
I - acesso prioritário à remoção quando servidora pública, integrante da administração direta ou
indireta;
II - manutenção do vínculo trabalhista, quando necessário o afastamento do local de trabalho,
por até seis meses.
o
§ 3 A assistência à mulher em situação de violência doméstica e familiar compreenderá o
acesso aos benefícios decorrentes do desenvolvimento científico e tecnológico, incluindo os serviços
de contracepção de emergência, a profilaxia das Doenças Sexualmente Transmissíveis (DST) e da
Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (AIDS) e outros procedimentos médicos necessários e
cabíveis nos casos de violência sexual.
CAPÍTULO III
DO ATENDIMENTO PELA AUTORIDADE POLICIAL
Art. 10. Na hipótese da iminência ou da prática de violência doméstica e familiar contra a
mulher, a autoridade policial que tomar conhecimento da ocorrência adotará, de imediato, as
providências legais cabíveis.
Parágrafo único. Aplica-se o disposto no caput deste artigo ao descumprimento de medida
protetiva de urgência deferida.
Art. 11. No atendimento à mulher em situação de violência doméstica e familiar, a autoridade
policial deverá, entre outras providências:
I - garantir proteção policial, quando necessário, comunicando de imediato ao Ministério
Público e ao Poder Judiciário;
II - encaminhar a ofendida ao hospital ou posto de saúde e ao Instituto Médico Legal;
41
III - fornecer transporte para a ofendida e seus dependentes para abrigo ou local seguro,
quando houver risco de vida;
IV - se necessário, acompanhar a ofendida para assegurar a retirada de seus pertences do
local da ocorrência ou do domicílio familiar;
V - informar à ofendida os direitos a ela conferidos nesta Lei e os serviços disponíveis.
Art. 12. Em todos os casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, feito o registro
da ocorrência, deverá a autoridade policial adotar, de imediato, os seguintes procedimentos, sem
prejuízo daqueles previstos no Código de Processo Penal:
I - ouvir a ofendida, lavrar o boletim de ocorrência e tomar a representação a termo, se
apresentada;
II - colher todas as provas que servirem para o esclarecimento do fato e de suas
circunstâncias;
III - remeter, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, expediente apartado ao juiz com o pedido
da ofendida, para a concessão de medidas protetivas de urgência;
IV - determinar que se proceda ao exame de corpo de delito da ofendida e requisitar outros
exames periciais necessários;
V - ouvir o agressor e as testemunhas;
VI - ordenar a identificação do agressor e fazer juntar aos autos sua folha de antecedentes
criminais, indicando a existência de mandado de prisão ou registro de outras ocorrências policiais
contra ele;
VII - remeter, no prazo legal, os autos do inquérito policial ao juiz e ao Ministério Público.
o
§ 1 O pedido da ofendida será tomado a termo pela autoridade policial e deverá conter:
I - qualificação da ofendida e do agressor;
II - nome e idade dos dependentes;
III - descrição sucinta do fato e das medidas protetivas solicitadas pela ofendida.
o
o
§ 2 A autoridade policial deverá anexar ao documento referido no § 1 o boletim de
ocorrência e cópia de todos os documentos disponíveis em posse da ofendida.
o
§ 3 Serão admitidos como meios de prova os laudos ou prontuários médicos fornecidos por
hospitais e postos de saúde.
TÍTULO IV
DOS PROCEDIMENTOS
CAPÍTULO I
DISPOSIÇÕES GERAIS
Art. 13. Ao processo, ao julgamento e à execução das causas cíveis e criminais decorrentes
da prática de violência doméstica e familiar contra a mulher aplicar-se-ão as normas dos Códigos de
42
Processo Penal e Processo Civil e da legislação específica relativa à criança, ao adolescente e ao
idoso que não conflitarem com o estabelecido nesta Lei.
Art. 14. Os Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, órgãos da Justiça
Ordinária com competência cível e criminal, poderão ser criados pela União, no Distrito Federal e nos
Territórios, e pelos Estados, para o processo, o julgamento e a execução das causas decorrentes da
prática de violência doméstica e familiar contra a mulher.
Parágrafo único. Os atos processuais poderão realizar-se em horário noturno, conforme
dispuserem as normas de organização judiciária.
Art. 15. É competente, por opção da ofendida, para os processos cíveis regidos por esta Lei, o
Juizado:
I - do seu domicílio ou de sua residência;
II - do lugar do fato em que se baseou a demanda;
III - do domicílio do agressor.
Art. 16. Nas ações penais públicas condicionadas à representação da ofendida de que trata
esta Lei, só será admitida a renúncia à representação perante o juiz, em audiência especialmente
designada com tal finalidade, antes do recebimento da denúncia e ouvido o Ministério Público.
Art. 17. É vedada a aplicação, nos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, de
penas de cesta básica ou outras de prestação pecuniária, bem como a substituição de pena que
implique o pagamento isolado de multa.
CAPÍTULO II
DAS MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA
Seção I
Disposições Gerais
Art. 18. Recebido o expediente com o pedido da ofendida, caberá ao juiz, no prazo de 48
(quarenta e oito) horas:
I - conhecer do expediente e do pedido e decidir sobre as medidas protetivas de urgência;
caso;
II - determinar o encaminhamento da ofendida ao órgão de assistência judiciária, quando for o
III - comunicar ao Ministério Público para que adote as providências cabíveis.
Art. 19. As medidas protetivas de urgência poderão ser concedidas pelo juiz, a requerimento
do Ministério Público ou a pedido da ofendida.
o
§ 1
As medidas protetivas de urgência poderão ser concedidas de imediato,
independentemente de audiência das partes e de manifestação do Ministério Público, devendo este
ser prontamente comunicado.
o
§ 2 As medidas protetivas de urgência serão aplicadas isolada ou cumulativamente, e
poderão ser substituídas a qualquer tempo por outras de maior eficácia, sempre que os direitos
reconhecidos nesta Lei forem ameaçados ou violados.
43
o
§ 3 Poderá o juiz, a requerimento do Ministério Público ou a pedido da ofendida, conceder
novas medidas protetivas de urgência ou rever aquelas já concedidas, se entender necessário à
proteção da ofendida, de seus familiares e de seu patrimônio, ouvido o Ministério Público.
Art. 20. Em qualquer fase do inquérito policial ou da instrução criminal, caberá a prisão
preventiva do agressor, decretada pelo juiz, de ofício, a requerimento do Ministério Público ou
mediante representação da autoridade policial.
Parágrafo único. O juiz poderá revogar a prisão preventiva se, no curso do processo, verificar
a falta de motivo para que subsista, bem como de novo decretá-la, se sobrevierem razões que a
justifiquem.
Art. 21. A ofendida deverá ser notificada dos atos processuais relativos ao agressor,
especialmente dos pertinentes ao ingresso e à saída da prisão, sem prejuízo da intimação do
advogado constituído ou do defensor público.
Parágrafo único. A ofendida não poderá entregar intimação ou notificação ao agressor.
Seção II
Das Medidas Protetivas de Urgência que Obrigam o Agressor
Art. 22. Constatada a prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos
desta Lei, o juiz poderá aplicar, de imediato, ao agressor, em conjunto ou separadamente, as
seguintes medidas protetivas de urgência, entre outras:
I - suspensão da posse ou restrição do porte de armas, com comunicação ao órgão
o
competente, nos termos da Lei n 10.826, de 22 de dezembro de 2003;
II - afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida;
III - proibição de determinadas condutas, entre as quais:
a) aproximação da ofendida, de seus familiares e das testemunhas, fixando o limite mínimo de
distância entre estes e o agressor;
b) contato com a ofendida, seus familiares e testemunhas por qualquer meio de comunicação;
c) freqüentação de determinados lugares a fim de preservar a integridade física e psicológica
da ofendida;
IV - restrição ou suspensão de visitas aos dependentes menores, ouvida a equipe de
atendimento multidisciplinar ou serviço similar;
V - prestação de alimentos provisionais ou provisórios.
o
§ 1 As medidas referidas neste artigo não impedem a aplicação de outras previstas na
legislação em vigor, sempre que a segurança da ofendida ou as circunstâncias o exigirem, devendo a
providência ser comunicada ao Ministério Público.
o
§ 2 Na hipótese de aplicação do inciso I, encontrando-se o agressor nas condições
o
o
mencionadas no caput e incisos do art. 6 da Lei n 10.826, de 22 de dezembro de 2003, o juiz
comunicará ao respectivo órgão, corporação ou instituição as medidas protetivas de urgência
concedidas e determinará a restrição do porte de armas, ficando o superior imediato do agressor
responsável pelo cumprimento da determinação judicial, sob pena de incorrer nos crimes de
prevaricação ou de desobediência, conforme o caso.
44
o
§ 3 Para garantir a efetividade das medidas protetivas de urgência, poderá o juiz requisitar, a
qualquer momento, auxílio da força policial.
o
§ 4 Aplica-se às hipóteses previstas neste artigo, no que couber, o disposto no caput e nos
§§ 5 e 6º do art. 461 da Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973 (Código de Processo Civil).
o
Seção III
Das Medidas Protetivas de Urgência à Ofendida
Art. 23. Poderá o juiz, quando necessário, sem prejuízo de outras medidas:
I - encaminhar a ofendida e seus dependentes a programa oficial ou comunitário de proteção
ou de atendimento;
II - determinar a recondução da ofendida e a de seus dependentes ao respectivo domicílio,
após afastamento do agressor;
III - determinar o afastamento da ofendida do lar, sem prejuízo dos direitos relativos a bens,
guarda dos filhos e alimentos;
IV - determinar a separação de corpos.
Art. 24. Para a proteção patrimonial dos bens da sociedade conjugal ou daqueles de
propriedade particular da mulher, o juiz poderá determinar, liminarmente, as seguintes medidas, entre
outras:
I - restituição de bens indevidamente subtraídos pelo agressor à ofendida;
II - proibição temporária para a celebração de atos e contratos de compra, venda e locação de
propriedade em comum, salvo expressa autorização judicial;
III - suspensão das procurações conferidas pela ofendida ao agressor;
IV - prestação de caução provisória, mediante depósito judicial, por perdas e danos materiais
decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a ofendida.
Parágrafo único. Deverá o juiz oficiar ao cartório competente para os fins previstos nos incisos
II e III deste artigo.
CAPÍTULO III
DA ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO
Art. 25. O Ministério Público intervirá, quando não for parte, nas causas cíveis e criminais
decorrentes da violência doméstica e familiar contra a mulher.
Art. 26. Caberá ao Ministério Público, sem prejuízo de outras atribuições, nos casos de
violência doméstica e familiar contra a mulher, quando necessário:
I - requisitar força policial e serviços públicos de saúde, de educação, de assistência social e
de segurança, entre outros;
II - fiscalizar os estabelecimentos públicos e particulares de atendimento à mulher em situação
de violência doméstica e familiar, e adotar, de imediato, as medidas administrativas ou judiciais
cabíveis no tocante a quaisquer irregularidades constatadas;
45
III - cadastrar os casos de violência doméstica e familiar contra a mulher.
CAPÍTULO IV
DA ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA
Art. 27. Em todos os atos processuais, cíveis e criminais, a mulher em situação de violência
doméstica e familiar deverá estar acompanhada de advogado, ressalvado o previsto no art. 19 desta
Lei.
Art. 28. É garantido a toda mulher em situação de violência doméstica e familiar o acesso aos
serviços de Defensoria Pública ou de Assistência Judiciária Gratuita, nos termos da lei, em sede
policial e judicial, mediante atendimento específico e humanizado.
TÍTULO V
DA EQUIPE DE ATENDIMENTO MULTIDISCIPLINAR
Art. 29. Os Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher que vierem a ser
criados poderão contar com uma equipe de atendimento multidisciplinar, a ser integrada por
profissionais especializados nas áreas psicossocial, jurídica e de saúde.
Art. 30. Compete à equipe de atendimento multidisciplinar, entre outras atribuições que lhe
forem reservadas pela legislação local, fornecer subsídios por escrito ao juiz, ao Ministério Público e à
Defensoria Pública, mediante laudos ou verbalmente em audiência, e desenvolver trabalhos de
orientação, encaminhamento, prevenção e outras medidas, voltados para a ofendida, o agressor e os
familiares, com especial atenção às crianças e aos adolescentes.
Art. 31. Quando a complexidade do caso exigir avaliação mais aprofundada, o juiz poderá
determinar a manifestação de profissional especializado, mediante a indicação da equipe de
atendimento multidisciplinar.
Art. 32. O Poder Judiciário, na elaboração de sua proposta orçamentária, poderá prever
recursos para a criação e manutenção da equipe de atendimento multidisciplinar, nos termos da Lei
de Diretrizes Orçamentárias.
TÍTULO VI
DISPOSIÇÕES TRANSITÓRIAS
Art. 33. Enquanto não estruturados os Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a
Mulher, as varas criminais acumularão as competências cível e criminal para conhecer e julgar as
causas decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, observadas as
previsões do Título IV desta Lei, subsidiada pela legislação processual pertinente.
Parágrafo único. Será garantido o direito de preferência, nas varas criminais, para o processo
e o julgamento das causas referidas no caput.
TÍTULO VII
DISPOSIÇÕES FINAIS
Art. 34. A instituição dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher poderá
ser acompanhada pela implantação das curadorias necessárias e do serviço de assistência judiciária.
46
Art. 35. A União, o Distrito Federal, os Estados e os Municípios poderão criar e promover, no
limite das respectivas competências:
I - centros de atendimento integral e multidisciplinar para mulheres e respectivos dependentes
em situação de violência doméstica e familiar;
II - casas-abrigos para mulheres e respectivos dependentes menores em situação de violência
doméstica e familiar;
III - delegacias, núcleos de defensoria pública, serviços de saúde e centros de perícia médicolegal especializados no atendimento à mulher em situação de violência doméstica e familiar;
IV - programas e campanhas de enfrentamento da violência doméstica e familiar;
V - centros de educação e de reabilitação para os agressores.
Art. 36. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios promoverão a adaptação de
seus órgãos e de seus programas às diretrizes e aos princípios desta Lei.
Art. 37. A defesa dos interesses e direitos transindividuais previstos nesta Lei poderá ser
exercida, concorrentemente, pelo Ministério Público e por associação de atuação na área,
regularmente constituída há pelo menos um ano, nos termos da legislação civil.
Parágrafo único. O requisito da pré-constituição poderá ser dispensado pelo juiz quando
entender que não há outra entidade com representatividade adequada para o ajuizamento da
demanda coletiva.
Art. 38. As estatísticas sobre a violência doméstica e familiar contra a mulher serão incluídas
nas bases de dados dos órgãos oficiais do Sistema de Justiça e Segurança a fim de subsidiar o
sistema nacional de dados e informações relativo às mulheres.
Parágrafo único. As Secretarias de Segurança Pública dos Estados e do Distrito Federal
poderão remeter suas informações criminais para a base de dados do Ministério da Justiça.
Art. 39. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, no limite de suas
competências e nos termos das respectivas leis de diretrizes orçamentárias, poderão estabelecer
dotações orçamentárias específicas, em cada exercício financeiro, para a implementação das
medidas estabelecidas nesta Lei.
Art. 40. As obrigações previstas nesta Lei não excluem outras decorrentes dos princípios por
ela adotados.
Art. 41. Aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher,
o
independentemente da pena prevista, não se aplica a Lei n 9.099, de 26 de setembro de 1995.
o
Art. 42. O art. 313 do Decreto-Lei n 3.689, de 3 de outubro de 1941 (Código de Processo
Penal), passa a vigorar acrescido do seguinte inciso IV:
“Art. 313. .................................................
................................................................
IV - se o crime envolver violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos da lei específica,
para garantir a execução das medidas protetivas de urgência.” (NR)
47
o
Art. 43. A alínea f do inciso II do art. 61 do Decreto-Lei n 2.848, de 7 de dezembro de 1940
(Código Penal), passa a vigorar com a seguinte redação:
“Art. 61. ..................................................
.................................................................
II - ............................................................
.................................................................
f) com abuso de autoridade ou prevalecendo-se de relações domésticas, de coabitação ou de
hospitalidade, ou com violência contra a mulher na forma da lei específica;
........................................................... ” (NR)
Art. 44. O art. 129 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), passa
a vigorar com as seguintes alterações:
“Art. 129. ..................................................
..................................................................
o
§ 9 Se a lesão for praticada contra ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou companheiro, ou
com quem conviva ou tenha convivido, ou, ainda, prevalecendo-se o agente das relações domésticas,
de coabitação ou de hospitalidade:
Pena - detenção, de 3 (três) meses a 3 (três) anos.
..................................................................
o
§ 11. Na hipótese do § 9 deste artigo, a pena será aumentada de um terço se o crime for cometido
contra pessoa portadora de deficiência.” (NR)
o
Art. 45. O art. 152 da Lei n 7.210, de 11 de julho de 1984 (Lei de Execução Penal), passa a
vigorar com a seguinte redação:
“Art. 152. ...................................................
Parágrafo único. Nos casos de violência doméstica contra a mulher, o juiz poderá determinar o
comparecimento obrigatório do agressor a programas de recuperação e reeducação.” (NR)
Art. 46. Esta Lei entra em vigor 45 (quarenta e cinco) dias após sua publicação.
o
o
Brasília, 7 de agosto de 2006; 185 da Independência e 118 da República.
LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA
Dilma Rousseff
Este texto não substitui o publicado no D.O.U. de 8.8.2006
48
Download

violência doméstica contra as mulheres e suas configuraçôes