Diferenciação de preços entre pagamentos com cartão de crédito, débito e dinheiro ou cheque. Questão atual e polêmica, ainda em discussão no STJ, sem entendimento sedimentado, é a possibilidade ou não do comerciante praticar preços diferenciados nos pagamentos realizados através de cartões ou dinheiro e cheque. É fato público e notório que as operadoras de cartão de crédito cobram dos comerciantes um percentual sobre a venda efetuada, sendo tal percentual variante entre 2% e 7%. Ademais, é de se salientar que o comerciante jamais recebe o pagamento por parte da operadora em período inferior a 30 (trinta) dias, ou seja, não é à vista, como muitos afirmam. O STJ, em recente decisão proibiu a prática de diferenciação de preços nas vendas com cartão de crédito, dinheiro ou cheque. Porém, alguns aspectos devem ser observados tanto pelos comerciantes quanto pelos próprios consumidores, a fim de se combater a prática abusiva praticada pelas operadoras. Vejamos. 1. Vedação da prática abusiva na modalidade de vantagem excessiva no CDC. O Código de Defesa do Consumidor, no seu artigo 39, V, veda ao fornecedor/comerciante, na sua prática, procedimentos abusivos, que lhe aufiram vantagens excessivas em relação ao consumidor. A vantagem excessiva busca afastar o desequilíbrio contratual, ou seja, o pagamento com preço muito além do valor real do produto. Na formação do preço do produto, o fornecedor deve levar em conta diversos aspectos, dentre eles o valor pago pelo produto, encargos fiscais, trabalhistas, custos de operação. Nisso inclui-se as taxas cobradas pelas administradoras de cartões de crédito. Assim, oferecer um preço diferenciado, dependendo do modo de pagamento, não se afigura uma prática abusiva, até porque o próprio consumidor também aufere vantagem com o pagamento no cartão de crédito: maior prazo para pagamento, possibilidade de parcelamento diretamente com o lojista ou com a operadora. Assim, o entendimento do STJ¹ ainda deve ser lapidado levando-se em consideração tais fatos e, a abusividade da prática de diferenciação de preços não se afigura. Pelo contrário, oferece ao próprio consumidor preços mais atrativos. ²Disponível em http://www.cade.gov.br/legislacao/resolucoes/20resol99.asp A diferenciação de preços não traz qualquer vantagem ao comerciante. Pelo contrário, é estipulada na exata proporção daquilo que lhe cabe de despesa adicional com o recebimento do valor através de cartão de crédito. A abusividade da prática só resta configurada quando a diferença for disparate entre o preço do produto para pagamento em dinheiro e para pagamento com o cartão de crédito. 2. Vedação de infração a ordem econômica O artigo 21, XII da Lei 8884/94 prevê que a diferenciação de preços seria conduta que infringe a ordem econômica. Porém, não se pode analisar a legislação de forma simplória, sem a contextualizar, devendo-se fazer uma análise mais detida. E para tal, vale colacionar entendimento do CADE, órgão competente para julgar tais infrações. Note-se que o entendimento é que a simples diferenciação não configura infração. Discriminação de preços: o produtor utiliza seu poder de mercado para fixar preços diferentes para o mesmo produto/serviço, discriminando entre compradores, individualmente ou em grupos, de forma a se apropriar de parcela do excedente do consumidor e assim elevar seus lucros. Esta prática, amplamente disseminada nas economias modernas, não é intrinsecamente anticompetitiva, na medida em que, embora aumentando os lucros do produtor, pode não afetar o bem-estar dos consumidores ao não restringir, ou até ao aumentar, o volume de transações no mercado. A análise específica se torna particularmente relevante neste caso, especialmente pela variedade de formas em que pode ocorrer a discriminação de preços. Em serviços de utilidade pública, a discriminação de preços reflete, com freqüência, a presença de categorias de consumidores com níveis muito díspares de consumo; diante de elevadas economias de escala, torna-se em geral eficiente cobrar menos de consumidores de volumes maiores. Na mesma direção, quando o custo marginal de fornecimento de um serviço aumenta significativamente em certos intervalos de tempo, comumente denominados "períodos de pico", o estabelecimento de preços diferenciados constitui prática eficiente.² O que a lei 8884/94 reprime é a diferenciação injustificada de preços. Contudo, como consta no último parágrafo acima, se houver na formação do preço um custo marginal ²Disponível em http://www.cade.gov.br/legislacao/resolucoes/20resol99.asp – in casu o percentual das operadoras –, a diferenciação não se demonstra desarrazoada. Assim, não há que se falar em infração a ordem econômica na diferenciação de preços. CONCLUSÕES Diante das explanações e situações expostas, conclui-se que a diferenciação de preços para pagamentos em dinheiro ou cheque e cartões de crédito ou débito não se afigura ilegal. Pelo contrário. A forma de pagamento é forma determinante na formação do preço por parte do lojista. O entendimento do STJ, verificando-se suas decisões, é muito superficial e não analisa a fundo a cadeia formadora de preços e as práticas comerciais envolvendo lojistas, consumidores e operadoras de cartão de crédito. E reafirma-se que somente com uma regulamentação efetiva por parte do Bacen ou dos organismos de regulação econômica do mercado de cartões de crédito e débito é que se poderá equiparar os preços em todas as formas de pagamento. Artigo elaborado pelo departamento jurídico da FCDL/SC ²Disponível em http://www.cade.gov.br/legislacao/resolucoes/20resol99.asp