ESTIMATIVA DA ALTURA DO CENTRO DE CARGAS
NEGATIVAS DAS TEMPESTADES DE RAIOS
Rafaela Ariana Flach1, Eduardo Alvim Leite 2 e Marco Jusevicius3
1
Instituto Tecnológico SIMEPAR – Centro Politécnico da UFPR – Jardim das Américas –
Curitiba – PR – Brazil, email: [email protected]
2
Instituto Tecnológico SIMEPAR – Centro Politécnico da UFPR – Jardim das Américas –
Curitiba – PR – Brazil, email:[email protected]
3
Instituto Tecnológico SIMEPAR – Centro Politécnico da UFPR – Jardim das Américas –
Curitiba – PR – Brazil, email: [email protected]
Resumo
A incidência direta ou indireta de descargas atmosféricas constituem-se em
importantes causas de perturbações em linhas de transmissão de energia, afetando o seu
funcionamento e podendo causar falhas e interrupções na transmissão de energia.
O presente trabalho tem a finalidade de discutir a determinação do envoltório
espacial de Linhas de Transmissão (buffer), parâmetro base para o desenvolvimento da análise
estatística do comportamento das descargas atmosféricas em torno da mesma, e
consequentemente, para a estimativa de risco de falha.
Abstract
The direct or indirect occurence of atmospheric discharges are important causes of
perturbations in energy transmission lines, causing malfunctions and causing possible
interruptions in energy transmission.
The present essay aims to demonstrate the experience developed at SIMEPAR
ascertaining the energy transmission line's spatial involucre. The development of the
statistical analysis of the discharging behavior around the transmission line and, consequently,
the estimated failure risk, are based on this parameter.
Introdução
A previsão da probabilidade de ocorrência de descargas atmosféricas em linhas de
transmissão de energia tem se mostrado prioritária, dada a taxa de ocorrência de perturbações,
falhas e interrupções na transmissão de energia devido a esse fenômeno. A importância da
pesquisa da altura do centro de cargas negativas da nuvem, neste contexto, é dada pela
necessidade de determinação do buffer desta linha.
Denominamos buffer da linha o envoltório espacial dentro do qual a ocorrência da
descarga atmosférica tem alta probabilidade de atingir diretamente a linha, com potencial de
causar impactos negativos na operação da mesma. Diversos modelos têm sido propostos para
a determinação do buffer da linha, conforme discutido em __. Um destes modelos relaciona o
buffer da linha à altura do centro de cargas negativas da nuvem. Segundo esse modelo
simplificado adotado neste contexto, o limite do buffer é aquele que iguala as distâncias entre
o ponto de origem da descarga à terra e ao cabo de guarda da linha de transmissão. A Figura 1
retrata esse modelo.
O foco no centro de cargas negativas da nuvem se relaciona ao fato da maioria das
descargas que alcançam o solo tem essa polaridade e as mesmas se concentram em posição
bem definida no interior da nuvem. Segundo Uman e Rakov (2003), menos de 10% das
descargas nuvem-solo se originam com carga positiva.
Segundo o modelo adotado, o tamanho do buffer é função da altura do centro de
cargas da nuvem, de onde parte a descarga atmosférica, e a altura das linhas de transmissão.
Este estudo se propõe a sumarizar o conhecimento acerca da altura do centro de cargas de
onde partem a maioria das descargas atmosféricas e estimá-la para a obtenção do buffer em
torno dos circuitos C1, C2 e C3 da Linha de Transmissão 765 kV Foz do Iguaçu (PR) – Tijuco
Preto (SP).
Modelo de cargas
A estrutura de cargas das nuvens de tempestade e a localização da fonte de descargas
é objeto de uma vasta investigação encontrada na literatura. As medidas dessas características
são feitas, basicamente, através de medidores de campo elétricos, sondas que podem
atravessar as nuvens de tempestade, sistemas de múltiplos radares e medidores de outras
características meteorológicas.
A concentração, valor e posição das cargas varia de acordo com o tipo de tempestade,
sua evolução, estação do ano e posição geográfica, em especial a latitude (Uman e Rakov,
2003).
O modelo mais aceito na literatura para a estrutura de cargas, e o modelo adotado
neste trabalho, é o modelo bipolar/tripolar, que considera a estrutura da nuvem como
composta pela existência de um núcleo de cargas negativas, seguido mais acima por um
grande núcleo de cargas positivas. Há o acréscimo, no modelo tripolar, de uma pequena
concentração de cargas positivas próximas à base da nuvem.
Pode ser encontrada uma grande variedade de alturas medidas para este centro de
cargas na literatura (Stolzenburg et al., 1998). O aumento do conhecimento acerca das
características gerais do processo de eletrificação e o aumento do número de medidas feitas
possibilitou a percepção de que, entre a grande diversidade de medidas obtidas, o processo de
eletrificação é similar, e a concentração de cargas negativas se encontra, de forma geral, em
temperatura aproximadamente entre -10°C e -25°C (Krehbiel, 1986).
A necessidade, a partir disto, é obter a altura correspondente a esta temperatura.
Existem diversos modelos de temperatura a altos níveis, porém foi optado pela interpolação
de dados de radiossondagem e de dados de reanálise para obter as alturas para cada estação do
ano do centro de cargas negativo em função da latitude.
Para este estudo, foi desconsiderada a incerteza relativa aos diversos caminhos que a
descarga atmosférica pode percorrer, e os fatores que tornam determinados pontos mais ou
menos propícios para a ocorrência da descarga. Supomos, assim, que a descarga percorre
caminhos perpendiculares ao solo.
A obtenção do buffer, a partir da altura do centro de cargas, é dada pela seguinte
relação, descrita em Chowdhuri (1989):
b 2  hn  ht   hn 2
2
(1)
Sendo: b a distância horizontal da descarga no limite do buffer à linha, ou seja, o
tamanho do buffer; hn a altura do centro de cargas da nuvem, em metros; ht a altura media das
torres de linhas de transmissão.
Para obter as alturas relativas a estas temperaturas, foi optado trabalhar com dados de
reanálise obtidas através do banco de dados do NOAA NCEP-NCAAR. Os dados obtidos
referem-se às temperaturas sobre as isóbaras de 400 hPa e 300 hPa sobre 15 pontos da grade
de 2,5° x 2,5°, entre 27,5°S e 22.5°S, e 55°W e 45°W (Figura 2).
hn - ht
Ponto de origem
hn origem
n da descarga
descarga
Tamanho do buffer (b)
buffer (b)
Figura 1 – Estimativa da largura do buffer a partir da altura da torre de transmissão e
da altura do centro de cargas negativas (em metros).
Resultados
Em uma análise inicial, o buffer foi dimensionado com base na estimativa do valor
da altura da base da nuvem. Foram feitas estimativas iniciais através de testes utilizando os
modelos de estimação do nível de condensação por levantamento descritos por Holton (1980)
e Davies-Jones (1983) através de dados meteorológicos de superfície.
Os valores apontavam para alturas em torno de 1 a 2 quilômetros, o que condiz com
as estimativas apontadas na literatura. Tal estimativa inicial foi importante para estabelecer,
temporariamente, um buffer mínimo, em torno de 250 m.
A relação entre a altura do ponto de origem da descarga e o buffer correspondente,
para diferentes alturas do cabo de guarda da linha de transmissão, é dada pela Figura 1.
A estimativa da altura do centro de carga, por sua vez, iniciou-se através dos dados
de temperatura em cada campo de pressão e foi obtido, primeiramente, a média de
temperatura de cada ponto, para cada mês (Figura 2).
Figura 2 – À esquerda, os pontos de grade considerados na estimativa. À direita, as médias
mensais de temperatura para cada ponto de grade em 400 hPa.
Verificou-se, como esperado, que a mudança de longitude não afeta de modo muito
determinante a temperatura, embora sejam visíveis certas alterações, principalmente no verão.
A variação anual e em função da latitude, por sua vez, se mostraram significativas. A variação
em função da latitude foi considerada linear, e foi feita uma regressão com todos as médias
mensais para obter esta relação.
A variação anual foi obtida através de variações das equações que modelam a
troposfera:
T  T 0  cH ;
(2)
 T 

P  P 0 
 T0 
 g
cR
(3)
;
Obtendo a seguinte relação:
H 
T
 y   1
c


P

P0



cR
g
;
(4)
Sendo:
P0 = 1013, 25 hPa; g = 9,801 m/s2, c= -0,0065 K/m; R = 287,04 J/kg/K;
H, a altura geopotencial em relação ao nível do mar, em metros;
P, a pressão na camada em questão, igual a 300 ou 400 hPa;.
T a temperatura da camada em questão, função da latitude.
Tendo este modelo constituído, ele foi aplicado aos dados de latitude, longitude e
altitude das três linhas. A extração das altitudes foi baseada no SRTM-NASA com resolução
espacial de 90m. Foram estimadas as alturas do centro de carga correspondentes a cada ponto,
para cada mês do ano (Figura 3 e 4).
Figura 3 – Mapa com o traçado dos três circuitos da Linhas de Transmissão
C1/C2/C3 765 kV Foz do Iguaçu (PR) – Tijuco Preto (SP).
Na Figura 4, estão apresentadas as estimativas das alturas do centro de cargas e o
buffer corresponde, para os três circuitos da Linha de Transmissão de Furnas, para os dois
meses que foram caracterizados como críticos: fevereiro (em azul e vermelho), apresenta as
maiores alturas correspondentes às temperaturas de -10°C e -25°C; junho (em verde e
amarelo), apresenta as menores alturas; as linhas em verde e azul correspondem às alturas
correspondentes à temperatura de -25°C, enquanto as linhas em vermelho e amarelo
correspondem à temperatura de -10°C.
Figura 4 – Altura estimada do centro de cargas para cada ponto da linha, e o buffer
correspondente.
Conclusões
O presente trabalho discute uma proposta para a estimativa do buffer de linhas de
transmissão e apresenta os passos utilizados em uma estimativa para a linha de transmissão
765 kV Foz do Iguaçu (PR) – Tijuco Preto (SP), conhecida como “Linhão de Furnas”,
responsável pela transmissão de cerca de 20% da energia produzida no país. Os resultados
apontaram para o buffer entre 650 e 950 metros, conforme varia o mês do ano e a temperatura
de localização do centro de carga negativa (-10°C a -25°C). A variação decorrente do trajeto
dos circuitos, que compreende a variação de altitude do terreno e de latitude não de mostram
determinantes na estimativa do buffer para esse caso. Como medida preventiva, o buffer do
Linhão de Furnas foi considerado de 1000 metros nos ambientes de monitoramento e análise
de descargas atmosféricas em operação no SIMEPAR.
Referências Bibliográficas
BOLTON, D. The computation of equivalent potential temperature. Monthly Weather Review,
1980.
CHOWDHURI, P. Estimation of flashover rates if overhead power distribution lines by
lightning strokes to nearby ground. IEEE Transaction on Power Delivery, 1989.
DAVIES-JONES, R. P. An accurate theoretical approximation for adiabatic condensation
temperature. Monthly Weather Review, 1983.
KREHBIEL, P. R. The electrical structure of thunderstorms. The Earth´s Electrical
Environment. Washington, DC: National Academy Press, 1986.
LEITE, E.A.; BENETI, C.; JUSEVICIUS, M. Metodologia para análise e correlação entre
desligamento e incidência de descargas atmosféricas. XX Seminário nacional de produção e
transmissão de energia elétrica, Recife, 2009.
STOLZENBURG, M.; RUST, W. D.; SMULL, B. F.; MARSHALL T.C. Electrical structure in
thunderstorm convective regions 1 - Mesoscale convective systems. Journal of geophysical
research, 1998.
UMAN, M. A.; RAKOV, V.A. Lightning: Physics and Effects. Cambridge University Press,
2003.
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