224 EDUCAÇÃO FÍSICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS A inclusão da Educação Física na educação de jovens e adultos representa a possibilidade de acesso, a cultura corporal de movimento. O acesso a esse universo de informações, vivências e valores é compreendido aqui como um direito do cidadão, na perspectiva da construção e usufruto de instrumentos para promover a saúde, utilizar criativamente o tempo de lazer e de expressão de afetos e sentimentos, em diversos contextos de convivência. Em síntese, a apropriação da cultura corporal de movimento, por meio da Educação Física na escola, pode e deve se constituir, num instrumento de inserção social, de exercício da cidadania e de melhoria da qualidade de vida. O recorte sugerido nos Parâmetros Curriculares Nacionais na área de Educação Física indicam um trabalho com a cultura corporal de movimento. O conceito de cultura, tratado no documento, é entendido como produto da sociedade e como processo dinâmico que, simultaneamente, vai constituindo e transformando a coletividade à qual os indivíduos pertencem. Cultura corporal de movimento indica o conhecimento possível de ser trabalhado pela área de Educação Física na escola. Trata-se, então, de um conhecimento produzido, em torno das práticas corporais. Esse conhecimento remonta a construção realizada pela humanidade ao longo do tempo, na tentativa de suprir insuficiências com criações de movimentos mais satisfatórios e eficientes. Historicamente, diversas possibilidades do uso do corpo foram desenvolvidas com a intenção de solucionar as mais variadas necessidades: motivos militares, relacionados ao domínio e uso do espaço; sobre a idéia do corpo forte, apto ao combate. Grande parte dos procedimentos didáticos desenvolvidos para esses objetivos influenciaram a ginástica ocidental, que teve sua origem na cultura greco-romana. Mais tarde, as práticas físicas ressurgiram, nos movimentos ginásticos do século IX tornando-se a matriz da educação física militar durante o século XX. Outros motivos contribuíram para o desenvolvimento da formação da cultura corporal de movimento; por exemplo: os econômicos, que dizem respeito às tecnologias de caça, pesca e agricultura; motivos de saúde, pelas práticas compensatórias e profiláticas. Além dos motivos religiosos, rituais e festas; motivos artísticos, ligados à construção e à 225 expressão de idéias e sentimentos; e por motivações lúdicas, relacionadas ao lazer e ao divertimento. Derivam daí conhecimentos e representações que se transformaram ao longo do tempo. Ressignificadas suas intencionalidades, formas de expressão e sistematização constituem o que se pode chamar de cultura corporal de movimento. Portanto, entende-se a Educação Física escolar como uma disciplina que introduz e integra o aluno na cultura corporal de movimento, formando o cidadão que vai produzi-la, reproduzi-la e transformá-la, instrumentalizando-o para usufruir de jogos, esportes, danças, lutas e das ginásticas em benefício do exercício crítico da cidadania e da melhoria da qualidade de vida. É necessário um esforço significativo de todos os profissionais envolvidos com EJA, a fim de que sejam criadas as condições de valorização desse universo de conhecimento, de modo que se tenha mais um núcleo de difusão dessa área cultural que, para além de ser regida pela obrigatoriedade legal, tem seu valor na construção da cidadania. Em função da presença da cultura corporal de movimento, tanto no âmbito nacional como mundial, e da importância sociocultural que essa área de conhecimento pode e deve ter na vida cotidiana do cidadão, a tarefa de conceber uma proposta de Educação Física para educação de jovens e adultos constitui-se, simultaneamente, numa necessidade e num desafio. Necessidade de reconhecer ter chegado o momento de olhar para esse segmento da sociedade brasileira e buscar novas formas de viabilizar seu acesso a essa área de conhecimento. Trata-se de ajustar a proposta de ensino aos interesses e possibilidades dos alunos de EJA, a partir de abordagens que contemplem a diversidade de objetivos, conteúdos e processos de ensino e aprendizagem, que compõe a Educação Física escolar na atualidade. Desafio de perceber e considerar suas especificidades de caráter metodológico, pois embora já exista um percurso na educação física de jovens e adultos , muitos caminhos ainda estão por ser percorridos. Com isso, atrair o convívio do aluno com as linguagens da Arte e da Educação Física aponta para o aumento da oferta de canais de expressão para um aluno que, de imediato, nem sempre procura na escola o acesso a esse tipo de 226 conhecimento. Ampliar a diversidade de expressão, numa sociedade que valoriza intensamente (por vezes exclusivamente) a linguagem escrita e a matemática, para um aluno que não domina muito bem esses códigos, e que, portanto, pode ter uma imagem negativa de si, pode levar ao caminho do fortalecimento da auto-estima. Favorecer as possibilidades de contato corporal consigo mesmo e com os outros, por meio de linguagens que favoreçam a expressão das idéias, sentimentos e crenças pelo movimento, pode dar oportunidade ao aluno de refletir sobre sua história pessoal e sobre como esta é “cravada” e desenhada em seu corpo ao longo do tempo. Delimitado este campo de ação e reflexão, duas questões primordiais precisam nortear o educador, como eixos orientadores do trabalho da Educação Física Escolar com jovens e adultos : • Quem são os alunos de EJA? • Como pode ser desenvolvida a Educação Física para estes alunos? As discussões no âmbito da Educação Física para EJA, com práticas expressas na cultura corporal, devem considerar que os alunos já possuem uma representação da escola , da atividade física e da educação física escolar, formada a partir das vivências que compõem a história pessoal de cada um, por isso, é importante incluir na perspectiva do ensino, como um dos eixos norteadores das ações educativas para jovens e adultos, possibilidades que resgatem as memórias que foram ancoradas a partir das vivências das diferentes práticas da cultura corporal. Isto representa valorizar e respeitar a história pessoal do aluno e, sobre esta, reconstruir e continuar construindo os significados do movimento e da cultura corporal. O que os alunos trazem nas suas lembranças, deve constar como ponto de partida do planejamento. Essas representações podem ser positivas ou negativas. Positivas quando trazem referências de uma educação física integradora e diversa, que não seja pautada apenas pelo esporte e sua organização seletiva. E negativas, se o aluno apresentar dificuldades em romper com certas lembranças principalmente com aquelas que se referem a exclusão, isto é,. são premiados os ganhadores, os “mais habilidosos”, pelo maior tempo de jogo, quando em situação de vitória permanecem na quadra aguardando o próximo adversário, em detrimento daqueles considerados “menos habilidosos”, que, ao perder, saem da disputa jogando durante menos tempo, e um numero menor de vezes. Ou, ainda, 227 numa situação individual, quando o acerto é garantia de continuidade no grupo, e o erro é o caminho para a exclusão. Por tudo isso, ressalta-se a necessidade de construir este conhecimento com participação do aluno, viabilizando a prática da inclusão. Outro ponto importante a ser considerado, nessa perspectiva de inclusão do aluno, é o trabalho com a cultura local, buscando localizar a origem das práticas, suas transformações e diferenciais com relação a outras regiões; por exemplo, a capoeira pode ser compreendida pela prática e pela leitura dessa prática, resgatando o percurso histórico e as diferentes influências que a transformaram até o momento presente, trazendo-a para a sala de aula. Essa abordagem dos conteúdos é adequada aos alunos jovens e adultos, pois seus interesses estão além da necessidade das práticas corporais, muito importantes em todas as faixas etárias, mas que, no entanto, não se esgotam somente no plano da vivência motora. Os alunos estão mais disponíveis a uma ampliação do olhar sobre essas práticas, no sentido de valorizar a expressão de sua cultura corporal e como pilar na construção de sua identidade. No sentido da construção de identidade, será tão importante considerar os valores construídos pelo aluno, ao longo de sua história pessoal, sobre a cultura corporal de movimento, como também os valores difundidos pela mídia em torno desse universo cultural. Mídia e Educação Física para jovens e adultos O aluno de EJA tem uma visão própria da sociedade, exerce sua individualidade de cidadão no trabalho e expressa seus desejos de lazer, muitas vezes, como “cliente” de alguns programas veiculados pela mídia. Por meio deles, absorve valores de outros contextos e com toda sua complexidade e individualidade pode, na escola, encontrar interlocução. Construir esse espaço é o grande desafio da Educação Física, para promover a reflexão sobre os conhecimentos construídos pelos alunos, viabilizando a explicitação de dúvidas e discordâncias. As Diretrizes Curriculares Nacionais apontam para essa questão e reconhecem o valor do tempo de lazer na sociedade, ressaltando ser preciso entender como os meios de comunicação vêm interferindo no desenvolvimento dos estudantes. Sabe-se que esses 228 meios são formadores de opinião e participam do processo de homogeneização da cultura de massa, na tentativa de sobrepor-se à cultura popular. O corpo não foge dessa batalha, sendo apresentado como padrão estético único, não abrindo espaço, na maioria das vezes, para a diversidade de padrões estéticos espalhados pelo Brasil. A mídia geralmente apresenta o corpo jovem, branco, musculoso para os homens, e essencialmente magro para as mulheres, envolvidos em difundir modismos, como alguns tipos de dança ou serem protagonistas de novelas, propagandas ou revistas. Além disso, há um movimento permanente em torno da cultura de massa, que a torna passageira já na sua concepção, com um ciclo de vida muito curto. O corpo “real” e a cultura corporal popular são muito valorizados nas comemorações religiosas, atribuídos de grande significado, como no bumba-meu-boi, no pastoril e no reisado, festas de rua que comemoram o aniversário de Jesus Cristo. Nessas comemorações, cidadãos comuns, com seus corpos reais, distantes dos modelos cultuados pela mídia, encontram um lugar de expressão, um palco para se transformarem naquilo que acreditam. Saem à rua para se divertir por meio de dramatizações cristãs sobre as histórias que envolveram o nascimento de Jesus. São verdadeiros espetáculos, atrações turísticas que movimentam a economia de muitas cidades ou apenas satisfazem moradores de pequenas regiões ou localidades. Muitas vezes as manifestações culturais populares estão ligadas à história local, ao cotidiano, seja na relação com o trabalho ou com a devoção. O estar junto determina o movimento de manutenção da identidade, um conhecimento da própria história que nunca pára de se transformar. É necessário sensibilizar o aluno para que reflita sobre o modelo de imagem corporal difundido e defendido pela mídia, a partir da própria imagem corporal e seus significados. Inicialmente, pode-se elaborar duas intervenções para atender à necessidade de reflexão sobre o modelo de imagem corporal difundido pela mídia. A primeira ligada à ampliação de tais modelos pela comparação e constatação que explicitem que eles não representam a diversidade cultural da nação. A segunda, ligada a inserção da reflexão na ação, ou seja, para além do fazer, da natureza predominantemente prática de abordagem dos conteúdos da área, as propostas podem propiciar uma reflexão sobre o que se faz de cultura corporal de movimento, e sobre os valores agregados a essas práticas. Além de ser prática, 229 a Educação Física proposta amplia e legitima o movimento como campo de expressão, carregado de conteúdos sociais. Síntese dos princípios que norteiam a educação física no ensino fundamental Os Parâmetros Curriculares Nacionais para a área de Educação Física escolar trazem como contribuição para a reflexão e discussão da prática pedagógica, três aspectos fundamentais: o princípio da inclusão, o da diversidade e as categorias de conteúdos. Dentro da realidade do ensino para educação de jovens e adultos, pode-se perceber a necessidade de se pensar no princípio da inclusão a todo momento da prática pedagógica. Considerando que a Educação Física sempre se pautou pela seleção dos alunos “hábeis” e a segregação daqueles não muito habilidosos, é preciso que se permita olhar para a cultura corporal de maneira ampla, além das atividades esportivas ou de relaxamento, por exemplo. Isso pode favorecer a criação de espaços para valorizar e refletir sobre a prática dentro do universo do movimento. Por existirem alunos que nunca participaram diretamente de atividades de movimento mais sistematizadas e organizadas como jogos, práticas esportivas, lutas, ginástica e atividades rítmicas e expressivas, o desempenho e a eficiência não devem ser considerados pontos altamente valorizados. O princípio da diversidade precisa estar presente nos caminhos que se buscam para a aprendizagem significativa, entendida como a aproximação entre os alunos e o conhecimento construído pela cultura corporal ao longo dos tempos. Essa escolha de objetivos e conteúdos deverá se pautar pela diversidade contida e trazida por meio das vivências dos diferentes grupos que chegam na escola . Esse movimento ocorre a cada novo período e pode ser associado às possibilidades de relacionamento com as outras áreas do conhecimento, dentro dos projetos de trabalho ou mesmo dos conteúdos segmentados e predeterminados por um planejamento repetido sistematicamente. É necessário visualizar com nitidez os diversos caminhos que se estabelecem entre os alunos - sujeitos de ensino e aprendizagem e o objeto de ensino e, nesse sentido, precisar com clareza as relações entre o que, para quem, e como se ensina e se aprende a cultura corporal, na educação de jovens e adultos , dentro da organização da escola. Não se pode perder de vista que os alunos estão inseridos numa cultura, trazem vivências de outras 230 culturas e são regidos por uma organização política e social. Isso faz crer na necessidade de olhar para a Educação Física como disciplina comprometida com o desenvolvimento de uma consciência crítica, por meio de uma ação cultural em seus objetivos, conteúdos e procedimentos. Estabelecer o diálogo como canal para o desvelamento da realidade por meio da problematização das ações cotidianas do esporte, por exemplo, dos valores presentes na mídia em relação a Educação Física e saúde, ética, etc. Outro aspecto relevante e fundamental, nesse processo, é a necessidade de um canal de comunicação entre o saber do aluno e o saber proposto pela escola. O educador assume o papel de mediador, garantindo espaço para que os alunos tenham voz dentro das escolhas e possam caracterizar a aprendizagem segundo suas necessidades. A relação de aproximação, apreensão, crítica e recriação da cultura corporal (produção) ocorre num contexto mais realista e mais político. Segundo Paulo Freire, não existe educação neutra, e os conteúdos precisam estar conectados à realidade, desenvolvidos de maneira não mecânica, sempre buscando uma reflexão, um pensar. Na Educação Física precisa-se ensinar não só o movimento, mas a realidade a que ele pertence , que está por ser desvelada. O que ensinar? Nesse ponto há uma discussão entre os professores de Educação Física em torno dos conteúdos significativos para o real desenvolvimento dos alunos. Há o desejo que ocorram alterações e incorporações de hábitos mais saudáveis e responsáveis para a saúde em geral. Isso só se efetivará dentro de um contexto em que o grupo se encontre mobilizado por razões muito específicas. É muito discutível que se prepare um programa, um planejamento de Educação Física para cada série, antes que o professor conheça algumas inquietações dos alunos sobre corpo e práticas que se relacionam a ele. Deve-se considerar que muitos conteúdos se inter-relacionam, logo objetivos podem ser atingidos por muitas vias do conhecimento, principalmente quando se amplia o foco para o desenvolvimento de competências e habilidades. O principal instrumento que os Parâmetros Curriculares Nacionais trazem nesta direção é a abordagem dos conteúdos escolares, em procedimentos, conceitos e atitudes, que apontam para uma valorização dos procedimentos sem restringi-los ao universo das habilidades motoras e dos fundamentos dos esportes, incluindo procedimentos de 231 organização, sistematização de informações, aperfeiçoamento, entre outros. Aos conteúdos conceituais de regras, táticas e alguns dados históricos factuais de modalidades, somam-se reflexões sobre os conceitos de ética, estética, desempenho, satisfação, eficiência, entre outros. E, finalmente, os conteúdos de natureza atitudinal são explicitados como objeto de ensino e aprendizagem e propostos como vivências concretas pelo aluno, o que viabiliza a construção de uma postura de responsabilidade perante si e o outro. Essa explicitação minimiza a construção de valores e atitudes, por meio do chamado “currículo oculto”1. Para quem ensinar? Quem é o aluno do ensino de jovens e adultos ? Quais são os seus interesses de aprendizagem? Quais são os seus conhecimentos prévios? Como são compostos os grupos? Como abordar as diferenças de faixa etária dentro de um mesmo grupo, os diferentes interesses e necessidades? Quais as transformações corporais, cognitivas, afetivas e sociais que ocorrem no universo diversificado dos alunos? Que grau de autonomia em relação ao próprio processo de aprendizagem o aluno pode assumir em cada etapa de seu processo? As respostas a essas e a inúmeras outras perguntas devem dar subsídios para que os processos de ensino e aprendizagem incluam o aluno, em relação interativa com os objetos de conhecimento da área. É fundamental que o professor fique sempre atento à duração e complexidade dessa interação, pois, da mesma forma que os objetos de ensino transformam os sujeitos, aos quais são sujeitos de ensino e aprendizagem, são, ao mesmo tempo, por eles transformados. É interessante refletir e considerar a qualidade e a quantidade de experiências de aprendizagem oferecidas pela escola, em relação com o meio sociocultural vivido pelo aluno fora dela, no qual é bombardeado pela indústria de massa da cultura e do lazer com falsas necessidades de consumo, carregado de mitos de saúde, desempenho e beleza, de informações pseudocientíficas e imprecisas. Em suma, uma sociedade que promete para muitos e viabiliza para poucos. Valores, preconceitos, e os estereótipos presentes no ambiente são o pano de fundo determinante para a geração de interesses e motivações dos alunos. Nesse contexto, deve-se 1 Para maior aprofundamento, recomenda-se a leitura do documento Parâmetros Curriculares Nacionais de Educação Física de 5ª a 8ª série, ver item “Conteúdos para o ensino fundamental”. 232 valorizar a função social da escola como espaço de experiências em que ampla parcela da população pode ter acesso à prática e à reflexão da cultura corporal de movimento. Como ensinar? Nas aulas de Educação Física, os aspectos procedimentais são mais facilmente observáveis, pois a aprendizagem desses conteúdos está necessariamente vinculada à experiência prática. No entanto, a valorização do desempenho técnico com pouca ênfase no prazer ou vice-versa, a abordagem técnica com referência em modelos muito avançados, a desvalorização de conteúdos conceituais e atitudinais e, principalmente, uma concepção de ensino que deixa como única alternativa ao aluno adaptar-se ou não a modelos predeterminados têm resultado, em muitos casos, na exclusão dos alunos. Portanto, além de buscar meios para garantir a vivência prática da experiência corporal, ao incluir o aluno na elaboração das propostas de ensino e aprendizagem devem ser considerado sua realidade social e pessoal, a percepção de si e do outro, dúvidas e necessidades de compreensão dessa mesma realidade. A partir da inclusão, pode-se constituir um ambiente de aprendizagem significativa, que faça sentido para o aluno, no qual ele tenha a possibilidade de fazer escolhas, trocar informações, estabelecer questões e construir hipóteses. Na aprendizagem e no ensino da cultura corporal de movimento, é preciso acompanhar a experiência prática e reflexiva dos conteúdos, na aplicação de contextos significativos. Durante esse acompanhamento, diversificando estratégias de abordagem dos conteúdos, aluno e professor podem participar de uma integração cooperativa de construção e descoberta, em que o aluno contribui com seu estilo pessoal de executar e refletir, e portanto de aprender trazendo em alguns momentos a síntese da atualidade para o instante da aprendizagem (recursos de troca de informações, conhecimentos prévios, informações da mídia etc.) e o professor promove uma visão organizada do processo, como possibilidades reais (experiência socioculturalmente construída, referência para a leitura). Em EJA, não só o professor promove a visão organizada do processo, mas este se completa com a possibilidade da ação dos alunos, como responsáveis também pelo ensino e aprendizagem dos colegas. Muitas vezes coexiste uma outra organização aparentemente desorganizada, se comparada ao conhecimento formal construído, mas capaz de atingir os 233 objetivos propostos: por exemplo, a troca entre os integrantes do grupo, (o aluno “vira professor”) com o objetivo de aumentar o grau de apropriação do fazer e, com isso, trazer elementos concretos para as discussões em torno de alguns temas polêmicos. Isso permite que se possa discutir e questionar alguns preconceitos sociais como por exemplo as competências designadas socialmente para as mulheres que elas não sabem jogar futebol ou qualquer outro jogo com bola. Pode-se, também, olhar para o outro lado, onde passeia o discurso de que basta pertencer ao sexo masculino para ser um bom jogador. Desse modo, ambos podem ressignificar suas estruturas interiores de aprendizagem e de ensino e elaborar a intenção e a predisposição necessárias à construção de um novo olhar... Prazer, técnica e interesses Em função da própria natureza lúdica de muitas das práticas da cultura corporal e dos diferentes contextos e intenções em que são exercidas, facilmente uma série de confusões se estabelecem na concepção dos processos de ensino e aprendizagem. Essas concepções se expressam em algumas propostas curriculares. Assim por exemplo, dá-se ênfase, em muitos casos, às atividades de relaxamento e alongamento como prevenção ao estresse diário, causado principalmente por muitas horas de trabalho. Aparecem alguns jogos e brincadeiras e não há referências quanto à preocupação com a técnica e sim com a participação de todos, garantida pelas atraentes estratégias realizadas pelos professores. A ludicidade está sempre muito presente. Em outros casos, em programas de treinamento para formar a seleção dos melhores, a fim de representar a escola. Neste caso, fica evidenciada a opção de um trabalho nos moldes geralmente adotados para o treino, que procura desenvolver e melhorar as habilidades e competências técnicas, por meio da repetição mecânica dos movimentos. OBJETIVOS DO ENSINO DE EDUCAÇÃO FÍSICA Os objetivos específicos que expressam o papel social da Educação Física para educação de jovens e adultos são: • Valorizar a participação e a integração de todos os alunos. 234 É necessário viabilizar um espaço para que as vivências de algumas práticas da cultura corporal, relevantes para o aluno jovem e adulto, legitimem o trabalho com a timidez, a auto-estima, o convívio e conhecimento do corpo, assim como as relações interpessoais, necessárias ao desenvolvimento da cidadania. • Valorizar, apreciar e desfrutar da cultura corporal de movimento. Deve-se criar condições dos alunos apreciarem eventos esportivos e culturais como torneios regionais, manifestações regionais como a capoeira, o bumba-meu-boi e outras danças, com o objetivo de valorizar essas produções culturais, para a ampliação do conhecimento histórico cultural e do olhar mais apurado para a estética gestual dessas manifestações. • Perceber e compreender as relações entre a cultura corporal e o exercício da cidadania. É importante ter como objetivo, junto ao aluno jovem e adulto, uma prática pedagógica reflexiva, pela qual se explicitem as práticas exclusivas em torno do corpo e do movimento. Esse caráter excludente, que classifica os alunos em aptos e inaptos, hábeis e inábeis, faz parte da herança histórica da Educação Física, remonta aos tempos em que a concepção que validava a existência da área era de natureza higienista, passando a seguir as fortes influências da educação militar. Na década de 70, visando á formação esportiva, a Educação Física escolar optou pelo modelo piramidal, ou seja, formar uma base escolar de alunos capacitados às atividades esportivas, da qual emergiriam talentos para representar o Brasil em competições internacionais. O modelo não deu certo, não se viabilizou o sonho da nação olímpica, a Educação Física escolar passou por uma crise de identidade, reformularam-se seus objetivos, iniciou-se a reflexão sobre os objetivos gerais para a educação básica e fundamental. O que permanece, apesar das mudanças dos referenciais conceituais da área, são as práticas pedagógicas seletivas presentes no Ensino Fundamental. Aqui o aluno pode localizar parte de sua história com a Educação Física e rever os valores presentes no processo de ensino pelo qual passou, sua própria relação com a cultura corporal, além de poder posicionar-se contra os processos de exclusão, afirmando os valores de direito ao acesso a esse universo de conhecimento. Incluir no processo de construção do conhecimento o debate de assuntos polêmicos em torno das atividades físicas, do esporte espetáculo, do uso das imagens que representam 235 saúde para estimular o consumo de produtos desnecessários, que valorize o pluralismo cultural, aliado ao estímulo a pesquisa, ao debate, ao confronto de opiniões, pode representar uma mudança na relação com o conhecimento, decorrendo em uma ampliação da observação crítica ao que se apresenta como verdade “científica”. • Usufruir do lazer, resgatando o prazer enquanto aspecto fundamental para a saúde e melhoria da qualidade de vida. Torna-se fundamental abordar diferentes práticas da cultura corporal como forma de lazer, que é um importante direito social assegurado constitucionalmente. Devem ser oferecidas, ao aluno, condições para o exercício desse direito, assim como espaço para reflexões sobre as possibilidades de uso do tempo e do espaço em suas práticas corporais de lazer. Valorizar o tempo de lazer, como possibilidade de ampliação das relações interpessoais dentro da comunidade, é pensar em qualidade de vida que pode ser promovida por meio de algumas atitudes, como a reivindicação de espaços públicos para o lazer e a organização em torno da utilização desses espaços. Promover trabalhos em grupo para discutir a gestão desses espaços, pesquisando na própria comunidade ou buscando informações sobre o que é desenvolvido em outros espaços, pode ser o ponto de partida para um trabalho que viabilize alternativas com um público que apresenta maiores possibilidades de interferência na comunidade. • Valorizar, por meio do conhecimento sobre o corpo, a formação de hábitos de auto-cuidado. Trata-se de ampliar os conhecimentos relacionados à saúde, pelas práticas da cultura corporal de movimento, que repercutam na melhoria da qualidade de vida e do bem-estar. Por meio do conhecimento sobre seu corpo, os alunos poderão valorizar os conhecimentos e procedimentos de aplicação desses conhecimentos, em benefício próprio e de sua comunidade. Propostas de ensino que contemplem esse objetivo são oportunas, nesse momento da escolarização, e muitas vezes representam a única via de acesso, para o aluno de EJA, a esse conhecimento. A apropriação por parte do aluno, quanto à valorização das práticas de formação de hábitos de auto-cuidado e ao domínio dos conhecimentos que permitam análise de situações concretas. Por exemplo, o uso do corpo em situações de trabalho 236 repetitivo, as posições de apoio que protegem a coluna durante um esforço físico, as forma de compensar movimentos com objetivo de manutenção funcional, as relações que se estabelecem entre atividades aeróbicas e doenças cardiovasculares. • Compreender e ser capaz de analisar criticamente os valores sociais como os padrões de beleza, as relações de gênero e preconceitos. Para contemplar esse objetivo, assim como a outros, trabalhar com os temas transversais, dentro da área ou ainda na interdisciplinaridade, representa uma possibilidade real de avançar concretamente na elaboração de propostas de ensino. Analisar os padrões de estética veiculados pela mídia, relacioná-los aos diferentes significados e interesses a eles vinculados, permite a inclusão do debate sobre: consumo, trabalho e quanto ao consumo relacionado ao corpo e ao movimento. Poderemos incluir, enquanto abordagem de conteúdos, os modelos estéticos e a sua relação com o consumo dos produtos dietéticos, com os modismos das dietas, e com programas de emagrecimento e atividade física veiculados na mídia. Não se trata de negar os conhecimentos construídos sobre a necessidade de combate ao sedentarismo, mas antes de tudo, de acessar os conhecimentos que possibilitem a análise da mídia, e que possam gerar um grau de autonomia no gerenciamento de práticas pessoais. CONTEÚDOS DO ENSINO DE EDUCAÇÃO FÍSICA Os conteúdos são apresentados segundo sua categoria conceitual (fatos, conceitos e princípios), procedimental (ligados ao fazer) e atitudinal (normas, valores e atitudes). Os conteúdos conceituais e procedimentais mantêm uma grande proximidade, na medida em que o objeto central da cultura corporal de movimento gira em torno do fazer, do compreender e do sentir com o corpo. Inclui-se nessas categorias os próprios processos de aprendizagem, organização e avaliação. Os conteúdos atitudinais apresentam-se como objeto de ensino e aprendizagem, e apontam para a necessidade do aluno vivenciá-los de modo concreto no cotidiano escolar, buscando minimizar a construção de valores e atitudes por meio do “currículo oculto”. Estão presentes de maneira contundente e agem paralelamente às categorias dos conceitos e dos procedimentos. Deve-se relevar e investigar 237 o quanto as normas e valores de muitos alunos de EJA orientam sua entrega ou sua resistência em participar das atividades de movimento. Critérios de seleção dos conteúdos Para garantir a coerência entre a concepção exposta e a concretização dos objetivos, alguns critérios foram utilizados para selecionar os conteúdos que serão trabalhados com os alunos. A definição dos conteúdos buscou guardar uma amplitude que possibilite a consideração das diferenças entre regiões, cidades e localidades brasileiras e suas respectivas populações. Além disso, tomou-se como referencial a diversidade de possibilidades de aprendizagem dos alunos nesta etapa da escolaridade. A seleção dos conteúdos está vinculada à relevância que essas práticas têm na cultura corporal de movimento do povo brasileiro. A aprendizagem dessas práticas, enquanto conteúdo, deve ser ampliada, considerando as dimensões conceituais, procedimentais e atitudinais, que ampliem as capacidades de interação social, o usufruto das possibilidades de lazer, a promoção da saúde pessoal e coletiva. É importante também, sempre que possível, estabelecer vínculos com os temas transversais, atendendo à demanda social, sem perder de vista as características do aluno de EJA. Especificidades do conhecimento da área Blocos de conteúdo Muitas vezes a organização do currículo na área de Educação Física não acompanha a divisão por seriação, tratando o conteúdo como um bloco a ser trabalhado ao longo do que se chama de terceiro e quarto ciclos do Ensino Fundamental. Sendo EJA um curso de características muito próprias, pode ser muito interessante quebrar essas fronteiras e estruturar uma nova organização que seja regida por princípios mais coerentes com a realidade e a real necessidade dos alunos. A distribuição e o desenvolvimento dos conteúdos estão relacionados com o projeto pedagógico de cada escola e a especificidade de cada grupo. A característica do trabalho deve contemplar os vários níveis de competência desenvolvidos, para que todos os alunos 238 sejam incluídos, e as diferenças individuais resultem em oportunidades para troca e enriquecimento do próprio trabalho. Dentro dessa perspectiva, o grau de aprofundamento dos conteúdos estará submetido às dinâmicas dos próprios grupos. A seguir serão apresentados como uma referência didática os blocos de conteúdos na área, assim não devem representar estruturas rígidas que devam ser cumpridas de um modo específico, mas um recorte possível de ser abordado no contexto escolar. Esportes, jogos, lutas e ginásticas Atividades rítmicas e expressivas Conhecimentos sobre o corpo Conhecimentos sobre o corpo Este bloco refere-se aos conhecimentos e conquistas individuais que subsidiam as práticas corporais expressas nos outros dois blocos e que dão recursos para o indivíduo gerenciar sua atividade corporal de forma autônoma. O corpo é compreendido não como um amontoado de partes e aparelhos, mas como um organismo integrado, como um corpo vivo, que interage com o meio físico e cultural, que sente dor, prazer, alegria, medo etc. Para se conhecer o corpo, abordam-se os conhecimentos anatômicos, fisiológicos, biomecânicos e bioquímicos que capacitam a análise crítica dos programas de atividade física e o estabelecimento de critérios para julgamento, escolha e realização de atividades corporais saudáveis. Neste bloco, inserem-se os conteúdos que se inter-relacionam com as áreas de conhecimento de anatomia, fisiologia, bioquímica e da biomecânica. Estes conteúdos são abordados principalmente a partir da percepção do próprio corpo, isto é, o aluno poderá, estimulado por suas sensações e, de posse de informações conceituais sistematizadas, analisar e compreender as alterações que ocorrem em seu corpo durante e depois de fazer atividades. Poderão ser feitas análises sobre alterações a curto, médio ou longo prazo. Sob a ótica da percepção do próprio corpo, os alunos também poderão analisar seus movimentos no tempo e no espaço: como são seus deslocamentos, qual é a velocidade de seus movimentos etc. Fazem parte deste bloco os conhecimentos sobre os hábitos posturais e atitudes corporais. A ênfase deste item está na relação entre as possibilidades e as necessidades 239 biomecânicas e a construção sociocultural da atitude corporal, dos gestos, da postura. Por que, por exemplo, os orientais sentam-se no chão, com as costas eretas? Por que há uma tendência das pessoas se apoiarem em apenas uma das pernas quando estão de pé? Observar, analisar, compreender essas atitudes corporais são atividades que podem ser desenvolvidas juntamente com projetos de História, Geografia e pluralidade cultural. Além da análise dos diferentes hábitos, pode-se incluir a questão da postura dos alunos na escola: as posturas mais adequadas para fazer determinadas tarefas e para diferentes situações. O corpo como sede de sensações e emoções deverá ser contemplado como conteúdo, de modo a permitir a compreensão da dimensão emocional que se expressa nas práticas da cultura corporal e a percepção do corpo sensível e emotivo, por meio de vivências corporais, como jogos dramáticos, massagem etc. Esportes, jogos, lutas e ginásticas Não se pretende, com este documento, definir cada uma das práticas, mas sim, transformá-lo em um instrumento viável ao professor e à escola, no sentido da operacionalizar e sistematizar os conteúdos da forma mais abrangente, diversificada e articulada possível. Assim, as práticas em que são adotadas regras de caráter oficial e competitivo, organizadas em federações regionais, nacionais e internacionais que regulamentam a atuação amadora e a profissional, são consideradas como esporte. Envolvem condições espaciais e de equipamentos sofisticados como campos, piscinas, bicicletas, pistas, ringues, ginásios etc. A divulgação pela mídia favorece a sua apreciação por um diverso contingente de grupos sociais e culturais. Por exemplo, os Jogos Olímpicos, a Copa do Mundo de Futebol, ou determinadas lutas de boxe profissional, são vistos e discutidos por um grande número de apreciadores e torcedores. Os jogos podem ter maior flexibilidade nas regulamentações, que são adaptadas em função das condições de espaço e material disponíveis, do número de participantes, entre outros. São exercidos com caráter competitivo, cooperativo ou recreativo em situações festivas, comemorativas, de confraternização ou, ainda, no cotidiano, como simples passatempo e diversão. Assim, incluem-se entre os jogos as brincadeiras regionais, os jogos de salão, de mesa, de tabuleiro, de rua e as brincadeiras infantis de modo geral. 240 As lutas são disputas em que o(s) oponente(s) deve(m) ser subjugado(s), com técnicas e estratégias de desequilíbrio, contusão, imobilização ou exclusão de um determinado espaço na combinação de ações de ataque e defesa. Caracterizam-se por uma regulamentação específica a fim de punir atitudes de violência e de deslealdade. Podem ser citados como exemplos de lutas desde as brincadeiras de cabo-de-guerra e braço-de-ferro até as práticas mais complexas da capoeira, do judô e do karatê. As ginásticas são técnicas de trabalho corporal que, de modo geral, assumem um caráter individualizado com finalidades diversas. Por exemplo, pode ser feita como preparação para outras modalidades, como relaxamento, para manutenção ou recuperação da saúde ou ainda de forma recreativa, competitiva e de convívio social. Envolvem ou não a utilização de materiais e aparelhos, podendo ocorrer em espaços fechados, ao ar livre e na água. Cabe ressaltar que são conteúdos que têm uma relação privilegiada com o bloco “conhecimentos sobre o corpo”, pois, nas atividades de ginásticas, esses conhecimentos se explicitam com bastante clareza. Atualmente, existem várias técnicas de ginástica que trabalham o corpo de modo diferente das ginásticas tradicionais (de exercícios rígidos, mecânicos e repetitivos), visando à percepção do próprio corpo: ter consciência da respiração, perceber relaxamento e tensão dos músculos, sentir as articulações da coluna vertebral. Uma prática pode ser vivida ou classificada, em função do contexto em que ocorre e das intenções de seus praticantes. Por exemplo, o futebol pode ser praticado como um esporte, em que se valorizam os aspectos formais, considerando as regras oficiais que são estabelecidas internacionalmente (e que incluem as dimensões do campo, o número de participantes, o diâmetro e o peso da bola, entre outros aspectos), com platéia, técnicos e árbitros. Pode ser considerado um jogo, quando ocorre na praia, ao final da tarde, com times compostos na hora, sem árbitro nem torcida, com fins puramente recreativos. E, em muitos casos, esses aspectos podem estar presentes simultaneamente. Incluem-se, neste bloco, as informações históricas sobre as origens e características dos esportes, jogos, lutas e ginásticas, e a valorização e apreciação dessas práticas. 241 Atividades rítmicas e expressivas Em princípio, é relevante sublinhar que todas as práticas da cultura corporal de movimento, mais ou menos explicitamente, possuem expressividade e ritmo. Quanto à expressão, essas práticas se constituem em códigos simbólicos, por meio dos quais a vivência individual do ser humano, em interação com os valores e conceitos do ambiente sociocultural, produz a possibilidade de comunicação por gestos e posturas. Em relação ao ritmo, desde a respiração até a execução de movimentos mais complexos, requer-se um ajuste com referência no espaço e no tempo, envolvendo, portanto, um ritmo ou uma pulsação. Este bloco de conteúdos inclui as manifestações da cultura corporal que têm como característica comum a intenção explícita de expressão e comunicação, por meio dos gestos na presença de ritmos, sons e da música na construção da expressão corporal. Trata-se especificamente das danças, mímicas, brincadeiras cantadas e das cirandas. Nessas atividades rítmicas e expressivas, encontram-se mais subsídios para enriquecer o processo de informação e formação dos códigos corporais de comunicação dos indivíduos e do grupo. Num país em que pulsam a capoeira, o samba, o bumba-meu-boi, o maracatu, o frevo, o afoxé, a catira, o baião, o xote, o xaxado, entre muitas outras manifestações, é surpreendente o fato de a Educação Física, durante muito tempo, ter desconsiderado essas produções da cultura popular como objeto de ensino e aprendizagem. A diversidade cultural, que caracteriza o país, tem na dança uma de suas expressões mais significativas, constituindo um amplo leque de possibilidades de aprendizagem. Os conteúdos deste bloco são amplos, diversificados e podem variar muito, de acordo com o local em que a escola estiver inserida. Sem dúvida alguma, resgatar as manifestações culturais tradicionais da coletividade, principalmente por meio das pessoas mais velhas, é de fundamental importância. A pesquisa sobre danças, brincadeiras cantadas de regiões distantes, com características diferentes das danças e brincadeiras locais, pode tornar o trabalho mais completo. Por meio das danças, brincadeiras e cirandas os alunos poderão conhecer as qualidades do movimento expressivo como leve/pesado, forte/fraco, rápido/lento, 242 fluido/interrompido. Podem perceber sua intensidade, duração, direção e analisá-lo a partir desses referenciais. Importante também é a percepção de um momento muito especial na dança, que é o saber conviver com a sensação de liberdade que acompanha tanto o exercício de criação, como o de conviver com o modelo pronto do desenho coreográfico. Processos de criação e cópia, utilizados de forma inadequada, reacendem categoricamente as atitudes corporais estereotipadas. Portanto, a possibilidade de harmonizar criação livre e cópia de movimento passa a ser uma atitude sensata de equilíbrio na aplicação dos conteúdos. Para adoção de atitudes de valorização e apreciação dessas manifestações expressivas, é importante conhecer técnicas de execução de movimentos, utilizar-se delas no exercício de seu potencial comunicativo, ser capaz de improvisar e de criar coreografias. Organização dos conteúdos Considerar as características dos alunos quanto à distribuição dos conteúdos durante essa etapa da escolarização, implica dimensionar o tempo de desenvolvimento de conteúdos “eleitos” junto a esses alunos. Neste sentido, com o propósito de elaborar uma proposta que permita um grau de diferenciação para cada grupo de trabalho, pode-se pensar no desenvolvimento de um programa por unidades didáticas, que seriam iniciadas a partir dos interesses e dos conhecimentos prévios que os alunos apresentem sobre o conteúdo a ser desenvolvido. O tempo de desenvolvimento de cada unidade estará relacionado com as possibilidades de aprofundamento dos grupos envolvidos; assim, grupos diferenciados terão aprofundamentos também diferentes, que se expressarão em vários roteiros de aprendizagem. Por exemplo, o conteúdo esporte poderá encaminhar-se para a análise prática dos gestos técnicos e das regras que determinam a prática do futebol. Neste caso, subgrupos podem ser formados em torno dessa unidade. Também pode haver grupos de trabalho com habilidade de jogo, que podem criar situações de aprendizagem para os que têm menos experiência. Outro grupo aprofundará o estudo das regras, partindo das oficiais em direção à adaptação para o grupo, com objetivo de tornar a participação de todos possível e prazerosa. Enfim, subgrupos podem ser criados, a partir dos interesses do grupo e do projeto educativo da escola, em torno de temas relacionados ao futebol como: mídia, 243 futebol e comportamento, violência no esporte, doping no esporte, a presença da mulher no esporte futebol, esporte profissional e esporte como lazer e integração. A partir de uma proposta e da formação de subgrupos de trabalho, o que determinará o alcance de uma unidade didática será a capacidade de articulação dos conhecimentos que o grupo possui, de partilhar esses conhecimentos entre seus integrantes, e a aplicação de metodologias de aprendizagem que garantam o avanço de todos, contemplando a diversidade de interesses e habilidades. Portanto, é fundamental que o trabalho organizado, em torno de unidades didáticas, preveja a possibilidade dos grupos seguirem itinerários diversos, com duração de tempo também diferente; assim, gerenciar junto com os alunos as produções do grupo, divididas em subgrupos, implica criar momentos para a socialização dos conhecimentos obtidos. Quando o professor, responsável pelo encaminhamento das propostas, percebe que o tema está se esgotando, enquanto produção de conhecimento, poderá encaminhar o trabalho para outra unidade, fazendo um fechamento dos conhecimentos obtidos. Essa unidade, agora encerrada, poderá ser retomada à frente, com objetivos de aprofundamento a partir dos conhecimentos já obtidos. Desse modo, passamos a pensar sobre o desenvolvimento dos conteúdos como espirais, que, ao serem retomados, começam a partir de um nível superior ao anteriormente trabalhado. Abordagem dos conteúdos Os conteúdos de aprendizagem serão apresentados dentro dos blocos, segundo suas categorias (conceitual , procedimental e atitudinal) o que permite a identificação mais precisa das intenções educativas. Nesse sentido, deve-se considerar que essas categorias de conteúdo sempre estão associadas, mesmo que tratadas de maneira específica. Por exemplo, os aspectos conceituais do desenvolvimento da resistência orgânica são aprendidos junto com os procedimentais, por meio da aplicação de exercícios de natureza aeróbica e anaeróbica, junto dos aspectos atitudinais de valorização (sentir-se envolvido e responsabilizar pelo seu desenvolvimento). Essas categorias constituem-se em referenciais para o diálogo entre o ensino e a aprendizagem. Os conteúdos dos blocos são organizados em dois itens: o primeiro trata dos conteúdos atitudinais, e o segundo agrupa conteúdos conceituais e procedimentais. 244 Os conteúdos atitudinais são apresentados em primeiro plano, perpassando os três blocos, pois a aprendizagem de qualquer prática da cultura corporal de movimento que não considerá-los de forma explícita reduzir-se à mera aprendizagem tecnicista e alienada. Entendem-se por valores os princípios éticos e as idéias que permitem que se possa emitir um juízo sobre as condutas e seu sentido. As atitudes refletem a coerência entre o comportamento e o discurso do sujeito. São as formas que cada pessoa encontra para expressar seus valores e posicionar-se em diferentes contextos. As normas são padrões ou regras de comportamento, construídos socialmente, para organizar determinadas situações; constituem a forma pactuada de concretizar os valores compartilhados por um coletivo e indicam o que se pode e o que não se pode fazer. Em seguida, os conteúdos conceituais e procedimentais são distribuídos nas especificidades de cada bloco. Os procedimentos expressam um saber fazer que envolve tomar decisões e realizar uma série de ações, de forma ordenada e não aleatória, para atingir uma meta. Os conceitos e princípios constituem-se em generalizações, deduções, informações e sistematizações relativas ao ambiente sociocultural. São organizados lado a lado, em função do diálogo que se estabelece na cultura corporal de movimento entre o fazer, o pensar e o sentir. Conteúdos atitudinais - conhecimento sobre o corpo; esportes, jogos, lutas e ginásticas; atividades rítmicas e expressivas • Valorização do estilo pessoal de cada um. • .Predisposição à cooperação e solidariedade (ajudar o outro, dar segurança, contribuir com um ambiente favorável ao trabalho etc.). • Predisposição ao diálogo (favorecer a troca de conhecimento, não omitir informações úteis ao desenvolvimento do outro, valorizar o diálogo na resolução de conflitos, respeitar a opinião do outro). • Valorização da cultura popular e nacional. • Predisposição para a busca do conhecimento, da diversidade de padrões, da atitude crítica em relação a padrões impostos, do reconhecimento a outros padrões pertinentes a diferentes contextos. 245 • Respeito a si e ao outro (próprios limites corporais, desempenho, interesse, biotipo, gênero, classe social, habilidade, erro etc.). • Valorização do desempenho esportivo de um modo geral, sem ufanismo ou regionalismo. • Predisposição para experimentar situações novas ou que envolvam novas aprendizagens. • Predisposição para cultivar algumas práticas sistemáticas (exercícios técnicos, de manutenção das capacidades físicas etc.). • Aceitação da disputa como um elemento da competição e não como uma atitude de rivalidade frente aos demais. • Predisposição para aplicar os conhecimentos técnicos e táticos. • Valorização do próprio desempenho em situações competitivas desvinculadas do resultado. • Reconhecimento do desempenho do outro, como subsídio para a própria evolução, como parte do processo de aprendizagem (diálogo de competências). • Disposição para adaptar regras, materiais e espaço visando à inclusão do outro (jogos, ginásticas, esportes etc.). • Disposição para aplicar os conhecimento adquiridos e os recursos disponíveis na criação e adaptação de jogos, esportes e danças, otimizando o tempo disponível para o lazer. • Valorização da cultura corporal de movimento como parte do patrimônio cultural da comunidade, do grupo social e da nação. • Valorização da cultura corporal de movimento como instrumento de expressão de afetos, sentimentos e emoções. • Valorização da cultura corporal de movimento como possibilidade de obter satisfação e prazer. • Valorização da cultura corporal de movimento como linguagem, como forma de comunicação e interação social. • Respeito a diferenças e características relacionadas ao gênero presente nas práticas da cultura corporal de movimento. 246 Conteúdos conceituais e procedimentais - conhecimentos sobre o corpo • Identificação das capacidades físicas básicas. • Compreensão dos aspectos relacionados com a boa postura. • Compreensão das relações entre as capacidades físicas e as práticas da cultura corporal de movimento. • Compreensão das técnicas de desenvolvimento e manutenção das capacidades físicas básicas. • Vivência de diferentes formas de desenvolvimento das capacidades físicas básicas. • Identificação das funções orgânicas relacionadas às atividades motoras. • Vivências corporais que ampliem a percepção do corpo sensível e do corpo emotivo. • Conhecimento dos efeitos que a atividade física exerce sobre o organismo e a saúde. Conteúdos conceituais e procedimentais - esportes, jogos, lutas e ginásticas • Compreensão dos aspectos históricos sociais relacionados aos jogos, às lutas, aos esportes e às ginásticas. • Participação em jogos, lutas e esportes, dentro do contexto escolar de forma recreativa. • Participação em jogos, lutas e esportes, dentro do contexto escolar de forma competitiva. • Vivência de jogos cooperativos. • Desenvolvimento das capacidades físicas e habilidades motoras, por meio das práticas da cultura corporal de movimento. • Compreensão e vivência dos aspectos relacionados à repetição e à qualidade do movimento na aprendizagem do gesto esportivo. • Aquisição e aperfeiçoamento de habilidades específicas a jogos, esportes, lutas e ginásticas. • Compreensão e vivência dos aspectos técnicos e táticos do esporte no contexto escolar. 247 • Desenvolvimento da capacidade de adaptar espaços e materiais na criação de jogos. • Desenvolvimento da capacidade de adaptar espaços e materiais para realizar esportes simultâneos, envolvendo diferentes objetivos de aprendizagem. • Vivência de esportes individuais dentro de contextos participativos e competitivos. • Vivência de esportes coletivos dentro de contextos participativos e competitivos. • Vivência de variados papéis assumidos no contexto esportivo (goleiro, defesa, atacante, técnico, torcedor, juiz). • Participação na organização de campeonatos, gincanas, excursões e acampamentos dentro do contexto escolar. • Compreensão das diferentes técnicas ginásticas relacionadas com diferentes contextos histórico-culturais e com seus objetivos específicos. • Compreensão e vivência dos aspectos de quantidade e qualidade relacionados aos movimentos ginásticos. Conteúdos conceituais e procedimentais - atividades rítmicas e expressivas • Compreensão dos aspectos histórico-sociais das danças. • Percepção do ritmo pessoal. • Percepção do ritmo grupal. • Desenvolvimento da noção espaço/tempo vinculada ao estímulo musical e ao silêncio com relação a si mesmo e ao outro. • Exploração de gestos e códigos de outros movimentos corporais não abordados nos outros blocos. • Compreensão do processo expressivo, partindo do código individual para o coletivo (mímicas individuais, representações de cenas do cotidiano em grupo, danças individuais, pequenos desenhos coreográficos em grupo). • Percepção dos limites corporais na vivência dos movimentos rítmicos e expressivos. • Predisposição a superar seus próprios limites nas vivências rítmicas e expressivas. 248 • Vivências das danças da cultura popular regional, compreendendo seus contextos de manifestação (Carnaval, escola de samba e seus integrantes, frevo, capoeira, bumba-meu-boi etc.). • Reconhecimento e apropriação dos princípios básicos para construção de desenhos coreográficos e coreografias simples. • Vivência da aplicação dos princípios básicos na construção de desenhos coreográficos. • Vivência das manifestações das danças urbanas mais emergentes e compreensão do seu contexto originário. • Vivência das danças populares regionais nacionais e internacionais e compreensão do contexto sociocultural onde se desenvolvem. Ensinar e aprender na educação de jovens e adultos Inicialmente, é fundamental que se façam algumas considerações sobre aspectos da realidade escolar brasileira que vão incidir sobre os processos de ensino e aprendizagem característicos da educação de jovens e adultos . Em EJA, a correspondência ideal entre idade e ciclo escolar não existe. Essa situação pode ser verificada pela convivência de alunos com idade a partir de 16 anos, não sendo possível precisar um teto para um limite máximo de idade escolar. Tudo isso num mesmo grupo. Esse quadro potencializa a já característica diversidade de interesses e formas de aprendizagem, de qualidade de interação social, de conhecimentos prévios entre alunos de uma mesma turma ou classe, exigindo do professor ainda mais clareza de intenções na sistematização de conteúdos, objetivos, estratégias, dinâmicas e formas de intervenção. As considerações que seguem são referências que apontam para determinadas direções e tendências presentes ao longo do desdobramento da escolaridade, importantes de serem observadas e, na medida de cada realidade, priorizadas e aprofundadas nos dois últimos ciclos. Pois qualquer tentativa de organizar processos de ensino e aprendizagem, em relação direta com faixas etárias de forma propedêutica e hierarquizada, será demasiadamente reducionista, e até mesmo falsa, se não incluir o aluno em primeiro plano de referência. 249 Neste momento da escolaridade, jovens e adultos dão andamento a um processo de busca de identificação e afirmação pessoal, em que a construção da auto-imagem e da autoestima desempenham um papel muito importante. Nessa construção, as experiências corporais adquirem uma dimensão significativa, cercada de dúvidas, conflitos, desejos, expectativas e inseguranças. Quase sempre influenciados por modelos externos, o jovem questiona muito mais a sua auto-imagem em relação à beleza, capacidades físicas, habilidades, limites, competências de expressão e comunicação, interesses etc., do que o adulto . Esse questionamento se poderia resumir na seguinte pergunta para o jovem: Como eu sou e como desejo ser? No adulto, há um afastamento seu em relação à própria imagem corporal, no sentido de acreditar que não há muito mais o que mudar, quase sempre se referindo aos atributos externos, como abdome saliente, cansaço, dores constantes no joelho e na coluna, entre outros, em função da idade “avançada”. Em EJA, é fundamental que se leve os alunos a perceberem como se relacionam idade e atividade física em geral. As questões em torno da sexualidade podem ser abordadas a partir dos temas transversais. Jovens e adultos poderão discutir temas relacionados às práticas corporais e a relação entre gêneros, a dimensão prazerosa do movimento, a erotização das danças na mídia. As vivências corporais pessoais e de interação social, onde ver e ser visto, expor-se ou retrair-se, escolher e ser escolhido são situações que implicam conseqüências reais, vividas de maneira mais ou menos satisfatória, que podem ser resgatadas junto ao grupo, permitindo uma recapitulação dos processos pessoais de aprendizagem. Praticar o processo de recapitulação das experiências pessoais pode ser muito importante nesse momento da escolarização, pois permite rever as respostas utilizadas naquele momento de vida, em contexto específico, e confrontá-lo com o momento atual, quando solicitamos percepção do próprio processo de aprendizagem, considerando as características do grupo. Em muitos momentos, a pergunta ganha outro sentido: “Como ser, para ser desejável?” Em EJA, isso pode ser reconhecido também pelo estilo de roupa que inicialmente escolhem para vir às aulas de Educação Física: atraentes, brilhosas e coloridas, decotadas e muito coladas, impedindo em muito o movimento natural do corpo. Sapatos, calças e camisas sociais. Roupas mais apropriadas para festas. Isso pode ser entendido, em diversas conversas com os alunos, que vir a escola é uma das principais ou a única 250 atividade social de muitos. Envolvem-se muito com as obrigações com o trabalho e pouco com práticas culturais. A padronização de beleza, desempenho, saúde e alimentação - modelos impostos pela sociedade de consumo - contribui para a cristalização de conceitos e comportamentos estereotipados e alienados, tornando a discussão, a reflexão e a relativização de conceitos e valores uma permanente necessidade. A Educação Física é responsável por abrir esse espaço de produção de conhecimento no ambiente escolar. O desenvolvimento desse universo de conhecimento pode acontecer pela abordagem dos temas transversais e de projetos interdisciplinares. Por isso, a indicação dos Parâmetros Curriculares Nacionais para que o processo de ensino e aprendizagem, nos ciclos finais, considere simultaneamente três elementos: diversidade, autonomia e as aprendizagens específicas. Diversidade A cultura corporal de movimento caracteriza-se, entre outras coisas, pela diversidade de práticas, manifestações e modalidades. Trata-se de um aspecto tão amplo e complexo, que é quase impossível sistematizá-lo conceitualmente de forma abrangente. De qualquer forma, é esse universo de informações da mídia que chega ao jovem e ao adulto, de forma sedutora, fragmentada, manipulada por interesses econômicos e por valores ideológicos. Dessa realidade a Educação Física escolar não pode fugir nem alienar-se, pois é impossível negar a força que a indústria da cultura e do lazer exerce na geração de comportamentos e atitudes. O conhecimento da cultura corporal de movimento deve constituir-se num instrumento de compreensão da realidade social e humana do aluno. Neste sentido, é fundamental que seja garantido o acesso à informação diversificada e aos inúmeros procedimentos e recursos para obtê-la. A Educação Física escolar dispõe de uma diversidade de formas de abordagem para a aprendizagem, entre elas as situações de jogo coletivo, os exercícios de preparação corporal, aperfeiçoamento, improvisação, a imitação de modelos, a apreciação e discussão, os circuitos, as atividades recreativas, enfim, todas devem ser utilizadas como recurso para a aprendizagem. 251 O contexto escolar dispõe de um tempo e de um espaço que, mesmo quando inadequados, podem ser bem aproveitados. Essa otimização da utilização do tempo e do espaço pode ser incorporada como conteúdo a ser desenvolvido com o aluno de EJA, que, para além de ter nesse espaço a possibilidade de vivenciar o maior numero possível de práticas da cultura corporal, poderá envolver-se também com o gerenciamento do tempo e na organização do espaço para esse trabalho. Assim, o aluno de EJA estará sendo habilitado a “gestar” espaços para as práticas da cultura corporal. A Educação Física escolar não pode reproduzir a miséria da falta de opções e perspectivas culturais, nem ser cúmplice de um processo de empobrecimento e descaracterização cultural. Ou seja, o mesmo espaço-tempo que viabiliza o futebol e a “queimada” deve viabilizar o vôlei, o tênis com raquetes de madeira, os jogos pré-desportivos, a dança, a ginástica, as atividades aeróbias, o relaxamento, o atletismo, entre inúmeros outros exemplos. No entanto, a Educação Física e a escola, de maneira geral, não precisam confinarse em seus muros. O diálogo permanente com a comunidade próxima pode ser cultivado, franqueando espaço para o desenvolvimento de produções relativas ao lazer, à expressão e à promoção da saúde, assim como ultrapassando os muros escolares na busca de informações e produções desta natureza. A escola pode buscar na comunidade pessoas e instituições que dominem conhecimentos relativos a práticas da cultura corporal e trazê-las para o seu interior. Academias de capoeira, grupos de balé clássico, moderno, escolas de samba, grupos de danças populares, sindicatos e associações de classe que cultivem práticas esportivas são freqüentados pelos próprios alunos e podem estabelecer um diálogo permanente com a instituição escolar. Da mesma forma, pode-se ir ao encontro de experiências e informações no meio ambiente próximo. Por exemplo, nas inúmeras escolas situadas em regiões litorâneas, a inclusão de atividades como caminhadas nas praias, rios e mangues, natação, recreação na areia etc. Faz parte dessa ampliação de repertório, o trabalho com equipamentos e brinquedos cultivados fora da escola , que permitem um enriquecimento da aprendizagem de conteúdos da Educação Física., assim como de procedimentos de construção, restauração, utilização cooperativa, conservação, adaptação podem tornar-se objetos de ensino e aprendizagem 252 bastante significativos para o jovem e o adulto, desmistificando, de certo modo, a sua posse e utilização apenas por parcela privilegiada da população. Ensinar e aprender a cultura corporal de movimento envolve a discussão permanente dos direitos e deveres do cidadão, em relação às possibilidades de exercício do lazer , da interação social e da promoção da saúde. Envolve, portanto, também o ensino de formas de organização para a reivindicação junto aos poderes públicos de equipamentos, espaços e infra-estrutura para a prática de atividades. Autonomia A evolução da autonomia do aluno de EJA, na sua relação com o conhecimento, ocorre a partir da ressignificação dos conteúdos vivenciados. É importante que o aluno se aproprie dos conhecimentos que o permitam administrar sua própria prática, que, ao mesmo tempo, que dêem oportunidade a ele, aluno, de rever valores já incorporados, que fomente a crítica , o questionamento, enfim, o desejo de saber mais. Os objetivos de construção e exercício da cidadania, com base na valorização de conteúdos atitudinais de respeito, solidariedade, justiça e diálogo, serão possíveis, se incorporados ao cotidiano escolar e aos processos de ensino e aprendizagem. Caminha também nessa direção a inclusão de conteúdos procedimentais de pesquisa, organização e observação a partir dos quais os alunos possam fazer opções, localizar problemas, checar hipóteses e também atribuir sentido e significado à aprendizagem. Faz parte desse processo o acesso a livros, revistas, jornais e vídeos; a elaboração de pesquisas, entrevistas, painéis, visitas, apreciação e organização de eventos e produção de materiais. Amplia-se, com isso, o universo de aprendizagem possível, somando-se aos conhecimentos produzidos na aprendizagem de procedimentos técnicos e gestuais. O grau de autonomia para organizar atividades pode evoluir, se forem considerados objetos de ensino procedimentos gerais como: escolha de times, distribuição de pequenos grupos por espaços adaptados, construção e adequação de materiais, discussão e elaboração de regras, distribuições espaciais em filas, círculos e outras. Inclui-se ainda o espaço para discussão de táticas, técnicas e estratégias, para a apreciação e observação. Por exemplo, é possível organizar uma aula sobre o voleibol que inclua, além do uso da quadra, rede e bola oficiais, a distribuição em espaços adaptados de mini-vôlei, com cordas e bolas plásticas, 253 variando o tamanho do espaço para jogo e a altura da rede. Organiza-se o tempo de forma que todos os grupos circulem pelos diversos espaços, fazendo um rodízio. Dessa forma, além dos procedimentos técnicos da modalidade, os alunos podem aprender sobre formas de organização para o jogo, de negociar a composição de equipes e sobre a determinação do caráter mais ou menos competitivo de cada situação. No trabalho com atividades rítmicas e expressivas, além dos momentos de criação e improvisação, em conjunto com a aprendizagem por meio de modelos coreográficos, juntam-se procedimentos de organização de tempo e espaço para os ensaios, pesquisa das fontes de informação, construção de fantasias, adereços, cenários e instrumentos, organização e divulgação das eventuais apresentações, em suma, tudo o que gira em torno da aprendizagem corporal específica. A busca da autonomia pauta-se na ampliação do olhar da escola sobre o objeto de ensino e aprendizagem da cultura corporal de movimento. Essa ampliação significa a possibilidade de construção, pelo aluno, do seu próprio discurso conceitual, atitudinal e procedimental. Em vez da reprodução ou memorização de conhecimentos, a sua recriação pelo sujeito, por meio da construção da autonomia para aprender. Aprendizagem específica No trabalho com educação de jovens e adultos, surgem possibilidades e necessidades de aprendizagem cada vez mais específicas, em função das condições cognitivas, afetivas e motoras dos alunos permitirem cada vez mais um distanciamento do próprio objeto de ensino. Ou seja, percebe-se com nitidez que as práticas da cultura corporal de movimento podem constituir-se em objetos de estudo e pesquisa sobre o homem e sua produção cultural. A aula de Educação Física, além de ser um momento de fruição corporal, pode configurar-se num momento de reflexão sobre o corpo, a sociedade, a ética, a estética e as relações inter e intrapessoais. A vivência da diversidade pode, paulatinamente, ser ampliada pela experiência do aprofundamento na direção da técnica e da satisfação, pautada nos interesses de obter respostas mais complexas para questões mais específicas, sejam elas de natureza conceitual, procedimental ou atitudinal. Por exemplo, um esporte como o futebol traz como possibilidade de aprofundamento o desenvolvimento técnico, tático e estratégico pelo 254 treinamento sistematizado de fundamentos e conceitos. Permite a organização e a participação de equipes com finalidades competitivas e recreativas em campeonatos, festivais, eventos de confraternização. O estudo da história do futebol, no Brasil, permite a reflexão sociopolítica sobre a condição do negro, a evolução do esporte-espetáculo e as relações trabalhistas, o ufanismo, o fanatismo, a violência das torcidas organizadas, a emergência do futebol feminino etc. O aprofundamento não deve estar centrado somente nos interesses dos alunos, mas na possibilidade de realização de uma aprendizagem significativa, que articula simultaneamente a compreensão de si mesmo, do outro e da realidade sociocultural. Na aprendizagem específica, é importante que o aluno sinta-se comprometido e capaz de dar significado à aprendizagem, que essa significação não parta exclusivamente das intenções dos professores. Deve-se relacionar, durante o desenvolvimento do aluno, o quanto pode ser aprendido em dado momento com o quanto os alunos já podem perceber como importante ser aprendido naquele mesmo momento. Ou seja, o fato do aluno não considerar determinado conteúdo como importante, em dado momento, pode significar que ele ainda não tem condições de estabelecer relações entre esse conhecimento com sua busca pessoal. Neste caso, deve-se pensar quais estratégias poderão dar significado a esse conteúdo e como esse conhecimento potencializará o desenvolvimento do aluno. ORIENTAÇÕES DIDÁTICAS A Educação Física, na educação de jovens e adultos deve propiciar a discussão sobre a prática pedagógica a partir dos seguintes aspectos: • A compreensão da influência do processo de escolarização na apropriação da cultura corporal de movimento. • O reconhecimento do aluno de EJA como aquele que tem uma história pessoal com algumas das práticas da cultura corporal de movimento. • A necessidade de incluir o aluno no processo de ensino e aprendizagem, como aquele que tem um conhecimento e estabelece uma relação pautada sobre valores atribuídos a essa cultura. • O reconhecimento da necessidade de rever a prática pedagógica, no sentido de ir 255 ao encontro do aluno, sem perder de vista as perspectivas de desenvolvimento e aprendizagem. • A necessidade da formação continuada do profissional de educação física escolar, para que esse co-autor, no processo de ensino e aprendizagem, também possa rever sua prática a luz das concepções de ensino que incorporou como aluno, como professor, com toda a complexidade de valores e objetivos estabelecidos nos diferentes contextos. Os temas abordados ao longo desse documento, serão tratados dentro dessas perspectivas. O objetivo é estabelecer novas relações entre as concepções de ensino, , com a prática de sala de aula na educação de jovens e adultos. A formulação para as orientações didáticas foi tratada ao longo deste documento, considera o aluno dentro de um projeto educativo repleto de inserções, possibilidades de leitura e diálogo com a realidade de cada contexto educativo. Assim, as atividades propostas abaixo devem ser lidas como referência, dentro das inúmeras possibilidades de desenvolvimento de um programa de ensino para jovens e adultos. No entanto, destaca-se duas atividades que poderão ser desenvolvidas em projetos interdisciplinares, ou como núcleos de interesse. Relações entre atividade física, corpo, saúde e os diferentes enfoques culturais Objetivo – Explicitar o conhecimento construído pelos integrantes do grupo e confrontá-lo com diferentes fontes de informação, para oportunizar a pesquisa, a troca de informações e como meio de adquirir autonomia na construção do conhecimento sobre atividade física e saúde. Expectativas de aprendizagem – Dominar técnicas de promoção e manutenção da saúde pela práticade atividades físicas regulares, incorporando-as como conhecimento obtido pela cultura corporal de movimento da comunidade, valorizando-o enquanto possibilidade de confrontá-lo com a produção científica da área. Desenvolvimento do tema como uma proposta interdisciplinar – É possível estabelecer diversas relações do tema saúde, atividade física e práticas de diferentes regiões, pela integração das áreas de conhecimento em torno de um projeto interdisciplinar. Por exemplo, a área de Ciências poderá subsidiar o conhecimento necessário à compreensão do funcionamento do corpo humano, estabelecer relações entre alimentação e gasto energético, 256 sugerir a leitura de textos científicos, auxiliando na compreensão de alguns termos e conceitos utilizados. A área de Língua Portuguesa poderá organizar, com os alunos, roteiros de entrevista para buscar as informações de campo sobre as práticas da cultura corporal de movimento, analisar diferentes estilos textuais nas diversas mídias que abordem o tema, subsidiar o trabalho de interpretação de textos científicos e a produção de textos sobre o conhecimento adquirido. A Geografia poderá analisar as relações entre as práticas locais e a topografia, bem como entre aspectos econômicos e as práticas mais difundidas. Uma pesquisa histórica sobre a imigração, a origem/descendência da população e as relações que se estabelecem com as danças e as músicas , poderá contribuir para a valorização da cultura local, ampliando a compreensão sobre os processos de transmissão e perpetuação dessa cultura. As propostas que trabalham o corpo e movimento, na dimensão da saúde , são muito bem aceitas quando desenvolvidas com o aluno jovem e adulto, principalmente porque esse tema começa a interessar, a fazer sentido, na medida em que o corpo começa a dar sinais de diminuição da vitalidade. Discutir e compreender as relações da atividade física com a saúde e a longevidade pode representar uma porta de entrada para discutir as diferenças culturais. A Educação Física poderá, integrada às outras áreas de conhecimento, incluir a abordagem da dimensão cultural influenciando as representações de saúde e bem-estar, explicitando o recorte de análise de um grupo em um determinado tempo. Exemplo de atividades nesta perspectiva 1ª etapa Solicitar aos alunos que, individualmente, escrevam sobre os benefícios obtidos na prática de atividades físicas regulares e que descrevam algumas dessas práticas, justificando a distribuição de tempo de cada sessão e a freqüência semanal da prática. Nesta etapa do trabalho, estarão sendo checados os conhecimentos que os alunos têm sobre o tema. Esse conhecimento poderá ter sido construído a partir de informações veiculadas pela mídia, pela prática orientada por um especialista, ou empiricamente. O levantamento dos conhecimentos prévios deve ser o objetivo principal, evitando-se nesse momento corrigir os conceitos descritos, para que os alunos não se inibam no momento em 257 que os verbalizam. Em seguida, formam-se grupos de aproximadamente cinco alunos para trocar informações, discutir e formular hipóteses, que expliquem e justifiquem a prática regular de atividades físicas e suas possíveis relações com a saúde. Após essa etapa, os alunos organizarão suas conclusões para apresentá-las a outros grupos, elegem-se algumas das práticas apresentadas que serão vivenciadas por todos, discutem-se as adaptações necessárias para realizar essas práticas. O grupo, como um todo, deve responsabilizar-se pela organização dos instrumentos de registro e pelo acompanhamento que mensure o desenvolvimento pessoal de cada um. 2ª etapa O professor apresenta duas tarefas para o grupo, simultaneamente: • Primeira tarefa – O grupo deve pesquisar, descobrir onde obter mais informações para praticar as modalidades escolhidas, analisar as possibilidades de atividades, as adaptações necessárias, criar e testar instrumentos de registro que mensurem o desenvolvimento individual e coletivo. • Segunda tarefa – O professor poderá apresentar para os alunos o modelo de roteiro de pesquisa abaixo, que servirá como referência para a elaboração de outros mais específicos. É importante que possam ser analisadas as questões formuladas, tendo em vista o que se pretende revelar. Os alunos, divididos em grupos, podem elaborar questionários diferentes para abordar e aprofundar informações sobre, por exemplo, hábitos alimentares, freqüência de atividade, objetivos dos praticantes, fontes de onde o conhecimento foi absorvido pelos praticantes etc. O objetivo deste trabalho é gerar um momento reflexivo sobre a importância da prática de atividades físicas, utilizando o maior número possível de fontes de pesquisa: consulta a revistas e livros especializados, entrevistas com praticantes regulares e profissionais ligados à área etc. 1. Quais as relações que você pode apontar entre atividade física, aptidão física e saúde? 2. Com que freqüência semanal deve-se praticar atividades físicas para manutenção de uma boa aptidão física? Quais as práticas mais indicadas? 258 Roteiro para essa questão: • Pesquisar em livros e revistas sobre a importância das atividades aeróbica, para a aptidão física, e dos exercícios de alongamento e fortalecimento, para a manutenção da boa postura. • Entrevistar um profissional dessa área e buscar respostas para o item acima. • Entrevistar um praticante regular e perguntar: - Do que consiste a sua prática? - Quais objetivos que você busca atingir? - O que o motivou a começar essa prática? - Você recebeu alguma orientação para desenvolver sua prática? Se recebeu, quem o orientou? - Qual é a freqüência semanal de prática? Em que horário? Quanto tempo dedica a cada sessão? Ao final dessas questões, procure formar uma idéia do que consiste um trabalho aeróbico e qual a importância para a saúde. Compare o que você sabe sobre atividade aeróbica e saúde com o conhecimento dos entrevistados. O objetivo nesse momento é discutir a função social do conhecimento como direito para usufruir melhor do tempo de lazer. Então, o professor pode levantar dados importantes para a estruturação do desenvolvimento do tema “saúde e atividade física”. Poderá sistematizar as opiniões dos alunos com a seguinte questão: “Qual seria, na sua opinião, um curso de Educação Física adequado à sua idade, que fosse ao encontro de seus interesses, em que horário e com qual freqüência semanal?” Roteiro para resposta à questão: - Quais seriam as atividades realizadas? - Quantos alunos por grupo? - Quantas vezes por semana? - Teriam algumas aulas teóricas? - Seriam necessários alguns aparelhos ou materiais específicos? 3ª etapa 259 O professor solicita que os alunos revejam suas práticas, após a ampliação do conhecimento obtido até o momento. Poderá pesquisar no grupo quantos alunos fazem atividade física semanalmente, qual a freqüência, quais são as atividades. Anotar e guardar esse registro para ser usado como um critério para mensurar a valorização do conhecimento e sua relação com as mudanças de hábito. Uma ou duas aulas podem ser agendadas em Ciências para tratar do sistema respiratório, sistema circulatório. Juntos, em uma terceira aula, o professor de Educação Física e o professor de Ciências, apresentam os parâmetros que classificam uma atividade física em aeróbica e anaeróbica e abordam questões relacionadas à alimentação, atividade física e a prevenção das doenças cardíacas. O professor deve retomar os registros dos alunos sobre a prática e propor um debate sobre as questões colocadas, tentando relacioná-las aos conteúdos já abordados. Como estratégia para aprofundar os conhecimentos, é preciso desenvolver a argumentação, estimular o desenvolvimento das habilidades relacionadas à expressão oral; poderá ser proposto um debate com os alunos divididos em dois grupos: um a favor da prática de atividades físicas regulares; e um contra. O professor poderá atuar como mediador do debate, enfatizando ao grupo que, independente das opiniões pessoais sobre o tema, os alunos devem preparar-se para a defesa de suas posições. Essa será a forma para elaborar e aprofundar o conhecimento. 4ª etapa O professor apresenta um filme que retrate práticas relacionadas à manutenção da saúde utilizadas pelos povos do Oriente, como o tai chi chuan, a ioga etc.. E, a seguir, propõe discussão e levantamento de hipóteses de quais são os parâmetros de saúde que norteiam tais práticas. Serão os mesmo que os do Ocidente?Quais aspectos curativos são contemplados nessas práticas? O professor estimula os alunos a procurar na comunidade alguns praticantes ou professores, que poderão ensinar o grupo ou , proporcionar uma vivência. 5ª etapa O professor agenda uma ou duas aulas com o professor de História, para localizar a 260 origem dos povos que criaram essa prática, o tempo histórico e as informações que contextualizem a prática como decorrente da cultura. Síntese: O professor promove um amplo debate sobre as diferenças culturais nos modelos ocidentais e orientais de cultura corporal para manutenção da saúde. Algumas questões para o debate: • Que práticas podem ser incorporadas às práticas do grupo após esse trabalho? • Como podemos aprofundar nosso conhecimento sobre diferentes práticas da cultura corporal? • Em que medida a mídia (TV, jornais e revistas) tem influenciado nossa prática? Finalmente, seria interessante que os conhecimentos obtidos durante esse trabalho, pudessem ser apresentados à comunidade, gerando uma prática de circulação do conhecimento. Poderão ser utilizados diversos veículos de divulgação, como palestras preparadas pelos alunos, vídeos, feiras com estandes de vivências e avaliação física etc. Algumas sugestões para orientações didáticas Neste momento, devemos listar temas que possam interessar aos alunos e que encontrem no projeto educativo diferentes formatos de trabalho. A intenção é apresentar sugestões para que, por diferentes metodologias, efetivem-se o desenvolvimento de competências e as habilidades relacionadas ao convívio social, ao trabalho em grupos cooperativos e à participação de debates. • Ver filmes no qual sejam discutidos temas relacionados à construção do conhecimento na área, como política no futebol, a questão da estética e a indústria de consumo de produtos dietéticos. • Elaborar o projeto “Mapeando a cultura corporal de movimento de nossa região ou cidade”: esporte, dança, teatro, circo, atletismo, tanto populares quanto eruditos e elitistas. • Fazer levantamento das ofertas de consumo e participação e dos locais para práticas corporais de lazer. 261 • Discutir o que é lazer; mapear o lazer do grupo (atual e passado) ou seus desejos futuros; as dificuldades em usufruir os espaços ou de perceber que podem ser usados. • Elaborar um guia de lazer com dicas de utilização etc. • Desenvolver atividades esportivas com as seguintes discussões: de gênero, de exclusão e inclusão e de diferenças etárias. Exemplo: o futebol. • Desenvolver o projeto “Esportivo-cultural” entre escolas da mesma região – proposta de um festival de jogos do qual todos os alunos participem. Criação coletiva entre escolas/alunos/funcionários/pais: “Quais jogos podem ser realizados de modo que haja uma diversidade considerável que atenda as diferenças existentes entre os alunos?” • Elaborar o projeto “Toque”: conhecimento corporal por meio do auto-toque. Relação dos órgãos com o equilíbrio corporal. Sistema integrado. Prazer. Relaxamento. • Desenvolver o projeto “O aluno é o professor”: nesse trabalho, haverá uma aula na qual os alunos organizam atividades diferenciadas com fundamentação teórica; reuniões de orientação com o professor para preparar e discutir os procedimentos de ensino e de avaliação O registro como orientação didática Registrar a produção cultural das práticas corporais desenvolvidas no cotidiano escolar pode se tornar um instrumento viabilizador das transformações da prática educativa. O professor deve ser incentivado a registrar seu cotidiano, a discutir e avaliar suas práticas junto aos alunos e a si próprio. Incorporar esse procedimento pode alavancar o desenvolvimento do projeto educativo, pois, pelo registro, pode-se exercitar reflexão da prática. Vários instrumentos poderão atender aos objetivos de registrar e refletir sobre a prática, por exemplo: Ø filmar em vídeo determinada atividade para ser vista pelo grupo; nesse sentido, o instrumento registro pode, por exemplo, adquirir a função de instrumento pedagógico de modificação de um padrão motor, pelo feedback visual; ou seja, alem da informação verbal durante a execução, o aluno poderá se observar executando os movimentos. 262 Ø registrar em relatórios as experiências vivenciadas, relatar em pequenos grupos, discutir sobre os relatos, enfim, atender às inúmeras possibilidades de aplicação do registro escrito para desenvolver diferentes competências. Pelo registro, pode-se incentivar encontros de escolas da mesma região para trocar experiências, realizar projetos em conjunto (artigos para revistas, por exemplo), entre outros. BIBLIOGRAFIA ALVES, R. Conversas com que gosta de ensinar. São Paulo: Cortez : Autores Associados, 1986 ARNOLD, P. J. Educación física, movimento y curriculum. Madri: Morata, 1988. BABIN, P. e KOULOUMDJIAN, M.-F. Os novos modos de compreender: a geração do audiovisual e do computador. São Paulo: Edições Paulinas, 1989. BETTI, M. Janela de vidro: Educação Física e esportes. Campinas: Universidade Estadual de Campinas. Tese de Doutorado, Instituto de Educação, 1997. __________. Ensino de primeiro e segundo graus: Educação Física para quê? Revista Brasileira de Ciências do Esporte, v. 16, n. 3, 1992. __________. Educação Física e sociedade. São Paulo: Movimento, 1991. BRACHT, V. Educação Física e aprendizagem social. Porto Alegre: Magister, 1992. BRUHNS, T. H. O corpo parceiro e o corpo adversário. Campinas: Papirus, 1993. CAILLOIS, R. Os jogos e os homens. Porto: Cotovia, 1990. COLL, C. Psicologia e currículo. São Paulo: Ática, 1996. CASTELLANI FILHO, L. Considerações acerca do conhecimento (re)conhecido pela Educação Física escolar. Revista Paulista de Educação Física, supl. n. 1, 1995. CLARO, E. Método dança. Educação Física: uma reflexão sobre consciência corporal e profissional. São Paulo: Robe, 1995. DARIDO, S. C. Ação pedagógica do professor de Educação Física: estudo de um tipo de formação profissional científica. São Paulo: Universidade de São Paulo. Tese de doutorado, Instituto de Psicologia, 1997. 263 DAVIS, M. e WALLBRIDGE, D. Limite e espaço: uma introdução à obra de D. W. Winnicott. Rio de Janeiro: Imago, 1982. DE LA TAILLE, Y; OLIVEIRA, M. K. e DANTAS, H. Piaget, Vygotsky e Wallon: teorias psicogenéticas em discussão. São Paulo: Summus, 1992. ENGUITA, M. F. A face oculta da escola. Porto Alegre: Artes Médicas, 1989. FARIAS JR., A. G. Questões do gênero e co-educação: algumas considerações didáticas sobre o enfoque multicultural. Revista do Núcleo de Sociologia do Futebol, n. 2, 1995. FREIRE, J. B. De corpo e alma. São Paulo: Summus, 1991. __________. Educação de corpo inteiro. São Paulo: Scipione, 1989. GIMENO, S. J. El curriculum; una reflexión sobre la prática. Madrid: Morata, 1988. HERNÁNDES, F e VENTURA, M. A Organização do currículo por projetos de trabalho – o conhecimento é um caleidoscópio. Porto Alegre : Artes Médicas, 1998. HILDEBRANDT, H. e LAGING, R. Concepções abertas no ensino da educação física. Rio de Janeiro: Ao Livro Técnico, 1986. KAMII, C. e DEVRIES, R. Jogos em grupo. São Paulo: Trajetória Cultural, 1991. KENSKI, V. O impacto da mídia e das novas tecnologias de comunicação na Educação Física. Motriz, v. 1, n. 2, 1995. KUNZ. E. Tranformação didático-pedagógica do esporte. Ijuí: Ed. Unijuí, 1994. LAPIERRE e AUCOUTURIER. A simbologia do movimento. Porto Alegre: Artes Médicas, 1986. LE BOULCH, J. Rumo a uma ciência do movimento humano. Porto Alegre: Artes Médicas, 1987b. LIBÂNEO, J. C. e PIMENTA, S. G. (coords.). Metodologia do ensino de educação física. São Paulo: Cortez, 1992. LUCKESI, C. C. Avaliação educacional escolar; para além do autoritarismo. Revista de Educação AEC, v. 15, n. 60, 1986. MEDINA, J. P. S. A Educação Física cuida do corpo... e mente. Campinas: Papirus, 1983. MOREIRA, W. W. Educação Física e esportes: perspectivas para o século XXI. Campinas: Papirus, 1992. 264 PERRENOUD, P. Avaliação – Da excelência à regulação das aprendizagens – Entre duas Lógicas. Porto Alegre : Artes Médicas Sul, 1999 PERRENOUD, P. 10 Novas Competências para ensinar. Porto Alegre : Artes Médicas Sul, 2000 SAVIANI, D. Escola e democracia - Teorias da Educação - Curvatura da Vara - Onze teses sobre educação e política. São Paulo: Cortez: Autores Associados, 1986 SÉRGIO, M. Educação Física ou ciência da motricidade humana?. Campinas: Papirus, 1989. TAFFAREL, C. N. Z. Criatividade nas aulas de Educação Física. Rio de Janeiro: Ao Livro Técnico, 1985. TANI; MANOEL; KOKOBUN e PROENÇA. Educação Física escolar. São Paulo: Edusp/EPU, 1988. VYGOTSKY, L. S. A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes, 1985. WAICHMAN, P. Tempo livre e recreação. Campinas: Papirus, 1997. WINNICOTT, D. W. Natureza humana. Rio de Janeiro: Imago, 1988. __________. O brincar e a realidade. Rio de Janeiro: Imago, 1975.