Disponível eletronicamente em www.revista-ped.unifei.edu.br Revista P&D em Engenharia de Produção V. 07 N. 01 (2009) p. 01-19 Recebido em 11/04/2008. Aceito em 17/02/2009 ISSN 1679-5830 RELACIONAMENTO COM FORNECEDORES ATRAVÉS DE CONTRATOS. A EXPERIÊNCIA DA GLAXOSMITHKLINE Sheila da Rosa Maranhão, M. Sc. Consultora de Materiais Avsource Brasil Serviços Aeronáuticos Faculdades Ibmec/RJ [email protected] Edson José Dalto, D. Sc. Professor Faculdades Ibmec/RJ [email protected] RESUMO Este estudo visa ampliar os conhecimentos na área de estratégias de relacionamento com fornecedores através de contratos formais ou não formais, através dos quais embarcador e cliente obtêm vantagem competitiva. Apresenta-se um estudo empírico de caráter qualitativo e exploratório nas práticas de gestão de suprimentos na Glaxosmithkline, avaliando-se a evolução desta atividade na empresa e seu estágio atual de maturidade. Enfatiza-se o relacionamento com fornecedores apoiado em contratos, negociando-se não somente preço, prazo e qualidade, mas gerando-se uma parceria efetiva, que envolve investimentos, compartilhamento de riscos e retornos e extensão do relacionamento um elo à montante dos atuais fornecedores. Palavras-chave: Contratos, Evolução de Compras, Relacionamento com Fornecedores. 2 MARANHÃO & DALTO / Revista P&D em Engenharia de Produção V. 07 N. 01 (2009) p. 01-19 RELATIONSHIPS WITH SUPPLIERS BASED ON CONTRACTS. THE GLAXOSMITHKLINE EXPERIENCE ABSTRACT This research aims to broaden the knowledge on supplier relationships strategies through formal or not formal contracts, through which supplier and client get competitive advantage. An empirical study with qualitative and exploratory character is shown on supplier management practices in the GlaxoSmithKline, where we evaluate the evolution of this activity in the company and its current stage of maturity. We emphasized the relationship with suppliers supported by contracts, with witch is negotiated not only price, lead times and quality, but the construction of an effective partnership, which involves investments, sharing risks and returns and the extension of relationship one upstream link to the current suppliers. Keywords: Contracts, Purchase Evolution, Relationship with Suppliers. 1. INTRODUÇÃO A tentativa das organizações de obterem diferenciação no mercado e redução de custos criou um grande movimento para que o setor de suprimentos reforçasse seus relacionamentos com fornecedores. O desenvolvimento e compartilhamento de idéias visam à melhoria dos produtos e serviços e à redução de riscos, para tornar possível uma maior vantagem competitiva para os participantes. Um dos processos chave do Supply Chain Management (SCM) é justamente gerenciar o relacionamento com fornecedores, para se ter flexibilidade a fim de atender o mercado no “timing” e na forma demandados. A garantia dos relacionamentos de longo prazo está baseada em contratos que estabelecem direitos e obrigações das partes, gerando estabilidade e resguardando a confiança dos parceiros. Uma clara fonte de aumento de valor é a economia de escala gerada por fornecedores com foco e expertise em seu negócio, como é o caso de um operador logístico, por exemplo. Uma forma alternativa de criação ou aumento de valor é a mudança de abordagem e habilidade gerencial do fornecedor por relacionar-se com diversos clientes, o que lhe permite mais facilmente aplicar o benchmarking (CORRÊA e CORRÊA, 2006). Este artigo mostra como o relacionamento estabelecido com os fornecedores, particularmente através da utilização de contratos, é de grande importância para a área de suprimentos. Um estudo empírico desenvolvido na empresa GlaxoSmithKline (GSK) tangibiliza esta perspectiva. O nível avançado de relacionamento com seus fornecedores nesta empresa levou ao surgimento do Projeto Prisma, que estende os benefícios obtidos na relação direta entre a GSK e seus fornecedores um elo à montante na cadeia, isto é, os fornecedores dos fornecedores. O problema central da pesquisa consiste em mostrar que o relacionamento com fornecedores, através de contratos, provê redução de custos e prazos, melhorando a performance da operação da cadeia de suprimentos. Os objetivos secundários deste estudo são: (1) apresentar a estratégia de compras através da adoção de contratos como uma forma de relacionamento com fornecedores; (2) evidenciar a evolução da atividade de compras; (3) destacar a importância da estratégia de compras no âmbito organizacional e, finalmente (4) exemplificar o uso de contratos no relacionamento da GSK com seus fornecedores e as MARANHÃO & DALTO / Revista P&D em Engenharia de Produção V.07 N. 01 (2009) p. 01-19 3 vantagens advindas dessa prática. Para atingir o objetivo aborda-se, na revisão de literatura, a evolução de compras e os vários tipos de relacionamentos com fornecedores surgidos nos últimos tempos, até que, num certo ponto, o nível de desenvolvimento da atividade de compras e o tipo de relacionamento adotado com os fornecedores se entrelaçam fortemente, emergindo a importância dos contratos com fornecedores. 2. REVISÃO DE LITERATURA Esta parte do trabalho tem a finalidade de apresentar os principais conceitos teóricos relacionados à gestão de suprimentos. Serão abordados o conceito e evolução da prática de compras nas empresas, o relacionamento com fornecedores e a formalização desse relacionamento através de contratos de compra. 2.1. Compras, Conceito e Evolução Gonçalves (2004) conceitua a função de compras como o processo de planejamento da aquisição, licitação, julgamento das propostas de fornecimento de materiais e serviços, bem como a contratação de fornecedores destinada ao fornecimento dos materiais e serviços utilizados pelas empresas. Desta forma, garante que os materiais e serviços exigidos sejam fornecidos nas quantidades corretas, com qualidade e no tempo desejado. Bowersox e Closs (2001) definem que suprimento abrange a compra e a organização da movimentação de entrada de materiais, de peças e de produtos acabados dos fornecedores, nas fábricas ou montadoras, depósitos ou lojas de varejo. O suprimento engloba a disponibilidade de sortimento desejado de materiais onde e quando necessários, tanto no recebimento de materiais, quanto nas operações de separação ou montagem. O processo de suprimentos de longo prazo, que busca por fontes que cubram as necessidades, seleciona fornecedores, negociando acordos e gerenciando tais fornecedores, focando no desenvolvimento de relacionamentos, assegurando a minimização de preços e custos. Trata-se do conceito moderno de Strategic Sourcing. Baily (2000) especifica que uma empresa do ramo de manufatura emprega, em média, 50% de seus recursos em materiais, suprimento e serviços e que, em alguns casos, pode chegar até a 90%. Christopher (2002) diz que a fonte da vantagem competitiva é encontrada, primeiramente, na capacidade da organização diferenciar-se de seus concorrentes aos olhos do cliente e, em segundo lugar, pela sua capacidade de operar a baixo custo, com lucro maior, conforme ilustra a figura 1. Baily (2000) afirma que, quando as empresas adotam abordagens de vantagem competitiva na administração de materiais, elas estão integrando estratégia e compras. Segundo Braga (2006), as atividades de compras, até meados dos anos 90, possuíam características meramente funcionais. Com a evolução da logística no mercado global, as empresas despertaram para o importante papel dessa atividade. Geralmente, o setor tinha o foco na redução do custo unitário, comprando grandes lotes de matérias-primas sendo, desta forma, subordinado ao setor financeiro. A atividade de compras era transacional, com muita burocracia e não havia comunicação com outras áreas da empresa. 4 MARANHÃO & DALTO / Revista P&D em Engenharia de Produção V. 07 N. 01 (2009) p. 01-19 CLIENTES Busca benefícios a preços aceitáveis Valor Valor Ativos & utilização Ativos & utilização Diferenciais de Custo COMPANHIA CONCORRENTE Figura 1: A Vantagem Competitiva e os três “Cs” Fonte: Christopher 2002 O primeiro estágio da atividade de compras era efetuado indiscriminadamente por encarregados da produção, chefes dos mecânicos, de departamentos, superintentendes, ou quem quer que precisasse do material. Num segundo estágio, um funcionário ficava responsável pela atividade que, ao menos, mantinha os registros. A função era altamente burocrática, porém foi um avanço nas normas de procedimentos e do desempenho do departamento de compras. Uma amostra do avanço na utilização de tecnologias em compras pode ser exemplificado pelo sistema de troca de informações entre comprador e fornecedor, pelo emprego do Data-Phone, da Bell System, um aparelho eletrônico de transmissão, usado para encomendar materiais aos fornecedores. As unidades transmissoras eram instaladas tanto nos escritórios dos fornecedores como nos dos clientes. Os itens sob contratos eram arrolados em cartões perfurados, sendo mantidos no escritório de compras, e introduzidos no aparelho Data-phone à medida que surgissem as necessidades. Conforme os dados de preços, quantidades e outros eram passados ao fornecedor, cartões correspondentes eram produzidos em sua unidade para que fossem atendidas as encomendas (HEINRITZ e FARRELL, 1986). Em meados dos anos 90, as atividades de compras começaram a focar em redução de custos totais, interagindo com outros setores, tais como: produção, qualidade e expedição. Ganharam, então, um novo enfoque e uma nomenclatura também nova, que o mercado adotou: Suprimentos ou Sourcing, criando-se Diretorias de Logística ou de Suprimentos. Com a estratégia de compras com embarques em menores quantidades e mais frequentes, alguns fornecedores aderiram ao just-in-time (JIT), estreitando relações com seus clientes. Desta forma, com a busca de fornecedores em nível global, a visão logística começou a ser incorporada pelas empresas. Posteriormente, a área de compras começou a ser chamada de Procurement, ficando subordinada à Diretoria de Supply Chain, focando na redução dos custos logísticos totais. O setor possui grande interação com as outras áreas da empresa e os outros elos da cadeia de suprimentos. A estratégia de compras é direcionada à criticidade e valor dos itens, resultando na utilização de diferentes ferramentas. Cresceu o uso da tecnologia da informação através de e-Procurement, leilões, Request for Proposal (RFPs) eletrônicos e catálogos via web. Os fornecedores viraram parceiros, tornando o seu serviço tão importante quanto o preço do produto. Pode-se verificar que, atualmente, devido à evolução da logística de suprimentos, a distância entre fornecedores e a manufatura vem diminuindo. A área de gestão de redes logísticas tem despertado interesse crescente, pois na nova competição entre cadeias, o sucesso depende da adoção da melhor estratégia para cada cadeia. Com a nova concorrência, MARANHÃO & DALTO / Revista P&D em Engenharia de Produção V.07 N. 01 (2009) p. 01-19 5 as prioridades mudaram. Se não for possível a fabricação e entrega de produtos de forma lucrativa e adequada, sua comercialização acaba enfraquecendo. Braga (2006) afirma que as atividades e estratégias definidas para a função de Compras ou Suprimentos buscam suportar a estratégia competitiva da empresa e, ao mesmo tempo, serem derivadas dela. A Figura 2 apresenta as relações da função suprimentos sob a perspectiva da hierarquia estratégica da empresa. Clientes Competidores Estratégia da Empresa Estratégia de Compras e Suprimentos Estratégia de Produção Outras Estratégias Funcionais Figura 2: Ligação da estratégia de compras ou suprimentos com a estratégia da empresa Fonte: Braga (2006) 2.2. Relacionamento com Fornecedores Tradicionalmente, segundo Corrêa e Corrêa (2006), as decisões estratégicas de suprimento eram pautadas pelo critério do fazer ou comprar (make or buy), que estabelecia que, a partir de um determinado volume, era mais econômico para a empresa produzir internamente no lugar de comprar de fornecedores. A decisão apoiava-se exclusivamente no critério de custo. Segundo esses mesmos autores, tal conceito começou a evoluir na década de 90, principalmente com a publicação do livro Competing for the Future de Hamel e Prahalad (1994). De acordo com este novo conceito, outras preocupações estratégicas deveriam ser consideradas na decisão de suprimentos, entre elas destacam-se a idéia de competências centrais (core competencies) e custos de troca. De acordo com Hamel e Prahalad (1994), uma competência central é um conjunto de habilidades e tecnologias que adicionadas ao talento gerencial colocam a empresa em uma posição singular frente os concorrentes. Já o custo de troca, representa a dificuldade imposta pela eventual substituição de um fornecedor. Os autores defendem que as competências centrais são traduzidas por três principais fatores: o quanto uma atividade gera de valor para o cliente, de que forma esta atividade proporciona diferenciação sobre a concorrência e o potencial de sua extendabilidade, isto é, qual o seu poder de gerar valor futuro em termos de aceitação pelos clientes e exclusividade. Quanto ao custo da troca, Hamel e Prahalad (1994) também apresentam três vertentes a serem avaliadas: especificidade dos ativos, grau de monopólio do fornecedor e custos de transação envolvidos. Quanto maior cada uma delas, tanto mais cara será a troca de fornecedor. Os autores admitem a dificuldade na avaliação específica da centralidade de uma atividade e do custo de sua troca, mas, sem dúvidas, esta nova abordagem trouxe um 6 MARANHÃO & DALTO / Revista P&D em Engenharia de Produção V. 07 N. 01 (2009) p. 01-19 panorama mais adequado e rico na decisão de relacionamento com fornecedores, inclusive nas formas alternativas de relacionamento que se descortinam a partir da decisão de outsorcing. Baixa Centralidade da atividade Alta Corrêa e Corrêa (2006) sugerem uma matriz de relacionamentos com fornecedores a partir das duas dimensões apresentadas por Hamel e Prahalad (1994), ilustrada na figura 3. Estratégico Risco Parceria para desenvolvimento Integração vertical Parceria estratégica Joint ventures Dependência Mercado Contrato de médio prazo Contrato de longo prazo Mercado puro Baixo Alto Custo de troca Figura 3: Matriz de relacionamento com fornecedores Fonte: Corrêa e Corrêa (2006) A matriz estabelece desde um relacionamento de mercado puro, quando não há nenhuma forma de comprometimento prévio entre as partes, ou seja, a compra é do tipo spot, até a situação em que o comprometimento é máximo, quando o fornecedor pertence ao próprio demandante, que é o caso da integração vertical. Os contratos de médio e longo prazos configuram a situação em que a centralidade da atividade adquirida é de média a baixa, havendo diferença no custo da troca. No caso em que a centralidade da atividade é mais elevada, o relacionamento sugerido pela matriz é de parceria ou joint venture, variando-se os formatos de acordo com o custo de troca envolvido. Leenders e Fearon (1993) afirmam que a seleção de fornecedores tornou-se muito complexa, incluindo fatores de meio ambiente, social, político, e a satisfação dos clientes, além dos tradicionais itens como qualidade, entrega, custo e serviço. Não é novidade que as questões como: racionalização de fornecedores, fornecedores preferenciais, parcerias, alianças estratégicas, e o desenvolvimento de fornecedores têm crescido notoriamente. O relacionamento entre fornecedores e compradores pode fazer diferença estratégica para uma organização, pois promove uma melhoria contínua na satisfação do cliente, derivada da procura por novas e melhores maneiras de gerenciar estas relações entre compradores e vendedores. Estes mesmos autores atribuem o surgimento das parcerias nos anos 80 aos estudos executados pelas empresas japonesas, as quais mantinham estreitas relações com os fornecedores, o que foi visto como elemento chave para alcançar qualidade, entregas rápidas, e melhorias contínuas. As primeiras empresas a utilizarem parcerias nos EUA foram: Xerox, Honeywell, Polaroid, Motorola, IBM e algumas empresas automotivas. Lambert e Stock (1992) corroboram esta visão, dizendo que, na década de 80, devido a grande pressão sofrida pelas empresas, nas questões de competitividade, redução de orçamentos e necessidade de melhoria de serviços aos seus clientes, elas começaram a contratar terceiros para a realização de atividades logísticas. Recentemente, as empresas e os prestadores de serviços logísticos começaram a reconhecer os benefícios que resultam das MARANHÃO & DALTO / Revista P&D em Engenharia de Produção V.07 N. 01 (2009) p. 01-19 7 parcerias e alianças, pois o propósito de ambos é o benefício das partes, em uma relação simbiótica. Johnson e Wood (1996) afirmam que o termo parceria tem sido largamente utilizado para relacionamentos de longo prazo entre fornecedores e compradores. A parceria é desenhada para proporcionar recompensas quando há cooperação das partes, promovendo incentivos e sucesso para todos. Citam ainda que os sistemas JIT e Eletronic Data Interchange (EDI) forçaram a um relacionamento estreito e disciplinado, com um reduzido número de fornecedores. Estes relacionamentos podem ser formais ou não, ou seja, ter contratos firmados ou não. Christopher (2002) diz que muitas empresas estão se beneficiando do relacionamento mais próximo com os fornecedores, por ele permitir encontrar meios de diminuir os custos da cadeia, através da concentração em atividades, como sistemas de entrega JIT, interligações dos processos de pedidos de compra por meio de EDI, e eliminação da necessidade de retrabalho por meio de programas de melhoria de qualidade. Foi descoberto que é possível criar valor para o cliente trabalhando junto com ele, na melhoria de produtos já existentes e no desenvolvimento de novos também. Kaynak (2005) reforça esta argumentação afirmando que a visão estratégica de médio e longo prazos, particularmente nas relações de fornecimento, visando simultaneamente a melhoria da qualidade e redução de prazos e custos, que proporciona vantagem competitiva duradoura, condicionou a concentração de fornecedores e o estreitamento de relação de parceria entre os elos da cadeia de suprimentos, facilitando a adoção de práticas mais modernas e de melhor resultados, como o suprimento JIT e o Total Quality Management (TQM). Naturalmente, esta relação mais duradoura entre parceiros de negócios desemboca na formalização de contratos estáveis. Kobayashi (2000) sustenta que as empresas se transformam, assim como os vários setores econômicos, surgindo alianças e, dessa maneira, se instauram formas de colaboração que levam a uma crescente eficiência e a um respeito mais atento do meio ambiente, que garante um futuro às próximas gerações. Por consequência, acontecem reestruturações radicais nas empresas, como a diminuição de pessoal e novas formas de organizações. Esse mesmo autor afirma que o objetivo é estabelecer relacionamentos estáveis com os próprios clientes, em particular com aqueles estratégicos, compreendendo as novas exigências deles, achando fornecedores que colaborem com as políticas da empresa e se tornem seus parceiros, além de adquirir novas competências e tecnologias, estabelecendo alianças com outras empresas. Dornier et al. (2000), nesse contexto de um relacionamento de parceria com fornecedores, faz um comparativo da Visão Tradicional versus novas parcerias (veja tabela 1, a seguir). Tabela 1: Visão tradicional versus novas parcerias com fornecedores Visão Tradicional Parcerias com fornecedores Ênfase principal no preço Critérios múltiplos Contratos de curto prazo Contratos de maior prazo Avaliação por ofertas Avaliação intensiva e extensiva Muito fornecedores Menor número de fornecedores selecionados Benefícios de melhorias dividos com base no poder relativo Benefícios de melhorias divididos de forma mais equitativa Melhorias em intervalos de tempo discretos Busca de melhoria contínua A correção de problemas é responsabilidade dos fornecedores Os problemas são resolvidos conjuntamente Clara delineação da responsabilidade do negócio Integração quase vertical A informação é proprietária A informação é compartilhada Fonte: Dornier et al. (2000) 8 MARANHÃO & DALTO / Revista P&D em Engenharia de Produção V. 07 N. 01 (2009) p. 01-19 Gonçalves (2004) afirma que no estudo de uma parceria, o jogo nas negociações deve ser franco e aberto, e a confiança mútua vai ocorrendo gradativamente, à medida que o processo de negociação avança. Isso ocorre também com a própria evolução da parceria. Criando-se um forte vínculo a partir de boas parcerias com fornecedores, é possível garantir o acesso aos recursos e à minimização, ou a uma certa divisão dos riscos entre os parceiros. Entretanto, torna-se necessário estar alerta às exigências futuras, quando será necessário incluir permanentemente investimentos destinados ao desenvolvimento de novos produtos e aquisição de novas tecnologias. O estágio mais avançado da parceria é denominado processo de cooperação, no qual cada parceiro conhece o seu potencial e, ainda, suas vantagens competitivas para o aperfeiçoamento dos processos e reduções de custos, aumentando consideravelmente a sinergia, com ganhos substanciais para todos os parceiros envolvidos no negócio. Bowersox e Closs (2001) pontuam que o objetivo de relacionamento de cooperação na cadeia de suprimento é aumentar a competitividade do canal, baseado em dois princípios: primeiro na redução do risco e aprimoramento da eficiência do processo como um todo e, segundo, na eliminação do trabalho duplicado e inútil. Corrêa e Corrêa (2006), afirmam que quando há a parceria estratégica, existe o alto nível de comprometimento e de pressão das partes em questão, pois se amarram mais intensamente os destinos dos parceiros, que se tornam profundamente dependentes. Uma intensiva troca de informações (inclusive, muitas vezes, sensíveis, como estrutura de custos do fornecedor, por exemplo) é usual, e a necessidade de confiança mútua é máxima. Os contratos tendem a ser complexos e difíceis de elaborar, podendo, em muitas situações, ser até considerados como fontes de vantagem competitiva e mantidos secretos, quando bem elaborados. Em geral, alta especificidade de ativos está envolvida na parceria e um exercício longo de escolha e negociação é requerido. Desenvolver um ou alguns poucos desses fornecedores, pode significar a diferenciação no mercado, que acompanhará os esforços do cliente de intensificar o relacionamento, podendo, a partir de certo ponto, incluir cláusulas de exclusividade ou mesmo integração vertical. Merli (2004) conceitua que comakership é o termo que caracteriza esse modelo e entende-se como uma relação evoluída entre cliente e fornecedor. A filosofia que rege os relacionamentos operacionais do comakership está atrelada à lógica das abordagens da Qualidade Total e do JIT. Estas filosofias estão modificando a maneira de agir no contexto dos suprimentos e fornecedores. A necessidade de recorrer a uma lógica de comakership é, de fato, inerente a todas as evoluções estratégicas em curso. Do ponto de vista cultural, são duas as dimensões que dão suporte à evolução do comakership: o Group-Wide Quality Control (GWQC) (cultura operacional e estratégica) e as cadeias de valor (cultura estratégica). Ambas pressupõem um relacionamento cliente-fornecedor que pode ser representado como elos consecutivos concatenados (cadeia cliente-fornecedor) e não como elos independentes que devem se inter-relacionar. A passagem dos elos independentes para elos concatenados é, antes de tudo, um problema cultural, segundo o autor. 2.3. Contratos Para conseguir competitividade na cadeia de suprimento e se tornar mais eficientes, esses relacionamentos entre empresas estão sendo formalizados através de contratos. Dessa forma se estabelece um “casamento”, a fim de suprir as necessidades cada vez mais complexas e exigentes do mercado. Com o estabelecimento de um contrato, o relacionamento perde a característica espontânea de aliança, levando a cooperação a uma obrigação, dessa maneira, oferecendo mais estabilidade para ambas as partes. Toda aquisição é processada através de uma ordem de compra, e é considerada um MARANHÃO & DALTO / Revista P&D em Engenharia de Produção V.07 N. 01 (2009) p. 01-19 9 contrato, pois geralmente possui termos e condições de fornecimento em que ambas as partes aceitaram para efetuar a transação. Medauar (2006) menciona que o Contrato de Compra, também denominado de fornecimento, destina-se à aquisição remunerada de bens ou serviços. Heinritz e Farrell (1986) citam que os contratos expressam a intenção do comprador de adquirir todas, ou parte, de suas necessidades de itens repetitivos de um único fornecedor durante um certo período de tempo. Essas necessidades podem ser de uma certa classe de itens ou de um material específico ou peça determinada. As condições são negociadas e a encomenda é feita para um determinado período, geralmente um ano. Ainda exemplificam uma forma mais avançada de conta em aberto, ou compra “sem estoque”, conhecida como “contratação de sistemas”, em que se estabelecem contratos ou acordos de compras com fornecedores cobrindo extensos grupos de materiais ou suprimentos. Parte desses contratos consiste em um catálogo detalhado dos itens cobertos, e do fornecedor é exigido que mantenha em estoque quantidades suficientes de todos os itens listados. Os requisitantes solicitam diretamente ao fornecedor detentor do contrato, em vez de serem enviados ao departamento de compras. Zenz (1994) cita que em alguns casos surgem contratos sem nenhuma formalização expressa. Ele é implícito e origina-se da conduta das partes, tomando o lugar do contrato formal ou verbal. Ainda exemplifica o caso do fornecedor que entrega algum produto que não foi solicitado pelo comprador, porém o comprador recebe e utiliza o carregamento e, então fica implícita a obrigação do pagamento da mercadoria. O fundamental é que o relacionamento com fornecedores através de contratos auxilia a evitar litígios ou a estabelecer um consenso jurídico quando o litígio for inevitável. Em alguns contratos, ambas as partes concordam em não entrar em ações judiciais, mas, em vez disso, optam por uma decisão apresentada por um árbitro. A arbitragem de disputas contratuais é encorajada nas práticas comerciais e amparada por decisões das cortes supremas; seu efeito legal é a eliminação prática dos litígios. 3. METODOLOGIA A elaboração dessa pesquisa possui um caráter qualitativo e exploratório, na forma de Estudo Aplicado. Esta abordagem justifica-se pelo objetivo buscado pela pesquisa que consiste resumidamente em apresentar o conceito de estratégia de compras baseado em contratos pelas empresas, destacar sua importância e vantagens para a organização, mostrar sua evolução e exemplificar esta prática na empresa GSK. A pesquisa não parte de hipóteses pré-definidas a serem testadas, mas sim da busca de informações relevantes, sob o escopo do tema estudado, inicialmente na teoria e depois na atividade de campo, buscando-se a construção de uma argumentação consistente sobre as práticas de relacionamento com fornecedores e gestão de aquisições da GSK, à luz da teoria levantada. O primeiro estágio do trabalho baseou-se em um estudo teórico sobre compras, contratos e relacionamentos com fornecedores em fontes diversas. A segunda etapa, ou seja, o estudo empírico na GSK, desenvolveu-se da seguinte forma: • • • Busca de informações em informes internos, manuais e site institucional; Busca de informações através de entrevistas (in loco); Coleta de dados acerca dos procedimentos e estratégias de compras; 10 • • • MARANHÃO & DALTO / Revista P&D em Engenharia de Produção V. 07 N. 01 (2009) p. 01-19 Análise da situação atual; Confronto e projeção das condições atual e futura com as teorias apresentadas. Entrevistas com os profissionais da GSK (um Diretor de Compras e dois Gerentes) com duração aproximada de uma hora cada. A opção deste trabalho em utilizar uma única experiência empírica, a empresa GSK, foi baseada no estágio avançado de evolução do processo de compras desta organização, que já utiliza uma moderna gestão em seus negócios, sendo assim, uma análise comparativa não teria o mesmo efeito. 4. A GSK E SEUS RELACIONAMENTOS COM FORNECEDORES A Indústria Farmacêutica Brasileira apresenta uma estrutura típica de oligopólio, pois a maior parcela do mercado está nas mãos de poucas firmas, que são subsidiárias das multinacionais formadoras do grupo das grandes farmacêuticas mundiais (big pharmas). Em 2002, a GSK obteve vendas totais de 26,9 bilhões de dólares, incluindo medicamentos, vacinas e produtos de consumo para o cuidado com a saúde. Distribuindo seus produtos em 130 países, a GSK possui uma das maiores operações de vendas e marketing da indústria, com 43 000 funcionários nesta área, que por sua vez fazem parte de uma equipe de 100 000 pessoas no mundo todo. A sede mundial da companhia está localizada no Reino Unido e seu centro operacional nos Estados Unidos. A sede regional na América Latina está localizada no Rio de Janeiro, Brasil. Hoje, no Brasil, com aproximadamente 1 400 funcionários, a GSK concentra toda a sua produção em duas fábricas localizadas no Rio de Janeiro, uma no bairro de Jacarepaguá e outra em Barros Filho. Ambas abastecem todo o mercado brasileiro e têm como meta os países do Mercosul, da Ásia Pacífico, da África e outros mercados. Nos últimos dois anos foram investidos US$ 250 milhões na modernização tecnológica e na ampliação da capacidade produtiva. A área de suprimentos da GSK sempre teve a preocupação com as melhorias em seus processos, seja buscando economias de custos ou tempo, seja aprimorando os processos almejando a qualidade, tanto das atividades como de produtos/serviços. No final dos anos 90, a empresa buscou a automatização de seus processos sendo pioneira na época. Nos últimos anos foram lançados sistemas para melhorar as compras de materiais produtivos-insumos (B2B) e materiais não-produtivos (E-Req), ou também classificados como materiais inventariáveis e não-inventariáveis, respectivamente. No ano de 2001 a área de suprimentos da GSK criou uma equipe multidisciplinar a fim de avaliar as potenciais vantagens e eventuais desvantagens de se desenvolver um sistema B2B para a compra de insumos produtivos. Isso foi necessário, uma vez que não era nem um pouco racional negociar todas as alterações necessárias às quantidades e prazos previamente estabelecidos nas ordens de compra ou contratos firmados com os fornecedores, deixando passar em branco as inúmeras oportunidades de negócios ofertadas pelo mercado. Com a utilização do sistema B2B, a área de suprimentos racionalizou este processo e deixou de ser uma simples intermediária entre o Planejamento e o Controle da Produção (GSK) e os fornecedores, para se concentrar em negociações mais vantajosas para a empresa. Os acordos/contratos comerciais, em sua maioria com uma vigência anual, são colocados no sistema ERP e, a partir daí, a ferramenta B2B considera automaticamente a nova condição comercial, cabendo à área do Planejamento e Controle da Produção somente a colocação do pedido, através do MRP, para que todas as etapas posteriores sejam realizadas MARANHÃO & DALTO / Revista P&D em Engenharia de Produção V.07 N. 01 (2009) p. 01-19 11 pela ferramenta. Com isto, foi possível economizar no ano de 2005 cerca de 20% nas compras de matérias-primas e materiais de embalagem e de 10% sobre o nível atual do inventário da fábrica. Um ponto importante a ser destacado, que significava anteriormente risco ao comprador, era a possibilidade de deixar de enviar um pedido por erro ou omissão, já que tudo era transmitido através de e-mail. Com relação à elaboração dos indicadores de desempenho dos fornecedores, obtidos mensalmente, o sistema calcula de forma automática, considerando a performance de entrega e de qualidade. Para o desempenho de entrega, o sistema foi convencionado para realizar duas análises: uma relacionada ao prazo e outra à quantidade entregue. Quanto ao prazo, avalia-se a data efetiva da entrega contra a data original do pedido, sempre levanto em conta a tolerância estabelecida pela GSK, de três dias de antecedência e zero dia de atraso. Quanto à quantidade entregue, há uma tolerância de ±10% sobre a quantidade do pedido original, devido à complexidade que se tem na produção de materiais impressos. Com a utilização do sistema E-Req verificou-se um empoderamento do cliente interno. Uma vez que preços e prazos já estão negociados pela área de compras, o processo de emissão de pedidos passou a ser executado diretamente pelo usuário. A área de compras da GSK tem sido responsável pelo gasto anual superior a R$ 100 milhões com seus fornecedores, entre as mais variadas categorias de produtos e/ou serviços. Por essa razão, a racionalização e evolução dos seus processos internos foi muito importante para melhoria de performance da área, além de reduzir a carga operacional de trabalho através da automatização. Nos últimos dez anos, o número de fornecedores foi reduzido de 5 000 para cerca de 500. Atualmente esta quantidade de fornecedores concentra 97% do volume dos gastos da empresa. Além da alteração destes números, houve neste período uma mudança no relacionamento da GSK com os fornecedores. Um dos pontos levantados como de sucesso neste processo foi o do estreitamento de relacionamentos. Antigamente, o único fator para a escolha de fornecedores era o preço, mas a concentração de fornecedores permitiu que a qualidade aumentasse, melhorando o relacionamento com eles. Para a escolha dos fornecedores atuais foi feita uma análise detalhada e estes participam junto da GSK no gerenciamento da melhoria contínua. O resultado foi que sobreviveram somente os fornecedores que estavam realmente preparados para este novo processo, que foca na melhoria contínua. A lógica de seleção e monitoramento dos fornecedores é mostrada na figura 4. 12 MARANHÃO & DALTO / Revista P&D em Engenharia de Produção V. 07 N. 01 (2009) p. 01-19 Mapeamento da categoria Análise da situação Criação e aprovação da estratégia Implementação da estratégia Melhoramento Contínuo Gerenciamento do Fornecedor Gerenciamento da Cadeia Gerenciamento do Requerimento Figura 4: Processo de seleção e monitoramento dos fornecedores na GSK Fonte: GSK (2006) Porém, para encontrar o equilíbrio do gerenciamento do requerimento, foi exigido que os fornecedores mantivessem o foco nos critérios estabelecidos na Pirâmide das Necessidades elaborada pela GSK, mostrada na figura 5. Inovação Custo Serviço Qualidade/Regulatório Assegurar Abastecimento Figura 5: Pirâmide de necessidades da GSK – Etapas do gerenciamento do requerimento Fonte: GSK (2006) O que tem proporcionado sucesso ao setor de Procurement da GSK nos últimos anos é o desejo do aprimoramento aliado à coragem de enfrentar novos desafios. Seguindo o conceito da GSK aplicado a seus fornecedores, a figura 6 evidencia o tipo de relacionamento que a empresa mantém, evitando a troca frequente de fornecedores, proporcionando mais tempo para a pesquisa e análise de mercado. MARANHÃO & DALTO / Revista P&D em Engenharia de Produção V.07 N. 01 (2009) p. 01-19 13 Figura 6: Concentração de fornecedores permite um melhor relacionamento Fonte: GSK (2006) Dentre o volume anual de compras da GSK citado anteriormente, 85% já são de contratos formais ou não formais, sendo que a meta da empresa é alcançar 100%. A GSK sempre buscou estabelecer contratos de médio e longo prazos, com interesse de manter os mesmos fornecedores em carteira. Para atingir este estágio, houve, primeiro, uma avaliação de sua carteira. Para a contratação de fornecedores capazes de atender as necessidades da GSK existe um procedimento interno desenvolvido pelo seu Sourcing Group Management, cujo processo de licitação possui uma metodologia própria, desenvolvida e aplicada igualmente em todas as unidades da GSK ao redor do mundo. A primeira etapa é o envio da RFI (Request for Information) para que haja um nivelamento entre as empresas concorrentes, no qual os principais itens observados são: porte da empresa, volume dos negócios, principais clientes e contratos. A segunda etapa depende da primeira, pois só receberão a RFQ (Request for Quotation) as empresas selecionadas na primeira etapa. Trata-se da solicitação de cotação, sendo detalhadas todas as especificações do produto/serviço em questão. É enviado ao cliente prospectado um template chamado PPCA (Purchase Price Cost Analysis) que possui uma estrutura aberta e detalhada de preços, de forma a facilitar a análise de custos. Quando julgado necessário, a GSK executa visitas técnicas para avaliar e atestar o que consta na cotação. O decisor final é o custo, dado que a etapa prévia de qualificação foi concluída. Os contratos são negociados pelos gerentes das linhas e os supervisores e compradores operacionalizam o suprimento. O Contrak é uma ferramenta corporativa da GSK de gestão de contratos que os tornam acessíveis a todas as filiais do mundo, o que ajuda muito para conhecimento do que está sendo praticado, quando for necessário realizar uma negociação. Nele são centralizadas todas as informações acerca dos contratos: dados do fornecedor, vigência, data em que foi firmado, valor, gerente do contrato e outras. O Contrak é programado para alertar com antecedência sobre o vencimento para renovação do contrato. Com a utilização desta ferramenta o processo de gestão de contratos proporciona uma grande segurança para o setor, inclusive para auditorias. Hoje existe uma política da empresa que diz que para uma compra ser elegível a contrato, ela deve ser de acima de R$ 25 000,00. A área de compras do Brasil está desenvolvendo uma ferramenta de análise que abrange outros aspectos relevantes tais como: volume de gasto anual, tempo (período), risco potencial, dificuldade de mercado, código legal e confidencialidade. Ao final da avaliação, dependendo do número de pontuação alcançado, é firmado um contrato formal, um contrato não formal (chamado de acordo acompanhado de 14 MARANHÃO & DALTO / Revista P&D em Engenharia de Produção V. 07 N. 01 (2009) p. 01-19 uma ordem de compra) ou apenas uma ordem de compra. Apesar de ter regras subjetivas, muitos destes itens são mensuráveis, como tempo gasto anual, o que ajuda em muito a mensuração. A política está sendo criada para ajudar os gerentes e sua equipe a tomarem a decisão quando realmente é necessário estabelecer um contrato de fornecimento. Este procedimento está sendo analisado pelo setor jurídico e após aprovado será incorporado à política de compras. Uma evolução de vanguarda na área de suprimentos da GSK é o Projeto Prisma, que se concentra no relacionamento entre fornecedores, com o objetivo de elevar um elo à montante, pelo menos, os benefícios obtidos no relacionamento de suprimentos de primeiro nível. Como a empresa já gastou por volta de R$ 100 milhões em programas para melhorias de compras no Brasil, decidiu compartilhar os conhecimentos adquiridos nos últimos dez anos, ajudando seus fornecedores a se tornarem mais competitivos e rentáveis. Estão sendo compartilhadas desde tecnologias até mesmo treinamento de compras. O programa tem a previsão de redução de até 30% dos custos dos fornecedores, pois as indicações da GSK para reduzir desperdícios e despesas partirão de análises das estruturas de gastos. Os fornecedores, por sua vez, se comprometem em reverter o valor de 15% da economia gerada, durante o primeiro ano do projeto, na forma de descontos para a GSK. Se houver a necessidade de investimentos, a GSK pode ajudar a financiar o projeto. Com esta política incentiva-se um relacionamento de “portas abertas” com a possibilidade de identificar oportunidades mútuas, aumenta-se a competitividade/lucratividade com a otimização dos custos da cadeia de abastecimento e integra-se a base fornecedora, descobrindo novas oportunidades de negócios. Os princípios que norteiam o Projeto Prisma estão alinhados com os conceitos de Rede de Valor, que concebe a necessidade de integração dos diversos steakholders e que estes elos podem ser estendidos aos seus parceiros mais próximos, como ilustra a figura 7, cujo formato inspirou o nome do projeto. Clientes Fornecedores Funcionários Acionistas Comunidade Figura 7: Rede de Valor Fonte: GSK (2006) Em 2006 foram realizados dois projetos-piloto, sendo que um deles gerou uma economia de aproximadamente 36% para o fornecedor, considerando apenas um dos itens levantados pela consultoria da GSK, composta de oito especialistas. Estas melhorias beneficiam não apenas a GSK, mas todos os clientes da carteira do fornecedor. Em julho deste ano a GSK convidou 36 dos seus principais fornecedores a participarem deste projeto. Os benefícios esperados para os integrantes são: • • • • • Aumento dos lucros via redução de custos; Melhoria de processos; Troca de conhecimento e know-how; Participação do Clube de Negócios; Possibilidade de realização de compras colaborativas; MARANHÃO & DALTO / Revista P&D em Engenharia de Produção V.07 N. 01 (2009) p. 01-19 15 Convites e/ou descontos em palestras e cursos relacionados aos processos de compras; Ter o nome da empresa publicado no site da GSK como integrante do programa. Com este novo tipo de relacionamento a GSK busca gerar valor por meio da troca de informações, conhecimentos e práticas de sourcing. • • Após o aceite e a assinatura dos Termos de Adesão ao programa e de Confidencialidade, são discutidos o processo e a metodologia de trabalho e são acordados os próximos passos, para então ser definido um Plano de Ação. O processo é dividido em três etapas: Etapa 1 – Diagnóstico e Plano de Trabalho. Quando é construído um banco de dados para que se tenha um esclarecimento da situação atual. Em paralelo é feita uma análise qualitativa da categoria, para que seja construído um plano de trabalho. Etapa 2 – Operação Colaborativa. Quando é definida a estratégia que dará suporte às negociações, gerando as possíveis opções. Etapa 3 – Implementação. Quando é elaborado o plano de implementação de Ação. Como ferramenta de análise de gastos, o gráfico, mostrado na figura 8, desenvolvido pela GSK, ajuda a identificar as prioridades de implementação. A região denominada Onda 1 é a área onde se deve atuar inicialmente, por se tratarem de casos com menor nível de desgaste e, consequentemente, maior facilidade de implementação. As esferas maiores traduzem um maior efeito em função do volume de gastos. As demais Ondas devem ser interpretadas de maneira análoga e sucessiva. Figura 8: Gráfico de análise de gastos Fonte: GSK (2006) 5. ANÁLISE DAS PRÁTICAS DE SUPRIMENTOS DA GSK O pioneirismo nas práticas de suprimento da GSK, com o lançamento dos sistemas B2B e E-Req, respectivamente para insumos de produção e materiais não inventariáveis, surgiu de um planejamento estratégico, em que se buscava uma redução de custos e prazos e 16 MARANHÃO & DALTO / Revista P&D em Engenharia de Produção V. 07 N. 01 (2009) p. 01-19 um ganho de qualidade não só dos produtos adquiridos, mas de todo o processo de suprimentos. Tal perspectiva é coerente com a proposição de Christopher (2002) que afirma que a fonte de vantagem competitiva para uma organização encontra-se na capacidade de diferenciar-se dos concorrentes e operar a baixo custo. A atividade de suprimentos tem uma composição relevante nos gastos de uma empresa, conforme apontado por Baily (2000), contribuindo significativamente para a consecução das metas estratégicas. O mesmo autor afirma que a adoção da abordagem de vantagem competitiva integra necessariamente estratégia e compras. Com a implantação dos sistemas, a GSK reporta uma redução de 20% nos custos de suprimentos e 10% do nível de inventário (que reflete um efeito de escala, como apontado por Corrêa e Corrêa (2006)), redução de erros e do tempo na operação de suprimentos, além da criação de indicadores de desempenho, ou seja, ganhos em custo, prazo e qualidade. A abordagem de competências centrais e custo de troca, propostas por Hamel e Prahalad (1994), estão presentes na análise do portfólio de relacionamentos da GSK, embora não esteja explicitada pelo uso desta nomenclatura. A prioridade na escolha dos fornecedores com os quais deveria estreitar relações e a abertura a confrontação de mercado no sistema B2B evidenciam a utilização desta teoria. Uma particularidade que pode ser destacada é que o portfólio de relacionamentos não é adotado de forma passiva, isto é, dadas as características de centralidade da atividade e custo da troca, escolhe-se a forma de relacionamento. O que acontece na GSK é que a convicção de que relações mais estáveis geram melhores resultados, faz com que os fornecedores migrem para um patamar mais estratégico, na medida em que são poucos e o espectro de fornecimento mais amplo (LEENDERS e FEARON, 1993; JOHNSON e WOOD, 1996; KAYNAK,2005). A perspectiva de Cadeia de Valor, destacada por Merli (2004), que dá suporte ao comakership, é nítida na abordagem da GSK, como pode ser visto na figura 7. Evidenciam-se também na GSK as modernas práticas de sourcing, destacadas na literatura, pelo uso do RFI e RFQ, PPCA, que fornece a estrutura de custos e o sistema Contrak, que torna transparente a toda a companhia os contratos firmados. A extensão das boas práticas entre clientes e fornecedores a outros elos da cadeia, conforme sugerido por Kobayashi (2000), e adoção do benchmarking (CORRÊA e CORRÊA, 2006) podem ser verificadas na GSK através da implantação do Projeto Prisma, cujo piloto já demonstrou seus benefícios. O gerenciamento da parceria com compartilhamento de riscos e comprometimento com investimentos, destacados por Gonçalves (2004), Corrêa e Corrêa (2006) e Merli (2004) podem ser notados principalmente pela adesão dos fornecedores ao Projeto Prisma, através do qual tanto a GSK quanto seus parceiros aceitam e compartilham os riscos, benefícios e investimentos no projeto. A utilização de contratos, conforme definido por Heinritz e Farrell (1986), é foco da perspectiva estratégica da GSK, que visa atingir 100% dos relacionamentos de fornecimento, diante de 85% praticado atualmente. Alguns aspectos levantados na literatura e não evidenciados nas práticas da GSK são o suprimento JIT e programas de qualidade, como o TQM e o GWQC (CHRISTOPHER, 2002; KAYNAK, 2005; JOHNSON e WOOD, 1996; MERLI, 2004); além de práticas sustentáveis (KOBAYASHI, 2000). Sabe-se que o estreitamento de parcerias com fornecedores em menor número gera benefícios de embarques mais frequentes em menores volumes, tipicamente proporcionados por suprimento JIT. Embora seja provável este benefício na relação da GSK com seus fornecedores, ele não foi evidenciado na pesquisa. Da mesma forma, práticas de MARANHÃO & DALTO / Revista P&D em Engenharia de Produção V.07 N. 01 (2009) p. 01-19 17 gestão da qualidade no suporte a suprimentos também não foram evidenciadas, mas é provável que existam. 6. CONCLUSÕES O objetivo central proposto na pesquisa era mostrar que o relacionamento com fornecedores, através de contratos, provê redução de custos e prazos, melhorando a performance da operação da cadeia de suprimentos. Secundariamente propunha-se (1) apresentar a estratégia de compras através da adoção de contratos como uma forma de relacionamento com fornecedores; (2) evidenciar a evolução da atividade de compras; (3) destacar a importância da estratégia de compras no âmbito organizacional e, finalmente (4) exemplificar o uso de contratos no relacionamento da GSK com seus fornecedores e as vantagens advindas dessa prática. Começando pelos objetivos secundários pode-se concluir que a proposta (1) está delineada na literatura que dedica o item 3.3. a esta questão, bem como destaca em outros itens do referencial teórico a importância da formalização do relacionamento através de contratos como forma de garantia jurídica da cooperação estabelecida entre cliente e fornecedor. O tema do relacionamento com fornecedores através de contratos é o foco da pesquisa e mostra-se sua importância no contexto da GSK que busca que 100% das suas aquisições sejam estabelecidas através de contratos estáveis de suprimentos. A proposta (2) é destacada na literatura, que apresenta a evolução da atividade de compras inicialmente isolada no contexto da organização, focada em relacionamentos conflituosos, baseados no menor preço, passando a valorizar o custo total no médio e longo prazos, redução de ciclo e ganho de qualidade nos bens adquiridos e nos processos de aquisição. Isto se obtém através de relacionamentos estáveis com fornecedores, com os quais se procura um compartilhamento de custos e benefícios, em uma relação simbiótica. Recomenda-se que essas práticas devem ser entendidas a outros elos da cadeia de suprimentos. O próprio jargão evolui nesta linha, passando de compras a procurement e strategic sourcing. O objetivo (3) foi atingido, na medida em que se apresenta o contexto da estratégia empresarial e a importância que a atividade compras representa na geração de valor e diferenciação da empresa. Aborda-se a necessidade de uma visão integradora na empresa e desta com a cadeia de suprimentos, destacando-se os aspectos de um relacionamento estável e protegido juridicamente com os fornecedores diretos e extensível aos indiretos. A proposta (4) é amplamente discutida na apresentação do estudo empírico realizado na GSK, em que se revela o contexto da empresa, o início do projeto de melhoria dos processos de aquisição, ocorridos no final dos anos 90, sua evolução, a operacionalização da contratação de fornecedores e da atividade de suprimentos, os benefícios obtidos em termos de custos, prazos e melhoria da qualidade e, finalmente a extensão da iniciativa um elo a montante na cadeia de suprimentos, com a implantação do Projeto Prisma. Finalmente, pode-se afirmar quanto ao objetivo central que foi atendido, pelo menos no que diz respeito ao estudo empírico efetuado. Mostrou-se como o bom emprego de relacionamentos com fornecedores alicerçado em contratos gera importantes vantagens tanto para a GSK quanto para seus parceiros. O estudo relata vantagens para a GSK no que diz respeito à melhoria geral dos processos de suprimento e bens adquiridos, redução dos ciclos de aquisição e maior disponibilidade de tempo para os gerentes e operadores de suprimentos, redução dos custos de aquisição e nível médio de estoques. Embora o mesmo destaque não seja explícito para os parceiros da GSK, pode-se notar que estes são também beneficiários das 18 MARANHÃO & DALTO / Revista P&D em Engenharia de Produção V. 07 N. 01 (2009) p. 01-19 melhorias implementadas, pelo menos na medida em que têm a garantia de fornecimentos por um longo prazo e em volume significativo, dada a concentração de fornecedores que resultou do projeto. A ênfase no benefício dos contratos também é clara, pois mostra o grande interesse da GSK em trabalhar exclusivamente através desse instrumento jurídico, que lhe garante que seus requisitos explicitados na Pirâmide de Necessidades (Figura 5) serão atendidos. A extensão a toda a cadeia de suprimentos, particularmente nos elos à montante na relação de fornecedores é uma preocupação viva, como mostrado no Projeto Prisma, na medida em que se vislumbram os grandes benefícios, sejam diretos, através do repasse de redução de custos às compras da GSK, sejam indiretos, através de uma relação mais estável com seus fornecedores e um nível de comprometimento maior. Tendo sido mostrados os benefícios do relacionamento com fornecedores através de contratos, no contexto da GSK, uma questão que se coloca, como forma de atender plenamente ao que foi proposto na questão de pesquisa, é se este mesmo benefício poderia ser evidenciado em um aspecto mais amplo, com outras empresas em outras circunstâncias. Entendemos que esta resposta pode ser encontrada na teoria apresentada, que afirma ser uma tendência atual a substituição de relacionamento com fornecedores de forma conflituosa para perspectivas mais colaborativas, sendo os contratos uma forma de dar estabilidade às relações de colaboração. Certamente há premissas para que uma relação de colaboração produza bons resultados e a primeira delas é a confiança nos parceiros escolhidos. Uma postura ética deve reger esta forma de colaboração e uma disposição de transparência e agilidade na comunicação para sanar eventuais atritos que são inevitáveis em qualquer forma de relacionamento humano. REFERÊNCIAS BAILY, P. Compras: Princípios e Administração. São Paulo: Atlas, 2000. BOWERSOX, D.J., CLOSS, D.J. Logística Empresarial: O processo de Integração da Cadeia de Suprimento. São Paulo: Atlas, 2001. BRAGA, Ataíde. Evolução estratégica do processo de compras ou suprimentos de bens e serviços nas empresas. 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