"Não Há Bem que Dure Sempre, Nem Mal que Nunca se Acabe": O Caso da Dudalina S/A” Autoria: Erica Dayane Chaves Cavalcante, Maria dos Remédios Antunes Magalhães, Germana Tavares de Melo, Luana Ferreira Salles, Rosiele Fernandes Pinto Resumo Este caso para ensino descreve a história empreendedora de uma empresa familiar, atuante no setor de vestuário brasileiro, a Dudalina. O caso destaca as principais dificuldades no gerenciamento de uma grande empresa, apresentando elementos que caracteriza uma história de ascensão, sucessão, declínio, turnaround e decisões de posicionamento estratégico ao longo da sua existência. A história suscita questões que abrigam teorias subjacentes em estratégia organizacional. A coleta dos dados primários foi realizada por meio de entrevistas semiestruturadas, permitindo, assim, uma profundidade nos eventos e acontecimentos. Os dados secundários, por sua vez, foram provenientes de análise documental: relatórios de gestão, documentos e registros contábeis e gerenciais, bem como, outros documentos de posse da empresa que pudessem ajudar a compor sua história. O dilema central reside na decisão da adoção da estratégia de varejo como forma da empresa se posicionar estrategicamente no mercado. 1 Um Resgate da História da Empresa Dudalina S/A A saga empreendedora da empresa Dudalina S/A se inicia em 1957 na pequena cidade de Luis Alves/SC e se confunde com a história da genitora da família, Dona Adelina (Adelina Clara Hess de Souza), que, junto aos seus 16 filhos e seu marido, Duda (Rodolfo Francisco de Souza Filho) – família Hess de Souza, desenvolveu e consolidou uma importante marca de vestuário no país, tornando-se um dos principais empreendimentos da moda masculina da América Latina. Antes desse começo, Sr. Duda, possuía um pequeno comércio de secos e molhados, único meio de sustento da família até aquele momento. Um de seus filhos, Vilson Luis de Souza (atual presidente do conselho de administração da Dudalina S/A) relembra desse momento com carinho: “o armazém do meu pai era como a extensão da nossa casa, quando precisávamos de um quilo de arroz descíamos e apanhávamos o produto. Éramos em muitos lá em casa, cada um pegava o que bem entendia, não havia um controle entre as contas da casa e as da empresa”. Em 1957, já com 6 filhos, Sr. Duda, em viagem à cidade de São Paulo para aquisição de produtos para abastecer seu armazém, empolgou-se com a conversa de um comerciante turco que atuava na Rua 25 de março, com os bons preços dos seus produtos e comprou uma quantidade exagerada de tecidos. No retorno à sua casa, ele se deu conta de que havia adquirido um produto não rentável para os negócios, uma vez que a base para seu comércio eram produtos alimentícios. Assim, o que poderia se tornar um problema, representou um grande motivador para o início de uma nova atividade. Os olhos de Dona Adelina brilham ao se lembrar do estalo que teve ao ver os tecidos comprados pelo marido: “quando vi os tecidos, então eu pensei o seguinte: bom, todas as noites nós estávamos vendendo camisas, cuecas aqui no armazém. E porque eu não vou pensar em fazer alguma coisa deste tecido para vendermos também?”. Diante do episódio, Dona Adelina convocou duas amigas que possuíam máquinas de costura e alguma habilidade para a confecção e iniciou o processo de fabricação de camisas. Após este início, as peças confeccionadas necessitavam ser vendidas e um único ponto de venda não daria conta de fazer com que a produção fosse vendida, ponderou Dona Adelina na ocasião, assumindo a seguinte postura: “eu mesma pegava uma Kombi e saía para vender os produtos nas lojas das cidades vizinhas: Brusque, Joinville, Dr. Pedrinho e Guaramirim. Assim, como eu saía para vender, eu vendia por um ou dois meses. Eu mesma vendia, eu mesma entregava, eu mesma recebia. Todo o negócio estava em minhas mãos”. Ela conta orgulhosa do seu papel para que a ideia de produzir e vender camisas ganhasse vigor e se tornasse um negócio sério: “todo o negócio estava em minhas mãos, todo o corte das camisas era feito por mim. Eu trabalhava de madrugada, até altas horas da noite. Mas quando meu filho Anselmo entrou, ele começou a me ajudar, mas a organização sempre estava comigo”. Neste momento, embora Dona Adelina fosse a principal figura para o controle e produção das camisas e ajudasse nas vendas e no gerenciamento do negócio que era tratado como uma extensão da casa, a presença da família na gestão dos negócios era total e fundamental. Os filhos foram se interessando pelo ofício e, inspirados na união dos nomes Duda e Adelina dos patriarcas da família Hess de Souza, nasce a marca Dudalina S/A. Afinal, o que é Empresa Dudalina S/A? A Dudalina S/A é uma empresa que atua no setor de vestuário e tem como objetivo do negócio a exploração da indústria do vestuário em fibras naturais, mistas ou artificiais, podendo ainda exportar ou importar. A empresa produz as marcas próprias e cada uma representa um 2 público alvo que se pretende alcançar. Assim, a DUDALINA está focada no público masculino executivo; a INDIVIDUAL, focada no público masculino nos estilos: life style, classic e premium; e a BASE & CO, focada no público jovem. Além disso, a empresa produz para as principais marcas brasileiras, exportando para países do MERCOSUL e Europa. As camisas de tecido plano são o principal produto e representam 70% da produção e das vendas da empresa. A Dudalina fabrica malhas, calças e bermudas, comercializando, ainda, boxers, jaquetas, perfumes, acessórios, trajes, sapatos e tricôs. A empresa mantém um escritório de vendas (matriz) na cidade de São Paulo/SP e 04 unidades industriais. A unidade mais antiga, fundada em 1957, está localizada na cidade de Luís Alves/SC e conta com uma planta de 2.926 m2. A unidade industrial de Blumenau/SC possui 5.085 m2 de área construída e foi inaugurada em 1983. Em Terra Boa/PR, a empresa mantém uma unidade de 2.652 m2. A unidade de Presidente Getúlio possui 1.428m2. Ao todo são 14.046 m2 de produção com 1.272 colaboradores diretos e 250 indiretos. Com a visão de futuro em ser a melhor empresa de moda masculina do Brasil, a empresa registrou em seu planejamento estratégico a missão de “despertar no consumidor o desejo por nossas marcas”. Para isso os valores adotados pela empresa são: Cliente, como prioridade e alvo de conquista contínua; Ética, transparência e verdade; Inovação, antecipação, criação de novos desejos de forma sustentável; Paixão, sentimento de motivação para fazer o melhor com prazer; Pessoas, construção de relações sólidas e verdadeiras. A empresa tem como presidente do conselho de administração, Vilson Luis de Souza, que discursou enfáticamente: “A meta da empresa é tornar-se uma grande gestora de marcas, não se esquecendo de nossos parceiros no Private Label, da responsabilidade social e do foco na sustentabilidade do negócio”. Modelo de Gestão da Dudalina Pelo seu caráter familiar e sua forma jurídica de Sociedade Anônima, a Dudalina S/A homologou um modelo de gestão caracterizado pela existência de um conselho de administração; um conselho de família; e um acordo de acionistas. O Conselho de Administração era um órgão de deliberação colegiada, sendo que a representação da empresa era privativa dos diretores. O Conselho de Administração era composto por 7 (sete) membros efetivos e 3 (três) suplentes, sendo 6 (seis) eleitos em assembleia geral dos acionistas e um indicado pelo acionista controlador. Os acionistas minoritários que representavam mais de 20% (vinte por cento) do capital social com direito a voto podiam indicar um dos conselheiros efetivos. Na composição do conselho, 3 (três) conselheiros eram independentes, ou seja, escolhidos entre pessoas com amplo conhecimento em gestão, finanças, mercado e estratégia e que não tinham nenhuma relação com a empresa. Esta especificidade garantia que os conselheiros mantivessem sua independência no exercício da função. Na época, o presidente do conselho era Vilson Luis de Souza. O conselho de família, intitulado Conselho de Família Hess de Souza, não tinha personalidade jurídica e era formado exclusivamente pelos 16 filhos do casal Rodolfo Francisco e Adelina Clara Hess de Souza. O referido conselho era presidido por Adelina Sheila Hess de Souza Cunha, auxiliada por três membros efetivos, que se reuniam a cada bimestre para deliberação da pauta. A reunião do conselho, por sua vez, era realizada, anualmente, com a presença mínima de 12 membros. Suas atribuições eram várias e iam desde a discussão de instrumentos de proteção e diversificação do patrimônio da família, passando pela autorização 3 para aquisição e venda de participações acionárias entre seus membros; discussão sobre desenvolvimento e formação dos acionistas; assuntos relacionados à sucessão e arbitragem de conflitos entre os membros. Sobre a função do conselho de família, Vilson explicou: “nas reuniões do conselho gastamos 60% do nosso tempo em questões relacionadas ao relacionamento dos sócios, tratamos de cuidar dos aspectos relacionados ao afeto entre os irmãos. Outros 30% do tempo gastamos discutindo a cultura da nossa organização, formas de preservar a herança cultural deixada pelos nossos pais. Somente 10% do tempo dedicamos ao negócio em si. Para tratar deste assunto o fórum é outro”. O Acordo de Acionistas foi um instrumento adotado para regular as relações entre os sócios das empresas, Dudalina S/A; ADRO Administração e Representações Comerciais Ltda e Dudalina Participações Ltda, ambas pertencentes e controladas pela família Hess de Souza, estabelecendo princípios e normas de relacionamento e gestão nas empresas. O documento estabelecia que a empresa Dudalina S/A deveria ser administrada de forma profissional e tecnicamente como empresa de capital aberto; também ficava expresso que a empresa não deveria ser conduzida como sociedade familiar. Este documento definia ainda os critérios que deveriam ser observados para o preenchimento de cargos de direção e gerência. O Acordo de Acionistas deliberava sobre a forma de administração da Dudalina S/A; sobre a formação do Conselho de Administração e sobre a formação da diretoria. Assinavam o referido Acordo de Acionistas os 16 irmãos e Dona Adelina. Os Diferentes Cenários Vivenciados pela Empresa Para que a marca Dudalina S/A fosse criada e estabelecida nos moldes atuais, muitos cenários foram palco de êxitos e dificuldades, cujas causas, em certa medida, eram devido à má execução ou falta de execução de planos estratégicos. Era mais um dia na história da empresa e, na figura de membro da família Hess de Souza e presidente do conselho de administração, Vilson Luis de Souza iniciava uma reflexão sobre os cenários com vistas a compreender estes momentos a fim de fundamentar sua postura em decisões futuras, uma vez que ele desempenhava importante papel no tripé gerencial da empresa. Suas reflexões remetiam ao começo da empresa Dudalina em maio de 1957. Lembrou-se que com o sucesso das vendas na década de 60 a empresa adquiriu duas lojas em Balneário Camboriú/SC, com a finalidade de oferecer uma ocupação aos membros da família e escoar a produção. Em 1969, Sr. Duda e Dona Adelina, mudaram-se para a cidade de Blumenau e, em 1974, o comando da empresa passou para a segunda geração da família, na ocasião, sob o comando dos irmãos Anselmo José, que exercia a função de presidente do conselho de administração, e Heitor Rodolfo, na função de diretor de produção. Anselmo José era o primogênito do casal e acompanhara os negócios da família desde a infância. Ele assumiu a gestão dos negócios em 1974, tendo sua trajetória marcada pelo foco no mercado e na preocupação constante em formalizar a estrutura da empresa. Vilson Luis, lembrouse de um discurso de sua mãe a esse respeito: “com a entrada do Anselmo na confecção, houve uma evolução da empresa bastante acentuada, uma evolução muito grande. A entrada dele no negócio foi muito importante. Ele saía para vender no norte do Paraná e várias cidades. A evolução principal da empresa iniciou-se quando o Anselmo começou a trabalhar na Dudalina, porque eu sozinha não dava conta, pois eu estava grávida todo ano, tinha que cuidar das crianças”. 4 Anselmo José tinha a necessidade de formalizar a estrutura, e isso seria o motivo da centralização excessiva que marcou a sua gestão, relembrou Vilson Luis, memorando o que o irmão tinha admitido em uma conversa passada: “a minha estrutura era um pouco centralizadora. Eu tinha domínio de todas as áreas. Atuava, ou fiscalizava dentro de todas as áreas. Fazia através de acompanhamentos e trabalho. Eu tinha poder absoluto. Era eu que dava as regras totais”. Foi com esta postura que surgiram os primeiros sinais de gestão profissional na empresa, pela contratação de um executivo externo da família, por Anselmo: “aí a empresa trouxe profissionais de fora que tinham experiência, contratação de profissionais, chefe de expedição, gerente comercial, eles já tinham experiências de outras empresas, sempre, ou quase sempre, da área têxtil, porque o têxtil tinha predomínio absoluto”. Os anos 80, conhecidos como a década perdida da economia nacional, foram marcados pela consolidação da marca e a superação de dificuldades. A empresa sofreu com as cheias do Rio Itajaí-Açu em 1983, período durante o qual a produção foi, momentaneamente, interrompida e foram necessárias ações para recuperar a fábrica. Num esforço contínuo de manter os bons índices, os negócios foram ampliados com a abertura do escritório de vendas na capital paulista, comandado pela sua irmã Sônia Regina, a sexta filha do casal. Em 1984, uma nova fábrica foi inaugurada na cidade de Blumenau/SC. No período subsequente – entre os anos de 1984 e 1989, a empresa cresceu 250%. Preocupados com a explosão dos negócios, o conselho de administração aprova a aplicação de 4% do faturamento anual em projetos de capacitação, treinamento e reformulação gerencial. Este foi o primeiro indício de uma nova estratégia gerencial, profissionalizar definitivamente a gestão do negócio. Em 1989, Anselmo José passou a presidência executiva da empresa para o irmão, Armando Hess de Souza, e assumiu o recém-criado Conselho de Administração. Anselmo deixou uma empresa capitalizada e com crescimento médio de 250% nos últimos 5 anos de sua gestão, porém, os problemas de gestão se acumulavam e coube à próxima gestão resolvê-los. A transferência da gestão da empresa foi intermediada pela própria fundadora, como lembrou Vilson Luis. Minha mãe argumentava: “uma vez que o presidente buscava interesses pessoais não consoantes com os interesses e a direção do negócio da empresa, será necessária a intervenção da fundadora para direcionar um processo de transição da gestão para o outro filho”. E foi o que aconteceu, na ocasião, conservando a característica cultural de gestão familiar. Na década de 90, sob o comando de Armando Cesar (Presidente executivo), o ajustamento da economia e a sequência de planos econômicos desastrosos trouxeram instabilidade à Dudalina. Vilson Luis relembra o que colaborou para o agravamento da crise na Dudalina foi o fato de, entre 1990 e 1991, o governo brasileiro ter promovido a abertura das importações. Seu irmão Armando, na época, tinha mencionado: “com a abertura das importações, o setor têxtil de Blumenau vivenciou uma crise, que foi quase a sua destruição. Na Dudalina não tínhamos uma estrutura de custos para competir com os importados, foi um caos”. Deste momento em diante a crise instalou-se na empresa que acumulou, a partir de então, prejuízos financeiros, o que, na percepção de Vilson Luis, tinha ocorrido, dentre outros motivos no tocante à gestão, pela falta de estratégia frente ao novo modelo econômico brasileiro. A abertura de mercado, promovida pelo então governo Fernando Collor de Melo, em 1991, fez com que a empresa se antecipasse às mudanças. Para tanto, os investimentos em modernização do parque industrial tornaram-se constantes. Precursora no uso de novas tecnologias, a empresa se tornou a primeira camisaria do Brasil a ter sistema integrado de modelagem, encaixe e corte eletrônicos. Em 1994, acontecem as primeiras importações de tecidos da Itália e de Portugal. A 5 marca Base entrou no mercado nesse mesmo ano como um laboratório de franquias. Em 1996, a empresa enfrentou sérias dificuldades e seu lucro foi negativo. Vilson Luis lembrava que o irmão Armando tinha se revoltado com a situação da empresa, assim como ele mesmo colocou numa reunião: “nós produzimos dentro do mesmo parque fabril: camisa, calça, bermuda, blusa infantil, era uma salada russa e perdemos mercado, porque nós dispersamos o foco e tudo o que nós fazemos é um produto de qualidade mediana”. “Foi uma briga quase que solitária do presidente com os conselheiros para dar mais foco à empresa e isso se arrastou por mais de 5 anos” evocou Vilson Luis. No ano seguinte, 1997, a empresa contratou uma consultoria, a Fundação Dom Cabral, com o objetivo de repensar o negócio e a forma de gestão, ocorrendo a instalação de um Conselho de Administração que não blindou a empresa de uma crise de gestão, disfarçada, no período anterior, pelo vertiginoso crescimento das receitas e do patrimônio da empresa. A nova diretoria direcionou seus esforços na procura de uma resposta às dificuldades encontradas na gestão, então a empresa iniciou um processo de expansão e modernização do parque fabril. Favorecidos pela abertura de mercado da economia brasileira, a empresa começou a importar tecidos da Europa. A contratação da uma consultoria e a adoção de um modelo de gestão, focado na excelência, salvaram a empresa de problemas mais sérios. A modernização chegou à gestão, que direcionou a instalação de modernas ferramentas de gestão, contratou designers reconhecidos internacionalmente e adquiriu tecnologia italiana para a confecção de camisas. Vilson Luis se recorda do discurso do irmão Armando: “foi uma exigência minha que a empresa seguisse o modelo de gestão que estávamos implantando. Percebi que esta era uma forma de colocar minhas ideias na organização, pois tinha o aval e experiência da Fundação Dom Cabral. Dessa forma, consegui vencer algumas resistências, principalmente, do Conselho de Administração”. A consolidação do novo modelo de gestão, apoiada pela consultoria, fez a empresa evoluir de um lucro operacional líquido negativo (ROL) de R$ 63.000,00, em 1996, para uma ROL de mais de R$ 3.700.000,00 no ano de 2000. O novo modelo de gestão contribuiu para que a empresa pudesse se reposicionar no mercado e adotar estratégias mais agressivas e contundentes. A principal mudança pode ser atribuída ao fato da empresa ter optado por trabalhar com 03 marcas de produtos e, dessa forma, segmentar o mercado, definindo estratégias para cada público alvo identificado. A opção da Dudalina foi trabalhar com o mercado das classes A e B nas marcas: Base Co; Individual e Dudalina (segmentada nas marcas Cult; Business e Sport Chic). Esse posicionamento proporcionou uma vantagem competitiva para a empresa, assim como pensou Vilson Luis: “hoje temos uma presença de mercado bem definida, a empresa tem uma visão clara do que acontece no universo da moda no mundo todo, do ponto de vista de produto, moda, tendências. Temos acompanhado de perto os chamados sinais fracos e sinais fortes de tendência, por isso a Dudalina tem estado na vanguarda". Os anos 2000 foram palco de dificuldades. Apesar dos conflitos e disputas internos, o presidente resiste à pressão e permanece no cargo até o ano de 2002. Trabalhando com adversidades múltiplas, mas focado no objetivo de organizar a empresa, Armando implantou uma gestão mais compartilhada e tentou se firmar como líder. Em 2001, o lucro da empresa foi 56% menor que no ano anterior e, em 2002, a empresa amargou prejuízos. A troca de diretoria no ano de 2002 não foi ocasionada pelos resultados negativos da empresa, conforme assumiu o CEO da época. A saída de Armando César Hess de Souza foi motivada por incompatibilidades com o conselho de administração, pois havia uma 6 orientação do conselho para que a diretoria da empresa elaborasse projetos voltados para a entrada na indústria de moda, desenvolvendo estratégia de criação de canais de distribuição direta, uma tendência das indústrias desse setor. Porém, havia um receio por parte da diretoria por entender que, dessa forma, a empresa estaria concorrendo diretamente com seus clientes dos magazines e redes de lojas. Além disso, a empresa tinha um histórico de insucesso, quando franqueou a marca Base Co. Assim, o conselho e a presidência da empresa não entravam em comum acordo quanto à questão de adotar a estratégia de varejo: "eu trocaria um ano de lucro da empresa por um bom projeto de varejo”, colocou Vislon. Para ele, o modelo de gestão familiar, associado à cultura portuguesa da família camuflava os conflitos internos e, caso a estratégia de varejo fosse adotada, ele não via outra alternativa a não ser a substituição do presidente. Vilson Luis lamentou que este momento foi marcado por conflitos entre os irmãos. De um lado Anselmo justificava sua saída: “muitos profissionais contratados bateram de frente com a gestão familiar, as pessoas iam adquirindo vontade própria e eu era muito ditador”. De outro, Armando, que se tornava o ocupante do cargo do irmão, colocava outra realidade: “O Anselmo iniciou um novo negócio que não era compatível com a Dudalina, então o conselho decidiu que ele deveria se afastar, para cuidar do próprio negócio, e me colocaram de presidente... eu não estava totalmente preparado... levei uns 2 anos para entender a dinâmica política da empresa, durante esse tempo fui muito castigado”. A consolidação do novo modelo de gestão da Dudalina alcançou o ápice no ano de 2003. Nesse período, houve outra troca da direção da empresa, que passou a ser presidida por Sônia Regina Hess de Souza. Esse fato, porém, não alterou as práticas organizacionais, tão pouco a forma e o modelo de condução dos negócios foram alterados. Sônia Regina assumiu a presidência, apoiada pelos irmãos Renê Murilo (diretor de operações) e Rui Leopoldo (diretor de exportações). Essa década foi marcada pela responsabilidade social. A empresa implantou um programa de participação nos lucros, tornou-se signatária do Pacto Global (programa da ONU em favor de direitos humanos, meio ambiente e contra a corrupção), e foi instituído o código de ética na empresa. Estrategicamente no mesmo período a Dudalina investiu fortemente em marketing. Já em 2004 a empresa retomou sua curva de crescimento e o lucro reapareceu no ano seguinte. Nos anos que seguiram até 2009, novos conflitos internos e contingências se fizeram presentes, porém não tiveram o mesmo impacto dos que incidiram no declínio da empresa no período 1991 a 2003. Entretanto, pensando em um cenário contemporâneo, Vilson Luis tinha consciência de que não estavam isentos de vivenciarem novas tempestades. Ele permanecia vigilante quanto aos eventos que, assim como os anteriores, pudessem vir a emergir e abalar a empresa. O dirigente avaliou as ações estratégicas tomadas e, num momento solitário de reflexão, questionou-se sobre quais medidas a Dudalina S/A poderia tomar para lidar com as contingências. Dentre algumas, ele refletiu sobre a possibilidade da empresa intensificar sua estratégia de varejo, já que ele tinha observado que há um movimento antigo e contínuo, ligado às condições econômicas características da indústria e ao cenário competitivo no qual a empresa estava inserida, das indústrias entrarem no varejo e terem tido bastante sucesso. NOTAS DE ENSINO Resumo 7 Este caso para ensino descreve a história empreendedora de uma empresa familiar, atuante no setor de vestuário brasileiro, a Dudalina. Na narrativa do caso, apresenta-se toda a trajetória da empresa, enfatizando, os momentos de dificuldades vivenciados pela empresa ao longo de seu desenvolvimento, bem como as subsequentes estratégias adotadas para a recuperação organizacional. A história suscita questões que abrigam teorias subjacentes em estratégia organizacional. O dilema central reside na decisão da adoção da estratégia de varejo como forma da empresa se posicionar estrategicamente no mercado. Recomenda-se a utilização deste caso em cursos de graduação e pós-graduação. OBJETIVOS EDUCACIONAIS O caso destaca as principais dificuldades no gerenciamento de uma grande empresa do setor de vestuário, apresentando elementos que a caracteriza como empresa familiar e uma história de ascensão, sucessão, declínio, turnaround e decisões de posicionamento estratégico ao longo da sua existência. Foram abordados temas que se encontram no quadrante da Administração Estratégica tendo como desafio descrever as etapas do ciclo de vida – CVO da empresa Dudalina S/A com ênfase na etapa de declínio organizacional, turnaround e as decisões definidas pela empresa a respeito de seu posicionamento estratégico no mercado até o ano de 2009. Os objetivos desse caso para ensino são desenvolver nos participantes: 1) conhecimentos sobre as peculiaridades da gestão de uma grande empresa familiar, em que são elucidados o cotidiano dessa empresa, a partir de um relato vivo da vivência dos seus personagens principais; 2) reconhecimento da possibilidade de aplicação dos conceitos de Administração Estratégica, possibilitando a discussão no âmbito da gestão de empresas de grande porte, mais especificamente as temáticas de CVO, declínio, turnaround e posicionamento estratégico, sendo temas abordados na disciplina de Administração Estratégica que compõem a grade curricular de cursos de graduação e pós-graduação; 3) além dos temas relacionados com a disciplina de Administração Estratégica, este caso tem potencialidade em sensibilizar e avaliar as consequências de uma postura empreendedora na gestão familiar, o processo de sucessão empresarial, concepção de novos negócios, posicionamento de mercado e gerência de marcas, conteúdos das disciplinas de Empreendedorismo; Gestão e Governança; e Marketing que podem ser ofertadas tanto na graduação como em pós-graduação; 4) proporcionar uma análise crítica da literatura; 5) desenvolver a capacidade de estabelecer claramente o link entre teoria e as atividades desenvolvidas pela organização em foco, fazendo com que os alunos sejam capazes de discernir e tomar melhores decisões. Considerando a dificuldade em realizar visitas técnicas que propiciem aos alunos uma vivência mais próxima da realidade, esse caso vem atender a essa demanda específica já que ilustra uma situação vivenciada no cotidiano de uma empresa. Tendo em vista a escassez na literatura de casos para ensino de grandes empresas, esse caso ilustra claramente a realidade de empresas que passam a ter maior dificuldade de sobrevivência conforme o ciclo de vida avança. Tal constatação pode ser explicada pela necessidade de capitalização do negócio, na medida em que vai acontecendo a consolidação de sua atividade. 8 Esse caso possibilita, ainda, conhecer as características próprias de grandes empresas familiares, diferenciando-se de outros tipos de gestão e que muitas vezes essas informações são negligenciadas nas discussões e literatura que trata desse setor. FONTES DE DADOS Este caso relata uma situação real, em uma empresa do setor de vestuário. As situações apresentadas são fieis à realidade pesquisada. Os sujeitos da pesquisa foram membros da família que exerceram ou exercem no período da pesquisa cargos de diretoria, além dos membros da família que têm participação acionária na empresa. Foram realizadas cinco entrevistas distribuídas nas seguintes funções: Sócio e Presidente do Conselho de Administração, Controladoria, Sócia e CEO da empresa, Sócio e ex- CEO empresa. Para levantar as possíveis causas do declínio bem como os fatores responsáveis pelo turnaround da empresa no período entre 1989 e 2004, foram ouvidas as pessoas que faziam parte da diretoria da empresa no período entre 1990 a 2004, pois, para Robbins e Pearce II (1992) o ciclo completo entre o declínio do desempenho e a recuperação é de aproximadamente quatro anos. Cabe observar que a Dudalina S/A enfrentou seu maior desafio no ano de 1991, em função da abertura abrupta das importações, sendo que nos anos 1996 e 2002 seu lucro também foi negativo. Nesse sentido, o período acima (1989 a 2004) se justifica como aquele que antecedeu o ápice das dificuldades da empresa. A coleta dos dados primários foi realizada por meio de entrevistas semi-estruturadas, permitindo, assim, uma profundidade nos eventos e acontecimentos, objeto deste caso para ensino. Os dados secundários, por sua vez, foram provenientes de análise documental: relatórios de gestão, documentos e registros contábeis e gerenciais, bem como, outros documentos de posse da empresa que pudessem ajudar a compor sua história. Para o levantamento destas informações, foi enviado, antecipadamente, aos devidos departamentos, um check list indicando a natureza da informação que se pretendia coletar, na tentativa de otimizar a coleta de dados. As entrevistas tiveram como propósito conhecer a empresa e identificar a situação problema que fosse considerada útil para a elaboração do caso. TÓPICOS PEDAGÓGICOS Sugestões e Orientações para o Uso do Caso Torna-se interessante discutir, antes do estudo do caso em si, um panorama da indústria de vestuário para que os alunos se situem sobre a realidade desse setor e as potencialidades desse mercado na região na qual se encontra a empresa em estudo. Pode-se começar a discussão do caso, abordando os assuntos de ciclo de vida das organizações, declínio, turnaround e posicionamento estratégico no contexto organizacional, considerando o ambiente em que a empresa se insere. Como sugestão para análise do caso pelo professor, para orientar a discussão em sala de aula, são recomendados os seguintes procedimentos: 1. Tempo para análise do caso, antes da aula: aproximadamente 1h; 2. Análise e discussão dos alunos em pequenos grupos (3 a 4 alunos): 20 minutos em sala; 3. Discussão em sessão plenária orquestrada pelo professor: 30 minutos em sala; 4. Fechamento da discussão do caso pelo docente: 15 a 20 minutos em sala. 9 Questões para Discussão 1. Quais sãos as fases do ciclo de vida da Dudalina? Explique cada uma delas de acordo com a literatura sobre o tema. 2. Qual o conceito de declínio e turnaround organizacional apresentados neste caso? Explique. 3. Oberva-se que vários fatores levaram a Dudalina ao declínio organizacional. Quais são esses fatores? 4. Quais medidas poderiam ter sido adotadas pela gestão da empresa para solucionar problemas de declínio apresentados no caso? 5. Descreva o processo de recuperação pelo qual passou a Dudalina, de acordo com a literatura sobre o tema. 6. Qual ferramenta estratégica poderia ajudar a Dudalina a decidir sobre a possibilidade de intensificar suas ações no varejo? Explique. 7. Quais as implicações para o modelo de negócio da Dudalina caso ela opte por intensificar as ações para o varejo? Revisão da Literatura Relacionada à Resolução das Questões Para embasar as questões na discussão deste caso para ensino e para a reflexão sobre os conflitos inerentes a essa empresa, deve ser considerada a literatura sobre ciclo de vida das organizações, declínio organizacional, turnaround e posicionamento estratégico. Ressalta-se que a utilização das três teorias de Administração Estratégica, neste caso para ensino, são apenas bases teóricas norteadoras para explicar os eventos que ocorreram ao longo dos anos na gestão. Já a teoria de posicionamento estratégico de Porter deve dar subsidio ao aluno para responder a questão central. No entanto, o professor pode fazer uso de outras teorias para dar suporte à resolução do caso, conforme explicitado anteriormente no tópico sobre os objetivos educacionais. Ciclo de Vida das Organizações Parte significante da literatura trata o Ciclo de Vida das Organizações (CVO) de maneira analógica aos seres vivos (MACEDO, 2003). Neste sentindo o CVO estuda a forma como as organizações se desenvolvem e administram suas atividades ao longo do tempo e a maneira como surgem padrões durante a trajetória de desenvolvimento. O modelo seminal para os estudos de CVO é proposto por Larry Greiner (1972). O autor explica o CVO com base em estudos realizados sobre o comportamento humano frente às modificações do ambiente. Utiliza elementos como idade; tamanho de crescimento da indústria; foco gerencial; estrutura organizacional; formalização; estilo da alta administração e sistemas de controle e recompensas aos níveis gerenciais, para enquadrar as empresas em cinco fases de desenvolvimento organizacional: 1) início, 2) sobrevivência, 3) sucesso/decolagem, 4) expansão e 5) maturidade; 10 Há um consenso entre os autores de que as crises enfrentadas pelas organizações podem ocorrer em qualquer fase do desenvolvimento da organização e se mal gerenciadas podem levar ao declínio e a morte das mesmas (GREINER, 1972; ADIZES, 1990; CHURCHILL, LEWIS, 1983; MILLER, FRIESEN, 1984). Outro ponto em comum entre as opiniões dos autores ocorre ao evidenciar que o aumento da complexidade na organização acontece na etapa de crescimento, exigindo, desta forma, um esforço maior da organização em vencê-los. Por outro lado, na etapa do envelhecimento a empresa perde, de forma visível, a capacidade de enfrentamento das crises e, se estratégias de turnaround não forem adotadas, o desaparecimento da organização é decretado Assim, de acordo com a literatura todas as empresas passam por fases de desenvolvimento: nascimento, crescimento, estabilização, declínio e morte. Cada fase apresenta características específicas, porém que são semelhantes entre as empresas. No entanto, diferente dos seres vivos as organizações podem apresentar a fase de renascimento (MILLER & FRIESEN, 1984). Declínio de Turnaround das Organizações Os estudos destinados a pesquisar declínio no desempenho das organizações têm focado tanto na compreensão do declínio por si, quanto do turnaround (recuperação empresarial) e da falência (HOFFMAN, 1989). Segundo Levy (1986), declínio organizacional é definido como a falta de consciência das ameaças do ambiente (interno ou externo) associado ao desconhecimento das fraquezas da organização. Para ele, essas duas deficiências fazem com que a empresa tome decisões que não são eficientes na solução dos problemas. Nesse sentido, Weitzel e Jonsson (1989) sugerem que as organizações desenvolvam um conjunto de indicadores capazes que ajudar o grupo gerencial a controlar as prováveis distorções na performance da empresa. De acordo com esses autores, os problemas enfrentados por empresas que se encontram na fase declínio são relacionados, principalmente, à erosão de sua base de recursos, requerendo dos gestores rapidez e eficiência na tomada de decisão. Adicionalmente, eles apontam três fatores causadores de declínio organizacional: descontinuidade da indústria, passagem de estágio do produto no seu ciclo de vida e a dinâmica organizacional interna. Outras causas de declínio também são apresentadas por Mintzberg (1984) e Greenhalgh (1982) ao afirmarem que o declínio ocorre quando a organização atinge o limite da oferta de seus serviços à sociedade, ou seja, a habilidade gerencial em se adaptar ao ambiente encontra-se deteriorada e a tentativa de aumentar a participação no mercado é falha. Adicionalmente, Schendel et al. (1976) apontam a estrutura de custos elevada, a produção ineficiente e a redução do volume dos negócios, associados ao aumento da concorrência e a problemas com a gestão como sendo as características que indicam as causas do declínio. A respeito do tema, os referidos autores enfatizam que o maior sinal de declínio na organização é a receita operacional líquida reduzida por quatro anos consecutivos. Bibeault (1999), por sua vez, afirma que as causas do declínio podem ser classificadas como internas e externas. No primeiro caso, a visão estreita, a falta de disciplina do gestor, assim como a centralização excessiva das decisões e os problemas oriundos da sucessão são apontados como possíveis causas do declínio. Os fatores externos podem ser causados pela subida das taxas 11 de juros e inflação, pela entrada de novos concorrentes, fatores ligados à regulamentação e legislação do setor e, finalmente, a evolução rápida da tecnologia de produção que pode tornar ultrapassada a tecnologia da empresa que, descapitalizada, não acompanha a concorrência. Ainda podem ser citados como responsáveis pelo declínio de organizações os seguinte fatores sugeridos por Thain e Goldthorpe (1989): Distanciamento do propósito organizacional definido na missão; Utilização de estratégias inapropriadas para atender aos objetivos estratégicos; Cadeia de valor deficiente, causando dificuldades para implementar a estratégia; Incapacidade de organizar pessoas, estruturas e sistemas para o controle; Recursos utilizados de forma dispendiosa; Estratégias operacionais desalinhadas com o meio ambiente; Dificuldades na obtenção dos resultados propostos. Nesse sentido, Scott (1976) sugere que seja introduzida energia humana e financeira numa organização em declínio, pois tal atitude é semelhante a um modelo orgânico que, quando doente, necessita de cuidados e assistência especiais. Katz e Kahn (1966) e Buckley (1967) explicam que o declínio numa organização se torna maior na medida em que as ações estratégicas adotadas pela empresa são insuficientes para repor a energia que a organização requer, do mesmo modo que o não entendimento da real complexidade do ambiente pode levar o grupo gestor a uma leitura errada da situação. Neste caso, segundo os autores, pode haver uma intensificação no declínio e a falência se torna inevitável. Entretanto, quando se consegue evitar a falência, diz-se que a empresa passa por um processo de recuperação denominado de turnaround. Dentre os precursores no estudo dessa temática, encontram-se Schendel et al. (1976) os quais apontam duas alternativas para solucionar o problema de declínio nas organizações: “curas estratégicas” e “curas operacionais”. A primeira é útil, quando a causa do declínio é a má gestão da organização; a segunda, é necessária para responder as deficiências financeiras, resultado da fraca eficiência operacional. Outra alternativa de recuperação das empresas é dada por Slatter e Lovett (1999). Eles afirmam que a mudança do principal executivo consiste em uma estratégia positiva que fornece um elevado grau de recuperação das empresas. Esse novo executivo deve concentrar esforços no aumento do fluxo de caixa, na melhoraria dos controles financeiros e na implantação de uma cultura de gestão orientada para resultados. Hofer (1980), por sua vez, afirma que caso a empresa apresenta saúde operacional adequada, ela alcança movimentos positivos de recuperação. Nessa situação, a redução dos custos e ativos é a melhor resposta. Entretanto, é importante ressaltar que o momento de recuperação deve ser adequado à situação financeiras da empresa e o foco da formulação de estratégias deve ser nas causas do declínio (BIBEAULT, 1999; HOFER, 1980). É importante salientar que a estratégia de redução de custos não é suficiente para o turnaround organizacional (SLATTER; LOVETT, 1999), devendo, os movimentos estratégicos da empresa, serem acompanhados doaumento da cota relativa de participação no mercado e uma eficiência nos níveis operacionais da organização (HAMMBRICK; SCHECTER, 1983). Corroborando com o pensamento de Hofer (1980) sobre turnaround após períodos de declínio, tem-se os estudos de Robbins e Pearce II (1992). Para eles, duas etapas são identificadas no processo de recuperação do desempenho organizacional: desenvolvimento de atividades de redução de custos e ativos (retrenchment) e o turnaround depois que a empresa estabilizou os resultados econômicos, conforme mostra a Figura 1. 12 Quadrante 1 Quadrante 2 Fatores Internos de declínio Baixa Alta Manutenção da eficiência Redução de custos Intensidade do declínio Fatores Externos de declínio Quadrante 3 Melhoria do desempenho da organização Estabilidade Redução de ativos Operacional Expansão empreendedora Estratégico Fase de Declínio Processo de estabilidade e recuperação crescimento Processo de Turnaround Figura 1 - O processo de recuperação de Robbins e Pearce II Fonte: Adaptado de Robbins e Pearce II (1992, p.291) De acordo com a Figura 1, o quadrante 1 representa a fase em que a organização começa a sentir os primeiros efeitos do declínio. Durante esse período, a combinação dos fatores internos e externos implica na necessidade de recuperação da empresa. Para tanto, é indispensável um diagnóstico preciso, pois, baseado nele, o grupo gestor tomará as providências cabíveis requeridas pela situação. No quadrante 2, pode-se observar a fase de retrenchment que corresponde a uma das ações de recuperação adotadas e que pode acontecer por meio da redução de custos (quando a intensidade do declínio é baixa), ou por meio da venda de ativos fixos, motivada, neste caso, por crises mais agravadas. Por outro lado, Arogyaswamy e Yasai-Ardekani (1997) afirmam que os fatores determinantes para o turnaround bem sucedido dos negócios são os investimentos em tecnologia e a busca contínua pela melhoria da eficiência na operação. Neste caso, a diminuição dos custos como atividade de retrenchment pode comprometer o desempenho e a qualidade dos produtos organizacionais, levando a empresa a um círculo vicioso que a implicaria em falência. Na Figura 1, também é possível observar uma justaposição entre o final do quadrante 2 (processo de estabilidade e recuperação) e o começo do quadrante 3 (processo de crescimento ou regresso ao crescimento). O tempo de duração entre uma fase e outra vai depender da capacidade da organização em responder aos problemas identificados (ROBBINS; PEARCE II, 1992). Essa capacidade está diretamente relacionada com aspectos como: recursos disponíveis, programas e políticas, estrutura organizacional, recursos humanos e recompensa. Fleck (2004) aponta duas condições essenciais para o sucesso de longo prazo nas organizações. A primeira, está relacionada com a “capacidade da empresa de exercer prolongado poder no mercado, ocupando posição privilegiada do setor” (FLECK, 2004, p. 84). A segunda, 13 está relacionada à “empresa projetar processos organizacionais que lhe permitam capturar, explorar e reconfigurar recursos valiosos e moldar consideravelmente seu ambiente de negócios” (FLECK, 2004, p. 84). Neste contexto, a autora procura explicar que o desempenho superior de uma organização é regido pela flexibilidade e agilidade que ela demonstra em reconfigurar seus processos, utilizando os recursos excedentes com objetivo de acompanhar e criar as mudanças no mercado. Assim, pode-se afirmar que o declínio e a recuperação do desempenho empresarial são um processo holístico que envolve aspectos econômicos, financeiros, estratégicos e humanos, desencadeados por uma sequência de acontecimentos e espalhados numa linha de tempo variável, tendo como inputs fatores relacionados ao ambiente interno e externo à organização. Posicionamento Estratégico O Modelo das Cinco Forças desenvolvido por Michael Porter (1979) é uma ferramenta de análise estratégica que destina-se ao estudo da competição entre as empresas para, a partir daí, daí definir qual estratégia será adotada, garantindo um posicionamento estratégico no mercado e aumentando suas chances de auferir maiores lucros. Segundo Porter (1989), em qualquer indústria existem cinco forças competitivas que determinam as regras da concorrência: entrada de novos concorrentes, a ameaça de substitutos, o poder de negociação dos compradores, o poder de negociação dos fornecedores e a rivalidade entre os concorrentes existentes. As forças mais competitivas determinam o lucro potencial máximo de uma setor industrial e, portanto, são mais importantes na formulação estratégica. Tais forças são melhor visualizadas na figura 2: Entrantes Potenciais Ameaça de novos entrantes Poder de Negociação dos Fornecedores Concorrência na Indústria Fornecedores Poder de Negociação dos Compradores Rivalidade entre empresas existentes Compradores Ameaça de serviços ou produtos substitutos Substitutos Figura 2: Cinco Forças Competitivas Fonte: Porter, 1989 14 De acordo com Porter (1989), o vigor de cada uma das cinco forças competitivas é uma função da estrutura industrial e seus elementos importantes são: Barreiras de entrada: economias de escala, diferenças de produtos patenteados, identidade de marca, custos de mudança, exigências de capital, acesso à destruição, vantagens de custo absoluto (curva de aprendizagem, acesso a insumos necessários, projeto de produtos de baixo custo), política governamental e retaliação esperada. Determinantes da rivalidade: crescimento da indústria, custos fixos, excesso de capacidade crônica, diferença de produtos, identidade de marca, custos de mudança, concentração e equilíbrio, complexidade informacional, diversidade de concorrentes, interesses empresariais e barreiras de saída. Determinantes do poder do comprador: alavancagem de negociação e sensibilidade ao preço. Determinantes da ameaça de substituição: desempenho do preço relativo dos substitutos, custos de mudança e propensão do comprador a substituir. Determinantes do poder do fornecedor: diferenciação de insumos, custos de mudança dos fornecedores e das empresas na indústria, presença de insumos substitutos, concentração de fornecedores, importância do volume para o fornecedor, custo relativo a compras totais na indústria, impacto dos insumos sobre custo ou diferenciação e ameaça de integração para frente em relação à ameaça de integração para trás pelas empresas na indústria. Indústrias atraentes têm ameaças baixas de entrada, ameaças baixas de rivalidade, ameaças baixas de substitutos, ameaças baixas de fornecedores poderosos, e ameaças baixas de compradores poderoso. É importante mencionar que apesar estrutura industrial ser relativamente estável, ela pode se modificar com o passar do tempo à medida que uma indústria se desenvolve, podendo influenciar de maneira positiva ou negativa a rentabilidade da indústria. Assim sendo, o objetivo da empresa é encontrar uma posição no setor onde possa melhor se defender dessas forças ou influenciá-las. REFERÊNCIAS ADIZES, I. Os ciclos de vida das organizações: como e por que as empresas crescem e morrem e o que fazer a respeito. São Paulo: Pioneira, 1990. AROGYASWAMY, K. e YASAI-ARDEKANI, M. Organizational turnaround: understanding the role of cutbacks, efficiency improvement, and investment in technology. IEEE Transactions on Engineering Management, n. 44, p. 3-11, 1997. BIBEAULT, D. 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