Tatiana Bastos Neves Moreira
POLITRAUMATISMO NA CRIANÇA
Politraumatismo
 Definição:
Conjunto de alterações causadas por um agente físico,
de forma intencional ou acidental. É caracterizado por
lesões acometendo mais de um órgão.
Politraumatismo na criança
 Introdução
 Um dos mais graves problemas de saúde pública
 Morbidade significativa após lesões- incapacidade
 No Brasil, causas externas representam a maior porcentagem de





óbitos na faixa de 5 a 19 anos
Dezoito mil mortes por ano
Causas externas de óbito ganham maior importância à medida que
um país se desenvolve
Lactentes, pré-escolares: acidentes domésticos, maus tratos,
acidentes automobilísticos
5-14 anos: acidentes automobilísticos, afogamentos
15-19 anos: homicídios, suicídios, acidentes automobilísticos
Politraumatismo na criança
 Mecanismos que levam à morte envolvem:
 Comprometimento da via aérea
 Choque hipovolêmico
 Acometimento do SNC
 Trauma torácico ou abdominal com lesão grave de um ou mais
órgãos
Politraumatismo na criança
 Atendimento Pré-hospitalar:
 Prognóstico depende de um pronto e apropriado serviço de
emergência, com o atendimento pré-hospitalar e hospitalar
trabalhando de modo integrado
 Dificuldades:


Sistemas de resgate desenvolvidos para adultos
Equipamentos pré-hospitalares inadequados para atender crianças
 Deve ser iniciado no próprio local do acidente pelas equipes de
resgate
 1ª. hora de atendimento fator prognóstico
 Avaliações iniciais inadequadas 30% das mortes precoces
Atendimento à criança politraumatizada
 Princípios da ressuscitação – Suporte Avançado de Vida em Pediatria
(PALS) – ABC do suporte básico de vida:
 Atenção para a via aérea (Airway)
 Respiração e ventilação (Breathing)
 Circulação e controle de hemorragias (Circulation)

Disability (incapacidade)
 Exposure (exposição)
Atendimento à criança politraumatizada
 Indicações de transporte para um hospital especializado em trauma
1- Trauma grave acometendo mais de um sistema orgânico
2- Necessidade ou potencial necessidade de ventilação mecânica ou O2
3- Instabilidade cardiovascular ou sinais de choque
4- TCE grave: alteração ou oscilação do nível de consciência, afundamento ou fratura de
crânio aberta, alteração aguda no exame neurológico, fratura maxilofacial, sinais de
HIC
5- Necessidade de intervenção cirúrgica
6- Necessidade de transfusão sanguínea
7- Suspeita de trauma intra-abdominal
8- Suspeita de lesão medular
9- Fratura de osso longo ou fratura complexa, amputação ou suspeita de
comprometimento neurovascular de uma ou mais extremidades
10- Necessidade de tratamento em unidade de cuidados intensivos pediátrica
Atendimento à criança politraumatizada
 Sistemas de escore de trauma
 ISS- 1974
 TS- 1981
 RTS- 1987
 PTS- 1987
 SCG e SCG modificado
Escore de Trauma Pediátrico (PTS)
Parâmetro Clínico
Escore
Peso (kg)
>20
2
10-19
1
<10
-1
Via Aérea
Parâmetro Clínico
Escore
Sistema Nervoso
Central
Acordado
2
↓ nível consciência
1
Coma ou descerebração
-1
Ferimento aberto
Normal
2
Sustentável
1
Não sustentável
-1
Pressão Arterial
Sistólica (mmHg)
Nenhum
2
Pequeno
1
Grande ou penetrante
-1
Ossos
>90
2
Sem lesão
2
50-89
1
Fratura simples
1
<50
-1
Fratura exposta ou
múltipla
-1
Escala de Coma de Glasgow (SCG)
Melhor resposta
SCG
SCG modificado
Escore
Ocular
Não abre os olhos
Não abre os olhos
1
Abre c/ estímulo doloroso
Abre c/ estímulo doloroso
2
Abre c/ comando verbal
Abre c/ comando verbal
3
Abre espontaneamente
Abre espontaneamente
4
Nenhuma resposta verbal
Nenhuma resposta vocal
1
Sons incompreensíveis
Inconsolável, agitado
2
Palavras inapropriadas
Consolável, inconsistente,
gemente
3
Conversação confusa
Choro, consolável, interações
inapropriadas
4
Orientada (adequada)
Sorri, interage com os sons
5
Nenhuma resposta motora
Nenhuma resposta motora
1
Extensão ao estímulo doloroso
Extensão ao estímulo doloroso
2
Flexão ao estímulo doloroso
Flexão ao estímulo doloroso
3
Retira ao estímulo doloroso
Retira ao estímulo doloroso
4
Localiza o estímulo doloroso
Localiza o estímulo doloroso
5
Verbal
Motora
Particularidades da criança politraumatizada em
relação ao adulto
 Menor massa corpórea
 Proximidade maior entre os órgãos
 Superfície corpórea maior em relação ao seu peso
 Em lactentes e pré-escolares, a calcificação não é completa
 Dor, medo e medidas terapêuticas tornam a criança mais instável
psicologicamente
 Doses de drogas, volume de líquidos ou tamanho de sondas são
fatores de confusão e atraso
Fita ou escala de Broselow
Avaliação e Tratamento da criança
politraumatizada
 Estabilização inicial- 2 etapas:
 Abordagem primária inicial
 Garantir via aérea (A)
 Assegurar respiração (B)
 Restaurar a circulação e controlar hemorragias (C)
 Abordagem secundária
 Avaliação do estado neurológico (D)
 Exposição do restante do corpo, aquecimento e pesquisa de outros ferimentos
(E)
Via Aérea (A)
 Prioridade inicial: manter via aérea pérvia
 TCE é a forma mais comum de trauma nas crianças (lesões faciais
são frequentes)
 Considerações especiais sobre abordagem da via aérea no trauma
pediátrico:



Possibilidade de lesão na coluna cervical
Probabilidade de TCE
Provável presença de estômago cheio
Estabilização da coluna cervical
Estabilização da coluna cervical
Via aérea (A) e respiração (B)
 Sistemas de oferta de oxigênio
 Máscara de oxigênio
 Tenda facial
 Capacete ou capuz de oxigênio
 Tenda de oxigênio
 Cânula nasal
Cânulas orofaríngea e nasofaríngea
Via Aérea (A) e respiração (B)
 Oximetria de pulso
 Desobstrução mecânica da via aérea
 Ventilação espontânea inadequada mesmo com vias aéreas pérvias
 VENTILAÇÃO ASSISTIDA
 Ventilação com bolsa- máscara
 Máscaras faciais
 Ressuscitador manual auto-inflável
Ressuscitador manual auto-inflável
Intubação Orotraqueal
Via aérea (A) e respiração (B)
 Intubação orotraqueal
 Intubação nasotraqueal
 SRI






Preparo
Posicionamento/ aspiração/ pré-oxigenação
Atropina 0,1-0,5mg/kg
Analgesia + sedativo + relaxante muscular
IOT
Ventilação / confirmar posição da cânula
Sedativos, analgésicos e relaxantes musculares usados na
SRI
AGENTE
DOSE EV (mg/kg)
VANTAGENS E
DESVANTAGENS
Midazolam
0,05-0,2
Propriedade amnésica
Pode causar hipotensão
Cetamina
1-2
Efeito simpático (↑ FC, PA)
↑ PIC, ↑ secreção VA
Tiopental
1-5
Propriedade neuroprotetora
Pode causar hipotensão
Propofol
2-3
Propriedade neuroprotetora
Pode causar hipotensão
Etomidato
0,2-0,3
Propriedade neuroprotetora
Preserva estabilidade hemodinâmica
Fentanil
0,002-0,005
Poucos efeitos hemodinâmicos
Rigidez de parede torácica
Succinilcolina
1-2
Ação rápida e curta
↑ PIC, ↑ PIO, hiperpotassemia
Rocurônio
0,6-1,2
Ação rápida, duração intermediária
Efeito mínimo sobre FC e PA
Pancurônio
0,1-0,2
Ação em 70-120seg
Ação vagolítica (taquicardia)
Vecurônio
0,1-0,2
Ação em 70-120seg, duração 30-90min
Sem ação vagolítica
Intubação Orotraqueal
 Laringoscópio


Lâminas retas
Lâminas curvas
 Tubos traqueais (TT)


sem cuff
Com cuff
 Tamanhos de TT:
 RN: 2,5-4,0
 Lactentes-2 anos: 4,0- 4,5
 > 2anos: = idade (anos) /4 + 4
Profundidade de inserção do TT em cm:
Idade (anos)/2 + 12 ou no. TT x 3
Via aérea (A) e respiração (B)
 No insucesso da IOT:
 Máscara laríngea
 Cricotireoidotomia percutânea
Via aérea (A) e respiração (B)
 Lesão de medula espinhal
 Mortalidade de 42% em crianças
 Manter imobilização cervical durante os procedimentos
 Colar cervical rígido ( ou frascos de soro, rolos de toalha ou isopor)
 Radiografia normal não exclui lesão
Via aérea (A) e respiração (B)
 Lesões graves de VA:
 Fratura de laringe ou traquéia
 Pneumotórax/ Pneumotórax hipertensivo
 Pneumotórax aberto
 Lesão de grandes vasos ou estruturas do mediastino
Circulação (C)
 Avaliar:
 Pulso
 Perfusão periférica
 PA
PAS em RN: > 60mmHg
PAS em 1-12m: >70mmHg
PAS 1-10anos: > 2 x (idade em anos) + 70mmHg
PAS > 10anos: > 90mmHg
Classificação do choque hemorrágico em pacientes
pediátricos vítimas de trauma (ACS, ATLS, 1997)
Sistema
Classe I (perda <
15% volemia)
Classe II (perda
15-25% volemia)
Classe III (perda
26-39% volemia)
Classe IV (perda >
40% volemia)
Cardiovascular
FC normal ou
levemente ↑
Pulso periférico
normal
PA normal
Ph normal
Taquicardia leve
Pulso periférico
pode estar ↓
PA normal
Ph normal
Taquicardia
significante
Pulso periférico
filiforme
Hipotensão
Acidose
Taquicardia
intensa
Pulso central
filiforme
Hipotensão grave
Acidose intensa
Respiratório
FR normal
Taquipnéia leve
Taquipnéia
moderada
Taquipnéia intensa
SNC
Ansioso
Responsivo
Irritado/ confuso
Responsivo
Irritado/letárgico
Resposta ↓ dor
Letárgico/comato
so
Pele
Extremidades
quentes e róseas
Extremidades frias
Rendilhada
Extremidades frias
Rendilhada/ pálida
Extremidades frias
Cianose
Renal
Débito urinário
normal
Oligúria
Densidade ↑
Oligúria
Uréia ↑
Anúria
Circulação (C)
 Choque hemorrágico na criança – causas:
 Lesão esplênica ou hepática
 Fraturas ósseas com lesão vascular
 Hemotórax
 Fraturas pélvicas
 Hemorragia intracraniana
Circulação (C)
 Tratamento do choque- IMEDIATO E VIGOROSO
 Controle de hemorragias externas
 Acesso vascular rápido



Acesso venoso periférico
Dissecção venosa ou inserção periférica de cateter em veia central
Acesso intra-ósseo
 Reposição volêmica agressiva


Soluções cristalóides isotônicas (SF0,9% ou Ringer)- 20ml/kg
Reavaliar: perfusão, FC, débito urinário, nível de consciência, PA
 Concentrado de hemácias – 10-15ml/kg
Erros mais comuns na ressuscitação do paciente
pediátrico com trauma (ABC):
 Falha em abrir e manter a via aérea pérvia
 Falha em fornecer oxigenação e ventilação apropriadas
 Falha em fornecer ressuscitação volêmica adequada
 Falha em reconhecer e tratar uma hemorragia
Abordagem secundária (D e E)
 Avaliação neurológica com pesquisa de déficits
 Exame físico completo
 Plano para posteriores estudos diagnósticos
 Radiografias do tórax, pelve e coluna cervical lateral
 Ultrassonografia de abdome
 Tomografia computadorizada
CASO CLÍNICO

Criança de 34 meses foi vítima de queda do tanque de lavar roupas
enquanto brincava. Imediatamente após o acidente, foi socorrida pelos
familiares e encontrava-se consciente. Queixava-se de dor torácica e
dificuldade para falar e respirar. Nesse momento, já havia sido notado
um inchaço na região do pescoço. Uma hora após o acidente, no
atendimento em pronto-socorro, encontrava-se com intensa dificuldade
respiratória (cianose em ar ambiente, estridor inspiratório, taquidispnéia
intensa e gemido). Mostrava-se sonolenta, apresentava escoriação em
terço inferior do esterno e enfisema subcutâneo que acometia o tórax, a
região cervical e estendia-se até a face. Devido a insuficiência
respiratória, optou-se por realizar intubação traqueal. Após o
procedimento, a radiografia de tórax evidenciava contusão pulmonar à
direita e pneumomediastino bilateral. A criança foi então submetida a
drenagem torácica, e iniciou-se expansão com solução fisiológica devido
à má perfusão periférica, pulsos periféricos finos e taquicardia (FC=
170bpm). Após os cuidados iniciais foi transferido para a UTI pediátrica
do Hospital Universitário da Universidade de São Paulo.
CASO CLÍNICO
 Na admissão na UTI apresentava intenso desconforto respiratório,
palidez cutâneo-mucosa e extenso enfisema subcutâneo que
acometia desde o couro cabeludo até raiz das coxas bilateralmente.
Os sinais vitais mostravam PA= 130x82 (M=104); FC=144bpm;
FR=25irpm; Tax= 37,4oC; SO2= 70% em FiO2=100%. O exame
segmentar mostrava drenagem torácica com drenos tubulares
bilateralmente que não borbulhavam e não oscilavam, ruídos
respiratórios diminuídos com estertores crepitantes à direita. Do
ponto de vista hemodinâmico, encontrava-se com bulhas rítmicas e
abafadas, tempo de enchimento capilar lentificado e pulsos
periféricos finos. A conduta inicial foi de conectar o paciente ao
ventilador mecânico, estabelecer um acesso venoso central, iniciar
reposição volêmica, sedação, analgesia e bloqueador H2 para
profilaxia da lesão de mucosa gástrica. Foi submetido a
ultrassonografia e radiografia simples de abdome, ecocardiograma e
tomografia de crânio, que foram normais.
CASO CLÍNICO

A tomografia de tórax mostrou um deslocamento posterior da
traquéia e brônquios fontes. O brônquio principal esquerdo
mostrava-se comprimido próximo à carina, volumoso
pneumomediastino em mediastino anterior e parênquima pulmonar
apresentando consolidações segmentares e broncogramas aéreos,
principalmente à direita, drenos torácicos em espaço pleural
aparentemente virtual e importante enfisema subcutâneo. Foi
solicitada uma avaliação endoscópica da via aérea, que evidenciou a
presença de sangue em via aérea.
CASO CLÍNICO
 Após estabilização inicial, nova endoscopia respiratória mostrou
ruptura parcial do brônquio principal esquerdo próximo à carina e
traqueobronquite moderada. Toracotomia foi realizada no quarto
dia de internação devido a preocupação de que o processo infeccioso
pudesse interferir com a cicatrização da sutura, favorecendo a
estenose da anastomose. O paciente estava febril desde o primeiro
dia de hospitalização, e os valores de proteína C reativa eram de 96
no primeiro dia e 131 no quarto dia, apesar de antibioticoterapia
(clindamicina e ceftriaxone). Os achados cirúrgicos foram
compatíveis com a endoscopia, e a ruptura quase completa do
brônquio principal esquerdo foi reparada.
CASO CLÍNICO
 O paciente foi mantido sob ventilação mecânica com necessidades
ventilatórias progressivamente menores; os drenos torácicos não
evidenciaram a presença de fístula, e houve regressão do
pneumomediastino e do enfisema subcutâneo. Dois dias após o
procedimento cirúrgico, o paciente foi extubado. Os drenos
torácicos foram retirados 24 horas após a extubação. Reavaliação
endoscópica no 14º. dia após a cirurgia mostrou uma redução do
lúmen do brônquio principal esquerdo, porém sem repercussão
clínica. O paciente recebeu alta da UTI 24 dias após internação e
segue em acompanhamento ambulatorial.
OBRIGADA!
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