Aprendizagem sem fronteiras Learning without borders
Ensinar para e Aprender com jovens em privação de Liberdade
Eixo 2: Formação de professores e cultura digital
Willian Lazaretti da Conceição 1
A pesquisa de doutorado em andamento busca compreender como as trajetórias de
vidas dos professores influenciam nos modos de ser e fazer no exercício da docência
para adolescentes em privação de liberdade. Por meio das histórias de vida, buscamos
apresentar aproximações com as histórias dos adolescentes, visando identificar aspectos
semelhantes que colaboram para e na relação entre professor e aluno em conflito com a
lei.
A análise histórica revela que a violência e o desvalor em relação a crianças e
jovens são tão antigos quanto à chegada dos europeus ao Brasil, uma vez que as
crianças nascidas de relações entre negras, índias e brancos foram frutos da violência,
da ausência de dignidade, da expropriação de corpos. Foi nesse contexto que
começaram a aparecer em solo brasileiro as primeiras crianças rejeitadas, tratadas como
objetos e desassistidas.
No Brasil cada estado é responsável pela execução de medidas socioeducativas de
internação e semiliberdade e devem atender as especificações da Lei do Sistema
Nacional de Atendimento Socioeducativo. No Estado de São Paulo o atendimento a
adolescentes que estão em cumprimento de medida socioeducativa de privação de
liberdade é de responsabilidade de uma instituição governamental intitulada Fundação
Centro de Atendimento Socioeducativo ao Adolescente (Fundação CASA). Esta
instituição é responsável pela execução das medidas de semiliberdade e de internação
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Professor Assistente da Universidade do Estado da Bahia, Departamento de Educação – Campus
Guanambi - Bahia – e-mail: [email protected]
Aprendizagem sem fronteiras Learning without borders
para jovens com idade entre 12 e 21 anos incompletos em todo o estado de São
Paulo/Brasil.
A metodologia utilizada é da História Oral de vida, e participam deste estudo dez
professores e professoras que foram convidados a conceder uma entrevista acerca da
história de vida. Sendo que, neste artigo foi dado ênfase na narrativa de uma professora.
De acordo com o referencial utilizado, essa metodologia é dividida em três etapas: a
transcrição, a textualização e a transcriação.
A textualização é um texto corrido, que contem somente as falas do entrevistado
podendo ser em ordem cronológica dos fatos ou não, além de serem extraídos os vícios
de linguagem e repetições de palavras. A segunda seria a textualização, que
corresponderia à uniformização do texto, através da supressão das perguntas feitas pelo
entrevistador, que agora passam a fazer parte de uma narrativa linear. Este processo tem
como ponto fundamental a mudança de códigos. O oral passa agora a ser grafado e é
nesta passagem que se assenta a discussão em torno nas possibilidades da
“transcriação”.
É na transcriação, que o pesquisador tem sua maior intervenção, pois a leitura de
um texto simplesmente transcrito não permite a ebulição de sentimentos que um texto
literário, por exemplo, traz à tona. Aliado a gravador de áudio, foi utilizada uma câmera
filmadora, que permite captar expressões decorrentes das falas, denunciando sensações
de cada período narrado.
Consideramos tal metodologia relevante, pois permite elucidar períodos e fatos
que marcaram as vidas desses professores, e que talvez nos permitam melhor
compreender as especificidades nas relações que estabelecem com os alunos, pois
muitos possuem alternativas, convites para atuarem em outros espaços com melhor
remuneração e até mais próximos das próprias residências, mas optam por permanecer
no trabalho com adolescentes em conflito com a lei.
Uma professora relata que iniciou sua carreira tarde, que antes trabalhava em
empresas devido ao curso de contabilidade que havia feito, quando na verdade tinha a
intenção de fazer medicina, mas como a família não possuía condições e arcar com as
despesas, não foi possível. Começou atuando como professora substituta, e permaneceu
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por seis meses apenas, e logo iniciou o trabalho com os jovens em privação de
liberdade. Relata que no primeiro dia que fizeram planejamento estava assustada com
ambiente, mesmo sem ter tido contato com os jovens. Menciona que gosta de dar aula
para eles, e que as vezes ter de ser mais que professora, pois já se percebeu tendo
conversas como se fosse mãe, outrora como se fosse médica e assim acredita que vai
conseguindo a confiança e ao mesmo tempo a dedicação dos alunos.
Quando ela dizia para outras pessoas que trabalha na Fundação as pessoas tem
uma ideia distorcida, porque “conosco professores ele possuem o maior respeito, e eles
mesmos cobram respeito entre eles”, e menciona que em cursos que realiza outros
professores comentam que está cada vez mais difícil de lecionar.
Ao analisar a história de vida dessa professora, alguns indícios dos fatores que
colaboraram para a sua permanência nesse contexto estão relacionados à violência,
principalmente a violência física que assola as escolas públicas, ao respeito mutuo
estabelecido na relação professor-aluno, mas também, denota uma complementaridade a
sua própria vida, pois o diálogo que estabelece com os jovens também promove
sensações de conforto para a professora que tem apenas um filho e que devido as
atribuições do cotidiano possui pouco tempo para conversarem.
A professora se envolve e se emociona com os avanços dos jovens, demonstrando
afetividade e atenção pelos mesmos, ação difícil quando se está na rede pública com
salas superlotadas, impossibilitando que vínculos positivos entre professores e alunos
sejam estabelecidos com maior frequência, transformando as práticas escolares em
reprodução de tarefas, e pouca construção do conhecimento.
O ensino formal para estes adolescentes funciona como um espaço de conquista
de direitos que anteriormente foram negados. Direito a atenção, ao respeito, ao
acolhimento, ao amor, pois o corpo docente lida com estes adolescentes com um olhar
que os reconhece como sujeitos de direitos e para, além disso, compreendem a condição
peculiar de desenvolvimento que perpassam, entendendo as angustias, as dúvidas e as
condutas por vezes inadequadas.
É possível refletir acerca de um atendimento socioeducativo balizado numa educação
cujo prevaleça o direito à existência, à dignidade, ao reconhecimento, à liberdade e à
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participação na vida social, coletiva e publicamente. Trata-se de possibilidades e alternativas
de um existir humanamente, de pronunciar o mundo e, assim modificá-lo. De certo não haverá
uma estratégia adequada, unificada e padronizada, pois a prática educativa, assim como toda
prática social, traz em seu bojo complexidades e singularidade por serem fenômenos
especificamente humanos.
Palavras-chave: Educação escolar; privação de liberdade; profissionalidade docente;
História oral de vida; Respeito.
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