Boletim Econômico – Edição nº 55 – fevereiro de 2015 Organização: Maurício José Nunes Oliveira – Assessor econômico Crise fiscal do governo acontece após 18 anos Déficit primário é primeiro registrado desde 1997 e deve alcançar R$ 20 bilhões com contas de estados e municípios 1 O Rombo nas contas públicas O governo federal fechou 2014 com o primeiro rombo nas contas do chamado governo central, que inclui o desempenho do Tesouro Nacional, Previdência Social e Banco Central, em toda a série histórica, iniciada em 1997. Apesar do superávit de R$ 1,03 bilhão em dezembro, o buraco no ano chegou a R$ 17,2 bilhões. O primeiro déficit fiscal em 18 anos será “ampliado” com a inclusão do resultado das contas de estados e municípios. O rombo deve chegar a R$ 20 bilhões. O inédito déficit fiscal resultou de “uma frustração de receitas combinado a um aumento das despesas federais”. Esta foi a base da estratégia de política econômica do primeiro mandato da presidente Dilma Rousseff: desonerações de impostos a alguns setores e aumento de gastos como forma de estímulo ao crescimento da economia. (PIB). O rombo fiscal de 2014 altera também a forma como se convencionou chamar a poupança para pagar os juros da dívida pública nas últimas duas décadas. Em vez de “superávit primário”, o dado do ano passado constituiu um déficit primário. Com menos recursos canalizados para essa poupança, o endividamento aumentou. A dívida bruta, indicador definido como “principal” pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy, teve um forte aumento no ano passado: saltou do equivalente a 56,7% do PIB no fim de 2013 para mais de 63% do PIB. Reverter esta deterioração das contas públicas é a principal missão do segundo mandado da Presidente Dilma. Vai ser necessário buscar credibilidade junto ao mercado para um novo arrocho da política fiscal Desde 2012, o governo entrega uma economia de recursos inferior ao prometido. Parte da piora nas contas públicas nos últimos meses do ano passado escancara a correção das “pedaladas fiscais”. Sob investigação do 2 Tribunal de Contas da União (TCU) e do Ministério Público Federal (MPF), o governo iniciou em setembro um processo de “despedalada”. Isto é, começou a ser corrigidos os atrasos nos repasses do Tesouro aos bancos, como forma de melhorar artificialmente as despesas federais. O caso mais flagrante de “despedalada” nas contas públicas ocorreu na Previdência Social. Um dos principais focos de atrasos do Tesouro foi com as aposentadorias. Como comprovou o TCU, o Tesouro atrasou os repasses de recursos ao INSS, que, por sua vez, adiou a transferência do dinheiro aos bancos. Sustentado nesses atrasos, o governo manteve até novembro uma projeção de déficit da Previdência de R$ 40 bilhões. Apenas no limite corrigiram essa projeção para R$ 49 bilhões negativos. Quando o resultado da previdência social foi divulgado, apresentou-se um rombo de R$ 56 bilhões. O rombo oficial terminou sendo 30% superior ao previsto originalmente e foi registrado graças à correção dos atrasos. O resultado fiscal só não foi pior porque o governo ampliou o uso dos dividendos pagos pelas empresas estatais ao Tesouro. Em 2014, as estatais pagaram R$ 18,9 bilhões em dividendos, volume 9,5% superior ao do ano anterior. O BNDES foi o principal responsável, ao recolher R$ 9 bilhões ao Tesouro, sendo seguido pela Caixa, que pagou R$ 4,3 bilhões. O Tesouro também tomou o dobro de dividendos da Petrobras entre 2013 e 2014 - foram R$ 2 bilhões no ano passado. 3 Grupo técnico é criado para acompanhamento de gastos públicos O governo federal instituiu o Grupo de Trabalho Interministerial para Acompanhamento de Gastos Públicos (GTAG) do governo federal. O grupo terá o objetivo de propor medidas para melhoria da execução orçamentária e financeira de 2015, contribuindo para o alcance das metas fiscais; medidas para melhoria da qualidade do gasto público, de sua eficiência e eficácia; e aperfeiçoamentos em políticas públicas, ações, projetos, programas temáticos e programas de gestão, manutenção e serviços do governo federal. Entre outras questões, o grupo deve fazer uma análise dos restos a pagar, que são as despesas empenhadas, mas não pagas, em um exercício financeiro. Os restos a pagar estão em R$ 226 bilhões. Nesse estoque de restos a pagar há, por exemplo, ciclos de obras, principalmente do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) que não necessariamente se paga este ano. O GTAG será composto por representantes do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, que coordenará o grupo e exercerá as funções de secretaria executiva; Casa Civil da Presidência da República; Ministério da Fazenda e Controladoria-Geral da União. Caberá ao GTAG selecionar órgãos, ações, projetos ou programas que serão objeto de análise; criar subgrupos temáticos destinados a detalhar a análise por órgão, grupo de órgãos ou programas específicos; convidar representantes de órgãos e entidades públicas para participar e apoiar a execução dos trabalhos, inclusive nos subgrupos; e requisitar dos órgãos executores as informações necessárias à efetivação de seus objetivos. 4 Resultado fiscal fica R$ 100 bi inferior ao prometido em 2014 Apesar de todas as manobras contábeis, as contas do governo fecharam com um resultado R$ 100 bilhões menores do que o prometido pela equipe econômica em 2014. O governo saiu de uma meta de R$ 80 bilhões para as contas do chamado governo central fixada para 2014 para um déficit de R$ 20 bilhões efetivamente registrados. Os dados divulgados indicam que o governo conseguiu uma margem de manobra de R$ 161,74 bilhões para administrar o resultado negativo nas contas do governo no passado. Essa é a soma das despesas pagas do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) - R$ 57,69 bilhões - e das desonerações tributárias, de R$ 104,04 bilhões em 2014. Com a flexibilização da meta fiscal prevista na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), aprovada pelo Congresso Nacional no final do ano passado, o governo poderá abater esse volume de gastos da meta. Foi essa mudança que garantiu à presidente Dilma Rousseff cumprir oficialmente a meta fiscal para fins legais, mesmo entregando um déficit primário - o primeiro da série histórica no acumulado do ano. A lei deu carta branca para o governo - que poderia ter registrado déficit de R$ 80 bilhões e ainda assim cumprir a meta do ano passado. Com o déficit de R$ 20 bilhões registrado em 2014 nas contas do governo central, o governo consumiu R$ 100 bilhões dessa margem de manobra de R$ 161,74 bilhões aprovada pela mudança na LDO, sobrando R$ 61,74 bilhões. O resultado fiscal de 2014 ainda está pendente, porque o governo terá de administrar uma eventual necessidade de corrigir passivos antigos, caso o relatório do Tribunal de Contas da União (TCU) sobre manobras contábeis seja aprovado. 5