Responsabilidade
médico-legal
Alguns aspectos práticos
Paulo Sancho
Advogado
www.sanchoeassociados.com
[email protected]
Maio de 2009
Os médicos são uns privilegiados!




Por um acto médico têm direito a 4 acções
distintas:
Processo penal, pelo cometimento de um crime,
por exemplo, homicídio negligente ou ofensas à
integridade física;
Processo civil, para indemnização dos danos que
daquele acto possam ter decorrido;
Dois processos disciplinares – um perante a
Ordem dos Médicos e outro pelo CHLN/IGAS.



O anestesista tem uma relação horizontal com o
cirurgião, o mesmo é dizer que está em pé de igualdade
e tem total autonomia;
Não está dependente do cirurgião, técnica ou
cientificamente, nem sujeito a qualquer grau de
hierarquia;
A regra no relacionamento entre especialistas de áreas
diferentes é a da confiança, que só deve ser
excepcionada quando houver razões fundadas de que o
outro não segue as regras de cuidado adequadas.
1 - O “novo” CHLN, E.P.E. e o Regime Legal da
Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado



O CHLN (ainda) é uma pessoa colectiva de direito público;
A sua actividade está, portanto, sujeita ao regime legal decorrente
da Lei n.º 67/2007 de 31.12 (alterada pela Lei n.º 31/2008 de
17.07), que aprovou o Regime da Responsabilidade Civil
Extracontratual do Estado e Demais Entidades Públicas.
Este diploma aplica-se aos danos causados pelo Estado e
demais pessoas colectivas de direito público resultantes do
exercício da função administrativa - n.º 1 do artigo 1.º
2 - Os diferentes vínculos contratuais dos médicos do
CHLN implicam diferenças na aplicação do regime da
responsabilidade civil?
Não
A Lei n.º 67/2007 aplica-se:

Aos funcionários e agentes públicos do CHLN, por danos decorrentes de
acções ou omissões adoptadas no exercício das funções e por causa desse
exercício;

Aos demais trabalhadores ao serviço do CHLN;

Às pessoas colectivas de direito privado e respectivos trabalhadores, por acções
ou omissões que adoptem no exercício de prerrogativas de poder público ou
que sejam reguladas por disposições ou princípios de direito administrativo.
4 – Quem assume a responsabilidade pelos danos
causados ?
A responsabilidade pelos erros cometidos por um médico do
CHLN pode ser
 Assumida em exclusivo pelo CHLN;
 Assumida solidariamente (i.e., em conjunto) pelo CHLN e
pelo médico que praticou o facto ilícito – sem prejuízo do
direito de regresso do Hospital sobre o médico (direito de
exigir a restituição do que foi pago).

Este direito de regresso é obrigatório quando a culpa do médico é
grave.
5 – É suficiente o seguro da OM ?

O Seguro de Responsabilidade Civil oferecido pela Ordem dos Médicos
abrange todos os médicos, independentemente do seu regime de trabalho
(contrato de trabalho em funções públicas – ex-funcionários públicos -,
contratados e prestadores de serviços individuais);

Este seguro tem um capital de € 15.000,00 (Quinze Mil Euros);

Considerando as recentes decisões dos nossos Tribunais, o aumento da
litigiosidade e os crescentes custos inerentes a um processo judicial, o reforço
da apólice disponibilizada pela OM poderá ser uma medida sensata (capital
de € 200.000 significa cerca de €150/ano).

As apólices individuais que cada médico tem cobrem os actos por eles
praticados no exercício de funções no CHLN.
O Seguro de Responsabilidade Civil das Sociedades

O Seguro de Responsabilidade Civil individual não cobre a
responsabilidade das sociedades que prestem serviços médicos;

Os médicos que têm sociedades através das quais praticam actos
médicos devem ter um seguro de responsabilidade civil para a
própria sociedade, já que esta é uma pessoa jurídica diferente do
médico, ainda que este seja o seu único sócio.

Tal não obsta a que a sociedade tenha direito de regresso contra
o médico que tenha praticado actos sem respeito pelas leges artis.
6 – Que Responsabilidade pode ser exigida aos
Médicos Internos?
• Internos do 1.º e 2.º Ano
• Internos do 3.º ano e seguintes
Por terem autonomia, a sua responsabilização
é admitida, conquanto estejam ainda em
formação e, portanto, sob orientação directa e
permanente de um colega graduado.
Se o erro incidir num acto da especialidade
para o qual o Interno ainda não possua aptidão
e esse acto resultar de uma instrução de Colega
graduado pode ser este apenas o responsável
pelo acto. Se o interno violar um dever de
cuidado, também é responsável.
Não são responsabilizados pelos seus
erros, salvo se tomarem decisões
clínicas à revelia do Orientador ou em
frontal contradição com a indicação
deste
7 - Quem assume a responsabilidade quando
os médicos internos actuam sozinhos?

Se o acto do Interno é praticado com culpa leve, no exercício das suas funções e
por causa desse exercício, a responsabilidade é exclusiva do CHLN – vide artigo
7º da Lei 67/2007 de 31 de Dezembro.

Nas situações em que o interno é colocado no serviço sem o acompanhamento
devido pelo médico que deveria estar a supervisionar o trabalho desse interno, a
responsabilidade é exclusiva do Estado (CHLN) uma vez que, sem prejuízo da
demonstração da existência de dolo ou culpa grave, se presume a culpa leve
sempre que tenha havido incumprimento dos deveres de vigilância por parte do
orientador ou de quem o substitua (art.º 10.º Lei 67/2007 de 31 de Dezembro).

Caso o Interno do ano comum desrespeite estas regras e decida actuar sozinho
assume total responsabilidade pelas consequências do acto praticado porquanto
“excedeu o limite das suas funções”.
8 - Quem assume a responsabilidade pelos actos praticados
pelo Interno após o exame final mas antes da assinatura do
contrato de trabalho?

O contrato a termo resolutivo incerto e a comissão de serviço vigoram pelo
período de duração estabelecido para o respectivo programa de
formação médica especializada, incluindo repetições e interrupções e, no
caso das vagas preferenciais, até à efectiva celebração do contrato por
tempo indeterminado (artigo 14º DL 203/2004, de 18 de Agosto).

Por outro lado, nos termos do Código do Trabalho, não é obrigatória a
celebração por escrito do contrato individual de trabalho por tempo
indeterminado.

Assim, se o médico se encontra a prestar serviço no Hospital, o CHLN
poderá ter de assumir a responsabilidade exclusiva ou solidariamente, caso
haja dolo ou culpa grave do trabalhador. (artigo 1º, n.º 4 da Lei 67/2007)
9 - Dever de documentação do processo clínico

O médico, seja qual for o enquadramento da sua acção profissional, deve
registar cuidadosamente os resultados que considere relevantes das
observações clínicas dos doentes a seu cargo.

Há um dever lateral do médico de realizar uma documentação minuciosa e
pormenorizada da sua actividade, cuja violação é passível de o fazer incorrer
em responsabilidade civil.

O médico deve cumprir o dever de documentação em tempo útil, i. e, não
deve deixar passar um intervalo de tempo que possa prejudicar a precisão e
clareza dos concretos factos e dados a registar, havendo uma maior urgência e
exigência de detalhe no registo de actividade durante as cirurgias do que, por
exemplo, numa consulta de rotina.
10 – Dever de documentação do Processo Clínico em caso de
falha no sistema informático

Sem prejuízo do protocolado em cada Hospital, se ocorrer uma falha no
sistema de registo do processo clínico devem os médicos inscrever os dados
numa ficha em papel e procurar obter um registo da falha (print screen?),
juntando-o ao respectivo processo.

Para precaver eventual responsabilidade civil ou disciplinar, será sensato
indicar testemunhas;

Assim que o sistema estiver operacional, o médico deverá inserir os dados
que registou em papel, por forma a manter a integralidade do processo
clínico.
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