CMYK Ciência Editora: Ana Paula Macedo [email protected] 3214-1195 • 3214-1172 / fax: 3214-1155 16 • CORREIO BRAZILIENSE • Brasília, quarta-feira, 3 de setembro de 2014 Os benefícios do suor extra Estudo de antropólogos americanos em tribo indígena do Peru sugere que trabalhar mais que o restante do grupo tem suas vantagens. O esforço pode gerar melhor reputação, o que garante uma série de ganhos indiretos Universidade de Washington/Divulgação Eric Danino/Reuters - 10/4/11 » VILHENA SOARES a vida em comunidade, é muito difícil que o trabalho seja dividido de tal forma que todos tenham de realizar o mesmo esforço sempre. Invariavelmente, uns trabalham mais que outros, e, nem sempre, aqueles com uma carga maior tomam alguma atitude para mudar essa situação. Por que os “explorados” agem assim? Um estudo conduzido por antropólogos dos Estados Unidos sugere que essa situação fornece melhor reputação para esses indivíduos, que acabam tendo uma série de benefícios indiretos. Ou seja, suportar uma carga maior pode ser vantajoso. Para chegar a essa conclusão, publicada recentemente na revista Pnas, os pesquisadores analisaram um grupo de 24 famílias da etnia Quechua, grupo indígena que vive no altiplano do Peru. Essa pequena população foi escolhida por ter uma organização que facilitaria aos autores observar como ocorria a divisão tanto das tarefas quanto dos produtos desse trabalho, compreendendo assim o sistema colaborativo existente ali. Ficou claro que os moradores dependiam muito de ações em grupo, já que algumas famílias viviam em lugares com melhor acesso a água e comida, enquanto outras precisavam recorrer aos vizinhos. Além disso, muitas tarefas necessitavam do engajamento de todos para serem terminadas. Os especialistas se surpreenderam com o fato de que aqueles que contribuíam menos acabavamrecebendoomesmomontante de recursos. “Havia esse pequeno grupo de pessoas que se esforçava muito mais que outras para manter os recursos de sobrevivência da comunidade. Elas estavam sempre presentes nas tarefas e também se empenhavam mais”, conta Henry Lyle, da Universidade de Washington e coautor do trabalho com Eric Smith. Isso levou a dupla a imaginar que poderia haver algum benefício não muito evidente em trabalhar mais que os outros. N Ajudar com as tarefas que são vitais para a sobrevivência dos membros da comunidade pode ser sinal de valor. Uma reputação positiva pode melhorar o apoio a partir de redes sociais” Mulher quechua carrega criança: trabalho em grupo é essencial para a sobrevivência da comunidade indígena peruana Henry Lyle, antropólogo da Universidade de Washington Os dois antropólogos perceberam, então, que os mais dedicados eram tidos pelo resto da comunidade como “trabalhadores” e “confiáveis”. A reputação deles também incluía adjetivos como “generosos”, influentes” e“respeitáveis”. Essa imagem positiva trazia alguns benefícios, notaram os autores, como uma rede de suporte social que acabava garantindo, entre outras consequências, melhores condições de saúde para toda a família. “Uma possível razão é que aqueles que contribuem mais recebem benefícios de reputação, enquanto aqueles que se esforçam menos obtêm custos de reputação. Ajudar com as tarefas que são vitais para a sobrevivência dos membros da variáveis e lembrar que, com o tempo, a história pode mudar. As relações de poder também. Precisamos desconfiar de alguns trabalhos para que possamos sempre entender melhor como as leis funcionam”, completa. Lima ainda acredita que o trabalho possa contribuir para o aprendizado de conceitos já conhecidos. “Esse tipo de estudo se insere em uma ampla tradição de pesquisas sociais que, de tempos em tempos, analisa se os diversos conceitos-chave das múltiplas teorias sociais se mantêm ou se modificam. Em termos científicos, possibilita novas confrontações teóricas e novas dúvidas e inquietações diante dos diferentes cenários de interação social”, explica. comunidade pode ser sinal de valor. Uma reputação positiva pode melhorar o apoio a partir de redes sociais”, analisa Lyle. Ele acredita que o estudo ajuda a entender melhor como funcionam as relações humanas em grupo e a importância das atitudes perante as redes sociais. “Nossos resultados contribuem para os esforços em curso para compreender as forças que moldam a evolução (cultural ou genética) da cooperação.” Tema antigo Para Weber Lima, professor de sociologia no Centro Universitário Instituto de Educação Superior de Brasília (Iesb), o artigo mostra como relações sociais diversas interagem entre si. “O estudo demonstra uma importante correlação entre o status social e os diferentes tipos de relações em ambientes sociais diversos”, diz. No entanto, o especialista, que não participou da pesquisa, diz que não se deve extrapolar os resultados como se fossem uma lei. “Em alguns ambientes sociais, a reputação, ou pelo menos um tipo específico dela, não necessariamente implica em melhores relações sociais”, aponta. O professor conta que a reputação é um tema caro para sociedades humanas desde os primórdios. “O status, ou reputação, influência, prestígio, capital simbólico ou como quer que o chamemos, está presente em diferentes níveis nas interações sociais. Desde os tempos mais remotos, como mostram registros arqueológicos e historiográficos, percebemos como os grupos e as sociedades significaram a reputação em suas relações sociais. Devemos ter cuidado, contudo, de não reforçarmos estereótipos sobre a importância da reputação social fora dos devidos contextos de análise sociológica”, lembra. Na avaliação de Erivan Raposo, professor de antropologia da Universidade Católica de Brasília (UCB), a dupla americana explorou um tema recorrente de uma forma nova. “Essas pesquisas são importantes porque nos permitem perceber certas reações de maneira diferente. Contudo, é preciso tomar cuidado com as CRIAÇÃO JAPONESA Reuters TV Cientistas do Japão criaram uma técnica para o diagnóstico do ebola que chama a atenção pela rapidez e pela simplicidade. Segundo eles, a partir de uma amostra de sangue ou de outro fluído corporal, é possível detectar a contaminação pelo vírus em 30 minutos. O resultado do método em uso atualmente demoradeumaaduas horas para ficar pronto. “O novo exige apenas um equipamento que pode ser aquecido com uma bateria e custa algumas centenas de dólares (…) É mais simples que o atual e pode ser utilizado nos países em que não estão disponíveis os aparelhos caros de avaliação”, complementou Jiro Yasuda, pesquisador da Universidade de Nagasaki e líder do estudo, em entrevista à agência France-Presse. O exame revela visualmente os genes específicos do vírus ebola. É baseado em técnicas já existentes que extraem o ácido ribonucleico (RNA) — moléculas biológicas ligadas à codificação de genes — de qualquer vírus presente em fluídos corporais. Cria-se, então, uma sequência de DNA. Colocada em um tubo de ensaio, ela é misturada a uma substância que, ao reagir com o sangue indica, em meia hora, a presença do patógeno. “O teste está pronto para ser enviado”, disse Yasuda, em referência aos países da África Ocidental que enfrentam uma epidemia da doença. Segundo o cientista, porém, eles ainda não foram procurados pelas nações atingidas. Divulgado no último dia 28, o balanço mais recente da Organização Mundial da Saúde (OMS) indica que, desde dezembro, 3.069 casos da doença foram registrados, sendo 1.552 mortos. A contagem inclui os episódios de Guiné (430 mortes), Libéria (694), Nigéria (seis) e Serra Leoa (422). O presidente dos EUA, Barack Obama, divulgou ontem um ví- Após análise genética de amostras do vírus que contamina pessoas na República Democrática do Congo (RDC), especialistas concluíram que o patógeno é de uma linhagem da cepa Zaire, mais intimamente relacionada com a do vírus que causou um surto da doença em 1995 em Kikwit, em RDC. “Esses resultados são tranquilizadores, dado que excluem a possibilidade de que o vírus se espalhou do Ocidente para a África Central”, comemorou a OMS, em nota. Os testes foram realizados no Centro Internacional de Recherches Médicales do Gabão em Franceville, um centro colaborador da Organização Mundial da Saúde. deo no qual se dirige aos países mais afetados, garantindo que ações conjuntas entre as nações podem frear as infecções. “Conter essa doença não será fácil, mas sabemos como fazer isso”, disse. A OMS também anunciou CMYK Novo teste detecta o ebola em 30 minutos “Resultados tranquilizadores” Equipe de saúde cerca paciente infectado que fugiu da quarentena na Líbéria: à procura de comida que 31 pessoas morreram em decorrência do ebola na República Democrática do Congo, mas o vírus que está matando os congoleses é diferente do que atinge as outras nações. “Perdendo a batalha” A organização Médicos Sem Fronteiras (MSF) e a ONU divulgaram alertas sobre a situação do surto. A presidente da MSF, Joanne Liu, disse que o mundo está “perdendo a batalha contra a epidemia”. “Os líderes não conseguiram tomar as medidas adequadas”, lamentou. No último dia 8, a OMS declarou que a epidemia se trata de uma emergência de saúde pública mundial e que as nações precisariam ajudar no enfrentamento à doença. A OMS, por sua vez, ressaltou que há um risco de escassez de alimentos devido à redução do comércio entre os países afetados pela epidemia. “A insegurança alimentar se intensificará nas próximas semanas e meses”, estimou Bukar Tijani, representante regional da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) para a África. Ontem, na Libéria, um paciente infectado fugiu da quarentena para procurar comida em um mercado. Armado com um pedaço de pau, o homem ameaçava as pessoas que tentavam se aproximar dele. Vestindo roupas de proteção, agentes de saúde o colocaram à força em uma caminhonete e o levaram de volta ao centro de recuperação.