O DEBATE SOBRE O ENSINO SUPERIOR E SUAS IMPLICAÇÕES NA
FORMAÇÃO PROFISSIONAL EM SERVIÇO SOCIAL
Cirlene Aparecida Hilário da Silva Oliveira1
Maria Ângela Rodrigues Alves de Andrade2
Resumo: O presente trabalho analisa a prática de ensino superior e o processo de
formação profissional em Serviço Social, destacando a relação necessária entre
educação, universidade e currículo. Apresenta os principais marcos históricos da
trajetória do processo de formação do Serviço Social, culminando com a proposta do
novo currículo, e aponta as novas exigências profissionais impostas pela demanda atual.
Evidencia que o
projeto
de formação profissional do
Serviço
Social na
contemporaneidade demandará uma formação acadêmica que propicie aos assistentes
sociais subsídios teóricos, éticos, políticos e técnicos, que possibilitem uma ação crítica,
criativa e comprometida com os interesses das demandas populares, em consonância
com o projeto ético-político norteador da profissão. Apresenta como um desafio atual
para o Serviço Social a plena efetivação da nova proposta curricular, que deve considerar
a direção social do curso, a realidade social e institucional em que se insere e a
construção do novo currículo no cotidiano da vida escolar.
Palavras-Chave: Ensino – Formação Profissional – Educação – Universidade
1
Professora Doutora do Departamento de Serviço Social da UNESP-Franca, Coordenadora do Conselho
de Curso de Graduação em Serviço Social – FHDSS/Franca e Membro da Direção Ampliada da ABEPSS
– Região Sul II. (Endereço: Rua Profº Sudário Ferreira, 4770 – Jd. Noêmia – Franca/SP-CEP 14.403.755
– Fone: (16) 3711-1896/1897 Depto Serviço Social/UNESP ou 3702-1280 (residencial) E-mail:
[email protected]; [email protected]
2
Professora Doutora do Departamento de Serviço Social da UNESP-Franca, Membro Titular do Conselho
de Curso de Graduação em Serviço Social-FHDSS/Franca e Vice-Coordenadora do Programa de Estudos
Pós-Graduados em Serviço Social da UNESP-Franca. E-mail: â[email protected]
Introdução
Resguardando as possibilidades e existência de especificidade entre o ensino superior
público e privado, nos propomos a apresentar uma reflexão que emerge de nossas
práticas enquanto docentes e pesquisadoras na área de formação profissional de uma
instituição pública : a Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, na cidade
de Franca – SP.
Entendendo a prática de ensino como uma prática social orientada por objetivos,
finalidades e conhecimentos, refletir sobre ela requer considerar as múltiplas
determinações sociais que a circundam no heterogêneo contexto político e sócio-cultural.
Considerar a educação no momento atual significa dispor-se a superar as teorias que lhe
conferem um caráter simplesmente técnico, neutro. Significa assumir o caráter político
inerente a ação de educar.
Estamos vivendo uma época em que também não é mais suficiente produzir no ensino
somente competentes discursos em torno das questões de cunho filosófico, histórico e
social, que envolvem o sistema educacional brasileiro. É preciso inserir neste debate a
ação produzida seja no ensino, na pesquisa, na extensão e na gestão, e articula-la, de
modo concreto às necessidades da sociedade contemporânea, com a finalidade de
contribuir para a construção de projetos mais condizentes de avanços que possam
beneficiar a maioria da população.
Educação, Universidade e Currículo – relação necessária a prática de ensino
Na tentativa de contribuir para o debate sobre o ensino e mais especificamente sobre o
ensino em Serviço Social julgamos fundamental tecer algumas considerações a respeito
da Educação, com a intenção de problematizar as questões que estão postas no debate
sobre esta temática, principalmente no que se refere aos pressupostos políticos, teóricos
e metodológicos, bases sobre as quais se desenvolve o atual ensino de 3º Grau.
Das tendências que atravessam as concepções em educação, é com a Histórico-Crítica
que estabelecemos maior identificação sendo que, esta opção não foi idealizada, mas
alicerçada no próprio desenvolvimento Histórico do Serviço Social e da proposta política
da profissão.
Partindo da premissa da corrente Histórico-Crítica, compreendemos que
“a educação é um fenômeno próprio dos seres humanos (...)
sabe-se que, diferentemente dos outros animais, que se adaptam
à realidade natural tendo sua existência garantida naturalmente,
o homem necessita produzir continuamente sua própria
existência. Para tanto, em lugar de se adaptar à natureza, ele tem
que adaptar a natureza a si, isto é, transforma-la. E isto é feito
pelo trabalho.”(Saviani, 1995, p.15)
Os homens enfrentam no cotidiano, situações que exigem respostas. Algumas são
concluídas de antemão, ocorrendo espontaneamente, outras nos obrigam a examiná-las
mais detidamente, a descobrir suas soluções. Diferem-se, portanto, o conhecimento
metódico e sistematizado do saber, daquilo que conhecemos por senso comum.
Tal interpretação significa que a reprodução e a produção do ser, passa a requerer a
existência de uma atividade mediadora, voltada para a formação dos indivíduos, qual
seja, a educação escolar, possibilitando através dela o acesso ao saber elaborado ou ao
conhecimento sistematizado.O ensino em todos os seus níveis compõe o processo de
educação, que diz respeito a construção da chamada cultura erudita. A educação é
entendida, portanto, como atividade mediadora no seio da prática social global, que
contribui (ou pelo menos deveria contribuir) para um movimento maior de
transformação das relações sociais.
A educação deve ser entendida como um processo que transcende o simples
desenvolvimento tecnológico, que abarca a possibilidade de superação. No entanto,
muitos estudos apontam na direção de que a educação não consegue transpor a função de
reprodução das relações sociais. Assim, o desafio a ser enfrentado é exatamente o de
manter-se uma concepção crítica da educação, mas ao mesmo tempo ter uma proposta
pedagógica que dê conta dela, que descubra e desenvolva formas mais adequadas para
atingir seus objetivos.
Esta análise já elaborada e apontada por muitos intelectuais, insere também a
Universidade com todas as suas contradições, insere também a prática educativa que
nela se desenvolve e que, de alguma forma sintetiza as múltiplas determinações
características da sociedade que historicamente a produziu. Este é o desafio que se
coloca aos que têm o compromisso de querer fazê-la avançar rumo a um processo mais
amplo de transformação social.
Há em parte desse universo, formadores que tem consciência de seu caráter conservador
e que buscam formular um novo projeto de Universidade: a Universidade que prepara
para o futuro, a Universidade que permeada pelo jogo político, tem a capacidade de
construir seus próprios projetos, a Universidade que supere a visão e o modelo de formar
“especialistas”. Uma Universidade que procura não só transmitir conhecimento formal,
mas que solicita de seus sujeitos um movimento de produção do pensamento crítico que
possa favorecer a maioria da comunidade a que pertença. É no bojo dessas propostas que
deveria se instalar e se articular os elementos que consolidem uma direção política da
Universidade Brasileira de ensino, pesquisa, extensão e gestão.
A pesquisa e a extensão vêm provocando nos docentes e educadores uma forte
motivação, ou seja, atualmente existe um volume maior de projetos e pesquisas em
execução. No entanto, observa-se certa diluição das questões relativas ao ensino –
entendida aqui como a relação direta de transmissão e construção do conhecimento em
sala de aula. A maioria das produções, contribuições e debates se travam relacionados à
questão do papel desempenhado pela Universidade, sem todavia, mergulhar na sua vida
cotidiana, desprezando a possibilidade de através também da práxis curricular, desvelar
os mecanismos de dominação existentes e as possibilidade de enfrentá-los.
Hoje, com a experiência docente, acreditamos necessário garantir as discussões em torno
da busca de propostas curriculares que nos permitam chegar a uma estrutura de ensino
que responda aos desafios lançados a Universidade e ao novo projeto de formação nos
cursos de Serviço Social.
No bojo desta prática, de espectro relativamente amplo, a organização curricular ganha
espaço privilegiado, pois dela depende o conjunto de propostas e atividades que,
intencionalmente organizadas, consubstanciarão aquilo que, formalmente constituirá
matéria de ensino. Este movimento intencional representa sempre a visão de um grupo
que ao selecionar os conteúdos e disciplinas que comporão o currículo, estabelecerão
concomitantemente as linhas ou eixos que deverão ser seguidos e aplicados inclusive na
sala de aula.
Assim, as questões que envolvem a estruturação e o desenvolvimento de um projeto de
formação profissional não podem ser reduzidas a uma simples definição de grade
curricular e/ou dos conteúdos das disciplinas que o irão compor. O currículo é a
expressão de um conjunto de concepções, é a explicitação de tendências políticas,
teóricas e metodológicas que dão direção aquilo que se quer imprimir a um projeto de
formação, incorporado num projeto educacional.
A organização curricular nesta perspectiva está condicionada à leitura, compreensão e
consciência da realidade, à fundamentação teórica e à instrumentalização técnica do
trabalho. Queremos dizer com isso que a implementação de um currículo supõe a
seleção intencional de conteúdos. Falar sobre decisões curriculares implica falar sobre
quais conteúdos ensinar, para que ensinar e como fazê-lo.
Com efeito, o conhecimento produzido é resultado dos confrontos que se estabelecem
entre as diferentes alternativas de compreensão de mundo, articuladas em um currículo.
A prática de ensino na Universidade
Quando se faz um levantamento do material existente sobre a prática de ensino,
constata-se um movimento de sistematização traçado a partir de um modo de
entendimento da realidade social. São as chamadas “tendências”da educação, que tratam
em sua essência de explicitar a ideologia que lhes sustentam e que norteiam suas ações.
Não seria possível nesse momento fazer explorações ou polemizar este tema, já que é
objeto de pesquisas e publicações na própria área de Educação. No entanto, faz-se
necessário aqui, destacar entre elas, aquela que do ponto de vista da trajetória de
formação profissional no Serviço Social estabelece com ela uma identidade. Tratar da
prática de ensino existente no Serviço Social, implica em um tipo de sistematização que
vai além do conhecimento e compreensão de um tipo de metodologia e/ou conteúdos
específicos, mas que caminha no sentido de revelar um eixo ideológico determinado.
A perspectiva que vimos refletir tem como propósito integrar e articular os diversos
aspectos do ensino a um movimento mais amplo de transformação da sociedade. A idéia
é a de que a “invenção” da escola enquanto instrumento de reprodução, também pode
colocar-se a serviço da transformação social, atendendo a um projeto histórico social,
que mesmo não podendo ser atingido em sua plenitude pela sua própria condição de
produção capitalista, pode mobilizar os sujeitos para uma ação pela emancipação.
Ao se preocupar com a questão pedagógica, Libâneo (1994) se apropria da concepção
Histórico-Crítica e no bojo desta concepção articula os modos do “fazer do ensino”,
identificando esta perspectiva como “perspectiva-crítica social dos conteúdos”.
Os adeptos a esta pedagogia buscam construir uma prática educativa coerente com a
ótica crítico-social onde os conhecimentos produzidos historicamente devem ser
confrontados com a prática social, reavaliando o saber sistematizado.
No que se refere ao ensino superior, têm predominado as análises que contrapõem a
idéia de Universidade restrita ao cultivo do saber, a produção e divulgação das idéias e
conhecimentos que sirvam à hegemonia da classe dominante. É principalmente na
Universidade que está assegurado um espaço para o discurso intelectual e para a
produção acadêmica acerca da transformação social, o que é essencial para o exercício
das atividades que lhe é destinada.
Repensar a prática do ensino na perspectiva de sua articulação com uma prática
mediadora de uma nova ordem social implica construir um conhecimento teórico-prático
que tenha sempre como referência a realidade social. Empenhar-se neste objetivo
significa fundamentar política e tecnicamente, todo o processo de ensino. Significa
buscar caminhos para a elaboração de uma prática de ensino, fundamentada em
pressupostos claramente definidos, superando uma prática tecnicista ou mecânica.
O aclaramento do verdadeiro sentido da prática de ensino aponta para a necessidade de
mudanças no conteúdo de ensino, mas também mudanças na forma de realizar essa
prática. É preciso sistematizar e difundir outras modalidades de ensino, além daquelas
tradicionalmente privilegiadas na Universidade, através das aulas expositivas, da leitura
de textos, dos debates e dos seminários.
No âmbito teórico o ensino é constituído por um conjunto de idéias e conhecimentos, e
no âmbito prático, por um conjunto de meios que são colocados em ação para a
realização do processo. Assim, teoria e prática precisam ser compreendidas de forma
articuladas. Observando que, esta proposta de prática de ensino pressupõe a busca de um
saber, que jamais poderá ser adquirido espontaneamente ou desorganizadamente, sua
construção deve ser organizada.
Certamente, desenvolver um processo de ensino que abarque esta perspectiva requer
que, no desenrolar do processo de planejamento, desenvolvimento e avaliação do ensino
todas as decisões sejam tomadas tendo como eixo o projeto de Universidade e ao
projeto de formação profissional proposto para o curso, qual seja, aquele
comprometido com o processo de formação crítico, científico e propositivo.
Além da questão política, pesa também na construção desse projeto a dimensão
pedagógica. Instaurar junto aos professores e alunos, um processo contínuo de reflexão
acerca da prática de ensino tal como ela acontece inclusive na sala de aula, tentando
explicitar os pressupostos que a sustentam e elucidando suas contradições, nos permite
ultrapassar o nível da consciência ingênua.
O exercício da prática educativa requer um projeto político que estabeleça finalidades,
que expresse intencionalidades, mas requer também a capacidade de captar a sala de aula
em toda sua complexidade. A prática de ensino realizada no cotidiano da sala de aula,
ainda é um dos principais instrumentos de mediação entre as finalidades da educação e a
sua plena realização.
Encaminhando a reflexão para os cursos de Serviço Social
No ensino superior de Serviço Social, estas questões estão em debate desde os finais dos
anos 70, quando à revisão curricular dos cursos passaram a ocupar um espaço
considerável nos debates produzidos pela então ABESS – Associação Brasileira de
Ensino em Serviço Social.
Outro ponto a destacar no período, diz respeito ao fato da profissão se aproximar do
contexto de movimento mais geral da sociedade e buscar compreender sua inserção nas
relações sociais de produção, bem como, produzir esforços para lhe conferir estatuto
acadêmico e científico. Rosa F. Pinto observa:
“Uma sociedade em mudança exige de uma profissão uma
postura científica de investigação-ação críticas e uma renovação
da ação profissional, sempre atenta às transformações sociais
estruturais e conjunturais desta sociedade na qual se efetua o seu
exercício”. (1986, p.33)
Essa preocupação se dá principalmente a partir de 1972 quando é implantado o 1º curso
de Pós-Graduação em Serviço Social na PUC-SP, primeiro a nível de Mestrado e em
1981 a nível de Doutorado. A expressiva procura pelos cursos de Pós-Graduação de
alguma forma expressam o interesse e a necessidade da busca por superar as deficiências
de nossa formação básica e o interesse em estabelecer um reconhecimento e prestígio da
profissão junto à comunidade científica.
O processo de discussão desencadeado nacionalmente pela ABESS, chega ao ano de
1980 com um proposta básica para o projeto de formação profissional: definir um
currículo mínimo em que se busque romper com a visão fragmentada da realidade,
proposto uma formação crítica e comprometida com a transformação social :
“ Nesse contexto, passa-se a discutir o direcionamento da
formação profissional, seus objetivos e conteúdos e a função
social da formação profissional enfatizando sua importância no
desenvolvimento de uma prática consciente e conseqüente no
interior
das
relações
de
classe
na
sociedade
brasileira”(ABESS,1996, p.145)
Buscam os cursos de Serviço Social - assim como o ensino universitário - um espaço
dentro das contradições do sistema capitalista, para implementar um processo de
superação de uma formação profissional fragmentada da realidade.
Ao se realizar a XXI Convenção Nacional da ABESS em 1979, uma proposta de
reformulação curricular foi aprovada e enviada ao Conselho Federal de Educação em
1980. Dizia o documento:
“Considera-se que a formação profissional do Serviço Social
tem como referência básica o homem como ser histórico de uma
realidade(...) daí a relevância de conhecer o contexto social, a
dinâmica das instituições vinculadas à sociedade civil e/ou à
sociedade política e suas articulações, bem como os
conhecimentos e as relações dos distintos extratos da sociedade
(...) a formação acadêmica pressupõe:1) um conhecimento
básico enfatizando à ciência do homem e da sociedade; 2) um
conhecimento profissional dos fundamentos teóricos do Serviço
Social e suas relações com esses sistemas...”(ABESS,1977, p. 12 apud PINTO, 1986, p.96-97).
Percebe-se que se consolidam as intenções em produzir um processo de formação crítico
e político, constituído pela fundamentação do saber científico. Esta preocupação
demarca e define as bases daquele processo de formação : a compreensão da sociedade
brasileira e a capacitação do profissional para proceder sua análise; a capacitação teórico
e prática para intervir; a capacitação para a produção do conhecimento sobre a prática
profissional e a realidade em que se insere. Esta proposta, foi aprovada para todo o país
pelo Conselho Federal de Educação em agosto de 1982 ( Parecer 412 ) e implementada a
partir de 1983.
O procedimento de revisão fez parte de um movimento ou de uma tendência que
extrapolava o universo da profissão. A proposta de um projeto de formação profissional
crítica comprometida com a transformação social era determinada pelos rumos
assumidos pela educação brasileira, num movimento mais geral, que pretendia articular
as diversas atividades profissionais com as exigências da realidade brasileira.
A partir dos anos 80, delineava-se uma tendência na Universidade brasileira que sem
deixar de incorporar o debate crítico anterior – de denúncia de práticas no interior do
sistema escolar que legitimavam e reforçavam o sistema de dominação – procurava
avançar no sentido de aprofundar a análise da prática educacional como uma “atividade
mediadora” no seio da prática social.
Novamente nos anos 90 a questão da formação do Assistente Social frente às novas
exigências é colocada em debate. A preocupação que move tais reflexões é a necessidade
de um novo currículo, que possibilite, na visão desta entidade, um salto qualitativo na
formação do Assistente Social que não foi atingido pela primeira revisão curricular. O
conteúdo dessas discussões consideram “a direção social, os eixos fundamentais, a
perspectiva teórico metodológica, a formação do mercado de trabalho e o tratamento
dispensado aa análise da realidade social brasileira”(ABESS, 1996, p.145)
Esta proposta vem impregnada da idéia do conhecimento não como um conjunto isolado
de informação, mas como um conjunto de idéias e conhecimentos comprometidos com
uma determinada visão de mundo e de um projeto político de educação. Um processo
portanto, portador de compromissos, interesses e ideologias subjacentes. Processo
complexo se considerarmos a necessidade imediata da profissão que é a de estabelecer
uma relação direta entre o conhecimento produzido e a ação profissional. Deve buscar
portanto, uma sólida formação teórico-prática, referenciada à realidade social brasileira,
apontando para a superação das debilidades de sua prática e para construção de
alternativas de ação.
O novo currículo do Serviço Social
Recentes discussões encaminharam a sistematização de uma nova proposta de diretrizes
básicas para o curso de Serviço Social, lideradas pela ABEPSS – Associação Brasileira
de Ensino e Pesquisa em Serviço Social 3, que culminou no novo currículo mínimo,
aprovado pelo MEC em 03 de abril de 2001, e já implantado nas unidades de ensino de
todo o país.
As diretrizes apresentadas na referida proposta foram definidas considerando-se que a
formação profissional do assistente social apresenta como foco central a questão social.
O Serviço Social, nas suas determinações sócio-históricas e ídeo-políticas, necessita
inovar as respostas profissionais no enfrentamento da questão social, daí o significado da
definição das diretrizes curriculares “que implicam capacitação teórico-metodológica,
ético-política e técnico-operativa para a:
1. apreensão crítica do processo histórico como totalidade;
2. investigação sobre a formação histórica e os processos sociais
contemporâneos que conformam a sociedade brasileira, no sentido
de aprender as particularidades da constituição e desenvolvimento
do capitalismo e do Serviço Social no País;
3. apreensão do significado social da profissão desvelando as
possibilidades de ação contidas na realidade;
4. apreensão das demandas – consolidadas e emergentes – postas ao
Serviço Social via mercado de trabalho, visando a formular
respostas profissionais que potenciem o enfrentamento da questão
social, considerando as novas articulações entre público e privado;
5. exercício profissional cumprindo as competências e atribuições
previstas na legislação profissional em vigor. (ABESS/CEDEPSS,
3
Em 1946 foi instituída a ABESS – Associação Brasileira de Ensino em Serviço Social, por um grupo de
assistentes sociais das escolas pioneiras no ensino de Serviço Social. Criada com a finalidade de definir e
coordenar uma política de formação profissional do assistente social, promove a adoção de um padrão
mínimo de ensino; em 1998 funde-se com o CEDEPSS – Centro de Documentação e Pesquisa em Política
Social e Serviço Social, formando-se assim a ABEPSS – Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em
Serviço Social, que tem papel fundamental na construção do projeto ético político da profissão e nos
avanços dos processos da formação profissional do Serviço Social.
1997, p. 62)
O projeto de formação profissional em Serviço Social, alicerçado nos pressupostos,
princípios e diretrizes da proposta básica, remete a um conjunto de conhecimentos
indissociáveis, que numa nova lógica curricular, são materializados em três núcleos de
fundamentação4:
1.
teórico-metodológicos da vida social;
2. da formação sócio-histórica da sociedade brasileira;
3. do trabalho profissional.
É importante salientar que o primeiro núcleo, responsável pelo
tratamento do ser social enquanto totalidade histórica, analisa os
componentes fundamentais da vida social, que serão
particularizados nos dois outros núcleos de fundamentação, o da
formação sócio-histórica da sociedade brasileira e o do trabalho
profissional. Portanto, a formação profissional constitui-se de
uma totalidade de conhecimentos que estão expressos nestes três
núcleos, contextualizados historicamente e manifestos em suas
particularidades. (ABESS/CEDEPSS, 1997, p. 63)
Os três núcleos reúnem os conteúdos que fundamentam o trabalho do assistente social,
constituindo-se assim eixos articuladores da formação profissional almejada. Estes eixos
desdobram-se em áreas do conhecimento, que são traduzidas pedagogicamente pelo
conjunto de componentes curriculares, irrompendo numa lógica curricular inovadora.
Esta apresenta como principal proposta a superação da fragmentação do processo de
ensino e aprendizagem, numa articulação de saberes que permeie todo o processo de
formação profissional, envolvendo ensino, pesquisa e extensão, possibilitando maior
convivência acadêmica entre os diferentes sujeitos: professores, alunos e comunidade.
Esta nova estrutura curricular deve refletir o atual momento
histórico e projetar-se para o futuro, abrindo novos caminhos
4
Não cabe, nos limites deste trabalho, a análise detalhada de cada núcleo. Para maiores estudos, consultar:
Diretrizes gerais para o curso de Serviço Social – ABESS/CEDEPSS. Cadernos ABESS n º. 7, pp. 64-71;
Proposta básica para o projeto de formação profissional. Ver. Serviço Social e Sociedade n º. 50, pp. 143171.
para a construção de conhecimentos, como experiência concreta
no
decorrer
da
própria
formação
profissional.
(ABESS/CEDEPSS, 1997, p. 64)
E, é justamente dentro desta nova lógica curricular, alicerçada num pensamento crítico,
que busca propostas inovadoras de ação profissional, que podemos afirmar que o ensino
da prática, impõe-se ao Serviço Social em duas dimensões: uma que diz respeito à
natureza interventiva da profissão e outra que dê conta da prática pedagógica, no
processo de formação acadêmico:
“a relação pedagógica professor/aluno é um dos aspectos
fundamentais no processo de formação profissional no meio
universitário, constitue-se um dos aspectos básicos em que se
expressam as relações de poder no interior da Universidade. No
âmbito específico do Serviço Social, esta relação não tem sido
suficientemente discutida enquanto relação de poder que tem
uma especificidade e um significativo peso no processo de
formação profissional.”(Carvalho e outras, 1984, p.133-134)
Eis o grande desafio atual: a busca da plena efetivação da nova proposta curricular que
considere: a direção social do curso, a realidade social e institucional em que se insere e
a construção do novo currículo no cotidiano da vida escolar.
Bibliografia
ABESS - Associação Brasileira de Ensino de Serviço Social. Formação profissional:
trajetórias e desafios. Cadernos ABESS nº 7. São Paulo: Cortez, 1997. 168p.
ABESS/CEDEPSS. (Doc.) Proposta básica para o projeto de formação profissional.
Serviço Social & Sociedade, São Paulo, nº 50, p.143-171, abr.1996.
ANDRADE, Maria Ângela Rodrigues Alves de. A prática de ensino no curso de Serviço
Social. São Paulo, 1996. 195 p. Tese (Doutorado em Serviço Social), PUC-SP.
CARVALHO, Alba Maria Pinho et al. Projeto de investigação: a formação profissional
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CHAUÍ, Marilena. Escritos sobre a universidade. São Paulo, Ed. UNESP, 2001.
IAMAMOTO, Marilda Vilela. Renovação e conservadorismo no serviço social: ensaios
críticos. São Paulo. Cortez, 1992.
______. O serviço social na contemporaneidade: trabalho e formação profissional. São
Paulo: Cortez, 1998. 326p.
JORGE, Maria Rachel Tolosa. A construção curricular no ensino de serviço social:
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LIBÂNEO, José Carlos. Democratização da escola pública: a pedagogia crítico social
dos conteúdos. 12 ed. São Paulo, Loyola, 1994 (Coleção Educar, 1)
OLIVEIRA, Cirlene Aparecida Hilário da Silva. A centralidade do estágio no processo
de formação profissional em serviço social. Franca, 2003, 178p.Tese (Doutorado em
Serviço Social) UNESP.
PINTO, Rosa Maria Ferreiro. Política educacional e serviço social. São Paulo. Cortez,
1986.
RIOS, Therezinha Azeredo. Ética e competência. São Paulo. Cortez, 1999 (Coleção
questões de nossa época, v. 16).
SAVIANI, Demerval. Escola e democracia. 29 ed. Campinas-SP, Autores Associados,
1995 (Coleção Polêmicas do Nosso Tempo, v.5)
____________. Pedagogia Histórico-Crítica: primeiras aproximações. 5 ed. CampinasSP. Autores Associados, 1995 (Coleção Polêmicas do Nosso Tempo, 40).
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o ensino superior e a formaçào profissional em serviço