PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO ' " ACÓRDÃO Vistos, relatados e TRIBUNAL DE JÜSTÍÇÃ DE SÃO PAULO ACÓRDÃO/DECISÃO MONOCRATICA REGISTRADO(A) SOB N° . . . . . . . . . . . . m u nu lllll lllll lllll llll 1111 discutidos estes autos de APELAÇÃO CÍVEL COM REVISÃO n° 33 9.513-5/7-00, da Comarca de SANTA ADELIA, em que é apelante MINISTÉRIO PÚBLICO sendo apelada DESTILARIA SÃO GERALDO LTDA: ACORDAM, Tribunal em Câmara de Justiça Especial do Estado do Meio Ambiente do de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "POR MAIORIA, DERAM PROVIMENTO PARCIAL AO RECURSO, VENCIDO O 3° JUIZ, QUE DECLARARÁ VOTO", de conformidade com o voto do Relator, que íntegra este acórdão. O julgamento teve a participação dos Desembargadores J.G. JACOBINA RABELLiO (Presidente, sem voto) , REGINA CAPISTRANO e AGUILAR CORTEZ. São Paulo, 2 8 de junho de 2 007. $? j ^ s .^<> RENATO NALINI Relcitor I PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO SEÇÃO CE DIREITO PUBLICO CÂMARA ESPECIAL DO MEIO AMBIENTE VOTO N° 1 3 . 0 5 6 APELAÇÃO CÍVEL N° 3 3 9 . 5 1 3 - 5 / 7 - SANTA ADÉLIA Apelante: MINISTÉRIO PÚBLICO Apelada: DESTILARIA SÃO GERALDO LTDA AÇÃO CIVIL PÚBLICA AMBIENTAL QUEIMA DE PALHA DE CANA-DEAÇÚCAR - ALEGADA PERM1SSIVIDADE DO DECRETO ESTADUAL N° 42.056/97 - A ORDEM CONSTITUCIONAL É SUPERIOR A QUALQUER NORMATIVIDADE, POIS É SEU FUNDAMENTO DE VALIDADE NOCIVIDADE MANIFESTA PARA O AMBIENTE, A SAÚDE E MESMO PARA A AGRICULTURA - AÇÃO CIVIL PÚBLICA IMPROCEDENTE APELO DO MINISTÉRIO PÚBLICO PARCIALMENTE PROVIDO Vistos etc. A s e n t e n ç a de fls. 1.455/1.459 julgou improcedente a ação civil pública movida pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO c o n t r a a DESTILARIA SÃO GERALDO LTDA, sob a r g u m e n t o de que n ã o houve dano provado, insuficiente o d a n o p r e s u m i d o , além do que inexistiria n o r m a proibitiva d a prática d a q u e i m a d a e, por isso, n ã o ser acolhido o pedido. Apela o Ministério Público a s u s t e n t a r , n a s razões de fls. 1.462/1.479, que a q u e i m a d a foi irregular. Evidentes os d a n o s ambientais, diante dos t r a b a l h o s científicos elaborados. Além disso, o Decreto E s t a d u a l n° 42.056 / 97 padece de inconstitucionalidade, ao disciplinar atividade efetivamente poluidora do meio APELAÇÃO CÍVEL N° 339 513-5/7 - SANTA ADÉLIA - VOTO N° 13 056 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO SEÇÃO DE DIREITO PUBLICO CÂMARA ESPECIAL DO MEIO AMBIENTE ambiente. Impõe-se, portanto, a reforma da sentença e o decreto de procedência da ação civil pública. A ré oferece contra-razões às fls. 1.483/1.494 e posiciona-se a Ilustrada Procuradoria Geral de Justiça no sentido do provimento do apelo - fls. 1.499/1.501. Neste Tribunal, o Exmo. Desembargador Lineu Peinado, com assento na Egrégia 2 a Câmara de Direito Público, representou ao Exmo. Desembargador Presidente da Seção de Direito Público para que os presentes fossem redistribuídos à Câmara Especial do Meio Ambiente - fls. 1.503. É u m a síntese do necessário. O deslinde do presente feito passa por duas questões: a existência ou não de norma proibitiva da queimada de palha de cana-de-açúcar no Estado de São Paulo, e a efetiva prática dessa conduta pela requerida. O trato conferido pela ordem fundante ao meio ambiente mereceu densa modificação. Hoje o artigo 225 da Carta Cidadã erigiu o direito ao meio ambiente ao primeiro bem da vida intergeracional, ou seja, fruível pelas futuras gerações. Dessa opção do constituinte deriva uma outra ordem de conseqüências no âmbito do processo. Além da categoria de bem da vida essencial e destinado a todas as gerações do porvir, o meio ambiente é u m valor fundante. Como valor, passa a ser critério de interpretação para o julgador. Sem sombra de qualquer dúvida, entre o valor tutela ao meio ambiente e a observância de lei federal ou decreto de leniência para com u m a prática primitiva, que sacrifica o primeiro valor, aquele haverá de prevalecer. Esta foi também a orientação do Colendo Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, na lenta, mas efetiva evolução da compreensão do problema da queima da palha de cana-de-açúcar. Por APELAÇÃO CÍVEL N° 339 513-5/7 - SANTA ADÊLIA - VOTO N° 13 056 3 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO SEÇÃO DE DIREITO PUBLICO CÂMARA ESPECIAL DO MEIO AMBIENTE isso é que, enquanto no julgamento da primeira ADIN, de Americana, dois foram os votos a favor da improcedência e vinte e três a favor da procedência, ou seja, a favor da queima. Na segunda ADIN, de Ribeirão Preto, houve empate - 12 a 1 2 - e o voto de Minerva do Presidente do Tribunal inclinou-se em desfavor do ambiente. Finalmente, na ADIN de Limeira, foram 15 os votos favoráveis à compreensão de que o Município pode proibir a queima de palha de cana-de-açúcar e 6 os votos contrários. Votação encerrada, diante do quorum para as ações diretas de inconstitucionalidade que, ao atingir 13 manifestações num sentido, prescindem de aferição das demais. Existe u m a evidente maturidade do Judiciário em relação a tais temas. Os usineiros de bom senso e de consciência sabem que precisam se ajustar aos novos tempos. É de se supor que a nova orientação também inspire o legislador a alterar posturas totalmente inadequadas com a efetividade do direito ao meio ambiente sadio. E o avanço tecnológico propiciará aos plantadores de cana, com a colheita da cana crua, maiores rendimentos e atendimento real à proteção ambiental que a Constituição exige de todos. Sem exceção. Por isso é que a invocação a leis que contradizem a vontade constituinte não inibem o Judiciário de fazer valer as promessas feitas pelo formulador do pacto. O concretizador das promessas constitucionais é o Judiciário. A ele incumbe aplicar a lei, mas sem esquecer que o fundamento de validade de todas elas é a Constituição. Em sua explicitude e ainda em sua implicitude. E a Constituição de 5 de outubro de 1988 é carta prenhe de princípios, os quais permitem ao juiz um protagonismo novo, exigido pela APELAÇÃO CÍVEL N° 339 5 1 3 - 5 / 7 - SANTA ADÉLIA - VOTO N° 13 056 4 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA D O ESTADO DE SÃO PAULO SEÇÃO DE DIREITO PUBLICO CÂMARA ESPECIAL DO MEIO AMBIENTE contemporaneidade, nunca mais aquela posição subalterna de servo da letra da lei. Diante do artigo 24, VI,] da Constituição Federal, e de seu § 2° 2 , inadmissível acolher-se a alegação de que a Lei Federal n° 6 9 3 8 / 8 1 revogara o suporte normativo da presente ação civil pública - a Lei Estadual n° 9 9 7 / 7 6 e o Decreto n° 8.468/76. O constituinte erigiu o meio ambiente no primeiro direito intergeracionaJ explicitamente protegido no pacto fundante. Ou seja, os viventes são titulares do meio ambiente, mas há u m a legião de titulares ainda não nascidos, mas igualmente merecedores de consideração e de respeito. Assim porque perfeitamente possível à legislação estadual impor maiores restrições que a legislação federal, ampliando inclusive o conceito de poluição e de poluidor. E nem há se falar que o Decreto n° 8468/76 trouxe situação nova não prevista na norma 3 regulamentada. O artigo 26 do Regulamento nada mais é 1 "Art 24 Compete ã União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre ( ) VI - florestas, caça, pesca, fauna, conservação da n a t u r e z a , defesa do solo e dos r e c u r s o s n a t u r a i s , proteção do meio ambiente e controle da poluição M 2 "§ 2 o - A competência da União p a r a legislar sobre n o r m a s gerais não exclui a competência s u p l e m e n t a r dos Estados " 3 "Art 26 Fica proibida a queima ao a r livre de resíduos sólidos, líquidos ou q u a l q u e r outro material combustível, exceto mediante autorização prévia da CETESB, para I - Treinamento p a r a combate a incêndio, II - Evita desenvolvimento de espécies indesejáveis, animal ou vegetal para proteção à agricultura e à pecuária " APELAÇÃO CÍVEL N° 339 5 1 3 - 5 / 7 - SANTA ADELIA - VOTO N° 13 0 5 6 5 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO SEÇÃO DE DIREITO PUBLICO CÂMARA ESPECIAL DO MEIO AMBIENTE que u m desdobramento das normas prevista s nos artigos 2° 4 e 3° 5 , ambos da Lei 9 9 7 / 7 6 . Tampouco há se alegar que o Decreto n° 42.056/97, ao permitir a manutenção das queimadas para a colheita da cana-de-açúcar, legitimaria a ação da requerida. A tese de sua incompatibilidade com a ordem constitucional vigente não é desarrazoada. J á se afirmou neste Tribunal que "a queima da palha da cana-de-açúcar deve ser coibida, data vênia, em face dos efeitos degradantes provocados ao meio ambiente e à saúde da circunvvzinhança, por atuação direta da combustão de material em contato com o solo, a liberar resíduos (fumaça/gases) que atingem, também, o equilíbrio dos elementos da atmosfera ... Ainda que se controverta na academia, reconhecendo-se a defesa séria e fundamentada de posições científicas, não se olvide que a população-consumidora, titular justa dos bens da vida, de um modo ou d 'outro, sofre as conseqüências comprovadas e comprováveis pela perícia no sítio produtor da poluição de que se trata 4 "Artigo 2 o - Considera - se poluição do meio ambiente a presença, o l a n ç a m e n t o ou a liberação, n a s á g u a s , no a r ou no solo, de toda e q u a l q u e r forma de matéria ou energia, com intensidade, em q u a n t i d a d e , de concentração ou com características em desacordo com a s que forem estabelecidas em decorrência desta lei, ou que tornem ou possam tornar a s á g u a s , o a r ou no solo I - impróprios, nocivos ou ofensivos à s a ú d e , II - inconvenientes ao bem - e s t a r público, III - d a n o s o s aos materiais, â fauna e à flora, IV - prejudiciais à segurança, ao u s o e gozo da propriedade e a s atividades n o r m a i s da c o m u n i d a d e " 5 Artigo 3 o - Fica proibido o lançamento ou liberação de poluentes n a s á g u a s , no a r ou no solo Parágrafo único - Considera - se poluente toda e q u a l q u e r forma de matéria ou energia que, direta ou indiretamente, c a u s a poluição do meio ambiente de que trata o artigo anterior APELAÇÃO CÍVEL N° 339 5 1 3 - 5 / 7 - SANTA ADÉLIA - VOTO N° 13 056 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO CÂMARA ESPECIAL DO MEIO AMBIENTE Dessarte, não fosse a grave acusação de ilegalidade do Decreto Estadual 42 056/97, por distorcer a hierarquia das leis (Leis Federais 4.771/65 e 6 938/81), a par de abrir caminho ã alteração do conceito de poluição, não tem eficácia, como outros diplomas, de transmudcr os efeitos físicos poluidores, substituindo-se à perícia da matéria de fato. Pode, a lei, definir o que não mais constitui poluição, mas não pode decretar que seus efeitos não mais existam"6 E m trilha idêntica: "Ação Civil Pública. Prática ilegal da queima de canade-açúcar Dano ao meio ambiente e à saúde pública. Meio ambiente consagrado a bem coletivo, nos termos da CF. Ilegalidade do Decreto Estadual 42 056/97 Lei 10.547/00 não aplicada na hipótese. Sentença de improcedência reformada. Condenação nas sanções requeridas Recurso provido7. O u t r a n ã o t e m sido a orientação deste relator em hipóteses análogas. A i n d a r e c e n t e m e n t e , e m voto proferido n o C o l e n d o Ó r g ã o E s p e c i a l a r e s p e i t o d o t e m a , tive o p o r t u n i d a d e de asseverar: "No Estado de São Paulo, a Lei 11.241, de 19.9.2002, regulamentada pelo Decreto Estadual 47.700, de 11.3.2003, estabelece: Artigo I o - Esta lei dispõe sobre a eliminação do uso do fogo como método despalhador e facihtador do corte da cana-de-açúcar. Artigo 2 o - Os plantadores de cana-de-açúcar que utilizem como método de pré-colheita a queima da palha são obrigados a tomar as providências 6 7 TJSP AC 033 786. Rei VALLIM BELLOCCHI.j 22 3 1999 TJSP AC 241 215. Rei MAGALHÃES COELHO APELAÇÃO CÍVEL N° 339 5 1 3 - 5 / 7 - SANTA AOÉLIA - VOTO N° 13 0 5 6 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO SEÇÃO DE DIREITO PUBLICO CÂMARA ESPECIAL DO MEIO AMBIENTE necessárias para reduzir a prática, seguintes tabelas' ANO 1° ANO 1 observadas ÁREA MECANIZÁVEL ONDE NÃO SE PODE EFETUARA QUEIMA PERCENTAGEM DE ELIMINAÇÃO DA QUEIMA 2 0 % da área cortada 20% da queima eliminada (2002) 3 0 % da queima eliminada (2006)] 5o ANO 3 0 % da área cortada 10° ANO 50% da área cortada 50% da queima eliminada (2011) 15° ANO 80% da área cortada 20° ANO 100% da á r e a cortada 8 0 % da queima eliminada (2016) eliminação total da queima (2021) ANO 10° ANO ÁREA NAO MECANIZAVEL.COM DECLIVIDADE SUPERIOR A 12% E/OU MENOR DE 150 HÁ ONDE , NÃO SE PODE EFETUAR <\ ! QUEIMA í 10% da área cortada as PERCENTAGEM DE ELIMINAÇÃO DA QUEIMA 10% da queima eliminada (2002) 20% da queima eliminada (2006)] 15° ANO 20% da área c o i t a d a 20° ANO 30% da área cortada 30% da queima eliminada (2011) 25° ANO 50% da área cortada 30° ANO 100% da á r e a cortada 50% da queima eliminada (2016) 100 % da queima eliminada (2021) Artigo 8 o - Os requerimentos para a queima devem ser protocolados até o dia 2 de abril de cada ano, na APELAÇÃO CÍVEL N° 339 5 1 3 - 5 / 7 - SANTA ADELIA - VOTO N° 13 0 5 6 \ 8 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO SEÇÃO DE DIREITO PUBLICO CÂMARA ESPEC IAL DO MEIO AMBIENTE unidade do Departamento Estadual de Proteção de Recursos Naturais - DEPRN que atender a respectiva região. § Io - A autorização será expedida: 1 - no prazo de 15 (quinze) dias úteis, a contar da data em que for protocolado o requerimento, salvo se houver exigência a ser cumprida, que deverá ser comunicada ao interessado por escrito, no prazo de 10 (dez) dias úteis, a contar da data do protocolo; 2 - no prazo de 15 (quinze) dias úteis, a contar da data do cumprimento da exigência a que se refere o item anterior; 3 - expirados os prazos constantes neste parágrafo, considera-se automaticamente concedida a respectiva autorização, independentemente de sua comunicação ou de qualquer outra manifestação da autoridade ao requerente. § 2o - O requerimento de que trata o caput deste artigo poderá ser enviado por meios de comunicação eletrônicos. Em termos de legislação, não se discute que o interesse econômico obteve j u n t o ao Governo a moratória de trinta anos, a evidenciar - de u m lado sua força persuasiva, sempre mediante a argumentação da prioridade à balança comercial, ameaça de desemprego e necessidade de alavancar o "progresso". De outro, o desinteresse em fazer valer o preceito constitucional que subordina a ordem econômica à defesa do meio ambiente 8 . Não é apenas esse o princípio fundante em desapreço. O primitivismo das queimadas constitui u m m a u uso da propriedade, que o constituinte subordinou à s u a inafastável função social 9 . Em lugar de se adequar à contemporaneidade, preferem os beneficiários dos métodos rudimentares reiterar a longeva argumentação a favor da H 9 Artigo 170, inciso VI. da Constituição da República Artigo 186, artigo 170, inciso III e artigo 5o, inciso XXIII, todos da Constituição da Republica APELAÇÃO CÍVEL N° 339 5 1 3 - 5 / 7 - SANTA ADÉLIA - VOTO N° 13 056 9 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO SEÇÃO DE DIREITO PUBLICO CÂMARA ESPECIAL DO MEIO AMBIENTE destruição da natureza. Louvam-se até mesmo em trabalhos acadêmicos, de conclusões a u m tempo singelas, de outro altamente discutíveis. Confira-se a fls. 17 da inicial [da ação direta de inconstitucionalidade ora em curso), o rol das conseqüências da interrupção do "científico" sistema da queima de palha: '1. Por exigir a mecanização do corte, causará desemprego. 2. Diminuição dos rendimentos operacionais das colhedoras e aumento do desgaste mecânico. 3. Possível aumento de perda de matéria-prima, em casos em que a máquina não esteja bem regulada para cortar a cana rente ao solo. 4. Se manual, a colheita torna-se mais difícil e perigosa em função da palha, de insetos e animais peçonhentos que antes eram í(afugentados" pelo fogo. 5. Aumento das impurezas vegetais, aumentando o custo com transporte, quando a limpeza da palha não for eficientemente realizada pela colhedora. 6. Perigo de incêndio na palha antes, durante e depois da colheita 7. Proliferação de pragas nos resíduos deixados no solo. 8. Necessidade de variedades melhores adaptadas à nova situação, o que pode exigir alguns anos de estudos e pesquisas 9. Os implementos para o cultivo e adubação deverão ser adaptados para que consigam trabalhar no solo com palha. 10. Exigências de terrenos mais bem preparados e planos, na busca do melhor rendimento operacional das máquinas. 11. Apenas 45% a 55% das terras do Estado de São Paulo são aptas a mecanização da colheita, APELAÇÃO CÍVEL N° 339 5 1 3 - 5 / 7 - SANTA ADÉLIA - VOTO N° 13 056 10 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO SEÇÃO DE DIREITO PUBLICO CÂMARA ESPECIAL DO MEIO AMBIENTE considerando a declividade de 15% e os tipos de solo do Estado'10. Dos onze argumentos, extrai-se que não se pretende investir em estratégia menos primitiva e a intenção de se transformar o Estado de São Paulo n u m imenso canavial, como se essa fora a única destinação da terra bandeirante. A leitura que se fez do preceito do artigo 225 da Constituição da República é acanhado e desconforme com a intenção do constituinte. O teor do dispositivo é de ser analisado à luz da vontade fundante. Dispõe: Artigo 225 - Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondose ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. Pela primeira vez o constituinte explicita u m direito intergeracional no texto Fundante. O zelo em relação ao meio ambiente decorre da necessidade da preservação da vida no planeta. Não são apenas os viventes os titulares desse direito, mas principalmente - as futuras gerações. Por isso é que incumbe ao Poder Público o elenco de atribuições descrito nos incisos de I a VII do artigo 225 da CF, de maneira alguma restritos à União ou ao Estado. Tanto assim, que o artigo 23 da Carta é explícito ao cometer a todas as esferas da Federação brasileira proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas11. Ora, vários municípios colhem as nefastas conseqüências dessa prática rude, que j á poderia ter sido extirpada se o avanço do agronegócio brasileiro 10 Tese de Mestrado do Engenheiro Agrônomo DANIEL BERTOLI GONÇALVES, defendida em 2001 perante o Instituto de Economia da UNICAMP, qu<: deu origem ao livro "4 Regulamentação das Queimadas e As Mudanças nos Canaxuus Paulistas". editora Rima, São Carlos, SP. 2002. p25 " Inciso VI do artigo 23 da Constituição da República APELAÇÃO CÍVEL N° 339 5 1 3 - 5 / 7 - SANTA ADÉLIA - VOTO N° 13 056 11 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO CÂMARA ESPECIAL DO MEIO AMBIENTE não se ativesse prioritariamente ao interesse do lucro, m a s tomasse a sério as determinações fundantes em relação ao meio ambiente. No caso específico da região de RIBEIRÃO PRETO, a luta contra as queimadas perdura h á quase trinta anos. A Associação Pa.u-Brasil fez u m a consulta pública com u r n a s espalhadas pelos diversos bairros e apurou que 9 8 % dos votantes eram contra as queimadas. E isso porque a população sente nos pulmões os efeitos adversos decorrentes das queimadas nos canaviíiis. A safra canavieira da região se inicia entre abril e maio e termina em novembro. Perpassa, portanto, o período de estiagem n a região. Isso causa transtornos respiratórios, principalmente em crianças e idosos, devido à presença de particulados e suspensão na atmosfera e a baixa umidade relativa. O químico PAULO FINOTTI salienta que, "não bastasse isso, o aquecimento da matéria orgânica causado pela queimada produz um fenômeno chamado piróhse, que resulta em quase uma centena de substâncias químicas, muitas delas cancerígenas"12. Embora o setor de açúcar e álcool movimente 6% do PIB e a tendência seja crescente, mercê da disseminação da tecnologia flexfuel 2 - motores de combustíveis flexíveis - o crescimento econômico não pode condenar à morte milhares de crianças e idosos. O Departamento de Saúde Ambiental da Faculdade de Saúde Pública da USP realizou u m a pesquisa em que se apurou incidência maior de doenças respiratórias em regiões de queimadas em culturas canavieiras. Essa pesquisa resultou em dissertação de mestrado de FÁBIO SILVA LOPES, cujo título "A utilização de sistemas de informação geográfica no estudo da exposição humana aos '" Em "Mais uma vez as queimadas". Jornal Tribuna de Ribeirão Preto APELAÇÃO CÍVEL N° 339 5 1 3 - 5 / 7 - SANTA ADELIA - VOTO N° 13 056 rx 12 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO CÂMARA ESPECIAL DO MEIO AMBIENTE produtos da queima da palha da cana-de-açúcar no Estado de São Paulo" não fornece a gravidade do conteúdo. Pois os dados de janeiro de 2000 a dezembro de 2004 evidenciaram a ocorrência de 22 mil internações ao ano por problemas respiratórios, detectados mais de 3 mil focos de queimadas ao ano em média naquele período 13 . É comprovado que ao serem aspirados pelas pessoas, os compostos emitidos pela queimada atingem os alvéolos e chegam até à corrente sangüínea. Desencadeiam processos inflamatórios e causam hipertensão. Estudos realizados pelos médicos MARCOS ARBEX, JOSÉ EDUARDO CANÇADO e FÁBIO LOPES, concluem no mesmo sentido: quando a u m e n t a m em 10% as partículas da queima do ar, sobem em 22% as internações de crianças e idosos. A poluição nessa região canavieira é muito maior do que a poluída megalópole da capital. E 80% das partículas s u s p e n s a s no ar vêm da queima da palha de cana 1 4 . O próprio Secretário do Meio Ambiente, o cientista JOSÉ GOLDEMBERG, j a observou ser "um absurdo fazer inúmeras exigências ambientais às indústrias do Estado, tentar melhorar a disposição de lixo e resíduos tóxicos, multar os caminhões que emitem fumaça e inspecionar os automóveis para que estes emitam menos poluentes e, simultânea e paradoxalmente, permitir a queima descontrolada da cana-de-açúcar que, em certas épocas do ano, inferniza a população de parte do Estado"15. No Brasil conduzido pela lex mercatona, não merecem divulgação as inúmeras pesquisas 11 Disponível em www usp br. acesso em 19 9 2006 MARCOS ARBEX é um dos autores de estudo desenvolvido no Laboratório de Poluição Atmosférica Experimental da Faculdade de Medicina da USP, FÁBIO LOPES é pesquisador da Faculdade de Saúde Publica da USP e JOSÉ EDUARDO CANÇADO e pesquisador do Laboratório de Poluição Atmosférica Experimental da USP O estudo foi apresentado no National Institute of Environmental Health Science e publicado no periódico cientifico Environmental Health Perspectives Dispnivel em www mackenzie br/dhim/assssona, consulta em 19 9 2006 ls Folha de São Paulo de 22 5 2002 14 APELAÇÃO CÍVEL N° 339 5 1 3 - 5 / 7 - SANTA ADELIA - VOTO N° 13 0 5 6 13 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO SEÇÃO DE DIREITO PUBLICO CÂMARA ESPECIAL DO MEIO AMBIENTE realizadas por cientistas sérios e devotados, a evidenciar os males advindos da queima da palha de cana-de-açúcar. Dentre eles, a sujeira n a s casas, no trabalho e em todas as áreas públicas; o aumento do consumo de água de abastecimento público para garantir a limpeza dos locais afetados com maior freqüência 16 . Aumento dos acidentes n a s rodovias, devido à falta de visibilidade. Influência da fumaça no uso dos aeroportos locais e risco potencial maior de acidentes aéreos. Problemas respiratórios em crianças e idosos. Interrupção dos serviços de energia elétrica por problemas causados em linhas de transmissão próximas à área da queimada. Desperdício de energia. Eliminação de animais silvestres, pássaros e outros seres. Extinção da biodiversidade. Emissão de gases prejudiciais ao ambiente. Em tese de doutorado defendida no Instituto de Biocências, Letras e Ciências Exatas da UNESP, em São José do Rio Preto, ROSA MARIA DO VALLE BOSSO constatou qualidades alarmantes de substância conhecida pela sigla HPA hidrocarboneto policíclico aromático - n a urina de cortadores de cana. Com evidências comprovadas de causar câncer, os HPAs constituem u m a família de diversas substâncias. Entre elas o naftaleno, fluoreno, pireno e benzc-pireno. Esses compostos e seus derivados podem ser encontrados em todos os compartimentos ambientais 1 7 . 6 Não e demais lembrar que toda a comunidade de RIBEIRÃO PRETO se utiliza da reserva do chamado "Aqüífero Guarany". cuja utilização e objeto de preocupação do;» quatro países que o hospedam - Argentina. Brasil, Paraguai e Uruguai O '"Jornal Nacional"* da TV Globo de 7 10 2006 noticiou que cientistas verificaram o rápido esgotamento desse manancial Ha algumas décadas, a água surgia a 30 metros de profundidade Hoje, são necessários quase 100 metro;* de perfuração para atingi-la F ha sinais desalentadores de contaminação do aqüífero, o que e trágico para o futuro brasileiro 1 ' Disponível sob o título "A polêmica do carvâozinho Queimar a palha de cana-de-açúcar e um sistema de cultivo poluente e prejudicial a saúde, aponta pesquisa da Faculdade de Saúde Publica da USP, SYLVIA MIGUEL, www usp br/|orusp/aquivo/2005/iusp738/pai?l011 htm. consulta em 19 9 2006 APELAÇÃO CÍVEL N° 339 5 1 3 - 5 / 7 - SANTA ADELIA - VOTO N° 13 056 14 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO CÂMARA ESPECIAL DO MEIO AMBIENTE Um outro trabalho acadêmico, realizado por MARY ROSA MARCHI, do Instituto de Química da UNESP de Araraquara, detectou grande volume de HPAs em amostras de poeira s u s p e n s a no ar. Para conseguir detectar as substâncias, MARY utilizou um equipamento capaz de coletar partículas inaláveis com diâmetro menor que 10 microns - equivalente à mihonésima parte do metro. Com a instalação do aparelho a 7 metros da altura do solo, n u m terreno situado a 5 quilômetros dos canaviais e a 10 quilômetros do centro da cidade, o estudo constatou u m volume de HPAs quatro vezes superior durante o período das safras, comparado à s entresafras. Empresários mais conscientes não desconhecem tais maléficos efeitos, tanto que se antecipam às exigências legais e conseguem reduzir o uso do fogo - o método mais primitivo, poluente e perigoso ainda em uso. É que a queima emite grande volume de gás carbônico - C 0 2 - gases de nitrogênio e enxofre, responsáveis pelas chuvas ácidas. O efeito estufa, j á sentido no Brasil, é agravado em virtude das queimadas. Elas ainda provocam significativas perdas de nutrientes para as plantas e facilitam a erosão e o aparecimento de ervas daninhas. Somente após a pressão popular e das ONGs contra as queimadas foi que alguns empresários se sentiram estimulados a obter tecnologias para a colheita de cana mecanizada, o que até barateou os custos de produção. De acordo com o Centro Nacional de Agrobiologia da Embrapa, a palha depositada anualmente no solo, no sistema de colheita de cana crua, varia de 10 a 15 toneladas por hectare. A queima deste material representa a perda de vários nutrientes, principalmente de nitrogênio - 30 a 60 kg por hectare - e enxofre - 15 a 25 kg por hectare. Considerados os 3,5 milhões de hectares de cana queimados e u m a produção média de 60 toneladas por hectare, são perdidos todo ano 150 mil toneladas APELAÇÃO CÍVEL N° 339 5 1 3 - 5 / 7 - SANTA ADÉLIA - VOTO N° 13 056 15 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO SEÇÃO DE DIREITO PUBLICO CÂMARA ESPEC AL DO MEIO AMBIENTE de nitrogênio e lançados n a atmosfera cerca de 64,8 milhões de toneladas de gás carbônico no mesmo período 18 . Em lugar da queima, a manutenção da palha e de subprodutos da indústria sucroalcooleira, seria possível u m dosamento mais racional de adubos. Com isso, preservar-se-ia o equilíbrio ambiental. A palha protege o solo do impacto da chuva, reduz as perdas do terreno por erosão e a temperatura da superfície do solo, pois conserva s u a umidade. Além disso, a palha serve como reserva de nutrientes, que são liberados lentamente em s u a decomposição. Toda a argumentação de feição catastrófica e terrorista dos que insistem no primitivismo das queimadas desfalece ao se constatar o resultado de estudos conduzidos por nove anos na Embrapa Agrobiologia. Constataram eles n a Usina Cruangi, em Timbaúba, no Pernambuco, produtividade 24% maior em parcelas não queimadas. A diferença entre os tratamentos a u m e n t o u com a passagem do tempo e foi 55% n a última soca. Na Usina Cruangi, a prática da colheita da cana após queima da palha foi abandonada há mais de vinte anos. Com isso, tornou-se u s u a l manter o canavial por sete socas - 8 anos - em contraste com as usinas vizinhas que, por adotarem a queima, renovam o canavial após quatro socas. Devido ao alto custo da colheita m a n u a l da cana crua, o lucro obtido com a m b a s as práticas de colheita cana crua ou queimada é aproximadamente o mesmo, considerando-se o aumento n a produtividade proporcionado pela manutenção da palha 19 ." Proibida a queima da palha de cana-de-açúcar, logrou o Ministério Público comprovar parcialmente às condutas imputadas à ré. 18 19 Disponível em www cnpag embrapa br. consulta em ll) 9 200b CLÁUDIO MARQUES, in www radiobras çov br, corsulta em 19 9 2006 APELAÇÃO CÍVEL N° 339 5 1 3 - 5 / 7 - SANTA ADÉLIA-VOTO N° 13 056 V \ 16 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO SEÇÃO DE DIREITO PUBLICO CÂMARA ESPECIAL DO MEIO AMBIENTE O parquet, embora tenha alegado que a requerida "desde a posse, utiliza fogo para limpeza de solo, preparo de plantio e colheita de cana-de-açúcar nas áreas de terras de que ê proprietária, arrendatária ou, de qualquer forma, explora"20, comprovou a prática da conduta apenas no ano de 1996 - documentação de fls. 21/48. Exceções à assertiva são as queimadas na Fazenda "São João", única sob seu domínio. A perícia realizada nesta propriedade - üs. 8 4 5 / 9 0 1 , confirmada pela prova testemunhai - fls. 1.439, demonstrou a continuidade do procedimento no período compreendido entre o ano de 1996 e a data de assinatura do laudo 25.07.2001. Indiscutível a ocorrência da queimada e circunstância extremamente relevante para a espécie - a ré sequer atendeu à normatividade permissiva que lhe permitiria a queima da palha da cana-de-açúcar. Assim, ainda se concluísse no sentido de que o decreto estadual pudesse viger sem contaminação de inconstitucionalidade, nem ao menos atender a tais preceitos a apelada atendeu. Diante da normatividade incidente e do contexto probatório, a sentença não pode subsistir. O dano foi comprovado, assim não fora e incidiria o princípio da precaução, a vedar tudo aquilo que autoriza a presunção de prejuízo, em favor das futuras gerações. A existência de vida no Planeta depende da maturidade com que o ambiente vier a ser tratado. Qualquer 20 1) Síüo "São Bento", Mun de Santa Adéha, 2) Fazenda "SanfAna", Mun de Santa Adéha, 3) Fazenda "São João", Mun de Santa Adéha, 4) Fazenda "Promissão", Mun de Santa Adéha; 5) Fazenda "Jardim Luciana", Mun de Santa Adéha, 6) Fazenda "Jardim Cristina, Mun de Santa Adéha" APELAÇÃO CÍVEL N° 339 5 1 3 - 5 / 7 - SANTA ADÉLIA VOTO N° 13 056 17 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO SEÇÃO DE DIREITO PUBLICO CÂMARA ESPECIAL DO MEIO AMBIENTE e m p r e e n d e d o r consciente saberia adotar estratégias q u e conciliassem o desenvolvimento e a sustentabilidade e n ã o malferissem a qualidade de vida d a c o m u n i d a d e atingida por s e u e m p r e e n d i m e n t o . Do exposto, confiro parcial provimento ao apelo ministerial p a r a julgar parcialmente procedente a ação civil pública movida pelo Ministério Público c o n t r a DESTILARIA SÃO GERALDO LTDA, c o n d e n a d a : a) ao c u m p r i m e n t o d a obrigação de n ã o fazer, consistente em abster-se de utilizar fogo p a r a a limpeza do solo, preparo do plantio e p a r a colheita d a c a n a - d e - a ç ú c a r , n a s á r e a s por ela cultivadas n a C o m a r c a de S a n t a Adélia, m e d i a n t e substituição desse processo arcaico por outro n ã o agressivo ao meio ambiente, sob a cominação de sanção pecuniária correspondente ao preço de 4.936 litros de álcool por alqueire em q u e for empregado o fogo como processo d e s p a l h a d o r d a cana-dea ç ú c a r , importância a reverter p a r a o F u n d o Especial de Reparação dos Interesses Difusos Lesados; b) ao p a g a m e n t o de indenização pelos d a n o s a m b i e n t a i s j á c a u s a d o s com a q u e i m a de p a l h a de c a n a - d e - a ç ú c a r n a s á r e a s localizadas n o Município de S a n t a Adélia, descritas à s fls. 2 1 / 4 8 , relativa ao a n o de 1996, n o valor correspondente ao preço de 4.936 litros de álcool por alqueire; c) ao p a g a m e n t o de indenização pelos d a n o s a m b i e n t a i s j á c a u s a d o s com a queima de p a l h a de c a n a - d e - a ç ú c a r n a Fazenda "São APELAÇÃO CÍVEL N° 339 5 1 3 - 5 / 7 - SANTA ADÉLIA - VOTO N° 13 0 5 6 18 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA D O ESTADO DE SÃO PAULO SEÇÃO DE DIREITO PUBLICO CÂMARA ESPECIAL DO MEIO AMBIENTE João", n o s termos do item "b", n o s a n o s de 1996, 1997, 1998, 1999, 2 0 0 0 e 2 0 0 1 . d) ao pagamento da^ despesas p r o c e s s u a i s e c u s t a s do process Por estes provimento ao apelo. fundamentqs</confere-se ÍATO NALINI Relator APELAÇÃO CÍVEL N° 339 5 1 3 - 5 / 7 - SANTA ADÉLIA - VOTO N° 13 0 5 6 parcial PODER JUDICIÁRIO SÃO PAULO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO CÂMARA ESPECIAL DO MEIO AMBIENTE RECURSO APELAÇÃO COM REVISÃO N 339 513 5/7-00 NATUREZA AÇÃO CIVIL PUBLICA AMBIENTAL-1 a INST N 7/1997 COMARCA APTE(S) APDO(S) SANTA ADELIA - 1 o OFICIO MINISTÉRIO PUBLICO DESTILARIA SÃO GERALDO LTDA VOTO N. 4201/07 (VENCIDO) VISTOS Contra sentença que julgou improcedente ação civil pública de natureza ambiental visando à obrigação de não fazer queima controlada no cultivo de canaviais (fls 1455/1459) apelou o Promotor de Justiça requerente alegando que houve queimada irregular, que há danos ambientais e que o Decreto estadual n 42056/97 é inconstitucional Foram apresentadas contra-razões defendendo a sentença e o Ministério Público se manifestou pelo provimento Cabe analisar as questões/proposições a que dá ensejo o conflito de interesses posto em julgamento A atividade de queima da palha da cana de açúcar é nociva ao meio ambiente (flora, fauna, ser humano) 7 A atividade de queima da palha da cana de açúcar é ilegal 7 Com relação à primeira delas, tudo indica que sim, caso contrario a legislação não exigiria sua redução gradual ate a substituição desse manejo, e as próprias empresas não se empenhariam em fazê-lo Ainda que se considere haver quem negue qualquer nocividade, ou que a tenha como tolerável, certo é que se trata de manejo que empobrece o solo, mas e mantido em razão da relação custo-benefício imediata, desde que não se leve em conta interesses outros que não o da rentabilidade no curto prazo É claro que se houvesse preocupação social de dar emprego os cortadores de cana não seriam trazidos de outros Estados para trabalhar somente por ocasião das safras e teriam mais trabalho sem a queima, onerando menos os Municípios Não obstante, esta é apenas mais uma forma de poluição, entre tantas com que APELAÇÃO COM REVISÃO N 339 513 5/7-00 - SANTA ADELIA PODER JUDICIÁRIO SÃO PAULO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO SEÇÃO DE DIREITO PUBLICO CÂMARA ESPECIAL DO MEIO AMBIENTE convivemos, e deve ser considerada a existência de política pública tendente a eliminar essa "técnica" Desta primeira, decorre a segunda questão/proposição, que divide mais os estudiosos, posto que ligada ao limite de interferência ambientai tido pelo Estado como tolerável Parece razoável admitir que as interferências na natureza não estão proibidas de modo absoluto, mas devem ser feitas de modo a não prejudicar a qualidade da vida no respectivo ecossistema Cada pess.oa, cada empresa, cada esfera de governo deve sua parcela de responsabilidade e de contribuição para assegurar não se tornem letra morta os fundamentos e objetivos traduzidos nos princípios constitucionais da dignidade humana (art 1 o , III), da construção de sociedade solidária sem qualquer forma de discriminação (art 3°, I e IV) em economia que, para assegurar existência digna (art 193), se desenvolva com observância da função social da propriedade e do dever de defesa do meio ambiente, como bem de uso comum essencial à qualidade vida presente e futura (art 170, III e VI, 186, II e 225), controlando o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem riscos (art 225, § 1 o , V) Para estabelecer o controle das atividades humanas sobre a terra, o legislador brasileiro, já no Estatuto da Terra, Lei n 4 504/64, vinculava o cumprimento da função social à conservação dos recursos; naturais (art 2o) e, no Código Florestal, Lei n 4 771/65, declarou ser bem de interesse comum qualquer forma de vegetação reconhecida de utilidade para a terra que reveste (art 1o), e proibiu o uso de fogo sem permissão específica do Poder Público (art 27, parágrafo único) Essa legislação foi recepcionada pelas Constituições Federais supervenientes A Lei Federal n 6 938/81 (Lei da Política Nacional do o Meio Ambiente), no artigo 3 , III, '"a", considera como poluição, entre outras, a atividade causadora de degradação ambiental capaz de, direta ou indiretamente, prejudicar a saúde, a segurança e o bem estar da população A Lei Federal n 8 171/91 (Lei da Política Agrícola) dispõe que a atividade agrícola está subordinada às normas e princípios de interesse público, inclusive quanto à função social e econômica da propriedade (art 2 o , I), APELAÇÃO COM REVISÃO N 339 513 5/7-00 - SANTA ADELIA PODER JUDICIÁRIO ° SÃO PAULO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO SEÇÃO DE DIREITO PUBLICO CÂMARA ESPECIAL DO MEIO AMBIENTE e que é objetivo da política agrícola proteger o meio ambiente, garantir seu uso racional e estimular a conservação e a recuperação dos recursos naturais" (art 3o, IV e art 4 o , IV) E a Lei Federal n 8 629/93 (Lei da Reforma Agrária) dispõe que a função social da propriedade rural implica utilização adequada dos recursos naturais e preservação do meio ambiente pela manutenção das características próprias do meio natural e da qualidade dos recursos ambientais, com vistas ao equilíbrio ecológico local e à saúde e qualidade de vida das comunidades próximas (art 9o, II e § 3o) Como se vê, qualquer atividade potencialmente lesiva ao meio ambiente e à saúde pública está sujeita ao controle da Administração Pública, que se fará nos limites estabelecidos pela Constituição Federal para a legislação ambiental, ou seja, à Administração cabe controlar o emprego de técnicas e métodos que importem riscos Ao Estado compete, pois, impedir que o dano se consume (art 225, § 1 o , V da CF), valendo-se do princípio da precaução Nenhuma lei ou norma administrativa pode permitir a consumação do dano E o dano restará consumado se houver degradação ambientai pela alteração adversa das características do meio ambiente (art 3o, II, Lei n 6 938/81), alteração desfavorável da biota (idem, art 3o, III, "c"), emissão de matérias ou energia fora dos padrões estabelecidos (art 3o, III, "e"), ou prejuízo para a saúde e o bem estar da população (art 3o, III, "a") O Decreto Federal n 2 661/98 regulamentou o parágrafo único do artigo 27 da Lei n 4 771/65 permitindo utilização de fogo para queima controlada em práticas agropastons e florestais mediante prévia autorização de órgão do Sistema Nacional do Meio Ambiente - SISNAMA e impôs eliminação gradativa em áreas passíveis de mecanização da colheita de cana de açúcar, pela redução mínima de um quarto da área de declividade inferior a doze por cento, ou mesmo superior, se tida como mecanizável, a cada cinco anos, exceção feita às lavouras de até 150 ha (art 3o e 16) E o Decreto n 3010 de 30 03 99 proibiu a queima a menos de mil metros de centro urbano, ou de quinhentos metros de seu perímetro APELAÇÃO COM REVISÃO N 339 513 5/7-00 - SANTA ADELIA PODER JUDICIÁRIO SÃO PAULO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO SEÇÃO DE DIREITO PUBLICO CÂMARA ESPECIAL DO MEIO AMBIENTE Com estes parâmetros, o Poder Executivo Federal estabeleceu limites de tolerabilidade temporal e espacial, a partir dos quais os órgãos da Administração Pública devem cuidar de evitar danos, atuando preventivamente e/ou repressivamente A propósito, cabe observar que o Código Florestal não cuidava somente de florestas e vegetações nativas e sua redação atual não deixa dúvidas sobre isto nem padece de vício de (m)constitucionahdade No Estado de São Paulo, aprimorando o tratamento dado à questão pelas Leis n 997/76, n 841/93 e n 6 171/88 e pelos Decretos n 8 468/76, n 28 848/88 e n 28 895/88, a Constituição Estadual (art 191/216), a Lei n 8 421/93 e a Lei n 9 509/97 (Lei da Política Estadual do Meio Ambiente) reforçaram o dever/direito à preservação do equilíbrio ecológico e à qualidade do meie ambiente e, depois do Decreto n 42 056/97 (que revogou o Decr n 28 895/88 e alterou o Decr n 41 719/97), a Lei n 10 547, de 02 05 2000, publicada em 03 05 2000, e objeto de veto do Governador rejeitado pela Assembléia Legislativa, disciplinou o emprego de fogo em práticas agrícolas mediante controle da Secretaria do Meio Ambiente ou órgão ou instituição por ela designado, como órgão do SISNAMA, para apreciar a "Comunicação de Queima Controlada", e estabeleceu o mesmo critério do Decreto Federal n 2 661/98 para eliminação gradativa dessas queimadas Posteriormente, o Decreto Estadual n 45 869 de 22 06 01 regulamentou a Lei n 10 547/2000, impondo a redução mínima de 25% das áreas mecanizáveis e de 13, 35% das não mecanizáveis desde então e a cada cinco anos, progressivamente, sendo que a partir de 2003 deveria ser observada distância mínima de mil metros do centro de qualquer aglomeração urbana, ou de quinhentos metros do perímetro urbano, e exigiu prévia comunicação à unidade regional do Sistema Estadual de Administração da Qualidade Ambientai - SEAQUA (DEPRN, CETESB, Polícia Florestal/Corpo de Bombeiros), vedando queima de área contínua superior a 500 ha Para queima da palha de cana de açúcar, exigiu autorização ambiental a ser requerida até 15 de janeiro de cada ano A constitucionahdade desse decreto, que estabeleceu restrições APELAÇÃO COM REVISÃO N 339 513 5/7-00 - SANTA ADELIA Ç- PODER JUDICIÁRIO SÃO PAULO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO CÂMARA ESPECIAL DO MEIO AMBIENTE além das constantes da lei regulamentada, foi questionada também pelos sindicatos das indústrias de fabricação de açúcar e álcool Valem, agora, a Lei Estadual n 11 241 de 16 09 02, que estabeleceu cronograma de redução para eliminação total da queima até o ano 2021 para áreas mecanizáveis (terrenos acima de 150 ha com declividade até 12%) e 2031 para não mecanizáveis, e o Decreto n 47 700/03 De se considerar, então, que a legislação federal e a estadual proíbem a queima de palha de cana de açúcar sempre que esta puder se mostrar lesiva ao meio ambiente ou à saúde pública A regra geral era e é a proibição, excepcionada nos casos em que o controle estatal admita essa queima como não danosa, com os parâmetros legais pertinentes E o Poder Público estabeleceu, bem ou mal, critérios para admitir a queima não lesiva ao meio ambiente e à saúde pública Pode ser considerada arbitrária e sem fundamento a permissão incondicional da queima em áreas de até 150 ha, assim como a previsão de omissão do órgão administrativo como equivalente a permissão tácita De um modo ou de outro, não se pode deixar de reconhecer que alguma queima poderia ser autorizada, se tida como não danosa pela Administração Pública, e que a petição inicial não aponta descumpnmento de regra administrativa Por outro lado, não é incumbência do Poder Judiciário estabelecer os limites de tolerabilidade da intervenção no meio ambiente, vale dizer, assumir o dever estatal de controle das atividades de risco Há necessidade de legislação e de normatização administrativa e as existentes não se mostram inconstitucionais, ante a impossibilidade de fixação pelo Poder Judiciário do limite de intervenção aceitável No acórdão relativo à Ação Rescisória n 373 280 5/1-00 (Primeiro Grupo de Câmaras de Direito Público, rei Des Demóstenes Braga) este Tribunal, em 16 08 05, considerou constitucional a legislação estadual aplicável a queima APELAÇÃO COM REVISÃO N 339 513 5/7-00 - SANTA ADELIA ( / PODER JUDICIÁRIO SÃO PAULO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO SEÇÃO DE DIREITO PUBLICO CÂMARA ESPECIAL DO MEIO AMBIENTE de palha de cana de açúcar (Lei n 997 de 31 05 76, Decreto n 8 468/76 e Decreto n 41 719 de 16 04 97 com a redação do Decreto n 42 056 de 06 08 97) e não liberou a empresa interessada das providências de mecanização do plantio e cumprimento da Lei Estadual n 10 547/2000 e do Decreto n 45 869 de 22 06 01 que a regulamentou Por fim, não há prova de que a Administração Pública Estadual esteja descumpnndo a legislação federal ou estadual e admitindo a queima sem pedido ou autorização formal com avaliação do impacto ambiental Ante o exposto, por meu voto nega-se provimento à apelação, mantendo-se a sentença por seus próprios fundamentos ANTÔNIO C e l ã o AGÜfLAR G0RTEZ 4 ° iUIZ(VENCIDGrj7 APELAÇÃO COM REVISÃO N 339 513 5/7-00 - SANTA ADELIA