PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5.ª REGIãO
TRF/fls. ____
Gabinete do Desembargador Federal Marcelo Navarro
APELAÇÃO CÍVEL (AC) Nº 522043/PE (0000515-27.2010.4.05.8304)
APTE : INCRA - INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA
AGRÁRIA
REPTE : PROCURADORIA REGIONAL FEDERAL - 5ª REGIÃO
APDO : JOSE AUGUSTO FREIRE E CôNJUGE
ORIGEM
: 20ª VARA FEDERAL DE PERNAMBUCO (COMPETENTE P/
EXECUçõES PENAIS) - PE
RELATOR : DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO NAVARRO
RELATÓRIO
O
Senhor
DESEMBARGADOR
FEDERAL
MARCELO
NAVARRO: Apelação do INCRA em face da sentença de fls. 112/124, a qual
extinguiu, sem resolução de mérito, processo de desapropriação por interesse
social promovido em detrimento de JOSÉ AUGUSTO FREIRE E CÔNJUGE.
Alegou o apelante: a) invalidade da decisão recorrida por à sua prolação não
preceder manifestação do Ministério Público Federal; b) o art. 68 do ADCT,
bem como os arts. 215, §1º, e 216, §1º, da Lei Fundamental, seja pelas suas
literalidades, ou pelo seus conteúdos, devem ser interpretados como
dispositivos hábeis para, isoladamente, permitirem o ajuizamento de ação de
desapropriação por interesse social, não obstante a inexistência de previsão
expressa na Lei 4.132/62; c) é patente o interesse social tendente à
regularização fundiária de remanescente quilombola, para fins de reforma
agrária.
Não houve contrarrazões.
O MPF apresentou parecer opinando pelo não provimento da
apelação.
É o relatório.
AC nº 522043-PE
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JDGM
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APTE : INCRA - INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA
AGRÁRIA
REPTE : PROCURADORIA REGIONAL FEDERAL - 5ª REGIÃO
APDO : JOSE AUGUSTO FREIRE E CôNJUGE
ORIGEM
: 20ª VARA FEDERAL DE PERNAMBUCO (COMPETENTE P/
EXECUçõES PENAIS) - PE
RELATOR : DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO NAVARRO
VOTO
O
Senhor
DESEMBARGADOR
FEDERAL
MARCELO
NAVARRO: O cerne do presente recurso reside em saber se é possível
utilizar-se da Lei 4.132/62 para justificar desapropriação em favor dos
quilombolas.
Entendo merecer reforma a sentença recorrida. Vejamos.
De logo, rejeito a alegação de nulidade da sentença. Não há
dispositivo legal que exija que o magistrado, ao despachar a petição inicial,
tenha a obrigação, em caso de entender que a hipótese é de rejeição de sua
liminar, tenha de promover a prévia intimação do Ministério Público Federal.
Tal raciocínio, com maior razão, deve ser aplicado quando a demanda não é
daquelas submetidas ao procedimento disciplinado pela Lei Complementar
76/93, na qual, às escâncaras, o seu art. 18, §2º, prevê a intervenção do
Ministério Público Federal antes das respectivas decisões.
Passamos ao exame do mérito.
Não posso desconhecer que o juiz sentenciante, em decisão com
sólida motivação, procurou homenagear o princípio da legalidade em sede
expropriatória, a exigir a existência de norma legal que, explicitamente,
consagrasse a medida extrema em favor de quilombolas como razão de
interesse social, o que não consta no elenco do art. 2º da Lei 4.132/62.
Não se pode olvidar que o art. 215, §1º, da Constituição, prevê
que o Estado protegerá as manifestações culturais afro-brasileiras, havendo,
em complemento, a indicação da desapropriação como instrumento para que o
Poder Público possa cumprir a sua finalidade no plano cultural.
Por outro lado, a desapropriação em causa, que pode incidir
sobre imóvel produtivo (STF, Pleno, MS 22.193 –SP), foi promovida para a
consecução da finalidade social do art. 2º, III, da Lei 4.132/62, que se refere
ao estabelecimento e a manutenção de colônias ou cooperativas de
AC nº 522043-PE
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povoamento e trabalho agrícola. Ao assim prever, o legislador, que, em
nenhum instante, traçou distinção, não limitou quem seriam os beneficiários
com a distribuição dos lotes ou parcelas, nada impedindo que, em se tratando
o imóvel em causa de sítio detentor de reminiscência histórica dos antigos
quilombos, tal venha beneficiar comunidade quilombola, principalmente porque
a Lei 12.288/2010, de caráter específico, é capaz de afastar a incidência do
art. 5º da Lei 4.132/62.
Plenamente satisfeita, no caso concreto, harmonização da
pretensão de expropriar com a legalidade (art. 37, caput, CF).
Nesse diapasão, seguem julgados desta Egrégia Corte:
APELAÇÃO. DESAPROPRIAÇÃO POR INTERESSE SOCIAL.
SÍTIO QUILOMBOLA. APLICABILIDADE DA LEI 4.132/62.
PROVIMENTO.
I –O art. 215, §1º, da Lei Maior, prevê que o Estado deverá
proteger a cultura afrobrasileira, o que poderá ocorrer mediante o
instrumento da desapropriação.
II –A ação de desapropriação em comento foi ajuizada com
fundamento no art. 2º, III, da Lei 4.132/62 (estabelecimento de
colônia ou cooperativa de povoamento ou trabalho agrícola), não
havendo nada que impeça que os beneficiários da medida
venham a ser integrantes de comunidade quilombola,
principalmente porque a Lei 12.288/2010, de caráter específico, é
capaz de afastar a incidência do art. 5º do primeiro dos diplomas
legais citados.
III –Apelo provido.
(AC 526257-PE, 4ª T, Rel. Edilson Nobre, unânime DJe
26/03/2012)
ADMINISTRATIVO. DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA. ÁREA
REMANESCENTE DE QUILOMBOLA. INDENIZAÇÃO DEVIDA.
FIXAÇÃO DO PREÇO JUSTO.
1. Agravo retido não conhecido, uma vez não requerida a sua
apreciação no apelo, conforme previsto no art. 523, parágrafo 1º,
do CPC.
2. Para a propositura da ação, faz-se necessário que a inicial
contenha, dentre outras exigências, a narração do fato e os
fundamentos do pedido (art. 282, III, CPC), sendo desnecessária
a indicação do texto de lei, no qual se fundamenta a ação e sua
indicação errada não importa em julgamento ultra petita, se o juiz,
ao julgar a causa, indica a lei corretamente. Amolda-se ao caso o
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brocardo mihi factum et dabo tibi jus (dá-me o fato, que eu te dou
o direito).
3. A jurisprudência pátria vem abonando o entendimento
albergado na sentença, de modo a conciliar tanto os direitos dos
proprietários privados no que toca à indenização pela
transferência da propriedade, quanto os direitos dos quilombolas
com relação ao resguardo da posse dos seus remanescentes.
4. Os juros moratórios, na desapropriação, devem levar em
consideração a regra prevista no art. 15-B do Decreto-Lei nº
3.365/41.
5. Juros compensatórios nos moldes do entendimento firmado
pelo STF na ADIN 2.332/DF, que suspendeu o termo "até seis
por cento ao ano" constante do art. 15-A do aludido Decreto
(aplicando-se, portanto, o percentual indicado na Súmula 618 do
Pretório Excelso).
6. Apelação e remessa oficial improvidas.
(APELREEX 4766/PE, Rel. Luiz Alberto Gurgel, unânime, DJe
22/03/2012) Grifou-se.
Com essas considerações, dou provimento à apelação, para que
a demanda expropriatória prossiga regularmente, cabendo ao magistrado
apreciar o pleito de imissão na posse.
É como voto.
Recife, 14 de junho de 2012.
Desembargador Federal MARCELO NAVARRO
RELAT O R
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RELATOR : DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO NAVARRO
EMENTA: CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. INCRA.
DESAPROPRIAÇÃO POR INTERESSE SOCIAL. SÍTIO
QUILOMBOLA.
APLICABILIDADE
DA
LEI
4.132/62.
POSSIBILIDADE.
1. Apelação do INCRA em face da sentença que indeferiu a
petição inicial, extinguindo o processo sem julgamento do mérito
(art. 267, VI, do CPC).
2. O Estado deverá proteger a cultura afrobrasileira, o que poderá
ocorrer mediante o instrumento da desapropriação. Inteligência
do art. 215, §1º, da CF.
3. A ação de desapropriação foi ajuizada com fundamento no art.
2º, III, da Lei 4.132/62 (estabelecimento de colônia ou
cooperativa de povoamento ou trabalho agrícola), inexistindo
impedimento para que os beneficiários da medida venham a ser
integrantes de comunidade quilombola. Precedentes desta Corte.
4. Apelação provida.
ACÓRDÃO
Decide a Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª
Região, por unanimidade, dar provimento à apelação, nos termos do voto do
relator, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes nos autos, que
ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Recife, 14 de junho de 2012.
Desembargador Federal MARCELO NAVARRO
RELAT O R
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