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Gestão da escola, gestão do conhecimento: desafios e
possibilidades
Edison Luiz Saturnino1
Resumo: O texto apresenta um conjunto de problematizações discutidas na oficina intitulada “Gestão
da escola, gestão do conhecimento: desafios e possibilidades”, ministrada no XVI Fórum Internacional
de Educação, no município de Osório, Rio Grande do Sul. Partindo do pressuposto que o ambiente
escolar é um espaço constituído nas relações de poder e fortemente marcado pelo embate dos
diferentes discursos que o constituem, o trabalho procura demonstrar que as condições de produção
de conhecimentos no âmbito da escola situam-se em uma zona de fronteira que extrapola os
interesses pedagógicos, articulando em seu entorno questões políticas, administrativas, econômicas,
sociais, culturais, educativas. A partir da apresentação de um panorama a respeito dos diversos
problemas e desafios que fazem parte do dia a dia das escolas contemporâneas, o texto assume um
tom prescritivo e busca explicitar uma série de ações a serem assumidas por professores e gestores,
sugerindo caminhos que contribuam para qualificar as propostas pedagógicas de nossas instituições
de ensino, bem como tornar melhor os processos educativos e as relações humanas que nelas se
estabelecem cotidianamente.
Palavras-chave: Gestão escolar. Gestão do conhecimento. Cotidiano escolar. Formação de
professores.
Abstract: The text presents a set of inquiries discussed in the workshop entitled "Gestão da escola,
gestão do conhecimento: desafios e possibilidades", during the XVI Forum of Education, in Osorio
City, Rio Grande do Sul State. Assuming that the school environment is a space constituted in power
relations and strongly marked by the clash of different discourses that constitute it, the paper
demonstrates that the conditions of knowledge production within the school are located in a zone that
extrapolates the border of teaching interests, articulating in its surrounding political, administrative,
economic, social, cultural, educational. From the presentation of an overview on the various problems
and challenges that are part of everyday life of contemporary schools, the text assumes a tone
prescriptive and seeks to clarify a series of actions to be undertaken by teachers and administrators,
suggesting ways that contribute to describe the educational proposals of our educational institutions,
as well as make better educational processes and human relations that are established in them daily.
keywords: School management. Knowledge management. School routine. Teacher training.
Introdução
Gostaria de iniciar nossa conversa formulando uma simples pergunta: por que um
evento destinado a discutir teorias, saberes, práticas e fazeres em educação reserva
uma de suas atividades para colocar em debate as relações que podem ser
estabelecidas entre a gestão da escola e a gestão dos conhecimentos que circulam
nas instituições de ensino?
A resposta mais plausível, entre tantas outras, seria a de que a gestão ou a
produção de conhecimentos se constitui como um dos fundamentos centrais do
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Licenciado em História, Mestre e Doutor em Educação/UFRGS. Professor da Faculdade Cenecista
de Osório.
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processo educacional escolar. Isto me parece indiscutível. Entretanto, outro dado ou
outra perspectiva de análise talvez justifique melhor a minha intervenção neste
evento: aqui estou tentando chamar a atenção para que, embora se constitua como
um dos fundamentos centrais do processo educacional escolar, a gestão do
conhecimento não acontece de maneira desarticulada de questões que estão no seu
entorno, como as de caráter político, administrativo, econômico, social, cultural e
mesmo pedagógico.
Então, é neste espaço onde a gestão do conhecimento converge (ou diverge) com
todas estas questões que pretendo situar minha fala. Cabe enfatizar que o campo de
articulação entre a produção do conhecimento e as questões antes referidas se
constitui como um espaço de lutas, de conflitos e de embates, caracterizado que
está pelas relações de poder que se produzem não só nos ambientes escolares,
mas também na sociedade como um todo.
Dito isto, espero que minhas palavras contribuam para avivar estas discussões e, no
limite, contribuam também para que a gestão dos conhecimentos em nossas
instituições educacionais resulte cada vez menos afetada negativamente pelas
nefastas disputas partidárias e ideológicas que, muitas vezes, invadem de modo
indevido os espaços escolares.
Pretendo, então, de maneira simples, direta e propositiva, apresentar aos gestores
educacionais e aos demais professores aqui presentes, desafios a serem vencidos e
possibilidades de ação a serem assumidas, ficando esta oficina caracterizada como
uma contribuição para qualificar, cada vez mais, a educação que é oferecida no
Litoral Norte do Rio Grande do Sul.
Dos desafios...
Um dos primeiros desafios que se impõe é o de articular a gestão do conhecimento
às exigências políticas e administrativas a que estão submetidas as redes públicas
de ensino, pois quem estabelece relações estreitas com a escola bem sabe das
dificuldades de se priorizar as questões pedagógico-educacionais em meio às
práticas paternalistas e corporativistas que tomam conta das administrações depois
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de uma eleição municipal. Interesses partidários, acomodações de cargos e
indicações políticas dificultam sobremaneira a construção de um projeto pedagógico
consistente e qualificado. Não são raras as vezes em que a escolha do Secretário de
Educação e de sua equipe pedagógica acontece muito mais para atender a
conveniências partidárias e eleitoreiras do que propriamente pela competência e
qualificação profissional daqueles que passarão a desempenhar as funções
públicas. Em outros casos, os cargos a serem ocupados nas secretarias municipais
de educação são divididos entre todos os partidos que formaram a coligação que
elegeu o prefeito da cidade, sem falar nos interesses político-partidários dos
membros que compõem as equipes diretivas das escolas. Por aí já se pode
compreender o tamanho do problema...
Priorizar as múltiplas possibilidades de produção e gestão de conhecimento dentro
de uma lógica econômico-social que tem se mostrado cada vez mais excludente,
classificatória e autoritária é outro desafio a ser superado pelos gestores. Aqui estou
falando das dificuldades de se constituir uma proposta pedagógica séria e
consistente em um contexto social no qual os governos insistem em não realizar os
investimentos necessários a uma gestão escolar qualificada, pois ao mesmo tempo
em que se cobra “eficiência” dos sistemas de ensino, percebe-se a diminuição das
verbas a serem aplicadas neste setor. Escassez de recursos, má aplicação daqueles
que existem e falta de políticas públicas são problemas sérios que afetam as redes
escolares. Também poderia destacar a discrepância entre as instâncias que criam
as leis e aquelas que as cumprem, discrepância esta que estabelece um perigoso
jogo de “empurra-empurra” para determinar sobre qual esfera de poder recai a
responsabilidade para que tais leis sejam cumpridas satisfatoriamente.
Dois exemplos atuais do que estou falando podem ser demonstrados pela inclusão
obrigatória das disciplinas de Filosofia e Sociologia nos currículos de Ensino Médio e
pela ampliação do Ensino Fundamental para nove anos. Quem cria as leis? Quem
as executa? Quem fiscaliza? Quem é responsável pela formação dos professores?
Quem vai fomentar a discussão pedagógica para que essas importantes construções
não cheguem em nossas escolas caracterizadas como ruínas? Muitas redes
municipais simplesmente ampliam o ensino fundamental para nove anos, sem
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discutir as dimensões e implicações teóricas, metodológicas, comportamentais e
cognitivas que esta mudança comporta.
Um outro desafio a ser assumido é o de administrar a diferença entre as rápidas
transformações mundiais provocadas pelas inovadoras tecnologias de produção, de
comunicação e de informação e as lentas mudanças que se operam nos sistemas de
ensino. E isso não é pouca coisa! Vou contar uma pequena historinha, que me
chegou pela Internet e por isso mesmo nem sei a quem devo creditar a autoria, que
ilustra o que quero dizer.
Conta a história que em pleno XX, um professor do século passado voltou a
sua cidade e ficou abismado com o que viu. As casas altíssimas, as ruas
pretas, passando umas sobre as outras, com uma infinidade de máquinas
andando em alta velocidade. O povo falava muitas coisas que o professor
não conhecia (poluição, avião, rádio, metrô, televisão...); os cabelos de
umas pessoas pareciam com os do tempo das cavernas... e as roupas
deixavam o professor ruborizado. Muito surpreso e preocupado com a
mudança, o professor visitou a cidade inteira e a cada vez compreendia
menos o que estava acontecendo. Na igreja, levou um susto com o padre
que não mais rezava em latim, com o órgão mudo e um grupo de cabeludos
tocando uma música estranha. Visitando algumas famílias, espantou-se
com o ritual depois do jantar: todos se reuniam durante horas para adorar
um aparelho que mostrava imagens e emitia som. Cada vez mais
desanimado, foi visitar a escola e, finalmente, sentiu um grande alívio,
reencontrando a paz. Ali, tudo continuava a mesma coisa como ele havia
deixado: as carteiras uma atrás da outra, o professor falando, falando... e os
alunos escutando, escutando, escutando...
Se trago esta alegoria não é em hipótese alguma para jogar mais uma culpa sobre
os já carregados ombros dos professores e gestores escolares. Conto esta pequena
história para chamar a atenção de que as tecnologias de informação chegam muito
lentamente à escola e quando alcançam o espaço escolar elas não são, na maioria
das vezes, aproveitadas de maneira significativa para qualificar o processo de
ensino-aprendizagem. Isto quer dizer que o desafio dos gestores não se reduz
unicamente à aquisição e instalação de computadores nas escolas, mas também
proporcionar uma formação continuada aos docentes, que precisam se familiarizar
com as tecnologias, convencer-se de sua importância e aprender a fazer um fecundo
uso didático-pedagógico destas ferramentas. Caso contrário, não adianta nos
queixarmos depois, de que a escola não consegue concorrer com a linguagem da
televisão, do vídeo-clipe, da internet, do msn, do facebook, etc..., etc..., etc...
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Outro desafio proposto aos gestores, que merece ser encarado como prioridade, é a
retomada da necessária discussão sobre as finalidades da escola contemporânea e
da importância dos saberes e conhecimentos que nela são produzidos. Esta
discussão torna-se particularmente difícil porque nossa sociedade parece ter como
referência única a concepção moderna de escola, o que nos leva a deduzir
equivocadamente que ela sempre se organizou a partir das mesmas formas e
conteúdos através dos quais a conhecemos hoje. Esta forma de pensar, baseada no
senso comum, dificulta a compreensão de que se as escolas nem sempre se
estruturaram da maneira como hoje se apresentam, então estas instituições podem
tornar-se algo diferente do que são atualmente, relacionando-se de diferentes
maneiras com a sociedade, ensinando outros conteúdos, construindo outros
conhecimentos, perseguindo outros objetivos, enfim, configurando-se a partir de
fundamentos pedagógicos, educacionais, políticos e culturais diferentes daqueles
que regem os sistemas de ensino atualmente. Aqui tento chamar a atenção para a
necessidade de se compreender as instituições escolares a partir de sua
historicidade, compreensão esta que tende a avivar constantemente a discussão
sobre a escola que se tem e a escola que se quer construir na contemporaneidade.
Instalar uma consistente reflexão sobre a dimensão ética dos atos de ensinar e
aprender e, no limite, problematizar a dimensão ética que envolve a gestão do
conhecimento nos ambientes escolares é outro desafio que os gestores necessitam
reconhecer de extrema importância. Aqui seria interessante retomar algumas
perguntas que nos acompanham desde longa data: o que se ensina? Para quem se
ensina? Como se ensina? Por que se ensina? Quem ensina? De que lugar ensina?
Consideradas muito gastas e velhas na opinião de alguns, estas perguntas são, no
meu entendimento, questões importantíssimas para que as redes de ensino
consigam atualizar satisfatoriamente suas propostas pedagógicas.
A este conjunto de perguntas poderíamos acrescentar um outro: o que se aprende?
Como se aprende? Por que se aprende? Quem aprende? De que lugar se aprende?
Por certo que as tentativas de respostas a estes dois conjuntos de questionamentos,
desde que embasadas em estudos teóricos sérios e acompanhadas de ações
políticas responsáveis, muito tem a contribuir com a produção de práticas educativas
pautadas pela ética e pelo respeito, práticas estas que merecem ser vivenciadas
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tanto dentro da escola quanto fora dela, na tentativa de tornar melhor a sociedade
contemporânea, oportunizando ao sujeito que com ela se relaciona a possibilidade
de aprender a operar transformações em si mesmo, seja este considerado um dos
principais objetivos da educação.
Ainda falando sobre desafios e dificuldades, gostaria de dizer que é tarefa dos
gestores em educação instrumentalizar a instituição escolar para receber os jovens e
acolher suas práticas culturais, reconhecendo e valorizando os conhecimentos que
as culturas juvenis produzem. A impressão que tenho é que, por força da lei, as
escolas se prepararam para receber os jovens, sendo óbvia a constatação de que
atualmente temos muito mais jovens nas escolas do que tínhamos há trinta anos
atrás. Entretanto, estas instituições não estão criando as condições necessárias para
acolher adequada e positivamente as práticas culturais dos jovens nem estão
conseguindo reconhecer a heterogeneidade que a condição juvenil comporta na
atualidade.
De um ponto de vista muito pessoal, quero dizer que os vinte anos já vividos na
escola pública me fazem considerar os jovens a partir de um olhar dividido entre a
preocupação e o encantamento. Preocupação porque habitualmente a juventude é
associada a problemas e riscos sociais, sua condição é vista como uma fase a ser
superada rapidamente e não são raras as vezes que vejo pais e professores
enfatizando os aspectos negativos dos jovens, esses “aborrescentes” que insistem
em nunca crescer. Encantamento porque, apesar das condições adversas, os jovens
conseguem superar estas dificuldades, continuam demarcando seus territórios e
construindo suas subjetividades de maneira encantadora. E mais que isso,
continuam acreditando, e nos fazendo acreditar, na utopia e na possibilidade de um
mundo melhor. Parece-me claro que professores e gestores não podem se subtrair
desta discussão.
Das possibilidades...
Aproveitando o título da oficina e procurando emprestar à nossa conversa um tom
mais perspectivo, pretendo agora apresentar aos professores e gestores escolares
algumas possibilidades de ação, na tentativa de colaborar para que os desafios
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discutidos anteriormente sejam encarados e vencidos de maneiras as mais
satisfatórias possíveis. Por certo que o tempo disponibilizado na oficina não me
permite uma explanação muito ampla, o que me faz ser econômico nas palavras e,
de maneira muito pontual, indicar caminhos para qualificar as propostas
pedagógicas de nossas escolas, bem como tornar melhor os processos educativos e
as relações humanas que nelas se estabelecem cotidianamente.
Em primeiro lugar, é tarefa dos gestores em educação a elaboração de políticas
públicas e procedimentos sistemáticos que possibilitem e priorizem a formação
continuada dos segmentos que fazem parte da comunidade escolar. E aqui não falo
de uma formação descompromissada e protocolar, realizada para gastar os recursos
disponibilizados pelo Ministério da Educação, nem falo de uma formação por demais
ansiosa, apressada em transformar, de uma hora para outra, professores
conservadores em arautos da pós-modernidade. Há que se efetivar uma política de
formação capaz de possibilitar aos professores a problematização de seus
procedimentos pedagógicas, levando-os à reflexão sobre o que devem manter e o
que precisam abandonar em suas práticas docentes. Aqui talvez seja interessante
evocar o velho Paulo Freire, quando afirma que ninguém se torna educador numa
terça-feira, às quatro e meia da tarde, o que equivale a dizer que quanto mais o
professor discutir e refletir sobre sua prática pedagógica, maiores serão as
possibilidades de torná-la melhor.
Neste sentido, a formação continuada dos professores é imprescindível. Ela merece
acontecer a partir de seminários objetivando discutir temáticas mais amplas no
campo da educação como também a partir de encontros onde possam ser
problematizadas as questões específicas de cada área de conhecimento. Se
partirmos do pressuposto de que se tornar cidadão, homem, mulher, estudante, pai,
mãe, profissional, etc., faz parte dos processos de aprendizagens construídos pelos
homens em condições históricas específicas, então as redes de ensino podem
prever nos seus calendários letivos encontros de formação com toda a comunidade
escolar, constituindo estes encontros como oportunidades onde possam ser
abordadas temáticas relevantes para os contextos culturais dos quais as escolas
fazem parte. Também é interessante que os gestores educacionais não se
descuidem e ofereçam formações específicas para os membros dos conselhos
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escolares, para os integrantes das assessorias e coordenações pedagógicas, para
os vigias, para as merendeiras, para o pessoal que atende na biblioteca, para o
pessoal que atende na secretaria e para todos aqueles que, de uma maneira ou
outra, participam dos processos educativos proporcionados pelas instituições.
Desenvolver projetos pedagógicos e culturais pautados por protagonismos infantil e
juvenil deve ser outro compromisso a ser assumido pelos gestores escolares. Mas
para privilegiar estes protagonismos é importante que a escola compartilhe com os
estudantes a tarefa de organizar e administrar os eventos culturais e pedagógicos.
Como ilustração ao que estou tentando dizer pode-se tomar como exemplo uma
atividade bastante comum em nossas escolas que é a festa junina. Geralmente o
envolvimento dos alunos restringe-se à coleta de brindes, à venda de votos e,
quando muito, à participação em uma gincana com algumas atividades culturais.
Aqui cabe enfatizar que a dimensão educativa de um evento como este resulta muito
mais consistente a partir da decisão de incluir os alunos em todas as etapas da
festividade, isto é, desde o seu planejamento até a decisão final de como serão
aplicados os recursos obtidos com o evento. Isso só para citar um exemplo.
Também é necessário propiciar visibilidade aos trabalhos elaborados pelos alunos
através de exposições, feiras e mostras culturais organizadas nos espaços
institucionais e também em âmbito municipal. Publicações de livros feitas a partir de
materiais produzidos pelos alunos são sempre convenientes.
Por outro lado, é importante proporcionar visibilidade aos projetos e trabalhos bem
sucedidos desenvolvidos pelos professores das redes públicas de ensino. E que isso
não seja feito para premiar quem faz e castigar quem ainda não consegue ou não
tem interesse em fazer. Essa prática pode muito bem funcionar como uma política
de incentivo, buscando convencer os docentes da necessidade e também da
importância da renovação e transformação de suas práticas pedagógicas. Neste
sentido, torna-se oportuno possibilitar que os professores também sejam os
protagonistas de parte dos dias de formação, através de eventos onde eles possam
mostrar as virtudes de seu trabalho e o que nele vem se destacando nos processos
de ensino e aprendizagem.
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A composição de equipes de assessoria educacional qualificadas e competentes,
comprometidas com o projeto pedagógico proposto pelos governos municipais, é
outra condição para o sucesso de qualquer proposta pedagógica. Por mais que a
montagem destas equipes obedeça a conveniências políticas, e mesmo políticopartidárias, é imprescindível que os sujeitos que delas participam apresentem
conhecimento, convicção e domínio sobre a proposta pedagógica do município. E
isso só se consegue com formações qualificadas, seminários de leituras dirigidas,
reuniões periódicas e acompanhamento sistemático do cotidiano das escolas.
É necessário construir e vivenciar uma cultura educativa que tome por tarefa a
transformação de dificuldades em possibilidades, de modo a superar a “pedagogia
da queixa”. Alunos queixam-se que os professores não sabem ministrar boas aulas;
professores reclamam que os alunos são indisciplinados; professores também
reclamam da falta de uma formação continuada e, quando ainda encontram forças,
reclamam dos baixos salários. Setores da sociedade reclamam da baixa qualidade
da educação oferecida em nossas escolas, gestores queixam-se da falta de recursos
financeiros para investimento nas instituições e governos argumentam que não há
dinheiro suficiente para resolver a situação. Este parece ser o diagnóstico de nossas
redes de ensino atualmente. E aqui não estou minimizando a intensidade destas
dificuldades, sugerindo que são irrelevantes ou que simplesmente não existem. O
que chamo a atenção é que esta “pedagogia da queixa” não deve funcionar como
um entrave nem pode inviabilizar a busca de soluções para os problemas
enfrentados pela escola contemporânea.
Discutir constantemente as estruturas e os pressupostos curriculares que compõem
o projeto político-pedagógico das Secretarias Municipais de Educação, de modo a
tornar o currículo relevante para a vida daqueles que com ele estão envolvidos,
constitui-se como outra tarefa que os gestores não podem abrir mão. Antes de tomar
o currículo como algo dado e indiscutível, baseado unicamente no conteúdo estático
dos livros didáticos ou naquelas antigas listagens de conteúdos mínimos, é
necessário compreendê-lo como o conjunto de todas as experiências de
conhecimento proporcionadas aos estudantes. É necessário entender os currículos
como constructos provisórios e flexíveis, que merecem ser constantemente
discutidos e transformados, a partir dos contextos históricos onde são vivenciados. É
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importante, ainda, considerar o currículo também a partir de suas dimensões éticas e
culturais, que em nenhum momento estão desvinculadas das relações de poder e
dos regimes de verdade de um determinado tempo e lugar.
Nestas discussões curriculares, os gestores não podem se descuidar da
implementação de projetos pedagógicos e sociais destinados a valorizar e incentivar
a leitura e a escrita, tendo em vista que os atos de ler e escrever devem tornar-se
compromisso de todas as áreas de conhecimento.
Certamente que as propostas pedagógicas resultarão mais satisfatórias se os
gestores investirem na efetivação de políticas públicas e projetos pedagógicos que
priorizem o respeito às diferenças e reconheçam as múltiplas identidades sociais e
culturais que fazem parte da constituição dos sujeitos na contemporaneidade.
Sabemos que a concepção de sujeito privilegiada na pós-modernidade é aquela que
o considera em sua multiplicidade e pluralidade, relacionada aos diversos lugares
que ocupa, não sendo entendido na perspectiva de um sujeito unitário, essencial,
centrado e coerente. Sabemos também que a cada momento os estudantes são
interpelados por uma infinidade de discursos e apelos midiáticos que os levam a
produzir identidades múltiplas e provisórias. Neste sentido, é oportuno perguntar de
que maneira a escola está se preparando para lidar com essas subjetividades? De
que maneira a escola está se preparando para lidar com essas identidades culturais
que, de certa forma, ela ajuda a produzir? Segundo Alfredo Veiga-Neto (2002), o
pensamento pós-moderno nos coloca em cenários de múltiplos propósitos e
múltiplas razões. Então aqui cabe mais uma provocação: como a escola se prepara
para lidar com esta diversidade? Como a escola se prepara e que importância ela
assume na formação de sujeitos nestes cenários de múltiplos propósitos e múltiplas
razões?
Propor às redes municipais de ensino um sistema de avaliação interna das
instituições escolares, como forma de colaborar com as mudanças e transformações
necessárias à melhoria dos processos educacionais constitui-se como outra medida
que pode se mostrar eficiente para qualificar as propostas pedagógicas. E aqui nada
que se aproxime do controle extremo, do autoritarismo e da sindicância. Muito pelo
contrário, este pode ser um mecanismo interessante para que as escolas se
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conheçam melhor, construindo um diagnóstico sobre seu funcionamento, suas
virtudes, suas carências e dificuldades, ficando o poder público municipal
encarregado de, conjuntamente com as instituições, encontrar os encaminhamentos
adequados para os problemas apresentados.
É necessário reconhecer as dificuldades enfrentadas pelo professor que está na
escola, refém de uma carga de trabalho muitas vezes excessiva, com uma formação
continuada deficiente, ministrando aulas para diferentes séries e níveis de ensino. É
necessário também compreender que ele sozinho, ou no pequeno grupo,
dificilmente vai conseguir reunir força e disposição suficientes para enfrentar todas
as dificuldades relacionadas ao cotidiano da escola. Neste sentido, é tarefa dos
gestores em educação, a partir do lugar institucional que ocupam, agirem de
maneira propositiva para a efetivação dos projetos educacionais e para a solução
das dificuldades evidenciadas nas redes públicas de ensino.
Para concluir, desejo reafirmar que minha fala não se constituiu como uma tentativa
de fornecer receitas ou modelos prontos, mas muito mais como uma contribuição às
discussões realizadas neste vasto e complexo campo que atuamos, que é o da
educação. Quero lembrar as palavras de José Machado Pais (2003), para quem o
procedimento de levantar questões é uma tarefa fácil quando comparada com a
carga de trabalho que representa tentar dar-lhes resposta. Que tenhamos, todos
nós, o fôlego, o entusiasmo e o desassossego necessário para que nossas
respostas ultrapassem o nível conceitual e transformem-se em ações concretas para
construir uma educação pública cada vez mais ética, competente e solidária.
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