LUCIMARA FRAGA ANDRADE DA SILVA INSTRUMENTOS QUE FACILITAM O ENSINO DE ÁLGEBRA NA SÉTIMA SÉRIE NO PROJETO EJA (EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS) Criciúma, 2004. 2 LUCIMARA FRAGA ANDRADE DA SILVA INSTRUMENTOS QUE FACILITAM O ENSINO DE ÁLGEBRA NA SÉTIMA SÉRIE NO PROJETO EJA (EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS) Monografia apresentada à Diretoria de PósGraduação da Universidade do Extremo Sul Catarinense – UNESC, para a obtenção do título de especialista em Educação Matemática. Criciúma, 2004. 3 DEDICATÓRIA À minha mãe querida e ao meu pai tão amoroso. 4 AGRADECIMENTOS Agradeço a Deus, provedor de todas as graças, por me conceder a conclusão de mais esta etapa. Agradeço ao meu esposo Facione pelo apoio e pelo companheirismo, indispensáveis ao meu sucesso. 5 RESUMO Na pesquisa, envolvemos alunos de sétima série do ensino fundamental do projeto E.J.A. (Educação de Jovens e Adultos) na Escola Municipal de Ensino Fundamental Nossa Senhora de Fátima no município de Santo Antônio da Patrulha, RS. O nosso objetivo é proporcionar aos alunos um ensino de álgebra de maior qualidade e aos professores, mais uma oportunidade de formação. Procuramos identificar e analisar os resultados de alguns instrumentos aos quais nos valemos da geometria, que são usados para facilitar o ensino de álgebra em comparação ao estudo de álgebra sem estes instrumentos, a não ser quadro e giz. Metodologicamente, fundamentamos a pesquisa na aplicação destes dois modos de ensino de álgebra de sétima série. Três momentos marcaram a dinâmica da pesquisa. Um deles diz respeito ao referencial teórico que é sobre: os modos de ensino, as tendências, o desenvolvimento do pensamento algébrico. O segundo momento foi marcado pela busca de dados, por meio da aplicação dos dois modos do ensino de álgebra, o modo de ensino associado com a geometria e o modo de ensino dissociado com a geometria. Por último, fizemos análise dos resultados obtidos, verificando o modo de ensino que conseguimos melhores resultados, nos quais tenha mais significado; e analisamos também a opinião dos alunos sobre o trabalho realizado. É consensual que se aprende álgebra do modo mais sistemático e desconexado com a geometria, mas onde associamos o estudo de álgebra com a geometria, o tornamos com maiôs sentido, significado e de maior abrangência de apreensão do conteúdo pelos alunos. 6 SUMÁRIO INTRODUÇÃO............................................................................................7 1. REFERENCIAL TEÓRICO......................................................................9 1.1. Tendências históricas do ensino de álgebra .......................................9 1.2. Aspectos históricos da álgebra...........................................................10 1.3. Concepções de Álgebra ....................................................................14 1.4. Concepções da educação algébrica .................................................16 1.5. Pensamento Algébrico ......................................................................17 1.6. Funções do ensino de álgebra...........................................................18 1.7 Relação entre álgebra e geometria.....................................................19 1.8. Como ensinar álgebra........................................................................20 1.9. Ensinar álgebra com geometria..........................................................20 1.10. O que é mais importante: álgebra ou geometria?............................23 1.11. Alguns modos de ver e conceber o ensino de matemática no Brasil...........................................................................................................................23 1.12. Dificuldades e erros dos alunos.......................................................28 1.13. Propostas para o ensino de álgebra................................................30 2. INTEGRANDO ÁLGEBRA E GEOMETRIA...........................................33 CONSIDERAÇÕES FINAIS......................................................................40 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..........................................................42 7 INTRODUÇÃO Ensinar álgebra através da geometria é algo já estudado e socializado, mas muitos professores têm muita insegurança em ensiná-la utilizando a geometria. Muitos alunos de sétima série entendem e passam a dominar a álgebra ensinada de forma tradicional, ao contrário de muitos outros. Estes, últimos, ficam à margem, frustrados com a matemática. Assim, os professores levam os alunos a pensar que a álgebra não serve para nada. Claro que isso não é culpa exclusiva dos professores. Nós, professores, precisamos de uma formação continuada. Pois, eu acredito, que o ensino de álgebra através da geometria não ocorre porque muitos professores não dominam a geometria, e assim não conseguem associá-las. Por isso, pretendo dar a contribuição ao ensinar desenvolvendo este tema que tenta integrar a geometria no estudo da álgebra. Para muitos educadores é necessário que se trabalhe o conteúdo de forma global, por isso, a álgebra e a geometria devem seguir a mesma trajetória. A maioria dos estudantes decora uma série enorme de regras que, para eles, não lhes dizem nada, a não ser, um amontoado de números e letras. Ao contrário da álgebra, a geometria é bem mais aceita. Os alunos têm mais afinidade com as figuras geométricas, pois eles vivenciam no seu cotidiano. Então percebi que seria muito mais interessante se esses ramos da matemática fossem estudados de forma integrada. No entanto, os livros de matemática do ensino fundamental apresentam os conteúdos de geometria e álgebra separadamente. Com isso, os alunos da escola pública, dificilmente aprendem geometria, pois este conteúdo é o último a aparecer em quase todos os livros didáticos. 8 No presente trabalho, pretendo demonstrar que a geometria e a álgebra estão muito ligadas, não se negando, é claro, que a abordagem específica em cada um desses ramos, é muito importante. Trabalhando esses conteúdos juntos, os alunos passam a ver o conhecimento como um todo, fazendo relações entre os mesmos. Estou realizando este estudo para me aprofundar neste tema e auxiliar os demais professores a procurar sanar este problema com seus alunos, dando maiores oportunidades para que um maior número de alunos dominem e entendam a álgebra. E o mais importante, que a tornem concreta e usual. Ao contrário de como a álgebra é tratada: abstrata e sem sentido. 9 1. REFERENCIAL TEÓRICO 1.1. Tendências históricas do ensino de Álgebra Fiorentini (1996) evidencia três tendências no ensino da álgebra: 1º - Lingüístico-pragmática: o papel do ensino da álgebra é fornecer um instrumento técnico (superior ao da aritmética) para a resolução de equações ou de problemas equacionáveis. Enfatiza o domínio prévio da linguagem do cálculo literal através de muitos exercícios que capacitam os alunos no manejo das expressões algébricas. 2º - Fundamentalista-estrutural: o ensino da álgebra é fornecer os fundamentos para a matemática. 3º - Fundamentalista-analógica: procura fazer uma síntese entre as duas anteriores, pois recupera o valor instrumental da álgebra e preserva a preocupação fundamentalista só que não através de propriedades estruturais, mas sim do uso de modelos analógicos geométricos (blocos de madeira ou mesmo figuras geométricas) ou físicos (como a balança) que visualizem ou justificam as passagens do transformismo algébrico. Essa concepção acredita que uma “álgebra geométrica” por tornar visível certas identidades algébricas, seria didaticamente superior a qualquer forma de abordagem estritamente lógico-simbólico. Para Fiorentini (1996), o pensamento algébrico se desenvolve gradativamente, antes mesmo da existência de uma linguagem algébrica simbólica, sobretudo quando a criança: - estabelece relações/comparações entre expressões numéricas; - produz mais de um modelo aritmético para uma mesma situação problema; - transforma ou cria expressões aritméticas em outras mais simples; 10 - desenvolve/cria uma linguagem mais concisa ou sincopada ao expressar-se matematicamente. 1.2. Aspectos Históricos da Álgebra O termo “álgebra” vem do árabe “al-jabr” que significa restauração e refere-se à transposição de termos para o outro lado da equação. Os egípcios, por volta do século VII, ainda não conheciam as equações. Os indícios do conhecimento algébrico se referem à regra de três simples. Atribuíram valores desconhecidos, falsos, na busca da solução do problema, que mais parecia uma receita sem nenhuma justificativa. Isso não satisfazia os matemáticos da época. A geometria, que se apresenta hoje nos livros didáticos e, conseqüentemente, abordada em situação escolar tem como base geometria. Euclidiana, criada por volta do século III a.C. por estudiosos da época e publicada por Euclides através de vários livros denominados de Os Elementos. O mesmo tipo de sistematização não ocorreu com a álgebra. A álgebra utilizada nos ensinamentos de Euclides, no centro de ensino e pesquisa de Alexandria, era muito diferente da que ensinamos e aprendemos hoje nas escolas. Os gregos da época não utilizavam letras para representar quantidades desconhecidas, e sim figuras geométricas planas. Para ilustrar, a notação atual, a², segundo Baumgart (1992) era representado pelo desenho de um quadrado. A preocupação, na época, era em obter visualização concreta das notações algébricas. A maior parte dos problemas da álgebra babilônica foi refeita por Euclides ficando denominada como álgebra geométrica de Euclides. A insistência na resolução de certos tipos de problemas, como base nas limitações da álgebra geométrica de Euclides, impediu que os matemáticos gregos fizessem uma ligação entre a álgebra geométrica de Euclides e as notações algébricas utilizadas hoje. Só por volta do século IV d.C. é que começou a surgir os primeiros símbolos matemáticos, na cidade de Alexandria. 11 Foi no ano 250 que Gregos Diofantinos criaram uma notação algébrica que se aproxima um pouco da usada na atualidade. Mesmo sendo preferência dos matemáticos gregos o estudo da Geometria, Diofanto, por volta do século III d.C., seguindo os métodos dos antigos babilônicos, deu inicio ao simbolismo moderno. Foi o primeiro matemático que introduziu um símbolo para a incógnita, além de fazer algumas abreviações (abreviações e não símbolos), na resolução de problemas e operações, evitando o estilo da álgebra retórica, em que as expressões são escritas totalmente em palavras, para a álgebra vêm escritas em palavras e outras são abreviadas. Com a destruição do museu de Alexandria, pouco se conhece de suas produções, o que temos hoje do trabalho de Diofanto, foi os poucos livros transportados para a Europa, traduzidos e divulgados pelos matemáticos europeus. Os adeptos da terceira leitura do desenvolvimento da álgebra, a qual fizemos referência anteriormente, defendem que a álgebra teve início com Diofanto, pois ele, foi o primeiro a utilizar um símbolo literal para a incógnita e, sobretudo, por ter sido o primeiro a utilizar uma linguagem mais concisa e específica para expressar o pensamento algébrico. Por volta do século XI, os matemáticos hindus, como Bhaskara, por exemplo, tinham uma certa admiração e preferência pelos números de valores elevados.Um dos métodos mais utilizados por eles na resolução de problemas foi a regra de inversão, em vez do uso de um simbolismo ou linguagem corrente. Partiam da resposta do problema e iam utilizando operações inversas àquelas apresentadas, sem recorrer a qualquer simbologia. Da mesma forma, resolviam as equações de segundo grau de uma forma visual, completando quadrados. A fórmula geral para solução de equação do segundo grau, a qual conhecemos como fórmula de Bhaskara, não foi deduzida por ele, e sim pelo matemático hindu, Sridhara no século XI. Segundo Garbi (1997), Bhaskara apenas eternizou seu nome. Uma das dificuldades enfrentadas pelos matemáticos da época na fórmula de Bhaskara, foi com as raízes quadradas de números negativos. A passagem da álgebra sincopada para álgebra simbólica, que são as equações representadas por símbolos como temos hoje, foi um processo longo, 12 inclusive social da época e a destruição de alguns centros de estudos com seus acervos. Nesse sentido, vale salientar que parte dos livros escritos pelos gregos na cidade de Alexandria se converteu em prêmio de guerra. Por isso, muitos deles foram transportados para Bagdá, e traduzido para a língua árabe, por volta do ano 833. Essa transferência, faz com que as pesquisas em matemática voltem a avançar, desta vez, pelos árabes, seguidores de Maomé. Tais pesquisas ocorreram no centro de ensino chamado a casa da sabedoria pelo mais destacado matemático árabe de todos os tempos: Mohamed ibn Musa al-Khowarizmi. Seu livro de destaque, foi Hisab al-jabr Wa-almuqabalah, que em português significa Livro sobre as operações restauradoras e redutoras ou em equilíbrio. Segundo Gueli (1992), é um modelo de livro didático: uma exposição direta e clara das equações, explicando minuciosamente cada passagem, do início ao fim. Porém, todos esses avanços ainda não foram suficientes para representar as equações totalmente em forma de símbolos. Para Babini (1996), o único progresso importante realizado desde a época dos babilônicos só aconteceu no século XVI, pelos matemáticos italianos, que foi a resolução algébrica das equações de terceiro e quarto graus. François Viète (1540-1603), é reconhecido pelos adeptos a quarta leitura da história da álgebra, anteriormente anunciada, como fundador da álgebra, embora ainda utilizasse um estilo sincopado. Ele foi um dos principais responsáveis pelos passos mais decisivos para a introdução dos símbolos na matemática que, até então, eram utilizados apenas para representar quantidades desconhecidas. Também desenvolveu o calculo com letra para representar valores conhecidos, com idéias usuais da aritmética e da geometria. Passou a representar a incógnita por uma vogal, a palavra “mais” por “p” e “menos” por “m”; porém, ainda utilizava algumas palavras como “área” para quadrado, “cubo” para a terceira potência e a expressão “é igual a”. A álgebra de Viète foi aperfeiçoada e consolidada pelo matemático e filosofo francês René Descartes (1596-1650). Assim como também foi o primeiro a escrever e estudar as equações através de expressões gerais. Ele criou a notação para expoentes, usou as primeiras letras do alfabeto a, b, c, ... Para os coeficientes 13 da incógnita e os termos independentes e as últimas x, y, z,... Para representar as incógnitas. Outros três matemáticos que contribuíram, no século XVIII, para o salto do desenvolvimento das equações foram Euler, Lagrange e Gaus. Euler vale ser mencionado, pois por ser considerado o consolidador da simbologia moderna das quais muitas ainda são utilizadas na atualidade como é o caso do “i”, significando a unidade imaginária no campo dos complexos, raiz quadrada de –1. Gaus formula e demonstra o teorema fundamental da álgebra, o qual afirma que toda equação polinomial de coeficientes reais ou complexos tem, no campo complexo, pelo menos uma raiz. O último grande salto do desenvolvimento da álgebra, segundo Lins e Gimenes (1997) aconteceu entre 1811 a 1940, por Galois, depois por Abel e, posteriormente, por Bourbaki que desenvolveram a noção da estrutura algébrica. Com isso, atinge-se a plena abstração e a álgebra se torna totalmente independente da aritmética e da geometria. Baumgart (1992) apresenta o desenvolvimento histórico das notações algébricas através de alguns exemplos de 1545 a 1693 como apresentamos a seguir: MATEMÁTICO Cardano (1545) Bombelli (1572) Viète (1591) Harriot (1631) Descartes (1637) Wallis (1693) FORMA ANTIGA FORMA MODERNA 14 Percebe-se, pois, que a álgebra, em sua origem, está limitada às equações, ou ainda a ciência das equações. Com seu desenvolvimento essa definição foi se tornando limitada, pois surgiram várias outras, intimamente ligadas a visões e percepções de mundo, de matemática e de educação matemática. Sua história influencia diretamente na forma como vem acontecendo a educação algébrica. Portanto, conhecê-la é condição necessária para entendermos a atual realidade, e dar subsídios para fazer uma profunda reflexão sobre a evolução do pensamento algébrico como uma forma de entender as dificuldades de aprendizagem dos alunos. Muitas vezes, o que o que consideramos erro ou falta de atenção dos alunos no processo de aprendizagem em situação escolar, é uma dificuldade histórica, ou seja, tem uma certa aproximação com aquelas que o homem teve no desenvolvimento de um determinado conceito. Cabe aos professores identificar tais dificuldades e planejar atividades pedagógicas, com intuito de evitar e superar as mesmas. 1.3. Concepções de Álgebra Fiorentini, Miguel e Miorin (1993), e Usiskin (1995) são autores que tentam explicitar as várias concepções de álgebra, educação algébrica e pensamento algébrico. Tais concepções têm contribuído para que os professores as socializem, muitas vezes de forma inconsciente, em sua prática pedagógica. São elas que determinam o modo dos alunos entender a álgebra e seu interesse ou não pela mesma. Fiorentini, Miguel e Miorin (1993) com base em textos de história da Matemática destacam as seguintes concepções de álgebra: 1) Processológica: também concebida como um estudo de procedimentos. A álgebra é um conjunto de fórmulas, com passos padronizados (sexiste uma forma de resolver) a serem seguidos na resolução de problemas equacionáveis, ou seja, aqueles que a aritmética por si só, não dá conta. O 15 pensamento algébrico existe independentemente de uma forma específica de linguagem que o expresse. 2) Lingüístico-estilística: possui uma linguagem própria, que foi elaborada por um grupo de especialistas com propósitos de representar, de forma resumida, o pensamento algébrico e seus procedimentos aos quais fizemos referência na concepção anterior. Tal concepção está mais preocupada com a representação simbólica do que com idéias e significações que caracterizam o pensamento algébrico. 3) Lingüístico-sintático-semântica: nesta concepção a álgebra se apresenta como na anterior, com uma linguagem particular, precisa e resumida, onde o poder criativo e instrumental não reside propriamente em sua linguagem aprimorada, mas sim por se apresentar de forma organizada e significativa. É mais rigorosa que a linguística-estilística uma vez que, para adquirir o caráter produtivo, o poder de transformação e de instrumentalização deve atingir o nível mais elevado de uma linguagem verdadeiramente simbólica, peculiar. O poder está nas letras e nos símbolos. Sua função pedagógica é ser instrumento de resolução de problemas. 4) Lingüístico-Postulacional: a álgebra é concebida como uma linguagem simbólica, cujos símbolos são compreendidos em seu nível máximo de abstração e generalização. Com uma estrutura geral, comum e com domínio sobre todos os conceitos matemáticos, surge para facilitar a resolução de problemas. Usiskin (1994) fez um estudo sobre as concepções de álgebra que permeia o ensino fundamental e observou que elas têm ligações com significados das letras ou variáveis e das operações com as mesmas. O autor evidencia as seguintes concepções: 1) Aritmética generalizada: Concebe as variáveis como generalização de modelos aritméticos, ou seja, como instrumentos para descrever situações matemáticas com superioridade sobre a língua materna, preservando as propriedades válidas para a aritmética. As instruções-chave são traduzir e generalizar. 16 2) Meios de resolver problemas: é a tradução de uma situação problema da linguagem escrita para uma linguagem algébrica. Neste caso, as variáveis são incógnitas ou constantes, tendo como instruções-chave a simplificação e a resolução. 3) Estudo de relação entre grandezas: fundamentalmente algébrica, é composta por leis e modelos matemáticos operacionais que representam a relação entre grandezas que variam. É nesta concepção que realmente aparece as noções de variáveis dependente e independente, como também de domínio e imagem de uma função. 4) Estudo das estruturas: a álgebra é vista como estudo das estruturas como monóide, grupo, anel e corpo. Embora essa idéia de estrutura não esteja muito presente no ensino médio e fundamental, mesmo assim, ela se apresenta implicitamente nas propriedades que são atribuídas às operações com números reais e polinômios. A concepção de variável não está vinculada a uma relação ou função, nem atua como uma incógnita. Ou seja, a variável não é um argumento. Nesse caso, a ênfase passa a ser os símbolos algébricos, como por exemplo, os polinômios e as técnicas abstratas de resolução/manipulação, sem qualquer resquício numérico, sem um modelo aritmético a ser generalizado. 1.4. Concepções de educação algébrica Novamente recorremos a Fiorentini, Miorin e Miguel (1993) que estudaram as várias formas de ensinar álgebra que se apresentaram ou ainda estão presentes nas escolas. Destacam três tendências: 1) Lingüístico-pragmática: nessa concepção a álgebra é considera da instrumento de resolução de problemas e equações. A aprendizagem se dá de forma mecânica através de uma seqüência de transformações algébricas que, posteriormente, são aplicadas na resolução de problemas artificiais, sem contextualização, sem análise com materiais didáticos, ou modelos didáticos. E tem como base a concepção algébrica lingüístico-sintático-semântica. 17 2) Fundamentalista estrutural: teve seu auge simultaneamente ao Movimento da Matemática Moderna, fundamenta-se na concepção lingüísticapostulacional de álgebra. Decorrente dessa concepção, houve uma reorganização na abordagem e na seqüência dos conceitos algébricos em situação escolar, comparada com a concepção Lingüístico-pragmática. Acreditava-se que uma justificativa lógica para cada passo das resoluções algébricas, facilitaria a identificação e, conseqüentemente, a aplicação nas diferentes situações de necessidade. A álgebra passa a ser considerada como fundamentadora da organização curricular da matemática escolar, tendo como base a teoria dos conjuntos, os campos numéricos e as propriedades que constituem as estruturas algébricas. 3) Fundametalista-analógica: concilia as duas concepções anteriores resgatando o valor instrumental da álgebra, com a justificativa lógica de cada passo nas resoluções algébricas. Também é considerada como instrumento de resolução de problemas com base na concepção lingüístico-sintático-semântica. O visual geométrico é utilizado para facilitar o processo de aprendizagem, assim como o uso das leis do equilíbrio físico (por exemplo, balança de dois pratos para resolução de equações), superando assim abordagens estritamente lógico-simbólicas. 1.5. Pensamento Algébrico Existe uma grande diferença entre pensar algebricamente, aritmeticamente e geometricamente, cada um desses pensamentos possuem características próprias, mas, necessariamente, um contribui para p desenvolvimento do outro, ou seja, estão interligados. O pensamento algébrico, considerado por Vygotski, o nível máximo de abstração e generalização do pensamento matemático, deve ser priorizado na escolarização. De acordo com Lins e Gimenes (1997) não existe um consenso referente ao que seja pensar algebricamente e sim aos conceitos algébricos. Para eles, o pensamento algébrico é um modo de produzir significado para a álgebra, que não 18 pode ser reduzido apenas a uma noção abstrata e extremamente genérica, incluir também, as manipulações formais carregadas de significados. Segundo Firentini, Miorin e Miguel (1993) a possibilidade de manifestação do pensamento algébrico não ocorre só no sistema conceitual matemático, mas nas diversas áreas do conhecimento, que pode se manifestar através da linguagem natural, da aritmética, da geometria e da linguagem das notações algébricas. A diferença entre o pensamento aritmético e o algébrico, para Fiorentini (2001), é que o pensamento algébrico é genérico e a expressão dentro de uma linguagem mais generalizada, tendo como um dos conceitos fundamentais a igualdade e não o x ou o y, tão usual no senso comum educacional: as letras são apenas álgebra simbólica. Já o pensamento aritmético se reduz a uma resposta final, ele tende reduzir a um valor único, a um resultado físico. É característico do pensamento aritmético a frase “o resultado é”. Ela não tem um sentido algébrico e se torna um obstáculo para o ensino da álgebra. 1.6. Funções do ensino de álgebra Para Fiorentini (1996), as funções do ensino da álgebra são: - Álgebra como aritmética generalizadora: as instruções chaves para o aluno, são traduzir e generalizar. Trata-se de técnicas importantes, não só para a álgebra, mas também para a aritmética. As letras aparecem como números gen´ricos quaisquer, não assumindo o significado de incógnita, nem de variável. - Álgebra como um estudo de procedimentos para resolver certos tipos de problemas: as variáveis são incógnitas ou constantes. Enquanto as instruções-chave no uso de uma variável como generalizadora de modelos são traduzir e generalizar, simplificar e resolver; “simplificar” e “resolver” são às vezes dois nomes diferentes para a mesma idéia. - Álgebra como estudo de relações entre grandezas variáveis: uma variável é um argumento (isto é, representa os valores do domínio de uma função). As letras assumem significados de variáveis. 19 - A álgebra como estudo das estruturas: as letras aparecem como objetos arbitrários como se fossem sinais no papel, isto é, símbolos arbitrários sem nenhuma referência numérica. 1.7. Relação entre álgebra e geometria Para Bigode (2000), a linguagem algébrica ganha grande impulso tanto na história quanto na escola quando aplicada à geometria. No presente trabalho a linguagem algébrica é utilizada para expressar perímetros e área de figuras planas; baseando a aprendizagem de coisas “novas” no conhecimento e na compreensão que os alunos já tem. As mentes dos alunos não são tábuas rasas, quando eles começam o primeiro ano de álgebra, além de já terem conhecimentos adquiridos em cursos anteriores de matemática, os alunos já tem muita crença e preceitos sobre álgebra. O professor ao introduzir os cálculos algébricos com a geometria, não deverá ter receio em voltar ou explorar temas já vistos, entendendo como investimento geométrico e resultados algébricos positivos. Primeira é a utilização “concreta” das letras para representar números e assim, um bom ponto de partida para o conceito geral de variável. O conceito de área e as fórmulas associadas serão necessárias em muitos problemas algébricos em etapas posteriores do curso. A geometria métrica proporciona uma boa parte para um trabalho inicial, pré-álgebra, com experiências de resolução de perímetro, área e volume. Proporciona uma melhor compreensão dos cálculos algébricos, uma vez que os alunos, ao longo de sua história escolar, em matemática, utilizam as letras em variadas situações e contextos, porem raramente eles tem consciência dos diferentes significados a elas. Para Bigode (2000) é comum cometerem erros e se confundirem com letras que ora representam incógnitas (a letra estática) ora representam variáveis (a letra dinâmica). É importante ressaltar que o professor tem um papel fundamental na 20 criação de tarefas e de um contexto de atividades e discussões que possam guiar a participação do aluno e no processo de construção de conhecimento. 1.8. Como ensinar álgebra? Na década de noventa, as professoras: Claudia Lisete Oliveira Groenvald, Maristela de Quadros Albé, Rosmari Irma Klaus e Vera Kern Hoffmann, se uniram para cria uma metodologia para desenvolver os conteúdos de sétima série trabalhando a geometria interligada com a álgebra. Esta metodologia procura ligar a lógica matemática necessária à compreensão da álgebra junto com a criatividade através de problemas orientadores que sejam envolventes e interessantes ao aluno, abordando os conteúdos através da redescoberta. As atividades induzem o aluno a pensar, envolver-se, tirar conclusões, generalizar. Os alunos concluem as regras sem a explicação formal do professor e, ao compreenderem, acham o estudo mais fácil e prazeroso. Além disso, as atividades são desenvolvidas com os alunos desenhando, pintando, recortando, tirando conclusões, e não, apenas, resolvendo exercícios. A importância de trabalhar geometria e álgebra interligando conceitos justifica-se porque a geometria é um assunto do interesse do aluno e serve como motivação para o desenvolvimento dos conteúdos, desde que tenha um enfoque prático e que o professor parta de situações concretas da vivencia do aluno, sendo a abstração e o uso de símbolos uma conseqüência do trabalho desenvolvido, dando oportunidade para a descoberta e o amadurecimento de conceitos. Desenvolvida assim a geometria não apresenta dificuldades para os alunos, pois eles estão constantemente em contato com ela. O aluno deve, sem dificuldades, conseguir transferir a linguagem matemática utilizada na geometria para a sua utilização na álgebra. 1.9. Ensinar álgebra com a geometria. 21 Segundo Baratojo (1990), quando os estudantes chegam às portas do estudo de álgebra, em geral, enfrentam duas grandes dificuldades: o problema da abstração e o da generalização. A maioria dos alunos decora uma série de regras, o que torna a álgebra, uma disciplina odiada. Para eles, são um amontoado de números e letras que não lhes dizem nada. Baratojo (1990), diz que foi através de observações de fatos concretos que o levou através de algo, como a geometria, que já fosse familiar ao aluno, e viesse a facilitar não só a iniciação do estudo da álgebra mas, também, consolidar os seus conhecimentos geométricos. Assim, sugere a iniciação ao estudo da álgebra utilizando conhecimentos da geometria já estudados nas séries anteriores como segmento de retas, perímetro e áreas. O autor propõe que inicialmente, pediríamos ao aluno para traçar dois segmentos de retas quaisquer. Podendo dizer que a medida de um segmento é “a” e a do outro é “b”. Então pediríamos para o aluno unir os dois segmentos. Provavelmente o aluno chegaria a conclusão que o resultado seria ( a + b), desta forma levaríamos o aluno à idéia de binômio, trinômio ( a + b + c) e assim sucessivamente. Baratojo (1990), nos diz também que com os segmentos de retas poderíamos mostrar ao aluno a diferença entre monômios. 22 O autor também faz demonstrações de multiplicações de binômios e divisão de monômios. Vemos que a área total do retângulo ABCD é (a + b) . (c + d); isto é, multiplicação de dois binômios. Estudando as áreas dos retângulos que completam o retângulo ABCD, teríamos: Logo: (a + b) . (c + d) = ac + ad + bc + bd. Da mesma forma pode-se apresentar a divisão de monômios pela geometria. Por exemplo, dividir 9x ² por 3x. Podemos representar o 9x ² como sendo a área de um quadrado de lado 3x, isto é: Logo o outro lado deveria ser também, 3x. Então: 9x ² : 3x = 3x Para apresentar o caso de fatoração colocando um termo comum em evidência, o autor propõe usar dois retângulos de lados “a” e “b” e “c” respectivamente. 23 Veríamos que a . b + a .c = a . (b + c). 1.10. O que é mais importante: álgebra ou geometria? Fiorentini (1992), abordando esta temática, nos pergunta o que é mais importante no ensino da matemática, a álgebra ou a geometria? Ele diz que atualmente o estudo da álgebra foi abandonado. Isto não significa que desapareceu dos livros didáticos, mas sim ausência de reflexão crítica sobre esse ensino. Pois analisando o modo como os professores trabalham a álgebra; de forma mecânica, enfatizando simplesmente a memorização, regras, símbolos e expressões como ocorria há várias décadas, mostra que o seu ensino não tem recebido a devida atenção. Segundo Fiorentini (1992), a geometria tende a desempenhar, cada vez com mais freqüência, um papel subsidiário na construção de conceitos e na visualização de propriedades aritméticas e algébricas. As conseqüências do movimento modernista foram muitas, vários autores matemáticos ressaltam apenas o abandono do ensino da geometria. Fiorentini (1992) pensa diferente, ambos sofreram prejuízos, pois o ensino da álgebra necessita de uma reavaliação. Notamos que a álgebra é uma disciplina de difícil compreensão e necessita de algo para facilitar o seu estudo, como a inclusão da geometria. Como vimos estes dois conteúdos possuem vários pontos em comum o que ajudaria muito a aprendizagem do aluno. 1.11. Alguns Modos de ver e conceber o ensino da matemática no Brasil 24 O estudo das relações/interações que envolvem a tríade aluno-professorsaber matemático é hoje reconhecido como um dos principais projetos da investigação em Educação Matemática. embora o papel da investigação seja elucidar aspectos da dinâmica dessa tríade, tal elucidação tem como eixo fundamental a transformação qualitativa, ainda que nem sempre imediata ou direta, do ensino/aprendizagem da Matemática. Há, entretanto, diferentes modos de conceber e ver a questão da qualidade do ensino da Matemática. Alguns podem relacioná-la ao nível de rigor e formalização dos conteúdos matemáticos trabalhados na escola. Outros, ao emprego de técnicas de ensino e ao controle do processo ensino/aprendizagem com o propósito de reduzir as reprovações. Há ainda aqueles que a relacionem ao uso de uma matemática ligada ao cotidiano ou à realidade do aluno. Ou aqueles que colocam a Educação Matemática a serviço da formação da cidadania. Por trás de cada modo de ensinar, esconde-se uma particular concepção de aprendizagem, de ensino, de Matemática e de Educação. O modo de ensinar sofre influência também dos valores e das finalidades que o professor atribui ao ensino de matemática, da forma como concebe a relação professor-aluno e, além disso, da visão que tem de mundo, de sociedade e de homem. Por exemplo, o professor que concebe a Matemática como uma ciência exata, logicamente organizada e a-histórica ou pronta e acabada, certamente terá uma prática pedagógica diferente daquele que a concede como uma ciência viva, dinâmica e historicamente sendo construída pelos homens, atendendo a determinados interesses e necessidades sociais Da mesma forma, o professor que acredita que o aluno aprende Matemática através da memorização de fatos, regras ou princípios transmitidos pelo professor ou pela repetição exaustiva de exercícios, também terá uma prática diferenciada daquele que entende que o aluno aprende construindo conceitos a partir de ações reflexivas sobre materiais e atividades, ou a partir de situaçõesproblema e problematizações do saber matemático. 25 Com base nessas situações, identificamos seis tendências: a formalista clássica; a empírico-ativista; a formalista moderna; a tecnicista e suas variações; a construtivista e a socioetnoculturalista. Tendência Formalista Clássica: o ensino nesta tendência pedagógica foi acentuadamente livresco e centrado no professor e no seu papel de transmissor e expositor do conteúdo através de preleções ou de desenvolvimentos teóricos na lousa. A aprendizagem do aluno era considerada passiva e consistia na memorização e na reprodução precisa dos raciocínios e procedimentos ditados pelo professor ou pelos livros. Tendência Empírico-Ativista: aqui o professor deixa de ser o elemento fundamental do ensino, tornando-se orientador ou facilitador da aprendizagem. O aluno passa a ser considerado o centro da aprendizagem – um ser “ativo”. O currículo, nesse contexto, deve ser organizado a partir dos interesses do aluno e deve atender ao seu desenvolvimento psicobiológico. Tendência Formalista Moderna: aqui a matemática escolar perde tanto seu papel de formadora da “disciplina mental” como seu caráter pragmático de ferramenta para a resolução de problemas. Passa a enfatizar a dimensão formativa sob outra perspectiva mais importante que a aprendizagem de conceitos e as aplicações da matemática, seria a apreensão da estrutura subjacente, a qual, acredita-se, capacitaria o aluno a aplicar essas formas estruturais de pensamento inteligente aos mais variados domínios, dentro e fora da Matemática. Tendência Tecnicista e suas Variações: a finalidade do ensino da Matemática na tendência tecnicista seria desenvolver habilidade e atitudes computacionais e manipulativas, capacitando o aluno para a resolução de exercícios ou de problemas-padrão. Isto porque o tecnicismo, com base no funcionalismo, parte do pressuposto de que a sociedade é um sistema tecnologicamente perfeito, orgânico e funcional. Caberia, portanto, à escola preparar recursos humanos “competentes” tecnicamente para este sistema. Ou seja, não é preocupação desta tendência formar indivíduos não-alienados, críticos e criativos, que saibam situar-se historicamente no mundo. 26 Tendência Construtivista: a principal finalidade do ensino da Matemática para esta corrente é de natureza formativa. Os conteúdos passam a desempenhar papel de meios úteis, mas não indispensáveis, para a construção e desenvolvimento das estruturas básicas da inteligência. Ou seja, o importante não é aprender isto ou aquilo, mas sim aprender a aprender e desenvolver o pensamento lógico-formal. Tendência Sócioetnocultural: face a estudos dessa natureza, surge então da diferença cultural. Segundo esta teoria, as crianças de classes pobres não são carentes de conhecimentos e de estruturas cognitivas, mas talvez não tenham habilidades formais tão desenvolvidas em relação à escrita e à representação simbólica; ou talvez possuam uma experiência de vida muito rica na qual usam procedimentos matemáticos não formais (Etnomatemática) que a escola, além de não saber aproveitá-los como ponto de partida discrimina-os ou rejeita-os enquanto formas válidas e possíveis de saber. A Etnomatemática inicialmente significa a Matemática não-acadêmica e não-sistematizada, isto é, a Matemática oral, informal, “espontânea” e, às vezes, oculta ou congelada, produzida e aplicada por grupos culturais específicos (indígenas, favelados, analfabetos, agricultores,...). Isto é, seria “uma maneira muito particular de grupos culturais específicos realizarem as tarefas de classificar, ordenar, inferir e modelar”1. Mais tarde, D’Ambrosio ampliaria o significado da Etnomatemática, definindo-a como “a arte ou técnica de explicar, de conhecer, de entender nos diversos contextos culturais” (D’AMBROSIO, 1990: 81). O grande mérito da Etnomatemática foi trazer uma nova visão de Matemática e de Educação Matemática de feição antropológica, social e política, que passam a ser vistas como atividades humanas determinadas sócioculturalmente pelo contexto em que são realizadas. A Matemática, por exemplo, só adquiri validade e significação no interior de um grupo cultural – que tanto pode ser uma comunidade indígena, uma classe de alunos ou até uma comunidade científica – onde se encontra presente nas diferentes práticas sócioculturais. 27 Ou seja, o conhecimento matemático deixa de ser visto, como faziam as tendências formalistas, como conhecimento pronto, acabado e isolado do mundo. Ao contrário, passa a ser visto como um saber prático, relativo, não-universal e dinâmico, produzido histórico-culturalmente nas diferentes práticas sociais, podendo aparecer sistematizado ou não. Esta forma cultural-antropológica de ver e conceber a Matemática e sua produção-divulgação, proporcionada pela Etnomatemática trouxe também profundas transformações no modo de conceber e tratar a Educação Matemática. O ponto de partida do processo ensino/aprendizagem seriam os problemas da realidade. Estes seriam identificados e estudados conjuntamente pelo professor e pelos alunos. A relação aluno-professor é dialógica: troca de conhecimentos entre ambos, atendendo sempre à iniciativa dos primeiros. O método de ensino preferido por essa tendência será, portanto, a problematização (tanto do saber popular como daquele produzido pelos matemáticos) e a Modelagem Matemática, que contempla uma abordagem externalista para a Matemática. em outras palavras, trata-se de um método de ensino que contempla a pesquisa e o estudo/discussão de problemas que dizem respeito à realidade dos alunos. Qual tendência: Alguma destas ou outra? O processo de construção de um ideário pedagógico, tanto individual como coletivo, é sempre dinâmico e dialético. De fato, se estamos permanentemente refletindo sobre nossa prática pedagógica, se discutimos com nossos pares, se pesquisamos e buscamos continuamente novas fontes teóricas e novas alternativas de ação em sala de aula,... então, é de se esperar que nosso ideário também esteja em permanente mutação. Embora, nesse processo de mutação, algumas concepções/crenças permaneçam inalteradas, no geral, o ideário pedagógico de uma pessoa ou grupo é sempre efêmero, pois representa apenas idéias que foram dominantes num determinado momento histórico. Se isso for verdadeiro, então, nenhum quadro classificatório, por melhor que seja, dará conta da multiplicidade de pensamentos e idéias presentes na práxis do ensino da Matemática. 1 In: Boletim nº 1 do Grupo Internacional de Estudos sobre Etnomatemática (ISGEm), agosto/1985 (Apud ANASTÁCIO, 1993: 59) 28 1.12. Dificuldades e erros dos alunos A álgebra “é uma fonte de confusões e atitudes negativas consideráveis entre os alunos”, comentário de recordações de alunos sobre suas experiências ao aprender matemática na escola (Boot, 1994). Segundo Boot (1994) uma das maneiras de tentar descobrir o que torna a álgebra difícil é identificar os tipos de erros que os alunos comumente cometem e investigar as razões deste erro; muitos deles podem ter origem nas idéias dos alunos sobre aspectos como: a) foco da atividade algébrica e a natureza das “respostas”; b) o uso da notação em álgebra; c) o significado das letras e das variáveis; d) os tipos de relações e métodos usados em aritmética. Fiorentini (1996) aponta, além desses, outros aspectos como: 1) O foco da atividade em álgebra (respostas genéricas ou expressões) é diferente da aritmética (respostas particulares, números bem definidos). Dificuldade em aceitar como resposta “y + 5” ou tenderá a simplificar “3x + 5y = 8xy”; 2) Dificuldades em interpretar o símbolo da igualdade como equivalência; 3) Na aritmética a justaposição de termos significa adição. (Ex: 3 . ¼ = 3 + ¼). Na álgebra multiplicação ( Ex: 4n = 4.n); 4) A pedagogia da “facilitância” geralmente não contribui para uma efetiva aprendizagem. Ex: 2a + 2b; 2 abacaxis e 2 bananas; 5) Dificuldades oriundas da aritmética como por exemplo, o uso dos parênteses, as regras dos sinais, potenciação, o uso de propriedades como a distributiva; 29 6) Dificuldades em compreender os diferentes significados das letras: incógnita, objeto, unidade de medida variável, número genérico, parâmetro e símbolo arbitrário. A mesma idéia de respostas com um único termo parece estar subjacente ao erro, freqüente entre os alunos de simplificar expressões como 2a + 5b = 7ab. Esse problema pode ocorrer porque os alunos têm dificuldades cognitivas em aceitar a ausência do fechamento, ou pode simplesmente refletir expectativas derivadas da preocupação aritmética quando a maneira como deveriam ser as respostas bem formadas. Marquis (1994: 234,235) fez um levantamento dos erros comuns em álgebra que os alunos cometem. 30 Para Boot (1994) essas descobertas parecem à diversas sugestões: 1º - Deixar claro para as crianças que a 2 + 3 não representa apenas uma instrução, mas também o resultado da adição desses números. Acentuar o valor bidirecional do símbolo de igualdade. 2º - Representar a multiplicação em álgebra por justaposição, 3n, deveria ser escrito 3 . n na forma completa, pelo menos na iniciação da álgebra. 3º - o enfoque “2 maçãs mais 5 bananas” para o problema 2a + 5b pode não ser oportuno. Ele não só favorece uma visão errada das letras, como também pode ser usado pelos alunos para justificar a simplificação de 7ab. Esta lista de possíveis causas das dificuldades das crianças no aprendizado de álgebra não é, de modo algum exaustiva. No entanto, poderá servir para lançar alguma luz sobre os tipos de dificuldades que as crianças provavelmente experimentarão quando começarem a estudar álgebra, devemos indagar que o professor pode evitar ou corrigir esses problemas. O professor deve fazer o papel de moderador e deixar que as diferentes facções de classes exponham seus pontos de vista. Discussões desse tipo, em sala de aula, são excelentes não só para identificar as diferentes concepções erradas que os alunos possam ter, como também para ajudá-los e superá-los num processo de interação com os colegas. 1.13. Propostas para o ensino de álgebra Evidenciaremos duas propostas para o ensino da álgebra, uma apresentada pelos pesquisadores Fiorentini, Miorin e Miguel (1993) que defende a idéia de que a melhoria da qualidade da educação algébrica exige um repensar na relação entre pensamento e linguagem. A outra, apresentada por Lins e Gimenes (1997), sugere que passemos a pensar em termos de significados e não em termos de técnicas e conteúdos. 31 Ambas as propostas, sugerem a antecipação do início do ensino de álgebra, para que este se desenvolva em concomitância com o ensino da aritmética. Assim sendo, rompe-se com o que tradicionalmente ocorre: primeiro aritmética e depois, com uma brusca ruptura, vem a álgebra carregada de transformações sem significados, pois seus conceitos são apresentados aos alunos com um exemplo/modelo introdutório e uma seqüência de outros semelhantes a serem desenvolvidos. O objetivo é a memorização dos passos evidenciados no exemplo/modelo, e os alunos mais bem treinados receberão como prêmio uma boa nota na avaliação e, por conseqüência, a aprovação ao final do ano letivo. Fiorentini, Miorin e Miguel (1993) ao defenderem que desde as séries inicias deve ser trabalhado o pensamento algébrico, por não haver razão para adialo, advertem que a introdução precoce e sem suporte concreto a uma linguagem simbólica abstrata pode funcionar como freio a aprendizagem significativa da álgebra. Ao proporem um repensar na relação entre pensamento e linguagem, acreditam que teremos como conseqüência a superação da prática pedagógica tradicional onde se inicia o ensino da álgebra com ênfase aos transformismos. Como proposta para o ensino da álgebra, sugerem que se inicia com situações problemas das mais diversificadas naturezas, através de reflexões e análises que possibilitem a elaboração de uma linguagem simbólica, carregada de significados. Após esta etapa fazer o contrário, ou seja, partir da expressão algébrica, atribuindo significados as mesmas. Só após esse processo de ir e vir é que deve ser enfatizar, as transformações de uma expressão em uma outra equivalente, por meio de procedimentos que as legitimam. Por sua vez, Lins e Gimenes (1997) defendem que a educação algébrica deve permitir que os alunos sejam capazes de produzir significados e de pensar algebricamente, antes de ter o domínio de habilidades técnicas, considerada por eles como, a capacidade de usar ferramentas desenvolvidas com maior facilidade. O domínio da habilidade técnica é uma etapa necessária, mas não pode anteceder as anteriores, uma vez que os alunos precisam compreender a natureza do que estão fazendo. Apenas praticar um conjunto de técnicas operatórias, não se justifica em si e por si mesma, é preciso ter a compreensão de que estas estão inseridas em um quadro maior de significações. Advertem que não se pode conduzir este processo 32 de forma que os alunos não percebam que o conhecimento está sendo aprofundado. Agir dessa forma é estar compactuando com as abordagens facilitadoras. O que o professor deve fazer é convidar o aluno a pensar diferente, com o objetivo de proporcionar uma aprendizagem consciente. Nessa perspectiva, o papel da escola é contribuir com o processo de análise e tematização dos significados. Sendo assim, não se nega tal conhecimento nem tenta substituí-lo, mas mostra-se ao aluno que ele sabe algo, cuja versão correta e completa do que ele sabe, ele vai aprender na escola. Tendo como base as idéias acima, os autores propõem atividades que permitem dar significado à linguagem simbólica, às expressões algébricas e às transformações de expressões. Introduzem o conceito de Modelos de Campos Semânticos como uma nova tendência para o ensino da álgebra. Para isso, parte do pressuposto que o conhecimento matemático e sua aprendizagem deve pautar-se por manifestação de uma crença-afirmação junto com uma justificação que autoriza o sujeito a produzir enunciação. É essa tríade crença-afirmação-justificação que justifica a necessidade da socialização do conhecimento em situação escolar. Para eles a mudança de perspectiva do ensino da álgebra refere-se a pensarmos em termos de significados sendo produzidos no interior de atividades, e não, como até que, pensarmos em termos de técnicas e conteúdos. O acima exposto nos mostra que a questão do significado é fundamental no processo ensino-aprendizagem da álgebra por permitir que o aluno revele o nível de compreensão dos conceitos como também a manifestação do pensamento algébrico. 33 2. INTEGRANDO ÁLGEBRA E GEOMETRIA A pesquisa foi realizada com uma turma de sétima série da Escola Municipal de Ensino Fundamental Nossa Senhora de Fátima no município de Santo Antônio da Patrulha no estado do Rio Grande do Sul. Primeiramente foram estudados os conceitos de adição e subtração de monômios na forma puramente algébrica, sistemática e descontextualizada. Partindo do conceito, exemplos e resolução de exercícios, o que ainda hoje, é muito comum. Desenvolvendo exercícios como os exemplos abaixo: Exemplo 1: adição e subtração de monômios: a) (+7x) + (-3x) = b) (-3x) + (+11x) = c) (-2y) + (-3y) = d) (+2m) + (+m) = e) (+3x) – (-3x) = f) (–5x) – ( -11x) = g) (+7y) – (+7y) = h) (-3a) – (+4a) = Exemplo 2: redução de termos semelhantes: a) 6a + 3a – 7 = b) 7a – 2a +4b –2b = c) x + 7 + x – 10 – 1 = 34 d) 2x³ - 7x² + 4x –2 + 8 – 3x² = Exemplo 3: adição e subtração de polinômios: a) (2x² - 9x +2) + (3x² - 7x –1) = b) (5x² - 4x +7) – (3x² + 7x – 1) = Depois foram trabalhados os mesmos conceitos, de adição e subtração de monômios e polinômios, mas agora associando os conceitos algébricos com os conceitos geométricos. Foram associados os conceitos de adição e subtração de monômios e polinômios com os conceitos de medida segmento de reta, perímetro e área de figuras planas. O trabalho foi realizado do seguinte modo: a) A primeira etapa foi desenvolvida iniciando-se o estudo traçando segmentos de reta com o uso da régua, a partir de medidas determinadas. Como segue abaixo: Em seguida realizamos o mesmo procedimento mas, agora sem a régua. Como aqui não sabemos mais as medidas, usamos as letras. b) A partir da união (adição de medidas) dos segmentos, percebemos os monômios, binômios, trinômios e polinômios, como descrito abaixo: 35 Da mesma maneira, vimos a diferença de monômios. Comparamos dois segmentos de reta, verificamos quanto falta para um ficar do tamanho do outro. Como ilustrados abaixo: Para verificarmos a adição de monômios vimos, também, o perímetro de figuras planas. Deste modo, reduzimos os termos semelhantes somando os lados da figuras que forem iguais. Como ilustrado abaixo: Outra atividade de adição de monômios foi a medição do perímetro de objetos da sala de aula como: cadernos, livros, classes, quadro, caixas, etc, como tiras de papel de tamanhos variados c) Nesta etapa vimos a adição e subtração de polinômios: Para tanto construímos o seguinte material: - cinco quadrados vermelhos de medida 8 x 8 cm²; - cinco quadrados azuis de medida 8 x 8 cm²; - dez retângulos vermelhos de medida 2 x 8 cm²; - dez retângulos azuis de medida 2 x 8 cm²; 36 - vinte quadrados vermelhos de medida 2 x 2 cm²; - vinte quadrados azuis de medida 2 x 2 cm². Após a construção das figuras as medidas ficaram as seguintes: A = x² A = xy A = y² As figuras azuis representariam os monômios positivos e as figuras vermelhas, os monômios negativos. Para assim realizar as adições e subtrações. Realizamos estas operações após o manuseio e a introdução dos alunos, sendo que eles convencionaram que soma-se as figuras iguais de mesma cor e elimina-se cada par de figuras iguais de cores diferentes. Como pode ser visualizado abaixo: Legenda: a) adição: x² + 2xy + y² + + 2x² - 1xy – 3y² +3x² + 1xy – 2y² 1x² + 1xy + 2y² + 1x² + 3xy + 1y² + 37 2x² + 4xy + 3y² 2x² + 3xy + 4y² + + -1x² - 1xy – 2y² 1x² + 2xy + 2y² -2x² + 1xy -5y² + + 1x² - 4xy + 3y² -1x² - 3xy – 2y² b) subtração: (2x² - 2xy – 3y²) – (1x² - 6xy + 3y²) = =(2x² - 2xy – 3y²) + ( -1x² + 6xy – 3y²)= 2x² - 2xy – 3y² + -1x² + 6xy – 3y² x² + 4xy – 6y² + 38 (1x² + 1xy + 2y²) – (1x² + 3xy + 1y²) = =(1x² + 1xy + 2y²) + ( -1x² - 3xy – 1y²)= 1x² + 1xy + 2y² + + -1x² - 3xy – 1y² 0x² - 2xy + 1y² (2x² + 3xy + 4y²) – (-1x² - 1xy - 2y²) = =(2x² + 3xy + 4y²) + ( 1x² + 1xy + 2y²)= 2x² + 3xy + 4y² + + 1x² + 1xy + 2y² 3x² + 4xy + 6y² (-2x² + 1xy - 5y²) – (1x² - 4xy + 3y²) = =(-2x² + 1xy - 5y²) + (-1x² + 4xy - 3y²) = -2x² + 1xy - 5y² 39 + -1x² + 4xy - 3y² -3x² + 5xy - 8y² + 40 CONSIDERAÇÕES FINAIS Os alunos, de um modo geral, demonstram que alcançaram os objetivos do conteúdo de adição e subtração de monômios e polinômios. Tiveram um bom desempenho em todo o decorrer do desenvolvimento de seus estudos. Isto se mostrou tanto da forma de se estudar a álgebra dissociada da geometria tanto na associação dos conteúdos algébricos como os conteúdos geométricos. Nos depoimentos dos alunos, foi visto que houve quem gostasse da forma de se trabalhar álgebra dissociada da geometria, outros que gostaram da forma associada com a geometria, outros ainda que gostaram das duas formas. Vale lembrar que o público em que realizei a pesquisa são alunos do projeto E.J.A.(Educação de Jovens e Adultos) que freqüentaram a escola tempos atrás e eles não estão acostumados com as inovações da educação. Assim constatei que eles querem que se trabalhe da mesma forma de que eles estudaram na sua época que freqüentaram a escola: quadro e giz. A maioria dos alunos admite que a forma de se estudar os conceitos algébricos associados com os conceitos geométricos lhes atribui mais sentido, significado, contextualização e compreensão do conteúdo, mesmo os alunos que gostaram mais de estudar álgebra dissociada da geometria. Lutar para recuperar o verdadeiro sentido do estudo da Matemática que, hoje ainda revela vestígios da herança do ensino de matemática passado, é para mim o motivo de estar atuando nesta área do conhecimento. Eu não poderia fazer o contrário, mecanizar mentes humanas que não produzem conhecimento e sim o reproduzem. Não poderia passar para as novas gerações, assim como foi no passado por muitos anos para mim, uma matemática opressora, bloqueadora, que impede a mente humana de criar e de maravilhar-se com o estudo da matemática. Não posso criar pessoas frustradas, pacatas, não criadoras, infelizes com o estudo da Matemática. Esta mesma Matemática que está no presente na nossa vida que não conseguimos nos dissociar dela. Uma Matemática que não é tão difícil como 41 parece e, às vezes, é tão simples que chega até ser banal ou até impercebível aos nossos olhos, à nossa mente. Uma matemática que faz parte de nós, faz parte do nosso ser e do nosso viver. 42 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ARCAVI, Abraham. Álgebra História representação: reflexão em educação Matemática. v.2. Rio de Janeiro: USU, 1998. BABINI, J. História de las Idéias Modernas em Matemática. Buenos Aires: Universidade de Buenos Aires, 1967. BAUMGART, J. K. História da Álgebra. São Paulo: Atual, 1992. BIGODE, Antônio José Lopes. Matemática, hoje é feita assim. São Paulo: FTD, 2000. BOOTH, Lesley R. Dificuldades das crianças que se iniciam em Álgebra. São Paulo: Atual , 1994. FIORENTINI, Dário. Alguns modos de ver e conhecer o ensino da matemática no Brasil. v.3. Zetetiké: Campinas, 1995. FIORENTINI, D; MIORIN, M.Â; MIGUEL, A. 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