CURRÍCULO E MUNDO CONTEMPORÂNEO Maurício Abdalla CURRÍCULO E SOCIEDADE Qualquer teorização sobre o currículo implica uma metateoria social e uma metateoria educativa. E toda teoria curricular que não ilumine essas conexões com a metateoria e com a história [...] levar-nos-á inevitavelmente ao erro. (José Gimeno Sacristán) CURRÍCULO E SOCIEDADE • Querer reduzir os problemas relevantes do ensino à problemática técnica de instrumentar o currículo supõe uma redução que desconsidera os conflitos de interesses que estão presentes no mesmo. • O currículo [...] é uma opção historicamente configurada, que se sedimentou dentro de uma determinada trama cultural, política, social e escolar; está carregado, portanto, de valores e pressupostos que é preciso decifrar. • A assepsia científica não cabe neste tema, pois no mundo educativo, o projeto cultural e de socialização que a escola tem para seus alunos não é neutro. De alguma forma, o currículo reflete o conflito de interesses dentro de uma sociedade e os valores dominantes que regem os processos educativos. (José Gimeno Sacristán) CONCEPÇÃO DO CURRÍCULO COMO PRÁXIS Currículo não é apenas um conjunto de prescrições acerca dos conteúdos e orientações gerais sobre o ensino, mas uma práxis que engloba vários níveis de existência e concretização. Engloba desde a sua existência como prescrição até sua realização como prática. REFLEXÕES SOBRE O MUNDO ATUAL • • • • • • • • Falência do capitalismo como processo civilizatório e sua coroação como economia crematística. Há uma crise humanitária estrutural que deve chamar a atenção de todos. 40 % da população mundial vive em estado de extrema pobreza (2,6 bilhões de pessoas). 10,7 milhões de crianças morrem por ano no mundo antes de completar 5 anos, devido, na sua grande maioria, à pobreza e à subnutrição. Isso representa cerca de 3.600 atentados de 11 de setembro por ano (ou cerca de 10 atentados por dia) com os prédios cheios de crianças. O relatório do IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas, órgão da ONU), prevê sérios riscos para o planeta em um curto espaço de tempo. A exclusão social é crescente e estrutural. O sistema não cria alternativas, apenas reforça as medidas que geram as crises. O otimismo, a utopia e a inteligibilidade do mundo se desfazem com a crise subjetiva de racionalidade. PERSPECTIVAS • Não há saída dentro da lógica capitalista. • O mundo precisa de um novo processo civilizatório Base material de produção da existência Racionalidade geral que articula a subjetividade • Para enfrentar a crise sistêmica, as ações devem coordenar-se de maneira sistêmica e vincular-se à todas as dimensões da práxis social. • A educação atua no campo das subjetividades, mas deve articular-se com experiências concretas. NOVA RACIONALIDADE • Princípio da cooperação como eixo de uma nova racionalidade • Novas bases interpretativas para as ciências • Novos parâmetros de relacionamento: Consigo mesmo (implicação individual) Com o outro (Implicação social) Com a natureza (Implicação ecológica) QUESTÕES EDUCACIONAIS O que se reproduz na escola atual? A hegemonia de um processo civilizatório no campo subjetivo não se relaciona somente com o conhecimento, mas também (e principalmente) com os valores e relações pessoais. Assim, a escola não possui apenas uma dimensão de reprodução de conteúdos explícitos, veiculados oralmente ou por materiais didáticos adequados à regulação. QUESTÕES EDUCACIONAIS O que se reproduz na escola atual? O reforço maior da racionalidade hegemônica se dá no campo dos valores, comportamentos, hábitos e relações interpessoais que se operam na totalidade da vida escolar. O cotidiano da escola não pode ser caracterizado somente pelas relações que se travam em sala de aula ou em atividades planejadas com objetivos instrucionais determinados. QUESTÕES EDUCACIONAIS O que se reproduz na escola atual? Desde o momento em que os alunos se inserem no universo escolar, entra em ação um conjunto de comportamentos e hábitos e de relações culturais e intersubjetivas, fundados em uma eticidade cujas origens estão além da escola. O microcosmo macrocosmo social escolar reflete o QUESTÕES EDUCACIONAIS O que se reproduz na escola atual? Compõem tais conjuntos, entre outros elementos, as brincadeiras e jogos, as gincanas e festas, as vestimentas, os aparelhos tecnológicos utilizados como símbolos de status ou fatores de inclusão pelo consumo, a criação de grupos e “tribos”, a postura diante das autoridades escolares, a reprodução das hierarquias dos bairros e da lógica do narcotráfico e gangues urbanas, as preferências musicais e culturais, a alimentação, etc. QUESTÕES EDUCACIONAIS A afirmação da racionalidade da cooperação pressupõe a criação de um novo sentido para a linguagem, os conteúdos cognitivos, as atitudes, hábitos e hierarquização de valores. Quando esse sentido não é produzido diretamente pela vida cotidiana, ele pode ser construído por meio de práticas educativas – planejadas à luz de uma intervenção histórica contra-hegemônica – que criem um ambiente vivencial e cognitivo fundado em relações de cooperação. QUESTÕES EDUCACIONAIS Mesmo que os currículos prescritos oficiais não assumam a racionalidade da cooperação, é possível a construção de uma prática curricular moldada aos propósitos de uma educação crítica fundada no Princípio da Cooperação. As implicações educacionais da racionalidade da cooperação dizem respeito ao currículo compreendido como totalidade e como práxis. Embora tenha incidência sobre os conteúdos, a proposta do Princípio da Cooperação recai prioritariamente no campo da realização do currículo, em sua dimensão prática e na organização do espaço escolar QUESTÕES EDUCACIONAIS A ideia de cooperação tem implicações muito maiores do que a intervenção no plano estrito das relações interpessoais. O Princípio da Cooperação como eixo fundamentador da educação deve ser compreendido em estreita relação com uma concepção holística das relações do ser humano consigo mesmo, com o outro e com a natureza, a partir da qual podemos destacar três níveis de implicações: 1) individuais; 2) sociais e 3) científicas e ecológicas QUESTÕES EDUCACIONAIS A intervenção educativa fundada na cooperação atinge, portanto, o planejamento escolar como um todo, o conteúdo cognitivo das diversas disciplinas (em ciências naturais e humanas), a corporalidade, a ética, a relação com a natureza e, obviamente, também as relações interpessoais.