PAMELA EMANUELI ALVES FERREIRA
ENUNCIADOS DE TAREFAS DE MATEMÁTICA:
UM ESTUDO SOB A PERSPECTIVA DA EDUCAÇÃO
MATEMÁTICA REALÍSTICA
Londrina
2013
PAMELA EMANUELI ALVES FERREIRA
ENUNCIADOS DE TAREFAS DE MATEMÁTICA:
UM ESTUDO SOB A PERSPECTIVA DA EDUCAÇÃO
MATEMÁTICA REALÍSTICA
Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação
em Ensino de Ciências e Educação Matemática
da Universidade Estadual de Londrina como
requisito parcial à obtenção do título de Doutora.
Orientadora: Profa. Dra. Regina Luzia Corio de
Buriasco.
Londrina
2013
Com carinho, ao GEPEMA...
AGRADECIMENTOS
Um jogo não se faz só, não se joga sozinho.
A paixão de um jogador nasce em grande parte do brilho dos olhos daqueles que o
acompanham, que torcem, especulam, criticam.
Eu, como aventureira jogadora, expresso aqui meus sentimentos de gratidão a todos que
participaram de formas diversas desta e de outras muitas partidas que joguei no
decorrer desses anos.
Àquela que administrou, norteou, aconselhou os caminhos, as jogadas, a grande técnica,
minha orientadora.
Às queridas árbitras, membros desta banca, que mediaram com tanto carinho, atenção e
dedicação as regras necessárias à boa conduta desta partida.
Ao time, que deu suporte necessário, justo e preciso nos momentos difíceis, mas que,
também, fora do cenário revelaram grandes sentimentos de amizade, cumplicidade, de
carinho, união, felicidade.
Aos amigos e familiares que sempre, ou quase sempre, estiveram presentes na plateia,
acompanhando, torcendo, vibrando, mesmo sem entender muito as regras do jogo, mas
torcendo simplesmente pela paixão e carinho devotado a esta jogadora.
À patrocinadora desta partida, CAPES, pela bolsa concedida.
Em especial, ao grande dono da casa dos jogos, senhor de tudo.
Tenho a impressão de ter sido uma
criança brincando à beira-mar,
divertindo-me em descobrir uma
pedrinha mais lisa ou uma concha mais
bonita que as outras, enquanto o imenso
oceano da verdade continua misterioso
diante de meus olhos (Isaac Newton).
FERREIRA, Pamela Emanueli Alves. Enunciados de Tarefas de Matemática: um estudo
sob a perspectiva da Educação Matemática Realística. 2013. 121f. Tese (Programa de PósGraduação em Ensino de Ciências e Educação Matemática) – Universidade Estadual de
Londrina, Londrina, 2013.
RESUMO
Esta pesquisa tem como objetivo apresentar um estudo a respeito de enunciados de tarefas de
matemática. Busca-se elaborar um quadro de referência com base na perspectiva da Educação
Matemática Realística que permita analisar tarefas de matemática. Com uma abordagem
predominantemente qualitativa, de cunho interpretativo, com base na Análise de Conteúdo, é
realizada uma análise de enunciados de tarefas de matemática de um livro didático no que diz
respeito às suas classificações, características, potencialidades e constituição, mais
especificamente, como o contexto se classifica, se a tarefa é rotineira ou não, a que tipo de
situação e item remete, se oportuniza matematização, se a tarefa é flexível e permite
diferentes estratégias de resolução, que tipo de competências promove, se é caracterizada
como exercício, problema. Uma intenção subjacente é que este trabalho sirva como um
recurso para professores que ensinam matemática, na busca de conhecer tarefas de
matemática, no sentido de analisar suas potencialidades e limitações, e utilizá-las em um
ambiente de avaliação como prática de investigação.
Palavras-chave: Educação Matemática. Educação Matemática Realística. Enunciados de
tarefas de matemática. Contexto. Avaliação como prática de investigação.
FERREIRA, Pamela Emanueli Alves. Math Tasks Instructions: a study under the Realistic
Mathematics Education perspective. 2013. 121f. Thesis (Sciences and Mathematics Education
Post-Graduate Program) – Universidade Estadual de Londrina, Londrina, 2013.
ABSTRACT
The objective of this research was to present a study on Math tasks instructions. It tries to
create a reference table based on the Realistic Mathematics Education perspective, which
allows the analysis of Math tasks. By adopting a predominantly qualitative, interpretative
approach, based on Content Analysis, Math tasks found in a textbook were analyzed
regarding their classification, characteristics, potentialities and constitution. More specifically,
it looked into how the context is classified, whether the task is carried out routinely or not,
what type of situation it refers to, whether it promotes mathematization processes, flexibility,
different resolution strategies, types of competence, and whether it is characterized as an
exercise or problem. An underlying intention of this research is to work as a resource for
Math teachers, helping them understand Math tasks, analyze their potentials and limitations
and use them in the context of assessment as an investigative practice.
Key words: Mathematics Education. Realistic Mathematics Education. Mathematics tasks
instructions. Context. Assessment as an investigative practice.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Figura 1 – Exemplo de uma tarefa não-rotineira. ..................................................................... 54
Figura 2 – Pirâmide de Avaliação proposta por De Lange (1999, tradução nossa). ................. 61
Figura 3 – Esquema representativo das relações criadas com a literatura estudada................. 65
Figura 4 – Tarefa classificada como Problema de contexto realista (T11). ............................. 74
Figura 5 – Tarefa classificada como Problema de contexto puramente matemático (T06). .... 75
Figura 6 – Tarefa classificada como Problema de contexto puramente matemático e de
primeira ordem (T08). .............................................................................................................. 76
Figura 7 – Tarefa classificada como Problema de contexto puramente matemático e de
segunda ordem (T25). ............................................................................................................... 77
Figura 8 – Tarefa classificada como Problema de contexto realista e de ordem zero (T16). ... 77
Figura 9 – Tarefa classificada como Problema de contexto realista e de primeira ordem (T27).
.................................................................................................................................................. 78
Figura 10 – Tarefa classificada como Problema de contexto realista e de segunda ordem
(T22). ........................................................................................................................................ 78
Figura 11 – Tarefa classificada como Problema de contexto puramente matemático e sem
ordem alguma e Problema Enigma (T12). ............................................................................... 80
Figura 12 – Tarefa classificada como Problema de contexto realista e Problema de Palavra
(T43). ........................................................................................................................................ 80
Figura 13 – Tarefa classificada como Exercício de Reconhecimento (T26)............................. 81
Figura 14 – Esquema representativo das relações criadas com a literatura estudada após a
análise. ...................................................................................................................................... 86
Figura 15 – Esquema representativo das relações criadas a partir do conjunto das tarefas
analisadas. ................................................................................................................................. 87
Figura 16 – Esquema representativo do agrupamento construído em 4.3. ............................... 88
Figura 17 – Tarefa T05. ............................................................................................................ 89
Figura 18 – Tarefa T26. ............................................................................................................ 91
Figura 19 – Tarefa T13. ............................................................................................................ 92
Figura 20 – Tarefa T08. ............................................................................................................ 94
Figura 21 – Tarefa T25. ............................................................................................................ 95
Figura 22 – Tarefa T16. ............................................................................................................ 97
Figura 23 – Tarefa T34. ............................................................................................................ 99
Figura 24 – Tarefa T22. .......................................................................................................... 100
Figura 25 – um meme da internet. .......................................................................................... 104
Figura 26 – outro meme da internet. ...................................................................................... 105
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 – Avaliação tradicional versus Avaliação como prática de investigação. ................. 19
Quadro 2 – Abordagens tradicionais segundo Van den Heuvel-Panhuizen (2010). ................. 29
Quadro 3 – Tipos de matematização na Instrução Matemática. ............................................... 36
Quadro 4 – Resumo dos Princípios da RME. ........................................................................... 37
Quadro 5 – Classificações de Tarefas segundo o contexto conforme Díaz e Poblete (2005). . 42
Quadro 6 – Classificações a respeito do uso de contexto segundo Dekker e Querelle (2002). 45
Quadro 7 – Classe de funcionalidade do contexto segundo De Lange (1995). ........................ 46
Quadro 8 – Agrupamento a respeito do tipo de contexto conforme Borasi (1986). ................. 48
Quadro 9 – Agrupamento a respeito do Tipo de Situação segundo o PISA (DE LANGE, 2003;
INEE, 2005, OECD, 2010). ...................................................................................................... 49
Quadro 10 – Tarefas rotineiras e não-rotineiras. ...................................................................... 52
Quadro 11 – Classificação de Butts (1997). ............................................................................. 54
Quadro 12 – Classificação de Problemas – Borasi (1986). ...................................................... 56
Quadro 13 – Tipos de item (OECD, 2004b; OECD, 2004c; OECD, 2005). ............................ 56
Quadro 14 – Tipos de Problema segundo Kirkley (2003). ....................................................... 58
Quadro 15 – Relaciona quantidade de tarefas com o tipo de subseção apresentada no livro
analisado. .................................................................................................................................. 70
Quadro 16 – Exemplo da codificação das tarefas..................................................................... 71
Quadro 17 – Classificação 1. .................................................................................................... 73
Quadro 18 – Classificação 2. .................................................................................................... 75
Quadro 19 – Classificação 3. .................................................................................................... 79
Quadro 20 – Classificação 4. .................................................................................................... 81
Quadro 21 – Classificação 5. .................................................................................................... 82
Quadro 22 – Classificação 6. .................................................................................................... 83
Quadro 23 – Construção dos grupos dos diferentes tipos de tarefas segundo as classificações
realizadas em 4.1. ..................................................................................................................... 84
Quadro 24 – Resumo das classificações de T05. ...................................................................... 90
Quadro 25 – Resumo das classificações de T26. ...................................................................... 92
Quadro 26 – Resumo das classificações de T13. ...................................................................... 93
Quadro 27 – Resumo das classificações de T08. ...................................................................... 95
Quadro 28 – Resumo das classificações de T25. ...................................................................... 97
Quadro 29 – Resumo das classificações de T16. ...................................................................... 98
Quadro 30 – Resumo das classificações de T34. .................................................................... 100
Quadro 31 – Resumo das classificações de T22. .................................................................... 103
SUMÁRIO
1 COLOCANDO AS CARTAS NA MESA ........................................................................... 14
1.1 AVALIAÇÃO ESCOLAR COMO PRÁTICA DE INVESTIGAÇÃO ................................................ 16
1.2 A IMPORTÂNCIA DA ANÁLISE DA PRODUÇÃO ESCRITA PARA A AVALIAÇÃO COMO PRÁTICA
DE INVESTIGAÇÃO .................................................................................................................. 20
2 ESTUDANDO AS POSSIBILIDADES DE JOGO ........................................................... 26
2.1 EDUCAÇÃO MATEMÁTICA REALÍSTICA – ALGUMAS CONSIDERAÇÕES .............................. 26
2.2 ENUNCIADOS DE TAREFAS DE MATEMÁTICA .................................................................... 39
2.2.1 Os contextos e as classificações das tarefas ............................................................. 39
2.2.2 Caracterizações dos tipos de tarefas ......................................................................... 51
2.2.3 A respeito das características das tarefas .................................................................. 59
2.2.4 Constituindo uma tarefa ........................................................................................... 62
2.2.5 A respeito de uma sua caracterização ....................................................................... 64
3 ESCLARECENDO AS REGRAS ...................................................................................... 67
3.1 OBJETIVO GERAL ............................................................................................................. 67
3.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS .................................................................................................. 67
3.3 AMBIENTE DE ESTUDO ...................................................................................................... 68
3.4 PROCEDIMENTOS DE ANÁLISE........................................................................................... 69
4 JOGANDO ........................................................................................................................... 73
4.1 DO CONTEXTO DAS TAREFAS ............................................................................................ 73
4.1.1 Classificação das tarefas a partir da leitura interpretativa feita a partir do texto de
Díaz e Poblete ................................................................................................................... 73
4.1.2 Classificação das tarefas a partir da leitura interpretativa feita a partir do texto de
De Lange (1987) ............................................................................................................... 75
4.1.3 Classificação das tarefas a partir da leitura interpretativa feita a partir do texto de
Borasi (1986) ..................................................................................................................... 79
4.1.4 Classificação das tarefas a partir da leitura interpretativa feita a partir do texto de
Butts (1987). ...................................................................................................................... 80
4.2 DAS CARACTERIZAÇÕES SEGUNDO TIPO DE SITUAÇÃO E TIPO DE ITEM ........................... 82
4.3 DOS AGRUPAMENTOS FORMADOS A PARTIR DAS PRIMEIRAS ANÁLISES (4.1)...................... 84
4.4 ANALISANDO TAREFAS INDIVIDUALMENTE (SUA CONSTITUIÇÃO) .................................... 88
4.4.1 Tarefa do GRUPO A – T05. ..................................................................................... 89
4.4.2 Tarefa do GRUPO B – T26 ...................................................................................... 91
4.4.3 Tarefa do GRUPO C – T13 ...................................................................................... 92
4.4.4 Tarefa do GRUPO D – T08 ...................................................................................... 93
4.4.6 Tarefa do GRUPO F – T16....................................................................................... 97
4.4.7 Tarefa do GRUPO G – T34 ...................................................................................... 99
4.4.8 Tarefa do GRUPO H – T22 .................................................................................... 100
5 DISCUTINDO AS JOGADAS.......................................................................................... 104
6 UM JOGO QUE NÃO SE ENCERRA ............................................................................ 110
REFERÊNCIAS ................................................................................................................... 112
14
1 COLOCANDO AS CARTAS NA MESA
Pelo fato de a prova escrita ser um dos instrumentos mais utilizados na
avaliação escolar, o GEPEMA1 tem dedicado seus estudos à busca de conhecer como
estudantes de diferentes níveis de escolaridade e professores que ensinam matemática lidam2
com questões de matemática em circunstância de prova.
No âmbito do GEPEMA foram produzidas, entre os anos de 2003 e 2007,
oito dissertações referentes à análise da produção escrita presente em questões consideradas
rotineiras de matemática da prova da AVA-20023. Na época (2005-2006), esta autora
participou do projeto atuando como bolsista em iniciação científica, estudando uma das seis
questões aplicadas pela AVA-2002.
Na busca de conhecer como os estudantes, professores lidam com questões
não-rotineiras de matemática, a partir de 2006, iniciou-se um estudo a respeito da produção
escrita de alunos, professores e estudantes de licenciatura em Matemática em questões de
matemática da prova do PISA4 (Programa Internacional de Avaliação de Estudantes) que
foram selecionadas para esses estudos pelo fato de serem consideradas não-rotineiras e já
validadas, pois fizeram parte de uma avaliação já realizada. Desse estudo, resultaram seis
dissertações, dentre as quais, uma delas é desta autora.
Para a análise da produção escrita em questões não-rotineiras de matemática
do PISA, o GEPEMA se dedicou a estudar documentos do PISA (OECD, 2003, 2004a, 2004b,
2004c, 2005, 2006, 2008, 2010) e, também, a conhecer a perspectiva da Educação Matemática
Realística (RME5) que fundamentava em grande parte esses documentos.
Até então, pesquisas geradas pelo GEPEMA tiveram como objeto de estudo
a avaliação como prática de investigação e a análise da produção escrita, e, como meta,
conhecer as formas pelas quais alunos e professores lidavam com as tarefas propostas.
Na busca de avançar o estudo no que diz respeito à compreensão das formas
1
GEPEMA – Grupo de Estudos e Pesquisa em Educação Matemática e Avaliação, da Universidade Estadual de
Londrina. Outras informações em: http://www.uel.br/grupo-estudo/gepema/index.html.
2
Lidar – Entendido como as maneiras pelas quais os sujeitos interpretam o enunciado, elaboram estratégias e
utilizam procedimentos para resolver uma questão, que, em muitos casos, são resultantes de processos
sistemáticos, tanto sintáticos como semânticos, os quais eles próprios constroem (VIOLA DOS SANTOS, 2007).
3
Sistema de Avaliação de Rendimento Escolar da Rede Estadual do Paraná.
4
Maiores informações a respeito do PISA podem ser encontradas no site: http://portal.inep.gov.br/pisaprograma-internacional-de-avaliacao-de-alunos.
5
RME – Realistic Mathematics Education (Educação Matemática Realística).
15
como os alunos lidam com tarefas6 de matemática, nesta pesquisa decidimos tomar como
objeto de estudo, enunciados de tarefas de matemática de um livro didático7, com a intenção
de conhecê-las em suas classificações, características8, potencialidades9, constituição10.
Considerando, também, que a avaliação da aprendizagem escolar conduzida
pelo professor é, supostamente, coerente com o trabalho didático, uma vez que é parte do
processo e não uma sua interrupção, supõe-se que as tarefas de avaliação são, quase sempre,
semelhantes às tarefas dos livros didáticos. Estudos indicam que um dos recursos mais
utilizados pelo professor na orientação de sua prática pedagógica é o livro didático
(OLIVEIRA, 2008; COSTA; ALLEVATO, 2010; ANDRADE; OLIVEIRA, 2011). Andrade
e Oliveira (2011) afirmam que os textos didáticos exercem um papel de destaque nas salas de
aula e que “chega-se a defender que esses textos ditam o ritmo das salas de aula, determinam
o que e como se ensina” (2011, p. 1). Estudos realizados no interior do GHOEM11 (Grupo
História Oral e Educação Matemática) têm apresentado uma linha de estudos que se pauta na
análise de livros/textos/manuais didáticos de matemática, buscando referenciais teóricos para
nortear e desenvolver suas pesquisas.
Neste trabalho busca-se apresentar um quadro de referência para a leitura de
enunciados de tarefas matemáticas, no sentido de conhecer suas características. Essa é apenas
uma parte da avaliação como prática de investigação, dada a necessidade de conhecer,
elaborar, escolher, instrumentos e tarefas que serão fonte para uma coleta de informações
mais próximas do modo como os alunos pensam.
Neste sentido, esta pesquisa procura apresentar uma proposta de análise de
enunciados de tarefas de matemática escolar. Esse estudo pode servir à análise da produção
escrita como ferramenta para ser utilizada na avaliação como prática de investigação.
Tomando como objeto de estudo tarefas de um livro didático, pretendemos
6
A palavra “tarefa” é aqui utilizada como semelhante ao significado de “questão”, “enunciado de uma questão
de matemática”, diferente do que comumente remete “ao dever de casa”. Ao longo do texto tentaremos explicitar
melhor.
7
Não temos a intenção de analisar o livro didático, e sim tarefas provenientes dele.
8
Características: implica em analisar se a tarefa é flexível, acessível aos estudantes, se pode ser resolvida em
diferentes níveis de escolaridade.
9
Potencialidades: implica em analisar se a tarefa dá margem para matematização, se oportuniza aprendizagem.
10
Constituição: implica em analisar se a tarefa é apresentada por elementos textuais, gráficos, se possui uma
pergunta, um contexto.
11
Outras informações a respeito do grupo e suas publicações estão disponíveis em: <http://www.ghoem.com/>.
Acesso em: 15 out. 2012.
16
 elaborar um quadro de referência com base na perspectiva da
Educação Matemática Realística que permita analisar as tarefas de
matemática selecionadas;
 analisar suas potencialidades e limitações;
 construir um panorama da classificação destas tarefas;
 confrontar a potencialidade destas tarefas com a oportunidade de
aprendizagem que deriva delas;
e com isso apresentar uma possibilidade para identificar potencialidades dessas tarefas para a
aprendizagem e para a avaliação, na perspectiva da RME.
Para o estudo selecionamos autores que tratam
 de características de problemas de matemática,
 de características de problemas de avaliação,
 dos contextos envolvidos nos enunciados de tarefas de matemática.
Grande parte deste referencial é constituída por pesquisas realizadas na
perspectiva da Educação Matemática Realística (RME), a qual tem sido objeto de estudo de
membros do GEPEMA e, portanto, será utilizada como “pano de fundo” desta pesquisa.
Por se tratar de uma pesquisa que tem como uma de suas metas buscar
conhecimento a respeito da avaliação escolar, são apresentadas duas subseções (seguintes) a
respeito da perspectiva de avaliação escolar adotada pela pesquisadora, bem como do grupo
de pesquisa do qual faz parte: o GEPEMA. Tomando a avaliação escolar como uma prática de
investigação, busca-se, no GEPEMA, oferecer uma possibilidade de o professor incluir em
sua avaliação uma análise das tarefas que irão compor os instrumentos de avaliação na
perspectiva de propiciar um ambiente favorável à construção de conhecimento dos estudantes.
1.1 AVALIAÇÃO ESCOLAR COMO PRÁTICA DE INVESTIGAÇÃO
Estudos já desenvolvidos no GEPEMA e dedicados à avaliação da
aprendizagem (tais como PEREGO, 2005; CURY, 1988, 2006; DALTO, 2007; FERREIRA,
2009; BURIASCO; FERREIRA; CIANI, 2009) têm dado indícios de que uma das maiores
dificuldades dos estudantes ao lidar com questões de matemática é relativa à interpretação dos
enunciados das questões. Com isso, de certa forma barrados na leitura da tarefa proposta,
muitos estudantes apresentam dificuldades para mostrarem o que sabem a partir de suas
resoluções. Uma das razões dessas dificuldades é a de que, apesar de documentos curriculares
17
(BRASIL, 1998, 2010a; PARANÁ, 2008; NCTM, 2000) pregarem perspectivas de ensino
voltadas para a contextualização, o “ensino de matemática” ainda carrega muitas marcas de
uma tradição alinhada à apropriação de regras e algoritmos, consolidada por uma perspectiva
tecnicista, fruto da herança cultural do Movimento da Matemática Moderna, a qual vai de
encontro, entrando em choque, com as perspectivas do movimento da Educação Matemática.
A avaliação escolar, seja de rendimento ou de aprendizagem, é um sistema
complexo que envolve diversas variáveis, objetivos, intenções, e, respeitada sua
complexidade, é necessário conhecimento sobre o que ela é, para quê e como é realizada, sob
quais perspectivas, regida sob quais concepções, para bem compreender seus resultados e
gerar intervenção. Tomamos a avaliação como um processo, entendida como uma “ação
continuada”, de “realização contínua e prolongada” (HOUAISS, 2009, CD-ROM). Em
conformidade com essa forma de pensar a avaliação, estamos tomando-a como uma prática de
investigação,
um processo de buscar conhecer ou, pelo menos, obter esclarecimentos,
informes sobre o desconhecido por meio de um conjunto de ações
previamente projetadas e/ou planejadas que procura seguir os rastros, os
vestígios, esquadrinhar, seguir a pista do que é observável, conhecido
(FERREIRA, 2009, p. 21).
A avaliação como prática de investigação (BURIASCO; FERREIRA;
CIANI, 2009), entendida como um processo pode favorecer tomadas de decisão, gerar
oportunidade para intervenção e aprendizagem. Por ter objetivo pedagógico, se caracteriza no
campo da avaliação formativa (BARLOW, 2006). Basicamente, a avaliação formativa pode
ser entendida como um conjunto de ações desenvolvidas por professores e alunos que
produzem informações para intervir e contribuir nos processos de ensino e aprendizagem
(HADJI, 1994; BLACK; WILLIAN, 1998; PERRENOUD, 1998; BARLOW, 2006;
MORGAN, 2008; MORENO, 2008; SANTOS, 2008).
Apesar de a expressão avaliação como prática de investigação não ser
muito presente na literatura, reconhecemos características desta perspectiva em alguns
trabalhos, tais como: “avaliação reguladora” (ALLAL, 1986); “avaliação didática” (VAN
DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 1996); “observação formativa” (PERRENOUD, 1998);
“avaliação para a aprendizagem” (BLACK et al, 2003); “avaliação autêntica” (MORGAN,
2003); “avaliação formativa alternativa” (FERNANDES, 2005); “ato de comunicação”
(BARLOW, 2006), que estão alinhadas com a caracterização de avaliação como prática de
investigação.
18
Uma avaliação como prática de investigação busca confrontar a prática
tradicional de avaliação por ser realizada frequentemente, de modo a buscar indícios a
respeito das dificuldades dos estudantes, de como se encontram no processo de uma dada
aprendizagem. Segundo Van den Heuvel-Panhuizen (1996), a avaliação escolar não tem
sentido de ser se não for para promover a aprendizagem. De acordo com Van den HeuvelPanhuizen (1996), a avaliação deve fornecer informações, pistas a respeito dos processos do
pensamento dos estudantes, para além dos resultados. Portanto, a função “didática” da
avaliação é a de maior escopo, pois visa integrar os processos de avaliação, ensino e
aprendizagem e fornecer meios para regulação (VAN DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 1996).
Assumir a avaliação como prática de investigação pode ajudar a superar o
mito da “medida de conhecimento”, pelo fato de que a avaliação nesta perspectiva não se
restringe apenas aos produtos gerados pelos estudantes, valorando-os, mas possibilita tomadas
de decisão, reorientação do processo do qual participam não apenas os alunos, mas também
professores, a comunidade, em um processo que é dependente do ambiente, dos materiais
didáticos, das condições físicas ambientais em que ocorre.
O fato de as produções dos estudantes, nessa perspectiva de avaliação, não
serem finalísticas (terem fim em si mesmas) pode favorecer um ambiente no qual o aluno tem
liberdade para se expressar de forma responsável, assumindo suas resoluções como de sua
responsabilidade, o que pode gerar autonomia, fazendo-o assumir confiança em suas
respostas, arriscar, argumentar, refletir, dizer o que pensa para além do que acha que o
professor deseja saber. Busca-se assim o desenvolvimento de uma atitude autônoma de
pensamento, valorizando a multiplicidade e originalidade das ações.
Ao fazer da avaliação da aprendizagem uma prática de investigação, o
professor tem o “dever de informar o aluno sobre a qualidade de seus trabalhos e de lhe
proporcionar os meios de otimizá-los” (BARLOW, 2006, p. 73). Nesta perspectiva, a função
de avaliador é complementada pela função de professor, de modo que a avaliação não termina
com o estabelecimento de uma nota. Da mesma forma que a avaliação está mergulhada no
processo de aprendizagem não sendo possível dissociá-los (os processos de avaliação e
aprendizagem), ao se tratar da aprendizagem escolar, não deveria ser possível dissociar as
funções de professor e de avaliador. Além disso, a função de avaliar não precisa ser apenas da
responsabilidade do professor. É importante, também, que os alunos sintam-se responsáveis e
tenham autonomia para avaliar suas tarefas e desenvolver um espírito autocrítico. Até porque
“não se pode afirmar que ele (o professor) seja sempre a pessoa mais indicada para engrenar
19
esse trabalho de diagnóstico e solução”, pois há casos em que a coavaliação e autoavaliação
podem ser mais eficazes para regular a aprendizagem (BARLOW, 2006, p. 73).
A seguir, apresentamos um quadro12 com algumas características da
avaliação como prática de investigação em contraste com a avaliação classificatória,
tradicionalmente utilizada, pois, apesar de haver esforços de educadores matemáticos para
superá-la, ainda é possível reconhecer suas marcas nas práticas de sala de aula.
Quadro 1 – Avaliação tradicional versus Avaliação como prática de investigação.
Avaliação tradicional/
classificação
A avaliação como processo de
classificação está limitada por
ter em sua raiz a homogeneidade
(ESTEBAN, 2003).
É considerada como uma
componente que pertence13 ao
processo educativo.
Valoriza a função classificatória.
Limita-se à observação.
Respostas predeterminadas
(ESTEBAN, 2003).
Valoriza respostas objetivas.
Limita-se ao que é diretamente
observável.
Recolhe informações e
classifica-as/ qualifica-as/
quantifica-as.
12
Avaliação como prática de investigação
Configura-se em uma perspectiva de heterogeneidade, abrindo
espaço para que o múltiplo e o desconhecido ganhem visibilidade
(ESTEBAN, 2003).
É considerada como prática necessária e indissociável do processo
educativo.
“A avaliação é vista como um componente integral do processo de
ensino e aprendizagem, no qual o professor tenta adquirir um
quadro mais completo do aluno quanto possível, por meio de todos
os tipos de estratégias de avaliação informali”14 (VAN DEN
HEUVEL-PANHUIZEN, 1996, p. 101, tradução nossa).
Preocupa-se com a função reguladora.
Requer intervenção.
Respostas em constante construção, desconstrução e reconstrução,
que passam a configurar o início de novos questionamentos, sejam
elas certas ou erradas (ESTEBAN, 2003).
De acordo com Santos (2003a, p. 1), a avaliação “não se restringe
a uma recolha de informação, mas incluindo-a, pressupõe
igualmente uma interpretação desses mesmos dados, uma acção
orientada por essa interpretação e assim uma produção de valores”.
Segundo Van den Heuvel-Panhuizen (1996), uma avaliação que
conta apenas com respostas certas ou erradas contribui pouco para
instrução posterior.
Interroga o caráter subjetivo das respostas.
Investiga o não observável para além do observável.
Recolhe informações e as interpreta.
Quadro construído com base em (HADJI, 1994; VAN DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 1996; ESTEBAN, 2002,
2003; BURIASCO, 1999, 2004, 2008; BARLOW, 2006; SANTOS, L., 2003a, 2008; BURIASCO, FERREIRA,
CIANI, 2009).
13
O “pertence” é no sentido de “uma parte de”, como se fosse possível separá-la (a avaliação) do processo todo.
14
As notas em números romanos servem para apresentar ao leitor os trechos originais dos textos citados, livres
de tradução. Se encontram nas páginas finais desta tese.
20
As diferenças entre alunos são
assumidas como peculiaridades
que devem ser trabalhadas e
incorporadas pelo movimento
coletivo
(ESTEBAN, 2003).
As diferenças entre alunos deixam de ser compreendidas como
deficiências que precisam ser corrigidas (ESTEBAN, 2003).
A defesa da ideia de avaliação como prática de investigação, que
auxilie tanto professores quanto estudantes, subsidia-se na crença
de que ela pode contribuir para uma prática escolar menos
excludente, que não silencie as pessoas, mas valorize e aceite as
diferenças, na busca de contribuir para que os processos de ensino
e aprendizagem se distanciem cada vez mais do que hoje é
chamado fracasso escolar (BURIASCO, 2008, p. 32).
Fortalece a prática da
memorização, decoreba,
reprodução.
Fortalece a reflexão e o diálogo.
O erro é visto como obstáculo,
indício do “não saber”, de
“falta”.
Limita-se a indicar o que ainda
não se sabe (ESTEBAN, 2002).
Qualquer instrumento de
avaliação pode servir para
quantificar.
Encoraja aprendizagens
superficiais, momentâneas.
Fonte: autora.
O erro passa a representar um indício, entre muitos outros, do
processo de construção de conhecimentos. O erro aporta aspectos
significativos para o processo de investigação ao sinalizar que a
criança está seguindo trajetos diferentes (originais, criativos,
novos, impossíveis?) dos propostos e esperados pelo professor
(ESTEBAN, 2003).
Torna o que ainda não se sabe em indício da necessidade e da
possibilidade de ampliação do conhecimento já consolidado
(ESTEBAN, 2002).
Nesta perspectiva, além de ser necessária uma diversidade de
instrumentos, a utilização de cada instrumento exige um
conhecimento relevante sobre suas vantagens e deve servir para a
“extração” quanto mais possível de informações.
Encoraja aprendizagem reflexiva e processual.
É possível colocar a avaliação a favor da investigação em diferentes
momentos, situações, ambientes. A análise da produção escrita de alunos é considerada
como um dos recursos para que a avaliação escolar seja entendida como prática de
investigação. Para que as produções escritas sejam passíveis de análise, as tarefas propostas
devem valorizar a resolução de problemas, a investigação, a escrita matemática, a reflexão, o
pensamento crítico.
1.2 A IMPORTÂNCIA DA ANÁLISE DA PRODUÇÃO ESCRITA PARA A AVALIAÇÃO COMO PRÁTICA DE
INVESTIGAÇÃO
Dentre todas as formas possíveis de comunicação em sala de aula, na
disciplina de matemática, a escrita parece ser a forma mais comum, se constituindo, quase
21
sempre, como principal recurso que os professores utilizam para que os alunos expressem o
que sabem. Ao lidar com uma situação matemática, o registro não é apenas importante, mas
necessário, dependendo da complexidade da situação, das variáveis envolvidas, dos objetivos
traçados pelo professor. Necessário, como meio de organização e manutenção das ideias
desenvolvidas, e importante, para veicular e comunicar uma solução, uma forma de
pensamento, uma maneira de lidar.
Em uma circunstância de avaliação em que se objetiva analisar a
“transposição” de pensamento matemático em linguagem escrita, há de se considerar alguns
fatores como: que tipo de mensagem deve ser produzida, que itens devem ser relevantes de
exposição, que habilidades são requeridas do produtor de informação, quão claro e/ou
objetivo deve ser o texto proposto de modo que seja possível avaliar o que se deseja. Davison
e Pearce (1988) alegam que uma das maneiras de os estudantes adquirirem nova informação é
por meio da transformação de ideias em linguagem. De acordo com os autores, “a execução
de uma tarefa escrita exige que os alunos reflitam a respeito de, analisem e sintetizem o
material a ser estudado de uma forma cuidadosa e precisaii” (DAVISON; PEARCE, 1988, p.
42, tradução nossa).
Além da finalidade comunicativa, educadores têm argumentado que a
escrita15 é importante para promover aprendizagem (write to learn) (EMIG, 1977;
JOHNSON, 1983; STEMPIEN; BORASI, 1985; BELL; BELL, 1985; DAVISON; PEARCE,
1988; BORASI; ROSE, 1989; VAN DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 1996; ISHII, 2003).
A ESCRITA representa um modo único de aprendizagem não apenas
valioso, não apenas especial, mas único. Esse será o meu argumento neste
trabalho. A tese é simples. A escrita está a serviço da aprendizagem
unicamente, porque como processo e produto possui um conjunto de
atributos que correspondem unicamente a certas poderosas estratégias de
aprendizagem (EMIG, 1977, p. 22, tradução nossa)iii.
Assim, mais do que ler, que consiste na decodificação de sinais [pistas] de
linguagem, e falar que é transitório e não permite revisão, a escrita - uma
atividade de codificação - fornece os contextos que incentivam aprender e
pensar (BELL; BELL, 1985, p. 214, tradução nossa)iv.
Não só a oportunidade para praticar a escrita melhora a capacidade de um
estudante na expressão escrita, mas a utilização da escrita para a prática de
tarefas matemáticas também auxilia os alunos a compreender conceitos de
matemática e melhorar a sua capacidade de se comunicar matematicamente
(DAVISON; PEARCE, 1988, p. 45, tradução nossa)v.
15
Escrita entendida como a ação “de escrever” e “refletir”.
22
No entanto, sugerimos que o uso da escrita para aprender pode fornecer
um meio valioso para facilitar uma abordagem personalizada e que faz
sentido [dá significado; making-of-meaning] para a aprendizagem da
matemática (BORASI; ROSE, 1989, p. 347, tradução nossa, grifo das
autoras)vi.
Segundo Johnson (1983), a escrita nas aulas de matemática, além de ser um
valioso objeto de investigação para o professor, pode contribuir para a aprendizagem por
propiciar aos estudantes,
 pensar e organizar seus pensamentos antes de escrever;
 atribuir significado aos conceitos estudados;
 desenvolver por meio da experiência a habilidade para expressar
seus pensamentos;
 pensar criativamente.
Em estudo realizado, Borasi e Rose (1989) destacam alguns benefícios da
escrita para a aprendizagem e argumentam a respeito de como e por que esta prática deve ser
incorporada nas aulas de matemática. Nesse estudo, 29 estudantes foram convidados a manter
uma espécie de diário ao longo de um curso de matemática, no qual poderiam registrar com
total liberdade qualquer pensamento relacionado à sua aprendizagem, tendo sido encorajados
a incluir entradas, pensamentos pessoais, reflexões a respeito da matéria aprendida em sala de
aula, reações às leituras e palestras realizadas, ou mesmo comentários relativos às tarefas
específicas. Borasi e Rose (1989) concluíram que a escrita deste material
 teve um efeito terapêutico sobre os componentes emocionais da
aprendizagem da matemática pelo fato de os estudantes expressarem
e refletirem a respeito de seus sentimentos, sobre o curso, a
matemática e a escolaridade;
 proporcionou maior acessibilidade aos conteúdos matemáticos. Por
ser necessário escrever sobre um determinado conteúdo, os alunos
necessitavam entendimento melhor e mais pessoal do assunto
tratado, provocando, portanto, a investigação;
 apresentou uma melhoria na aprendizagem e habilidades para
resolver problemas por resultar da articulação e reflexão a respeito
do processo de fazer matemática.
Bell e Bell (1985) apresentaram um estudo piloto, no qual estudantes de um
grupo experimental, que deveriam escrever sobre seus modos de pensar em suas tarefas,
apresentaram uma melhora estatisticamente significativa na resolução de problemas em
23
relação ao grupo de controle, que deveria apresentar apenas as soluções dos problemas. Os
autores concluem que, apesar de ter sido “apenas um estudo piloto, há uma base para
promover o uso da escrita como um processo de ensino e aprendizagem na apresentação de
resolução de problemas matemáticos para os alunos”vii (BELL; BELL, 1985, p. 219, tradução
nossa). Além disso, os autores argumentam que a escrita na resolução de problemas promove
a comunicação, por dar oportunidade dos estudantes revelarem suas dificuldades de
compreensão.
Assim como na alfabetização o aprender a escrever dá suporte para aprender
a ler, na matemática as tarefas escritas deveriam servir de apoio para que os estudantes
aprendam a ler matematicamente. Parece que as tarefas matemáticas resumem-se quase
sempre na leitura e interpretação de um enunciado de contexto matemático, ou mesmo que
envolva outras informações não matemáticas, a resolução quase sempre é orientada para uma
produção “puramente” matemática, com números, símbolos, algoritmos. A produção de texto
em matemática é quase sempre suprimida, quando deveria ser estimulada por se tratar de uma
ação que pode desenvolver a criatividade e o espírito interpretativo. De acordo com Borasi e
Rose (1989) e Davison e Pearce (1988), tradicionalmente, a quantidade de escrita necessária
em cursos de matemática tem sido mínima. Talvez seja pela falta de estímulo da escrita que os
alunos tenham tanta dificuldade em traduzir contextos em linguagem matemática e utilizarem
linguagem matemática em outros contextos.
Para Johnson (1983), a escrita como uma ferramenta analítica é
frequentemente utilizada nos cursos de literatura e ciências sociais, mas aos alunos “quase
nunca” é dada a oportunidade de produzir escrita significativa nas aulas de matemática. O
autor argumenta que professores de matemática precisam reconhecer que a escrita pode ser
uma ferramenta valiosa de aprendizado e de avaliação e que “se os alunos podem escrever
com clareza sobre os conceitos matemáticos, então é evidente que eles os entendem viii” (1983,
p. 117, tradução nossa).
No processo de “tradução do pensamento matemático em linguagem
escrita” há algumas perdas, as quais tornam o trabalho (do professor) de leitura da produção
escrita tão complexo quanto à ação de escrever (do aluno). A escrita é tão importante para a
aprendizagem do aluno quanto, a leitura e análise das produções escritas são para o trabalho
do professor em sua contínua formação e prática pedagógica.
A análise da produção escrita é uma prática que serve à avaliação como
prática de investigação e pode ser considerada tanto na formação do professor como em sua
rotina letiva.
24
Ao incentivar os alunos a se explicarem em prosa clara e coerente, a
exposição permite que eles se tornem mais conscientes de seus processos de
pensamento e mais cônscios das escolhas que fazem ao realizar cálculos e
análises envolvidos na resolução de problemas de matemáticaix (BELL;
BELL, 1985, p. 220, tradução nossa).
Com o intuito de introduzir a prática da escrita nos cursos de matemática,
Johnson (1983) apresenta algumas alternativas:
 solicitar que os alunos reescrevam os problemas de contexto que não
foram compreendidos. Isto os ajuda a identificar as palavras
importantes do enunciado bem como suas relações;
 propor que os estudantes elaborem seus próprios problemas;
 solicitar que reescrevam os parágrafos difíceis de um texto estudado;
 convidar os alunos a explicar relações, discutir sentenças, dissertar
sobre temas matemáticos.
A respeito dos benefícios que a leitura das produções escritas dos estudantes
pode causar, Borasi e Rose (1989) concluem a partir de sua pesquisa que, em relação às
avaliações realizadas anteriormente com o mesmo grupo, houve uma melhoria na avaliação e
uma remediação individual dos alunos; pode-se obter um feedback homogêneo a respeito dos
aspectos do curso em si; um feedback imediato a respeito do desempenho do professor no
decorrer do curso. Bell e Bell (1985) argumentam ainda que, se os estudantes esclarecem seus
modos de lidar em suas produções escritas, o professor pode fornecer feedback imediato e
individual respondendo com sugestões que podem tornar claros os processos desenvolvidos
pelos alunos.
Como em todo tipo de avaliação, para ser bem realizada, a análise da
produção escrita deve contar com um planejamento bem delineado e contingenciado pelos
objetivos do professor. O instrumento de recolha de dados deve estar em coerência com os
objetivos traçados e possibilitar acesso à informação desejada. A análise da produção escrita
associada a um bom instrumento de avaliação pode servir para
 detectar erros frequentes, recorrentes, dificuldades;
 simular formas de pensar, tipos de raciocínio;
 investigar causas de erros, obstáculos didáticos, obstáculos
epistemológicos;
 investigar acertos casuais;
 produzir e emitir feedback;
25
 dar suporte para a reelaboração do próprio instrumento de avaliação
utilizado.
A respeito das dificuldades de realizar a análise da produção escrita,
Johnson (1983) destaca que não é de se esperar que a escrita dos estudantes seja similar à de
um matemático profissional, e que o professor deve considerar/relevar alguns aspectos, dentre
eles a dificuldade dos estudantes se expressarem.
A análise da produção escrita é uma prática que cabe tanto ao professor
quanto ao aluno. Propor tarefas nas quais os alunos possam também realizar a análise de suas
produções escritas e a de seus pares pode ajudá-los no sentido de aperfeiçoar suas próprias
produções ao considerarem a necessidade de tornar clara a mensagem emitida.
Não existe um momento específico para realizar a análise da produção
escrita. É uma prática que permeia praticamente todo o processo de avaliação de
aprendizagem, desde a seleção/elaboração dos instrumentos de avaliação, das tarefas
matemáticas que comporão as provas escritas, relatórios, trabalhos. Realizar uma previsão da
produção que é almejada dos estudantes também é um trabalho que cabe à análise da
produção escrita. Contudo, para que a informação desejada seja provocada, é necessário que o
estudante se envolva em tarefas que despertem seu interesse.
Em consonância com a avaliação enquanto prática de investigação e
oportunidade de aprendizagem, a Educação Matemática Realística (RME) mostra-se como
uma perspectiva que é consoante com a avaliação desejada pela pesquisadora/pelo GEPEMA.
O modo como o ensino e a aprendizagem são apresentados na perspectiva da RME se mostra
favorável à prática de uma mudança de atitude do modo tradicional como a avaliação escolar
vem sendo ainda empregada. Portanto, tomamos a Educação Matemática Realística como
uma oportunidade de constituir um referencial para uma avaliação escolar que oportunize a
aprendizagem.
26
2 ESTUDANDO AS POSSIBILIDADES DE JOGO
2.1 EDUCAÇÃO MATEMÁTICA REALÍSTICA – ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
Na busca de conhecer como estudantes lidam com questões não-rotineiras
de Matemática, em 2006, o GEPEMA iniciou estudos a respeito da análise da produção
escrita em itens do PISA, por serem validadas e caracterizadas como não-rotineiras. A ideia
de trabalhar com tarefas de matemática não-rotineiras parte da hipótese de que elas podem
mobilizar conhecimentos dos estudantes por se tratarem de situações familiares, imagináveis,
com as quais eles possam produzir significado e, então, aprender matemática16. Como o PISA
apresentava em seus documentos indícios da RME como fundamentação teórica, o GEPEMA,
a partir de 2006, começou a estudar essa abordagem que, além de continuar sendo tema atual
de estudo do GEPEMA, tem se tornado um referencial teórico para nossos estudos em
Avaliação e Educação Matemática.
A Educação Matemática Realística é uma abordagem de ensino e
aprendizagem cujo desenvolvimento foi inspirado, principalmente, pelas ideias e
contribuições do educador matemático alemão Hans Freudenthal (1905-1990).
Hans Freudenthal, nascido em 1905, desenvolveu interesses em matemática,
ciências e literatura. Em 1923, ele entrou na Universidade de Berlim para estudar matemática
e física. Seu orientador de doutorado foi Heinz Hopf e, em 1931, Freudenthal concluiu seu
doutorado com uma tese a respeito da teoria dos fins de grupos. Em 1927, enquanto estudava
na Universidade de Berlim, assistiu uma palestra dada por Luitzen Egbertus Jan Brouwer,
adepto da corrente filosófica da matemática conhecida como intuicionismo. Brouwer foi um
forte influenciador das ideias de Hans Freudenthal.
Em 1930, Freudenthal foi convidado para ir para a Universidade de
Amsterdã como assistente de Brouwer. Durante a invasão da Alemanha na Holanda, em
meados de 1940, Freudenthal ficou afastado de suas funções na Universidade de Amsterdã,
devido à perseguição nazista (ele era judeu). Em maio de 1945, após a Holanda ter sido
libertada pelas tropas canadenses, Freudenthal pôde voltar às suas funções, tomando posse
como professor na Universidade de Utrecht, de 1946 até o ano de 1975, quando se aposentou.
16
Não é exatamente pelo fato de ser não-rotineiras (não, frequentemente, presentes em livros didáticos) que faz
com que as questões tenham as caraterísticas apresentadas. O que ocorre é que questões com estas
características, que acreditamos interessantes, ainda são muito pouco presentes nos livros.
27
Os primeiros trabalhos de Freudenthal foram relacionados à topologia e
álgebra. Mais tarde, fez grandes contribuições no campo da Geometria, Filosofia, História da
Matemática e Educação Matemática. Ele morreu, em 1990, sentado em um banco de um
parque perto de sua casa, em Utrecht.
A RME surgiu na Holanda entre o final da década de 1960 e começo dos
anos 1970. Nessa época, educadores holandeses, influenciados pelas ideias de Hans
Freudenthal, buscavam elaborar uma proposta curricular que modernizasse a Educação
Matemática do país, com uma perspectiva de reforma educacional em oposição ao movimento
da Matemática Moderna, dominante em muitos países, que tinha uma perspectiva de ensino
estruturalista como base.
O movimento para reforma curricular não foi exclusivo da Holanda.
Educadores e autoridades de outros países, também, buscavam reformas para o ensino de
matemática em seus países. Entretanto, o que parece ter alavancado a reforma na Holanda foi
o relacionamento de Hans Freudenthal com a ICMI17 (Comissão Internacional de Instrução
Matemática), como presidente, entre os anos de 1967 e 1970.
Em 1908, no IV Congresso Internacional de Matemática em Roma, foi
aprovada uma resolução, apresentada por iniciativa do educador americano David Eugene
Smith (1860-1944), da criação de uma Comissão Internacional18 com o objetivo inicial de
fazer um estudo comparativo a respeito dos métodos e planos de ensinar matemática nas
escolas secundárias. O presidente fundador19 da ICMI foi o matemático alemão Felix Klein
(1849-1925) e o primeiro secretário-geral foi o suíço Henri Fehr, um dos cofundadores da
revista internacional L‘Enseignement Mathématique.
Depois de interrupções de suas atividades ao longo das duas Guerras
Mundiais, a ICMI foi reconstituída em 1952. Naquele momento, a comunidade internacional
matemática estava se reorganizando e a ICMI tornou-se, então, uma comissão oficial da
União Internacional de Matemática20 (IMU – International Mathematical Union).
17
International Commission on Mathematical Instruction.
No entanto, a ideia de uma comissão internacional já havia sido formulada por Smith, três anos antes na
revista internacional L‘Enseignement Mathématique.
19
Mais tarde, os ICMIs estiveram sob a presidência de matemáticos e educadores eminentes, citando alguns:
Jacques Hadamard (de 1932 até a guerra), H. Marshall Stone (1959-1962), André Lichnerowicz (1963-1966),
Hans Freudenthal (1967-1970), Jean-Pierre Kahane ( 1983-1990), Miguel de Guzmán (1991-1998) e Hyman
Bass (1999-2006). Assim, o interesse e engajamento produtivo de pesquisadores matemáticos preocupados com
a educação matemática escolar têm uma história longa e substancial, embora desigual (ICMI, 2012, on-line).
20
Outras informações disponíveis em: <http://www.mathunion.org>. Acesso em: 19 out. 2012.
18
28
Ao longo do tempo, como a missão da educação geral se expandiu,
aumentaram também as necessidades e complexidade da educação matemática. O pequeno
espaço disponibilizado para uma das seções da ICMI comprometeu a comunicação de
problemas e ideias relacionadas com a educação matemática. Isto levou o então presidente
Hans Freudenthal a organizar, em 1969, o primeiro Congresso Internacional de Educação
Matemática (ICME21), em Lyon (na França). O ICME, desde então, evoluiu para congressos
quadrienais. Eles representam hoje em dia um elemento importante no programa de atividades
da ICMI, mas não apenas o único (ICMI, 2012, on-line).
Além de sua relação com os ICMIs e ICMEs, Hans Freudenthal teve
também outras fortes influências que, por sua vez, influenciaram as atuais bases da RME.
Hans Freudenthal foi o editor fundador da Educational Studies in Mathematics22 e um dos
fundadores do PME23 (Grupo Internacional de Psicologia e Educação Matemática). Ele
também foi fundador e presidente da Comissão para o Estudo e Melhoria do Ensino de
Matemática (CIEAEM24), que conta com mais de 50 anos de atividade (GRAVEMEIJER;
TERWEL, 2000).
O movimento de reforma na Holanda teve impulso a partir de 1968, com o
projeto Wiskobas (que significa “matemática nas escolas primárias”) e teve como fundadores
Fred Goffree, Edu Wijdeveld e, mais tarde, Adrian Treffers. O Wiskobas foi um projeto do
CMLW (Mathematics Curriculum Modernization Committee) que foi criado, em 1961, para
modernizar a educação matemática nas escolas secundárias. Em 1971, o Instituto IOWO
(Instituto para Desenvolvimento de Educação Matemática) forneceu as instalações para o
desenvolvimento do projeto Wiskobas. O IOWO tinha na época como diretor Hans
Freudenthal, que, por sua resistência ao movimento da Matemática Moderna em relação à
Educação Matemática, deu um novo impulso ao movimento holandês para uma reforma
curricular. Em 1981, o Instituto IOWO foi sucedido pelo grupo de Investigação para a
21
International Congresson Mathematical Education.
Educational Studies in Mathematics (Estudos Educacionais em Matemática). De acordo com o inventário de
publicações relativas à RME, contruído pelo GEPEMA e atualizado até 2010, é o periódico com maior
quantidade de publicações.
23
PME – International Group for Psychology and Mathematics Education. Segundo Gravemeijer e Terwel
(2000), o PME foi estabelecido para superar o behaviorismo dominante na psicologia educacional. O PME é um
grupo internacional de educadores e pesquisadores de matemática que se reúnem anualmente para compartilhar e
discutir interesses a respeito da Educação Matemática. Foi fundado em 1976, no III ICME, realizado na
Alemanha.
24
CIEAEM– International Commission for the Study and Improvement of Mathematics Teaching. Afiliada ao
ICMI, fundada a partir de 1950, tem como meta investigar as atuais condições e possibilidades para o
desenvolvimento da educação matemática a fim de melhorar a qualidade do ensino da matemática. As
conferências da CIEAEM são anuais.
22
29
Educação Matemática e Centro de Computação Educacional (OW & OC) e, em 1991, em
homenagem ao precursor da RME, passou a se chamar Instituto Freudenthal (FI ou FIsme). O
FIsme (Freudenthal Institute for Science and Mathematics Education) é uma organização
holandesa de pesquisadores que, atualmente, se dedicam ao estudo do ensino de ciências e
educação matemática.
O principal objetivo daquela reforma curricular holandesa foi o de
abandonar a abordagem mecanicista, até então, prevalecente para a educação matemática.
Nessa busca, a Holanda não perseguiu nem a abordagem empirista, predominante na
educação matemática da Inglaterra, nem a estruturalista, que nos EUA levou ao movimento
New Math (VAN DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 2010). No quadro a seguir, apresentamos
algumas características das abordagens citadas, segundo Van den Heuvel-Panhuizen (2010).
Quadro 2 – Abordagens tradicionais segundo Van den Heuvel-Panhuizen (2010).
Abordagem
Características
Mecanicista
“Característica desta abordagem é seu foco em cálculos com números simples, e a
pouca atenção prestada às aplicações; o que é certamente verdade para o início do
processo de aprendizagem. Matemática é ensinada de uma forma atomizada.
Estudantes aprendem os procedimentos de uma maneira passo a passo na qual o
professor demonstra como resolver um problema” (VAN DEN HEUVELPANHUIZEN, 2010, p. 4, tradução nossa)x.
Empirista
Típico deste tipo de educação era que os alunos eram deixados livres para descobrir
muito por si próprios e eram estimulados a realizar investigações (VAN DEN
HEUVEL-PANHUIZEN, 2010, p. 4, tradução nossa)xi.
Estruturalista
Este é um método de ensinar matemática que foca em conceitos abstratos, como a
teoria dos conjuntos, funções e outras bases diferentes de dez (VAN DEN
HEUVEL-PANHUIZEN, 2010, p. 4, tradução nossa)xii.
Fonte: autora.
Dada a insatisfação com o ensino por meio das abordagens denominadas
tradicionalistas dominantes na época, Freudenthal (1968, 1983, 1991) fomentou uma
discussão a respeito do que acreditava ser a educação matemática, lançando suas ideias a
respeito do ensino e aprendizagem, ao apresentar e discutir a respeito
 da matemática como Atividade Humana;
 do ensino e aprendizagem como Princípio de Reinvenção;
 da aprendizagem Matemática por meio da Matematização;
30
 da
reinvenção
de
ferramentas
matemáticas
por
meio
da
25
Matematização Progressiva .
A partir desses conceitos fundamentais foram lançadas as bases da RME, que começaram a
ser incorporadas, desenvolvidas, aprimoradas por seguidores e adeptos das ideias de
Freudenthal.
Freudenthal teve outras várias influências na elaboração de suas ideias.
Segundo Gravemeijer e Terwel (2000), ele foi, também, influenciado pelas ideias pedagógicas
de sua esposa Suus Lutter-Freudenthal, uma das forças motrizes por trás do movimento
JenaPlan26 de Peter Petersen, na Holanda. Foi, também, fortemente influenciado pela reforma
pedagógica do educador belga Ovide Decroly, sendo, ambos, membros ativos da New
Education Fellowship27 (GRAVEMEIJER; TERWEL, 2000). A ideia de Freudenthal a
respeito do aprendizado de matemática em contextos realísticos se assemelha à ideia
educacional de Decroly relativa aos Centros de Interesse, bem como o princípio de Decroly
sobre elaboração em espaço e tempo corresponde ao princípio da Reinvenção-Guiada de
Freudenthal (GRAVEMEIJER; TERWEL, 2000).
Embora o movimento RME tenha começado no final da década de 60, a
expressão Educação Matemática Realística começou a ser utilizada apenas no final dos anos
70 (TREFFERS, 1991). O termo “realistic” tem origem no verbo neerlandês “zich REALISEren‖ e foi traduzido, para o português, também pelo GEPEMA, para “realístico” ao invés de
“realista”, porque parece estar mais relacionado ao significado de “imaginar”, “realizar”,
“fazer ideia”, “tomar consciência de” (realistic no inglês) e, por sua vez, à possibilidade de
“tornar real” na mente28 dos estudantes, o que sugere que os contextos ou situações nos quais
os alunos se envolvem não precisam ser autenticamente “reais”, mas precisam ser
imagináveis, realizáveis, concebíveis (VAN DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 2005).
25
Estas ideias tiveram fortes influências da perspectiva construtivista de Brower, adepto da corrente filosófica
intuicionista, para a qual a intuição ocupa o papel principal para o conhecimento. Nessa perspectiva,
construtivistas defendem que a matemática é produto de construções mentais. Uma vez que é considerada fruto
de contruções mentais (humanas), Freudenthal apresenta o slogan “Matemática como atividade humana”.
26
O JenaPlan é uma abordagem de ensino pautada nas ideias educacionais de Peter Petersen (1884-1952) e
recebeu este nome por seu precursor ser natural de Jena, Alemanha.
27
Uma antiga organização internacional que tinha como objetivo a reforma pedagógica. Nessa organização
podem ser citados ainda Martin Buber, Ovide Decroly, John Dewey, Geheeb Paulo, Maria Montessori, Helen
Parkhurst, Meuter Hanna, Jean Piaget e Peter Petersen. As conferências realizadas por essa organização
ocorreram em meados de 1920-1940.
28
Segundo Heyting (1956, p. 22 apud SHAPIRO, 1997), a matemática, a partir do ponto de vista intuicionista, é
um estudo de determinadas funções da mente humana, e o programa de Brouwer consistiu em um estudo de
construções matemáticas mentais, no qual o “existir” deveria ser tomado como sinônimo de “ser construído”.
Assim, na perspectiva de Freudenthal, a possibilidade de aprender matemática está associada à de torná-la “real”,
ou seja, imaginável na mente dos estudantes.
31
Freudenthal (1968) propôs uma discussão a respeito do que é matemática e
o que deveria ser considerado útil para a aprendizagem29. Para ele, a matemática é vista com
um meio de organizar um assunto, que pode envolver a procura e resolução de problemas, a
conceituação de um tema estudado de um ponto de vista matemático (FREUDENTHAL,
1971). Como matemático, Freudenthal (1968) argumentava que a função dos matemáticos
era, especificadamente, matematizar assuntos próprios do conhecimento matemático, mas que
era possível, também, matematizar assuntos da realidade.
De acordo com Freudenthal (1991), a matemática deve ser conectada com a
realidade, estar próxima das crianças, ser relevante para a sociedade e ser de valor humano.
Para Van Den Heuvel-Panhuizen (1996), sob a perspectiva da Educação Matemática
Realística, o aluno deve “fazer matemática” partindo de fenômenos e, ao lidar com eles,
desenvolver ferramentas matemáticas necessárias para esse lidar.
Freudenthal (1991) defendia a ideia da Matemática como uma “Atividade
Humana” em construção, na qual deveria ser dada aos alunos a oportunidade de “reinventar” a
matemática, fazendo-a (FREUDENTHAL, 1991; TREFFERS, 1987; DE LANGE, 1987;
VAN DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 1996; GRAVEMEIJER; DOORMAN, 1999). Ele e seus
seguidores acreditam que os alunos deveriam ter a oportunidade “guiada” para reinventá-la,
em lugar de serem considerados como receptores de uma matemática já “pronta” e “acabada”.
Segundo Freudenthal (1971, p. 413-414), a matemática como atividade humana
é uma atividade de resolução de problemas, de procura por problemas, mas é
também uma atividade de organização de um determinado assunto. Este
pode ser um assunto da realidade que deve ser organizado de acordo com
modelos ou padrões matemáticos caso os problemas da realidade devam ser
resolvidos. Também pode ser um assunto matemático, resultados novos ou
antigos, de seu próprio país ou de outros, que devem ser organizados de
acordo com novas ideias, para serem mais bem compreendidos, em um
contexto mais amplo ou por meio de uma abordagem axiomáticaxiii
(FREUDENTHAL, 1971, p. 413-414, tradução nossa).
Nesta perspectiva, a essência da Educação Matemática não reside no ensino
dos objetos matemáticos30 simplesmente, mas sim na atividade: um processo de organização e
tratamento de um assunto por meio desses objetos. Partindo deste ponto de vista, a
matemática é vista como uma ação e não como um “comboio” de conhecimentos e, portanto,
29
Segundo Gravemeijer e Terwel (2000), embora Freudenthal nunca tenha referenciado estudiosos como o
alemão Wolfgang Klafki, perguntas básicas de Klafki tornaram-se, também, questões de interesse de
Freudenthal: o que deve ser ensinado em um assunto escolar? Para qual propósito? E para quem?
30
Estamos chamando de objeto matemático, qualquer conhecimento matemático já conhecido e sistematizado
historicamente.
32
não faz sentido ensinar às crianças apenas os “conteúdos”, mas sim dar a elas diferentes
oportunidades para experienciar a matemática como uma “atividade humana”. Nesse sentido,
os conteúdos, conceitos, objetos, ideias, algoritmos, propriedades matemáticas emergem dos
fenômenos com os quais os alunos podem se envolver ao lidar com um assunto, em vez de ser
o ponto de partida.
Freudenthal (1968, 1973, 1991) argumenta que, se as crianças aprendem
matemática de uma forma isolada, divorciada de suas experiências, ela será esquecida e não
serão capazes de aplicá-la. Para este autor, os alunos têm maior chance de aprender
matemática construindo-a, reinventando-a, recriando-a.
A sistematização é uma virtude da matemática e o que as crianças devem
aprender é a atividade de sistematizar e não o resultado da sistematização apenas
(FREUDENTHAL, 1968). Segundo o autor, o poder maravilhoso que a matemática tem de
eliminar o contexto e colocar outros contextos “na mesma forma” é que faz dela uma
atividade útil. Portanto, parece inócuo apresentar apenas conteúdo sistematizado para ser
operacionalizado, uma vez que, como um sistema fechado, até uma máquina pode operar, e
isso não caracteriza uma atividade humana. O que é próprio dos humanos é a atividade de
matematizar o assunto estudado, seja ele matemático ou não (FREUDENTHAL, 1968).
Pensar em uma matemática possível de ser transferida significa pensar que
alunos “aprendem” ao armazenar e reproduzir informações (conceitos,
objetos matemáticos), assim como, por exemplo, robôs e computadores.
Quem “recebe” não participa da escolha de quais informações vai receber e,
muito menos, da decisão de quais são importantes para serem
“armazenadas”, de quando aplicá-las, para quê e/ou por que elas são
relevantes, ou como foram obtidas. Essa poderia ser adjetivada como uma
“atividade robótica”, “atividade cibernética”, mas não humana (LOPEZ,
2010, p. 15-16).
Freudenthal (1968, 1983) considera uma inversão antididática31 o ensino da
matemática a partir do próprio conteúdo matemático para depois aplicá-lo em problemas, o
que caracteriza uma forma de ensino contrária às ações dos matemáticos. Na perspectiva
proposta por este autor, os alunos devem fazer matemática, lidar com ela, para então produzir
conhecimento, resolver problemas, organizar e utilizar fenômenos da sala de aula em
situações do dia a dia.
31
As críticas de Freudenthal a respeito da inversão antididática, visualizada na perspectiva de instrução
tradicional, bem como suas ideias a respeito do princípio de reinvenção foram, provavelmente, inspiradas pelo
movimento de reforma pedagógica, por sua vez, fortemente influenciada pelas ideias de Peter Petersen e Maria
Montessori (GRAVEMEIJER; TERWEL, 2000).
33
Ao encontro da perspectiva da matemática como uma atividade humana,
Freudenthal (1991) considerava que a aprendizagem deveria ser concebida, na realidade, a
partir da exploração de situações que possibilitassem aos estudantes “reinventar”32 a
matemática. Ele reconhecia que, embora todo corpo de conhecimento matemático não
pudesse ser simplesmente reinventado em situações de sala de aula, os estudantes deveriam
ter a oportunidade de experienciar processos nos quais eles se sentissem os “autores” da
invenção, com a perspectiva de que a matemática fosse visualizada como uma ação, sempre
em movimento, e não como algo complexo pronto, acabado, imutável.
Na reinvenção guiada
 os alunos têm um papel fundamental e são considerados: (a)
protagonistas da aprendizagem; (b) reinventores de ferramentas,
procedimentos, conceitos matemáticos; (c) autores do que fazem.
 o professor serve de guia, interventor, orientador, recurso,
mediador do processo de aprendizagem.
 as tarefas são motes, pontos de partida, para o processo de
reinvenção; devem ser propícias às possíveis matematizações.
 a matemática é uma atividade humana.
 a aprendizagem é baseada na experiência do aluno, na qual a
construção de conceitos matemáticos é feita de forma que ele
consiga reconstruir o que aprendeu33.
De acordo com o princípio da reinvenção, os alunos devem ter a
oportunidade de vivenciar um processo semelhante àquele pelo qual um determinado objeto
matemático foi construído (FREUDENTHAL, 1973). Nesse processo, a ajuda do professor é
de fundamental importância, como um orientador, mediador, guia que oferece direções,
verifica a convergência entre o que os estudantes produzem e o que há de padrões vigentes na
comunidade matemática. O ponto de partida neste processo são as estratégias informais dos
estudantes, que, gradualmente, tendem a se tornar formais, segundo as orientações do guia
(DRIJVERS, 2003). Nessa perspectiva, o processo de aprendizagem é estruturado por
32
Isto significa possibilitar que os alunos experimentem um caminho “semelhante” ao processo pelo qual a
matemática foi elaborada historicamente e, então, atribuir algum sentido à sua utilidade em situações diversas.
33
Sistematização construída a partir das referências: (FREUDENTHAL, 1968, 1971, 1983, 1991; DE LANGE,
1987; TREFFERS, 1987; VAN DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 1996; DRIJVERS, 2003).
34
níveis34. Em um nível, determinado conceito pode ser o objeto da matematização, que em
outros níveis, pode ser ferramenta útil para organização de outros assuntos, na busca de
matematizar e sistematizar outros objetos.
Freudenthal considerava a matemática não como o corpo do conhecimento
matemático, mas como uma atividade de busca e resolução de problemas e, de forma mais
geral, como a atividade de organizar “matematicamente” a “realidade” – atividade que
chamou de “matematização” (VAN DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 2003). Para Freudenthal
(1991), aprender matemática deveria ter origem no “fazer” matemática, sendo a
matematização o núcleo da Educação Matemática. Treffers (1987) descreveu a matematização
como
uma atividade organizada. Ela refere-se à essência da atividade matemática,
à linha que atravessa toda educação matemática voltada para a aquisição de
conhecimento factual, à aprendizagem de conceitos, à obtenção de
habilidades e ao uso da linguagem e de outras organizações, às habilidades
na resolução de problemas que estão, ou não, em um contexto matemáticoxiv
(TREFFERS, 1987, p. 51-52, tradução nossa).
Associado ao conceito de atividade humana, o foco da matematização não
reside sobre a forma ou produtos da atividade, mas sim sobre a própria atividade, bem como
sobre seu efeito. Na opinião de Freudenthal (1968), Educação Matemática para crianças,
acima de tudo, deve ter como objetivo a matematização da realidade “cotidiana” (VAN DEN
HEUVEL-PANHUIZEN, 1996; GRAVEMEIJER; TERWEL, 2000).
Segundo Gravemeijer e Terwel (2000), matematização busca por “fazer
mais matemática”. Para esclarecer o que significa “mais matemática”, pode-se pensar em
características da matemática como generalidade, certeza, exatidão e concisão:
generalidade: generalizando (olhando para analogia, classificando,
estruturando); certeza: refletindo, justificando, provando (usando uma
abordagem sistemática, elaborando e testando conjecturas, etc.); exatidão:
modelando, simbolizando, definindo (limitando interpretações e validade); e
concisão: simbolizando e esquematizando (desenvolvimento de padrão
procedimentos e notações)xv (GRAVEMEIJER; TERWEL, 2000, p. 781,
tradução e sublinhados nossos).
Para Freudenthal (1968, 1971), era possível “matematizar a realidade” e
“matematizar a matemática” (STREEFLAND, 2003). Freudenthal denominou esta
34
Esta ideia está fundamentada nos níveis de Van Hiele, elaborados pelo casal neerlandês Dina van HieleGeldof e Pierre van Hiele em suas teses de doutorado, que foram orientadas por Martinus Jan Langeveld e Hans
Freudenthal na Universidade de Utrecht (GRAVEMEIJER; TERWEL, 2000).
35
organização da atividade de matematização que pode envolver “assunto da realidade” e
“assunto matemático”. Ao processo que Freudenthal chamava de matematização podem ser
identificadas duas grandes vertentes. A primeira é a que explica o sujeito ir dos contextos
“realísticos” envolvidos nas tarefas ou fenômenos explorados, para um assunto matemático. A
segunda diz respeito ao desenvolvimento dos procedimentos matemáticos para explorar os
fenômenos. Na tentativa de poder falar sobre essas vertentes, Treffers (197835, 1987), em sua
tese, distinguiu matematização horizontal e vertical: a primeira como uma tarefa de tornar um
assunto acessível para tratamento matemático e a segunda como uma tarefa de promover um
processamento matemático mais “sofisticado” (apud FREUDENTHAL, 1991). Treffers e
Goffree (1985) também apresentam algumas ideias a respeito dos conceitos de matematização
horizontal e vertical. Segundo os autores, a matematização é um processo dinâmico; o que
pode ser um assunto a ser matematizado, em certo momento, pode ser utilizado mais tarde
como um modelo de caráter algorítmico para matematizar outro assunto de nível mais
elevado. A matematização horizontal transforma um problema em campo matemático (o
problema é abordado por métodos matemáticos, ou ainda, o problema é esquematizado a fim
de ser manipulado por ferramentas matemáticas). As atividades de processamento dentro do
sistema matemático caracterizam a matematização vertical, a qual significa ainda uma
renovação do problema do mundo real em matemática.
Na componente horizontal a estrada para a matemática é pavimentada por
meio de formação de modelo, esquematização e atalhos. A componente
vertical atua por processamento matemático, aumentando o nível de
estrutura no campo do problema correspondente. Sem dúvida, separar grupos
de atividade sem dois componentes parece um pouco artificial.xvi
(TREFFERS; GOFFREE, 1985, p. 109, tradução nossa).
Treffers (1987) conceitua a “matematização horizontal” como uma tentativa
de esquematizar o problema matematicamente, ou seja, a matematização horizontal consiste
em esquematizar o que se considera necessário para que seja possível abordar o problema por
meios matemáticos, seja por meio da formação de um modelo, de esquematização, ou de
simbolização. Segundo Van den Heuvel-Panhuizen (2010), envolve a ida do “mundo da vida
real” para o “mundo da matemática”. Isto significa que as ferramentas matemáticas são
utilizadas para elaborar, organizar o modelo e resolver problemas situados em algumas
situações da vida real.
35
TREFFERS, A. Wiskobas doelgericht. Utrecht: IOWO, Rijksuniversiteit Utrecht, 1978. A tese de Adrian
Treffers está originalmente escrita na língua holandesa.
36
As tarefas que acompanham e estão relacionadas ao processo matemático, à
solução do problema, à generalização da solução e à posterior formalização podem ser
descritas como uma “matematização vertical”, segundo Treffers (1987). Para Van den HeuvelPanhuizen (2010), matematizar verticalmente significa mover-se dentro do “mundo” da
matemática. Refere-se ao processo de reorganização dentro do sistema matemático resultando
em atalhos, fazendo uso de ligações entre conceitos e estratégias.
Freudenthal,
em
seu
livro
Revisitando
a
Educação
Matemática
(FREUDENTHAL, 1991), discorre a respeito de uma sua resistência para aceitar as duas
componentes da matematização como propostas por Treffers (1987), porque para ele não era
possível separá-las e nem compará-las atribuindo-lhes maior ou menor valor. Para
Freudenthal (1991), não há um ponto de corte claro que promova a distinção entre os dois
“mundos”. Treffers (1987) também reconheceu que esta distinção entre matematização
horizontal e vertical é um pouco artificial, dado que elas estão fortemente inter-relacionadas.
A
resistência
de
Freudenthal
para
distinguir
os
dois
tipos de
matematização36 propostas por Treffers (1987) parece ter base em uma de suas críticas a
respeito das abordagens tradicionais de ensino enfatizarem apenas um ou outro componente
da matematização. Para ele, as duas formas de matematizar possuem igual valor e merecem
mesma importância. Assim, o conceito global de matematização deve incluir tanto
matemática aplicada como matemática pura. Para ilustrar as diferenças entre as abordagens
tradicionais de ensino e a Educação Matemática Realística com relação à matematização,
Treffers (1987) apresenta o seguinte quadro.
Quadro 3 – Tipos de matematização na Instrução Matemática.
Abordagem para a Educação
Matemática
Horizontal
Mecanicista
−
Empirista
+
Estruturalista
−
Realística
+
Fonte: Treffers (1987, p. 251, tradução nossa).
36
Matematização
Vertical
−
−
+
+
Freudenthal (1991) afirma que, apesar de sua resistência inicial, acabou aceitando o uso das expressões
matematização horizontal e vertical. Vale a pena observar que Freudenthal foi o orientador da tese de Adri
Treffers.
37
Se por um lado, a matematização é própria das tarefas dos estudantes, uma
atividade de organizar assuntos matematicamente, a “didatização37” é própria das tarefas do
professor como uma atividade de organizar fenômenos suscetíveis à matematização. Nesta
perspectiva, Freudenthal (1983) explora o conceito de fenomenologia didática. Segundo
Freudenthal (1983), conceitos matemáticos, estruturas, ideias foram inventados como
ferramentas para organizar fenômenos do mundo físico, social e mental. A fenomenologia de
um conceito matemático, de uma estrutura ou ideia significa a ação de descrevê-la em sua
relação com os fenômenos para os quais foi criada. Estendendo esta ideia para o processo de
aprendizagem a fenomenologia didática se mostra como uma maneira de o professor
oportunizar aos alunos os “lugares” ou “situações” pelas quais podem reinventar “suas”
matemáticas, matematizar. Freudenthal (1983) apresenta o conceito de fenomenologia
didática38 como uma heurística sob a qual, a partir da exploração de fenômenos, são extraídos
os objetos matemáticos.
Uma condição para pôr em prática a fenomenologia didática é propiciar aos
estudantes tarefas ricas39. Nesse sentido, os contextos das tarefas de matemática
desempenham um importante papel na resolução dos estudantes (DE LANGE, 1987;
TREFFERS, 1987; VAN DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 1996).
Resumidamente, a Educação Matemática Realística é caracterizada por
cinco/seis40 princípios que são fundamentados nos níveis de Van Hielexvii, na fenomenologia
didática de Freudenthal, e na Reinvenção Guiada por meio da matematização progressiva.
Esses princípios são apresentados no quadro a seguir.
Quadro 4 – Resumo dos Princípios da RME41.
Princípios42
(1) Da Atividade
37
Características
- refere-se à interpretação da matemática como atividade humana (VAN DEN
HEUVEL-PANHUIZEN, 2010);
- aprender é uma atividade construtiva (NES, 2009);
- as produções dos estudantes são utilizadas para a construção de conceitos (VAN
É considerada função do professor de apresentar didaticamente a realidade por contextos ricos.
Uma maneira de descrever ideias matemáticas como sendo relacionadas com os fenômenos que são
“matematizáveis”.
39
Tarefas ricas são aquelas com as quais os estudantes se sentem atraídos para resolver e, possivelmente,
matematizar (DE LANGE, 1987; TREFFERS, 1987; VAN DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 1996, 2010).
40
Na maioria dos textos são apresentados cinco princípios. Van den Heuvel Panhuizen (2000, 2010) apresenta
seis.
41
Quadro construído com base nas descrições de Streefland (1991), Treffers (1987), Van den Heuvel-Panhuizen
(2000, 2001, 2010), Widjaja e Heck ( 2003), Nes (2009).
42
Apenas Van den Heuvel-Panhuizen (2000, 2010) apresenta o sexto princípio. Os demais autores apresentam
apenas os cinco primeiros.
38
38
(2) Da Realidade
(3) De Níveis
(4) Do
Entrelaçamento
(5) Da
Interatividade
(6) De
Orientação
DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 2000)xviii.
- a RME tem a função de tornar os alunos capazes de aplicar matemática (VAN
DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 2010);
- o processo de matematização ocorre a partir da exploração de contextos ricos
(VAN DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 2010);
- fenômenos da realidade devem ser organizados por meio da matemática (NES,
2009);
- é importante o uso de contextos reais que sejam significativos e naturais ao
aluno como ponto de partida para a sua aprendizagem (WIDJAJA; HECK,
2003).
- os alunos passam vários níveis de compreensão (VAN DEN HEUVELPANHUIZEN, 2010);
- começam de seus procedimentos informais e por meio da matematização
progressiva e esquematizações avançam para a construção de modelos mais
formais (VAN DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 2010);
- os modelos têm de mudar de “modelo de” ao “modelo para” (STREEFLAND,
1991).
- domínios matemáticos, como geometria, número, medição e manipulação de
dados não são considerados capítulos curriculares isolados, mas fortemente
integradosxix (VAN DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 2010);
- os alunos devem desenvolver uma visão integrada da matemática, bem como
flexibilidade para se conectar a diferentes subdomínios e / ou a outras
disciplinasxx (WIDJAJA; HECK, 2003);
- a resolução de problemas de contexto ricos significa muitas vezes que se tem de
aplicar uma ampla gama de ferramentas matemáticas e entendimentosxxi (VAN
DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 2000);
- a força do princípio entrelaçamento é que traz coerência para o currículo. Este
princípio refere-se não só aos diferentes domínios de matemática, mas também
podem ser encontradas dentro delesxxii (VAN DEN HEUVEL-PANHUIZEN,
2000).
- a aprendizagem matemática não é apenas uma atividade pessoal, mas também
uma atividade social (VAN DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 2010);
- os alunos devem ter oportunidades para compartilhar suas estratégias e
invenções com outros alunos (VAN DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 2010);
- a interação entre alunos e professores é uma parte essencial na RME porque a
discussão e colaboração oportunizam a reflexão sobre o trabalho (WIDJAJA;
HECK, 2003).
- os estudantes devem contar com uma oportunidade “guiada” para “reinventar”
a matemática (VAN DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 2010);
- o ensino e os programas devem basear-se num conjunto coerente de trajetória
de ensino-aprendizagem a longo prazo (VAN DEN HEUVEL-PANHUIZEN,
2010);
- os alunos precisam de espaço para construir conhecimentos matemáticos e
ferramentas por si só. Para alcançar isso, os professores têm de proporcionar aos
alunos um ambiente de aprendizagem em que este processo de construção possa
surgirxxiii (VAN DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 2000).
Fonte: autora.
O princípio que mais nos interessa neste trabalho é o segundo (Da
Realidade), que está relacionado ao papel dos contextos. Por considerar relevante conhecer “o
papel” que os contextos podem desempenhar nas tarefas dos estudantes, apresentamos a
39
seguir uma revisão de literatura a respeito de tarefas matemáticas na busca de conhecer suas
características, potencialidades, constituição.
2.2 ENUNCIADOS DE TAREFAS DE MATEMÁTICA
Dado o interesse do GEPEMA em estudar a produção escrita em tarefas
não-rotineiras, seus participantes iniciaram um estudo a respeito do papel dos contextos em
tarefas de matemática. As hipóteses lançadas a respeito da possível influência que o texto
apresentado na proposição de uma tarefa exerce motivaram esta pesquisadora a conhecer sua
constituição, suas características, potencialidades.
Dado o quadro teórico adotado (Educação Matemática Realística) e
considerando que, por um lado,

o contexto envolvido em uma tarefa exerce um papel importante
(TREFFERS; GOFFREE, 1985; DE LANGE, 1987; TREFFERS,
1987;
VAN
DEN
HEUVEL-PANHUIZEN,
1996,
2005;
SHANNON, 2007), sendo, por vezes, um aspecto que pode
determinar o sucesso, ou não, dos estudantes em suas resoluções
(CLEMENTS, 1980; VAN DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 1996,
2005)
e, por outro,

que as tarefas de sala de aula não devem ser diferentes das de
avaliação, e a avaliação deveria mostrar indícios da aprendizagem do
estudante,
faz-se relevante propor um estudo a respeito do que as tarefas podem oportunizar, na
perspectiva de uma Educação Matemática que leva em conta a fenomenologia didática,
matematização, reinvenção guiada, por meio de tarefas matemáticas que impulsionam estes
processos.
2.2.1 Os contextos e as classificações das tarefas
Propor aos estudantes tarefas matemáticas que apresentem contextos
diversos é uma alternativa para que possam ampliar seus conhecimentos, pois, mais do que
aprender a operar dados, o ensino da matemática deveria propiciar que os alunos pudessem
40
resolver tarefas com mais referência em sua realidade do que aquelas apenas do tipo “efetue”,
“some”, “divida”, “calcule a seguinte regra de três”, apresentadas rotineiramente nas escolas.
Até porque a aprendizagem escolar pode se constituir como uma base para que nossos alunos
continuem aprendendo, dentro e fora da escola, para que tenham uma participação efetiva na
sociedade.
Partindo do pressuposto de que a avaliação escolar deve fornecer
informações a respeito da aprendizagem dos estudantes, devemos pensar em instrumentos de
avaliação que contenham tarefas que possibilitem aos estudantes apresentar estas
informações. Para tanto, a flexibilidade da tarefa, a questão, o contexto, a forma de
apresentação são assuntos que merecem ser estudados.
Segundo Borasi (1986), o principal papel do contexto para a realização de
uma tarefa parece ser de fornecer ao “resolvedor” as informações que lhe possam permitir a
resolução do problema. Essa autora ainda argumenta que experiências na resolução de
problemas da “vida real” poderiam contribuir também para o desenvolvimento de diferentes
estratégias para analisar contextos e criar fórmulas matemáticas.
Clements (1980) chamou a atenção para a necessidade de pesquisa a
respeito dos fatores que fazem com que alguns problemas aritméticos verbais sejam mais
fáceis (acessíveis) do que os correspondentes aritméticos “estruturados”, apesar de
envolverem mais leitura, compreensão e transformação. Sua pesquisa revelou que, em um
teste com 126 estudantes, 58 acertaram o item43 a seguir “Questão 5 - Escrevam a resposta
correta para 1 − 1 4” enquanto que 98 acertaram o problema aritmético verbal
correspondente “Questão 18 - Um bolo é cortado em quatro partes iguais e Bill leva uma das
partes. Que fração do bolo resta?”xxiv(CLEMENTS, 1980, p. 19, tradução nossa).
Após uma entrevista realizada com seis crianças que apresentaram resposta
incorreta para a questão 5, o autor conclui que a imagem evocada pelo problema do bolo
ajudou os estudantes a fornecerem resposta correta para a outra questão (18). Os resultados
apresentados e a discussão produzida pelo autor nos fazem pensar a respeito da influência que
o contexto desempenha nas tarefas dos estudantes.
Segundo Van den Heuvel-Panhuizen (1996), o contexto de uma tarefa pode
apresentar situações realísticas, fantasiosas, fatídicas, ou até mesmo ser circunscrito
estritamente por uma linguagem matemática. O contexto é apenas um potencializador para a
oportunidade de matematizar. O fato de um contexto embutir uma situação do cotidiano não é
43
Usualmente, é chamado de item, ou questão, uma tarefa em circunstância de prova/teste.
41
suficiente para que o estudante possa aprender algo ao lidar com ele. Com isso não é possível
dizer a priori quais seriam bons problemas de contexto, visto que essa caracterização depende
da relação que o “resolvedor” em potencial estabelece com o enunciado. Todavia, a hipótese é
de que a proximidade do contexto com o repertório do estudante aumenta a possibilidade de
matematização.
Segundo Van den Heuvel-Panhuizen (2001) a ênfase que a RME coloca a
respeito da questão do contexto das tarefas matemáticas, que envolvem situações por meio
das quais os estudantes possam imaginá-las, torná-las reais em suas mentes, realizar, é o que
dá o nome à abordagem “realística” da educação matemática holandesa.
Os contextos nesta perspectiva parecem ser a matéria-prima da
matematização. Essa autora apresenta dois exemplos de problemas que considera iguais de
um ponto de vista matemático, entretanto, a diferença contextual faz com que os alunos
considerem os dois problemas completamente diferentes. O primeiro problema envolve uma
divisão de 81 por 6, levando em conta “pessoas” e “mesas” e “cadeiras”. O segundo exemplo
envolve uma divisão de 81 por 7, com “pessoas”, “cafeteiras” e “xícaras de café” (VAN DEN
HEUVEL-PANHUIZEN, 2001, p. 14-16).
Para Díaz e Poblete (2005) bem como para Van den Heuvel-Panhuizen
(2001), os problemas de contexto não devem ser apresentados apenas em fase de aplicação,
como é feito tradicionalmente, mas também em fase de desenvolvimento e exploração, pois
podem fazer com que os estudantes reconheçam a utilidade da matemática em suas
necessidades e vida diária, além de despertarem curiosidade, criatividade. Para Van den
Heuvel-Panhuizen (2001), problemas de contexto44 e situações da “vida real” servem para
constituir e para aplicar conceitos matemáticosxxv. Enquanto trabalham com problemas de
contexto, os alunos podem desenvolver ferramentas e compreensão matemática.
Segundo Díaz e Poblete (2005), um problema de contexto, em geral,
necessita de matematização, o que pode demandar certa exploração xxvi do estudante que
resolve o problema. Por outro lado, se for possível matematizar o problema de maneira quase
automática e sem muitos esforços, então não se trata de um problema de contexto, mas sim de
um exercício de matematização (DÍAZ; POBLETE, 2005)45. Contextualizar o conhecimento
matemático não significa simplesmente simulá-lo em sala de aula com qualquer atividade
44
Problemas de Contexto: são definidos na RME como situações-problema que são experimentalmente “reais”
para os estudantes (GRAVEMEIJER; DOORMAN, 1999).
45
Obs: os autores não apresentam nenhuma referência a respeito da RME, então o termo matematização por eles
utilizado pode não ter o mesmo sentido.
42
cotidiana, mas exige conhecer as representações que os alunos fazem desse conhecimento e
conhecer o significado de suas concepções (DÍAZ; POBLETE, 2005). Díaz e Poblete (2005)
apresentam uma classificação para tarefas (problemas46) segundo seu contexto. Apresentamos,
a seguir, um quadro com exemplos de tarefas classificadas segundo o contexto por Díaz e
Poblete (2005).
Quadro 5 – Classificações de Tarefas segundo o contexto conforme Díaz e Poblete (2005).
Classificação segundo o contexto
Problema de contexto real – Um contexto
é real, se ele é produzido efetivamente na
realidade e envolve ações do aluno nela
mesma.
Problema de contexto realista47 – Um
contexto é realista, se ele pode realmente
ocorrer. Trata-se de uma simulação de
realidade ou de uma parte dela.
Problema de contexto fantasioso – Um
contexto é fantasioso, se for fruto da
imaginação
sem
fundamento
na
realidade.
Exemplo
Meça com um fio o diâmetro e o comprimento da
circunferência de três moedas de tamanhos
diferentes. Estabeleça a razão entre o diâmetro e o
comprimento de cada moeda. O que você pode
concluir a partir dessa razão?
A Torre Eiffel, em Paris, mede 300 m,e pesa
8000000 kg. Se construirmos uma semelhante a ela
usando o mesmo material da original que pese 1
kg, quanto medirá?
Foram trazidos à Terra dois habitantes do planeta
Krypton: Superman e Supergirl. Para que ambos
não sejam afetados pela "criptonita", precisam
tomar diariamente uma quantidade de litros de
líquido equivalente a um nono de seus pesos.
a) quanto de líquido Superman precisa tomar em
uma semana, se pesa 63 kg?
b) quanto pesa Supergirl, se em três semanas
consumiu 126 litros de líquido?
Problema de contexto puramente
Um retângulo tem dimensões de 8 cm por 20 cm. O
matemático – Um contexto é puramente
lado menor de um outro triângulo, semelhante a
matemático se refere exclusivamente a
ele, é de 6 cm. Encontrar a razão de semelhança
objetos matemáticos: números, relações e
para passar do primeiro para o segundo.
operações
aritméticas,
figuras
geométricas, etc.
Fonte: autora – com referência48 em Díaz e Poblete (2005, p. 4, tradução nossa).
Shannon (2007) considera que o papel dos contextos nas tarefas de
avaliação é um assunto complexo que vai muito além de simplesmente motivar os estudantes
a lidar com uma tarefa. Para a autora, a importância atribuída aos contextos das tarefas está
associada mais à oportunidade de possibilitar a abstração matemática por meio de situações
diversas e diferentes representações, do que tornar o contexto matemático familiar aos
46
Os autores fazem a classificação de Problemas, mas achamos adequado chamá-los de tarefas.
Não é no mesmo sentido de realístico. Realista, nesse caso, está associado a contextos que dizem respeito a
informações que são ou podem ser reais.
48
Os quadros indicados com referência no autor indicam que apenas a construção do quadro é da autora deste
texto, mas o conteúdo é do autor citado.
47
43
estudantes. No entanto, ela reconhece que este é um papel importante dos contextos para
tornar o conhecimento matemático mais acessível aos estudantes. Além disso, a autora
argumenta que o potencial de uma tarefa de contexto para gerar discussão e abstração
depende do modo como ela é tratada e por mais útil que a tarefa seja, pode ser tornada inútil
se os alunos não tiverem condições de lidar com a complexidade da matemática intrínseca
subjacente.
Segundo Treffers e Goffree (1985), problemas de contexto têm formas
específicas, conteúdos e funções, podem ser editados em linguagem puramente aritmética,
como problemas de palavra e texto e serem apresentados por meios de jogos, histórias,
noticiários, modelos, gráficos, ou ainda pela combinação de tais portadores de informações,
agrupados em temas ou projetos. Dependendo da forma como o problema é utilizado na
instrução, pode ser considerado como de contexto, ou não (problema de palavra49).
Um dos princípios da RME é relativo ao papel que os contextos dos
problemas desempenham na formação dos estudantes. De acordo com Treffers e Goffree
(1985), os contextos dos problemas cumprem uma série de funções.
Formação de conceito: na fase inicial de um curso permitirá aos alunos um
acesso natural e motivador para a matemática, – Modelo de formação: eles
fornecem um suporte seguro para a aprendizagem de operações formais,
procedimentos, notações, regras, e fazem isso juntamente com outros
modelos que têm uma função importante como suporte para o pensamento, –
Aplicabilidade: eles descobrem a realidade como uma fonte e domínio de
aplicações, – Exercício de habilidades específicas em situações aplicadas
(TREFFERS; GOFFREE, 1985, p. 111; TREFFERS, 1987, p. 256, tradução
e grifos nossos).
Os Problemas de Contexto são considerados como uma “matéria-prima” no
que diz respeito ao Princípio da Realidade que, dentre outros quatro/cinco princípios,
caracteriza a Educação Matemática Realística, segundo educadores como Van den HeuvelPanhuizen (1996, 2000, 2001, 2010), Treffers (1987) e Strefland (1991). Este princípio
concebe a “realidade” como uma fonte para a aprendizagem. Baseado na perspectiva da
matemática como atividade humana, assim como a matemática tem origem na matematização
da realidade, a natureza da aprendizagem matemática também tem sua origem na
49
Problema de Palavra: são problemas que geralmente possuem todas as informações necessárias para resolver o
problema, o contexto está explícito no texto do problema, envolve a combinação de algoritmos padrões e a
solução é única e exata (BORASI, 1986).
44
matematização da realidade50. No ambiente pedagógico, matematizar a “realidade” significa
explorar contextos ricos que demandam uma organização matemática ou, em outras palavras,
contextos que podem ser matematizados (FREUDENTHAL, 1968; VAN DEN HEUVELPANHUIZEN, 2000). De acordo com Gravemeijer e Doorman (1999, p. 127), se “os
estudantes vivenciam o processo de reinventar a matemática como uma expansão do senso
comum, então não sentirão dicotomia alguma entre suas experiências de vida cotidiana e
matemática, ambos farão parte da mesma realidade”xxvii.
Nesse sentido, espera-se que os estudantes, ao trabalhar com problemas de
diferentes contextos, possam desenvolver ferramentas matemáticas, compreensão, estratégias
que sejam intimamente ligadas ao contexto (VAN DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 2001).
Partindo da exploração de fenômenos diversos, por meio de estratégias menos informais, e
progredindo no sentido de sistematizar e obter caráter de um modelo formal, por meio da
matematização, certos aspectos do contexto matemático podem tornar-se mais gerais e
fornecerem apoio para a resolução de outros problemas relacionados (VAN DEN HEUVELPANHUIZEN, 2001). A fim de cumprir a função de passagem entre um nível informal e o
formal, os modelos que recebem caráter “modelo de” (específicos) passam a um “modelo
para” (mais geral) (STREEFLAND, 1991).
No que diz respeito às possibilidades de matematização, De Lange (1987, p.
76-77) classifica diferentes usos/utilidades/fins/objetivos (uses) dos contextos (de terceira,
segunda e primeira ordem) como segue.
 Contexto de Ordem Zero é utilizado apenas para tornar o problema
parecido com uma situação da vida real. São chamados por De
Lange (1999) de “contexto falso”, “contexto de camuflagem”.
Segundo o autor, os problemas que contêm este tipo de contexto
devem ser evitados. Para Dekker e Querelle (2002), o contexto
utilizado em um problema deve ser relevante para resolvê-lo, se não
há relevância alguma para o uso do contexto é classificado como de
ordem zero51.
 Contexto de Primeira Ordem é aquele que apresenta operações
matemáticas “textualmente embaladas”, no qual uma simples
50
Nesse sentido, Freudenthal (1973) critica a inversão didática que geralmente é feita no ensino tradicional: em
vez de partir do problema concreto e investigá-la por meios matemáticos, a “matemática” vem em primeiro
lugar, enquanto o problema concreto vem depois como uma "aplicação" (FREUDENTHAL, 1973, p. 132).
51
Os autores ainda indicam uma pergunta para inspecionar a relevância do contexto em um problema: “por que
alguém desejaria saber a resposta desse problema?”.
45
tradução do enunciado para uma linguagem matemática é suficiente
(DE LANGE, 1987). Para De Lange (1999) e Dekker e Querelle
(2002), esse tipo de contexto é relevante e necessário para resolver o
problema e avaliar a resposta.
 Contexto de Segunda Ordem é aquele com o qual o estudante é
confrontado com uma situação realística e dele é esperado que
encontre ferramentas matemáticas para organizar, estruturar e
resolver a tarefa (DE LANGE, 1987). Esse tipo de contexto, segundo
De Lange (1999), envolve matematização, enquanto que nos
contextos de primeira ordem os problemas já são pré-matematizados.
 Contexto de Terceira Ordem como aquele que possibilita um
“processo de matematização conceitual”, este tipo de contexto serve
para
“introduzir
ou
desenvolver
um
conceito
ou
modelo
matemático” (DE LANGE, 1987, p. 76).
A seguir apresentamos alguns exemplos de tarefas segundo a classificação
do Uso do Contexto proposta por De Lange (1987) e por Dekker e Querelle (2002).
Quadro 6 – Classificações a respeito do uso de contexto segundo Dekker e Querelle (2002).
Uso do Contexto
Ordem zero
Primeira ordem
Exemplo
- A secção transversal de um copo de vinho tem a forma de (parte de) a sinusoide
seguinte:
1
𝑦 = 3𝑠𝑖𝑛 𝑥 + + 3
2
Determinar o volume do presente vidroxxviii.
- A chuva está caindo em um ângulo de 48 graus por causa do vento. Próximo a
um edifício é encontrado um trecho seco a uma distância de 2 metros. Usando
essa informação, calcule a altura do edifícioxxix.
Fonte: Dekker e Querelle (2002).
Para uma reunião escolar noturna são esperados 150 pais. Em cada mesa
podem ser colocadas quatro cadeiras. Quantas mesas são necessárias? Mostre
como você encontrou a sua respostaxxx.
150
Segunda ordem
―Este problema é realmente diferente de ‗calcule 4 ‘‖xxxi.
Fonte: Dekker e Querelle (2002).
Uma escada de três metros de comprimento é colocada
contra a parede, um metro a partir da parte inferior da
parede. Até que altura da parede a escada pode
alcançarxxxii?
Fonte: Dekker e Querelle (2002).
46
Aqui você vê o Problema Ônibus.
Terceira ordem
1. Use setas para este problema.
resposta:
4
37
2. Agora faça o seu próprio problemaxxxiii.
Fonte: Dekker e Querelle (2002).
Fonte: autora – com referência em Dekker e Querelle (2002).
Segundo De Lange (1995), uma das funções mais características da
instrução na RME é o uso dos contextos para formação conceitual, que está relacionado ao
que chama de “processo de matematização conceitual”. De Lange (1995) explicita que,
quando se trata de tarefas de testes, essa função do contexto não é sempre utilizada, pelo fato
de que usualmente não são introduzidos novos conceitos durante um teste, mas são aplicados
conceitos matemáticos de alguma forma. Nas tarefas de avaliação, então, são associadas,
quase sempre, apenas as três primeiras classes de funcionalidades dos contextos.
No quadro a seguir apresentamos alguns exemplos de tarefas, segundo a
classe de funcionalidade do contexto, retirados de De Lange (1995).
Quadro 7 – Classe de funcionalidade do contexto segundo De Lange (1995).
Classe de funcionalidade de Contexto
Exemplos
- Que número representa 75% de:
1. nenhuma função: não há
contexto.
2. o contexto é utilizado para
“camuflar”, “vestir” o problema
matemático.
3. o contexto exerce no problema
uma função essencial e relevante.
Fonte: De Lange (1995).
- O fator de crescimento de um tipo de bactéria é 6 (por
unidade de tempo). No momento há 4 bactérias. Calcular
o momento em que haverá 100 bactérias.
- O percentual de juros para um ano é de oito por cento.
R$4.000 são depositados no tempo t0 . Em que momento
esse montante aumentará para R$5.000?
- Bill pesava 107 quilos no verão passado. Ele perdeu 4
quilos, e então ele ganhou 11 quilos. Quanto é que ele
pesa agora? xxxiv
Fonte: De Lange (1995).
- Qual destes seria uma estimativa razoavelmente boa
para a largura de uma sala de aula? ( ) 4 pés ( )10 pés ( )
25 pés ( ) 300 pés
47
- Qual destas é a melhor estimativa para o comprimento
da mesa de um professor? ( ) 4 pés ( ) 10 polegadas ( ) 2
pés
( ) 15 pés ( ) 20 pésxxxv
Fonte: De Lange (1995).
Fonte: autora – com referência De Lange (1995).
Com base nos três níveis de funcionalidade de contexto apresentados por De
Lange (1995), Meyer et al (2001, p. 523) destacam cinco papéis do contexto no ensino e
aprendizagem da matemática que são muitas vezes interativos:
 motivar os alunos para explorar nova matemática;
 oferecer aos alunos a oportunidade de aplicar a matemática;
 servir como uma fonte de matemática nova;
 sugerir uma fonte de estratégia de solução;
 fornecer uma âncora para a compreensão matemática.
De Lange (1999) ainda destaca que nas tarefas de avaliação uma variedade
de contextos é necessária, bem como uma gama de funções:
a variedade é necessária para minimizar a chance de apresentar questões e
fenômenos que não são culturalmente relevantes. A gama de funções para os
contextos necessita maior elaboração por causa dos efeitos sobre o que
estamos medindo relacionado a essa funçãoxxxvi (1999, p. 27).
No que diz respeito à importância da utilização de problemas de contexto,
Dekker e Querelle (2002) apresentam cinco razões:
a) para introduzir um novo assunto ou conceito em matemática – por
meio de exemplos dentro de um contexto, o conteúdo matemático
envolvido se torna claro;
b) para praticar um novo conceito ou procedimento – resolvendo
muitos problemas de contexto diferentes com mesmo conteúdo
matemático, os alunos aprendem a usar e aplicar o conteúdo;
c) para mostrar o poder da matemática – ao compreender que diferentes
problemas de contexto podem envolver o mesmo conteúdo
matemático;
d) para envolver os alunos no problema – usando problemas da vida
real, os alunos podem mostrar que são matematicamente
alfabetizados e que sabem como a matemática é usada para resolver
problemas práticos que surgem em situações da vida real.
48
Borasi (1986) em uma tentativa de clarificar o conceito de “problema” faz
uma análise de vários exemplos de problemas a partir de quatro conceitos relacionados: (a) a
formulação de um problema, isto é, a definição da tarefa a ser executada, (b) o contexto em
que o problema está inserido, (c) o conjunto de soluções adequadas, (d) os métodos de
abordagem que poderiam ser empregados na resolução do problema. De acordo com os quatro
conceitos relacionados e suas características, a autora classifica os problemas em sete
categorias52. Apresentamos no quadro a seguir as categorias apresentadas por ela e sua relação
com o contexto (item b)53 e exemplos.
Quadro 8 – Agrupamento a respeito do tipo de contexto conforme Borasi (1986, p. 134,
tradução nossa).
Rótulo
(1) Exercício
(2) Problema de
palavra
(3) Problema Enigma
Contexto
(1) Inexistente
(2) Totalmente explícito
no texto
(2) Totalmente explícito
no texto
Exemplos
(x) Encontre o resultado de 4 × 2 + 6 × 3.xxxvii
(i) Maria comprou um hambúrguer por $0.90 e
uma coca por $0.30 dólares. Se a taxa local sobre
as vendas é de 5%, como, quanto ela deverá
receber, se ela der ao caixeiro $2,00?xxxviii
(KANTOWSKI, 1981 apud BORASI, 1986).
(v) Seis palitos de fósforos devem ser montados
para formar quatro triângulos equiláteros
congruentes nos quais cada lado é igual ao
comprimento dos palitos.xxxix
(SCHEERER, 1963 apud BORASI, 1986).
(vii) Prove que a fórmula:
(4) Prova de uma
conjectura
(3) Apenas parcialmente
no texto - teorias
conhecidas são assumidas
para qualquer par de números naturais n e m
fornece todas as soluções integrais da forma
xl
(5) Problema da
vida real
(3) Apenas parcialmente
no texto
(6) Situação54
problemática
(3) Apenas parcialmente
no texto - problemático
52
(iv) A esposa de Hans está morrendo. Um
farmacêutico descobriu um remédio que pode
curar a sua doença, mas vende-o por um preço que
Hans não pode pagar. Hans deveria roubar o
remédio?xli
(KOHLBERG, 1981, p. 12 apud BORASI, 1986).
(ii) Você está no final de sua terceira década de
vida, os seus filhos estão bem na escola, seu
marido está criando um nome para si próprio na
sua profissão e você está aborrecida.xlii
Apesar de Borasi (1986) identificar suas classificações em categorias, neste trabalho preferimos pensá-las
como agrupamentos.
53
Apresentamos aqui apenas o item (b), e os itens (a), (c) e (d) na seção seguinte.
54
Entendemos que Borasi (1986) chama de Situação uma tarefa que não apresenta explicitamente uma questão,
pergunta. A tradução é literal e diferente do significado que atribuímos para “situação” ao longo do nosso texto.
49
(ADAMS, 1974, p. 21 apud BORASI, 1986 ).
(vi) Considere a seguinte ternária Pitagóricaxliii;
(7) Situação
(4) Apenas parcialmente
no texto – não
problemático
(BROWN-WALTER, 1970 apud BORASI, 1986).
Fonte: autora – com referência em Borasi (1986).
Segundo esta classificação, a existência de contexto parece estar relacionada
com o “grau” em que uma situação é apresentada no enunciado. Para Borasi (1986), o
contexto, de uma forma mais geral, diz respeito à “situação na qual o problema está
embutido” (BORASI, 1986, p. 129).
O projeto PISA, segundo o documento INEE (2005), pretende dar
possibilidade de que a intuição e a compreensão matemática dos estudantes sejam avaliadas
em diferentes “situações55”. Os documentos do PISA (OECD, 2003; OECD, 2004a; OECD,
2006; OECD, 2010), em geral, classificam as situações em quatro ou cinco grupos. Para o
PISA (OECD, 2006), a situação é a parte do mundo do estudante em que as tarefas se situam
e está localizada a uma certa distância do estudante. A situação mais “próxima” é a vida
pessoal do estudante, em seguida vêm a vida escolar, a vida profissional e de lazer, depois a
comunidade local e a sociedade. Situações científicas são as mais distantes.
As características dos diferentes tipos de situação apresentados pelos
documentos do PISA (OECD, 2003; OECD, 2004a; OECD, 2006; OECD, 2010) são
sistematizadas no quadro a seguir.
Quadro 9 – Agrupamento a respeito do Tipo de Situação segundo o PISA (DE LANGE,
2003; INEE, 2005, OECD, 2010).
Agrupamento
de situação
Algumas considerações
Relacionada com as atividades diárias dos alunos (INEE, 2005).
Pessoal ou
uso privado
Pessoal – Problemas classificados na categoria de contexto pessoal focam sobre as
atividades do “eu”, da família ou seu grupo de pares. Os tipos de contextos que
podem ser considerados pessoais incluem (mas não estão limitados a) os que
envolvem a preparação de alimentos, compras, jogos, transporte pessoal de saúde,
esportes, viagens e agendamento pessoal e finanças pessoaisxliv (OECD, 2010).
“Nos termos da vida pessoal nós incluímos, dependendo da idade, jogos,
programação diária, esportes, compras, poupança, relações interpessoais, finanças,
votação, mapas de leitura, mesas de leitura, saúde, seguros, e assim por diante xlv”.
55
Em alguns documentos também chamadas de “contextos”.
50
(DE LANGE, 2003, p. 80, tradução nossa).
“Relacionam-se com as atividades cotidianas dos estudantes. Tratam da maneira
como um problema matemático afeta diretamente o indivíduo e como o indivíduo
percebe o contexto do problema. Essas situações tendem a demandar alto grau de
interpretação para que o problema seja resolvido” (OECD, 2005, p. 41).
Refere-se à comunidade local ou mais ampla, com a qual os estudantes observam
um determinado aspecto de seu entorno (INEE, 2005).
Requer dos alunos compreensão, conhecimento e habilidades matemáticas para
avaliar os aspectos de uma situação externa com repercussões importantes na vida
pública.
Pública
Social – Problemas classificados na categoria de contexto social focam em sua
comunidade (seja local, nacional ou global). Eles podem envolver (mas não estão
limitados a) coisas como sistemas de votação, transportes públicos, governo,
políticas públicas, demografia, publicidade, estatísticas e economias nacionais.
Embora os indivíduos estejam envolvidos em todas estas coisas de uma forma
pessoal, na categoria de contexto social o foco dos problemas está na perspectiva da
comunidadexlvi (OECD, 2010).
“Na comunidade local, vemos o cidadão inteligente fazer julgamentos apropriados,
tomar decisões, avaliar conclusões, juntar dados e fazer inferências, e adotar uma
atitude crítica – observando o raciocínio por trás das decisões” xlvii (DE LANGE,
2003, p. 80, tradução nossa).
“Requerem que os estudantes observem algum aspecto da vizinhança. Há situações
localizadas na comunidade que tratam essencialmente da maneira como os
estudantes compreendem relações entre elementos de sua vizinhança. Elas exigem
que os estudantes ativem sua compreensão, seus conhecimentos e suas habilidades
em matemática para avaliar aspectos de uma situação externa que pode ter algumas
consequências” (OECD, 2005, p. 41).
Refere-se ao ambiente de trabalho (INEE, 2005).
Ocupacional
ou Profissional
Ocupacional – Problemas classificados na categoria de contexto ocupacional estão
centrados no mundo do trabalho. Itens categorizados como ocupacionais podem
envolver (mas não estão limitados a) coisas como medição, custo e pedido de
materiais para construção, folha de pagamento/contabilidade, controle de qualidade,
programação/inventário, design / arquitetura, e tomadas de decisão relacionadas ao
trabalho. Contextos ocupacionais podem dizer respeito a qualquer nível da força de
trabalho, de trabalho não qualificado para os níveis mais elevados de trabalho
profissional, apesar de os itens do estudo PISA serem acessíveis a estudantes de 15
anos de idadexlviii (OECD, 2010).
“Trabalho e lazer envolvem raciocínio, compreensão de dados e de estatísticas,
finanças, impostos, riscos, taxas, amostras, programação, padrões geométricos,
representações bi e tridimensionais, orçamentos, visualizações, e assim por
diantexlix” (DE LANGE, 2003, p. 80, tradução nossa).
“Surgem na vida do estudante na escola ou em um ambiente de trabalho. Tratam
essencialmente da maneira como o ambiente escolar ou de trabalho pode exigir que
o estudante enfrente determinado problema que requer uma solução matemática”
(OECD, 2005, p. 41). (Refere-se às situações ocupacionais e escolares).
Refere-se às atividades escolares (INEE, 2005).
Educacional
“Vida escolar [está] relacionada ao entendimento do papel da matemática na
sociedade, eventos escolares (por exemplo, esportes, times, programação), dados
51
para compreensão, computadores, e assim por diante”l (DE LANGE, 2003, p. 80).
É mais abstrata e pode implicar a compreensão de um processo tecnológico, uma
interpretação teórica ou um problema especificamente matemático (INEE, 2005).
Científicos – Problemas classificados na categoria de contexto científico
relacionam-se com a aplicação da matemática ao mundo natural e as questões e
temas relacionados à ciência e tecnologia. Contextos particulares podem incluir
(mas não estão limitados a) áreas tais como condições meteorológicas ou clima,
ecologia, medicina, ciência espacial, genética, medição, e o próprio mundo da
matemáticali (OECD, 2010).
Científica
“Para funcionar como um cidadão inteligente, indivíduos precisam ser letrados em
muitos campos, não só em matemática. A utilização de situações científicas ou
contextos em aulas de matemática não deveria ser evitada por si, mas um pouco de
cuidado deve ser tomado. Se nós tentarmos ensinar para os estudantes as
competências certas, mas usar o contexto errado, nós estaremos criando um
problema, e não resolvendo”lii (DE LANGE, 2003, p. 80, tradução nossa).
“São mais abstratas e podem envolver a compreensão de um processo tecnológico,
de uma situação teórica e ou de um problema explicitamente matemático. A
estrutura de matemática do PISA inclui nesta categoria situações matemáticas
relativamente abstratas com as quais os estudantes frequentemente se defrontam em
uma aula de matemática, e que consistem inteiramente de elementos matemáticos
explícitos, sem que se faça nenhuma tentativa para situar o problema em um
contexto mais amplo. Ocasionalmente, estes contextos são identificados como
„intramatemáticos‟” (OCDE, 2005, p. 41).
Fonte: autora.
Embora algumas descrições utilizem a palavra “categoria”, consideramos os
tipos de situação como agrupamentos devido à não limitação de uma tarefa a um único tipo de
situação. O uso de situações nos contextos das tarefas de matemática do PISA está
relacionado à possibilidade de fornecer um contexto autêntico56 para o uso da matemática.
Segundo De Lange (2002), “a literacia matemática é avaliada por dar aos estudantes tarefas
„autênticas‟, baseadas em situações que, embora às vezes fictícias, representam os tipos de
problemas encontrados na vida real” (DE LANGE, 2002, p. 33, tradução nossa).
2.2.2 Caracterizações dos tipos de tarefas
Esta seção tem como intuito apresentar algumas caracterizações a respeito
da formulação de itens: no que diz respeito ao tipo de problema/tarefa, ao tipo de item, à
formulação da pergunta e possibilidades de soluções.
56
Autêntico no sentido de fazer sentido, de ser legítimo para o estudante, não necessariamente verdadeiro. Ainda
que seja um contexto de conto de fadas, por exemplo, que seja razoável com os fatos, fundamentado em algo.
52
De acordo com McIntosh e Jarrett (2000), na Resolução de Problemas, os
alunos deveriam ser responsáveis por muitas decisões que, no “passado”, eram da
responsabilidade de professores e livros didáticos. Segundo esses autores, ao aluno cabe
decidir que método ou procedimento irá utilizar, que estratégias tem possibilidade de
desenvolver, contar com suas experiências anteriores, desenhar uma linha de raciocínio,
arquitetar uma resolução autonomamente ou com seus pares. Ao professor, cabe a
responsabilidade de selecionar e lhes propor “boas” tarefas. Com isso, o professor deve criar
condições para que os alunos possam envolver-se, significativamente, com os problemas
(MCINTOSH; JARRETT, 2000). Para além de fornecer respostas corretas, a Resolução de
Problemas preocupa-se com os meios para a obtenção das respostas, com a elaboração de
conhecimento por meio da tarefa proposta.
Nesse sentido, consideramos importante para o professor conhecer os
benefícios de conhecimento das tarefas, os possíveis métodos de solução, a pertinência das
múltiplas respostas, os conceitos envolvidos, a familiaridade do estudante com a tarefa e/ou o
que lhe é solicitado em relação ao conteúdo ou às competências.
Consideramos que a escolha das tarefas, seja em uma situação de aula ou de
avaliação, deva estar fortemente associada aos objetivos didáticos, que determinarão que
tarefas são potenciais para atingi-los. Quando o objetivo do professor for, por exemplo,
avaliar o desempenho dos estudantes na aplicação e/ou repetição de técnicas já conhecidas,
uma boa escolha é a proposição de tarefas rotineiras, com as quais os alunos tenham alguma
intimidade e possam demonstrar suas habilidades, com pouca chance de terem como
obstáculo a interpretação das mesmas.
Apresentamos no quadro a seguir algumas definições/características para as
tarefas do tipo rotineiras ou não-rotineiras. Em seguida, um exemplo para cada tipo de tarefa.
Quadro 10 – Tarefas rotineiras e não-rotineiras.
Tipo de
Tarefa
Algumas explanações
Tarefas que são frequentes nas salas de aula e nos livros didáticos
(BURIASCO, 1999).
Rotineira
Frequente nos livros didáticos, que quase sempre envolvem apenas conhecimentos
memorizados e técnicas operatórias (PARANÁ, 2001).
Habitualmente, exercícios de repetição e consolidação de técnicas, e de aplicação
direta de conhecimento (SANTOS, 2004).
“As tarefas rotineiras, vulgarmente designadas por exercícios, não são,
normalmente, geradoras de grande discussão entre os alunos, uma vez que o modo
53
de resolução assenta num algoritmo já conhecido destes” (MENEZES, 1999, s.n.).
Exercícios de rotina são organizados para proporcionar prática em uma determinada
técnica matemática que, normalmente, acabou de ser demonstrada para o alunoliii
(SCHOENFELD, 1992).
Tarefas rotineiras (exercícios): exercícios de identificação e de tradução de uma
linguagem para outra, realização de algoritmos (“contas”), exercícios de aplicação
(problemas de palavras) (PONTE; SERRAZINA, 2000).
A atividade resultante de tarefas de rotina contribui para consolidar cognitivamente
conhecimentos e destrezas já adquiridos (PONTE; SERRAZINA, 2000).
Tarefas que são muito pouco ou quase nunca frequentes nas salas de aula e
nos livros didáticos (BURIASCO, 1999).
Entendem-se por experiências matemáticas de aprendizagem situações que aos
olhos dos alunos são não-rotineiras e que apresentam certo nível de complexidade.
Entre elas, podemos ter a resolução de problemas, tarefas de investigação, realização
de projetos e jogos (SANTOS, 2003b).
Tarefas não-rotineiras: problemas de processo, investigações, projetos, jogos
(PONTE; SERRAZINA, 2000).
Não-rotineira
A realização de tarefas não-rotineiras proporciona condições para um
desenvolvimento cognitivo no qual: novo conhecimento subjetivo é construído pelo
aluno; itens de conhecimento adquirido anteriormente são reconhecidos e avaliados
pelo aluno e são reorganizados e reestruturados num corpo de conhecimento mais
alargado (PONTE; SERRAZINA, 2000).
Problemas não rotineiros, na RME, são situações genuínas de resolução de
problema, para as quais o estudante terá de trazer todo o conhecimento informal e as
estratégias que ele possui (GRAVEMEIJER, 1994).
Os problemas não rotineiros incluem “problemas de processo” (problemas para os
quais não há nenhum algoritmo padrão para extrair ou representar a informação
dada) e problemas com informação supérflua ou insuficiente. A instrução foca em
problemas passíveis de estratégias particulares e inclui jogos (SCHOENFELD,
1992).
Fonte: autora.
Exemplos
Tarefa Rotineira: (PARANÁ, 2001) Num pacote pequeno de bolacha ―Tostadinhas‖ cabem
28 bolachas. Quantas bolachas serão necessárias para encher 250 pacotes do mesmo
tamanho?
a) 700
b) 5740
c) 7000
d) 278
54
Tarefa Não-Rotineira:
Figura 1 – Exemplo de uma tarefa não-rotineira.
Fonte: OECD (2005, p. 82).
De acordo com o Quadro 10, sintetizando características de tarefas ou nãorotineiras, concluímos que as classificações limitam-se, quase sempre, à familiaridade do
estudante com a tarefa proposta; quando conhecida, acaba sendo praticamente um “exercício”
ao passo que quando não “familiar”, por alguma razão, quase sempre tem o caráter de
problema. Entretanto, parece não haver uma distinção assim tão clara entre as duas ideias.
Butts (1997) apresenta uma classificação para cinco tipos típicos de
problemas (para nós, tarefas) que podem ajudar estender o entendimento a respeito da
familiaridade com problemas de matemática. Apresentamos, no quadro a seguir, os tipos de
tarefa segundo a classificação de Butts (1997), seguidos de suas definições e exemplos.
Quadro 11 – Classificação de Butts (1997).
Tipo de tarefa
A – Exercício de
reconhecimento
Definição
Usualmente, pede ao “resolvedor” para
reconhecer ou recordar um fato
específico, uma definição ou
enunciado de um teorema.
Exemplos
Quais das seguintes expressões são
polinômios?
a) 𝑥 3 + 3𝑥 + 2
b) 𝑥 3 + 3 𝑥 + 2
c) 𝑥 3 + 3𝑥 + 2
d) 𝑥 3 + 3/𝑥 + 2
e) 2
55
Fonte: Butts (1997, p. 34).
B – Exercícios
algorítmicos
C – Problemas de
aplicação
D – Problemas de
pesquisa aberta
E – Situação Problema
Exercícios que podem ser resolvidos
com um procedimento passo a passo,
frequentemente, um algoritmo
numérico.
Envolvem algoritmos aplicativos. Os
problemas tradicionais caem nesta
categoria, exigindo sua resolução: (a)
formulação do problema
simbolicamente e depois (b)
manipulação dos símbolos mediante
algoritmos diversos.
Problemas de pesquisa aberta são
aqueles em cujo enunciado não há uma
estratégia para resolvê-los.
Usualmente, tais problemas
expressam-se por: “prove que”,
“encontre todos”, ou
“para quais”, mais outras muitas
variações.
Neste subconjunto não estão incluídos
“problemas” propriamente ditos, mas
situações, nas quais uma das etapas
decisivas é identificar o(s) problema(s)
inerente(s) à situação.
Calcule:
16 + 4. −2 − 6 + 3 .
Fonte: Butts (1997, p. 34).
Uma bolsa com moedas de 5, 10 e 25
centavos contém 435 moedas no valor de
43,45 dólares. Há três vezes mais moedas
de 10 do que de 25. Quantas moedas de
cada tipo estão na bolsa?
Fonte: Butts (1997, p. 35).
Quantos triângulos diferentes, de lados
inteiros, podem ser construídos de modo
que o(s) lado(s) maior(es) tenha(m) 5 cm
de comprimento? 6 cm? 𝑛 cm? Em cada
caso, quantos são isósceles?
Fonte: Butts (1997, p. 35).
Esboce um estacionamento de carros.
Seguem alguns problemas pertinentes que
poderiam ser considerados. Há muitos e
muitos outros.
a) Que tamanho deverá ter cada
boxe?
b) Qual o ângulo a ser observado
para marcar cada boxe?
c) Quanto deverá ser cobrado por
carro, por hora, se deseja obter
um lucro de 10%?
Fonte: Butts (1997, p. 36).
Fonte: autora – com referência em Butts (1997, p. 32-44).
De acordo com Butts (1997), uma alta porcentagem de exercícios e
problemas propostos em livros didáticos recai nas três primeiras categorias que quase sempre
contém em seu enunciado uma estratégia para resolvê-los. O obstáculo, então, a resolver é a
tradução da tarefa para uma forma matemática apropriada e, então, a aplicação de algoritmos
adequados.
Borasi (1986) também apresenta uma classificação para problemas (tarefas)
de matemática orientada por conceitos relacionados: “exercício”, “problemas” ou “situação”
com base no contexto57, tipo de formulação, soluções e métodos de abordagem. Essa
classificação é apresentada no quadro a seguir.
57
Apresentado na seção anterior.
56
Quadro 12 – Classificação de Problemas – Borasi (1986).
Tipo da tarefa
Formulação
Soluções
Sobretudo única e
exata
Sobretudo única e
exata
Exercício
Única e explícita
Problema de
palavra58
Única e explícita
ProblemaEnigma
Única e explícita
Sobretudo única e
exata
Prova de uma
conjectura
Única e explícita
Geralmente, mas não
necessariamente única
Parcialmente dada –
muitas alternativas
possíveis.
Muitas implicitamente
Situação
sugeridas – uma
problemática
explicita pode ser dada
Inexistente - nem mesmo
Situação
implicitamente
Fonte: Borasi (1986, p. 134, tradução nossa).
Problema da
Vida real
Muitas possíveis –
apenas soluções
aproximadas
Muitas possíveis
A criação de um
problema
Métodos de abordagem
Combinação de algoritmos
conhecidos
Combinação de algoritmos
conhecidos
Elaboração de um novo
algoritmo – ato de
reformulações-reflexivas.
Reformulação do contexto –
reformulações – elaboração
de novos algoritmos
Reformulação do contexto –
reformulações – criação de
um modelo
Reformulação do contexto –
reformulações –
problematização
Problematização.
De acordo com Borasi (1986), uma análise da natureza dos problemas
(tarefas) é necessária para avaliar e explorar seu alcance e a significância na área da educação.
Dada a natureza complexa e discutível do tópico, o objetivo é iniciar um inquérito para
estimular o debate, além de fornecer respostas definitivas (BORASI, 1986).
No que diz respeito à formulação da tarefa e as possibilidades de solução,
podemos acrescentar uma classificação apresentada por documentos do PISA (OECD, 2004b;
OECD, 2004c; OECD, 2005) com relação aos tipos de itens. No quadro a seguir,
apresentamos os diferentes tipos de itens segundo os documentos citados, seguido de suas
características e exemplos.
Quadro 13 – Tipos de item (OECD, 2004b; OECD, 2004c; OECD, 2005).
Tipo de Item
Múltipla
Escolha
58
Características
- Envolve a escolha de uma
alternativa das apresentadas.
- A resolução trata-se apenas de
indicar uma resposta.
“Estes
itens
solicitavam
aos
estudantes que fizessem um círculo
em uma letra para indicar uma opção
entre quatro ou cinco alternativas,
Exemplos (OECD, 2004c).
Questão 22: EXPORTAÇÕES M438Q02
Qual foi o valor das exportações de sumos de
fruta da Zedelândia, em 2000?
A 1,8 milhões de zedes.
B 2,3 milhões de zedes.
C 2,4 milhões de zedes.
D 3,4 milhões de zedes.
E 3,8 milhões de zedes.
O que diferencia aqui “problema de palavra” e “exercício” é que este não apresenta contexto algum em seu
enunciado.
57
Múltipla
Escolha
Complexa
Resposta de
Construção
Fechada
Resposta
Curta
Resposta de
Construção
Aberta
cada uma delas podendo ser um
número, uma palavra, uma frase ou
uma sentença” (OECD, 2005, p.
335).
- Envolve escolher as alternativas de
vários itens propostos.
- Para cada item os alunos devem
escolher uma resposta para cada
opção apresentada.
- São do tipo: falso/verdadeiro;
sim/não.
“Nestes itens os estudantes fizeram
uma série de opções, geralmente
binárias. Os estudantes indicaram
suas respostas fazendo um círculo em
uma palavra ou em uma frase curta
(por exemplo, sim ou não) para cada
ponto” (OECD, 2005, p. 335).
- Sem alternativa.
- Permite a construção livre de
respostas com limite fechado de
respostas aceitáveis.
- Os tipos de respostas são similares
às dos tipos de respostas em múltipla
escolha (respostas simples, rápidas e
curtas). Mas não são apresentadas as
alternativas.
- São facilmente avaliáveis.
“Estes itens exigiram que os
estudantes
construíssem
suas
próprias respostas, havendo uma
variedade limitada de respostas
aceitáveis” (OECD, 2005, p. 335).
- Sem alternativa.
- Similar ao item de construção
fechada com maior amplitude de
possibilidades de respostas possíveis.
- Respostas breves.
“Assim como nos itens de respostas
de construção fechada, os estudantes
deveriam fornecer respostas breves,
havendo, porém, ampla variedade de
respostas possíveis” (OECD, 2005, p.
335).
- Exigem respostas mais longas,
sofisticadas, como pedido de
explicação,
argumentação,
justificativa, opinião, pontos de vista,
relacionamento de ideias, conexões,
reflexão.
“Normalmente,
estes
itens
solicitavam aos estudantes que
Fonte: OECD (2004c, p. 84).
Questão 12: DADOS DE JOGAR M555Q02
Fonte: OECD (2004c, p. 76).
Questão 21: EXPORTAÇÕES M438Q1
Qual foi o valor total (em milhões de zedes)
das exportações da Zedelândia, em 1998?
Resposta: .........................................
Fonte: OECD (2004c, p. 83).
Questão 23: ESCADA M547Q01
A figura seguinte representa uma escada de
14 degraus, que tem uma altura total de 252
cm.
Profundidade total 400 cm
Qual é a altura de cada um dos 14 degraus?
Altura: ................. cm.
Fonte: OECD (2004c, p. 85).
Questão 17: CAMINHANDO M124Q3
O Bernardo sabe que o comprimento do seu
passo é de 0,80 metros. A fórmula aplica-se
ao caminhar do Bernardo.
Calcule, em metros por minuto e em
quilómetros por hora, a velocidade a que o
Bernardo caminha. Apresente os cálculos que
58
relacionassem informações ou idéias efectuar.
contidas no texto de estímulo com
sua própria experiência ou opinião, Fonte: OECD (2004c, p. 79).
sendo
que
a
aceitabilidade
dependeria mais da habilidade para
usar o que leram ao justificar ou
explicar tal posição, do que da
posição tomada pelo estudante”
(OECD, 2005, p. 335).
Fonte: autora.
Os tipos de itens apresentados pelo PISA dizem respeito, especificadamente,
às tarefas de avaliação. Entretanto, podem servir para estender uma discussão no que diz
respeito às tarefas de sala de aula de modo geral.
Kirkley (2003)59 apresenta três agrupamentos de problemas no que concerne
às suas características de resolução e possibilidades de resposta que são apresentados no
quadro a seguir.
Quadro 14 – Tipos de Problema segundo Kirkley (2003).
Tipo de
Problema
Problemas bem
estruturados
Definição
Problemas que sempre
usam a mesma solução
passo a passo.
Características
- A estratégia de
solução é usualmente
previsível
- Convergente (uma
resposta certa)
- Todas as informações
de partida são,
usualmente, parte do
enunciado do
problemalv.
Problemas
moderadamente
estruturados
Problemas que exigem uma
variedade de estratégias e
adaptações para se adequar
a contextos particulares.
- Muitas vezes, é aceitável
mais do que uma estratégia
de solução.
- Convergente (uma
resposta certa).
- Frequentemente devem
ser recolhidas informações
necessáriaslvi.
Equilibrar um talão de
Projetar uma planilha,
cheques, seguindo uma
escrever uma carta, e
receita, e resolver um
Exemplos
planejar uma chamada de
enigma de palavras
vendas.
cruzadas.
Fonte: autora – com referência em Kirkley (2003, p. 8, tradução nossa).
59
Problemas estrutura
imperfeita
Problemas com objetivos
vagos e imprecisos.
Estratégias de solução,
menos restritasliv.
- Solução não está bem
definida ou previsível.
Múltiplas perspectivas,
objetivos e soluções.
- Não existe uma solução
única e bem definida; pode
não haver uma solução
totalmente satisfatória a
todos.
- Frequentemente devem
ser recolhidas informações
necessáriaslvii.
Pintar um retrato, projetar
uma ponte, e criar um
novo programa de
computador.
Com base em Newell e Simon (1972) - NEWELL, A.; SIMON, H. Human Problem Solving. Englewood
Cliffs, NJ: Prentice Hall, 1972.
59
Com base nas classificações apresentadas nessa seção, buscamos, na seção
de análise do material, realizar uma leitura das tarefas investigadas para conhecê-las em suas
características e promover uma possível discussão a respeito de suas potencialidades.
2.2.3 A respeito das características das tarefas
Considerando que não deve haver diferenças entre tarefas de sala de aula e
de avaliação, conforme discutido anteriormente, reconhecemos que há, no entanto, diferenças
no que diz respeito aos seus objetivos, contexto de aplicação, duração das tarefas, autonomia.
Com isso, consideramos que algumas características de bons problemas (tarefas) de avaliação,
na perspectiva da RME, indicadas por Van den Heuvel-Panhuizen (1996, 2005), também
devem ser consideradas para as tarefas de sala de aula. Para a autora, bons problemas de
avaliação devem ser informativos, significativos, transparentes, elásticos/flexíveis, acessíveis.
O caráter informativo é relativo à possibilidade de fornecer o máximo de
informações a respeito do conhecimento dos estudantes, insights, competências, incluindo
suas estratégias, procedimentos, formas de raciocínio. Em outras palavras, problemas
informativos devem fornecer uma “imagem” quanto mais completa possível do aprendizado
dos estudantes.
Para que os estudantes possam mostrar suas formas genuínas de lidar com
os problemas, as situações problemáticas devem ser significativas. Isto significa que os
problemas devem ser convidativos, que valham a pena resolver, desafiadores, e que sua
solução seja útil para o fornecimento de uma ou várias respostas. Uma forma de avaliar se um
problema é significativo reside nas respostas das perguntas: o estudante pode se sentir o
“dono” do problema, aquele que domina a situação? Ele pode, a partir da situação, se colocar
a pensar a respeito de questões próprias? Por outro lado, para que os problemas sejam
significativos do ponto de vista da avaliação, eles devem refletir objetivos importantes, se
alguma coisa não apresenta motivo para ser aprendida, então não é útil para a avaliação (VAN
DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 1996).
Para que o caráter significativo possa se revelar, os problemas devem ser
antes acessíveis aos estudantes. Isto significa que devem ser tão claros quanto possível, de
forma que os estudantes possam, pelo menos, refletir a respeito do assunto nele envolvido.
Isto não significa que devem sugerir estratégias ou indicação de solução, mas permitir que o
estudante possa, ao seu nível, revelar alguma forma pela qual abordaria o problema.
60
Ao encontro da acessibilidade dos problemas o caráter de transparência
deve permitir ao estudante mostrar o nível em que se encontra. Nesse sentido, um problema
não pode ser tão fechado a ponto de ser resolvido por uma única maneira, de modo a impedir
que o estudante demonstre suas “habilidades”, ainda que seja por meio de seus métodos
informais.
Para que a avaliação seja tão transparente quanto possível, o caráter de
flexibilidade e elasticidade sugere que os problemas possam ser resolvidos por diferentes
estratégias, em diferentes níveis de aprendizagem. Os alunos devem ter a oportunidade de dar
suas respostas por suas próprias palavras (VAN DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 1996).
No âmbito dessas características de bons problemas de avaliação o papel
dos contextos é essencial, pois “comparado com problemas numéricos simples, problemas de
contexto oferecem aos estudantes mais oportunidades de demonstrar suas habilidades” (VAN
DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 1996, p. 94). No entanto, não é apenas o fato de apresentar
alguma “situação” ou “contexto” no texto do problema que o faz tornar-se mais flexível. Para
Van den Heuvel-Panhuizen (2005), os “problemas de palavras” são frequentemente
confundidos com problemas de contexto. Para essa autora, os problemas de palavras refletem
um contexto não muito essencial. Frequentemente, nesse tipo de problema, o contexto é
utilizado apenas para “camuflar”, “embalar” um contexto matemático. Nesse sentido, é
possível “despir” facilmente o “problema matemático” envolvido na situação realizando
“simples traduções” para linguagem simbólica.
Tão inflexíveis quanto os problemas de palavras podem ser, os problemas
“crus60”, “despidos” são aqueles que não envolvem contexto algum que não seja o
matemático. Esses problemas dão pouca liberdade na forma de abordagem. Quase sempre,
formulam-se a partir de expressões como “resolva as seguintes equações”, “qual o par
ordenado é solução para o sistema”. Para De Lange (1999) esses tipos de problemas devem
ser evitados.
De Lange (1999), considerando as características para bons problemas de
avaliação, na perspectiva da RME, apresenta uma “pirâmide de avaliação” para fornecer uma
imagem visual dos problemas que são necessários para representar o processo no qual um
estudante se encontra.
60
Do inglês “bare problem”.
61
Figura 2 – Pirâmide de Avaliação proposta por De Lange (1999, tradução nossa).
Fonte: autora – traduzida e adaptada de Shafer e Foster (1997, p. 3).
No Nível I, as tarefas demandam resumidamente competências relacionadas
à reprodução como: reconhecer fatos, aplicar algoritmos conhecidos, desenvolver habilidades
técnicas, reconhecer equivalências, recordar objetos matemáticos e propriedades, realizar
procedimentos de rotina. As tarefas nesse nível, geralmente, são do tipo de Múltipla Escolha,
Múltipla Escolha Complexa, de Resposta de Construção Fechada (DE LANGE, 1999).
Geralmente, as questões são isoladas sem muita ligação com situações reais ou imaginárias.
As tarefas de Nível II envolvem competências de conexão. Demandam que
os estudantes lidem com diferentes formas de representação de acordo com a situação,
integrem informações, sejam capazes de distinguir e relacionar diferentes declarações, de
decodificar e interpretar linguagem simbólica ou formal, bem como relacioná-las com a
linguagem natural, formular e resolver problemas e situações (DE LANGE, 1999). Nesse
nível, há exigência de alguma forma de matematização. As tarefas nesse nível são,
geralmente, do tipo de Resposta Curta ou Resposta de Construção Fechada. Segundo De
62
Lange (1999), frequentemente, as tarefas deste tipo são colocadas “dentro” de um contexto de
envolver os alunos na tomada de decisão matemática.
As tarefas de Nível III (reflexão) envolvem a matematização de situações
que, segundo De Lange (1999), reside no conhecimento e extração da matemática envolvida,
bem como sua utilização para a resolução do problema. Envolvem análise, interpretação,
desenvolvimento de modelos e estratégias, proposição de questões, apresentação de
argumentação, provas, generalizações, incluem ainda reflexão a respeito de todo o processo
(DE LANGE, 1999). Tarefas do tipo de Resposta de Construção Aberta são mais
características desse nível.
De Lange (1999) salienta que a definição dos três níveis é uma ação um
tanto arbitrária dado que não há uma distinção tão clara entre os diferentes níveis. Pode
ocorrer de alguma tarefa, em algum nível, incorporar habilidades e competências associadas a
outro nível.
A pirâmide fornece uma imagem visual “justa” da quantidade de tarefas
necessárias para representar o desempenho dos estudantes (DE LANGE, 1999). Assim
concentra-se em uma quantidade maior no Nível I, seguida pelos dois outros níveis,
considerando que o tempo e qualidade do “lidar” com tarefas do Nível III são, relativamente,
“maiores” do que nas tarefas de nível II e I. Nos diferentes níveis as tarefas ainda podem
variar de “simples” a “complexas61” ou ainda do tratamento “informal” para o “formal”.
2.2.4 Constituindo uma tarefa
A proposta desta subseção é apresentar alguns significados assumidos por
nós para falar do nosso objeto de estudo: tarefas de matemática. Acreditamos ser importante
apresentá-los, pois os significados de alguns termos muitas vezes se confundem e, na
literatura, por vezes, são assumidos termos diferentes com os mesmos significados, ou com
mesmos nomes e significados diferentes.
Tarefa, enunciado, contexto, questão, situação, problema, resolução,
solução são termos que cercam nosso objeto de estudo. As características aqui assumidas não
têm objetivo de defini-los, mas de apenas explicitá-los, a fim de podermos conversar a
61
No original, o autor utiliza os termos “fácil” e “difícil” que consideramos serem relativos à forma como o
sujeito enfrenta as tarefas. Acreditamos ser mais coerente a utilização dos termos simples e complexos pelo fato
dessas características serem associadas às tarefas e não aos sujeitos.
63
respeito deles. Além dos autores citados para fundamentar suas características, foram
estudadas as definições apresentadas em alguns dicionários O estudo relativo aos termos foi
feito sobre definições apresentadas em dicionários da Língua Portuguesa, de termos
linguísticos, etimológicos, de Filosofia e Psicologia, nas seguintes obras: Lalande (1953),
Mora (1971), Xavier e Mateus (1992), Corominas e Pascual (1996), Blackburn (1997), Doron
e Parot (2001), Cunha, (2003), Trask (2004) e Houaiss (2009).
Enunciado: conjunto de elementos que formam a exposição de uma tarefa. Composto de
itens escritos ou gráficos. Enunciados dos livros didáticos que estão “postos” e são
independentes do sujeito “resolvedor”.
Questão: pergunta, interrogação, proposta ou matéria a examinar que suscita ou provoca
alguma discussão ou ação do sujeito. Nem sempre a questão precisa ser uma pergunta.
Contexto: conjunto de circunstâncias inter-relacionadas que formam uma trama para
expressar um fato ou uma situação e que contribuem para a sua significação. Encadeamento
de ideias presentes em um texto. De uma forma mais geral, diz respeito à “situação na qual o
problema está embutido” (BORASI, 1986, p. 129).
Situação: indica o estado em que algo está, muitas vezes determinado pelo tempo, espaço,
condições.
Problema: a proposição que o sujeito internaliza, aquela que toma para si ao estabelecer
relações entre o que conhece e o que interpreta do enunciado.
Um problema é uma situação em que “resolvedor” não tem um procedimento ou algoritmo
que conduzirá certamente a uma solução (KANTOWSKI, 1981, apud BORASI, 1986).
Tarefa matemática: qualquer proposição oral, textual e/ou gráfica formada por enunciado
que suscite um desenvolvimento matemático. A questão pode ser dada explicitamente no texto
ou pode ser inferida, “realizada” pelo sujeito.
Atividade: conjunto de ações do qual o estudante lança mão ao resolver um problema.
Resolução: conjunto de estratégias e procedimentos que o sujeito desenvolve na tentativa de
64
solucionar um problema.
Solução: resposta a um problema investigado.
Estratégia: De acordo com Hadji (1994, p. 47), pode “entender-se por estratégia a orientação
geral das operações e dos meios a utilizar. [...]. Em sentido lato, o termo designa um conjunto
de ações coordenadas tendo em vista uma finalidade”.
Procedimento: Está relacionado ao processo de desenvolvimento da estratégia. Segundo
Dalto (2007, p. 38), se, por exemplo, um estudante utiliza-se de uma “estratégia algébrica”
para resolver um problema, um dos procedimentos que pode ser utilizado é uma equação, ou
uma função, ou sistemas de equações.
2.2.5 A respeito de uma sua caracterização
De posse das classificações e considerações a respeito de tarefas de
matemática apresentadas nas seções anteriores, buscamos um entrelaçamento para lançar uma
leitura a respeito das tarefas que selecionamos para este estudo. Assim, apresentamos um
primeiro62 esquema que representa as relações que estabelecemos a priori (antes da análise) a
respeito da literatura estudada.
62
Este foi o primeiro, porque ao longo do desenvolvimento da tese, o esquema foi se modificando.
65
Figura 3 – Esquema representativo das relações criadas com a literatura estudada.
Fonte: autora.
Da rede das relações estabelecidas podemos apresentar algumas
considerações.
Dado um conjunto de tarefas de matemática, podemos classificá-las pelos
tipos de item (destacados na cor laranja).
Analisando o enunciado de cada tarefa, do ponto de vista do contexto,
podemos classificá-la como de contexto estritamente matemático ou não apenas matemático.
Quando recai no contexto estritamente matemático, o tipo de contexto que o descreve é o
Puramente Matemático, segundo a definição de Díaz e Poblete (2005). Quando recai no
contexto não apenas matemático, pode se dividir em três agrupamentos: Real, Realista e
Fantasioso63, utilizando as definições de Díaz e Poblete (2005).
63
Traduzido do verbete espanhol Fantasista.
66
Quando o contexto é do tipo não apenas matemático, provavelmente, remete
a situações do cotidiano ou do imaginário do estudante. Para agrupar as tarefas, de acordo
com as situações que elas apresentam, podemos nos basear nas classificações apresentadas
pelos documentos do PISA (OECD, 2003; OECD, 2004a; OECD, 2006; OECD, 2010)
destacadas na cor verde. Quando o contexto da tarefa é do tipo estritamente matemático, não
identificamos situação nele, neste primeiro momento.
Sendo de contexto estritamente matemático ou não, as tarefas podem ser
agrupadas em Exercício ou Problema. Quando é um exercício de contexto estritamente
matemático, identificamo-lo como da categoria Exercício de Borasi (1986). A tarefa que é do
tipo exercício com contexto não apenas matemático foi identificada com a categoria
Problemas de Palavras de Borasi (1986). Já as tarefas, consideradas como do tipo problema,
e de contexto não apenas matemático, podem ser agrupadas, a nosso ver, nas cinco categorias
de Borasi (1986): Problema Enigma, Problema da Vida Real, Prova de uma conjectura,
Situação Problemática, Situação.
67
3 ESCLARECENDO AS REGRAS
A maioria dos estudos relativos à avaliação da matemática escolar
desenvolvidos no interior do GEPEMA até o presente momento fez uso da produção escrita
de estudantes e professores de matemática para conhecer os modos pelos quais lidavam com
enunciados de tarefas de matemática em situação de avaliação, quais conhecimentos
apresentavam, estratégias, procedimentos, possíveis interpretações, dificuldades, obstáculos
didáticos ou epistemológicos. Das dissertações (20) e teses (2) produzidas por participantes do
GEPEMA, 14 dissertações e duas teses utilizaram como objeto de estudo a produção escrita
dos sujeitos investigados.
Esta investigação tem interesse de investigar os enunciados de tarefas de
matemática para contribuir para análise da produção escrita. Seguirá uma abordagem
qualitativa de cunho interpretativo sob as orientações presentes na análise de conteúdo
(BARDIN, 2004), à luz de pressupostos teóricos
 da avaliação como prática de investigação;
 da análise da produção escrita como ferramenta para a avaliação
como prática de investigação;
 da Educação Matemática Realística como quadro de referência para
a análise dos enunciados e contextos de tarefas de matemática;
 da análise de Problemas (BORASI, 1986; BUTTS, 1997; e outros).
3.1 OBJETIVO GERAL
Apresentar um quadro de referência para a leitura de enunciados de tarefas
matemáticas com base na perspectiva da Educação Matemática Realística, no sentido de
conhecer suas características.
3.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS
 Apresentar um quadro de referência com base na perspectiva da
Educação Matemática Realística que permita “ler” as tarefas de
matemática selecionadas;
 analisar algumas de suas potencialidades e limitações;
68
 construir um panorama da classificação destas tarefas;
 identificar, inventariar e analisar as características das tarefas do
livro didático estudado tomando como base o atendimento à
classificação dos autores escolhidos;
 confrontar a potencialidade destas tarefas com a oportunidade de
aprendizagem que deriva delas.
3.3 AMBIENTE DE ESTUDO
Como um dos objetivos foi o de analisar enunciados de tarefas de
matemática, utilizamos um livro didático64 de matemática como fonte para a recolha de dados.
O critério utilizado para a escolha do livro didático que contém as tarefas a serem analisadas
foi o de ser o mais utilizado no Ensino Fundamental, com base em um levantamento feito
pelo Núcleo Regional de Educação de Londrina dos livros didáticos adotados pelas escolas
estaduais em 2011.
Para a análise, selecionamos as tarefas relativas ao “conteúdo estruturante”
Mudança e Relações65 (OECD, 2003), da série correspondente ao oitavo ano do Ensino
Fundamental. Segundo o PNLD (BRASIL, 2010b), os conteúdos de matemática dos livros
didáticos para o Ensino Fundamental são organizados em cinco campos: Números e
Operações; Geometria; Tratamento da Informação; Álgebra; Grandeza e Medidas. Pelo fato
de o GEPEMA ter dedicado seus estudos com mais frequência a respeito do conteúdo
estruturante “Mudança e Relações”, selecionamos as seções relativas à “Álgebra” para análise
das tarefas.
Dos conteúdos relativos ao campo “Álgebra” o livro didático selecionado
apresenta as seguintes seções: introdução ao cálculo algébrico; estudo dos polinômios; estudo
das frações algébricas; equações do primeiro grau com uma incógnita; porcentagem e juros
simples; sistema de equações do primeiro grau com duas incógnitas. Para esta análise
escolhemos a seção do livro do oitavo ano, que diz respeito a Sistema de Equações do
Primeiro Grau com Duas Incógnitas. Esta escolha se deu pela hipótese de que seria a seção
que envolveria maior diversidade de situações e possibilidades de exploração de contexto.
64
GIOVANNI, J. R.; CASTRUCCI, B.; GIOVANNI J. R. Jr. A conquista da matemática. Ed. Renovada. São
Paulo: FTD, 2007. (7ª. Série, 8º ano).
65
O PISA (OECD, 2003) organiza os conteúdos de matemática em quatro conteúdos estruturantes: Quantidade,
Espaço e forma; Mudança e Relações; Incerteza.
69
A seção selecionada está dividida pelos autores da obra em três partes:
1. Equação do 1º grau com duas incógnitas;
2. Sistema de Equações do 1º grau com duas incógnitas;
3. Resolução de um Sistema de Equações do 1º grau com duas incógnitas.
3.4 PROCEDIMENTOS DE ANÁLISE
As etapas que resumem os procedimentos de análise são: exploração do
livro didático a ser analisado, levantamento e sistematização do conteúdo; seleção da seção a
ser analisada; levantamento das tarefas presentes na seção; resolução de todas as tarefas;
análise e classificação das tarefas de acordo com a literatura que fundamenta este estudo;
construção de agrupamentos das tarefas de acordo com suas classificações; análise de um
exemplo de tarefa para cada grupo construído.
Foi realizada uma primeira leitura do livro didático para conhecer o
material, como o autor apresenta o conteúdo, as tarefas, como estrutura as seções por meio de
exemplos, de exercícios, problemas. Com isso, fizemos um levantamento dos diferentes tipos
de subseções em cada seção:

Explorando:
com
exemplos
de
problemas
resolvidos
para
“apresentação” do conteúdo a ser estudado;

Exercícios: que quase sempre seguem análogos aos exemplos
anteriormente apresentados;

Desafios: tarefas que o autor julga instigante aos estudantes;

Resolvendo problemas: com exemplos resolvidos de problemas de
“aplicação” do conteúdo estudado;

Tratando a Informação; apresenta algum contexto relacionado ao
conteúdo estudado com ênfase no “tratamento estatístico” como
leitura e/ou construção de gráficos e tabelas;

Brasil Real: em que apresenta alguma situação do contexto brasileiro
para ser tratado por meio do conteúdo matemático apresentado na
seção;

Chegou a sua vez: que oferece exercícios de aplicação quase sempre
relacionados às sessões Desafio, Tratando a Informação e Brasil
Real;
70

Retomando o que aprendeu: com um apanhado de exercícios
tratados na seção.
A seção que selecionamos para o estudo possui todas essas subseções. Das
três partes em que é dividida a seção Sistema de Equações do Primeiro Grau com Duas
Incógnitas, selecionamos apenas as tarefas presentes na terceira (Resolução de um Sistema de
Equações do 1º grau com duas incógnitas) por considerar que as duas primeiras (Equação do
1º grau com duas incógnitas; Sistema de Equações do 1º grau com duas incógnitas) possuíam
apenas tarefas de preparação (procedimentais) para a última parte. Desse levantamento
resultou o seguinte quadro:
Quadro 15 – Relaciona a quantidade de tarefas com o tipo de subseção apresentada no livro
analisado.
Tipo66
Exemplos
Exercícios
Desafio
Resolvendo Problemas
Brasil Real
Tratando a Informação
Retomando o que aprendeu
Total
Quantidade
8
24
4
2
3
5
8
54
Fonte: autora.
Para o estudo, descartamos as tarefas apresentadas como exemplo e ficamos
com todas as outras (46) por termos interesse na análise das tarefas que são “propostas” aos
estudantes.
Realizado o levantamento das tarefas presentes em cada seção, na próxima
etapa foram resolvidas todas as 46 tarefas e inventariados os conteúdos relacionados e
procedimentos matemáticos necessários para a resolução de cada tarefa. Esta etapa foi
necessária para obter familiaridade e conhecimento a respeito do material estudado.
O procedimento seguinte tratou de codificar as tarefas de acordo com a
seção da qual fazia parte, ordem de apresentação na seção, ordem na contagem geral das
tarefas. Foi, ainda, indicada para cada tarefa a página que consta no livro didático e a
quantidade de subitens. Desse procedimento obtivemos um quadro do qual apresentamos um
recorte como exemplo:
66
Os nomes das subseções são originais do livro didático.
71
Quadro 16 – Exemplo da codificação das tarefas.
Subseção
E1
D1
RP1
B1
B1
TI1
RA1
Fonte: autora.
Ordem na
subseção
01
02
01
01
02
05
01
Tarefa na
contagem geral
T01
T09
T10
T27
T28
T38
T39
Código
Página
E10101
D10209
RP10110
B10127
B10228
TI10538
RA10139
181
185
186
189
189
192-193
193
Quantidade
de itens
8
1
2
1
1
1
1
A leitura do Quadro 16 exige a compreensão do uso dos códigos. Por
exemplo, o código D10209 é constituído por três elementos (D1 – 02 – 09) que referem:

o elemento D1 indica que a tarefa é da primeira subseção de Desafio
(D);

o elemento seguinte (02) indica que nessa subseção de desafio é a
segunda tarefa apresentada;

o terceiro elemento (09) indica que é a nona tarefa na contagem geral
das 46 tarefas presentes na seção.
A letra “E” refere-se à seção “Exercícios, as letras “RP” à seção Resolvendo
Problemas, “B” à seção “Brasil Real”, “TI” à seção “Tratando a Informação” e “RA” à seção
“Retomando o que aprendeu”.
A próxima etapa foi a de analisar e organizar as tarefas de acordo com
algumas classificações apresentadas pelos autores. As tarefas foram agrupadas por
semelhança de acordo com os critérios67 estabelecidos para cada classificação. As
classificações realizadas foram relativas à (ao):
1. Tipo de contexto de Díaz e Poblete (2005).
2. Ordem do contexto de De Lange (1987).
3. Tipo de Problema de Borasi (1986).
4. Tipo de Problema de Butts (1997).
5. Tipo de Situação dos documentos do PISA.
6. Tipo de Item dos documentos do PISA.
67
Os critérios são discutidos nas seções de análise.
72
7. Tipo rotineira ou não-rotineira.
A partir da análise do material foi construída uma planilha que contém todas
as informações técnicas extraídas para cada tarefa, bem como suas classificações.
A análise dessa planilha e dessas classificações deu origem a alguns
agrupamentos. Apresentamos na seção de análise as classificações realizadas as quais foram
separadas em dois eixos: um que diz respeito ao contexto e tipo de problema (classificações 1,
2, 3 e 4 – apresentadas em 4.1) e outro que diz respeito às características da tarefa
(classificações 5 e 6 – apresentadas em 4.2).
Agrupamos, então, as classificações realizadas em 4.1. Desse agrupamento
resultaram oito grupos que são apresentados em 4.3. A partir desse agrupamento formado,
apresentamos um mapeamento das características obtidas do conjunto das tarefas à luz da
literatura estudada. Desses oito grupos formados e apresentados em 4.3, decidimos apresentar
em 4.4 a análise de um exemplo de tarefa para cada grupo formado.
Salientamos que as possibilidades de agrupamentos dessas classificações
são muitas. Nesta tese estamos apresentando um agrupamento e uma possibilidade de análise.
73
4 JOGANDO
Nesta seção, apresentamos a análise das tarefas selecionadas para este
estudo, segundo os procedimentos metodológicos descritos na seção 3.
4.1 DO CONTEXTO DAS TAREFAS
Esta subseção apresenta a leitura interpretativa que fizemos das 46 tarefas
selecionadas para o estudo. Nesta análise as tarefas foram classificadas tendo por base as
proposições de:
1. Díaz e Poblete (2005);
2. De Lange (1987);
3. Problema de Borasi (1986);
4. Butts (1997).
4.1.1 Classificação das tarefas a partir da leitura interpretativa feita a partir do texto de Díaz e
Poblete
Apresentamos a seguir o quadro resultante da 1ª. classificação das tarefas de
acordo com o contexto de Díaz e Poblete (2005).
Quadro 17 – Classificação 1.
Classificação segundo o contexto
(DÍAZ; POBLETE, 2005)
Quantidade
Código das tarefas
0
-
Problema de contexto realista
27
T09, T10, T11, T14, T15, T16, T17, T18,
T19, T20, T21, T22, T23, T24, T27, T28,
T29, T34, T35, T36, T37, T38, T40, T41,
T42, T43, T45
Problema de contexto fantasioso
0
-
Problema de contexto puramente
matemático
19
T01, T02, T03, T04, T05, T06, T07, T08,
T12, T13, T25, T26, T30, T31, T32, T33,
T39, T44, T46
Problema de contexto real
Total
Fonte: autora.
46
74
Das
46
tarefas
analisadas
não
foram
identificadas
tarefas
que
correspondessem a contextos reais (que dependessem de intervenções/informações da
realidade dos alunos) ou estritamente fantasiosos (que remetessem ao mundo da fantasia,
ficção científica, com pouca relação à realidade). As 27 tarefas consideradas como de
contexto realista indicavam alguma referência na realidade, ainda que artificial.
A “fronteira” que separa as tarefas de contexto real e contexto realista
parece indefinida. Como critério, consideramos que o problema de contexto real deveria
envolver alguma informação “extra”, vinda do contexto da realidade dos alunos, da escola,
comunidade. Como as 27 tarefas que faziam alguma referência à realidade tinham todas as
informações no próprio enunciado, sem necessidade de pesquisa, foram classificadas como
Problema de contexto realista. A Figura 4 representa uma das tarefas do material analisado.
Figura 4 – Tarefa classificada como Problema de contexto realista (T11).
Fonte: Giovanni et al (2007, p. 187).
Foram classificadas como Problema de contexto puramente matemático as
tarefas que não faziam referência alguma à realidade dos estudantes ou ao mundo da fantasia.
Essas tarefas apresentavam no enunciado expressões do tipo “resolva o sistema”, “determine a
solução do sistema de equações”, “o par ordenado (x,y) é a solução do sistema”. Como
exemplo, apresentamos a Figura 5 a seguir.
75
Figura 5 – Tarefa classificada como Problema de contexto puramente matemático (T06).
Fonte: Giovanni et al (2007, p. 185).
4.1.2 Classificação das tarefas a partir da leitura interpretativa feita a partir do texto de De
Lange (1987)
No Quadro 18 apresentamos o levantamento da classificação das tarefas de
acordo com os critérios para a ordem de contexto propostos por De Lange (1987).
Quadro 18 – Classificação 2.
Classificação com base na
ordem de contexto (DE
LANGE, 1987)
Quantidade
Código das tarefas
Ordem zero
2
T16, T23
Primeira ordem
7
T3, T08, T27, T28, T34, T35, T36
Segunda ordem
20
T09, T10, T11, T14, T15, T17, T18, T19, T20, T21,
T22, T24, T25, T29, T38, T40, T41, T42, T43, T45
Terceira ordem
0
-
Sem ordem alguma68
17
T01, T02, T03, T04, T05, T06, T07, T12, T13, T26,
T30, T31, T32, T33, T39, T44, T46
Total
Fonte: autora.
46
Começamos justificando a criação de mais um item para essa classificação
(sem ordem alguma). De acordo com a classificação de De Lange (1987), os contextos
parecem servir para relacionar a matemática com alguma referência na realidade. Como há 19
tarefas que foram indicadas como de contexto puramente matemático na classificação
anterior, acrescentamos esse item. Consideramos que, apesar de o contexto ser “puramente
68
Essa designação não faz parte da classificação de De Lange (1987).
76
matemático” (que apresenta apenas elementos na linguagem matemática), ele não deixa de ter
referência na realidade, pois tarefas desse tipo fazem parte, por exemplo, da realidade escolar
das aulas de matemática. Segundo a classificação de De Lange (1987), os contextos parecem
ser classificados como de ordem zero, primeira e segunda ordem, quando envolvem alguma
situação extramatemática. No caso em que a tarefa apresenta situação intramatemática, parece
não se adequar aos critérios de classificação das ordens do contexto de De Lange (1987). Por
isso, a criação do item “Sem ordem alguma”. Nesse grupo, foram indicadas 17 das 19 tarefas,
antes classificadas com contexto puramente matemático.
Dessas 19 tarefas classificadas como puramente matemáticas, classificamos
as outras duas, uma como contexto de Primeira Ordem (T08) e outra como de Segunda
Ordem (T25), pela relevância e necessidade do contexto apresentado para a resolução da
tarefa, ainda que fosse puramente matemático.
Figura 6 – Tarefa classificada como Problema de contexto puramente matemático e de
primeira ordem (T08).
Fonte: Giovanni et al (2007, p. 185).
77
Figura 7 – Tarefa classificada como Problema de contexto puramente matemático e de
segunda ordem (T25).
Fonte: Giovanni et al (2007, p. 189).
Das 27 tarefas classificadas como de contexto realista, 2 foram consideradas
como de ordem zero, 6 como de primeira ordem, 19 como de segunda ordem.
As tarefas consideradas como de ordem zero apresentam situações que,
embora remetam a algo conhecido pelos estudantes como “tábuas”, “marceneiro”,
“prateleiras”, parecem não promover a necessidade de serem resolvidas, sendo artificiais,
servindo apenas para “embalar” os sistemas de equações envolvidos nas tarefas. A Figura 8
exemplifica uma delas.
Figura 8 – Tarefa classificada como Problema de contexto realista e de ordem zero (T16).
Fonte: Giovanni et al (2007, p. 187).
78
As tarefas consideradas como de primeira ordem apresentam contextos mais
relevantes em relação às tarefas de ordem zero tornando o contexto necessário e útil para a
emissão de uma resposta. Essas tarefas exigem baixa demanda de matematização, sendo
resolvidas com procedimentos matemáticos simples e, possivelmente, já conhecidos dos
estudantes. Como exemplo, apresentamos a Figura 9 (Tarefa T27).
Figura 9 – Tarefa classificada como Problema de contexto realista e de primeira ordem
(T27).
Fonte: Giovanni et al (2007, p. 189).
Foram consideradas como tarefas de contexto de segunda ordem, as tarefas
que, além de apresentarem contexto relevante e útil para avaliação e emissão de uma resposta,
exigiam um certo nível de matematização, ainda que apenas horizontal. Todas as tarefas
envolviam a tradução em linguagem matemática e a resolução de um sistema de equações
lineares com duas ou três incógnitas. A Figura 10 é um exemplo deste tipo de tarefa.
Figura 10 – Tarefa classificada como Problema de contexto realista e de segunda ordem
(T22).
Fonte: Giovanni et al (2007, p. 188).
Nenhuma das tarefas foi classificada como de contexto de terceira ordem.
79
4.1.3 Classificação das tarefas a partir da leitura interpretativa feita a partir do texto de Borasi
(1986)
Apresentamos no Quadro 19 a terceira classificação das tarefas, realizada de
acordo com os rótulos para classificação de Problemas de Borasi (1986).
Quadro 19 – Classificação 3.
Classificação
(BORASI,
1986)
Contexto
Quantidade
Exercício
Inexistente
15
Problema de
palavra
Totalmente explícito no
texto
27
Totalmente explícito no
texto
Apenas parcialmente no
texto - teorias
Prova de uma
conhecidas são
conjectura
assumidas
Problema da Apenas parcialmente no
texto
vida real
Apenas
parcialmente
no
Situação
texto - problemático
problemática
Apenas parcialmente no
Situação
texto – não problemático
Total
Fonte: autora.
Problema Enigma
Código das tarefas
T01, T02, T03, T04, T05, T06, T07, T26,
T30, T31, T32, T33, T39, T44, T46
T09, T10, T11, T14, T15, T16, T17, T18,
T19, T20, T21, T22, T23, T24, T27, T28,
T29, T34, T35, T36, T37, T38, T40, T41,
T42, T43, T45
4
T08, T12, T13, T25
0
-
0
-
0
-
0
-
46
Comparando com a primeira classificação, realizada a partir de Díaz e
Poblete (2005), na qual das 19 tarefas consideradas como contexto puramente matemático,
pela classificação de Borasi (1986) 15 foram identificadas como Exercício69 e 4 como
Problema Enigma70 (T08, T12, T13, T25) nessa classificação. As 15 classificadas como
Exercício foram, na classificação 2, indicadas como sem ordem alguma.
Das quatro tarefas, classificadas como Problema Enigma, duas foram
identificadas segundo a classificação 2 como sem ordem alguma (T12, T13). As outras tarefas
(T08 – figura 6, T25 – figura 7) foram classificadas como de contextos de Primeira e Segunda
69
Exemplo de Exercício – ver T06 (figura 5).
Possuem contexto explícito no texto que se diferem do Problema de Palavra por serem de contexto puramente
matemático.
70
80
Ordem, respectivamente. Essas duas tarefas foram ainda consideradas como sendo as duas
únicas não-rotineiras de toda a amostra das 46 tarefas.
Figura 11 – Tarefa classificada como Problema de contexto puramente matemático e sem
ordem alguma e Problema Enigma (T12).
Fonte: Giovanni et al (2007, p. 187).
As 27 tarefas que foram classificadas como de contexto realista (na primeira
classificação) foram classificadas como Problema de Palavra, que, apesar de terem caráter de
exercício, com formulação única e explícita, apresentam contexto explícito no texto.
Figura 12 – Tarefa classificada como Problema de contexto realista e Problema de Palavra
(T43).
Fonte: Giovanni et al (2007, p. 193).
Como os contextos necessários para a resolução das tarefas estavam sempre
presentes no texto do enunciado, nenhuma tarefa foi classificada como Prova de uma
conjectura, Problema da vida real, Situação problemática ou Situação, de acordo com Borasi
(1986).
4.1.4 Classificação das tarefas a partir da leitura interpretativa feita a partir do texto de Butts
(1997).
No quadro a seguir apresentamos a quantidade e os códigos das tarefas
classificadas segundo a proposição de Butts (1997).
81
Quadro 20 – Classificação 4.
Classificação (BUTTS, 1997)
Quantidade
Código das tarefas
A – Exercício de reconhecimento
1
T26
B – Exercícios algorítmicos
14
T01, T02, T03, T04, T05, T06, T07, T30,
T31, T32, T33, T39, T44, T46
C – Problemas de aplicação
29
T09, T10, T11, T12, T13, T14, T15, T16,
T17, T18, T19, T20, T21, T22, T23, T24,
T27, T28, T29, T34, T35, T36, T37, T38,
T40, T41, T42, T43, T45
D – Problemas de pesquisa aberta
2
T08, T25
E – Situação-Problema
Fonte: autora.
0
-
Nessa última classificação, tendo por referência Butts (1997) foram
consideradas como Exercícios algorítmicos71 14 tarefas, as quais foram interpretadas ainda
como de contexto puramente matemático (pela 1ª. classificação), sem ordem alguma (pela 2ª.
classificação) e Exercício (pela 3ª. classificação). Uma tarefa que apresentou o mesmo perfil d
estas 14, nas três primeiras classificações, foi classificada, nessa quarta, como Exercício de
reconhecimento, apresentada a seguir.
Figura 13 – Tarefa classificada como Exercício de Reconhecimento (T2672).
Fonte: Giovanni et al (2007, p. 189).
Das 29 tarefas consideradas como Problema de Aplicação, 27 são de
contexto realista (1ª. classificação) e de segunda ordem (2ª. classificação). As outras duas são
as citadas como Problema Enigma na 3ª. classificação e como sem ordem alguma na 2ª.
classificação.
Foram constatadas, com base na classificação de Butts (1997), duas tarefas
(T08 - figura 6, T25 - figura 7) classificadas como Problema de pesquisa aberta, as quais
foram interpretadas como de contextos de Primeira e Segunda Ordem, respectivamente,
segundo De Lange (1987), ambas como Problema Enigma e não-rotineiras, analisadas a
partir de Borasi (1986).
71
72
Exemplo – ver T06 (figura 5).
Segue da tarefa 25 (T25 – figura 7).
82
Ao serem classificadas as tarefas a partir de Butts (1997) não foi
identificada nenhuma tarefa como Situação Problema.
4.2 DAS CARACTERIZAÇÕES SEGUNDO TIPO DE SITUAÇÃO E TIPO DE ITEM
Esta seção apresenta a leitura interpretativa que fizemos das 46 tarefas
selecionadas para o estudo. Nessa análise as tarefas foram classificadas:

pelo tipo de situação (DE LANGE, 2003; INEE, 2005, OECD,
2010);

pelo tipo de item (OECD, 2005; OECD, 2004b; OECD, 2004c).
Os Quadros 21 e 22 apresentam a quantidade e os códigos das tarefas
classificadas quanto ao tipo de situação e tipo de item, respectivamente.
Quadro 21 – Classificação 5.
Agrupamento de
situação
Quantidade
Código das tarefas
Pessoal ou uso
privado
12
Pública
8
Ocupacional ou
Profissional
5
Educacional
2
T15, T19
19
T01, T02, T03, T04, T05, T06, T07, T08, T12, T13, T25,
T26, T30, T31, T32, T33, T39, T44, T46,
Científica
Total
T09, T10, T11, T14, T16, T17, T18, T20, T21, T38, T41, T43
T27, T28, T29, T34, T35, T36, T37, T45
T22, T23, T24, T40, T42
46
Fonte: autora.
As 12 tarefas que foram identificadas como situações de ordem pessoal ou
uso privado envolvem em seus enunciados situações como: “pesagem” em uma balança,
divisão de um terreno para construção de casa e jardim, pontuação em partidas de voleibol ou
outros esportes, comparação de preços de mercadorias de um supermercado.
83
As tarefas que foram classificadas como de situação Pública apresentam
situações como: cálculo do índice de mortalidade infantil, variação percentual de produtos de
cesta básica, preços da bilheteria de um cinema.
As cinco tarefas com situações reconhecidas como Ocupacional ou
Profissional em 5 tarefas apresentam situações como: encaixotamento de livros de uma
editora, marcenaria, variação do preço de venda de um produto em duas lojas distintas, preço
de venda e preço de custo em uma determinada loja, preço da assinatura de duas revistas de
uma editora.
Como situação de ordem Educacional foram identificadas duas tarefas: uma
diz respeito a um torneio de basquete na escola e a outra diz respeito à inscrição de estudantes
do curso de literatura inglesa em outro curso de língua espanhola.
Foram identificadas como situações científicas73 as 19 tarefas que
apresentam contexto puramente matemático. O que não significa que tarefas de situação
científica estejam limitadas apenas aos enunciados puramente matemáticos. Uma tarefa
poderia ser indicada nesta categoria envolvendo um contexto de ficção científica, por
exemplo, sem ser estritamente matemática.
Quadro 22 – Classificação 6.
Tipo de Item
Quantidade
Código das tarefas
Múltipla Escolha
8
T41, T43, T45, T40, T42, T39, T44, T46
Múltipla Escolha
Complexa
0
-
Resposta de
Construção
Fechada
36
T09, T10, T11, T14, T16, T17, T18, T20, T21, T38, T27, T28,
T29, T34, T35, T36, T37, T22, T23, T24, T15, T19, T01, T02,
T03, T04, T05, T06, T07, T08, T12, T13, T30, T31, T32, T33
Resposta Curta
2
T25, T26,
Resposta de
Construção
Aberta
0
-
Total
Fonte: autora.
46
As oito tarefas identificadas como de Múltipla Escolha são apresentadas na
última subseção, intitulada “Retomando o que aprendeu”. Todas as tarefas dessa subseção
73
“que consistem inteiramente de elementos matemáticos explícitos, sem que se faça [no enunciado] alguma
tentativa para situar o problema em um contexto mais amplo. Ocasionalmente, estes contextos são identificados
como „intramatemáticos‟” (OCDE, 2005, p. 41).
84
consistem na resolução de um sistema de duas (ou três) equações lineares e duas (ou três)
incógnitas e apresentam, cada uma, cinco alternativas, das quais apenas uma é a correta.
As outras 36 tarefas classificadas como de Resposta de Construção Fechada
também consistem na resolução de um sistema de duas (ou três) equações lineares e duas (ou
três) incógnitas e admitem apenas uma resposta correta. Entretanto, nessas tarefas não há a
apresentação de alternativas.
As duas tarefas classificadas como Resposta Curta são tarefas que
envolvem a investigação de um determinado sistema, podendo assumir uma multiplicidade de
respostas diferentes, motivo pelo qual foram indicadas nessa categoria.
Não foram identificadas tarefas de Múltipla Escolha Complexa e de
Resposta de Construção Aberta.
4.3 DOS AGRUPAMENTOS FORMADOS A PARTIR DAS PRIMEIRAS ANÁLISES (4.1)
Tendo realizado as análises e classificações descritas em 4.1, elaboramos o
Quadro 23 o qual permite visualizar os oito grupos distintos que puderam ser formados a
partir destas classificações. Os grupos foram nomeados de A até H.
Quadro 23 – Construção dos grupos dos diferentes tipos de tarefas segundo as classificações
realizadas em 4.1.
1ª.
Classificação
2ª.
Classificação
3ª.
Classificação
4ª.
Classificação
Totais
Exercícios
algorítmicos
(14)
A
(14)
Exercício de
Reconhecimento
(1)
B
(1)
Problema de
aplicação
(2)
C
(2)
Exercício
(15)
Tarefas
(46)
Contexto
Puramente
Matemático
(19)74
Sem ordem
(17)
Problema
Enigma
(2)
74
(x) quantidade “x” de tarefas neste item.
85
Contexto
realista
(27)
Ordem 1
(1)
Problema
Enigma
(1)
Problema de
pesquisa aberta
(1)
D
(1)
Ordem 2
(1)
Problema
Enigma
(1)
Problema de
pesquisa aberta
(1)
E
(1)
Ordem 0
(2)
Problema de
Palavra
(2)
Problema de
aplicação
(2)
F
(2)
Ordem 1
(6)
Problema de
Palavra
(6)
Problema de
aplicação
(6)
G
(6)
Problema de
Palavra
(19)
46
Problema de
aplicação
(19)
46
Ordem 2
(19)
Total
Fonte: autora.
46
46
H
(19)
46
Com relação ao primeiro esquema (que informamos antes da análise –
Figura 3), no esquema da Figura 14, deixamos em colorido apenas os tipos de tarefas que
surgiram nessa análise e em cinza os tipos de tarefas que não apareceram.
86
Figura 14 – Esquema representativo das relações criadas com a literatura estudada após a
análise.
Fonte: autora.
Com relação ao primeiro esquema (Figura 3), como houve apenas um tipo
de contexto (Realista), adaptamos o tipo de situação “saindo” desse tipo de tarefa. Isto indica
que não houve situações envolvidas (propostas) nas tarefas que fossem reais (efetivamente)
ou fantasiosas.
No esquema apresentado, destacamos em cinza as possibilidades de
classificação de tarefas que não surgiram na amostra.
No que diz respeito ao tipo de situação, no primeiro esquema (Figura 3)
havíamos considerado que a situação científica surgiria apenas das tarefas de contexto realista
e não consideramos que pudessem surgir, também, das tarefas de contexto puramente
matemático. Contudo, após a análise, constatamos que todas as tarefas de contexto puramente
matemático puderam ser identificadas como de situação científica.
87
Com isso, retiramos do esquema apresentado na Figura 14 os itens em cinza
(pois não surgiram tarefas que exemplificassem esses itens). Com a retirada dos itens em
cinza o esquema que representa apenas os tipos de tarefa que surgiram na análise é
apresentado na Figura 15.
Figura 15 – Esquema representativo das relações criadas a partir do conjunto das tarefas
analisadas.
Fonte: autora.
A partir da análise realizada em 4.1 e do agrupamento apresentado no
Quadro 23, construímos um esquema para representá-lo (Figura 16).
88
Figura 16 – Esquema representativo do agrupamento construído em 4.3.
Fonte: autora.
Consideramos que assim como as possibilidades de agrupamentos a partir
das classificações são muitas, as possibilidades para representar as vias de classificação dessas
tarefas são muitas também. Acreditamos que o importante é que a proposição de tarefas de
matemática pertençam a diferentes grupos de modo que não valorizem apenas um ou alguns
tipos de tarefas.
4.4 ANALISANDO TAREFAS INDIVIDUALMENTE (SUA CONSTITUIÇÃO)
Nesta seção apresentamos as análises particulares de oito tarefas que são
representativas dos grupos formados em 4.3. Em suma, são apresentadas informações a
89
respeito do contexto, do conteúdo envolvido, do tipo de tarefa, tipo de item, tipo de situação,
competência envolvida.
4.4.1 Tarefa do GRUPO A – T05.
A tarefa apresentada na Figura 17 é representativa do Grupo A. As catorze
tarefas incluídas neste grupo possuem as mesmas classificações, com exceção em relação ao
tipo de item. Onze são de Resposta de Construção Fechada e três são de Múltipla Escolha.
Figura 17 – Tarefa T05.
Fonte: Giovanni et al (2007, p. 185).
A Tarefa 05 é classificada com um Exercício Algorítmico que, segundo a
definição de Butts (1997), pode ser resolvida com um procedimento passo a passo. Segundo a
classificação de Borasi (1986), a respeito de Exercício, neste tipo de tarefa o contexto é
inexistente. No que diz respeito às classificações quanto à ordem de contexto de De Lange
(1987), esta tarefa não foi classificada em nenhum tipo. Tanto Borasi (1986) quanto De Lange
(1987)
parecem
identificar
o
contexto
como
aquele
que
fornece
informações
extramatemáticas.
Apesar disso, consideramos a tarefa como de contexto estritamente
matemático, que é convergente com a definição de Díaz e Poblete (2005) como de Contexto
Puramente Matemático, pois se refere exclusivamente a objetos matemáticos: números,
relações, operações.
A tarefa é de Resposta de Construção Fechada, pois não apresenta
alternativa e permite a construção livre de respostas com limite fechado de respostas
90
aceitáveis. Se considerarmos a tarefa como de contexto matemático, a situação envolvida
também é estritamente matemática, identificada como do tipo Científica que, segundo o
documento OCDE (2005), consiste de elementos matemáticos explícitos sem que se faça
nenhuma tentativa para situar a tarefa em um contexto mais amplo.
A tarefa é ainda do tipo rotineira, por ser frequente nas salas de aula e nos
livros didáticos (BURIASCO, 1999), tanto que o Grupo A contém 14 tarefas desse tipo, que
representa, aproximadamente, 30% das tarefas analisadas. Essas tarefas são identificadas com
exigências de competências relacionadas à Reprodução, que, de acordo com De Lange
(1999), envolve aplicar algoritmos conhecidos, desenvolver habilidades técnicas, reconhecer
equivalências, recordar objetos matemáticos e propriedades, realizar procedimentos de rotina.
Na pirâmide de De Lange (1999) se enquadraria no Nível I.
A tarefa é classificada, com base em Borasi (1986), como um Exercício,
pois no que diz respeito a:

contexto: é inexistente.

formulação: é única e explícita. Demanda que o estudante resolva o
sistema apresentado para que, de posse dos valores numéricos das
incógnitas envolvidas, resolva as operações solicitadas nos três itens
a, b e c.

soluções: são únicas e exatas. O par ordenado que resolve o sistema
é (20,10) e os itens a, b e c têm como respostas únicas 200, 500 e 2,
respectivamente.

métodos de abordagem: combinação de algoritmos conhecidos,
tais como: isolar as incógnitas, utilizar métodos de substituição,
adição ou multiplicação para resolução de sistemas lineares.
No quadro a seguir apresentamos um resumo das classificações desta tarefa.
Quadro 24 – Resumo das classificações de T05.
Tipo de Contexto
Tipo de Tarefa
Ordem de Contexto
Tipo de Item
Tipo de Situação
Competência
Rotineira ou não-rotineira
Fonte: autora.
Puramente Matemático
Exercício (BORASI, 1986)
Exercício algorítmico (BUTTS, 1997)
Não há
Resposta de Construção Fechada
Científica
Reprodução
Rotineira
91
4.4.2 Tarefa do GRUPO B – T26
A tarefa T26 é a única do Grupo B, a qual é apresentada a seguir.
Figura 18 – Tarefa T2675.
Fonte: Giovanni et al (2007, p. 189).
Com relação à classificação de Butts (1997), é identificada como Exercício
de Reconhecimento, pois exige que os alunos identifiquem soluções semelhantes entre si.
O contexto é Puramente Matemático (DÍAZ; POBLETE, 2005), pois
envolve a comparação das relações matemáticas que foram criadas na tarefa antecedente.
Com relação à classificação de Borasi (1986), consideramos mais próxima do tipo Exercício,
pois no que diz respeito a:

contexto:
é
inexistente,
não
depende
de
informações
extramatemáticas.

formulação: única e explícita. Exige que os alunos comparem suas
resoluções.

soluções: a solução para cada aluno é única. Embora as soluções
entre os estudantes possam variar, dependendo das soluções obtidas
na tarefa antecedente.

métodos de abordagem: comparação e identificação.
Quanto à ordem de contexto de De Lange (1987), esta tarefa não foi
classificada em nenhum tipo, porque não demanda nenhum tipo de matematização.
O tipo de resposta desta tarefa é Curta, em que não há alternativa, é similar
à de construção fechada, mas há uma amplitude de respostas possíveis e respostas breves. A
situação é identificada como do tipo Científica, pois envolve relações a partir de informações
estritamente matemáticas. A competência associada é de Reprodução, porque demanda
reconhecimento e identificação de respostas equivalentes.
No quadro a seguir apresentamos um resumo das classificações desta tarefa.
75
Segue da tarefa 25 (T25 – figura 6). A Tarefa T25 faz parte do Grupo E (a ser apresentada mais adiante).
92
Quadro 25 – Resumo das classificações de T26.
Tipo de Contexto
Tipo de Tarefa.
Ordem de Contexto
Tipo de Item
Tipo de Situação
Competência
Rotineira ou não-rotineira
Fonte: autora.
Puramente Matemático
Exercício (BORASI, 1986)
Exercício de reconhecimento (BUTTS, 1997)
Não há
Resposta de Construção Fechada
Científica
Reprodução
Rotineira.
4.4.3 Tarefa do GRUPO C – T13
A tarefa T13 é uma das duas tarefas que fazem parte do Grupo C76. As duas
tarefas receberam as mesmas classificações em todos os itens de análise.
Figura 19 – Tarefa T13.
Fonte: Giovanni et al (2007, p. 187).
Diferente das tarefas dos grupos A e B, T13 foi considerada como um
problema e não como exercício, tendo sido classificada como Problema de Aplicação
(BUTTS, 1997) e Problema Enigma (BORASI, 1986). Segundo a definição de Butts (1997),
os problemas tradicionais quase sempre caem no grupo Problema de Aplicação, exigindo para
sua resolução a formulação simbólica do problema e manipulação dos símbolos mediante
algoritmos diversos.
O Problema Enigma difere do Problema de Palavra por ser de contexto
puramente matemático. A tarefa é classificada com base em Borasi (1986) como um
Problema Enigma, pois no que diz respeito a:
76

contexto: é totalmente explícito no texto.

formulação: é única e explícita.
A outra tarefa é T22 – ver Figura 10.
93

soluções: é única e exata. Os números que resolvem o problema são
87 e 23.

métodos de abordagem: além dos algoritmos tradicionais para
resolução de sistemas lineares, esta tarefa dá margem para
exploração por meio de tentativa e erro, por exemplo. Pode envolver,
também, a elaboração de um algoritmo para resolução de tarefas
similares.
A tarefa foi considerada ainda como de Resposta de Construção Fechada e
Rotineira. A situação é científica por envolver apenas contexto matemático e, dependendo da
exploração realizada pelo aluno, pode ser relacionada à competência de Reprodução (quando
lança mão de procedimentos e algoritmos conhecidos) ou de Conexão (quando lança mão de
procedimentos novos para sua resolução). Entretanto, consideramos ser mais típica deste tipo
de tarefa a competência de Reprodução.
No quadro a seguir apresentamos um resumo das classificações desta tarefa.
Quadro 26 – Resumo das classificações de T13.
Tipo de Contexto
Tipo de Tarefa.
Ordem de Contexto
Tipo de Item
Tipo de Situação
Competência
Rotineira ou não-rotineira
Fonte: autora.
Puramente Matemático
Problema Enigma (BORASI, 1986)
Problemas de aplicação (BUTTS, 1997)
Não há
Resposta de Construção Fechada
Científica
Reprodução
Rotineira
4.4.4 Tarefa do GRUPO D – T08
A Tarefa T08 (vide Figura 20) é a única do grupo D. Apesar de ser de
contexto puramente matemático, que não envolve situação extramatemática, pôde ser
caracterizada como um Problema Enigma segundo a definição de Borasi (1986), que exige a
elaboração de um algoritmo, reflexão. No que diz respeito a:

contexto: é totalmente explícito no texto. Não necessita de
informações extras.

formulação: é única e explícita, qual seja, indicar o valor numérico
das diferentes figuras do enigma.
94

soluções: é única e exata.

métodos de abordagem: pode envolver sistematizar as equações e
resolvê-las, segundo procedimentos conhecidos para resolução de
sistemas lineares, elaborar algoritmos de resolução que contenha
procedimentos simples de somar, subtrair, dividir, realizar tentativa e
erro simulando resultados.
Figura 20 – Tarefa T08.
Fonte: Giovanni et al (2007, p. 185).
É, também, considerada como um Problema de pesquisa aberta, conforme
Butts (1997), por ser do tipo de tarefa em cujo enunciado não há uma estratégia para resolvêla. Geralmente, esse tipo de tarefa é expressa por “prove que”, “encontre todos”, “para quais”,
entre outras variações.
Esta tarefa foi classificada como contexto de primeira ordem, por apresentar
situação que pode ser simplesmente traduzida em operações matemáticas simples e não
demandar matematização77.
Com relação ao tipo de item, a tarefa apresentada é classificada como um
item de resposta de construção fechada, pois permite a construção livre de resoluções com
77
Estamos considerando o nível de escolaridade em que esta tarefa é empregada para afirmar que realizar
operações matemáticas básicas para resolver a tarefa não se trata de um processo de matematização, uma vez
que, possivelmente, já tenham sido matematizadas nos anos anteriores.
95
um limite fechado de respostas aceitáveis (nesse caso, uma apenas). Não apresenta
alternativas de resposta e, para sua solução não há a necessidade explícita de apresentar os
procedimentos de resolução, bem como justificativa de como foram pensados. A resposta é
objetiva e curta.
A situação é considerada científica por se tratar de uma tarefa
especificamente matemática, que envolve apenas números, representações e operações
matemáticas.
A tarefa foi classificada como não-rotineira, pois apesar de ser de contexto
estritamente matemático e envolver competências de reprodução, como reconhecer
equivalências, realizar procedimentos de rotina, recordar objetos e propriedades matemáticas,
procedimentos considerados típicos e comuns nas tarefas de matemática rotineiras,
consideramos que o contexto é diferenciado por possibilitar uma flexibilidade de conteúdo. A
tarefa que, inicialmente, tem o caráter de ser um sistema de equações é apresentada de uma
forma diferenciada das tarefas consideradas rotineiras para este conteúdo, pois permite
flexibilidade para elaboração de algoritmo e recorrência a outras estratégias de resolução que
envolvam procedimentos conhecidos, como operações matemáticas básicas: adição,
subtração, divisão.
No quadro a seguir apresentamos um resumo das classificações desta tarefa.
Quadro 27 – Resumo das classificações de T08.
Tipo de Contexto
Tipo de Tarefa
Ordem de Contexto
Tipo de Item
Tipo de Situação
Competência
Rotineira ou não-rotineira
Fonte: autora.
Puramente Matemático
Problema Enigma (BORASI, 1986)
Problema de pesquisa aberta (BUTTS, 1997)
Primeira Ordem
Resposta de Construção Fechada
Científica
Reprodução
Não-rotineira
4.4.5 Tarefa do GRUPO E – T25
A Tarefa T25 (item 1 da Figura 21), única do grupo E, foi classificada como
de Segunda Ordem pela relevância do contexto apresentado, por ser útil para a resolução da
tarefa e, também, por possibilitar matematização, apesar de o contexto ter sido considerado
como puramente matemático. Consideramos que esta tarefa não é rotineira, porque,
96
frequentemente, nos livros didáticos as tarefas de enunciados puramente matemáticos não
possibilitam matematização, e sim treinamento de técnicas.
Figura 21 – Tarefa T25.
Fonte: Giovanni et al (2007, p. 189).
Segundo a classificação de Borasi (1986), classificamo-la como Situação
Problemática, pois no que diz respeito a:

contexto: é totalmente explícito no texto, embora seja problemático.

formulação: é feita explicitamente.

soluções: muitas possíveis.

métodos de abordagem: pode envolver sistematizar as equações
algébricas e reescrevê-las segundo procedimentos conhecidos para
resolução de sistemas lineares, levantar hipóteses, testar conjecturas,
simular e testar resultados, problematizar.
Segundo a classificação de Butts (1997), a tarefa foi classificada como de
Problema de Pesquisa Aberta. No que diz respeito ao tipo de item, foi a única tarefa
classificada como de Resposta Curta, pois não apresenta alternativa de respostas, as respostas
97
são breves e com muitas possibilidades de resposta. Quanto ao tipo de situação classificamos
como Científica.
A tarefa foi classificada ainda com competências de Conexão, pois dá
possibilidade para matematização, exige que os alunos lidem com informações numéricas e
simbólicas e as interpretem, sugere tomada de decisão.
No quadro a seguir apresentamos um resumo das classificações desta tarefa.
Quadro 28 – Resumo das classificações de T25.
Tipo de Contexto
Tipo de Tarefa
Ordem de Contexto
Tipo de Item
Tipo de Situação
Competência
Rotineira ou não-rotineira
Fonte: autora.
Puramente Matemático
Problema Enigma (BORASI, 1986)
Problema de pesquisa aberta (BUTTS, 1997)
Segunda Ordem
Resposta Curta
Científica/Educacional
Conexão
Não-rotineira.
4.4.6 Tarefa do GRUPO F – T16
A tarefa T16 (apresentada na Figura 22) é uma das duas tarefas que estão
presentes no grupo F. O contexto que embala a tarefa de resolver uma ou duas equações
lineares envolve um fato que pode ocorrer na realidade, embora seja pouco provável que
alguém precise, na prática, equacionar as medidas das partes de uma tábua para obtê-las, e,
uma vez que medida a primeira parte (85 cm), por que não utilizar o mesmo procedimento
para obter as outras duas partes? Pelo fato de o contexto se tratar apenas de uma simulação de
realidade, ou parte dela, caracterizamo-lo como Realista conforme a definição de Diáz e
Poblete (2005).
Figura 22 – Tarefa T16.
Fonte: Giovanni et al (2007, p. 187).
Os tipos de tarefas que são utilizadas apenas para tornar o problema
matemático parecido com uma situação da vida real são chamados por De Lange (1999) de
98
contexto falso ou de camuflagem, pois são, geralmente, irrelevantes para a resolução do
problema e pouco possibilitam a matematização, sendo resolvidos, quase sempre, por uma
simples tradução para a linguagem algébrica. Estes tipos de tarefas são classificados como de
Contexto de Ordem Zero.
Para Borasi (1986), uma tarefa com estas características recebe a
denominação de Problema de Palavras. No caso desta tarefa, o que justifica esta classificação
se deve ao fato de que:

o contexto: é totalmente explícito no texto.

a formulação: é única e explícita, qual seja, indicar as duas outras
medidas da tábua.

a solução: é única e exata.

os métodos de abordagem: envolvem combinação de algoritmos
conhecidos.
Conforme Butts (1997), as tarefas tradicionais que exigem formulação do
problema simbolicamente e manipulação dos símbolos mediante algoritmos diversos recebem
a denominação de Problemas de Aplicação. Estes tipos de tarefas, além de tradicionais, são,
ainda, frequentes nos livros didáticos e, portanto, as tarefas são classificadas como rotineiras.
Quanto ao tipo de item, a tarefa é classificada como de Resposta de
Construção Fechada e o tipo de situação é Pessoal ou de uso Privado.
No que diz respeito ao agrupamento de competências, se situa no nível I, de
Reprodução, por exigir apenas aplicação de algoritmos simples e conhecidos, desenvolver
habilidades técnicas e realizar procedimentos rotineiros.
No quadro a seguir apresentamos um resumo das classificações desta tarefa.
Quadro 29 – Resumo das classificações de T16.
Tipo de Contexto
Tipo de Tarefa
Ordem de Contexto
Tipo de Item
Tipo de Situação
Competência
Rotineira ou não-rotineira
Fonte: autora.
Realista
Problema de Palavra (BORASI, 1986)
Problemas de aplicação (BUTTS, 1997)
Zero Ordem
Resposta de Construção Fechada
Pessoal ou uso privado
Reprodução
Rotineira.
99
4.4.7 Tarefa do GRUPO G – T34
As seis tarefas do grupo G receberam classificações similares às tarefas do
grupo F com o diferencial de que estas foram classificadas com contexto de Primeira Ordem.
Nesse tipo de tarefa o contexto apresentado é necessário e relevante para resolver o problema
proposto, embora não necessite um processo de matematização sofisticada pelo fato de já ser
pré-matematizado. O que caracteriza a tarefa T34 (da Figura 23) como pré-matematizada é
que a equação necessária para resolver o problema já é dada na própria tarefa, o que resta ao
estudante é a simples aplicação dos dados retirados da tabela, na fórmula dada, mediante
manipulação da calculadora. Este tipo de tarefa é típico nos itens de avaliação que exigem
competências de Reprodução.
Figura 23 – Tarefa T3478.
Fonte: Giovanni et al (2007, p. 192-193).
Por ter referência em uma situação do tipo Pública situada em uma possível
realidade, classificamos a tarefa T34 (exemplar para o grupo G) como de contexto Realista
conforme Díaz e Poblete (2005). Segundo a classificação de Butts (1997), se assemelha aos
Problemas de Aplicação.
No que diz respeito à classificação de Borasi (1986), o contexto é totalmente
explícito no texto, a formulação e a solução são únicas e exatas, e a abordagem é identificada
com a manipulação de algoritmo conhecido. Estas características situam a tarefa T34 no
agrupamento dos Problemas de Palavras.
O tipo de item é de Resposta de Construção Fechada e a tarefa é rotineira.
No quadro a seguir apresentamos um resumo das classificações desta tarefa.
78
Na página anterior a esta tarefa é dada uma tabela com uma lista de produtos de supermercado com seus
respectivos preços coletados em duas datas distintas. Além disto, é dada uma equação para calcular a variação
percentual dos preços.
100
Quadro 30 – Resumo das classificações de T34.
Tipo de Contexto
Tipo de Tarefa
Ordem de Contexto
Tipo de Item
Tipo de Situação
Competência
Rotineira ou não-rotineira
Fonte: autora.
Realista
Problema de Palavra (BORASI, 1986)
Problemas de aplicação (BUTTS, 1997)
Primeira Ordem
Resposta de Construção Fechada
Pública
Reprodução
Rotineira
4.4.8 Tarefa do GRUPO H – T22
A tarefa T22 (apresentada na Figura 24) envolve de forma mais geral um
sistema de duas equações e duas incógnitas. O contexto que situa a elaboração das equações
trata-se de uma distribuição de uma quantidade conhecida de livros e caixas, com dois tipos
de caixas que comportam quantidades distintas de livros.
Figura 24 – Tarefa T22.
Fonte: Giovanni et al (2007, p. 188).
A tarefa pode ser classificada como um problema pelo fato de não envolver
apenas a reprodução de um conhecimento matemático que o estudante já possui. A tarefa
demanda interpretação, transcrição para linguagem simbólica, análise.
Uma vez que esta tarefa é situada em um tipo de contexto, que permite
correlacionar fatos realísticos (editora, livros, distribuição, caixas) às informações
matemáticas do problema (𝑥 + 𝑦 = 27; 50𝑥 + 70𝑦 = 1650), a tarefa deixa de ser
simplesmente um mero exercício e podemos classificá-la como sendo do tipo de contexto não
apenas matemático. Segundo a classificação de Díaz e Poblete (2005), a tarefa é um
Problema de Contexto Realista, por se tratar de uma simulação que pode ser constatada na
realidade. Nesse tipo de contexto, as informações que acompanham a descrição do “problema
101
matemático já equacionado”79 embalado na situação podem tanto fornecer a atribuição de
significado à tarefa proposta, bem como oferecer possibilidade de o estudante recorrer a
outros métodos alternativos de resolução, o que faz com que a elasticidade do problema seja
aumentada.
Se pudéssemos “despir” o dado problema, a tarefa seria classificada como
um tipo de contexto apenas matemático.
Resolva o sistema de equações a seguir
𝑥 + 𝑦 = 27
50𝑥 + 70𝑦 = 1650
Neste tipo de tarefa “despida”, o estudante tem apenas a possibilidade de
resolvê-la se já conhecer os métodos tradicionais de resolução de sistema de equações com
duas equações e duas incógnitas (adição, substituição, redução por escalonamento). Nesse
caso, poderíamos classificá-la como Exercício.
No que diz respeito ao tipo de item o problema apresentado exige apenas
que o estudante forneça uma resposta à pergunta feita, sem a necessidade explícita de
apresentar os procedimentos de resolução, bem como justificativa de como foram pensados.
Não apresenta possibilidades de resposta indicadas a priori. Portanto, é classificada como um
item de resposta de construção fechada.
As informações que acompanham o problema situam-no em uma situação
ocupacional ou do trabalho, ou seja, são relacionadas com atividades que podem ser
verificadas em algum ambiente de trabalho.
Quanto ao tipo de competência que a tarefa demanda em sua resolução,
exige que os estudantes sejam capazes de: distinguir e relacionar as informações; lidar com as
representações das mesmas; decodificar a linguagem natural para simbólica; desenvolver
estratégias; integrar informações. Atitudes que são próprias da categoria Conexão (DE
LANGE, 1999).
Por se tratar de uma tarefa matemática que é típica de livros didáticos e
embalada em contexto que é acessível ao estudante, o problema é explicitamente do tipo
rotineiro.
79
Expressão traduzida de bare problem.
102
A tarefa é classificada com base em Borasi (1986), como um Problema de
Palavra, pois no que diz respeito a:

contexto: é todo dado no próprio texto. Não exige que o aluno
busque informações extras.

formulação: é única e explícita. A questão é explicitamente uma, a
saber: as quantidades de caixas de cada tipo necessárias para
empacotamento dos 1650 livros.

soluções: sobretudo única e exata. Apenas uma resposta é possível
para o problema: 15 caixas de 70 livros e 12 caixas de 50 livros.

métodos de abordagem: combinação de algoritmos conhecidos,
método da substituição, método da adição para resolução de sistemas
de equações lineares. Pode envolver tentativa e erro, estimativa por
meio da construção de tabelas, contagem, comparação de múltiplos e
divisores comuns.
Apesar de ser considerada uma tarefa rotineira, consideramos que o
contexto é portador de solução, pois permite ao solucionador “experienciar” a situação
apresentada, antes de ter que lidar com a tarefa matemática subjacente: simular, conjecturar,
testar hipóteses realísticas. Nesse tipo de tarefa, as ferramentas matemáticas são instrumentais
que podem surgir por meio da manipulação das informações, para a resolução do problema,
ou seja, o contexto pode conduzir à elaboração de conhecimento matemático.
Como a tarefa é apresentada após exemplos e apresentação do conteúdo
(nesta ordem), consideramos que o contexto propriamente dito da tarefa é utilizado apenas
para ilustrar um contexto matemático. Com isso, quaisquer outras situações diferenciadas
poderiam servir para ilustrar o “mesmo” contexto matemático. Ser considerado como um
Problema de Palavra significa que, apesar do contexto ser essencial para a resolução da
tarefa, ele não é, especificamente, próprio da tarefa. Outros elementos que podem estar
envolvidos em algum tipo de distribuição também poderiam embalar a tarefa de resolver o
“mesmo” sistema de equações lineares, ou ainda outras similares, mais ou menos complexas.
Essa tarefa é classificada ainda como contexto de segunda ordem, pois
demanda que o estudante identifique quais ferramentas matemáticas deve utilizar para
organizar, estruturar e resolver a tarefa, promovendo, desse modo, a matematização, ainda que
horizontal. Identificamos como matematização horizontal, pois, supostamente, o aluno já
conhece os procedimentos de resolução do sistema e a principal demanda parece ser a de
103
traduzi-la para a linguagem matemática. Caso a tarefa fosse utilizada como tema de
introdução ao conteúdo, por exemplo, poderia ser pensada como contexto de terceira ordem
por possibilitar a matematização conceitual.
No quadro a seguir apresentamos um resumo das classificações da tarefa
T22.
Quadro 31 – Resumo das classificações de T22.
Tipo de Contexto
Tipo de Tarefa
Ordem de Contexto
Tipo de Item
Tipo de Situação
Competência
Rotineira ou não-rotineira
Fonte: autora.
Realista
Problema de Palavra (BORASI, 1986)
Problemas de aplicação (BUTTS, 1997)
Segunda Ordem
Resposta de Construção Fechada
Ocupacional ou Profissional
Conexão
Rotineira
Com relação aos itens apresentados na seção 2.2.4 (da constituição da
tarefa) podemos apresentar as seguintes conclusões:
Enunciado: o enunciado é formado apenas por elementos textuais.
Questão: há uma questão que é explícita: quantas caixas de cada tipo a editora utilizou?
Contexto: conjunto da situação proposta com o problema assumido pelo sujeito.
Situação: envolve a distribuição de livros em caixas em uma determinada editora, situando-se
num contexto de trabalho.
Problema: o problema “original”, “proposto”, é explícito pela questão. Entretanto, não é
possível garantir que se constitua “de fato” como um problema para o sujeito, ou que ele
compreenda o enunciado proposto e o resolva.
Tarefa matemática: contém uma questão explícita, contém uma situação e demanda
tratamento matemático.
Atividade: conjunto de ações que o estudante lança mão ao resolver um problema.
Resolução: conjunto de estratégias e procedimentos que o sujeito desenvolve na tentativa de
solucionar um problema.
Solução: 15 caixas de 70 livros e 12 caixas de 50 livros.
Estratégia: algumas podem ser utilizadas: método da substituição, método da adição para
resolução de sistemas de equações lineares. Pode envolver ainda tentativa e erro, estimativa
por meio da construção de tabelas, contagem, comparação de múltiplos e divisores comuns.
Procedimento: Está relacionado ao processo de desenvolvimento da estratégia.
104
5 DISCUTINDO AS JOGADAS
Figura 25 – um meme80 da internet.
Fonte: ZOOA, online. Disponível em: <http://zooa.wordpress.com/tag/poker-face/>. Acesso em: 28
jan. de 2013.
A Figura (25) apresentada é um meme famoso em uma rede social. Não
apenas pelo seu caráter típico de “meme” pelos desenhos divertidos apresentados, mas
também por, muito provavelmente, evocar na lembrança dos internautas alguma situação que
é muito típica na avaliação tradicional. Na tentativa de contextualizar algum assunto
matemático, por vezes, os enunciados acabam se tornando um tanto artificiais e tão
desconexos da realidade que seria mais simples se o assunto ficasse totalmente “cru”, apenas
matemático.
No que diz respeito à classificação das tarefas com base no agrupamento de
Díaz e Poblete (2005) (vide Quadro 17), observa-se que os contextos das tarefas limitam-se
apenas a dois grupos: ser puramente matemáticos ou revestidos de alguma situação com
referência na realidade, artificial. Os problemas de contextos reais (que podem ser produzidos
efetivamente na realidade) e fantasiosos não são explorados. Por este motivo, dentre outros,
acreditamos que estabelecer relações entre os conteúdos matemáticos, aprendidos na escola, e
suas utilidades em situações reais, fora dela, parece tão difícil aos estudantes. A referência
80
Meme pode ser uma ideia, uma expressão, um bordão, um desenho que se espalha rapidamente por
compartilhamento na internet como um viral.
105
obtida se resume, quase sempre, em aprender matemática de forma técnica, mecânica, ou no
máximo inserida em situações artificiais.
Outro detalhe que, também, é comum nas aulas de matemática é que os
“problemas” de aplicação aparecem, quase sempre, no final de uma sequência didática e, em
seguida, na prova, quando muito do que foi trabalhado focou apenas na resolução de
exercícios (puramente matemáticos) na perspectiva de que, “se os alunos sabem lidar com a
matemática, saberão lidar com a sua aplicação” (vide figura 26).
Figura 26 – outro meme da internet.
Fonte: Imagens para Facebook, on-line. Disponível em: <http://imagensparafacebook.com/imagensfacebook/meme-imagens-facebook/vida-de-estudante-memes.html>. Acesso em: 28 jan. de 2013.
Apesar de a seção do livro didático analisado apresentar mais tarefas (27)
com contextos com referência na realidade do que exercícios puramente matemáticos (16), a
ordem de apresentação é comum à dos livros didáticos em geral: primeiro são apresentadas as
tarefas que, supostamente, promoverão o desenvolvimento das habilidades de cálculo e
manipulação de algoritmos e depois são apresentados os “problemas de aplicação”.
Entretanto, também, consideramos que o livro didático é apenas um instrumento para o
professor e não um guia, que deve ser seguido “religiosamente”.
106
Além de os contextos das tarefas se limitarem a apenas dois grupos,
conforme Díaz e Poblete (2005), observamos pouca variedade entre os tipos de tarefa,
segundo a classificação de Butts (1997) (vide Quadro 20). Vale a pena observar que, apesar
de a publicação de Butts (1997) ter mais de 15 anos, a afirmação do autor de que a maioria
dos problemas contidos dos livros didáticos, de qualquer nível, pertencia aos 3 primeiros
agrupamentos, aparentemente, não mudou. Apenas duas tarefas (T08 e T25) foram
identificadas como de Pesquisa Aberta (grupo D) e, ainda, como as duas únicas não-rotineiras
de toda a amostra.
Consideramos, além disso, que não é o fato de uma tarefa apresentar alguma
“situação” real, ou com referência na realidade, ou ainda fictícia, que faz com que ela venha a
se constituir em um “Problema de Contexto”. Com isso, autores como De Lange (1999) e Van
den Heuvel-Panhuizen (1996, 2005) justificam a relevância do contexto para a resolução do
problema. Se a questão pode ser facilmente despida e resolvida sem o “uso” da situação,
então, muito provavelmente, estamos lidando com um Problema de Palavras, cuja “situação”
pode ser substituída por outras análogas. Na análise realizada, observamos que a maioria das
tarefas (42 de 46 - vide Quadro 19) pode ser identificada nos grupos Exercício e Problema de
Palavras, com base no agrupamento de Borasi (1986).
Nesse agrupamento, os grupos de tarefas são formados a partir de elementos
como tipo de contexto, formulação das questões, soluções e métodos de abordagem.
Observamos que, segundo nossa análise, há pouca variedade na distribuição das tarefas nos
diferentes grupos: apenas três grupos (dos sete) comportam as 46 tarefas. Não bastasse essa
limitação, esses três grupos revelam tarefas que pouco valorizam contextos ricos, formulações
que possam dar margem para várias questões, soluções e métodos de abordagem
diversificados.
Um bom Problema de Contexto é o que conta com a característica de a
situação ser autêntica para a resolução do estudante. Desse ponto de vista, o assunto
matemático e a situação são dificilmente separáveis. O caráter da autenticidade vai ao
encontro do que a Educação Matemática Realística propõe: a matemática no ambiente de
ensino e aprendizagem deve emergir da exploração de fenômenos que são experiencialmente
reais, mais especificamente, realísticos. Real não no sentido de ser verdadeiro, mas “real” no
sentido de ser imaginável, concebido, concreto (por ter passado pelo processo de abstração).
Por este motivo, acreditamos que a tradução para “realístico” é mais apropriada. A
autenticidade da tarefa está fortemente ligada com a relação que o sujeito irá estabelecer com
ela. Portanto, é possível acontecer de um bom Problema de Contexto (aos olhos do educador)
107
nem se constituir como um problema (que valha a pena ser resolvido) para o estudante. Vale
considerar que, mesmo que uma tarefa envolva situação de fato real não é condição suficiente
para ser um Problema de Contexto, se o estudante não reconhecer na situação a relevância
para a resolução. Nesse caso, podemos dizer que o problema é de contexto camuflado, serve
apenas para promover a matemática desejada.
Na nossa análise, não identificamos, a partir da leitura dos enunciados,
propostas de tarefas que conduzissem à exploração de situações autenticamente reais. As
situações, quando presentes nos enunciados das tarefas, eram, quase sempre, de caráter
imaginável, realizável nas mentes dos estudantes. Segundo a classificação realizada tendo por
referência De Lange (1987) (vide Quadro 18), 26 tarefas não apresentam contexto ou o
contexto envolvido dá pouca, ou nenhuma, margem para matematização. As outras 20 tarefas,
classificadas com contexto de segunda ordem, oferecem alguma margem para matematização,
o que requer do estudante organizar, estruturar e resolver a tarefa. Nenhuma tarefa foi
identificada com contexto de terceira ordem, que, a nosso ver, a qual pudesse ser
caracterizada como um bom Problema de Contexto. Nesse grupo estariam as tarefas que
possibilitariam a matematização conceitual.
Com relação à relevância do contexto para o problema, De Lange (1987,
1995, 1999) estabelece alguns critérios, que se relacionam tanto com a importância que o
contexto desempenha na resolução quanto com a oportunidade de matematização. Com isso, a
possibilidade de matematizar parece estar fortemente associada ao papel que o contexto
desempenha no sentido de quanto mais “realístico” o contexto proposto, mais o estudante tem
a oportunidade de se apropriar dele e, então, produzir a sua matemática.
Ocorre que ser realístico, para nós, nem sempre precisa estar associado a
alguma situação com referência na realidade, uma tarefa de contexto estritamente matemático
também pode oportunizar a matematização. Por este motivo, a classificação de De Lange
(1987, 1995, 1999) quanto à ordem dos contextos nos deixou em dúvida com relação a como
classificar esses tipos de problemas

a tarefa que é “puramente matemática” não tem ordem de contexto?

“puramente matemática” significa que não há contexto? Ou que o
contexto não exerce função alguma?

e se considerarmos que o contexto é matemático? Entra, também, na
ordem zero?
Na análise realizada, as duas tarefas (T08 e T25) de contexto puramente
matemático, segundo Díaz e Poblete (2005), foram classificadas com contextos de primeira e
108
segunda ordem com base na classificação de De Lange (1987) pela oportunidade de
matematização que ofereciam. Se fôssemos considerar apenas o envolvimento da tarefa com
algum contexto real ou realístico, estas duas tarefas ficariam no grupo sem ordem alguma
criado por nós, que, além de não apresentar contexto real ou realístico, não dá margem para
matematização.
Considerando que as tarefas de contexto puramente matemático possuem
contexto, a nosso ver, encontramos nas definições dos documentos relativos ao PISA uma
definição que associa o tipo de situação científica a estes tipos de tarefas. Segundo o
documento OCDE (2005), a situação científica consiste de elementos matemáticos explícitos
sem que se faça nenhuma tentativa para situar a tarefa em um contexto mais amplo. Ocorre
que uma tarefa de contexto puramente matemático, segundo esta definição, envolve situação
científica, embora nem toda tarefa com situação científica seja de contexto puramente
matemático.
No que diz respeito às classificações das tarefas quanto suas situações,
consideramos que houve uma boa distribuição nos diferentes grupos (vide quadro 21). Essa
multiplicidade de situações envolvidas nas tarefas pode permitir aos estudantes expandir seus
conhecimentos a respeito de assuntos que não são apenas matemáticos. Em uma possibilidade
de aumentar o quadro, sugeriríamos a criação de um grupo com tarefas de situação fantasiosa,
que o agrupamento não contempla.
Com relação aos tipos de item, a maioria da amostra (44 tarefas de 46) se
concentra em tarefas de Resposta de Construção Fechada ou de Múltipla Escolha. Estes dois
grupos de tipos de item permitem a construção livre de resoluções com limite fechado de
respostas aceitáveis, portanto, são facilmente avaliáveis. A diferença entre os dois grupos é
que o segundo apresenta alternativas de resposta, enquanto o primeiro não. Estes tipos de
itens são tradicionais e frequentes em livros didáticos. Apenas duas tarefas foram classificadas
como de Resposta Curta, um tipo de item que permite uma amplitude de possibilidades de
respostas aceitáveis. Não foram identificadas tarefas cujo item fosse de Múltipla Escolha
Complexa ou Resposta de Construção Aberta, apesar de avaliações como a do PISA utilizar,
frequentemente, itens deste tipo em suas aferições. Acreditamos que a não familiaridade dos
estudantes com estes tipos de item pode dificultar seus modos de lidar com tarefas deste tipo.
Lamentável que estes dois tipos de itens sejam pouco frequentes em livros
didáticos, pois estimulam a criatividade dos estudantes, tomadas de decisão, autonomia, poder
de argumentação. Segundo De Lange (1999), estes tipos de item geralmente são encontrados
109
nas tarefas no nível II de competências: conexão. Enquanto que o item de Resposta de
Construção Aberta é facilmente encontrado no nível III: de reflexão.
Quanto à oportunidade de matematização associada ao papel que os
contextos desempenham, temos ainda de considerar que nem sempre uma única tarefa pode
favorecer o desenvolvimento ou produção de algum conceito matemático. Algumas tarefas
podem ser potenciais apenas para a matematização horizontal, como pode ocorrer com as
tarefas de problemas de palavras, ou até mesmo tarefas com contextos de segunda ordem. O
que parece ser relevante de ser considerado com relação ao tipo de matematização tem a ver
com o tratamento mais, ou menos, imediato dado à tarefa. Em outras palavras, fornecer um
tratamento formal e sofisticado para um fenômeno nem sempre implica em matematização
vertical se, por exemplo, este tratamento já é rotineiro e mecânico. Por este motivo,
concordamos com De Lange (1999) quando salienta que tarefas que envolvem
matematização81 vertical não são recomendadas em circunstâncias de prova (avaliação).
Assim, podemos pensar que a matematização vertical pode envolver, também, uma
matematização conceitual.
A matematização conceitual parece demandar exploração de mais de uma
tarefa. Por conta disso, a RME valoriza a fenomenologia didática no sentido de promover a
construção de um objeto matemático por meio da exploração de vários fenômenos associados
a ele. Assim, a matematização não fica associada às tarefas, que são, muitas vezes, limitadas a
um assunto, a um modelo. A ideia é trabalhar como “modelos de” no sentido de desenvolver
“modelos para” em uma perspectiva de matematização progressiva.
Pelas classificações realizadas, observamos que há pouca diversidade entre
as tarefas no que diz respeito aos contextos, tipos de item, de competências, possibilidades de
matematização. Acreditamos que as tarefas analisadas dariam pouca margem para um
trabalho didático na perspectiva da RME82. Não foi muita surpresa para nós essa conclusão,
em razão de o livro didático selecionado para coleta da amostra ser, apesar de suas muitas
mudanças e melhorias ao longo dos anos, ainda um livro tradicional. Talvez por este motivo é
que o livro costuma ser o mais escolhido pelos professores, pela familiaridade que os
professores têm com ele, o que, possivelmente, lhes confere segurança no lidar com o
conteúdo.
81
Se uma tarefa propicia a matematização, seja ela horizontal ou vertical, isto implica na construção/ produção
de um novo conhecimento? Matematização implica em aprendizagem?
82
Há de considerar que dentre os cinco/seis princípios que caracterizam a RME (vide Quadro 4), nesta pesquisa,
nos debruçamos, mais pontualmente, no estudo das tarefas com relação ao segundo princípio.
110
6 UM JOGO QUE NÃO SE ENCERRA
Na busca de identificar boas tarefas para avaliação percorremos o caminho
de estudar a avaliação como prática de investigação, análise da produção escrita, análise de
enunciados de tarefas de matemática que podem revelar potencialidades das tarefas tanto para
a avaliação quanto para um trabalho didático em sala de aula. Muitas são as perguntas que
decorrem desta análise. Tendo classificado um conjunto de tarefas e observado suas
características, suas limitações, suas formulações, tipos de item e situações, vale e é
necessário perguntar: quais as especificidades das tarefas que são potenciais para sala de aula?
E para a avaliação? O que esta análise pode oportunizar ao trabalho didático do professor, seja
no seu planejamento, suas intenções, ambiente didático? Será que tarefas tradicionais dos
tipos analisados podem permitir uma avaliação que oportunize a aprendizagem? Perguntas
essas que podem ser motivo de investigações futuras.
Ainda como sugestão de pesquisas, valeria a pena investigar:
 como professores da Educação Básica (com ou sem o referencial
indicado) analisariam as mesmas tarefas?
 o que é possível enxergar na produção escrita de tarefas em
diferentes modalidades de classificação.
 a elaboração e/ou pesquisa de tarefas com características que não se
apresentaram nesta amostra estudada.
 como seria o uso das tarefas, utilizadas nesta análise, na pesquisa
relativa aos outros princípios da RME?
 a utilização das classificações aqui apresentas em curso de formação
continuada de professores de matemática
Apesar de a ação de classificar as tarefas ser um tanto subjetiva, devido ao
caráter interpretativo da análise e ao fato de ser relativo ao “lidar” de cada sujeito com uma
determinada tarefa, consideramos que conhecê-las (as tarefas) é importante para a avaliação.
Neste trabalho buscamos, com base na literatura, analisar tarefas de um livro
didático para conhecê-las
 em sua constituição, identificando qual a questão associada a cada
tarefa, se é caracterizada como exercício, problema, se apresenta
contexto, qual o tipo de item;
111
 suas características, como o contexto se classifica, se a tarefa é
rotineira ou não, a que tipo de situação remete;
 suas potencialidades, se oportuniza matematização, se a tarefa é
flexível e permite diferentes estratégias de resolução, que tipo de
competências pode promover.
É relevante considerar que as classificações e análises realizadas fazem
sentido no âmbito de conhecer as tarefas, seus itens e conceitos a elas associados, os possíveis
métodos de solução, suas múltiplas respostas quando convém, conteúdo, competências, para
que possamos dialogar a respeito delas. Não queremos limitar os tipos de tarefas em
definições fechadas, pois estaríamos limitando o campo da discussão.
Consideramos que uma tarefa por si só “não tem vida própria”, ela depende
também do “contexto prático” em que é empregada, do tratamento e situação em que o
professor trabalha com ela. Isto pode ser motivo de análises futuras.
Uma intenção subjacente é que este trabalho sirva como um recurso para
professores que ensinam matemática, na busca de conhecer melhor as tarefas de matemática e
potencializar sua utilização em um contexto de avaliação como oportunidade de
aprendizagem.
112
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119
Notas.
i
Instead, assessment is viewed as an integral component of the teaching and learning process, in which the
teacher attempts to acquire as complete a picture of the student as possible through all sorts of informal
assessment strategies, such as class observation, questioning, practical assignments, constructing work-folios
and having the students keep journals.
ii
―Performing a writing task requires students to reflect on, analyze, and synthesize the material being studied in
a thoughtful and precise way‖.
iii
―WRITING represents a unique mode of learning-not merely valuable, not merely special, but unique. That
will be my contention in this paper. The thesis is straightforward. Writing serves learning uniquely because
writing as process-and- product possesses a cluster of attributes that correspond uniquely to certain powerful
learning strategies‖.
iv
―WRITING represents a unique mode of learning-not merely valuable, not merely special, but unique. That will
be my contention in this paper. The thesis is straightforward. Writing serves learning uniquely because writing as
process-and- product possesses a cluster of attributes that correspond uniquely to certain powerful learning
strategies‖.
v
―Not only will the opportunity to practice writing improve a student's ability in written expression, but using
writing to practice mathematical tasks will also assist students in comprehending mathematics concepts and
improve their ability to communicate mathematically‖.
vi
―Nevertheless, we suggest that the use of writing to learn can provide a valuable means to facilitate a
personalized and making-of-meaning approach to learning mathematics‖.
vii
These results indicate that, although this was only a pilot study, there is a basis for promoting the use of
writing as a teaching and learning process in presenting mathematical problem solving to students.
viii
If students can write clearly about mathematical concepts, then it is apparent that they understand them.
ix
By encouraging students to explain themselves in clear coherent prose, exposition allows them to become more
aware of their thinking processes and more conscious of the choices they are making as they carry out the
computation and analysis involved in solving math problems.
x
Characteristic of this approach is its focus on calculations with bare numbers, and the little attention that it
pays to applications; which is certainly true for the beginning of the learning process. Mathematics is taught in
an atomised way. Students learn procedures in a step-by-step way in which the teacher demonstrates how to
solve a problem.
xi
―Typical of this type of education was that students were let free to discover much by themselves and were
stimulated to carry out investigations‖.
xii
―This is a method of teaching mathematics which focuses on abstract concepts such as set theory, functions
and bases other than ten‖.
xiii
It is an activity of solving problems, of looking for problems, but it is also an activity of organizing a subject
matter. This can be a matter from reality which has to be organized according to mathematical patterns if
problems from reality have to be solved. It can also be a mathematical matter, new or old results, of your own or
of others, which have to be organized according to new ideas, to be better understood, in a broader context, or
by an axiomatic approach.
xiv
Mathematising is an organising activity. It refers to the essence of the mathematical activity, to the thread that
runs through all mathematics education directed towards the acquisition of factual knowledge, the learning of
concepts, the attainment of skills and the use of language and other organising skills in solving problems that
are, or are not, placed in mathematical context.
xv
for generality: generalizing (looking for analogies, classifying, structuring); for certainty: reflecting,
justifying, proving (using a systematic approach, elaborating and testing conjectures, etc.); for exactness:
modelling, symbolizing, defining (limiting interpretations and validity); and for brevity: symbolizing and
schematizing (developing standard procedures and notations).
xvi
In the horizontal component the road to mathematics is paved by means of model formation, schematising,
and shortcutting. The vertical component acts by mathematical processing, raising the structure level in the
corresponding problem field. No doubt the separating clusters of activities in the two components looks
somewhat artificial.
xvii
(1) pupils reach the first level of thinking as soon as they can manipulate the known characteristics of a
pattern that is familiar to them; (2) as soon as they learn to manipulate the interrelatedness of the characteristics
they will have reached the second level; (3) they will reach the third level of thinking when they start
manipulating the intrinsic characteristics of relations (ZULKARDI, 2002, p. 29).
xviii
The activity principle means that students are confronted with problem situations in which, for instance, they
can produce fractions and gradually develop an algorithmic way of multiplication and division, based on an
informal way of working. In relation to this principle, ―own productions‖ play an important role in RME.
120
xix
The intertwinement principle means that mathematical domains such as number, geometry, measurement, and
data handling are not considered as isolated curriculum chapters but as heavily integrated.
xx
Pupils should develop an integrated view of mathematics as well as the flexibility to connect to different subdomains and/or to other disciplines.
xxi
Moreover, solving rich context problems often means that one has to apply a broad range of mathematical
tools and understandings.
xxii
The strength of the intertwinement principle is that it brings coherency to the curriculum. This principle refers
not only to the different domains of mathematics, but can also be found within them.
xxiii
the students need room to construct mathematical insights and tools by themselves. In order to reach this, the
teachers have to provide the students with a learning environment in which this construction process can
emerge.
xxiv
Question 5: Write in the answer 1 – 1/4= ___ (Answer). Question 18: A cake is cut into four equal parts and
Bill takes one of the parts. What fraction of the cake is left?
xxv
The context problems function only as a field of application. By solving context problems the students can
apply what was learned earlier in the bare format. In RME this is different. Here, context problems function also
as a source for the learning process. In other words, in RME, context problems and real life situations are used
both to constitute and to apply mathematical concepts.
xxvi
En general, la resolución de un problema de contexto real, realista o fantasista, necesita La matematización
de La situación dada, es decir, su traducción en lenguaje matemático, Ya que se trata de un problema, El
proceso de matematización en cuestión debe exigir una cierta búsqueda de parte del estudiante que resuelve el
problema. Si este puede matematizar la situación de manera casi automática y sin esfuerzo, entonces no se trata
de un problema de contexto, sino más bien de un ejercicio de matematización.
xxvii
If the students experience the process of reinventing mathematics as expanding common sense, then they will
experience no dichotomy between everyday life experience and mathematics. Both will bepart of the same reality
(GRAVEMEIJER; DOORMAN, 1999, p. 127).
xxviii
- The cross section of a wine glass has got the shape of (part of) the following sinusoïd: y = 3sin(x + ½) +
3. Determine the volume of this glass.
xxix
- Rain is falling in an angle of 48 degrees because of the wind. Next to the building, a dry patch is found,
width two meters. Using this information, calculate the height of the building.
xxx
For a parent‘s evening at school 150 parents are expected. At each table four chairs can be placed. How many
tables are needed? Show how you found your answer.
xxxi
The problem is really different from: Compute 150 ÷ 4 =
xxxii
A ladder, length three meters, is placed against the wall, one meter from the bottom of the wall. Up to which
height on the wall does the ladder reach?
xxxiii
Here you see a bus problem.
1. Use arrows for this problem.
Answer:
+4
3 7
2. Now make your own problem.
xxxiv
– The growth factor of a bacterium type is 6 (per time unit). At the moment there are 4 bacteria. Calculate
the point in time when there will be 100 bacteria. – The interest percentage for a year is eight per cent. $4000 is
deposited at 0 time. At what point in time will this amount have increased to $5000. – Bill weighed 107 pounds
last summer. He lost 4 pounds, and then he gained 11 pounds. How much does he weigh now?
xxxv
Which of these would be a fairly good estimate for the width of a classroom?
Which of these is the best estimate for the length of a teacher‘s desk?
xxxvi
A variety of contexts is needed, as well as a range of roles for the contexts. The variety is needed to minimize
the chance of featuring issues and phenomena that are not culturally relevant. The range of roles for the contexts
needs further elaboration because of the effects on what we are measuring relates to this role.
xxxvii
Find the result of 4 x 2+ 6 x 3.
xxxviii
Maria bought a hamburger for $.90 and a coke for $.30. If the local sales tax is 5%, how, much change
should she receive if she gives the clerk $2.00?
xxxix
Six matches must be assembled to form four congruent equilateral triangles each side of which is equal to
the length of the matches.
xl
Prove that the formula:
xli
Hans‘ wife is dying. A pharmacist has discovered a medicine that would cure her illness, but sells it at a price
for any pair of natural numbers n and m gives all the integral solutions of
121
that Hans cannot afford. Should Hans steal the medicine?
xlii
You are in your late thirties, your children are well into school, you husband is establishing a name for
himself in his profession and you are bored.
xliii
Consider the following Pythagorean triplets.
xliv
Personal – Problems classified in the personal context category focus on activities of one‘s self, one‘s family
or one‘s peer group. The kinds of contexts that may be considered personal include (but are not limited to) those
involving food preparation, shopping, games, personal health personal transportation, sports, travel, and
personal scheduling and personal finance
xlv
Under personal life we include, depending on age, games, daily scheduling, sports, shopping, saving,
interpersonal relations, finances, voting, reading maps, reading tables, health, insurance, and so on.
xlvi
Societal – Problems classified in the societal context category focus on one‘s community (whether local,
national or global). They may involve (but are not limited to) such things as voting systems, public transport,
government, public policies, demographics, advertising, national statistics and economics. Although individuals
are involved in all of these things in a personal way, in the societal context category the focus of problems is on
the community perspective.
xlvii
In the local community, we see the intelligent citizen making appropriate judgments, making decisions,
evaluating conclusions, gathering data and making inferences, and in general adopting a critical attitude —
seeing the reasoning behind decisions.
xlviii
Occupational – Problems classified in the occupational context category are centred on the world of work.
Items categorised as occupational may involve (but are not limited to) such things as measuring, costing and
ordering materials for building, payroll/accounting, quality control, scheduling/inventory, design/architecture,
and job-related decision making. Occupational contexts may relate to any level of the workforce, from unskilled
work to the highest levels of professional work, although items in the PISA survey must be accessible to 15-yearold students.
xlix
Work and leisure involves reasoning, understanding data and statistics, finances, taxes, risks, rates, samples,
scheduling, geometric patterns, two- and three-dimensional representations, budgets, visualizations, and so on.
l
School life relates to understanding the role of mathematics in society, school events (e.g., sports, teams,
scheduling), understanding data, computers, and so on.
li
Scientific – Problems classified in the scientific category relate to the application of mathematics to the natural
world and issues and topics related to science and technology. Particular contexts might include (but are not
limited to) such areas as weather or climate, ecology, medicine, space science, genetics, measurement, and the
world of mathematics itself.
lii
To function as an intelligent citizen, individuals need to be literate in many fields, not only in mathematics. The
use of scientific situations or contexts in mathematics classes should not be avoided per se, but some care must
be taken. If we try to teach students the right competencies but use the wrong context, we are creating a problem,
not solving it.
liii
They are, rather, routine exercises organized to provide practice on a particular mathematical technique that,
typically, has just been demonstrated to the student.
liv
Problems with vague and unclear goals. Solution strategies least constrained.
lv
• Often more than one acceptable solution strategy. • Convergent (one right answer). • Needed information
often must be gathered.
lvi
- Solution strategy is usually predictable • Convergent (one right answer) • All starting information is usually
part of the problem statement.
lvii
• Solution is not well defined or predictable. Multiple perspectives, goals, and solutions. • There is no single
well-defined and agreed-upon solution; there may not be a fully satisfactory solution at all. • Needed information
often must be gathered.
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PAMELA EMANUELI ALVES FERREIRA ENUNCIADOS DE