PAMELA EMANUELI ALVES FERREIRA ENUNCIADOS DE TAREFAS DE MATEMÁTICA: UM ESTUDO SOB A PERSPECTIVA DA EDUCAÇÃO MATEMÁTICA REALÍSTICA Londrina 2013 PAMELA EMANUELI ALVES FERREIRA ENUNCIADOS DE TAREFAS DE MATEMÁTICA: UM ESTUDO SOB A PERSPECTIVA DA EDUCAÇÃO MATEMÁTICA REALÍSTICA Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências e Educação Matemática da Universidade Estadual de Londrina como requisito parcial à obtenção do título de Doutora. Orientadora: Profa. Dra. Regina Luzia Corio de Buriasco. Londrina 2013 Com carinho, ao GEPEMA... AGRADECIMENTOS Um jogo não se faz só, não se joga sozinho. A paixão de um jogador nasce em grande parte do brilho dos olhos daqueles que o acompanham, que torcem, especulam, criticam. Eu, como aventureira jogadora, expresso aqui meus sentimentos de gratidão a todos que participaram de formas diversas desta e de outras muitas partidas que joguei no decorrer desses anos. Àquela que administrou, norteou, aconselhou os caminhos, as jogadas, a grande técnica, minha orientadora. Às queridas árbitras, membros desta banca, que mediaram com tanto carinho, atenção e dedicação as regras necessárias à boa conduta desta partida. Ao time, que deu suporte necessário, justo e preciso nos momentos difíceis, mas que, também, fora do cenário revelaram grandes sentimentos de amizade, cumplicidade, de carinho, união, felicidade. Aos amigos e familiares que sempre, ou quase sempre, estiveram presentes na plateia, acompanhando, torcendo, vibrando, mesmo sem entender muito as regras do jogo, mas torcendo simplesmente pela paixão e carinho devotado a esta jogadora. À patrocinadora desta partida, CAPES, pela bolsa concedida. Em especial, ao grande dono da casa dos jogos, senhor de tudo. Tenho a impressão de ter sido uma criança brincando à beira-mar, divertindo-me em descobrir uma pedrinha mais lisa ou uma concha mais bonita que as outras, enquanto o imenso oceano da verdade continua misterioso diante de meus olhos (Isaac Newton). FERREIRA, Pamela Emanueli Alves. Enunciados de Tarefas de Matemática: um estudo sob a perspectiva da Educação Matemática Realística. 2013. 121f. Tese (Programa de PósGraduação em Ensino de Ciências e Educação Matemática) – Universidade Estadual de Londrina, Londrina, 2013. RESUMO Esta pesquisa tem como objetivo apresentar um estudo a respeito de enunciados de tarefas de matemática. Busca-se elaborar um quadro de referência com base na perspectiva da Educação Matemática Realística que permita analisar tarefas de matemática. Com uma abordagem predominantemente qualitativa, de cunho interpretativo, com base na Análise de Conteúdo, é realizada uma análise de enunciados de tarefas de matemática de um livro didático no que diz respeito às suas classificações, características, potencialidades e constituição, mais especificamente, como o contexto se classifica, se a tarefa é rotineira ou não, a que tipo de situação e item remete, se oportuniza matematização, se a tarefa é flexível e permite diferentes estratégias de resolução, que tipo de competências promove, se é caracterizada como exercício, problema. Uma intenção subjacente é que este trabalho sirva como um recurso para professores que ensinam matemática, na busca de conhecer tarefas de matemática, no sentido de analisar suas potencialidades e limitações, e utilizá-las em um ambiente de avaliação como prática de investigação. Palavras-chave: Educação Matemática. Educação Matemática Realística. Enunciados de tarefas de matemática. Contexto. Avaliação como prática de investigação. FERREIRA, Pamela Emanueli Alves. Math Tasks Instructions: a study under the Realistic Mathematics Education perspective. 2013. 121f. Thesis (Sciences and Mathematics Education Post-Graduate Program) – Universidade Estadual de Londrina, Londrina, 2013. ABSTRACT The objective of this research was to present a study on Math tasks instructions. It tries to create a reference table based on the Realistic Mathematics Education perspective, which allows the analysis of Math tasks. By adopting a predominantly qualitative, interpretative approach, based on Content Analysis, Math tasks found in a textbook were analyzed regarding their classification, characteristics, potentialities and constitution. More specifically, it looked into how the context is classified, whether the task is carried out routinely or not, what type of situation it refers to, whether it promotes mathematization processes, flexibility, different resolution strategies, types of competence, and whether it is characterized as an exercise or problem. An underlying intention of this research is to work as a resource for Math teachers, helping them understand Math tasks, analyze their potentials and limitations and use them in the context of assessment as an investigative practice. Key words: Mathematics Education. Realistic Mathematics Education. Mathematics tasks instructions. Context. Assessment as an investigative practice. LISTA DE ILUSTRAÇÕES Figura 1 – Exemplo de uma tarefa não-rotineira. ..................................................................... 54 Figura 2 – Pirâmide de Avaliação proposta por De Lange (1999, tradução nossa). ................. 61 Figura 3 – Esquema representativo das relações criadas com a literatura estudada................. 65 Figura 4 – Tarefa classificada como Problema de contexto realista (T11). ............................. 74 Figura 5 – Tarefa classificada como Problema de contexto puramente matemático (T06). .... 75 Figura 6 – Tarefa classificada como Problema de contexto puramente matemático e de primeira ordem (T08). .............................................................................................................. 76 Figura 7 – Tarefa classificada como Problema de contexto puramente matemático e de segunda ordem (T25). ............................................................................................................... 77 Figura 8 – Tarefa classificada como Problema de contexto realista e de ordem zero (T16). ... 77 Figura 9 – Tarefa classificada como Problema de contexto realista e de primeira ordem (T27). .................................................................................................................................................. 78 Figura 10 – Tarefa classificada como Problema de contexto realista e de segunda ordem (T22). ........................................................................................................................................ 78 Figura 11 – Tarefa classificada como Problema de contexto puramente matemático e sem ordem alguma e Problema Enigma (T12). ............................................................................... 80 Figura 12 – Tarefa classificada como Problema de contexto realista e Problema de Palavra (T43). ........................................................................................................................................ 80 Figura 13 – Tarefa classificada como Exercício de Reconhecimento (T26)............................. 81 Figura 14 – Esquema representativo das relações criadas com a literatura estudada após a análise. ...................................................................................................................................... 86 Figura 15 – Esquema representativo das relações criadas a partir do conjunto das tarefas analisadas. ................................................................................................................................. 87 Figura 16 – Esquema representativo do agrupamento construído em 4.3. ............................... 88 Figura 17 – Tarefa T05. ............................................................................................................ 89 Figura 18 – Tarefa T26. ............................................................................................................ 91 Figura 19 – Tarefa T13. ............................................................................................................ 92 Figura 20 – Tarefa T08. ............................................................................................................ 94 Figura 21 – Tarefa T25. ............................................................................................................ 95 Figura 22 – Tarefa T16. ............................................................................................................ 97 Figura 23 – Tarefa T34. ............................................................................................................ 99 Figura 24 – Tarefa T22. .......................................................................................................... 100 Figura 25 – um meme da internet. .......................................................................................... 104 Figura 26 – outro meme da internet. ...................................................................................... 105 LISTA DE QUADROS Quadro 1 – Avaliação tradicional versus Avaliação como prática de investigação. ................. 19 Quadro 2 – Abordagens tradicionais segundo Van den Heuvel-Panhuizen (2010). ................. 29 Quadro 3 – Tipos de matematização na Instrução Matemática. ............................................... 36 Quadro 4 – Resumo dos Princípios da RME. ........................................................................... 37 Quadro 5 – Classificações de Tarefas segundo o contexto conforme Díaz e Poblete (2005). . 42 Quadro 6 – Classificações a respeito do uso de contexto segundo Dekker e Querelle (2002). 45 Quadro 7 – Classe de funcionalidade do contexto segundo De Lange (1995). ........................ 46 Quadro 8 – Agrupamento a respeito do tipo de contexto conforme Borasi (1986). ................. 48 Quadro 9 – Agrupamento a respeito do Tipo de Situação segundo o PISA (DE LANGE, 2003; INEE, 2005, OECD, 2010). ...................................................................................................... 49 Quadro 10 – Tarefas rotineiras e não-rotineiras. ...................................................................... 52 Quadro 11 – Classificação de Butts (1997). ............................................................................. 54 Quadro 12 – Classificação de Problemas – Borasi (1986). ...................................................... 56 Quadro 13 – Tipos de item (OECD, 2004b; OECD, 2004c; OECD, 2005). ............................ 56 Quadro 14 – Tipos de Problema segundo Kirkley (2003). ....................................................... 58 Quadro 15 – Relaciona quantidade de tarefas com o tipo de subseção apresentada no livro analisado. .................................................................................................................................. 70 Quadro 16 – Exemplo da codificação das tarefas..................................................................... 71 Quadro 17 – Classificação 1. .................................................................................................... 73 Quadro 18 – Classificação 2. .................................................................................................... 75 Quadro 19 – Classificação 3. .................................................................................................... 79 Quadro 20 – Classificação 4. .................................................................................................... 81 Quadro 21 – Classificação 5. .................................................................................................... 82 Quadro 22 – Classificação 6. .................................................................................................... 83 Quadro 23 – Construção dos grupos dos diferentes tipos de tarefas segundo as classificações realizadas em 4.1. ..................................................................................................................... 84 Quadro 24 – Resumo das classificações de T05. ...................................................................... 90 Quadro 25 – Resumo das classificações de T26. ...................................................................... 92 Quadro 26 – Resumo das classificações de T13. ...................................................................... 93 Quadro 27 – Resumo das classificações de T08. ...................................................................... 95 Quadro 28 – Resumo das classificações de T25. ...................................................................... 97 Quadro 29 – Resumo das classificações de T16. ...................................................................... 98 Quadro 30 – Resumo das classificações de T34. .................................................................... 100 Quadro 31 – Resumo das classificações de T22. .................................................................... 103 SUMÁRIO 1 COLOCANDO AS CARTAS NA MESA ........................................................................... 14 1.1 AVALIAÇÃO ESCOLAR COMO PRÁTICA DE INVESTIGAÇÃO ................................................ 16 1.2 A IMPORTÂNCIA DA ANÁLISE DA PRODUÇÃO ESCRITA PARA A AVALIAÇÃO COMO PRÁTICA DE INVESTIGAÇÃO .................................................................................................................. 20 2 ESTUDANDO AS POSSIBILIDADES DE JOGO ........................................................... 26 2.1 EDUCAÇÃO MATEMÁTICA REALÍSTICA – ALGUMAS CONSIDERAÇÕES .............................. 26 2.2 ENUNCIADOS DE TAREFAS DE MATEMÁTICA .................................................................... 39 2.2.1 Os contextos e as classificações das tarefas ............................................................. 39 2.2.2 Caracterizações dos tipos de tarefas ......................................................................... 51 2.2.3 A respeito das características das tarefas .................................................................. 59 2.2.4 Constituindo uma tarefa ........................................................................................... 62 2.2.5 A respeito de uma sua caracterização ....................................................................... 64 3 ESCLARECENDO AS REGRAS ...................................................................................... 67 3.1 OBJETIVO GERAL ............................................................................................................. 67 3.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS .................................................................................................. 67 3.3 AMBIENTE DE ESTUDO ...................................................................................................... 68 3.4 PROCEDIMENTOS DE ANÁLISE........................................................................................... 69 4 JOGANDO ........................................................................................................................... 73 4.1 DO CONTEXTO DAS TAREFAS ............................................................................................ 73 4.1.1 Classificação das tarefas a partir da leitura interpretativa feita a partir do texto de Díaz e Poblete ................................................................................................................... 73 4.1.2 Classificação das tarefas a partir da leitura interpretativa feita a partir do texto de De Lange (1987) ............................................................................................................... 75 4.1.3 Classificação das tarefas a partir da leitura interpretativa feita a partir do texto de Borasi (1986) ..................................................................................................................... 79 4.1.4 Classificação das tarefas a partir da leitura interpretativa feita a partir do texto de Butts (1987). ...................................................................................................................... 80 4.2 DAS CARACTERIZAÇÕES SEGUNDO TIPO DE SITUAÇÃO E TIPO DE ITEM ........................... 82 4.3 DOS AGRUPAMENTOS FORMADOS A PARTIR DAS PRIMEIRAS ANÁLISES (4.1)...................... 84 4.4 ANALISANDO TAREFAS INDIVIDUALMENTE (SUA CONSTITUIÇÃO) .................................... 88 4.4.1 Tarefa do GRUPO A – T05. ..................................................................................... 89 4.4.2 Tarefa do GRUPO B – T26 ...................................................................................... 91 4.4.3 Tarefa do GRUPO C – T13 ...................................................................................... 92 4.4.4 Tarefa do GRUPO D – T08 ...................................................................................... 93 4.4.6 Tarefa do GRUPO F – T16....................................................................................... 97 4.4.7 Tarefa do GRUPO G – T34 ...................................................................................... 99 4.4.8 Tarefa do GRUPO H – T22 .................................................................................... 100 5 DISCUTINDO AS JOGADAS.......................................................................................... 104 6 UM JOGO QUE NÃO SE ENCERRA ............................................................................ 110 REFERÊNCIAS ................................................................................................................... 112 14 1 COLOCANDO AS CARTAS NA MESA Pelo fato de a prova escrita ser um dos instrumentos mais utilizados na avaliação escolar, o GEPEMA1 tem dedicado seus estudos à busca de conhecer como estudantes de diferentes níveis de escolaridade e professores que ensinam matemática lidam2 com questões de matemática em circunstância de prova. No âmbito do GEPEMA foram produzidas, entre os anos de 2003 e 2007, oito dissertações referentes à análise da produção escrita presente em questões consideradas rotineiras de matemática da prova da AVA-20023. Na época (2005-2006), esta autora participou do projeto atuando como bolsista em iniciação científica, estudando uma das seis questões aplicadas pela AVA-2002. Na busca de conhecer como os estudantes, professores lidam com questões não-rotineiras de matemática, a partir de 2006, iniciou-se um estudo a respeito da produção escrita de alunos, professores e estudantes de licenciatura em Matemática em questões de matemática da prova do PISA4 (Programa Internacional de Avaliação de Estudantes) que foram selecionadas para esses estudos pelo fato de serem consideradas não-rotineiras e já validadas, pois fizeram parte de uma avaliação já realizada. Desse estudo, resultaram seis dissertações, dentre as quais, uma delas é desta autora. Para a análise da produção escrita em questões não-rotineiras de matemática do PISA, o GEPEMA se dedicou a estudar documentos do PISA (OECD, 2003, 2004a, 2004b, 2004c, 2005, 2006, 2008, 2010) e, também, a conhecer a perspectiva da Educação Matemática Realística (RME5) que fundamentava em grande parte esses documentos. Até então, pesquisas geradas pelo GEPEMA tiveram como objeto de estudo a avaliação como prática de investigação e a análise da produção escrita, e, como meta, conhecer as formas pelas quais alunos e professores lidavam com as tarefas propostas. Na busca de avançar o estudo no que diz respeito à compreensão das formas 1 GEPEMA – Grupo de Estudos e Pesquisa em Educação Matemática e Avaliação, da Universidade Estadual de Londrina. Outras informações em: http://www.uel.br/grupo-estudo/gepema/index.html. 2 Lidar – Entendido como as maneiras pelas quais os sujeitos interpretam o enunciado, elaboram estratégias e utilizam procedimentos para resolver uma questão, que, em muitos casos, são resultantes de processos sistemáticos, tanto sintáticos como semânticos, os quais eles próprios constroem (VIOLA DOS SANTOS, 2007). 3 Sistema de Avaliação de Rendimento Escolar da Rede Estadual do Paraná. 4 Maiores informações a respeito do PISA podem ser encontradas no site: http://portal.inep.gov.br/pisaprograma-internacional-de-avaliacao-de-alunos. 5 RME – Realistic Mathematics Education (Educação Matemática Realística). 15 como os alunos lidam com tarefas6 de matemática, nesta pesquisa decidimos tomar como objeto de estudo, enunciados de tarefas de matemática de um livro didático7, com a intenção de conhecê-las em suas classificações, características8, potencialidades9, constituição10. Considerando, também, que a avaliação da aprendizagem escolar conduzida pelo professor é, supostamente, coerente com o trabalho didático, uma vez que é parte do processo e não uma sua interrupção, supõe-se que as tarefas de avaliação são, quase sempre, semelhantes às tarefas dos livros didáticos. Estudos indicam que um dos recursos mais utilizados pelo professor na orientação de sua prática pedagógica é o livro didático (OLIVEIRA, 2008; COSTA; ALLEVATO, 2010; ANDRADE; OLIVEIRA, 2011). Andrade e Oliveira (2011) afirmam que os textos didáticos exercem um papel de destaque nas salas de aula e que “chega-se a defender que esses textos ditam o ritmo das salas de aula, determinam o que e como se ensina” (2011, p. 1). Estudos realizados no interior do GHOEM11 (Grupo História Oral e Educação Matemática) têm apresentado uma linha de estudos que se pauta na análise de livros/textos/manuais didáticos de matemática, buscando referenciais teóricos para nortear e desenvolver suas pesquisas. Neste trabalho busca-se apresentar um quadro de referência para a leitura de enunciados de tarefas matemáticas, no sentido de conhecer suas características. Essa é apenas uma parte da avaliação como prática de investigação, dada a necessidade de conhecer, elaborar, escolher, instrumentos e tarefas que serão fonte para uma coleta de informações mais próximas do modo como os alunos pensam. Neste sentido, esta pesquisa procura apresentar uma proposta de análise de enunciados de tarefas de matemática escolar. Esse estudo pode servir à análise da produção escrita como ferramenta para ser utilizada na avaliação como prática de investigação. Tomando como objeto de estudo tarefas de um livro didático, pretendemos 6 A palavra “tarefa” é aqui utilizada como semelhante ao significado de “questão”, “enunciado de uma questão de matemática”, diferente do que comumente remete “ao dever de casa”. Ao longo do texto tentaremos explicitar melhor. 7 Não temos a intenção de analisar o livro didático, e sim tarefas provenientes dele. 8 Características: implica em analisar se a tarefa é flexível, acessível aos estudantes, se pode ser resolvida em diferentes níveis de escolaridade. 9 Potencialidades: implica em analisar se a tarefa dá margem para matematização, se oportuniza aprendizagem. 10 Constituição: implica em analisar se a tarefa é apresentada por elementos textuais, gráficos, se possui uma pergunta, um contexto. 11 Outras informações a respeito do grupo e suas publicações estão disponíveis em: <http://www.ghoem.com/>. Acesso em: 15 out. 2012. 16 elaborar um quadro de referência com base na perspectiva da Educação Matemática Realística que permita analisar as tarefas de matemática selecionadas; analisar suas potencialidades e limitações; construir um panorama da classificação destas tarefas; confrontar a potencialidade destas tarefas com a oportunidade de aprendizagem que deriva delas; e com isso apresentar uma possibilidade para identificar potencialidades dessas tarefas para a aprendizagem e para a avaliação, na perspectiva da RME. Para o estudo selecionamos autores que tratam de características de problemas de matemática, de características de problemas de avaliação, dos contextos envolvidos nos enunciados de tarefas de matemática. Grande parte deste referencial é constituída por pesquisas realizadas na perspectiva da Educação Matemática Realística (RME), a qual tem sido objeto de estudo de membros do GEPEMA e, portanto, será utilizada como “pano de fundo” desta pesquisa. Por se tratar de uma pesquisa que tem como uma de suas metas buscar conhecimento a respeito da avaliação escolar, são apresentadas duas subseções (seguintes) a respeito da perspectiva de avaliação escolar adotada pela pesquisadora, bem como do grupo de pesquisa do qual faz parte: o GEPEMA. Tomando a avaliação escolar como uma prática de investigação, busca-se, no GEPEMA, oferecer uma possibilidade de o professor incluir em sua avaliação uma análise das tarefas que irão compor os instrumentos de avaliação na perspectiva de propiciar um ambiente favorável à construção de conhecimento dos estudantes. 1.1 AVALIAÇÃO ESCOLAR COMO PRÁTICA DE INVESTIGAÇÃO Estudos já desenvolvidos no GEPEMA e dedicados à avaliação da aprendizagem (tais como PEREGO, 2005; CURY, 1988, 2006; DALTO, 2007; FERREIRA, 2009; BURIASCO; FERREIRA; CIANI, 2009) têm dado indícios de que uma das maiores dificuldades dos estudantes ao lidar com questões de matemática é relativa à interpretação dos enunciados das questões. Com isso, de certa forma barrados na leitura da tarefa proposta, muitos estudantes apresentam dificuldades para mostrarem o que sabem a partir de suas resoluções. Uma das razões dessas dificuldades é a de que, apesar de documentos curriculares 17 (BRASIL, 1998, 2010a; PARANÁ, 2008; NCTM, 2000) pregarem perspectivas de ensino voltadas para a contextualização, o “ensino de matemática” ainda carrega muitas marcas de uma tradição alinhada à apropriação de regras e algoritmos, consolidada por uma perspectiva tecnicista, fruto da herança cultural do Movimento da Matemática Moderna, a qual vai de encontro, entrando em choque, com as perspectivas do movimento da Educação Matemática. A avaliação escolar, seja de rendimento ou de aprendizagem, é um sistema complexo que envolve diversas variáveis, objetivos, intenções, e, respeitada sua complexidade, é necessário conhecimento sobre o que ela é, para quê e como é realizada, sob quais perspectivas, regida sob quais concepções, para bem compreender seus resultados e gerar intervenção. Tomamos a avaliação como um processo, entendida como uma “ação continuada”, de “realização contínua e prolongada” (HOUAISS, 2009, CD-ROM). Em conformidade com essa forma de pensar a avaliação, estamos tomando-a como uma prática de investigação, um processo de buscar conhecer ou, pelo menos, obter esclarecimentos, informes sobre o desconhecido por meio de um conjunto de ações previamente projetadas e/ou planejadas que procura seguir os rastros, os vestígios, esquadrinhar, seguir a pista do que é observável, conhecido (FERREIRA, 2009, p. 21). A avaliação como prática de investigação (BURIASCO; FERREIRA; CIANI, 2009), entendida como um processo pode favorecer tomadas de decisão, gerar oportunidade para intervenção e aprendizagem. Por ter objetivo pedagógico, se caracteriza no campo da avaliação formativa (BARLOW, 2006). Basicamente, a avaliação formativa pode ser entendida como um conjunto de ações desenvolvidas por professores e alunos que produzem informações para intervir e contribuir nos processos de ensino e aprendizagem (HADJI, 1994; BLACK; WILLIAN, 1998; PERRENOUD, 1998; BARLOW, 2006; MORGAN, 2008; MORENO, 2008; SANTOS, 2008). Apesar de a expressão avaliação como prática de investigação não ser muito presente na literatura, reconhecemos características desta perspectiva em alguns trabalhos, tais como: “avaliação reguladora” (ALLAL, 1986); “avaliação didática” (VAN DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 1996); “observação formativa” (PERRENOUD, 1998); “avaliação para a aprendizagem” (BLACK et al, 2003); “avaliação autêntica” (MORGAN, 2003); “avaliação formativa alternativa” (FERNANDES, 2005); “ato de comunicação” (BARLOW, 2006), que estão alinhadas com a caracterização de avaliação como prática de investigação. 18 Uma avaliação como prática de investigação busca confrontar a prática tradicional de avaliação por ser realizada frequentemente, de modo a buscar indícios a respeito das dificuldades dos estudantes, de como se encontram no processo de uma dada aprendizagem. Segundo Van den Heuvel-Panhuizen (1996), a avaliação escolar não tem sentido de ser se não for para promover a aprendizagem. De acordo com Van den HeuvelPanhuizen (1996), a avaliação deve fornecer informações, pistas a respeito dos processos do pensamento dos estudantes, para além dos resultados. Portanto, a função “didática” da avaliação é a de maior escopo, pois visa integrar os processos de avaliação, ensino e aprendizagem e fornecer meios para regulação (VAN DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 1996). Assumir a avaliação como prática de investigação pode ajudar a superar o mito da “medida de conhecimento”, pelo fato de que a avaliação nesta perspectiva não se restringe apenas aos produtos gerados pelos estudantes, valorando-os, mas possibilita tomadas de decisão, reorientação do processo do qual participam não apenas os alunos, mas também professores, a comunidade, em um processo que é dependente do ambiente, dos materiais didáticos, das condições físicas ambientais em que ocorre. O fato de as produções dos estudantes, nessa perspectiva de avaliação, não serem finalísticas (terem fim em si mesmas) pode favorecer um ambiente no qual o aluno tem liberdade para se expressar de forma responsável, assumindo suas resoluções como de sua responsabilidade, o que pode gerar autonomia, fazendo-o assumir confiança em suas respostas, arriscar, argumentar, refletir, dizer o que pensa para além do que acha que o professor deseja saber. Busca-se assim o desenvolvimento de uma atitude autônoma de pensamento, valorizando a multiplicidade e originalidade das ações. Ao fazer da avaliação da aprendizagem uma prática de investigação, o professor tem o “dever de informar o aluno sobre a qualidade de seus trabalhos e de lhe proporcionar os meios de otimizá-los” (BARLOW, 2006, p. 73). Nesta perspectiva, a função de avaliador é complementada pela função de professor, de modo que a avaliação não termina com o estabelecimento de uma nota. Da mesma forma que a avaliação está mergulhada no processo de aprendizagem não sendo possível dissociá-los (os processos de avaliação e aprendizagem), ao se tratar da aprendizagem escolar, não deveria ser possível dissociar as funções de professor e de avaliador. Além disso, a função de avaliar não precisa ser apenas da responsabilidade do professor. É importante, também, que os alunos sintam-se responsáveis e tenham autonomia para avaliar suas tarefas e desenvolver um espírito autocrítico. Até porque “não se pode afirmar que ele (o professor) seja sempre a pessoa mais indicada para engrenar 19 esse trabalho de diagnóstico e solução”, pois há casos em que a coavaliação e autoavaliação podem ser mais eficazes para regular a aprendizagem (BARLOW, 2006, p. 73). A seguir, apresentamos um quadro12 com algumas características da avaliação como prática de investigação em contraste com a avaliação classificatória, tradicionalmente utilizada, pois, apesar de haver esforços de educadores matemáticos para superá-la, ainda é possível reconhecer suas marcas nas práticas de sala de aula. Quadro 1 – Avaliação tradicional versus Avaliação como prática de investigação. Avaliação tradicional/ classificação A avaliação como processo de classificação está limitada por ter em sua raiz a homogeneidade (ESTEBAN, 2003). É considerada como uma componente que pertence13 ao processo educativo. Valoriza a função classificatória. Limita-se à observação. Respostas predeterminadas (ESTEBAN, 2003). Valoriza respostas objetivas. Limita-se ao que é diretamente observável. Recolhe informações e classifica-as/ qualifica-as/ quantifica-as. 12 Avaliação como prática de investigação Configura-se em uma perspectiva de heterogeneidade, abrindo espaço para que o múltiplo e o desconhecido ganhem visibilidade (ESTEBAN, 2003). É considerada como prática necessária e indissociável do processo educativo. “A avaliação é vista como um componente integral do processo de ensino e aprendizagem, no qual o professor tenta adquirir um quadro mais completo do aluno quanto possível, por meio de todos os tipos de estratégias de avaliação informali”14 (VAN DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 1996, p. 101, tradução nossa). Preocupa-se com a função reguladora. Requer intervenção. Respostas em constante construção, desconstrução e reconstrução, que passam a configurar o início de novos questionamentos, sejam elas certas ou erradas (ESTEBAN, 2003). De acordo com Santos (2003a, p. 1), a avaliação “não se restringe a uma recolha de informação, mas incluindo-a, pressupõe igualmente uma interpretação desses mesmos dados, uma acção orientada por essa interpretação e assim uma produção de valores”. Segundo Van den Heuvel-Panhuizen (1996), uma avaliação que conta apenas com respostas certas ou erradas contribui pouco para instrução posterior. Interroga o caráter subjetivo das respostas. Investiga o não observável para além do observável. Recolhe informações e as interpreta. Quadro construído com base em (HADJI, 1994; VAN DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 1996; ESTEBAN, 2002, 2003; BURIASCO, 1999, 2004, 2008; BARLOW, 2006; SANTOS, L., 2003a, 2008; BURIASCO, FERREIRA, CIANI, 2009). 13 O “pertence” é no sentido de “uma parte de”, como se fosse possível separá-la (a avaliação) do processo todo. 14 As notas em números romanos servem para apresentar ao leitor os trechos originais dos textos citados, livres de tradução. Se encontram nas páginas finais desta tese. 20 As diferenças entre alunos são assumidas como peculiaridades que devem ser trabalhadas e incorporadas pelo movimento coletivo (ESTEBAN, 2003). As diferenças entre alunos deixam de ser compreendidas como deficiências que precisam ser corrigidas (ESTEBAN, 2003). A defesa da ideia de avaliação como prática de investigação, que auxilie tanto professores quanto estudantes, subsidia-se na crença de que ela pode contribuir para uma prática escolar menos excludente, que não silencie as pessoas, mas valorize e aceite as diferenças, na busca de contribuir para que os processos de ensino e aprendizagem se distanciem cada vez mais do que hoje é chamado fracasso escolar (BURIASCO, 2008, p. 32). Fortalece a prática da memorização, decoreba, reprodução. Fortalece a reflexão e o diálogo. O erro é visto como obstáculo, indício do “não saber”, de “falta”. Limita-se a indicar o que ainda não se sabe (ESTEBAN, 2002). Qualquer instrumento de avaliação pode servir para quantificar. Encoraja aprendizagens superficiais, momentâneas. Fonte: autora. O erro passa a representar um indício, entre muitos outros, do processo de construção de conhecimentos. O erro aporta aspectos significativos para o processo de investigação ao sinalizar que a criança está seguindo trajetos diferentes (originais, criativos, novos, impossíveis?) dos propostos e esperados pelo professor (ESTEBAN, 2003). Torna o que ainda não se sabe em indício da necessidade e da possibilidade de ampliação do conhecimento já consolidado (ESTEBAN, 2002). Nesta perspectiva, além de ser necessária uma diversidade de instrumentos, a utilização de cada instrumento exige um conhecimento relevante sobre suas vantagens e deve servir para a “extração” quanto mais possível de informações. Encoraja aprendizagem reflexiva e processual. É possível colocar a avaliação a favor da investigação em diferentes momentos, situações, ambientes. A análise da produção escrita de alunos é considerada como um dos recursos para que a avaliação escolar seja entendida como prática de investigação. Para que as produções escritas sejam passíveis de análise, as tarefas propostas devem valorizar a resolução de problemas, a investigação, a escrita matemática, a reflexão, o pensamento crítico. 1.2 A IMPORTÂNCIA DA ANÁLISE DA PRODUÇÃO ESCRITA PARA A AVALIAÇÃO COMO PRÁTICA DE INVESTIGAÇÃO Dentre todas as formas possíveis de comunicação em sala de aula, na disciplina de matemática, a escrita parece ser a forma mais comum, se constituindo, quase 21 sempre, como principal recurso que os professores utilizam para que os alunos expressem o que sabem. Ao lidar com uma situação matemática, o registro não é apenas importante, mas necessário, dependendo da complexidade da situação, das variáveis envolvidas, dos objetivos traçados pelo professor. Necessário, como meio de organização e manutenção das ideias desenvolvidas, e importante, para veicular e comunicar uma solução, uma forma de pensamento, uma maneira de lidar. Em uma circunstância de avaliação em que se objetiva analisar a “transposição” de pensamento matemático em linguagem escrita, há de se considerar alguns fatores como: que tipo de mensagem deve ser produzida, que itens devem ser relevantes de exposição, que habilidades são requeridas do produtor de informação, quão claro e/ou objetivo deve ser o texto proposto de modo que seja possível avaliar o que se deseja. Davison e Pearce (1988) alegam que uma das maneiras de os estudantes adquirirem nova informação é por meio da transformação de ideias em linguagem. De acordo com os autores, “a execução de uma tarefa escrita exige que os alunos reflitam a respeito de, analisem e sintetizem o material a ser estudado de uma forma cuidadosa e precisaii” (DAVISON; PEARCE, 1988, p. 42, tradução nossa). Além da finalidade comunicativa, educadores têm argumentado que a escrita15 é importante para promover aprendizagem (write to learn) (EMIG, 1977; JOHNSON, 1983; STEMPIEN; BORASI, 1985; BELL; BELL, 1985; DAVISON; PEARCE, 1988; BORASI; ROSE, 1989; VAN DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 1996; ISHII, 2003). A ESCRITA representa um modo único de aprendizagem não apenas valioso, não apenas especial, mas único. Esse será o meu argumento neste trabalho. A tese é simples. A escrita está a serviço da aprendizagem unicamente, porque como processo e produto possui um conjunto de atributos que correspondem unicamente a certas poderosas estratégias de aprendizagem (EMIG, 1977, p. 22, tradução nossa)iii. Assim, mais do que ler, que consiste na decodificação de sinais [pistas] de linguagem, e falar que é transitório e não permite revisão, a escrita - uma atividade de codificação - fornece os contextos que incentivam aprender e pensar (BELL; BELL, 1985, p. 214, tradução nossa)iv. Não só a oportunidade para praticar a escrita melhora a capacidade de um estudante na expressão escrita, mas a utilização da escrita para a prática de tarefas matemáticas também auxilia os alunos a compreender conceitos de matemática e melhorar a sua capacidade de se comunicar matematicamente (DAVISON; PEARCE, 1988, p. 45, tradução nossa)v. 15 Escrita entendida como a ação “de escrever” e “refletir”. 22 No entanto, sugerimos que o uso da escrita para aprender pode fornecer um meio valioso para facilitar uma abordagem personalizada e que faz sentido [dá significado; making-of-meaning] para a aprendizagem da matemática (BORASI; ROSE, 1989, p. 347, tradução nossa, grifo das autoras)vi. Segundo Johnson (1983), a escrita nas aulas de matemática, além de ser um valioso objeto de investigação para o professor, pode contribuir para a aprendizagem por propiciar aos estudantes, pensar e organizar seus pensamentos antes de escrever; atribuir significado aos conceitos estudados; desenvolver por meio da experiência a habilidade para expressar seus pensamentos; pensar criativamente. Em estudo realizado, Borasi e Rose (1989) destacam alguns benefícios da escrita para a aprendizagem e argumentam a respeito de como e por que esta prática deve ser incorporada nas aulas de matemática. Nesse estudo, 29 estudantes foram convidados a manter uma espécie de diário ao longo de um curso de matemática, no qual poderiam registrar com total liberdade qualquer pensamento relacionado à sua aprendizagem, tendo sido encorajados a incluir entradas, pensamentos pessoais, reflexões a respeito da matéria aprendida em sala de aula, reações às leituras e palestras realizadas, ou mesmo comentários relativos às tarefas específicas. Borasi e Rose (1989) concluíram que a escrita deste material teve um efeito terapêutico sobre os componentes emocionais da aprendizagem da matemática pelo fato de os estudantes expressarem e refletirem a respeito de seus sentimentos, sobre o curso, a matemática e a escolaridade; proporcionou maior acessibilidade aos conteúdos matemáticos. Por ser necessário escrever sobre um determinado conteúdo, os alunos necessitavam entendimento melhor e mais pessoal do assunto tratado, provocando, portanto, a investigação; apresentou uma melhoria na aprendizagem e habilidades para resolver problemas por resultar da articulação e reflexão a respeito do processo de fazer matemática. Bell e Bell (1985) apresentaram um estudo piloto, no qual estudantes de um grupo experimental, que deveriam escrever sobre seus modos de pensar em suas tarefas, apresentaram uma melhora estatisticamente significativa na resolução de problemas em 23 relação ao grupo de controle, que deveria apresentar apenas as soluções dos problemas. Os autores concluem que, apesar de ter sido “apenas um estudo piloto, há uma base para promover o uso da escrita como um processo de ensino e aprendizagem na apresentação de resolução de problemas matemáticos para os alunos”vii (BELL; BELL, 1985, p. 219, tradução nossa). Além disso, os autores argumentam que a escrita na resolução de problemas promove a comunicação, por dar oportunidade dos estudantes revelarem suas dificuldades de compreensão. Assim como na alfabetização o aprender a escrever dá suporte para aprender a ler, na matemática as tarefas escritas deveriam servir de apoio para que os estudantes aprendam a ler matematicamente. Parece que as tarefas matemáticas resumem-se quase sempre na leitura e interpretação de um enunciado de contexto matemático, ou mesmo que envolva outras informações não matemáticas, a resolução quase sempre é orientada para uma produção “puramente” matemática, com números, símbolos, algoritmos. A produção de texto em matemática é quase sempre suprimida, quando deveria ser estimulada por se tratar de uma ação que pode desenvolver a criatividade e o espírito interpretativo. De acordo com Borasi e Rose (1989) e Davison e Pearce (1988), tradicionalmente, a quantidade de escrita necessária em cursos de matemática tem sido mínima. Talvez seja pela falta de estímulo da escrita que os alunos tenham tanta dificuldade em traduzir contextos em linguagem matemática e utilizarem linguagem matemática em outros contextos. Para Johnson (1983), a escrita como uma ferramenta analítica é frequentemente utilizada nos cursos de literatura e ciências sociais, mas aos alunos “quase nunca” é dada a oportunidade de produzir escrita significativa nas aulas de matemática. O autor argumenta que professores de matemática precisam reconhecer que a escrita pode ser uma ferramenta valiosa de aprendizado e de avaliação e que “se os alunos podem escrever com clareza sobre os conceitos matemáticos, então é evidente que eles os entendem viii” (1983, p. 117, tradução nossa). No processo de “tradução do pensamento matemático em linguagem escrita” há algumas perdas, as quais tornam o trabalho (do professor) de leitura da produção escrita tão complexo quanto à ação de escrever (do aluno). A escrita é tão importante para a aprendizagem do aluno quanto, a leitura e análise das produções escritas são para o trabalho do professor em sua contínua formação e prática pedagógica. A análise da produção escrita é uma prática que serve à avaliação como prática de investigação e pode ser considerada tanto na formação do professor como em sua rotina letiva. 24 Ao incentivar os alunos a se explicarem em prosa clara e coerente, a exposição permite que eles se tornem mais conscientes de seus processos de pensamento e mais cônscios das escolhas que fazem ao realizar cálculos e análises envolvidos na resolução de problemas de matemáticaix (BELL; BELL, 1985, p. 220, tradução nossa). Com o intuito de introduzir a prática da escrita nos cursos de matemática, Johnson (1983) apresenta algumas alternativas: solicitar que os alunos reescrevam os problemas de contexto que não foram compreendidos. Isto os ajuda a identificar as palavras importantes do enunciado bem como suas relações; propor que os estudantes elaborem seus próprios problemas; solicitar que reescrevam os parágrafos difíceis de um texto estudado; convidar os alunos a explicar relações, discutir sentenças, dissertar sobre temas matemáticos. A respeito dos benefícios que a leitura das produções escritas dos estudantes pode causar, Borasi e Rose (1989) concluem a partir de sua pesquisa que, em relação às avaliações realizadas anteriormente com o mesmo grupo, houve uma melhoria na avaliação e uma remediação individual dos alunos; pode-se obter um feedback homogêneo a respeito dos aspectos do curso em si; um feedback imediato a respeito do desempenho do professor no decorrer do curso. Bell e Bell (1985) argumentam ainda que, se os estudantes esclarecem seus modos de lidar em suas produções escritas, o professor pode fornecer feedback imediato e individual respondendo com sugestões que podem tornar claros os processos desenvolvidos pelos alunos. Como em todo tipo de avaliação, para ser bem realizada, a análise da produção escrita deve contar com um planejamento bem delineado e contingenciado pelos objetivos do professor. O instrumento de recolha de dados deve estar em coerência com os objetivos traçados e possibilitar acesso à informação desejada. A análise da produção escrita associada a um bom instrumento de avaliação pode servir para detectar erros frequentes, recorrentes, dificuldades; simular formas de pensar, tipos de raciocínio; investigar causas de erros, obstáculos didáticos, obstáculos epistemológicos; investigar acertos casuais; produzir e emitir feedback; 25 dar suporte para a reelaboração do próprio instrumento de avaliação utilizado. A respeito das dificuldades de realizar a análise da produção escrita, Johnson (1983) destaca que não é de se esperar que a escrita dos estudantes seja similar à de um matemático profissional, e que o professor deve considerar/relevar alguns aspectos, dentre eles a dificuldade dos estudantes se expressarem. A análise da produção escrita é uma prática que cabe tanto ao professor quanto ao aluno. Propor tarefas nas quais os alunos possam também realizar a análise de suas produções escritas e a de seus pares pode ajudá-los no sentido de aperfeiçoar suas próprias produções ao considerarem a necessidade de tornar clara a mensagem emitida. Não existe um momento específico para realizar a análise da produção escrita. É uma prática que permeia praticamente todo o processo de avaliação de aprendizagem, desde a seleção/elaboração dos instrumentos de avaliação, das tarefas matemáticas que comporão as provas escritas, relatórios, trabalhos. Realizar uma previsão da produção que é almejada dos estudantes também é um trabalho que cabe à análise da produção escrita. Contudo, para que a informação desejada seja provocada, é necessário que o estudante se envolva em tarefas que despertem seu interesse. Em consonância com a avaliação enquanto prática de investigação e oportunidade de aprendizagem, a Educação Matemática Realística (RME) mostra-se como uma perspectiva que é consoante com a avaliação desejada pela pesquisadora/pelo GEPEMA. O modo como o ensino e a aprendizagem são apresentados na perspectiva da RME se mostra favorável à prática de uma mudança de atitude do modo tradicional como a avaliação escolar vem sendo ainda empregada. Portanto, tomamos a Educação Matemática Realística como uma oportunidade de constituir um referencial para uma avaliação escolar que oportunize a aprendizagem. 26 2 ESTUDANDO AS POSSIBILIDADES DE JOGO 2.1 EDUCAÇÃO MATEMÁTICA REALÍSTICA – ALGUMAS CONSIDERAÇÕES Na busca de conhecer como estudantes lidam com questões não-rotineiras de Matemática, em 2006, o GEPEMA iniciou estudos a respeito da análise da produção escrita em itens do PISA, por serem validadas e caracterizadas como não-rotineiras. A ideia de trabalhar com tarefas de matemática não-rotineiras parte da hipótese de que elas podem mobilizar conhecimentos dos estudantes por se tratarem de situações familiares, imagináveis, com as quais eles possam produzir significado e, então, aprender matemática16. Como o PISA apresentava em seus documentos indícios da RME como fundamentação teórica, o GEPEMA, a partir de 2006, começou a estudar essa abordagem que, além de continuar sendo tema atual de estudo do GEPEMA, tem se tornado um referencial teórico para nossos estudos em Avaliação e Educação Matemática. A Educação Matemática Realística é uma abordagem de ensino e aprendizagem cujo desenvolvimento foi inspirado, principalmente, pelas ideias e contribuições do educador matemático alemão Hans Freudenthal (1905-1990). Hans Freudenthal, nascido em 1905, desenvolveu interesses em matemática, ciências e literatura. Em 1923, ele entrou na Universidade de Berlim para estudar matemática e física. Seu orientador de doutorado foi Heinz Hopf e, em 1931, Freudenthal concluiu seu doutorado com uma tese a respeito da teoria dos fins de grupos. Em 1927, enquanto estudava na Universidade de Berlim, assistiu uma palestra dada por Luitzen Egbertus Jan Brouwer, adepto da corrente filosófica da matemática conhecida como intuicionismo. Brouwer foi um forte influenciador das ideias de Hans Freudenthal. Em 1930, Freudenthal foi convidado para ir para a Universidade de Amsterdã como assistente de Brouwer. Durante a invasão da Alemanha na Holanda, em meados de 1940, Freudenthal ficou afastado de suas funções na Universidade de Amsterdã, devido à perseguição nazista (ele era judeu). Em maio de 1945, após a Holanda ter sido libertada pelas tropas canadenses, Freudenthal pôde voltar às suas funções, tomando posse como professor na Universidade de Utrecht, de 1946 até o ano de 1975, quando se aposentou. 16 Não é exatamente pelo fato de ser não-rotineiras (não, frequentemente, presentes em livros didáticos) que faz com que as questões tenham as caraterísticas apresentadas. O que ocorre é que questões com estas características, que acreditamos interessantes, ainda são muito pouco presentes nos livros. 27 Os primeiros trabalhos de Freudenthal foram relacionados à topologia e álgebra. Mais tarde, fez grandes contribuições no campo da Geometria, Filosofia, História da Matemática e Educação Matemática. Ele morreu, em 1990, sentado em um banco de um parque perto de sua casa, em Utrecht. A RME surgiu na Holanda entre o final da década de 1960 e começo dos anos 1970. Nessa época, educadores holandeses, influenciados pelas ideias de Hans Freudenthal, buscavam elaborar uma proposta curricular que modernizasse a Educação Matemática do país, com uma perspectiva de reforma educacional em oposição ao movimento da Matemática Moderna, dominante em muitos países, que tinha uma perspectiva de ensino estruturalista como base. O movimento para reforma curricular não foi exclusivo da Holanda. Educadores e autoridades de outros países, também, buscavam reformas para o ensino de matemática em seus países. Entretanto, o que parece ter alavancado a reforma na Holanda foi o relacionamento de Hans Freudenthal com a ICMI17 (Comissão Internacional de Instrução Matemática), como presidente, entre os anos de 1967 e 1970. Em 1908, no IV Congresso Internacional de Matemática em Roma, foi aprovada uma resolução, apresentada por iniciativa do educador americano David Eugene Smith (1860-1944), da criação de uma Comissão Internacional18 com o objetivo inicial de fazer um estudo comparativo a respeito dos métodos e planos de ensinar matemática nas escolas secundárias. O presidente fundador19 da ICMI foi o matemático alemão Felix Klein (1849-1925) e o primeiro secretário-geral foi o suíço Henri Fehr, um dos cofundadores da revista internacional L‘Enseignement Mathématique. Depois de interrupções de suas atividades ao longo das duas Guerras Mundiais, a ICMI foi reconstituída em 1952. Naquele momento, a comunidade internacional matemática estava se reorganizando e a ICMI tornou-se, então, uma comissão oficial da União Internacional de Matemática20 (IMU – International Mathematical Union). 17 International Commission on Mathematical Instruction. No entanto, a ideia de uma comissão internacional já havia sido formulada por Smith, três anos antes na revista internacional L‘Enseignement Mathématique. 19 Mais tarde, os ICMIs estiveram sob a presidência de matemáticos e educadores eminentes, citando alguns: Jacques Hadamard (de 1932 até a guerra), H. Marshall Stone (1959-1962), André Lichnerowicz (1963-1966), Hans Freudenthal (1967-1970), Jean-Pierre Kahane ( 1983-1990), Miguel de Guzmán (1991-1998) e Hyman Bass (1999-2006). Assim, o interesse e engajamento produtivo de pesquisadores matemáticos preocupados com a educação matemática escolar têm uma história longa e substancial, embora desigual (ICMI, 2012, on-line). 20 Outras informações disponíveis em: <http://www.mathunion.org>. Acesso em: 19 out. 2012. 18 28 Ao longo do tempo, como a missão da educação geral se expandiu, aumentaram também as necessidades e complexidade da educação matemática. O pequeno espaço disponibilizado para uma das seções da ICMI comprometeu a comunicação de problemas e ideias relacionadas com a educação matemática. Isto levou o então presidente Hans Freudenthal a organizar, em 1969, o primeiro Congresso Internacional de Educação Matemática (ICME21), em Lyon (na França). O ICME, desde então, evoluiu para congressos quadrienais. Eles representam hoje em dia um elemento importante no programa de atividades da ICMI, mas não apenas o único (ICMI, 2012, on-line). Além de sua relação com os ICMIs e ICMEs, Hans Freudenthal teve também outras fortes influências que, por sua vez, influenciaram as atuais bases da RME. Hans Freudenthal foi o editor fundador da Educational Studies in Mathematics22 e um dos fundadores do PME23 (Grupo Internacional de Psicologia e Educação Matemática). Ele também foi fundador e presidente da Comissão para o Estudo e Melhoria do Ensino de Matemática (CIEAEM24), que conta com mais de 50 anos de atividade (GRAVEMEIJER; TERWEL, 2000). O movimento de reforma na Holanda teve impulso a partir de 1968, com o projeto Wiskobas (que significa “matemática nas escolas primárias”) e teve como fundadores Fred Goffree, Edu Wijdeveld e, mais tarde, Adrian Treffers. O Wiskobas foi um projeto do CMLW (Mathematics Curriculum Modernization Committee) que foi criado, em 1961, para modernizar a educação matemática nas escolas secundárias. Em 1971, o Instituto IOWO (Instituto para Desenvolvimento de Educação Matemática) forneceu as instalações para o desenvolvimento do projeto Wiskobas. O IOWO tinha na época como diretor Hans Freudenthal, que, por sua resistência ao movimento da Matemática Moderna em relação à Educação Matemática, deu um novo impulso ao movimento holandês para uma reforma curricular. Em 1981, o Instituto IOWO foi sucedido pelo grupo de Investigação para a 21 International Congresson Mathematical Education. Educational Studies in Mathematics (Estudos Educacionais em Matemática). De acordo com o inventário de publicações relativas à RME, contruído pelo GEPEMA e atualizado até 2010, é o periódico com maior quantidade de publicações. 23 PME – International Group for Psychology and Mathematics Education. Segundo Gravemeijer e Terwel (2000), o PME foi estabelecido para superar o behaviorismo dominante na psicologia educacional. O PME é um grupo internacional de educadores e pesquisadores de matemática que se reúnem anualmente para compartilhar e discutir interesses a respeito da Educação Matemática. Foi fundado em 1976, no III ICME, realizado na Alemanha. 24 CIEAEM– International Commission for the Study and Improvement of Mathematics Teaching. Afiliada ao ICMI, fundada a partir de 1950, tem como meta investigar as atuais condições e possibilidades para o desenvolvimento da educação matemática a fim de melhorar a qualidade do ensino da matemática. As conferências da CIEAEM são anuais. 22 29 Educação Matemática e Centro de Computação Educacional (OW & OC) e, em 1991, em homenagem ao precursor da RME, passou a se chamar Instituto Freudenthal (FI ou FIsme). O FIsme (Freudenthal Institute for Science and Mathematics Education) é uma organização holandesa de pesquisadores que, atualmente, se dedicam ao estudo do ensino de ciências e educação matemática. O principal objetivo daquela reforma curricular holandesa foi o de abandonar a abordagem mecanicista, até então, prevalecente para a educação matemática. Nessa busca, a Holanda não perseguiu nem a abordagem empirista, predominante na educação matemática da Inglaterra, nem a estruturalista, que nos EUA levou ao movimento New Math (VAN DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 2010). No quadro a seguir, apresentamos algumas características das abordagens citadas, segundo Van den Heuvel-Panhuizen (2010). Quadro 2 – Abordagens tradicionais segundo Van den Heuvel-Panhuizen (2010). Abordagem Características Mecanicista “Característica desta abordagem é seu foco em cálculos com números simples, e a pouca atenção prestada às aplicações; o que é certamente verdade para o início do processo de aprendizagem. Matemática é ensinada de uma forma atomizada. Estudantes aprendem os procedimentos de uma maneira passo a passo na qual o professor demonstra como resolver um problema” (VAN DEN HEUVELPANHUIZEN, 2010, p. 4, tradução nossa)x. Empirista Típico deste tipo de educação era que os alunos eram deixados livres para descobrir muito por si próprios e eram estimulados a realizar investigações (VAN DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 2010, p. 4, tradução nossa)xi. Estruturalista Este é um método de ensinar matemática que foca em conceitos abstratos, como a teoria dos conjuntos, funções e outras bases diferentes de dez (VAN DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 2010, p. 4, tradução nossa)xii. Fonte: autora. Dada a insatisfação com o ensino por meio das abordagens denominadas tradicionalistas dominantes na época, Freudenthal (1968, 1983, 1991) fomentou uma discussão a respeito do que acreditava ser a educação matemática, lançando suas ideias a respeito do ensino e aprendizagem, ao apresentar e discutir a respeito da matemática como Atividade Humana; do ensino e aprendizagem como Princípio de Reinvenção; da aprendizagem Matemática por meio da Matematização; 30 da reinvenção de ferramentas matemáticas por meio da 25 Matematização Progressiva . A partir desses conceitos fundamentais foram lançadas as bases da RME, que começaram a ser incorporadas, desenvolvidas, aprimoradas por seguidores e adeptos das ideias de Freudenthal. Freudenthal teve outras várias influências na elaboração de suas ideias. Segundo Gravemeijer e Terwel (2000), ele foi, também, influenciado pelas ideias pedagógicas de sua esposa Suus Lutter-Freudenthal, uma das forças motrizes por trás do movimento JenaPlan26 de Peter Petersen, na Holanda. Foi, também, fortemente influenciado pela reforma pedagógica do educador belga Ovide Decroly, sendo, ambos, membros ativos da New Education Fellowship27 (GRAVEMEIJER; TERWEL, 2000). A ideia de Freudenthal a respeito do aprendizado de matemática em contextos realísticos se assemelha à ideia educacional de Decroly relativa aos Centros de Interesse, bem como o princípio de Decroly sobre elaboração em espaço e tempo corresponde ao princípio da Reinvenção-Guiada de Freudenthal (GRAVEMEIJER; TERWEL, 2000). Embora o movimento RME tenha começado no final da década de 60, a expressão Educação Matemática Realística começou a ser utilizada apenas no final dos anos 70 (TREFFERS, 1991). O termo “realistic” tem origem no verbo neerlandês “zich REALISEren‖ e foi traduzido, para o português, também pelo GEPEMA, para “realístico” ao invés de “realista”, porque parece estar mais relacionado ao significado de “imaginar”, “realizar”, “fazer ideia”, “tomar consciência de” (realistic no inglês) e, por sua vez, à possibilidade de “tornar real” na mente28 dos estudantes, o que sugere que os contextos ou situações nos quais os alunos se envolvem não precisam ser autenticamente “reais”, mas precisam ser imagináveis, realizáveis, concebíveis (VAN DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 2005). 25 Estas ideias tiveram fortes influências da perspectiva construtivista de Brower, adepto da corrente filosófica intuicionista, para a qual a intuição ocupa o papel principal para o conhecimento. Nessa perspectiva, construtivistas defendem que a matemática é produto de construções mentais. Uma vez que é considerada fruto de contruções mentais (humanas), Freudenthal apresenta o slogan “Matemática como atividade humana”. 26 O JenaPlan é uma abordagem de ensino pautada nas ideias educacionais de Peter Petersen (1884-1952) e recebeu este nome por seu precursor ser natural de Jena, Alemanha. 27 Uma antiga organização internacional que tinha como objetivo a reforma pedagógica. Nessa organização podem ser citados ainda Martin Buber, Ovide Decroly, John Dewey, Geheeb Paulo, Maria Montessori, Helen Parkhurst, Meuter Hanna, Jean Piaget e Peter Petersen. As conferências realizadas por essa organização ocorreram em meados de 1920-1940. 28 Segundo Heyting (1956, p. 22 apud SHAPIRO, 1997), a matemática, a partir do ponto de vista intuicionista, é um estudo de determinadas funções da mente humana, e o programa de Brouwer consistiu em um estudo de construções matemáticas mentais, no qual o “existir” deveria ser tomado como sinônimo de “ser construído”. Assim, na perspectiva de Freudenthal, a possibilidade de aprender matemática está associada à de torná-la “real”, ou seja, imaginável na mente dos estudantes. 31 Freudenthal (1968) propôs uma discussão a respeito do que é matemática e o que deveria ser considerado útil para a aprendizagem29. Para ele, a matemática é vista com um meio de organizar um assunto, que pode envolver a procura e resolução de problemas, a conceituação de um tema estudado de um ponto de vista matemático (FREUDENTHAL, 1971). Como matemático, Freudenthal (1968) argumentava que a função dos matemáticos era, especificadamente, matematizar assuntos próprios do conhecimento matemático, mas que era possível, também, matematizar assuntos da realidade. De acordo com Freudenthal (1991), a matemática deve ser conectada com a realidade, estar próxima das crianças, ser relevante para a sociedade e ser de valor humano. Para Van Den Heuvel-Panhuizen (1996), sob a perspectiva da Educação Matemática Realística, o aluno deve “fazer matemática” partindo de fenômenos e, ao lidar com eles, desenvolver ferramentas matemáticas necessárias para esse lidar. Freudenthal (1991) defendia a ideia da Matemática como uma “Atividade Humana” em construção, na qual deveria ser dada aos alunos a oportunidade de “reinventar” a matemática, fazendo-a (FREUDENTHAL, 1991; TREFFERS, 1987; DE LANGE, 1987; VAN DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 1996; GRAVEMEIJER; DOORMAN, 1999). Ele e seus seguidores acreditam que os alunos deveriam ter a oportunidade “guiada” para reinventá-la, em lugar de serem considerados como receptores de uma matemática já “pronta” e “acabada”. Segundo Freudenthal (1971, p. 413-414), a matemática como atividade humana é uma atividade de resolução de problemas, de procura por problemas, mas é também uma atividade de organização de um determinado assunto. Este pode ser um assunto da realidade que deve ser organizado de acordo com modelos ou padrões matemáticos caso os problemas da realidade devam ser resolvidos. Também pode ser um assunto matemático, resultados novos ou antigos, de seu próprio país ou de outros, que devem ser organizados de acordo com novas ideias, para serem mais bem compreendidos, em um contexto mais amplo ou por meio de uma abordagem axiomáticaxiii (FREUDENTHAL, 1971, p. 413-414, tradução nossa). Nesta perspectiva, a essência da Educação Matemática não reside no ensino dos objetos matemáticos30 simplesmente, mas sim na atividade: um processo de organização e tratamento de um assunto por meio desses objetos. Partindo deste ponto de vista, a matemática é vista como uma ação e não como um “comboio” de conhecimentos e, portanto, 29 Segundo Gravemeijer e Terwel (2000), embora Freudenthal nunca tenha referenciado estudiosos como o alemão Wolfgang Klafki, perguntas básicas de Klafki tornaram-se, também, questões de interesse de Freudenthal: o que deve ser ensinado em um assunto escolar? Para qual propósito? E para quem? 30 Estamos chamando de objeto matemático, qualquer conhecimento matemático já conhecido e sistematizado historicamente. 32 não faz sentido ensinar às crianças apenas os “conteúdos”, mas sim dar a elas diferentes oportunidades para experienciar a matemática como uma “atividade humana”. Nesse sentido, os conteúdos, conceitos, objetos, ideias, algoritmos, propriedades matemáticas emergem dos fenômenos com os quais os alunos podem se envolver ao lidar com um assunto, em vez de ser o ponto de partida. Freudenthal (1968, 1973, 1991) argumenta que, se as crianças aprendem matemática de uma forma isolada, divorciada de suas experiências, ela será esquecida e não serão capazes de aplicá-la. Para este autor, os alunos têm maior chance de aprender matemática construindo-a, reinventando-a, recriando-a. A sistematização é uma virtude da matemática e o que as crianças devem aprender é a atividade de sistematizar e não o resultado da sistematização apenas (FREUDENTHAL, 1968). Segundo o autor, o poder maravilhoso que a matemática tem de eliminar o contexto e colocar outros contextos “na mesma forma” é que faz dela uma atividade útil. Portanto, parece inócuo apresentar apenas conteúdo sistematizado para ser operacionalizado, uma vez que, como um sistema fechado, até uma máquina pode operar, e isso não caracteriza uma atividade humana. O que é próprio dos humanos é a atividade de matematizar o assunto estudado, seja ele matemático ou não (FREUDENTHAL, 1968). Pensar em uma matemática possível de ser transferida significa pensar que alunos “aprendem” ao armazenar e reproduzir informações (conceitos, objetos matemáticos), assim como, por exemplo, robôs e computadores. Quem “recebe” não participa da escolha de quais informações vai receber e, muito menos, da decisão de quais são importantes para serem “armazenadas”, de quando aplicá-las, para quê e/ou por que elas são relevantes, ou como foram obtidas. Essa poderia ser adjetivada como uma “atividade robótica”, “atividade cibernética”, mas não humana (LOPEZ, 2010, p. 15-16). Freudenthal (1968, 1983) considera uma inversão antididática31 o ensino da matemática a partir do próprio conteúdo matemático para depois aplicá-lo em problemas, o que caracteriza uma forma de ensino contrária às ações dos matemáticos. Na perspectiva proposta por este autor, os alunos devem fazer matemática, lidar com ela, para então produzir conhecimento, resolver problemas, organizar e utilizar fenômenos da sala de aula em situações do dia a dia. 31 As críticas de Freudenthal a respeito da inversão antididática, visualizada na perspectiva de instrução tradicional, bem como suas ideias a respeito do princípio de reinvenção foram, provavelmente, inspiradas pelo movimento de reforma pedagógica, por sua vez, fortemente influenciada pelas ideias de Peter Petersen e Maria Montessori (GRAVEMEIJER; TERWEL, 2000). 33 Ao encontro da perspectiva da matemática como uma atividade humana, Freudenthal (1991) considerava que a aprendizagem deveria ser concebida, na realidade, a partir da exploração de situações que possibilitassem aos estudantes “reinventar”32 a matemática. Ele reconhecia que, embora todo corpo de conhecimento matemático não pudesse ser simplesmente reinventado em situações de sala de aula, os estudantes deveriam ter a oportunidade de experienciar processos nos quais eles se sentissem os “autores” da invenção, com a perspectiva de que a matemática fosse visualizada como uma ação, sempre em movimento, e não como algo complexo pronto, acabado, imutável. Na reinvenção guiada os alunos têm um papel fundamental e são considerados: (a) protagonistas da aprendizagem; (b) reinventores de ferramentas, procedimentos, conceitos matemáticos; (c) autores do que fazem. o professor serve de guia, interventor, orientador, recurso, mediador do processo de aprendizagem. as tarefas são motes, pontos de partida, para o processo de reinvenção; devem ser propícias às possíveis matematizações. a matemática é uma atividade humana. a aprendizagem é baseada na experiência do aluno, na qual a construção de conceitos matemáticos é feita de forma que ele consiga reconstruir o que aprendeu33. De acordo com o princípio da reinvenção, os alunos devem ter a oportunidade de vivenciar um processo semelhante àquele pelo qual um determinado objeto matemático foi construído (FREUDENTHAL, 1973). Nesse processo, a ajuda do professor é de fundamental importância, como um orientador, mediador, guia que oferece direções, verifica a convergência entre o que os estudantes produzem e o que há de padrões vigentes na comunidade matemática. O ponto de partida neste processo são as estratégias informais dos estudantes, que, gradualmente, tendem a se tornar formais, segundo as orientações do guia (DRIJVERS, 2003). Nessa perspectiva, o processo de aprendizagem é estruturado por 32 Isto significa possibilitar que os alunos experimentem um caminho “semelhante” ao processo pelo qual a matemática foi elaborada historicamente e, então, atribuir algum sentido à sua utilidade em situações diversas. 33 Sistematização construída a partir das referências: (FREUDENTHAL, 1968, 1971, 1983, 1991; DE LANGE, 1987; TREFFERS, 1987; VAN DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 1996; DRIJVERS, 2003). 34 níveis34. Em um nível, determinado conceito pode ser o objeto da matematização, que em outros níveis, pode ser ferramenta útil para organização de outros assuntos, na busca de matematizar e sistematizar outros objetos. Freudenthal considerava a matemática não como o corpo do conhecimento matemático, mas como uma atividade de busca e resolução de problemas e, de forma mais geral, como a atividade de organizar “matematicamente” a “realidade” – atividade que chamou de “matematização” (VAN DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 2003). Para Freudenthal (1991), aprender matemática deveria ter origem no “fazer” matemática, sendo a matematização o núcleo da Educação Matemática. Treffers (1987) descreveu a matematização como uma atividade organizada. Ela refere-se à essência da atividade matemática, à linha que atravessa toda educação matemática voltada para a aquisição de conhecimento factual, à aprendizagem de conceitos, à obtenção de habilidades e ao uso da linguagem e de outras organizações, às habilidades na resolução de problemas que estão, ou não, em um contexto matemáticoxiv (TREFFERS, 1987, p. 51-52, tradução nossa). Associado ao conceito de atividade humana, o foco da matematização não reside sobre a forma ou produtos da atividade, mas sim sobre a própria atividade, bem como sobre seu efeito. Na opinião de Freudenthal (1968), Educação Matemática para crianças, acima de tudo, deve ter como objetivo a matematização da realidade “cotidiana” (VAN DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 1996; GRAVEMEIJER; TERWEL, 2000). Segundo Gravemeijer e Terwel (2000), matematização busca por “fazer mais matemática”. Para esclarecer o que significa “mais matemática”, pode-se pensar em características da matemática como generalidade, certeza, exatidão e concisão: generalidade: generalizando (olhando para analogia, classificando, estruturando); certeza: refletindo, justificando, provando (usando uma abordagem sistemática, elaborando e testando conjecturas, etc.); exatidão: modelando, simbolizando, definindo (limitando interpretações e validade); e concisão: simbolizando e esquematizando (desenvolvimento de padrão procedimentos e notações)xv (GRAVEMEIJER; TERWEL, 2000, p. 781, tradução e sublinhados nossos). Para Freudenthal (1968, 1971), era possível “matematizar a realidade” e “matematizar a matemática” (STREEFLAND, 2003). Freudenthal denominou esta 34 Esta ideia está fundamentada nos níveis de Van Hiele, elaborados pelo casal neerlandês Dina van HieleGeldof e Pierre van Hiele em suas teses de doutorado, que foram orientadas por Martinus Jan Langeveld e Hans Freudenthal na Universidade de Utrecht (GRAVEMEIJER; TERWEL, 2000). 35 organização da atividade de matematização que pode envolver “assunto da realidade” e “assunto matemático”. Ao processo que Freudenthal chamava de matematização podem ser identificadas duas grandes vertentes. A primeira é a que explica o sujeito ir dos contextos “realísticos” envolvidos nas tarefas ou fenômenos explorados, para um assunto matemático. A segunda diz respeito ao desenvolvimento dos procedimentos matemáticos para explorar os fenômenos. Na tentativa de poder falar sobre essas vertentes, Treffers (197835, 1987), em sua tese, distinguiu matematização horizontal e vertical: a primeira como uma tarefa de tornar um assunto acessível para tratamento matemático e a segunda como uma tarefa de promover um processamento matemático mais “sofisticado” (apud FREUDENTHAL, 1991). Treffers e Goffree (1985) também apresentam algumas ideias a respeito dos conceitos de matematização horizontal e vertical. Segundo os autores, a matematização é um processo dinâmico; o que pode ser um assunto a ser matematizado, em certo momento, pode ser utilizado mais tarde como um modelo de caráter algorítmico para matematizar outro assunto de nível mais elevado. A matematização horizontal transforma um problema em campo matemático (o problema é abordado por métodos matemáticos, ou ainda, o problema é esquematizado a fim de ser manipulado por ferramentas matemáticas). As atividades de processamento dentro do sistema matemático caracterizam a matematização vertical, a qual significa ainda uma renovação do problema do mundo real em matemática. Na componente horizontal a estrada para a matemática é pavimentada por meio de formação de modelo, esquematização e atalhos. A componente vertical atua por processamento matemático, aumentando o nível de estrutura no campo do problema correspondente. Sem dúvida, separar grupos de atividade sem dois componentes parece um pouco artificial.xvi (TREFFERS; GOFFREE, 1985, p. 109, tradução nossa). Treffers (1987) conceitua a “matematização horizontal” como uma tentativa de esquematizar o problema matematicamente, ou seja, a matematização horizontal consiste em esquematizar o que se considera necessário para que seja possível abordar o problema por meios matemáticos, seja por meio da formação de um modelo, de esquematização, ou de simbolização. Segundo Van den Heuvel-Panhuizen (2010), envolve a ida do “mundo da vida real” para o “mundo da matemática”. Isto significa que as ferramentas matemáticas são utilizadas para elaborar, organizar o modelo e resolver problemas situados em algumas situações da vida real. 35 TREFFERS, A. Wiskobas doelgericht. Utrecht: IOWO, Rijksuniversiteit Utrecht, 1978. A tese de Adrian Treffers está originalmente escrita na língua holandesa. 36 As tarefas que acompanham e estão relacionadas ao processo matemático, à solução do problema, à generalização da solução e à posterior formalização podem ser descritas como uma “matematização vertical”, segundo Treffers (1987). Para Van den HeuvelPanhuizen (2010), matematizar verticalmente significa mover-se dentro do “mundo” da matemática. Refere-se ao processo de reorganização dentro do sistema matemático resultando em atalhos, fazendo uso de ligações entre conceitos e estratégias. Freudenthal, em seu livro Revisitando a Educação Matemática (FREUDENTHAL, 1991), discorre a respeito de uma sua resistência para aceitar as duas componentes da matematização como propostas por Treffers (1987), porque para ele não era possível separá-las e nem compará-las atribuindo-lhes maior ou menor valor. Para Freudenthal (1991), não há um ponto de corte claro que promova a distinção entre os dois “mundos”. Treffers (1987) também reconheceu que esta distinção entre matematização horizontal e vertical é um pouco artificial, dado que elas estão fortemente inter-relacionadas. A resistência de Freudenthal para distinguir os dois tipos de matematização36 propostas por Treffers (1987) parece ter base em uma de suas críticas a respeito das abordagens tradicionais de ensino enfatizarem apenas um ou outro componente da matematização. Para ele, as duas formas de matematizar possuem igual valor e merecem mesma importância. Assim, o conceito global de matematização deve incluir tanto matemática aplicada como matemática pura. Para ilustrar as diferenças entre as abordagens tradicionais de ensino e a Educação Matemática Realística com relação à matematização, Treffers (1987) apresenta o seguinte quadro. Quadro 3 – Tipos de matematização na Instrução Matemática. Abordagem para a Educação Matemática Horizontal Mecanicista − Empirista + Estruturalista − Realística + Fonte: Treffers (1987, p. 251, tradução nossa). 36 Matematização Vertical − − + + Freudenthal (1991) afirma que, apesar de sua resistência inicial, acabou aceitando o uso das expressões matematização horizontal e vertical. Vale a pena observar que Freudenthal foi o orientador da tese de Adri Treffers. 37 Se por um lado, a matematização é própria das tarefas dos estudantes, uma atividade de organizar assuntos matematicamente, a “didatização37” é própria das tarefas do professor como uma atividade de organizar fenômenos suscetíveis à matematização. Nesta perspectiva, Freudenthal (1983) explora o conceito de fenomenologia didática. Segundo Freudenthal (1983), conceitos matemáticos, estruturas, ideias foram inventados como ferramentas para organizar fenômenos do mundo físico, social e mental. A fenomenologia de um conceito matemático, de uma estrutura ou ideia significa a ação de descrevê-la em sua relação com os fenômenos para os quais foi criada. Estendendo esta ideia para o processo de aprendizagem a fenomenologia didática se mostra como uma maneira de o professor oportunizar aos alunos os “lugares” ou “situações” pelas quais podem reinventar “suas” matemáticas, matematizar. Freudenthal (1983) apresenta o conceito de fenomenologia didática38 como uma heurística sob a qual, a partir da exploração de fenômenos, são extraídos os objetos matemáticos. Uma condição para pôr em prática a fenomenologia didática é propiciar aos estudantes tarefas ricas39. Nesse sentido, os contextos das tarefas de matemática desempenham um importante papel na resolução dos estudantes (DE LANGE, 1987; TREFFERS, 1987; VAN DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 1996). Resumidamente, a Educação Matemática Realística é caracterizada por cinco/seis40 princípios que são fundamentados nos níveis de Van Hielexvii, na fenomenologia didática de Freudenthal, e na Reinvenção Guiada por meio da matematização progressiva. Esses princípios são apresentados no quadro a seguir. Quadro 4 – Resumo dos Princípios da RME41. Princípios42 (1) Da Atividade 37 Características - refere-se à interpretação da matemática como atividade humana (VAN DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 2010); - aprender é uma atividade construtiva (NES, 2009); - as produções dos estudantes são utilizadas para a construção de conceitos (VAN É considerada função do professor de apresentar didaticamente a realidade por contextos ricos. Uma maneira de descrever ideias matemáticas como sendo relacionadas com os fenômenos que são “matematizáveis”. 39 Tarefas ricas são aquelas com as quais os estudantes se sentem atraídos para resolver e, possivelmente, matematizar (DE LANGE, 1987; TREFFERS, 1987; VAN DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 1996, 2010). 40 Na maioria dos textos são apresentados cinco princípios. Van den Heuvel Panhuizen (2000, 2010) apresenta seis. 41 Quadro construído com base nas descrições de Streefland (1991), Treffers (1987), Van den Heuvel-Panhuizen (2000, 2001, 2010), Widjaja e Heck ( 2003), Nes (2009). 42 Apenas Van den Heuvel-Panhuizen (2000, 2010) apresenta o sexto princípio. Os demais autores apresentam apenas os cinco primeiros. 38 38 (2) Da Realidade (3) De Níveis (4) Do Entrelaçamento (5) Da Interatividade (6) De Orientação DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 2000)xviii. - a RME tem a função de tornar os alunos capazes de aplicar matemática (VAN DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 2010); - o processo de matematização ocorre a partir da exploração de contextos ricos (VAN DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 2010); - fenômenos da realidade devem ser organizados por meio da matemática (NES, 2009); - é importante o uso de contextos reais que sejam significativos e naturais ao aluno como ponto de partida para a sua aprendizagem (WIDJAJA; HECK, 2003). - os alunos passam vários níveis de compreensão (VAN DEN HEUVELPANHUIZEN, 2010); - começam de seus procedimentos informais e por meio da matematização progressiva e esquematizações avançam para a construção de modelos mais formais (VAN DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 2010); - os modelos têm de mudar de “modelo de” ao “modelo para” (STREEFLAND, 1991). - domínios matemáticos, como geometria, número, medição e manipulação de dados não são considerados capítulos curriculares isolados, mas fortemente integradosxix (VAN DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 2010); - os alunos devem desenvolver uma visão integrada da matemática, bem como flexibilidade para se conectar a diferentes subdomínios e / ou a outras disciplinasxx (WIDJAJA; HECK, 2003); - a resolução de problemas de contexto ricos significa muitas vezes que se tem de aplicar uma ampla gama de ferramentas matemáticas e entendimentosxxi (VAN DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 2000); - a força do princípio entrelaçamento é que traz coerência para o currículo. Este princípio refere-se não só aos diferentes domínios de matemática, mas também podem ser encontradas dentro delesxxii (VAN DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 2000). - a aprendizagem matemática não é apenas uma atividade pessoal, mas também uma atividade social (VAN DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 2010); - os alunos devem ter oportunidades para compartilhar suas estratégias e invenções com outros alunos (VAN DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 2010); - a interação entre alunos e professores é uma parte essencial na RME porque a discussão e colaboração oportunizam a reflexão sobre o trabalho (WIDJAJA; HECK, 2003). - os estudantes devem contar com uma oportunidade “guiada” para “reinventar” a matemática (VAN DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 2010); - o ensino e os programas devem basear-se num conjunto coerente de trajetória de ensino-aprendizagem a longo prazo (VAN DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 2010); - os alunos precisam de espaço para construir conhecimentos matemáticos e ferramentas por si só. Para alcançar isso, os professores têm de proporcionar aos alunos um ambiente de aprendizagem em que este processo de construção possa surgirxxiii (VAN DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 2000). Fonte: autora. O princípio que mais nos interessa neste trabalho é o segundo (Da Realidade), que está relacionado ao papel dos contextos. Por considerar relevante conhecer “o papel” que os contextos podem desempenhar nas tarefas dos estudantes, apresentamos a 39 seguir uma revisão de literatura a respeito de tarefas matemáticas na busca de conhecer suas características, potencialidades, constituição. 2.2 ENUNCIADOS DE TAREFAS DE MATEMÁTICA Dado o interesse do GEPEMA em estudar a produção escrita em tarefas não-rotineiras, seus participantes iniciaram um estudo a respeito do papel dos contextos em tarefas de matemática. As hipóteses lançadas a respeito da possível influência que o texto apresentado na proposição de uma tarefa exerce motivaram esta pesquisadora a conhecer sua constituição, suas características, potencialidades. Dado o quadro teórico adotado (Educação Matemática Realística) e considerando que, por um lado, o contexto envolvido em uma tarefa exerce um papel importante (TREFFERS; GOFFREE, 1985; DE LANGE, 1987; TREFFERS, 1987; VAN DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 1996, 2005; SHANNON, 2007), sendo, por vezes, um aspecto que pode determinar o sucesso, ou não, dos estudantes em suas resoluções (CLEMENTS, 1980; VAN DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 1996, 2005) e, por outro, que as tarefas de sala de aula não devem ser diferentes das de avaliação, e a avaliação deveria mostrar indícios da aprendizagem do estudante, faz-se relevante propor um estudo a respeito do que as tarefas podem oportunizar, na perspectiva de uma Educação Matemática que leva em conta a fenomenologia didática, matematização, reinvenção guiada, por meio de tarefas matemáticas que impulsionam estes processos. 2.2.1 Os contextos e as classificações das tarefas Propor aos estudantes tarefas matemáticas que apresentem contextos diversos é uma alternativa para que possam ampliar seus conhecimentos, pois, mais do que aprender a operar dados, o ensino da matemática deveria propiciar que os alunos pudessem 40 resolver tarefas com mais referência em sua realidade do que aquelas apenas do tipo “efetue”, “some”, “divida”, “calcule a seguinte regra de três”, apresentadas rotineiramente nas escolas. Até porque a aprendizagem escolar pode se constituir como uma base para que nossos alunos continuem aprendendo, dentro e fora da escola, para que tenham uma participação efetiva na sociedade. Partindo do pressuposto de que a avaliação escolar deve fornecer informações a respeito da aprendizagem dos estudantes, devemos pensar em instrumentos de avaliação que contenham tarefas que possibilitem aos estudantes apresentar estas informações. Para tanto, a flexibilidade da tarefa, a questão, o contexto, a forma de apresentação são assuntos que merecem ser estudados. Segundo Borasi (1986), o principal papel do contexto para a realização de uma tarefa parece ser de fornecer ao “resolvedor” as informações que lhe possam permitir a resolução do problema. Essa autora ainda argumenta que experiências na resolução de problemas da “vida real” poderiam contribuir também para o desenvolvimento de diferentes estratégias para analisar contextos e criar fórmulas matemáticas. Clements (1980) chamou a atenção para a necessidade de pesquisa a respeito dos fatores que fazem com que alguns problemas aritméticos verbais sejam mais fáceis (acessíveis) do que os correspondentes aritméticos “estruturados”, apesar de envolverem mais leitura, compreensão e transformação. Sua pesquisa revelou que, em um teste com 126 estudantes, 58 acertaram o item43 a seguir “Questão 5 - Escrevam a resposta correta para 1 − 1 4” enquanto que 98 acertaram o problema aritmético verbal correspondente “Questão 18 - Um bolo é cortado em quatro partes iguais e Bill leva uma das partes. Que fração do bolo resta?”xxiv(CLEMENTS, 1980, p. 19, tradução nossa). Após uma entrevista realizada com seis crianças que apresentaram resposta incorreta para a questão 5, o autor conclui que a imagem evocada pelo problema do bolo ajudou os estudantes a fornecerem resposta correta para a outra questão (18). Os resultados apresentados e a discussão produzida pelo autor nos fazem pensar a respeito da influência que o contexto desempenha nas tarefas dos estudantes. Segundo Van den Heuvel-Panhuizen (1996), o contexto de uma tarefa pode apresentar situações realísticas, fantasiosas, fatídicas, ou até mesmo ser circunscrito estritamente por uma linguagem matemática. O contexto é apenas um potencializador para a oportunidade de matematizar. O fato de um contexto embutir uma situação do cotidiano não é 43 Usualmente, é chamado de item, ou questão, uma tarefa em circunstância de prova/teste. 41 suficiente para que o estudante possa aprender algo ao lidar com ele. Com isso não é possível dizer a priori quais seriam bons problemas de contexto, visto que essa caracterização depende da relação que o “resolvedor” em potencial estabelece com o enunciado. Todavia, a hipótese é de que a proximidade do contexto com o repertório do estudante aumenta a possibilidade de matematização. Segundo Van den Heuvel-Panhuizen (2001) a ênfase que a RME coloca a respeito da questão do contexto das tarefas matemáticas, que envolvem situações por meio das quais os estudantes possam imaginá-las, torná-las reais em suas mentes, realizar, é o que dá o nome à abordagem “realística” da educação matemática holandesa. Os contextos nesta perspectiva parecem ser a matéria-prima da matematização. Essa autora apresenta dois exemplos de problemas que considera iguais de um ponto de vista matemático, entretanto, a diferença contextual faz com que os alunos considerem os dois problemas completamente diferentes. O primeiro problema envolve uma divisão de 81 por 6, levando em conta “pessoas” e “mesas” e “cadeiras”. O segundo exemplo envolve uma divisão de 81 por 7, com “pessoas”, “cafeteiras” e “xícaras de café” (VAN DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 2001, p. 14-16). Para Díaz e Poblete (2005) bem como para Van den Heuvel-Panhuizen (2001), os problemas de contexto não devem ser apresentados apenas em fase de aplicação, como é feito tradicionalmente, mas também em fase de desenvolvimento e exploração, pois podem fazer com que os estudantes reconheçam a utilidade da matemática em suas necessidades e vida diária, além de despertarem curiosidade, criatividade. Para Van den Heuvel-Panhuizen (2001), problemas de contexto44 e situações da “vida real” servem para constituir e para aplicar conceitos matemáticosxxv. Enquanto trabalham com problemas de contexto, os alunos podem desenvolver ferramentas e compreensão matemática. Segundo Díaz e Poblete (2005), um problema de contexto, em geral, necessita de matematização, o que pode demandar certa exploração xxvi do estudante que resolve o problema. Por outro lado, se for possível matematizar o problema de maneira quase automática e sem muitos esforços, então não se trata de um problema de contexto, mas sim de um exercício de matematização (DÍAZ; POBLETE, 2005)45. Contextualizar o conhecimento matemático não significa simplesmente simulá-lo em sala de aula com qualquer atividade 44 Problemas de Contexto: são definidos na RME como situações-problema que são experimentalmente “reais” para os estudantes (GRAVEMEIJER; DOORMAN, 1999). 45 Obs: os autores não apresentam nenhuma referência a respeito da RME, então o termo matematização por eles utilizado pode não ter o mesmo sentido. 42 cotidiana, mas exige conhecer as representações que os alunos fazem desse conhecimento e conhecer o significado de suas concepções (DÍAZ; POBLETE, 2005). Díaz e Poblete (2005) apresentam uma classificação para tarefas (problemas46) segundo seu contexto. Apresentamos, a seguir, um quadro com exemplos de tarefas classificadas segundo o contexto por Díaz e Poblete (2005). Quadro 5 – Classificações de Tarefas segundo o contexto conforme Díaz e Poblete (2005). Classificação segundo o contexto Problema de contexto real – Um contexto é real, se ele é produzido efetivamente na realidade e envolve ações do aluno nela mesma. Problema de contexto realista47 – Um contexto é realista, se ele pode realmente ocorrer. Trata-se de uma simulação de realidade ou de uma parte dela. Problema de contexto fantasioso – Um contexto é fantasioso, se for fruto da imaginação sem fundamento na realidade. Exemplo Meça com um fio o diâmetro e o comprimento da circunferência de três moedas de tamanhos diferentes. Estabeleça a razão entre o diâmetro e o comprimento de cada moeda. O que você pode concluir a partir dessa razão? A Torre Eiffel, em Paris, mede 300 m,e pesa 8000000 kg. Se construirmos uma semelhante a ela usando o mesmo material da original que pese 1 kg, quanto medirá? Foram trazidos à Terra dois habitantes do planeta Krypton: Superman e Supergirl. Para que ambos não sejam afetados pela "criptonita", precisam tomar diariamente uma quantidade de litros de líquido equivalente a um nono de seus pesos. a) quanto de líquido Superman precisa tomar em uma semana, se pesa 63 kg? b) quanto pesa Supergirl, se em três semanas consumiu 126 litros de líquido? Problema de contexto puramente Um retângulo tem dimensões de 8 cm por 20 cm. O matemático – Um contexto é puramente lado menor de um outro triângulo, semelhante a matemático se refere exclusivamente a ele, é de 6 cm. Encontrar a razão de semelhança objetos matemáticos: números, relações e para passar do primeiro para o segundo. operações aritméticas, figuras geométricas, etc. Fonte: autora – com referência48 em Díaz e Poblete (2005, p. 4, tradução nossa). Shannon (2007) considera que o papel dos contextos nas tarefas de avaliação é um assunto complexo que vai muito além de simplesmente motivar os estudantes a lidar com uma tarefa. Para a autora, a importância atribuída aos contextos das tarefas está associada mais à oportunidade de possibilitar a abstração matemática por meio de situações diversas e diferentes representações, do que tornar o contexto matemático familiar aos 46 Os autores fazem a classificação de Problemas, mas achamos adequado chamá-los de tarefas. Não é no mesmo sentido de realístico. Realista, nesse caso, está associado a contextos que dizem respeito a informações que são ou podem ser reais. 48 Os quadros indicados com referência no autor indicam que apenas a construção do quadro é da autora deste texto, mas o conteúdo é do autor citado. 47 43 estudantes. No entanto, ela reconhece que este é um papel importante dos contextos para tornar o conhecimento matemático mais acessível aos estudantes. Além disso, a autora argumenta que o potencial de uma tarefa de contexto para gerar discussão e abstração depende do modo como ela é tratada e por mais útil que a tarefa seja, pode ser tornada inútil se os alunos não tiverem condições de lidar com a complexidade da matemática intrínseca subjacente. Segundo Treffers e Goffree (1985), problemas de contexto têm formas específicas, conteúdos e funções, podem ser editados em linguagem puramente aritmética, como problemas de palavra e texto e serem apresentados por meios de jogos, histórias, noticiários, modelos, gráficos, ou ainda pela combinação de tais portadores de informações, agrupados em temas ou projetos. Dependendo da forma como o problema é utilizado na instrução, pode ser considerado como de contexto, ou não (problema de palavra49). Um dos princípios da RME é relativo ao papel que os contextos dos problemas desempenham na formação dos estudantes. De acordo com Treffers e Goffree (1985), os contextos dos problemas cumprem uma série de funções. Formação de conceito: na fase inicial de um curso permitirá aos alunos um acesso natural e motivador para a matemática, – Modelo de formação: eles fornecem um suporte seguro para a aprendizagem de operações formais, procedimentos, notações, regras, e fazem isso juntamente com outros modelos que têm uma função importante como suporte para o pensamento, – Aplicabilidade: eles descobrem a realidade como uma fonte e domínio de aplicações, – Exercício de habilidades específicas em situações aplicadas (TREFFERS; GOFFREE, 1985, p. 111; TREFFERS, 1987, p. 256, tradução e grifos nossos). Os Problemas de Contexto são considerados como uma “matéria-prima” no que diz respeito ao Princípio da Realidade que, dentre outros quatro/cinco princípios, caracteriza a Educação Matemática Realística, segundo educadores como Van den HeuvelPanhuizen (1996, 2000, 2001, 2010), Treffers (1987) e Strefland (1991). Este princípio concebe a “realidade” como uma fonte para a aprendizagem. Baseado na perspectiva da matemática como atividade humana, assim como a matemática tem origem na matematização da realidade, a natureza da aprendizagem matemática também tem sua origem na 49 Problema de Palavra: são problemas que geralmente possuem todas as informações necessárias para resolver o problema, o contexto está explícito no texto do problema, envolve a combinação de algoritmos padrões e a solução é única e exata (BORASI, 1986). 44 matematização da realidade50. No ambiente pedagógico, matematizar a “realidade” significa explorar contextos ricos que demandam uma organização matemática ou, em outras palavras, contextos que podem ser matematizados (FREUDENTHAL, 1968; VAN DEN HEUVELPANHUIZEN, 2000). De acordo com Gravemeijer e Doorman (1999, p. 127), se “os estudantes vivenciam o processo de reinventar a matemática como uma expansão do senso comum, então não sentirão dicotomia alguma entre suas experiências de vida cotidiana e matemática, ambos farão parte da mesma realidade”xxvii. Nesse sentido, espera-se que os estudantes, ao trabalhar com problemas de diferentes contextos, possam desenvolver ferramentas matemáticas, compreensão, estratégias que sejam intimamente ligadas ao contexto (VAN DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 2001). Partindo da exploração de fenômenos diversos, por meio de estratégias menos informais, e progredindo no sentido de sistematizar e obter caráter de um modelo formal, por meio da matematização, certos aspectos do contexto matemático podem tornar-se mais gerais e fornecerem apoio para a resolução de outros problemas relacionados (VAN DEN HEUVELPANHUIZEN, 2001). A fim de cumprir a função de passagem entre um nível informal e o formal, os modelos que recebem caráter “modelo de” (específicos) passam a um “modelo para” (mais geral) (STREEFLAND, 1991). No que diz respeito às possibilidades de matematização, De Lange (1987, p. 76-77) classifica diferentes usos/utilidades/fins/objetivos (uses) dos contextos (de terceira, segunda e primeira ordem) como segue. Contexto de Ordem Zero é utilizado apenas para tornar o problema parecido com uma situação da vida real. São chamados por De Lange (1999) de “contexto falso”, “contexto de camuflagem”. Segundo o autor, os problemas que contêm este tipo de contexto devem ser evitados. Para Dekker e Querelle (2002), o contexto utilizado em um problema deve ser relevante para resolvê-lo, se não há relevância alguma para o uso do contexto é classificado como de ordem zero51. Contexto de Primeira Ordem é aquele que apresenta operações matemáticas “textualmente embaladas”, no qual uma simples 50 Nesse sentido, Freudenthal (1973) critica a inversão didática que geralmente é feita no ensino tradicional: em vez de partir do problema concreto e investigá-la por meios matemáticos, a “matemática” vem em primeiro lugar, enquanto o problema concreto vem depois como uma "aplicação" (FREUDENTHAL, 1973, p. 132). 51 Os autores ainda indicam uma pergunta para inspecionar a relevância do contexto em um problema: “por que alguém desejaria saber a resposta desse problema?”. 45 tradução do enunciado para uma linguagem matemática é suficiente (DE LANGE, 1987). Para De Lange (1999) e Dekker e Querelle (2002), esse tipo de contexto é relevante e necessário para resolver o problema e avaliar a resposta. Contexto de Segunda Ordem é aquele com o qual o estudante é confrontado com uma situação realística e dele é esperado que encontre ferramentas matemáticas para organizar, estruturar e resolver a tarefa (DE LANGE, 1987). Esse tipo de contexto, segundo De Lange (1999), envolve matematização, enquanto que nos contextos de primeira ordem os problemas já são pré-matematizados. Contexto de Terceira Ordem como aquele que possibilita um “processo de matematização conceitual”, este tipo de contexto serve para “introduzir ou desenvolver um conceito ou modelo matemático” (DE LANGE, 1987, p. 76). A seguir apresentamos alguns exemplos de tarefas segundo a classificação do Uso do Contexto proposta por De Lange (1987) e por Dekker e Querelle (2002). Quadro 6 – Classificações a respeito do uso de contexto segundo Dekker e Querelle (2002). Uso do Contexto Ordem zero Primeira ordem Exemplo - A secção transversal de um copo de vinho tem a forma de (parte de) a sinusoide seguinte: 1 𝑦 = 3𝑠𝑖𝑛 𝑥 + + 3 2 Determinar o volume do presente vidroxxviii. - A chuva está caindo em um ângulo de 48 graus por causa do vento. Próximo a um edifício é encontrado um trecho seco a uma distância de 2 metros. Usando essa informação, calcule a altura do edifícioxxix. Fonte: Dekker e Querelle (2002). Para uma reunião escolar noturna são esperados 150 pais. Em cada mesa podem ser colocadas quatro cadeiras. Quantas mesas são necessárias? Mostre como você encontrou a sua respostaxxx. 150 Segunda ordem ―Este problema é realmente diferente de ‗calcule 4 ‘‖xxxi. Fonte: Dekker e Querelle (2002). Uma escada de três metros de comprimento é colocada contra a parede, um metro a partir da parte inferior da parede. Até que altura da parede a escada pode alcançarxxxii? Fonte: Dekker e Querelle (2002). 46 Aqui você vê o Problema Ônibus. Terceira ordem 1. Use setas para este problema. resposta: 4 37 2. Agora faça o seu próprio problemaxxxiii. Fonte: Dekker e Querelle (2002). Fonte: autora – com referência em Dekker e Querelle (2002). Segundo De Lange (1995), uma das funções mais características da instrução na RME é o uso dos contextos para formação conceitual, que está relacionado ao que chama de “processo de matematização conceitual”. De Lange (1995) explicita que, quando se trata de tarefas de testes, essa função do contexto não é sempre utilizada, pelo fato de que usualmente não são introduzidos novos conceitos durante um teste, mas são aplicados conceitos matemáticos de alguma forma. Nas tarefas de avaliação, então, são associadas, quase sempre, apenas as três primeiras classes de funcionalidades dos contextos. No quadro a seguir apresentamos alguns exemplos de tarefas, segundo a classe de funcionalidade do contexto, retirados de De Lange (1995). Quadro 7 – Classe de funcionalidade do contexto segundo De Lange (1995). Classe de funcionalidade de Contexto Exemplos - Que número representa 75% de: 1. nenhuma função: não há contexto. 2. o contexto é utilizado para “camuflar”, “vestir” o problema matemático. 3. o contexto exerce no problema uma função essencial e relevante. Fonte: De Lange (1995). - O fator de crescimento de um tipo de bactéria é 6 (por unidade de tempo). No momento há 4 bactérias. Calcular o momento em que haverá 100 bactérias. - O percentual de juros para um ano é de oito por cento. R$4.000 são depositados no tempo t0 . Em que momento esse montante aumentará para R$5.000? - Bill pesava 107 quilos no verão passado. Ele perdeu 4 quilos, e então ele ganhou 11 quilos. Quanto é que ele pesa agora? xxxiv Fonte: De Lange (1995). - Qual destes seria uma estimativa razoavelmente boa para a largura de uma sala de aula? ( ) 4 pés ( )10 pés ( ) 25 pés ( ) 300 pés 47 - Qual destas é a melhor estimativa para o comprimento da mesa de um professor? ( ) 4 pés ( ) 10 polegadas ( ) 2 pés ( ) 15 pés ( ) 20 pésxxxv Fonte: De Lange (1995). Fonte: autora – com referência De Lange (1995). Com base nos três níveis de funcionalidade de contexto apresentados por De Lange (1995), Meyer et al (2001, p. 523) destacam cinco papéis do contexto no ensino e aprendizagem da matemática que são muitas vezes interativos: motivar os alunos para explorar nova matemática; oferecer aos alunos a oportunidade de aplicar a matemática; servir como uma fonte de matemática nova; sugerir uma fonte de estratégia de solução; fornecer uma âncora para a compreensão matemática. De Lange (1999) ainda destaca que nas tarefas de avaliação uma variedade de contextos é necessária, bem como uma gama de funções: a variedade é necessária para minimizar a chance de apresentar questões e fenômenos que não são culturalmente relevantes. A gama de funções para os contextos necessita maior elaboração por causa dos efeitos sobre o que estamos medindo relacionado a essa funçãoxxxvi (1999, p. 27). No que diz respeito à importância da utilização de problemas de contexto, Dekker e Querelle (2002) apresentam cinco razões: a) para introduzir um novo assunto ou conceito em matemática – por meio de exemplos dentro de um contexto, o conteúdo matemático envolvido se torna claro; b) para praticar um novo conceito ou procedimento – resolvendo muitos problemas de contexto diferentes com mesmo conteúdo matemático, os alunos aprendem a usar e aplicar o conteúdo; c) para mostrar o poder da matemática – ao compreender que diferentes problemas de contexto podem envolver o mesmo conteúdo matemático; d) para envolver os alunos no problema – usando problemas da vida real, os alunos podem mostrar que são matematicamente alfabetizados e que sabem como a matemática é usada para resolver problemas práticos que surgem em situações da vida real. 48 Borasi (1986) em uma tentativa de clarificar o conceito de “problema” faz uma análise de vários exemplos de problemas a partir de quatro conceitos relacionados: (a) a formulação de um problema, isto é, a definição da tarefa a ser executada, (b) o contexto em que o problema está inserido, (c) o conjunto de soluções adequadas, (d) os métodos de abordagem que poderiam ser empregados na resolução do problema. De acordo com os quatro conceitos relacionados e suas características, a autora classifica os problemas em sete categorias52. Apresentamos no quadro a seguir as categorias apresentadas por ela e sua relação com o contexto (item b)53 e exemplos. Quadro 8 – Agrupamento a respeito do tipo de contexto conforme Borasi (1986, p. 134, tradução nossa). Rótulo (1) Exercício (2) Problema de palavra (3) Problema Enigma Contexto (1) Inexistente (2) Totalmente explícito no texto (2) Totalmente explícito no texto Exemplos (x) Encontre o resultado de 4 × 2 + 6 × 3.xxxvii (i) Maria comprou um hambúrguer por $0.90 e uma coca por $0.30 dólares. Se a taxa local sobre as vendas é de 5%, como, quanto ela deverá receber, se ela der ao caixeiro $2,00?xxxviii (KANTOWSKI, 1981 apud BORASI, 1986). (v) Seis palitos de fósforos devem ser montados para formar quatro triângulos equiláteros congruentes nos quais cada lado é igual ao comprimento dos palitos.xxxix (SCHEERER, 1963 apud BORASI, 1986). (vii) Prove que a fórmula: (4) Prova de uma conjectura (3) Apenas parcialmente no texto - teorias conhecidas são assumidas para qualquer par de números naturais n e m fornece todas as soluções integrais da forma xl (5) Problema da vida real (3) Apenas parcialmente no texto (6) Situação54 problemática (3) Apenas parcialmente no texto - problemático 52 (iv) A esposa de Hans está morrendo. Um farmacêutico descobriu um remédio que pode curar a sua doença, mas vende-o por um preço que Hans não pode pagar. Hans deveria roubar o remédio?xli (KOHLBERG, 1981, p. 12 apud BORASI, 1986). (ii) Você está no final de sua terceira década de vida, os seus filhos estão bem na escola, seu marido está criando um nome para si próprio na sua profissão e você está aborrecida.xlii Apesar de Borasi (1986) identificar suas classificações em categorias, neste trabalho preferimos pensá-las como agrupamentos. 53 Apresentamos aqui apenas o item (b), e os itens (a), (c) e (d) na seção seguinte. 54 Entendemos que Borasi (1986) chama de Situação uma tarefa que não apresenta explicitamente uma questão, pergunta. A tradução é literal e diferente do significado que atribuímos para “situação” ao longo do nosso texto. 49 (ADAMS, 1974, p. 21 apud BORASI, 1986 ). (vi) Considere a seguinte ternária Pitagóricaxliii; (7) Situação (4) Apenas parcialmente no texto – não problemático (BROWN-WALTER, 1970 apud BORASI, 1986). Fonte: autora – com referência em Borasi (1986). Segundo esta classificação, a existência de contexto parece estar relacionada com o “grau” em que uma situação é apresentada no enunciado. Para Borasi (1986), o contexto, de uma forma mais geral, diz respeito à “situação na qual o problema está embutido” (BORASI, 1986, p. 129). O projeto PISA, segundo o documento INEE (2005), pretende dar possibilidade de que a intuição e a compreensão matemática dos estudantes sejam avaliadas em diferentes “situações55”. Os documentos do PISA (OECD, 2003; OECD, 2004a; OECD, 2006; OECD, 2010), em geral, classificam as situações em quatro ou cinco grupos. Para o PISA (OECD, 2006), a situação é a parte do mundo do estudante em que as tarefas se situam e está localizada a uma certa distância do estudante. A situação mais “próxima” é a vida pessoal do estudante, em seguida vêm a vida escolar, a vida profissional e de lazer, depois a comunidade local e a sociedade. Situações científicas são as mais distantes. As características dos diferentes tipos de situação apresentados pelos documentos do PISA (OECD, 2003; OECD, 2004a; OECD, 2006; OECD, 2010) são sistematizadas no quadro a seguir. Quadro 9 – Agrupamento a respeito do Tipo de Situação segundo o PISA (DE LANGE, 2003; INEE, 2005, OECD, 2010). Agrupamento de situação Algumas considerações Relacionada com as atividades diárias dos alunos (INEE, 2005). Pessoal ou uso privado Pessoal – Problemas classificados na categoria de contexto pessoal focam sobre as atividades do “eu”, da família ou seu grupo de pares. Os tipos de contextos que podem ser considerados pessoais incluem (mas não estão limitados a) os que envolvem a preparação de alimentos, compras, jogos, transporte pessoal de saúde, esportes, viagens e agendamento pessoal e finanças pessoaisxliv (OECD, 2010). “Nos termos da vida pessoal nós incluímos, dependendo da idade, jogos, programação diária, esportes, compras, poupança, relações interpessoais, finanças, votação, mapas de leitura, mesas de leitura, saúde, seguros, e assim por diante xlv”. 55 Em alguns documentos também chamadas de “contextos”. 50 (DE LANGE, 2003, p. 80, tradução nossa). “Relacionam-se com as atividades cotidianas dos estudantes. Tratam da maneira como um problema matemático afeta diretamente o indivíduo e como o indivíduo percebe o contexto do problema. Essas situações tendem a demandar alto grau de interpretação para que o problema seja resolvido” (OECD, 2005, p. 41). Refere-se à comunidade local ou mais ampla, com a qual os estudantes observam um determinado aspecto de seu entorno (INEE, 2005). Requer dos alunos compreensão, conhecimento e habilidades matemáticas para avaliar os aspectos de uma situação externa com repercussões importantes na vida pública. Pública Social – Problemas classificados na categoria de contexto social focam em sua comunidade (seja local, nacional ou global). Eles podem envolver (mas não estão limitados a) coisas como sistemas de votação, transportes públicos, governo, políticas públicas, demografia, publicidade, estatísticas e economias nacionais. Embora os indivíduos estejam envolvidos em todas estas coisas de uma forma pessoal, na categoria de contexto social o foco dos problemas está na perspectiva da comunidadexlvi (OECD, 2010). “Na comunidade local, vemos o cidadão inteligente fazer julgamentos apropriados, tomar decisões, avaliar conclusões, juntar dados e fazer inferências, e adotar uma atitude crítica – observando o raciocínio por trás das decisões” xlvii (DE LANGE, 2003, p. 80, tradução nossa). “Requerem que os estudantes observem algum aspecto da vizinhança. Há situações localizadas na comunidade que tratam essencialmente da maneira como os estudantes compreendem relações entre elementos de sua vizinhança. Elas exigem que os estudantes ativem sua compreensão, seus conhecimentos e suas habilidades em matemática para avaliar aspectos de uma situação externa que pode ter algumas consequências” (OECD, 2005, p. 41). Refere-se ao ambiente de trabalho (INEE, 2005). Ocupacional ou Profissional Ocupacional – Problemas classificados na categoria de contexto ocupacional estão centrados no mundo do trabalho. Itens categorizados como ocupacionais podem envolver (mas não estão limitados a) coisas como medição, custo e pedido de materiais para construção, folha de pagamento/contabilidade, controle de qualidade, programação/inventário, design / arquitetura, e tomadas de decisão relacionadas ao trabalho. Contextos ocupacionais podem dizer respeito a qualquer nível da força de trabalho, de trabalho não qualificado para os níveis mais elevados de trabalho profissional, apesar de os itens do estudo PISA serem acessíveis a estudantes de 15 anos de idadexlviii (OECD, 2010). “Trabalho e lazer envolvem raciocínio, compreensão de dados e de estatísticas, finanças, impostos, riscos, taxas, amostras, programação, padrões geométricos, representações bi e tridimensionais, orçamentos, visualizações, e assim por diantexlix” (DE LANGE, 2003, p. 80, tradução nossa). “Surgem na vida do estudante na escola ou em um ambiente de trabalho. Tratam essencialmente da maneira como o ambiente escolar ou de trabalho pode exigir que o estudante enfrente determinado problema que requer uma solução matemática” (OECD, 2005, p. 41). (Refere-se às situações ocupacionais e escolares). Refere-se às atividades escolares (INEE, 2005). Educacional “Vida escolar [está] relacionada ao entendimento do papel da matemática na sociedade, eventos escolares (por exemplo, esportes, times, programação), dados 51 para compreensão, computadores, e assim por diante”l (DE LANGE, 2003, p. 80). É mais abstrata e pode implicar a compreensão de um processo tecnológico, uma interpretação teórica ou um problema especificamente matemático (INEE, 2005). Científicos – Problemas classificados na categoria de contexto científico relacionam-se com a aplicação da matemática ao mundo natural e as questões e temas relacionados à ciência e tecnologia. Contextos particulares podem incluir (mas não estão limitados a) áreas tais como condições meteorológicas ou clima, ecologia, medicina, ciência espacial, genética, medição, e o próprio mundo da matemáticali (OECD, 2010). Científica “Para funcionar como um cidadão inteligente, indivíduos precisam ser letrados em muitos campos, não só em matemática. A utilização de situações científicas ou contextos em aulas de matemática não deveria ser evitada por si, mas um pouco de cuidado deve ser tomado. Se nós tentarmos ensinar para os estudantes as competências certas, mas usar o contexto errado, nós estaremos criando um problema, e não resolvendo”lii (DE LANGE, 2003, p. 80, tradução nossa). “São mais abstratas e podem envolver a compreensão de um processo tecnológico, de uma situação teórica e ou de um problema explicitamente matemático. A estrutura de matemática do PISA inclui nesta categoria situações matemáticas relativamente abstratas com as quais os estudantes frequentemente se defrontam em uma aula de matemática, e que consistem inteiramente de elementos matemáticos explícitos, sem que se faça nenhuma tentativa para situar o problema em um contexto mais amplo. Ocasionalmente, estes contextos são identificados como „intramatemáticos‟” (OCDE, 2005, p. 41). Fonte: autora. Embora algumas descrições utilizem a palavra “categoria”, consideramos os tipos de situação como agrupamentos devido à não limitação de uma tarefa a um único tipo de situação. O uso de situações nos contextos das tarefas de matemática do PISA está relacionado à possibilidade de fornecer um contexto autêntico56 para o uso da matemática. Segundo De Lange (2002), “a literacia matemática é avaliada por dar aos estudantes tarefas „autênticas‟, baseadas em situações que, embora às vezes fictícias, representam os tipos de problemas encontrados na vida real” (DE LANGE, 2002, p. 33, tradução nossa). 2.2.2 Caracterizações dos tipos de tarefas Esta seção tem como intuito apresentar algumas caracterizações a respeito da formulação de itens: no que diz respeito ao tipo de problema/tarefa, ao tipo de item, à formulação da pergunta e possibilidades de soluções. 56 Autêntico no sentido de fazer sentido, de ser legítimo para o estudante, não necessariamente verdadeiro. Ainda que seja um contexto de conto de fadas, por exemplo, que seja razoável com os fatos, fundamentado em algo. 52 De acordo com McIntosh e Jarrett (2000), na Resolução de Problemas, os alunos deveriam ser responsáveis por muitas decisões que, no “passado”, eram da responsabilidade de professores e livros didáticos. Segundo esses autores, ao aluno cabe decidir que método ou procedimento irá utilizar, que estratégias tem possibilidade de desenvolver, contar com suas experiências anteriores, desenhar uma linha de raciocínio, arquitetar uma resolução autonomamente ou com seus pares. Ao professor, cabe a responsabilidade de selecionar e lhes propor “boas” tarefas. Com isso, o professor deve criar condições para que os alunos possam envolver-se, significativamente, com os problemas (MCINTOSH; JARRETT, 2000). Para além de fornecer respostas corretas, a Resolução de Problemas preocupa-se com os meios para a obtenção das respostas, com a elaboração de conhecimento por meio da tarefa proposta. Nesse sentido, consideramos importante para o professor conhecer os benefícios de conhecimento das tarefas, os possíveis métodos de solução, a pertinência das múltiplas respostas, os conceitos envolvidos, a familiaridade do estudante com a tarefa e/ou o que lhe é solicitado em relação ao conteúdo ou às competências. Consideramos que a escolha das tarefas, seja em uma situação de aula ou de avaliação, deva estar fortemente associada aos objetivos didáticos, que determinarão que tarefas são potenciais para atingi-los. Quando o objetivo do professor for, por exemplo, avaliar o desempenho dos estudantes na aplicação e/ou repetição de técnicas já conhecidas, uma boa escolha é a proposição de tarefas rotineiras, com as quais os alunos tenham alguma intimidade e possam demonstrar suas habilidades, com pouca chance de terem como obstáculo a interpretação das mesmas. Apresentamos no quadro a seguir algumas definições/características para as tarefas do tipo rotineiras ou não-rotineiras. Em seguida, um exemplo para cada tipo de tarefa. Quadro 10 – Tarefas rotineiras e não-rotineiras. Tipo de Tarefa Algumas explanações Tarefas que são frequentes nas salas de aula e nos livros didáticos (BURIASCO, 1999). Rotineira Frequente nos livros didáticos, que quase sempre envolvem apenas conhecimentos memorizados e técnicas operatórias (PARANÁ, 2001). Habitualmente, exercícios de repetição e consolidação de técnicas, e de aplicação direta de conhecimento (SANTOS, 2004). “As tarefas rotineiras, vulgarmente designadas por exercícios, não são, normalmente, geradoras de grande discussão entre os alunos, uma vez que o modo 53 de resolução assenta num algoritmo já conhecido destes” (MENEZES, 1999, s.n.). Exercícios de rotina são organizados para proporcionar prática em uma determinada técnica matemática que, normalmente, acabou de ser demonstrada para o alunoliii (SCHOENFELD, 1992). Tarefas rotineiras (exercícios): exercícios de identificação e de tradução de uma linguagem para outra, realização de algoritmos (“contas”), exercícios de aplicação (problemas de palavras) (PONTE; SERRAZINA, 2000). A atividade resultante de tarefas de rotina contribui para consolidar cognitivamente conhecimentos e destrezas já adquiridos (PONTE; SERRAZINA, 2000). Tarefas que são muito pouco ou quase nunca frequentes nas salas de aula e nos livros didáticos (BURIASCO, 1999). Entendem-se por experiências matemáticas de aprendizagem situações que aos olhos dos alunos são não-rotineiras e que apresentam certo nível de complexidade. Entre elas, podemos ter a resolução de problemas, tarefas de investigação, realização de projetos e jogos (SANTOS, 2003b). Tarefas não-rotineiras: problemas de processo, investigações, projetos, jogos (PONTE; SERRAZINA, 2000). Não-rotineira A realização de tarefas não-rotineiras proporciona condições para um desenvolvimento cognitivo no qual: novo conhecimento subjetivo é construído pelo aluno; itens de conhecimento adquirido anteriormente são reconhecidos e avaliados pelo aluno e são reorganizados e reestruturados num corpo de conhecimento mais alargado (PONTE; SERRAZINA, 2000). Problemas não rotineiros, na RME, são situações genuínas de resolução de problema, para as quais o estudante terá de trazer todo o conhecimento informal e as estratégias que ele possui (GRAVEMEIJER, 1994). Os problemas não rotineiros incluem “problemas de processo” (problemas para os quais não há nenhum algoritmo padrão para extrair ou representar a informação dada) e problemas com informação supérflua ou insuficiente. A instrução foca em problemas passíveis de estratégias particulares e inclui jogos (SCHOENFELD, 1992). Fonte: autora. Exemplos Tarefa Rotineira: (PARANÁ, 2001) Num pacote pequeno de bolacha ―Tostadinhas‖ cabem 28 bolachas. Quantas bolachas serão necessárias para encher 250 pacotes do mesmo tamanho? a) 700 b) 5740 c) 7000 d) 278 54 Tarefa Não-Rotineira: Figura 1 – Exemplo de uma tarefa não-rotineira. Fonte: OECD (2005, p. 82). De acordo com o Quadro 10, sintetizando características de tarefas ou nãorotineiras, concluímos que as classificações limitam-se, quase sempre, à familiaridade do estudante com a tarefa proposta; quando conhecida, acaba sendo praticamente um “exercício” ao passo que quando não “familiar”, por alguma razão, quase sempre tem o caráter de problema. Entretanto, parece não haver uma distinção assim tão clara entre as duas ideias. Butts (1997) apresenta uma classificação para cinco tipos típicos de problemas (para nós, tarefas) que podem ajudar estender o entendimento a respeito da familiaridade com problemas de matemática. Apresentamos, no quadro a seguir, os tipos de tarefa segundo a classificação de Butts (1997), seguidos de suas definições e exemplos. Quadro 11 – Classificação de Butts (1997). Tipo de tarefa A – Exercício de reconhecimento Definição Usualmente, pede ao “resolvedor” para reconhecer ou recordar um fato específico, uma definição ou enunciado de um teorema. Exemplos Quais das seguintes expressões são polinômios? a) 𝑥 3 + 3𝑥 + 2 b) 𝑥 3 + 3 𝑥 + 2 c) 𝑥 3 + 3𝑥 + 2 d) 𝑥 3 + 3/𝑥 + 2 e) 2 55 Fonte: Butts (1997, p. 34). B – Exercícios algorítmicos C – Problemas de aplicação D – Problemas de pesquisa aberta E – Situação Problema Exercícios que podem ser resolvidos com um procedimento passo a passo, frequentemente, um algoritmo numérico. Envolvem algoritmos aplicativos. Os problemas tradicionais caem nesta categoria, exigindo sua resolução: (a) formulação do problema simbolicamente e depois (b) manipulação dos símbolos mediante algoritmos diversos. Problemas de pesquisa aberta são aqueles em cujo enunciado não há uma estratégia para resolvê-los. Usualmente, tais problemas expressam-se por: “prove que”, “encontre todos”, ou “para quais”, mais outras muitas variações. Neste subconjunto não estão incluídos “problemas” propriamente ditos, mas situações, nas quais uma das etapas decisivas é identificar o(s) problema(s) inerente(s) à situação. Calcule: 16 + 4. −2 − 6 + 3 . Fonte: Butts (1997, p. 34). Uma bolsa com moedas de 5, 10 e 25 centavos contém 435 moedas no valor de 43,45 dólares. Há três vezes mais moedas de 10 do que de 25. Quantas moedas de cada tipo estão na bolsa? Fonte: Butts (1997, p. 35). Quantos triângulos diferentes, de lados inteiros, podem ser construídos de modo que o(s) lado(s) maior(es) tenha(m) 5 cm de comprimento? 6 cm? 𝑛 cm? Em cada caso, quantos são isósceles? Fonte: Butts (1997, p. 35). Esboce um estacionamento de carros. Seguem alguns problemas pertinentes que poderiam ser considerados. Há muitos e muitos outros. a) Que tamanho deverá ter cada boxe? b) Qual o ângulo a ser observado para marcar cada boxe? c) Quanto deverá ser cobrado por carro, por hora, se deseja obter um lucro de 10%? Fonte: Butts (1997, p. 36). Fonte: autora – com referência em Butts (1997, p. 32-44). De acordo com Butts (1997), uma alta porcentagem de exercícios e problemas propostos em livros didáticos recai nas três primeiras categorias que quase sempre contém em seu enunciado uma estratégia para resolvê-los. O obstáculo, então, a resolver é a tradução da tarefa para uma forma matemática apropriada e, então, a aplicação de algoritmos adequados. Borasi (1986) também apresenta uma classificação para problemas (tarefas) de matemática orientada por conceitos relacionados: “exercício”, “problemas” ou “situação” com base no contexto57, tipo de formulação, soluções e métodos de abordagem. Essa classificação é apresentada no quadro a seguir. 57 Apresentado na seção anterior. 56 Quadro 12 – Classificação de Problemas – Borasi (1986). Tipo da tarefa Formulação Soluções Sobretudo única e exata Sobretudo única e exata Exercício Única e explícita Problema de palavra58 Única e explícita ProblemaEnigma Única e explícita Sobretudo única e exata Prova de uma conjectura Única e explícita Geralmente, mas não necessariamente única Parcialmente dada – muitas alternativas possíveis. Muitas implicitamente Situação sugeridas – uma problemática explicita pode ser dada Inexistente - nem mesmo Situação implicitamente Fonte: Borasi (1986, p. 134, tradução nossa). Problema da Vida real Muitas possíveis – apenas soluções aproximadas Muitas possíveis A criação de um problema Métodos de abordagem Combinação de algoritmos conhecidos Combinação de algoritmos conhecidos Elaboração de um novo algoritmo – ato de reformulações-reflexivas. Reformulação do contexto – reformulações – elaboração de novos algoritmos Reformulação do contexto – reformulações – criação de um modelo Reformulação do contexto – reformulações – problematização Problematização. De acordo com Borasi (1986), uma análise da natureza dos problemas (tarefas) é necessária para avaliar e explorar seu alcance e a significância na área da educação. Dada a natureza complexa e discutível do tópico, o objetivo é iniciar um inquérito para estimular o debate, além de fornecer respostas definitivas (BORASI, 1986). No que diz respeito à formulação da tarefa e as possibilidades de solução, podemos acrescentar uma classificação apresentada por documentos do PISA (OECD, 2004b; OECD, 2004c; OECD, 2005) com relação aos tipos de itens. No quadro a seguir, apresentamos os diferentes tipos de itens segundo os documentos citados, seguido de suas características e exemplos. Quadro 13 – Tipos de item (OECD, 2004b; OECD, 2004c; OECD, 2005). Tipo de Item Múltipla Escolha 58 Características - Envolve a escolha de uma alternativa das apresentadas. - A resolução trata-se apenas de indicar uma resposta. “Estes itens solicitavam aos estudantes que fizessem um círculo em uma letra para indicar uma opção entre quatro ou cinco alternativas, Exemplos (OECD, 2004c). Questão 22: EXPORTAÇÕES M438Q02 Qual foi o valor das exportações de sumos de fruta da Zedelândia, em 2000? A 1,8 milhões de zedes. B 2,3 milhões de zedes. C 2,4 milhões de zedes. D 3,4 milhões de zedes. E 3,8 milhões de zedes. O que diferencia aqui “problema de palavra” e “exercício” é que este não apresenta contexto algum em seu enunciado. 57 Múltipla Escolha Complexa Resposta de Construção Fechada Resposta Curta Resposta de Construção Aberta cada uma delas podendo ser um número, uma palavra, uma frase ou uma sentença” (OECD, 2005, p. 335). - Envolve escolher as alternativas de vários itens propostos. - Para cada item os alunos devem escolher uma resposta para cada opção apresentada. - São do tipo: falso/verdadeiro; sim/não. “Nestes itens os estudantes fizeram uma série de opções, geralmente binárias. Os estudantes indicaram suas respostas fazendo um círculo em uma palavra ou em uma frase curta (por exemplo, sim ou não) para cada ponto” (OECD, 2005, p. 335). - Sem alternativa. - Permite a construção livre de respostas com limite fechado de respostas aceitáveis. - Os tipos de respostas são similares às dos tipos de respostas em múltipla escolha (respostas simples, rápidas e curtas). Mas não são apresentadas as alternativas. - São facilmente avaliáveis. “Estes itens exigiram que os estudantes construíssem suas próprias respostas, havendo uma variedade limitada de respostas aceitáveis” (OECD, 2005, p. 335). - Sem alternativa. - Similar ao item de construção fechada com maior amplitude de possibilidades de respostas possíveis. - Respostas breves. “Assim como nos itens de respostas de construção fechada, os estudantes deveriam fornecer respostas breves, havendo, porém, ampla variedade de respostas possíveis” (OECD, 2005, p. 335). - Exigem respostas mais longas, sofisticadas, como pedido de explicação, argumentação, justificativa, opinião, pontos de vista, relacionamento de ideias, conexões, reflexão. “Normalmente, estes itens solicitavam aos estudantes que Fonte: OECD (2004c, p. 84). Questão 12: DADOS DE JOGAR M555Q02 Fonte: OECD (2004c, p. 76). Questão 21: EXPORTAÇÕES M438Q1 Qual foi o valor total (em milhões de zedes) das exportações da Zedelândia, em 1998? Resposta: ......................................... Fonte: OECD (2004c, p. 83). Questão 23: ESCADA M547Q01 A figura seguinte representa uma escada de 14 degraus, que tem uma altura total de 252 cm. Profundidade total 400 cm Qual é a altura de cada um dos 14 degraus? Altura: ................. cm. Fonte: OECD (2004c, p. 85). Questão 17: CAMINHANDO M124Q3 O Bernardo sabe que o comprimento do seu passo é de 0,80 metros. A fórmula aplica-se ao caminhar do Bernardo. Calcule, em metros por minuto e em quilómetros por hora, a velocidade a que o Bernardo caminha. Apresente os cálculos que 58 relacionassem informações ou idéias efectuar. contidas no texto de estímulo com sua própria experiência ou opinião, Fonte: OECD (2004c, p. 79). sendo que a aceitabilidade dependeria mais da habilidade para usar o que leram ao justificar ou explicar tal posição, do que da posição tomada pelo estudante” (OECD, 2005, p. 335). Fonte: autora. Os tipos de itens apresentados pelo PISA dizem respeito, especificadamente, às tarefas de avaliação. Entretanto, podem servir para estender uma discussão no que diz respeito às tarefas de sala de aula de modo geral. Kirkley (2003)59 apresenta três agrupamentos de problemas no que concerne às suas características de resolução e possibilidades de resposta que são apresentados no quadro a seguir. Quadro 14 – Tipos de Problema segundo Kirkley (2003). Tipo de Problema Problemas bem estruturados Definição Problemas que sempre usam a mesma solução passo a passo. Características - A estratégia de solução é usualmente previsível - Convergente (uma resposta certa) - Todas as informações de partida são, usualmente, parte do enunciado do problemalv. Problemas moderadamente estruturados Problemas que exigem uma variedade de estratégias e adaptações para se adequar a contextos particulares. - Muitas vezes, é aceitável mais do que uma estratégia de solução. - Convergente (uma resposta certa). - Frequentemente devem ser recolhidas informações necessáriaslvi. Equilibrar um talão de Projetar uma planilha, cheques, seguindo uma escrever uma carta, e receita, e resolver um Exemplos planejar uma chamada de enigma de palavras vendas. cruzadas. Fonte: autora – com referência em Kirkley (2003, p. 8, tradução nossa). 59 Problemas estrutura imperfeita Problemas com objetivos vagos e imprecisos. Estratégias de solução, menos restritasliv. - Solução não está bem definida ou previsível. Múltiplas perspectivas, objetivos e soluções. - Não existe uma solução única e bem definida; pode não haver uma solução totalmente satisfatória a todos. - Frequentemente devem ser recolhidas informações necessáriaslvii. Pintar um retrato, projetar uma ponte, e criar um novo programa de computador. Com base em Newell e Simon (1972) - NEWELL, A.; SIMON, H. Human Problem Solving. Englewood Cliffs, NJ: Prentice Hall, 1972. 59 Com base nas classificações apresentadas nessa seção, buscamos, na seção de análise do material, realizar uma leitura das tarefas investigadas para conhecê-las em suas características e promover uma possível discussão a respeito de suas potencialidades. 2.2.3 A respeito das características das tarefas Considerando que não deve haver diferenças entre tarefas de sala de aula e de avaliação, conforme discutido anteriormente, reconhecemos que há, no entanto, diferenças no que diz respeito aos seus objetivos, contexto de aplicação, duração das tarefas, autonomia. Com isso, consideramos que algumas características de bons problemas (tarefas) de avaliação, na perspectiva da RME, indicadas por Van den Heuvel-Panhuizen (1996, 2005), também devem ser consideradas para as tarefas de sala de aula. Para a autora, bons problemas de avaliação devem ser informativos, significativos, transparentes, elásticos/flexíveis, acessíveis. O caráter informativo é relativo à possibilidade de fornecer o máximo de informações a respeito do conhecimento dos estudantes, insights, competências, incluindo suas estratégias, procedimentos, formas de raciocínio. Em outras palavras, problemas informativos devem fornecer uma “imagem” quanto mais completa possível do aprendizado dos estudantes. Para que os estudantes possam mostrar suas formas genuínas de lidar com os problemas, as situações problemáticas devem ser significativas. Isto significa que os problemas devem ser convidativos, que valham a pena resolver, desafiadores, e que sua solução seja útil para o fornecimento de uma ou várias respostas. Uma forma de avaliar se um problema é significativo reside nas respostas das perguntas: o estudante pode se sentir o “dono” do problema, aquele que domina a situação? Ele pode, a partir da situação, se colocar a pensar a respeito de questões próprias? Por outro lado, para que os problemas sejam significativos do ponto de vista da avaliação, eles devem refletir objetivos importantes, se alguma coisa não apresenta motivo para ser aprendida, então não é útil para a avaliação (VAN DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 1996). Para que o caráter significativo possa se revelar, os problemas devem ser antes acessíveis aos estudantes. Isto significa que devem ser tão claros quanto possível, de forma que os estudantes possam, pelo menos, refletir a respeito do assunto nele envolvido. Isto não significa que devem sugerir estratégias ou indicação de solução, mas permitir que o estudante possa, ao seu nível, revelar alguma forma pela qual abordaria o problema. 60 Ao encontro da acessibilidade dos problemas o caráter de transparência deve permitir ao estudante mostrar o nível em que se encontra. Nesse sentido, um problema não pode ser tão fechado a ponto de ser resolvido por uma única maneira, de modo a impedir que o estudante demonstre suas “habilidades”, ainda que seja por meio de seus métodos informais. Para que a avaliação seja tão transparente quanto possível, o caráter de flexibilidade e elasticidade sugere que os problemas possam ser resolvidos por diferentes estratégias, em diferentes níveis de aprendizagem. Os alunos devem ter a oportunidade de dar suas respostas por suas próprias palavras (VAN DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 1996). No âmbito dessas características de bons problemas de avaliação o papel dos contextos é essencial, pois “comparado com problemas numéricos simples, problemas de contexto oferecem aos estudantes mais oportunidades de demonstrar suas habilidades” (VAN DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 1996, p. 94). No entanto, não é apenas o fato de apresentar alguma “situação” ou “contexto” no texto do problema que o faz tornar-se mais flexível. Para Van den Heuvel-Panhuizen (2005), os “problemas de palavras” são frequentemente confundidos com problemas de contexto. Para essa autora, os problemas de palavras refletem um contexto não muito essencial. Frequentemente, nesse tipo de problema, o contexto é utilizado apenas para “camuflar”, “embalar” um contexto matemático. Nesse sentido, é possível “despir” facilmente o “problema matemático” envolvido na situação realizando “simples traduções” para linguagem simbólica. Tão inflexíveis quanto os problemas de palavras podem ser, os problemas “crus60”, “despidos” são aqueles que não envolvem contexto algum que não seja o matemático. Esses problemas dão pouca liberdade na forma de abordagem. Quase sempre, formulam-se a partir de expressões como “resolva as seguintes equações”, “qual o par ordenado é solução para o sistema”. Para De Lange (1999) esses tipos de problemas devem ser evitados. De Lange (1999), considerando as características para bons problemas de avaliação, na perspectiva da RME, apresenta uma “pirâmide de avaliação” para fornecer uma imagem visual dos problemas que são necessários para representar o processo no qual um estudante se encontra. 60 Do inglês “bare problem”. 61 Figura 2 – Pirâmide de Avaliação proposta por De Lange (1999, tradução nossa). Fonte: autora – traduzida e adaptada de Shafer e Foster (1997, p. 3). No Nível I, as tarefas demandam resumidamente competências relacionadas à reprodução como: reconhecer fatos, aplicar algoritmos conhecidos, desenvolver habilidades técnicas, reconhecer equivalências, recordar objetos matemáticos e propriedades, realizar procedimentos de rotina. As tarefas nesse nível, geralmente, são do tipo de Múltipla Escolha, Múltipla Escolha Complexa, de Resposta de Construção Fechada (DE LANGE, 1999). Geralmente, as questões são isoladas sem muita ligação com situações reais ou imaginárias. As tarefas de Nível II envolvem competências de conexão. Demandam que os estudantes lidem com diferentes formas de representação de acordo com a situação, integrem informações, sejam capazes de distinguir e relacionar diferentes declarações, de decodificar e interpretar linguagem simbólica ou formal, bem como relacioná-las com a linguagem natural, formular e resolver problemas e situações (DE LANGE, 1999). Nesse nível, há exigência de alguma forma de matematização. As tarefas nesse nível são, geralmente, do tipo de Resposta Curta ou Resposta de Construção Fechada. Segundo De 62 Lange (1999), frequentemente, as tarefas deste tipo são colocadas “dentro” de um contexto de envolver os alunos na tomada de decisão matemática. As tarefas de Nível III (reflexão) envolvem a matematização de situações que, segundo De Lange (1999), reside no conhecimento e extração da matemática envolvida, bem como sua utilização para a resolução do problema. Envolvem análise, interpretação, desenvolvimento de modelos e estratégias, proposição de questões, apresentação de argumentação, provas, generalizações, incluem ainda reflexão a respeito de todo o processo (DE LANGE, 1999). Tarefas do tipo de Resposta de Construção Aberta são mais características desse nível. De Lange (1999) salienta que a definição dos três níveis é uma ação um tanto arbitrária dado que não há uma distinção tão clara entre os diferentes níveis. Pode ocorrer de alguma tarefa, em algum nível, incorporar habilidades e competências associadas a outro nível. A pirâmide fornece uma imagem visual “justa” da quantidade de tarefas necessárias para representar o desempenho dos estudantes (DE LANGE, 1999). Assim concentra-se em uma quantidade maior no Nível I, seguida pelos dois outros níveis, considerando que o tempo e qualidade do “lidar” com tarefas do Nível III são, relativamente, “maiores” do que nas tarefas de nível II e I. Nos diferentes níveis as tarefas ainda podem variar de “simples” a “complexas61” ou ainda do tratamento “informal” para o “formal”. 2.2.4 Constituindo uma tarefa A proposta desta subseção é apresentar alguns significados assumidos por nós para falar do nosso objeto de estudo: tarefas de matemática. Acreditamos ser importante apresentá-los, pois os significados de alguns termos muitas vezes se confundem e, na literatura, por vezes, são assumidos termos diferentes com os mesmos significados, ou com mesmos nomes e significados diferentes. Tarefa, enunciado, contexto, questão, situação, problema, resolução, solução são termos que cercam nosso objeto de estudo. As características aqui assumidas não têm objetivo de defini-los, mas de apenas explicitá-los, a fim de podermos conversar a 61 No original, o autor utiliza os termos “fácil” e “difícil” que consideramos serem relativos à forma como o sujeito enfrenta as tarefas. Acreditamos ser mais coerente a utilização dos termos simples e complexos pelo fato dessas características serem associadas às tarefas e não aos sujeitos. 63 respeito deles. Além dos autores citados para fundamentar suas características, foram estudadas as definições apresentadas em alguns dicionários O estudo relativo aos termos foi feito sobre definições apresentadas em dicionários da Língua Portuguesa, de termos linguísticos, etimológicos, de Filosofia e Psicologia, nas seguintes obras: Lalande (1953), Mora (1971), Xavier e Mateus (1992), Corominas e Pascual (1996), Blackburn (1997), Doron e Parot (2001), Cunha, (2003), Trask (2004) e Houaiss (2009). Enunciado: conjunto de elementos que formam a exposição de uma tarefa. Composto de itens escritos ou gráficos. Enunciados dos livros didáticos que estão “postos” e são independentes do sujeito “resolvedor”. Questão: pergunta, interrogação, proposta ou matéria a examinar que suscita ou provoca alguma discussão ou ação do sujeito. Nem sempre a questão precisa ser uma pergunta. Contexto: conjunto de circunstâncias inter-relacionadas que formam uma trama para expressar um fato ou uma situação e que contribuem para a sua significação. Encadeamento de ideias presentes em um texto. De uma forma mais geral, diz respeito à “situação na qual o problema está embutido” (BORASI, 1986, p. 129). Situação: indica o estado em que algo está, muitas vezes determinado pelo tempo, espaço, condições. Problema: a proposição que o sujeito internaliza, aquela que toma para si ao estabelecer relações entre o que conhece e o que interpreta do enunciado. Um problema é uma situação em que “resolvedor” não tem um procedimento ou algoritmo que conduzirá certamente a uma solução (KANTOWSKI, 1981, apud BORASI, 1986). Tarefa matemática: qualquer proposição oral, textual e/ou gráfica formada por enunciado que suscite um desenvolvimento matemático. A questão pode ser dada explicitamente no texto ou pode ser inferida, “realizada” pelo sujeito. Atividade: conjunto de ações do qual o estudante lança mão ao resolver um problema. Resolução: conjunto de estratégias e procedimentos que o sujeito desenvolve na tentativa de 64 solucionar um problema. Solução: resposta a um problema investigado. Estratégia: De acordo com Hadji (1994, p. 47), pode “entender-se por estratégia a orientação geral das operações e dos meios a utilizar. [...]. Em sentido lato, o termo designa um conjunto de ações coordenadas tendo em vista uma finalidade”. Procedimento: Está relacionado ao processo de desenvolvimento da estratégia. Segundo Dalto (2007, p. 38), se, por exemplo, um estudante utiliza-se de uma “estratégia algébrica” para resolver um problema, um dos procedimentos que pode ser utilizado é uma equação, ou uma função, ou sistemas de equações. 2.2.5 A respeito de uma sua caracterização De posse das classificações e considerações a respeito de tarefas de matemática apresentadas nas seções anteriores, buscamos um entrelaçamento para lançar uma leitura a respeito das tarefas que selecionamos para este estudo. Assim, apresentamos um primeiro62 esquema que representa as relações que estabelecemos a priori (antes da análise) a respeito da literatura estudada. 62 Este foi o primeiro, porque ao longo do desenvolvimento da tese, o esquema foi se modificando. 65 Figura 3 – Esquema representativo das relações criadas com a literatura estudada. Fonte: autora. Da rede das relações estabelecidas podemos apresentar algumas considerações. Dado um conjunto de tarefas de matemática, podemos classificá-las pelos tipos de item (destacados na cor laranja). Analisando o enunciado de cada tarefa, do ponto de vista do contexto, podemos classificá-la como de contexto estritamente matemático ou não apenas matemático. Quando recai no contexto estritamente matemático, o tipo de contexto que o descreve é o Puramente Matemático, segundo a definição de Díaz e Poblete (2005). Quando recai no contexto não apenas matemático, pode se dividir em três agrupamentos: Real, Realista e Fantasioso63, utilizando as definições de Díaz e Poblete (2005). 63 Traduzido do verbete espanhol Fantasista. 66 Quando o contexto é do tipo não apenas matemático, provavelmente, remete a situações do cotidiano ou do imaginário do estudante. Para agrupar as tarefas, de acordo com as situações que elas apresentam, podemos nos basear nas classificações apresentadas pelos documentos do PISA (OECD, 2003; OECD, 2004a; OECD, 2006; OECD, 2010) destacadas na cor verde. Quando o contexto da tarefa é do tipo estritamente matemático, não identificamos situação nele, neste primeiro momento. Sendo de contexto estritamente matemático ou não, as tarefas podem ser agrupadas em Exercício ou Problema. Quando é um exercício de contexto estritamente matemático, identificamo-lo como da categoria Exercício de Borasi (1986). A tarefa que é do tipo exercício com contexto não apenas matemático foi identificada com a categoria Problemas de Palavras de Borasi (1986). Já as tarefas, consideradas como do tipo problema, e de contexto não apenas matemático, podem ser agrupadas, a nosso ver, nas cinco categorias de Borasi (1986): Problema Enigma, Problema da Vida Real, Prova de uma conjectura, Situação Problemática, Situação. 67 3 ESCLARECENDO AS REGRAS A maioria dos estudos relativos à avaliação da matemática escolar desenvolvidos no interior do GEPEMA até o presente momento fez uso da produção escrita de estudantes e professores de matemática para conhecer os modos pelos quais lidavam com enunciados de tarefas de matemática em situação de avaliação, quais conhecimentos apresentavam, estratégias, procedimentos, possíveis interpretações, dificuldades, obstáculos didáticos ou epistemológicos. Das dissertações (20) e teses (2) produzidas por participantes do GEPEMA, 14 dissertações e duas teses utilizaram como objeto de estudo a produção escrita dos sujeitos investigados. Esta investigação tem interesse de investigar os enunciados de tarefas de matemática para contribuir para análise da produção escrita. Seguirá uma abordagem qualitativa de cunho interpretativo sob as orientações presentes na análise de conteúdo (BARDIN, 2004), à luz de pressupostos teóricos da avaliação como prática de investigação; da análise da produção escrita como ferramenta para a avaliação como prática de investigação; da Educação Matemática Realística como quadro de referência para a análise dos enunciados e contextos de tarefas de matemática; da análise de Problemas (BORASI, 1986; BUTTS, 1997; e outros). 3.1 OBJETIVO GERAL Apresentar um quadro de referência para a leitura de enunciados de tarefas matemáticas com base na perspectiva da Educação Matemática Realística, no sentido de conhecer suas características. 3.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS Apresentar um quadro de referência com base na perspectiva da Educação Matemática Realística que permita “ler” as tarefas de matemática selecionadas; analisar algumas de suas potencialidades e limitações; 68 construir um panorama da classificação destas tarefas; identificar, inventariar e analisar as características das tarefas do livro didático estudado tomando como base o atendimento à classificação dos autores escolhidos; confrontar a potencialidade destas tarefas com a oportunidade de aprendizagem que deriva delas. 3.3 AMBIENTE DE ESTUDO Como um dos objetivos foi o de analisar enunciados de tarefas de matemática, utilizamos um livro didático64 de matemática como fonte para a recolha de dados. O critério utilizado para a escolha do livro didático que contém as tarefas a serem analisadas foi o de ser o mais utilizado no Ensino Fundamental, com base em um levantamento feito pelo Núcleo Regional de Educação de Londrina dos livros didáticos adotados pelas escolas estaduais em 2011. Para a análise, selecionamos as tarefas relativas ao “conteúdo estruturante” Mudança e Relações65 (OECD, 2003), da série correspondente ao oitavo ano do Ensino Fundamental. Segundo o PNLD (BRASIL, 2010b), os conteúdos de matemática dos livros didáticos para o Ensino Fundamental são organizados em cinco campos: Números e Operações; Geometria; Tratamento da Informação; Álgebra; Grandeza e Medidas. Pelo fato de o GEPEMA ter dedicado seus estudos com mais frequência a respeito do conteúdo estruturante “Mudança e Relações”, selecionamos as seções relativas à “Álgebra” para análise das tarefas. Dos conteúdos relativos ao campo “Álgebra” o livro didático selecionado apresenta as seguintes seções: introdução ao cálculo algébrico; estudo dos polinômios; estudo das frações algébricas; equações do primeiro grau com uma incógnita; porcentagem e juros simples; sistema de equações do primeiro grau com duas incógnitas. Para esta análise escolhemos a seção do livro do oitavo ano, que diz respeito a Sistema de Equações do Primeiro Grau com Duas Incógnitas. Esta escolha se deu pela hipótese de que seria a seção que envolveria maior diversidade de situações e possibilidades de exploração de contexto. 64 GIOVANNI, J. R.; CASTRUCCI, B.; GIOVANNI J. R. Jr. A conquista da matemática. Ed. Renovada. São Paulo: FTD, 2007. (7ª. Série, 8º ano). 65 O PISA (OECD, 2003) organiza os conteúdos de matemática em quatro conteúdos estruturantes: Quantidade, Espaço e forma; Mudança e Relações; Incerteza. 69 A seção selecionada está dividida pelos autores da obra em três partes: 1. Equação do 1º grau com duas incógnitas; 2. Sistema de Equações do 1º grau com duas incógnitas; 3. Resolução de um Sistema de Equações do 1º grau com duas incógnitas. 3.4 PROCEDIMENTOS DE ANÁLISE As etapas que resumem os procedimentos de análise são: exploração do livro didático a ser analisado, levantamento e sistematização do conteúdo; seleção da seção a ser analisada; levantamento das tarefas presentes na seção; resolução de todas as tarefas; análise e classificação das tarefas de acordo com a literatura que fundamenta este estudo; construção de agrupamentos das tarefas de acordo com suas classificações; análise de um exemplo de tarefa para cada grupo construído. Foi realizada uma primeira leitura do livro didático para conhecer o material, como o autor apresenta o conteúdo, as tarefas, como estrutura as seções por meio de exemplos, de exercícios, problemas. Com isso, fizemos um levantamento dos diferentes tipos de subseções em cada seção: Explorando: com exemplos de problemas resolvidos para “apresentação” do conteúdo a ser estudado; Exercícios: que quase sempre seguem análogos aos exemplos anteriormente apresentados; Desafios: tarefas que o autor julga instigante aos estudantes; Resolvendo problemas: com exemplos resolvidos de problemas de “aplicação” do conteúdo estudado; Tratando a Informação; apresenta algum contexto relacionado ao conteúdo estudado com ênfase no “tratamento estatístico” como leitura e/ou construção de gráficos e tabelas; Brasil Real: em que apresenta alguma situação do contexto brasileiro para ser tratado por meio do conteúdo matemático apresentado na seção; Chegou a sua vez: que oferece exercícios de aplicação quase sempre relacionados às sessões Desafio, Tratando a Informação e Brasil Real; 70 Retomando o que aprendeu: com um apanhado de exercícios tratados na seção. A seção que selecionamos para o estudo possui todas essas subseções. Das três partes em que é dividida a seção Sistema de Equações do Primeiro Grau com Duas Incógnitas, selecionamos apenas as tarefas presentes na terceira (Resolução de um Sistema de Equações do 1º grau com duas incógnitas) por considerar que as duas primeiras (Equação do 1º grau com duas incógnitas; Sistema de Equações do 1º grau com duas incógnitas) possuíam apenas tarefas de preparação (procedimentais) para a última parte. Desse levantamento resultou o seguinte quadro: Quadro 15 – Relaciona a quantidade de tarefas com o tipo de subseção apresentada no livro analisado. Tipo66 Exemplos Exercícios Desafio Resolvendo Problemas Brasil Real Tratando a Informação Retomando o que aprendeu Total Quantidade 8 24 4 2 3 5 8 54 Fonte: autora. Para o estudo, descartamos as tarefas apresentadas como exemplo e ficamos com todas as outras (46) por termos interesse na análise das tarefas que são “propostas” aos estudantes. Realizado o levantamento das tarefas presentes em cada seção, na próxima etapa foram resolvidas todas as 46 tarefas e inventariados os conteúdos relacionados e procedimentos matemáticos necessários para a resolução de cada tarefa. Esta etapa foi necessária para obter familiaridade e conhecimento a respeito do material estudado. O procedimento seguinte tratou de codificar as tarefas de acordo com a seção da qual fazia parte, ordem de apresentação na seção, ordem na contagem geral das tarefas. Foi, ainda, indicada para cada tarefa a página que consta no livro didático e a quantidade de subitens. Desse procedimento obtivemos um quadro do qual apresentamos um recorte como exemplo: 66 Os nomes das subseções são originais do livro didático. 71 Quadro 16 – Exemplo da codificação das tarefas. Subseção E1 D1 RP1 B1 B1 TI1 RA1 Fonte: autora. Ordem na subseção 01 02 01 01 02 05 01 Tarefa na contagem geral T01 T09 T10 T27 T28 T38 T39 Código Página E10101 D10209 RP10110 B10127 B10228 TI10538 RA10139 181 185 186 189 189 192-193 193 Quantidade de itens 8 1 2 1 1 1 1 A leitura do Quadro 16 exige a compreensão do uso dos códigos. Por exemplo, o código D10209 é constituído por três elementos (D1 – 02 – 09) que referem: o elemento D1 indica que a tarefa é da primeira subseção de Desafio (D); o elemento seguinte (02) indica que nessa subseção de desafio é a segunda tarefa apresentada; o terceiro elemento (09) indica que é a nona tarefa na contagem geral das 46 tarefas presentes na seção. A letra “E” refere-se à seção “Exercícios, as letras “RP” à seção Resolvendo Problemas, “B” à seção “Brasil Real”, “TI” à seção “Tratando a Informação” e “RA” à seção “Retomando o que aprendeu”. A próxima etapa foi a de analisar e organizar as tarefas de acordo com algumas classificações apresentadas pelos autores. As tarefas foram agrupadas por semelhança de acordo com os critérios67 estabelecidos para cada classificação. As classificações realizadas foram relativas à (ao): 1. Tipo de contexto de Díaz e Poblete (2005). 2. Ordem do contexto de De Lange (1987). 3. Tipo de Problema de Borasi (1986). 4. Tipo de Problema de Butts (1997). 5. Tipo de Situação dos documentos do PISA. 6. Tipo de Item dos documentos do PISA. 67 Os critérios são discutidos nas seções de análise. 72 7. Tipo rotineira ou não-rotineira. A partir da análise do material foi construída uma planilha que contém todas as informações técnicas extraídas para cada tarefa, bem como suas classificações. A análise dessa planilha e dessas classificações deu origem a alguns agrupamentos. Apresentamos na seção de análise as classificações realizadas as quais foram separadas em dois eixos: um que diz respeito ao contexto e tipo de problema (classificações 1, 2, 3 e 4 – apresentadas em 4.1) e outro que diz respeito às características da tarefa (classificações 5 e 6 – apresentadas em 4.2). Agrupamos, então, as classificações realizadas em 4.1. Desse agrupamento resultaram oito grupos que são apresentados em 4.3. A partir desse agrupamento formado, apresentamos um mapeamento das características obtidas do conjunto das tarefas à luz da literatura estudada. Desses oito grupos formados e apresentados em 4.3, decidimos apresentar em 4.4 a análise de um exemplo de tarefa para cada grupo formado. Salientamos que as possibilidades de agrupamentos dessas classificações são muitas. Nesta tese estamos apresentando um agrupamento e uma possibilidade de análise. 73 4 JOGANDO Nesta seção, apresentamos a análise das tarefas selecionadas para este estudo, segundo os procedimentos metodológicos descritos na seção 3. 4.1 DO CONTEXTO DAS TAREFAS Esta subseção apresenta a leitura interpretativa que fizemos das 46 tarefas selecionadas para o estudo. Nesta análise as tarefas foram classificadas tendo por base as proposições de: 1. Díaz e Poblete (2005); 2. De Lange (1987); 3. Problema de Borasi (1986); 4. Butts (1997). 4.1.1 Classificação das tarefas a partir da leitura interpretativa feita a partir do texto de Díaz e Poblete Apresentamos a seguir o quadro resultante da 1ª. classificação das tarefas de acordo com o contexto de Díaz e Poblete (2005). Quadro 17 – Classificação 1. Classificação segundo o contexto (DÍAZ; POBLETE, 2005) Quantidade Código das tarefas 0 - Problema de contexto realista 27 T09, T10, T11, T14, T15, T16, T17, T18, T19, T20, T21, T22, T23, T24, T27, T28, T29, T34, T35, T36, T37, T38, T40, T41, T42, T43, T45 Problema de contexto fantasioso 0 - Problema de contexto puramente matemático 19 T01, T02, T03, T04, T05, T06, T07, T08, T12, T13, T25, T26, T30, T31, T32, T33, T39, T44, T46 Problema de contexto real Total Fonte: autora. 46 74 Das 46 tarefas analisadas não foram identificadas tarefas que correspondessem a contextos reais (que dependessem de intervenções/informações da realidade dos alunos) ou estritamente fantasiosos (que remetessem ao mundo da fantasia, ficção científica, com pouca relação à realidade). As 27 tarefas consideradas como de contexto realista indicavam alguma referência na realidade, ainda que artificial. A “fronteira” que separa as tarefas de contexto real e contexto realista parece indefinida. Como critério, consideramos que o problema de contexto real deveria envolver alguma informação “extra”, vinda do contexto da realidade dos alunos, da escola, comunidade. Como as 27 tarefas que faziam alguma referência à realidade tinham todas as informações no próprio enunciado, sem necessidade de pesquisa, foram classificadas como Problema de contexto realista. A Figura 4 representa uma das tarefas do material analisado. Figura 4 – Tarefa classificada como Problema de contexto realista (T11). Fonte: Giovanni et al (2007, p. 187). Foram classificadas como Problema de contexto puramente matemático as tarefas que não faziam referência alguma à realidade dos estudantes ou ao mundo da fantasia. Essas tarefas apresentavam no enunciado expressões do tipo “resolva o sistema”, “determine a solução do sistema de equações”, “o par ordenado (x,y) é a solução do sistema”. Como exemplo, apresentamos a Figura 5 a seguir. 75 Figura 5 – Tarefa classificada como Problema de contexto puramente matemático (T06). Fonte: Giovanni et al (2007, p. 185). 4.1.2 Classificação das tarefas a partir da leitura interpretativa feita a partir do texto de De Lange (1987) No Quadro 18 apresentamos o levantamento da classificação das tarefas de acordo com os critérios para a ordem de contexto propostos por De Lange (1987). Quadro 18 – Classificação 2. Classificação com base na ordem de contexto (DE LANGE, 1987) Quantidade Código das tarefas Ordem zero 2 T16, T23 Primeira ordem 7 T3, T08, T27, T28, T34, T35, T36 Segunda ordem 20 T09, T10, T11, T14, T15, T17, T18, T19, T20, T21, T22, T24, T25, T29, T38, T40, T41, T42, T43, T45 Terceira ordem 0 - Sem ordem alguma68 17 T01, T02, T03, T04, T05, T06, T07, T12, T13, T26, T30, T31, T32, T33, T39, T44, T46 Total Fonte: autora. 46 Começamos justificando a criação de mais um item para essa classificação (sem ordem alguma). De acordo com a classificação de De Lange (1987), os contextos parecem servir para relacionar a matemática com alguma referência na realidade. Como há 19 tarefas que foram indicadas como de contexto puramente matemático na classificação anterior, acrescentamos esse item. Consideramos que, apesar de o contexto ser “puramente 68 Essa designação não faz parte da classificação de De Lange (1987). 76 matemático” (que apresenta apenas elementos na linguagem matemática), ele não deixa de ter referência na realidade, pois tarefas desse tipo fazem parte, por exemplo, da realidade escolar das aulas de matemática. Segundo a classificação de De Lange (1987), os contextos parecem ser classificados como de ordem zero, primeira e segunda ordem, quando envolvem alguma situação extramatemática. No caso em que a tarefa apresenta situação intramatemática, parece não se adequar aos critérios de classificação das ordens do contexto de De Lange (1987). Por isso, a criação do item “Sem ordem alguma”. Nesse grupo, foram indicadas 17 das 19 tarefas, antes classificadas com contexto puramente matemático. Dessas 19 tarefas classificadas como puramente matemáticas, classificamos as outras duas, uma como contexto de Primeira Ordem (T08) e outra como de Segunda Ordem (T25), pela relevância e necessidade do contexto apresentado para a resolução da tarefa, ainda que fosse puramente matemático. Figura 6 – Tarefa classificada como Problema de contexto puramente matemático e de primeira ordem (T08). Fonte: Giovanni et al (2007, p. 185). 77 Figura 7 – Tarefa classificada como Problema de contexto puramente matemático e de segunda ordem (T25). Fonte: Giovanni et al (2007, p. 189). Das 27 tarefas classificadas como de contexto realista, 2 foram consideradas como de ordem zero, 6 como de primeira ordem, 19 como de segunda ordem. As tarefas consideradas como de ordem zero apresentam situações que, embora remetam a algo conhecido pelos estudantes como “tábuas”, “marceneiro”, “prateleiras”, parecem não promover a necessidade de serem resolvidas, sendo artificiais, servindo apenas para “embalar” os sistemas de equações envolvidos nas tarefas. A Figura 8 exemplifica uma delas. Figura 8 – Tarefa classificada como Problema de contexto realista e de ordem zero (T16). Fonte: Giovanni et al (2007, p. 187). 78 As tarefas consideradas como de primeira ordem apresentam contextos mais relevantes em relação às tarefas de ordem zero tornando o contexto necessário e útil para a emissão de uma resposta. Essas tarefas exigem baixa demanda de matematização, sendo resolvidas com procedimentos matemáticos simples e, possivelmente, já conhecidos dos estudantes. Como exemplo, apresentamos a Figura 9 (Tarefa T27). Figura 9 – Tarefa classificada como Problema de contexto realista e de primeira ordem (T27). Fonte: Giovanni et al (2007, p. 189). Foram consideradas como tarefas de contexto de segunda ordem, as tarefas que, além de apresentarem contexto relevante e útil para avaliação e emissão de uma resposta, exigiam um certo nível de matematização, ainda que apenas horizontal. Todas as tarefas envolviam a tradução em linguagem matemática e a resolução de um sistema de equações lineares com duas ou três incógnitas. A Figura 10 é um exemplo deste tipo de tarefa. Figura 10 – Tarefa classificada como Problema de contexto realista e de segunda ordem (T22). Fonte: Giovanni et al (2007, p. 188). Nenhuma das tarefas foi classificada como de contexto de terceira ordem. 79 4.1.3 Classificação das tarefas a partir da leitura interpretativa feita a partir do texto de Borasi (1986) Apresentamos no Quadro 19 a terceira classificação das tarefas, realizada de acordo com os rótulos para classificação de Problemas de Borasi (1986). Quadro 19 – Classificação 3. Classificação (BORASI, 1986) Contexto Quantidade Exercício Inexistente 15 Problema de palavra Totalmente explícito no texto 27 Totalmente explícito no texto Apenas parcialmente no texto - teorias Prova de uma conhecidas são conjectura assumidas Problema da Apenas parcialmente no texto vida real Apenas parcialmente no Situação texto - problemático problemática Apenas parcialmente no Situação texto – não problemático Total Fonte: autora. Problema Enigma Código das tarefas T01, T02, T03, T04, T05, T06, T07, T26, T30, T31, T32, T33, T39, T44, T46 T09, T10, T11, T14, T15, T16, T17, T18, T19, T20, T21, T22, T23, T24, T27, T28, T29, T34, T35, T36, T37, T38, T40, T41, T42, T43, T45 4 T08, T12, T13, T25 0 - 0 - 0 - 0 - 46 Comparando com a primeira classificação, realizada a partir de Díaz e Poblete (2005), na qual das 19 tarefas consideradas como contexto puramente matemático, pela classificação de Borasi (1986) 15 foram identificadas como Exercício69 e 4 como Problema Enigma70 (T08, T12, T13, T25) nessa classificação. As 15 classificadas como Exercício foram, na classificação 2, indicadas como sem ordem alguma. Das quatro tarefas, classificadas como Problema Enigma, duas foram identificadas segundo a classificação 2 como sem ordem alguma (T12, T13). As outras tarefas (T08 – figura 6, T25 – figura 7) foram classificadas como de contextos de Primeira e Segunda 69 Exemplo de Exercício – ver T06 (figura 5). Possuem contexto explícito no texto que se diferem do Problema de Palavra por serem de contexto puramente matemático. 70 80 Ordem, respectivamente. Essas duas tarefas foram ainda consideradas como sendo as duas únicas não-rotineiras de toda a amostra das 46 tarefas. Figura 11 – Tarefa classificada como Problema de contexto puramente matemático e sem ordem alguma e Problema Enigma (T12). Fonte: Giovanni et al (2007, p. 187). As 27 tarefas que foram classificadas como de contexto realista (na primeira classificação) foram classificadas como Problema de Palavra, que, apesar de terem caráter de exercício, com formulação única e explícita, apresentam contexto explícito no texto. Figura 12 – Tarefa classificada como Problema de contexto realista e Problema de Palavra (T43). Fonte: Giovanni et al (2007, p. 193). Como os contextos necessários para a resolução das tarefas estavam sempre presentes no texto do enunciado, nenhuma tarefa foi classificada como Prova de uma conjectura, Problema da vida real, Situação problemática ou Situação, de acordo com Borasi (1986). 4.1.4 Classificação das tarefas a partir da leitura interpretativa feita a partir do texto de Butts (1997). No quadro a seguir apresentamos a quantidade e os códigos das tarefas classificadas segundo a proposição de Butts (1997). 81 Quadro 20 – Classificação 4. Classificação (BUTTS, 1997) Quantidade Código das tarefas A – Exercício de reconhecimento 1 T26 B – Exercícios algorítmicos 14 T01, T02, T03, T04, T05, T06, T07, T30, T31, T32, T33, T39, T44, T46 C – Problemas de aplicação 29 T09, T10, T11, T12, T13, T14, T15, T16, T17, T18, T19, T20, T21, T22, T23, T24, T27, T28, T29, T34, T35, T36, T37, T38, T40, T41, T42, T43, T45 D – Problemas de pesquisa aberta 2 T08, T25 E – Situação-Problema Fonte: autora. 0 - Nessa última classificação, tendo por referência Butts (1997) foram consideradas como Exercícios algorítmicos71 14 tarefas, as quais foram interpretadas ainda como de contexto puramente matemático (pela 1ª. classificação), sem ordem alguma (pela 2ª. classificação) e Exercício (pela 3ª. classificação). Uma tarefa que apresentou o mesmo perfil d estas 14, nas três primeiras classificações, foi classificada, nessa quarta, como Exercício de reconhecimento, apresentada a seguir. Figura 13 – Tarefa classificada como Exercício de Reconhecimento (T2672). Fonte: Giovanni et al (2007, p. 189). Das 29 tarefas consideradas como Problema de Aplicação, 27 são de contexto realista (1ª. classificação) e de segunda ordem (2ª. classificação). As outras duas são as citadas como Problema Enigma na 3ª. classificação e como sem ordem alguma na 2ª. classificação. Foram constatadas, com base na classificação de Butts (1997), duas tarefas (T08 - figura 6, T25 - figura 7) classificadas como Problema de pesquisa aberta, as quais foram interpretadas como de contextos de Primeira e Segunda Ordem, respectivamente, segundo De Lange (1987), ambas como Problema Enigma e não-rotineiras, analisadas a partir de Borasi (1986). 71 72 Exemplo – ver T06 (figura 5). Segue da tarefa 25 (T25 – figura 7). 82 Ao serem classificadas as tarefas a partir de Butts (1997) não foi identificada nenhuma tarefa como Situação Problema. 4.2 DAS CARACTERIZAÇÕES SEGUNDO TIPO DE SITUAÇÃO E TIPO DE ITEM Esta seção apresenta a leitura interpretativa que fizemos das 46 tarefas selecionadas para o estudo. Nessa análise as tarefas foram classificadas: pelo tipo de situação (DE LANGE, 2003; INEE, 2005, OECD, 2010); pelo tipo de item (OECD, 2005; OECD, 2004b; OECD, 2004c). Os Quadros 21 e 22 apresentam a quantidade e os códigos das tarefas classificadas quanto ao tipo de situação e tipo de item, respectivamente. Quadro 21 – Classificação 5. Agrupamento de situação Quantidade Código das tarefas Pessoal ou uso privado 12 Pública 8 Ocupacional ou Profissional 5 Educacional 2 T15, T19 19 T01, T02, T03, T04, T05, T06, T07, T08, T12, T13, T25, T26, T30, T31, T32, T33, T39, T44, T46, Científica Total T09, T10, T11, T14, T16, T17, T18, T20, T21, T38, T41, T43 T27, T28, T29, T34, T35, T36, T37, T45 T22, T23, T24, T40, T42 46 Fonte: autora. As 12 tarefas que foram identificadas como situações de ordem pessoal ou uso privado envolvem em seus enunciados situações como: “pesagem” em uma balança, divisão de um terreno para construção de casa e jardim, pontuação em partidas de voleibol ou outros esportes, comparação de preços de mercadorias de um supermercado. 83 As tarefas que foram classificadas como de situação Pública apresentam situações como: cálculo do índice de mortalidade infantil, variação percentual de produtos de cesta básica, preços da bilheteria de um cinema. As cinco tarefas com situações reconhecidas como Ocupacional ou Profissional em 5 tarefas apresentam situações como: encaixotamento de livros de uma editora, marcenaria, variação do preço de venda de um produto em duas lojas distintas, preço de venda e preço de custo em uma determinada loja, preço da assinatura de duas revistas de uma editora. Como situação de ordem Educacional foram identificadas duas tarefas: uma diz respeito a um torneio de basquete na escola e a outra diz respeito à inscrição de estudantes do curso de literatura inglesa em outro curso de língua espanhola. Foram identificadas como situações científicas73 as 19 tarefas que apresentam contexto puramente matemático. O que não significa que tarefas de situação científica estejam limitadas apenas aos enunciados puramente matemáticos. Uma tarefa poderia ser indicada nesta categoria envolvendo um contexto de ficção científica, por exemplo, sem ser estritamente matemática. Quadro 22 – Classificação 6. Tipo de Item Quantidade Código das tarefas Múltipla Escolha 8 T41, T43, T45, T40, T42, T39, T44, T46 Múltipla Escolha Complexa 0 - Resposta de Construção Fechada 36 T09, T10, T11, T14, T16, T17, T18, T20, T21, T38, T27, T28, T29, T34, T35, T36, T37, T22, T23, T24, T15, T19, T01, T02, T03, T04, T05, T06, T07, T08, T12, T13, T30, T31, T32, T33 Resposta Curta 2 T25, T26, Resposta de Construção Aberta 0 - Total Fonte: autora. 46 As oito tarefas identificadas como de Múltipla Escolha são apresentadas na última subseção, intitulada “Retomando o que aprendeu”. Todas as tarefas dessa subseção 73 “que consistem inteiramente de elementos matemáticos explícitos, sem que se faça [no enunciado] alguma tentativa para situar o problema em um contexto mais amplo. Ocasionalmente, estes contextos são identificados como „intramatemáticos‟” (OCDE, 2005, p. 41). 84 consistem na resolução de um sistema de duas (ou três) equações lineares e duas (ou três) incógnitas e apresentam, cada uma, cinco alternativas, das quais apenas uma é a correta. As outras 36 tarefas classificadas como de Resposta de Construção Fechada também consistem na resolução de um sistema de duas (ou três) equações lineares e duas (ou três) incógnitas e admitem apenas uma resposta correta. Entretanto, nessas tarefas não há a apresentação de alternativas. As duas tarefas classificadas como Resposta Curta são tarefas que envolvem a investigação de um determinado sistema, podendo assumir uma multiplicidade de respostas diferentes, motivo pelo qual foram indicadas nessa categoria. Não foram identificadas tarefas de Múltipla Escolha Complexa e de Resposta de Construção Aberta. 4.3 DOS AGRUPAMENTOS FORMADOS A PARTIR DAS PRIMEIRAS ANÁLISES (4.1) Tendo realizado as análises e classificações descritas em 4.1, elaboramos o Quadro 23 o qual permite visualizar os oito grupos distintos que puderam ser formados a partir destas classificações. Os grupos foram nomeados de A até H. Quadro 23 – Construção dos grupos dos diferentes tipos de tarefas segundo as classificações realizadas em 4.1. 1ª. Classificação 2ª. Classificação 3ª. Classificação 4ª. Classificação Totais Exercícios algorítmicos (14) A (14) Exercício de Reconhecimento (1) B (1) Problema de aplicação (2) C (2) Exercício (15) Tarefas (46) Contexto Puramente Matemático (19)74 Sem ordem (17) Problema Enigma (2) 74 (x) quantidade “x” de tarefas neste item. 85 Contexto realista (27) Ordem 1 (1) Problema Enigma (1) Problema de pesquisa aberta (1) D (1) Ordem 2 (1) Problema Enigma (1) Problema de pesquisa aberta (1) E (1) Ordem 0 (2) Problema de Palavra (2) Problema de aplicação (2) F (2) Ordem 1 (6) Problema de Palavra (6) Problema de aplicação (6) G (6) Problema de Palavra (19) 46 Problema de aplicação (19) 46 Ordem 2 (19) Total Fonte: autora. 46 46 H (19) 46 Com relação ao primeiro esquema (que informamos antes da análise – Figura 3), no esquema da Figura 14, deixamos em colorido apenas os tipos de tarefas que surgiram nessa análise e em cinza os tipos de tarefas que não apareceram. 86 Figura 14 – Esquema representativo das relações criadas com a literatura estudada após a análise. Fonte: autora. Com relação ao primeiro esquema (Figura 3), como houve apenas um tipo de contexto (Realista), adaptamos o tipo de situação “saindo” desse tipo de tarefa. Isto indica que não houve situações envolvidas (propostas) nas tarefas que fossem reais (efetivamente) ou fantasiosas. No esquema apresentado, destacamos em cinza as possibilidades de classificação de tarefas que não surgiram na amostra. No que diz respeito ao tipo de situação, no primeiro esquema (Figura 3) havíamos considerado que a situação científica surgiria apenas das tarefas de contexto realista e não consideramos que pudessem surgir, também, das tarefas de contexto puramente matemático. Contudo, após a análise, constatamos que todas as tarefas de contexto puramente matemático puderam ser identificadas como de situação científica. 87 Com isso, retiramos do esquema apresentado na Figura 14 os itens em cinza (pois não surgiram tarefas que exemplificassem esses itens). Com a retirada dos itens em cinza o esquema que representa apenas os tipos de tarefa que surgiram na análise é apresentado na Figura 15. Figura 15 – Esquema representativo das relações criadas a partir do conjunto das tarefas analisadas. Fonte: autora. A partir da análise realizada em 4.1 e do agrupamento apresentado no Quadro 23, construímos um esquema para representá-lo (Figura 16). 88 Figura 16 – Esquema representativo do agrupamento construído em 4.3. Fonte: autora. Consideramos que assim como as possibilidades de agrupamentos a partir das classificações são muitas, as possibilidades para representar as vias de classificação dessas tarefas são muitas também. Acreditamos que o importante é que a proposição de tarefas de matemática pertençam a diferentes grupos de modo que não valorizem apenas um ou alguns tipos de tarefas. 4.4 ANALISANDO TAREFAS INDIVIDUALMENTE (SUA CONSTITUIÇÃO) Nesta seção apresentamos as análises particulares de oito tarefas que são representativas dos grupos formados em 4.3. Em suma, são apresentadas informações a 89 respeito do contexto, do conteúdo envolvido, do tipo de tarefa, tipo de item, tipo de situação, competência envolvida. 4.4.1 Tarefa do GRUPO A – T05. A tarefa apresentada na Figura 17 é representativa do Grupo A. As catorze tarefas incluídas neste grupo possuem as mesmas classificações, com exceção em relação ao tipo de item. Onze são de Resposta de Construção Fechada e três são de Múltipla Escolha. Figura 17 – Tarefa T05. Fonte: Giovanni et al (2007, p. 185). A Tarefa 05 é classificada com um Exercício Algorítmico que, segundo a definição de Butts (1997), pode ser resolvida com um procedimento passo a passo. Segundo a classificação de Borasi (1986), a respeito de Exercício, neste tipo de tarefa o contexto é inexistente. No que diz respeito às classificações quanto à ordem de contexto de De Lange (1987), esta tarefa não foi classificada em nenhum tipo. Tanto Borasi (1986) quanto De Lange (1987) parecem identificar o contexto como aquele que fornece informações extramatemáticas. Apesar disso, consideramos a tarefa como de contexto estritamente matemático, que é convergente com a definição de Díaz e Poblete (2005) como de Contexto Puramente Matemático, pois se refere exclusivamente a objetos matemáticos: números, relações, operações. A tarefa é de Resposta de Construção Fechada, pois não apresenta alternativa e permite a construção livre de respostas com limite fechado de respostas 90 aceitáveis. Se considerarmos a tarefa como de contexto matemático, a situação envolvida também é estritamente matemática, identificada como do tipo Científica que, segundo o documento OCDE (2005), consiste de elementos matemáticos explícitos sem que se faça nenhuma tentativa para situar a tarefa em um contexto mais amplo. A tarefa é ainda do tipo rotineira, por ser frequente nas salas de aula e nos livros didáticos (BURIASCO, 1999), tanto que o Grupo A contém 14 tarefas desse tipo, que representa, aproximadamente, 30% das tarefas analisadas. Essas tarefas são identificadas com exigências de competências relacionadas à Reprodução, que, de acordo com De Lange (1999), envolve aplicar algoritmos conhecidos, desenvolver habilidades técnicas, reconhecer equivalências, recordar objetos matemáticos e propriedades, realizar procedimentos de rotina. Na pirâmide de De Lange (1999) se enquadraria no Nível I. A tarefa é classificada, com base em Borasi (1986), como um Exercício, pois no que diz respeito a: contexto: é inexistente. formulação: é única e explícita. Demanda que o estudante resolva o sistema apresentado para que, de posse dos valores numéricos das incógnitas envolvidas, resolva as operações solicitadas nos três itens a, b e c. soluções: são únicas e exatas. O par ordenado que resolve o sistema é (20,10) e os itens a, b e c têm como respostas únicas 200, 500 e 2, respectivamente. métodos de abordagem: combinação de algoritmos conhecidos, tais como: isolar as incógnitas, utilizar métodos de substituição, adição ou multiplicação para resolução de sistemas lineares. No quadro a seguir apresentamos um resumo das classificações desta tarefa. Quadro 24 – Resumo das classificações de T05. Tipo de Contexto Tipo de Tarefa Ordem de Contexto Tipo de Item Tipo de Situação Competência Rotineira ou não-rotineira Fonte: autora. Puramente Matemático Exercício (BORASI, 1986) Exercício algorítmico (BUTTS, 1997) Não há Resposta de Construção Fechada Científica Reprodução Rotineira 91 4.4.2 Tarefa do GRUPO B – T26 A tarefa T26 é a única do Grupo B, a qual é apresentada a seguir. Figura 18 – Tarefa T2675. Fonte: Giovanni et al (2007, p. 189). Com relação à classificação de Butts (1997), é identificada como Exercício de Reconhecimento, pois exige que os alunos identifiquem soluções semelhantes entre si. O contexto é Puramente Matemático (DÍAZ; POBLETE, 2005), pois envolve a comparação das relações matemáticas que foram criadas na tarefa antecedente. Com relação à classificação de Borasi (1986), consideramos mais próxima do tipo Exercício, pois no que diz respeito a: contexto: é inexistente, não depende de informações extramatemáticas. formulação: única e explícita. Exige que os alunos comparem suas resoluções. soluções: a solução para cada aluno é única. Embora as soluções entre os estudantes possam variar, dependendo das soluções obtidas na tarefa antecedente. métodos de abordagem: comparação e identificação. Quanto à ordem de contexto de De Lange (1987), esta tarefa não foi classificada em nenhum tipo, porque não demanda nenhum tipo de matematização. O tipo de resposta desta tarefa é Curta, em que não há alternativa, é similar à de construção fechada, mas há uma amplitude de respostas possíveis e respostas breves. A situação é identificada como do tipo Científica, pois envolve relações a partir de informações estritamente matemáticas. A competência associada é de Reprodução, porque demanda reconhecimento e identificação de respostas equivalentes. No quadro a seguir apresentamos um resumo das classificações desta tarefa. 75 Segue da tarefa 25 (T25 – figura 6). A Tarefa T25 faz parte do Grupo E (a ser apresentada mais adiante). 92 Quadro 25 – Resumo das classificações de T26. Tipo de Contexto Tipo de Tarefa. Ordem de Contexto Tipo de Item Tipo de Situação Competência Rotineira ou não-rotineira Fonte: autora. Puramente Matemático Exercício (BORASI, 1986) Exercício de reconhecimento (BUTTS, 1997) Não há Resposta de Construção Fechada Científica Reprodução Rotineira. 4.4.3 Tarefa do GRUPO C – T13 A tarefa T13 é uma das duas tarefas que fazem parte do Grupo C76. As duas tarefas receberam as mesmas classificações em todos os itens de análise. Figura 19 – Tarefa T13. Fonte: Giovanni et al (2007, p. 187). Diferente das tarefas dos grupos A e B, T13 foi considerada como um problema e não como exercício, tendo sido classificada como Problema de Aplicação (BUTTS, 1997) e Problema Enigma (BORASI, 1986). Segundo a definição de Butts (1997), os problemas tradicionais quase sempre caem no grupo Problema de Aplicação, exigindo para sua resolução a formulação simbólica do problema e manipulação dos símbolos mediante algoritmos diversos. O Problema Enigma difere do Problema de Palavra por ser de contexto puramente matemático. A tarefa é classificada com base em Borasi (1986) como um Problema Enigma, pois no que diz respeito a: 76 contexto: é totalmente explícito no texto. formulação: é única e explícita. A outra tarefa é T22 – ver Figura 10. 93 soluções: é única e exata. Os números que resolvem o problema são 87 e 23. métodos de abordagem: além dos algoritmos tradicionais para resolução de sistemas lineares, esta tarefa dá margem para exploração por meio de tentativa e erro, por exemplo. Pode envolver, também, a elaboração de um algoritmo para resolução de tarefas similares. A tarefa foi considerada ainda como de Resposta de Construção Fechada e Rotineira. A situação é científica por envolver apenas contexto matemático e, dependendo da exploração realizada pelo aluno, pode ser relacionada à competência de Reprodução (quando lança mão de procedimentos e algoritmos conhecidos) ou de Conexão (quando lança mão de procedimentos novos para sua resolução). Entretanto, consideramos ser mais típica deste tipo de tarefa a competência de Reprodução. No quadro a seguir apresentamos um resumo das classificações desta tarefa. Quadro 26 – Resumo das classificações de T13. Tipo de Contexto Tipo de Tarefa. Ordem de Contexto Tipo de Item Tipo de Situação Competência Rotineira ou não-rotineira Fonte: autora. Puramente Matemático Problema Enigma (BORASI, 1986) Problemas de aplicação (BUTTS, 1997) Não há Resposta de Construção Fechada Científica Reprodução Rotineira 4.4.4 Tarefa do GRUPO D – T08 A Tarefa T08 (vide Figura 20) é a única do grupo D. Apesar de ser de contexto puramente matemático, que não envolve situação extramatemática, pôde ser caracterizada como um Problema Enigma segundo a definição de Borasi (1986), que exige a elaboração de um algoritmo, reflexão. No que diz respeito a: contexto: é totalmente explícito no texto. Não necessita de informações extras. formulação: é única e explícita, qual seja, indicar o valor numérico das diferentes figuras do enigma. 94 soluções: é única e exata. métodos de abordagem: pode envolver sistematizar as equações e resolvê-las, segundo procedimentos conhecidos para resolução de sistemas lineares, elaborar algoritmos de resolução que contenha procedimentos simples de somar, subtrair, dividir, realizar tentativa e erro simulando resultados. Figura 20 – Tarefa T08. Fonte: Giovanni et al (2007, p. 185). É, também, considerada como um Problema de pesquisa aberta, conforme Butts (1997), por ser do tipo de tarefa em cujo enunciado não há uma estratégia para resolvêla. Geralmente, esse tipo de tarefa é expressa por “prove que”, “encontre todos”, “para quais”, entre outras variações. Esta tarefa foi classificada como contexto de primeira ordem, por apresentar situação que pode ser simplesmente traduzida em operações matemáticas simples e não demandar matematização77. Com relação ao tipo de item, a tarefa apresentada é classificada como um item de resposta de construção fechada, pois permite a construção livre de resoluções com 77 Estamos considerando o nível de escolaridade em que esta tarefa é empregada para afirmar que realizar operações matemáticas básicas para resolver a tarefa não se trata de um processo de matematização, uma vez que, possivelmente, já tenham sido matematizadas nos anos anteriores. 95 um limite fechado de respostas aceitáveis (nesse caso, uma apenas). Não apresenta alternativas de resposta e, para sua solução não há a necessidade explícita de apresentar os procedimentos de resolução, bem como justificativa de como foram pensados. A resposta é objetiva e curta. A situação é considerada científica por se tratar de uma tarefa especificamente matemática, que envolve apenas números, representações e operações matemáticas. A tarefa foi classificada como não-rotineira, pois apesar de ser de contexto estritamente matemático e envolver competências de reprodução, como reconhecer equivalências, realizar procedimentos de rotina, recordar objetos e propriedades matemáticas, procedimentos considerados típicos e comuns nas tarefas de matemática rotineiras, consideramos que o contexto é diferenciado por possibilitar uma flexibilidade de conteúdo. A tarefa que, inicialmente, tem o caráter de ser um sistema de equações é apresentada de uma forma diferenciada das tarefas consideradas rotineiras para este conteúdo, pois permite flexibilidade para elaboração de algoritmo e recorrência a outras estratégias de resolução que envolvam procedimentos conhecidos, como operações matemáticas básicas: adição, subtração, divisão. No quadro a seguir apresentamos um resumo das classificações desta tarefa. Quadro 27 – Resumo das classificações de T08. Tipo de Contexto Tipo de Tarefa Ordem de Contexto Tipo de Item Tipo de Situação Competência Rotineira ou não-rotineira Fonte: autora. Puramente Matemático Problema Enigma (BORASI, 1986) Problema de pesquisa aberta (BUTTS, 1997) Primeira Ordem Resposta de Construção Fechada Científica Reprodução Não-rotineira 4.4.5 Tarefa do GRUPO E – T25 A Tarefa T25 (item 1 da Figura 21), única do grupo E, foi classificada como de Segunda Ordem pela relevância do contexto apresentado, por ser útil para a resolução da tarefa e, também, por possibilitar matematização, apesar de o contexto ter sido considerado como puramente matemático. Consideramos que esta tarefa não é rotineira, porque, 96 frequentemente, nos livros didáticos as tarefas de enunciados puramente matemáticos não possibilitam matematização, e sim treinamento de técnicas. Figura 21 – Tarefa T25. Fonte: Giovanni et al (2007, p. 189). Segundo a classificação de Borasi (1986), classificamo-la como Situação Problemática, pois no que diz respeito a: contexto: é totalmente explícito no texto, embora seja problemático. formulação: é feita explicitamente. soluções: muitas possíveis. métodos de abordagem: pode envolver sistematizar as equações algébricas e reescrevê-las segundo procedimentos conhecidos para resolução de sistemas lineares, levantar hipóteses, testar conjecturas, simular e testar resultados, problematizar. Segundo a classificação de Butts (1997), a tarefa foi classificada como de Problema de Pesquisa Aberta. No que diz respeito ao tipo de item, foi a única tarefa classificada como de Resposta Curta, pois não apresenta alternativa de respostas, as respostas 97 são breves e com muitas possibilidades de resposta. Quanto ao tipo de situação classificamos como Científica. A tarefa foi classificada ainda com competências de Conexão, pois dá possibilidade para matematização, exige que os alunos lidem com informações numéricas e simbólicas e as interpretem, sugere tomada de decisão. No quadro a seguir apresentamos um resumo das classificações desta tarefa. Quadro 28 – Resumo das classificações de T25. Tipo de Contexto Tipo de Tarefa Ordem de Contexto Tipo de Item Tipo de Situação Competência Rotineira ou não-rotineira Fonte: autora. Puramente Matemático Problema Enigma (BORASI, 1986) Problema de pesquisa aberta (BUTTS, 1997) Segunda Ordem Resposta Curta Científica/Educacional Conexão Não-rotineira. 4.4.6 Tarefa do GRUPO F – T16 A tarefa T16 (apresentada na Figura 22) é uma das duas tarefas que estão presentes no grupo F. O contexto que embala a tarefa de resolver uma ou duas equações lineares envolve um fato que pode ocorrer na realidade, embora seja pouco provável que alguém precise, na prática, equacionar as medidas das partes de uma tábua para obtê-las, e, uma vez que medida a primeira parte (85 cm), por que não utilizar o mesmo procedimento para obter as outras duas partes? Pelo fato de o contexto se tratar apenas de uma simulação de realidade, ou parte dela, caracterizamo-lo como Realista conforme a definição de Diáz e Poblete (2005). Figura 22 – Tarefa T16. Fonte: Giovanni et al (2007, p. 187). Os tipos de tarefas que são utilizadas apenas para tornar o problema matemático parecido com uma situação da vida real são chamados por De Lange (1999) de 98 contexto falso ou de camuflagem, pois são, geralmente, irrelevantes para a resolução do problema e pouco possibilitam a matematização, sendo resolvidos, quase sempre, por uma simples tradução para a linguagem algébrica. Estes tipos de tarefas são classificados como de Contexto de Ordem Zero. Para Borasi (1986), uma tarefa com estas características recebe a denominação de Problema de Palavras. No caso desta tarefa, o que justifica esta classificação se deve ao fato de que: o contexto: é totalmente explícito no texto. a formulação: é única e explícita, qual seja, indicar as duas outras medidas da tábua. a solução: é única e exata. os métodos de abordagem: envolvem combinação de algoritmos conhecidos. Conforme Butts (1997), as tarefas tradicionais que exigem formulação do problema simbolicamente e manipulação dos símbolos mediante algoritmos diversos recebem a denominação de Problemas de Aplicação. Estes tipos de tarefas, além de tradicionais, são, ainda, frequentes nos livros didáticos e, portanto, as tarefas são classificadas como rotineiras. Quanto ao tipo de item, a tarefa é classificada como de Resposta de Construção Fechada e o tipo de situação é Pessoal ou de uso Privado. No que diz respeito ao agrupamento de competências, se situa no nível I, de Reprodução, por exigir apenas aplicação de algoritmos simples e conhecidos, desenvolver habilidades técnicas e realizar procedimentos rotineiros. No quadro a seguir apresentamos um resumo das classificações desta tarefa. Quadro 29 – Resumo das classificações de T16. Tipo de Contexto Tipo de Tarefa Ordem de Contexto Tipo de Item Tipo de Situação Competência Rotineira ou não-rotineira Fonte: autora. Realista Problema de Palavra (BORASI, 1986) Problemas de aplicação (BUTTS, 1997) Zero Ordem Resposta de Construção Fechada Pessoal ou uso privado Reprodução Rotineira. 99 4.4.7 Tarefa do GRUPO G – T34 As seis tarefas do grupo G receberam classificações similares às tarefas do grupo F com o diferencial de que estas foram classificadas com contexto de Primeira Ordem. Nesse tipo de tarefa o contexto apresentado é necessário e relevante para resolver o problema proposto, embora não necessite um processo de matematização sofisticada pelo fato de já ser pré-matematizado. O que caracteriza a tarefa T34 (da Figura 23) como pré-matematizada é que a equação necessária para resolver o problema já é dada na própria tarefa, o que resta ao estudante é a simples aplicação dos dados retirados da tabela, na fórmula dada, mediante manipulação da calculadora. Este tipo de tarefa é típico nos itens de avaliação que exigem competências de Reprodução. Figura 23 – Tarefa T3478. Fonte: Giovanni et al (2007, p. 192-193). Por ter referência em uma situação do tipo Pública situada em uma possível realidade, classificamos a tarefa T34 (exemplar para o grupo G) como de contexto Realista conforme Díaz e Poblete (2005). Segundo a classificação de Butts (1997), se assemelha aos Problemas de Aplicação. No que diz respeito à classificação de Borasi (1986), o contexto é totalmente explícito no texto, a formulação e a solução são únicas e exatas, e a abordagem é identificada com a manipulação de algoritmo conhecido. Estas características situam a tarefa T34 no agrupamento dos Problemas de Palavras. O tipo de item é de Resposta de Construção Fechada e a tarefa é rotineira. No quadro a seguir apresentamos um resumo das classificações desta tarefa. 78 Na página anterior a esta tarefa é dada uma tabela com uma lista de produtos de supermercado com seus respectivos preços coletados em duas datas distintas. Além disto, é dada uma equação para calcular a variação percentual dos preços. 100 Quadro 30 – Resumo das classificações de T34. Tipo de Contexto Tipo de Tarefa Ordem de Contexto Tipo de Item Tipo de Situação Competência Rotineira ou não-rotineira Fonte: autora. Realista Problema de Palavra (BORASI, 1986) Problemas de aplicação (BUTTS, 1997) Primeira Ordem Resposta de Construção Fechada Pública Reprodução Rotineira 4.4.8 Tarefa do GRUPO H – T22 A tarefa T22 (apresentada na Figura 24) envolve de forma mais geral um sistema de duas equações e duas incógnitas. O contexto que situa a elaboração das equações trata-se de uma distribuição de uma quantidade conhecida de livros e caixas, com dois tipos de caixas que comportam quantidades distintas de livros. Figura 24 – Tarefa T22. Fonte: Giovanni et al (2007, p. 188). A tarefa pode ser classificada como um problema pelo fato de não envolver apenas a reprodução de um conhecimento matemático que o estudante já possui. A tarefa demanda interpretação, transcrição para linguagem simbólica, análise. Uma vez que esta tarefa é situada em um tipo de contexto, que permite correlacionar fatos realísticos (editora, livros, distribuição, caixas) às informações matemáticas do problema (𝑥 + 𝑦 = 27; 50𝑥 + 70𝑦 = 1650), a tarefa deixa de ser simplesmente um mero exercício e podemos classificá-la como sendo do tipo de contexto não apenas matemático. Segundo a classificação de Díaz e Poblete (2005), a tarefa é um Problema de Contexto Realista, por se tratar de uma simulação que pode ser constatada na realidade. Nesse tipo de contexto, as informações que acompanham a descrição do “problema 101 matemático já equacionado”79 embalado na situação podem tanto fornecer a atribuição de significado à tarefa proposta, bem como oferecer possibilidade de o estudante recorrer a outros métodos alternativos de resolução, o que faz com que a elasticidade do problema seja aumentada. Se pudéssemos “despir” o dado problema, a tarefa seria classificada como um tipo de contexto apenas matemático. Resolva o sistema de equações a seguir 𝑥 + 𝑦 = 27 50𝑥 + 70𝑦 = 1650 Neste tipo de tarefa “despida”, o estudante tem apenas a possibilidade de resolvê-la se já conhecer os métodos tradicionais de resolução de sistema de equações com duas equações e duas incógnitas (adição, substituição, redução por escalonamento). Nesse caso, poderíamos classificá-la como Exercício. No que diz respeito ao tipo de item o problema apresentado exige apenas que o estudante forneça uma resposta à pergunta feita, sem a necessidade explícita de apresentar os procedimentos de resolução, bem como justificativa de como foram pensados. Não apresenta possibilidades de resposta indicadas a priori. Portanto, é classificada como um item de resposta de construção fechada. As informações que acompanham o problema situam-no em uma situação ocupacional ou do trabalho, ou seja, são relacionadas com atividades que podem ser verificadas em algum ambiente de trabalho. Quanto ao tipo de competência que a tarefa demanda em sua resolução, exige que os estudantes sejam capazes de: distinguir e relacionar as informações; lidar com as representações das mesmas; decodificar a linguagem natural para simbólica; desenvolver estratégias; integrar informações. Atitudes que são próprias da categoria Conexão (DE LANGE, 1999). Por se tratar de uma tarefa matemática que é típica de livros didáticos e embalada em contexto que é acessível ao estudante, o problema é explicitamente do tipo rotineiro. 79 Expressão traduzida de bare problem. 102 A tarefa é classificada com base em Borasi (1986), como um Problema de Palavra, pois no que diz respeito a: contexto: é todo dado no próprio texto. Não exige que o aluno busque informações extras. formulação: é única e explícita. A questão é explicitamente uma, a saber: as quantidades de caixas de cada tipo necessárias para empacotamento dos 1650 livros. soluções: sobretudo única e exata. Apenas uma resposta é possível para o problema: 15 caixas de 70 livros e 12 caixas de 50 livros. métodos de abordagem: combinação de algoritmos conhecidos, método da substituição, método da adição para resolução de sistemas de equações lineares. Pode envolver tentativa e erro, estimativa por meio da construção de tabelas, contagem, comparação de múltiplos e divisores comuns. Apesar de ser considerada uma tarefa rotineira, consideramos que o contexto é portador de solução, pois permite ao solucionador “experienciar” a situação apresentada, antes de ter que lidar com a tarefa matemática subjacente: simular, conjecturar, testar hipóteses realísticas. Nesse tipo de tarefa, as ferramentas matemáticas são instrumentais que podem surgir por meio da manipulação das informações, para a resolução do problema, ou seja, o contexto pode conduzir à elaboração de conhecimento matemático. Como a tarefa é apresentada após exemplos e apresentação do conteúdo (nesta ordem), consideramos que o contexto propriamente dito da tarefa é utilizado apenas para ilustrar um contexto matemático. Com isso, quaisquer outras situações diferenciadas poderiam servir para ilustrar o “mesmo” contexto matemático. Ser considerado como um Problema de Palavra significa que, apesar do contexto ser essencial para a resolução da tarefa, ele não é, especificamente, próprio da tarefa. Outros elementos que podem estar envolvidos em algum tipo de distribuição também poderiam embalar a tarefa de resolver o “mesmo” sistema de equações lineares, ou ainda outras similares, mais ou menos complexas. Essa tarefa é classificada ainda como contexto de segunda ordem, pois demanda que o estudante identifique quais ferramentas matemáticas deve utilizar para organizar, estruturar e resolver a tarefa, promovendo, desse modo, a matematização, ainda que horizontal. Identificamos como matematização horizontal, pois, supostamente, o aluno já conhece os procedimentos de resolução do sistema e a principal demanda parece ser a de 103 traduzi-la para a linguagem matemática. Caso a tarefa fosse utilizada como tema de introdução ao conteúdo, por exemplo, poderia ser pensada como contexto de terceira ordem por possibilitar a matematização conceitual. No quadro a seguir apresentamos um resumo das classificações da tarefa T22. Quadro 31 – Resumo das classificações de T22. Tipo de Contexto Tipo de Tarefa Ordem de Contexto Tipo de Item Tipo de Situação Competência Rotineira ou não-rotineira Fonte: autora. Realista Problema de Palavra (BORASI, 1986) Problemas de aplicação (BUTTS, 1997) Segunda Ordem Resposta de Construção Fechada Ocupacional ou Profissional Conexão Rotineira Com relação aos itens apresentados na seção 2.2.4 (da constituição da tarefa) podemos apresentar as seguintes conclusões: Enunciado: o enunciado é formado apenas por elementos textuais. Questão: há uma questão que é explícita: quantas caixas de cada tipo a editora utilizou? Contexto: conjunto da situação proposta com o problema assumido pelo sujeito. Situação: envolve a distribuição de livros em caixas em uma determinada editora, situando-se num contexto de trabalho. Problema: o problema “original”, “proposto”, é explícito pela questão. Entretanto, não é possível garantir que se constitua “de fato” como um problema para o sujeito, ou que ele compreenda o enunciado proposto e o resolva. Tarefa matemática: contém uma questão explícita, contém uma situação e demanda tratamento matemático. Atividade: conjunto de ações que o estudante lança mão ao resolver um problema. Resolução: conjunto de estratégias e procedimentos que o sujeito desenvolve na tentativa de solucionar um problema. Solução: 15 caixas de 70 livros e 12 caixas de 50 livros. Estratégia: algumas podem ser utilizadas: método da substituição, método da adição para resolução de sistemas de equações lineares. Pode envolver ainda tentativa e erro, estimativa por meio da construção de tabelas, contagem, comparação de múltiplos e divisores comuns. Procedimento: Está relacionado ao processo de desenvolvimento da estratégia. 104 5 DISCUTINDO AS JOGADAS Figura 25 – um meme80 da internet. Fonte: ZOOA, online. Disponível em: <http://zooa.wordpress.com/tag/poker-face/>. Acesso em: 28 jan. de 2013. A Figura (25) apresentada é um meme famoso em uma rede social. Não apenas pelo seu caráter típico de “meme” pelos desenhos divertidos apresentados, mas também por, muito provavelmente, evocar na lembrança dos internautas alguma situação que é muito típica na avaliação tradicional. Na tentativa de contextualizar algum assunto matemático, por vezes, os enunciados acabam se tornando um tanto artificiais e tão desconexos da realidade que seria mais simples se o assunto ficasse totalmente “cru”, apenas matemático. No que diz respeito à classificação das tarefas com base no agrupamento de Díaz e Poblete (2005) (vide Quadro 17), observa-se que os contextos das tarefas limitam-se apenas a dois grupos: ser puramente matemáticos ou revestidos de alguma situação com referência na realidade, artificial. Os problemas de contextos reais (que podem ser produzidos efetivamente na realidade) e fantasiosos não são explorados. Por este motivo, dentre outros, acreditamos que estabelecer relações entre os conteúdos matemáticos, aprendidos na escola, e suas utilidades em situações reais, fora dela, parece tão difícil aos estudantes. A referência 80 Meme pode ser uma ideia, uma expressão, um bordão, um desenho que se espalha rapidamente por compartilhamento na internet como um viral. 105 obtida se resume, quase sempre, em aprender matemática de forma técnica, mecânica, ou no máximo inserida em situações artificiais. Outro detalhe que, também, é comum nas aulas de matemática é que os “problemas” de aplicação aparecem, quase sempre, no final de uma sequência didática e, em seguida, na prova, quando muito do que foi trabalhado focou apenas na resolução de exercícios (puramente matemáticos) na perspectiva de que, “se os alunos sabem lidar com a matemática, saberão lidar com a sua aplicação” (vide figura 26). Figura 26 – outro meme da internet. Fonte: Imagens para Facebook, on-line. Disponível em: <http://imagensparafacebook.com/imagensfacebook/meme-imagens-facebook/vida-de-estudante-memes.html>. Acesso em: 28 jan. de 2013. Apesar de a seção do livro didático analisado apresentar mais tarefas (27) com contextos com referência na realidade do que exercícios puramente matemáticos (16), a ordem de apresentação é comum à dos livros didáticos em geral: primeiro são apresentadas as tarefas que, supostamente, promoverão o desenvolvimento das habilidades de cálculo e manipulação de algoritmos e depois são apresentados os “problemas de aplicação”. Entretanto, também, consideramos que o livro didático é apenas um instrumento para o professor e não um guia, que deve ser seguido “religiosamente”. 106 Além de os contextos das tarefas se limitarem a apenas dois grupos, conforme Díaz e Poblete (2005), observamos pouca variedade entre os tipos de tarefa, segundo a classificação de Butts (1997) (vide Quadro 20). Vale a pena observar que, apesar de a publicação de Butts (1997) ter mais de 15 anos, a afirmação do autor de que a maioria dos problemas contidos dos livros didáticos, de qualquer nível, pertencia aos 3 primeiros agrupamentos, aparentemente, não mudou. Apenas duas tarefas (T08 e T25) foram identificadas como de Pesquisa Aberta (grupo D) e, ainda, como as duas únicas não-rotineiras de toda a amostra. Consideramos, além disso, que não é o fato de uma tarefa apresentar alguma “situação” real, ou com referência na realidade, ou ainda fictícia, que faz com que ela venha a se constituir em um “Problema de Contexto”. Com isso, autores como De Lange (1999) e Van den Heuvel-Panhuizen (1996, 2005) justificam a relevância do contexto para a resolução do problema. Se a questão pode ser facilmente despida e resolvida sem o “uso” da situação, então, muito provavelmente, estamos lidando com um Problema de Palavras, cuja “situação” pode ser substituída por outras análogas. Na análise realizada, observamos que a maioria das tarefas (42 de 46 - vide Quadro 19) pode ser identificada nos grupos Exercício e Problema de Palavras, com base no agrupamento de Borasi (1986). Nesse agrupamento, os grupos de tarefas são formados a partir de elementos como tipo de contexto, formulação das questões, soluções e métodos de abordagem. Observamos que, segundo nossa análise, há pouca variedade na distribuição das tarefas nos diferentes grupos: apenas três grupos (dos sete) comportam as 46 tarefas. Não bastasse essa limitação, esses três grupos revelam tarefas que pouco valorizam contextos ricos, formulações que possam dar margem para várias questões, soluções e métodos de abordagem diversificados. Um bom Problema de Contexto é o que conta com a característica de a situação ser autêntica para a resolução do estudante. Desse ponto de vista, o assunto matemático e a situação são dificilmente separáveis. O caráter da autenticidade vai ao encontro do que a Educação Matemática Realística propõe: a matemática no ambiente de ensino e aprendizagem deve emergir da exploração de fenômenos que são experiencialmente reais, mais especificamente, realísticos. Real não no sentido de ser verdadeiro, mas “real” no sentido de ser imaginável, concebido, concreto (por ter passado pelo processo de abstração). Por este motivo, acreditamos que a tradução para “realístico” é mais apropriada. A autenticidade da tarefa está fortemente ligada com a relação que o sujeito irá estabelecer com ela. Portanto, é possível acontecer de um bom Problema de Contexto (aos olhos do educador) 107 nem se constituir como um problema (que valha a pena ser resolvido) para o estudante. Vale considerar que, mesmo que uma tarefa envolva situação de fato real não é condição suficiente para ser um Problema de Contexto, se o estudante não reconhecer na situação a relevância para a resolução. Nesse caso, podemos dizer que o problema é de contexto camuflado, serve apenas para promover a matemática desejada. Na nossa análise, não identificamos, a partir da leitura dos enunciados, propostas de tarefas que conduzissem à exploração de situações autenticamente reais. As situações, quando presentes nos enunciados das tarefas, eram, quase sempre, de caráter imaginável, realizável nas mentes dos estudantes. Segundo a classificação realizada tendo por referência De Lange (1987) (vide Quadro 18), 26 tarefas não apresentam contexto ou o contexto envolvido dá pouca, ou nenhuma, margem para matematização. As outras 20 tarefas, classificadas com contexto de segunda ordem, oferecem alguma margem para matematização, o que requer do estudante organizar, estruturar e resolver a tarefa. Nenhuma tarefa foi identificada com contexto de terceira ordem, que, a nosso ver, a qual pudesse ser caracterizada como um bom Problema de Contexto. Nesse grupo estariam as tarefas que possibilitariam a matematização conceitual. Com relação à relevância do contexto para o problema, De Lange (1987, 1995, 1999) estabelece alguns critérios, que se relacionam tanto com a importância que o contexto desempenha na resolução quanto com a oportunidade de matematização. Com isso, a possibilidade de matematizar parece estar fortemente associada ao papel que o contexto desempenha no sentido de quanto mais “realístico” o contexto proposto, mais o estudante tem a oportunidade de se apropriar dele e, então, produzir a sua matemática. Ocorre que ser realístico, para nós, nem sempre precisa estar associado a alguma situação com referência na realidade, uma tarefa de contexto estritamente matemático também pode oportunizar a matematização. Por este motivo, a classificação de De Lange (1987, 1995, 1999) quanto à ordem dos contextos nos deixou em dúvida com relação a como classificar esses tipos de problemas a tarefa que é “puramente matemática” não tem ordem de contexto? “puramente matemática” significa que não há contexto? Ou que o contexto não exerce função alguma? e se considerarmos que o contexto é matemático? Entra, também, na ordem zero? Na análise realizada, as duas tarefas (T08 e T25) de contexto puramente matemático, segundo Díaz e Poblete (2005), foram classificadas com contextos de primeira e 108 segunda ordem com base na classificação de De Lange (1987) pela oportunidade de matematização que ofereciam. Se fôssemos considerar apenas o envolvimento da tarefa com algum contexto real ou realístico, estas duas tarefas ficariam no grupo sem ordem alguma criado por nós, que, além de não apresentar contexto real ou realístico, não dá margem para matematização. Considerando que as tarefas de contexto puramente matemático possuem contexto, a nosso ver, encontramos nas definições dos documentos relativos ao PISA uma definição que associa o tipo de situação científica a estes tipos de tarefas. Segundo o documento OCDE (2005), a situação científica consiste de elementos matemáticos explícitos sem que se faça nenhuma tentativa para situar a tarefa em um contexto mais amplo. Ocorre que uma tarefa de contexto puramente matemático, segundo esta definição, envolve situação científica, embora nem toda tarefa com situação científica seja de contexto puramente matemático. No que diz respeito às classificações das tarefas quanto suas situações, consideramos que houve uma boa distribuição nos diferentes grupos (vide quadro 21). Essa multiplicidade de situações envolvidas nas tarefas pode permitir aos estudantes expandir seus conhecimentos a respeito de assuntos que não são apenas matemáticos. Em uma possibilidade de aumentar o quadro, sugeriríamos a criação de um grupo com tarefas de situação fantasiosa, que o agrupamento não contempla. Com relação aos tipos de item, a maioria da amostra (44 tarefas de 46) se concentra em tarefas de Resposta de Construção Fechada ou de Múltipla Escolha. Estes dois grupos de tipos de item permitem a construção livre de resoluções com limite fechado de respostas aceitáveis, portanto, são facilmente avaliáveis. A diferença entre os dois grupos é que o segundo apresenta alternativas de resposta, enquanto o primeiro não. Estes tipos de itens são tradicionais e frequentes em livros didáticos. Apenas duas tarefas foram classificadas como de Resposta Curta, um tipo de item que permite uma amplitude de possibilidades de respostas aceitáveis. Não foram identificadas tarefas cujo item fosse de Múltipla Escolha Complexa ou Resposta de Construção Aberta, apesar de avaliações como a do PISA utilizar, frequentemente, itens deste tipo em suas aferições. Acreditamos que a não familiaridade dos estudantes com estes tipos de item pode dificultar seus modos de lidar com tarefas deste tipo. Lamentável que estes dois tipos de itens sejam pouco frequentes em livros didáticos, pois estimulam a criatividade dos estudantes, tomadas de decisão, autonomia, poder de argumentação. Segundo De Lange (1999), estes tipos de item geralmente são encontrados 109 nas tarefas no nível II de competências: conexão. Enquanto que o item de Resposta de Construção Aberta é facilmente encontrado no nível III: de reflexão. Quanto à oportunidade de matematização associada ao papel que os contextos desempenham, temos ainda de considerar que nem sempre uma única tarefa pode favorecer o desenvolvimento ou produção de algum conceito matemático. Algumas tarefas podem ser potenciais apenas para a matematização horizontal, como pode ocorrer com as tarefas de problemas de palavras, ou até mesmo tarefas com contextos de segunda ordem. O que parece ser relevante de ser considerado com relação ao tipo de matematização tem a ver com o tratamento mais, ou menos, imediato dado à tarefa. Em outras palavras, fornecer um tratamento formal e sofisticado para um fenômeno nem sempre implica em matematização vertical se, por exemplo, este tratamento já é rotineiro e mecânico. Por este motivo, concordamos com De Lange (1999) quando salienta que tarefas que envolvem matematização81 vertical não são recomendadas em circunstâncias de prova (avaliação). Assim, podemos pensar que a matematização vertical pode envolver, também, uma matematização conceitual. A matematização conceitual parece demandar exploração de mais de uma tarefa. Por conta disso, a RME valoriza a fenomenologia didática no sentido de promover a construção de um objeto matemático por meio da exploração de vários fenômenos associados a ele. Assim, a matematização não fica associada às tarefas, que são, muitas vezes, limitadas a um assunto, a um modelo. A ideia é trabalhar como “modelos de” no sentido de desenvolver “modelos para” em uma perspectiva de matematização progressiva. Pelas classificações realizadas, observamos que há pouca diversidade entre as tarefas no que diz respeito aos contextos, tipos de item, de competências, possibilidades de matematização. Acreditamos que as tarefas analisadas dariam pouca margem para um trabalho didático na perspectiva da RME82. Não foi muita surpresa para nós essa conclusão, em razão de o livro didático selecionado para coleta da amostra ser, apesar de suas muitas mudanças e melhorias ao longo dos anos, ainda um livro tradicional. Talvez por este motivo é que o livro costuma ser o mais escolhido pelos professores, pela familiaridade que os professores têm com ele, o que, possivelmente, lhes confere segurança no lidar com o conteúdo. 81 Se uma tarefa propicia a matematização, seja ela horizontal ou vertical, isto implica na construção/ produção de um novo conhecimento? Matematização implica em aprendizagem? 82 Há de considerar que dentre os cinco/seis princípios que caracterizam a RME (vide Quadro 4), nesta pesquisa, nos debruçamos, mais pontualmente, no estudo das tarefas com relação ao segundo princípio. 110 6 UM JOGO QUE NÃO SE ENCERRA Na busca de identificar boas tarefas para avaliação percorremos o caminho de estudar a avaliação como prática de investigação, análise da produção escrita, análise de enunciados de tarefas de matemática que podem revelar potencialidades das tarefas tanto para a avaliação quanto para um trabalho didático em sala de aula. Muitas são as perguntas que decorrem desta análise. Tendo classificado um conjunto de tarefas e observado suas características, suas limitações, suas formulações, tipos de item e situações, vale e é necessário perguntar: quais as especificidades das tarefas que são potenciais para sala de aula? E para a avaliação? O que esta análise pode oportunizar ao trabalho didático do professor, seja no seu planejamento, suas intenções, ambiente didático? Será que tarefas tradicionais dos tipos analisados podem permitir uma avaliação que oportunize a aprendizagem? Perguntas essas que podem ser motivo de investigações futuras. Ainda como sugestão de pesquisas, valeria a pena investigar: como professores da Educação Básica (com ou sem o referencial indicado) analisariam as mesmas tarefas? o que é possível enxergar na produção escrita de tarefas em diferentes modalidades de classificação. a elaboração e/ou pesquisa de tarefas com características que não se apresentaram nesta amostra estudada. como seria o uso das tarefas, utilizadas nesta análise, na pesquisa relativa aos outros princípios da RME? a utilização das classificações aqui apresentas em curso de formação continuada de professores de matemática Apesar de a ação de classificar as tarefas ser um tanto subjetiva, devido ao caráter interpretativo da análise e ao fato de ser relativo ao “lidar” de cada sujeito com uma determinada tarefa, consideramos que conhecê-las (as tarefas) é importante para a avaliação. Neste trabalho buscamos, com base na literatura, analisar tarefas de um livro didático para conhecê-las em sua constituição, identificando qual a questão associada a cada tarefa, se é caracterizada como exercício, problema, se apresenta contexto, qual o tipo de item; 111 suas características, como o contexto se classifica, se a tarefa é rotineira ou não, a que tipo de situação remete; suas potencialidades, se oportuniza matematização, se a tarefa é flexível e permite diferentes estratégias de resolução, que tipo de competências pode promover. É relevante considerar que as classificações e análises realizadas fazem sentido no âmbito de conhecer as tarefas, seus itens e conceitos a elas associados, os possíveis métodos de solução, suas múltiplas respostas quando convém, conteúdo, competências, para que possamos dialogar a respeito delas. Não queremos limitar os tipos de tarefas em definições fechadas, pois estaríamos limitando o campo da discussão. Consideramos que uma tarefa por si só “não tem vida própria”, ela depende também do “contexto prático” em que é empregada, do tratamento e situação em que o professor trabalha com ela. Isto pode ser motivo de análises futuras. Uma intenção subjacente é que este trabalho sirva como um recurso para professores que ensinam matemática, na busca de conhecer melhor as tarefas de matemática e potencializar sua utilização em um contexto de avaliação como oportunidade de aprendizagem. 112 REFERÊNCIAS ALLAL, L. Estratégias de avaliação formativa: Concepções psicopedagógicas e modalidades de aplicação. In: ALLAL, L.; CARDINET, J.; PERRENOUD, P. (Orgs.). A avaliação num ensino diferenciado. Coimbra: Almedina, 1986. p. 175-209. ANDRADE, M. M.; OLIVEIRA, F. D. A análise de textos didáticos em História da Educação Matemática. In: I CIHEM - I Congresso Ibero-Americano de História da Educação Matemática, 2011, Covilhã - Portugal. Anais... Covilhã, 2011. 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Vol. II. 119 Notas. i Instead, assessment is viewed as an integral component of the teaching and learning process, in which the teacher attempts to acquire as complete a picture of the student as possible through all sorts of informal assessment strategies, such as class observation, questioning, practical assignments, constructing work-folios and having the students keep journals. ii ―Performing a writing task requires students to reflect on, analyze, and synthesize the material being studied in a thoughtful and precise way‖. iii ―WRITING represents a unique mode of learning-not merely valuable, not merely special, but unique. That will be my contention in this paper. The thesis is straightforward. Writing serves learning uniquely because writing as process-and- product possesses a cluster of attributes that correspond uniquely to certain powerful learning strategies‖. iv ―WRITING represents a unique mode of learning-not merely valuable, not merely special, but unique. That will be my contention in this paper. The thesis is straightforward. Writing serves learning uniquely because writing as process-and- product possesses a cluster of attributes that correspond uniquely to certain powerful learning strategies‖. v ―Not only will the opportunity to practice writing improve a student's ability in written expression, but using writing to practice mathematical tasks will also assist students in comprehending mathematics concepts and improve their ability to communicate mathematically‖. vi ―Nevertheless, we suggest that the use of writing to learn can provide a valuable means to facilitate a personalized and making-of-meaning approach to learning mathematics‖. vii These results indicate that, although this was only a pilot study, there is a basis for promoting the use of writing as a teaching and learning process in presenting mathematical problem solving to students. viii If students can write clearly about mathematical concepts, then it is apparent that they understand them. ix By encouraging students to explain themselves in clear coherent prose, exposition allows them to become more aware of their thinking processes and more conscious of the choices they are making as they carry out the computation and analysis involved in solving math problems. x Characteristic of this approach is its focus on calculations with bare numbers, and the little attention that it pays to applications; which is certainly true for the beginning of the learning process. Mathematics is taught in an atomised way. Students learn procedures in a step-by-step way in which the teacher demonstrates how to solve a problem. xi ―Typical of this type of education was that students were let free to discover much by themselves and were stimulated to carry out investigations‖. xii ―This is a method of teaching mathematics which focuses on abstract concepts such as set theory, functions and bases other than ten‖. xiii It is an activity of solving problems, of looking for problems, but it is also an activity of organizing a subject matter. This can be a matter from reality which has to be organized according to mathematical patterns if problems from reality have to be solved. It can also be a mathematical matter, new or old results, of your own or of others, which have to be organized according to new ideas, to be better understood, in a broader context, or by an axiomatic approach. xiv Mathematising is an organising activity. It refers to the essence of the mathematical activity, to the thread that runs through all mathematics education directed towards the acquisition of factual knowledge, the learning of concepts, the attainment of skills and the use of language and other organising skills in solving problems that are, or are not, placed in mathematical context. xv for generality: generalizing (looking for analogies, classifying, structuring); for certainty: reflecting, justifying, proving (using a systematic approach, elaborating and testing conjectures, etc.); for exactness: modelling, symbolizing, defining (limiting interpretations and validity); and for brevity: symbolizing and schematizing (developing standard procedures and notations). xvi In the horizontal component the road to mathematics is paved by means of model formation, schematising, and shortcutting. The vertical component acts by mathematical processing, raising the structure level in the corresponding problem field. No doubt the separating clusters of activities in the two components looks somewhat artificial. xvii (1) pupils reach the first level of thinking as soon as they can manipulate the known characteristics of a pattern that is familiar to them; (2) as soon as they learn to manipulate the interrelatedness of the characteristics they will have reached the second level; (3) they will reach the third level of thinking when they start manipulating the intrinsic characteristics of relations (ZULKARDI, 2002, p. 29). xviii The activity principle means that students are confronted with problem situations in which, for instance, they can produce fractions and gradually develop an algorithmic way of multiplication and division, based on an informal way of working. In relation to this principle, ―own productions‖ play an important role in RME. 120 xix The intertwinement principle means that mathematical domains such as number, geometry, measurement, and data handling are not considered as isolated curriculum chapters but as heavily integrated. xx Pupils should develop an integrated view of mathematics as well as the flexibility to connect to different subdomains and/or to other disciplines. xxi Moreover, solving rich context problems often means that one has to apply a broad range of mathematical tools and understandings. xxii The strength of the intertwinement principle is that it brings coherency to the curriculum. This principle refers not only to the different domains of mathematics, but can also be found within them. xxiii the students need room to construct mathematical insights and tools by themselves. In order to reach this, the teachers have to provide the students with a learning environment in which this construction process can emerge. xxiv Question 5: Write in the answer 1 – 1/4= ___ (Answer). Question 18: A cake is cut into four equal parts and Bill takes one of the parts. What fraction of the cake is left? xxv The context problems function only as a field of application. By solving context problems the students can apply what was learned earlier in the bare format. In RME this is different. Here, context problems function also as a source for the learning process. In other words, in RME, context problems and real life situations are used both to constitute and to apply mathematical concepts. xxvi En general, la resolución de un problema de contexto real, realista o fantasista, necesita La matematización de La situación dada, es decir, su traducción en lenguaje matemático, Ya que se trata de un problema, El proceso de matematización en cuestión debe exigir una cierta búsqueda de parte del estudiante que resuelve el problema. Si este puede matematizar la situación de manera casi automática y sin esfuerzo, entonces no se trata de un problema de contexto, sino más bien de un ejercicio de matematización. xxvii If the students experience the process of reinventing mathematics as expanding common sense, then they will experience no dichotomy between everyday life experience and mathematics. Both will bepart of the same reality (GRAVEMEIJER; DOORMAN, 1999, p. 127). xxviii - The cross section of a wine glass has got the shape of (part of) the following sinusoïd: y = 3sin(x + ½) + 3. Determine the volume of this glass. xxix - Rain is falling in an angle of 48 degrees because of the wind. Next to the building, a dry patch is found, width two meters. Using this information, calculate the height of the building. xxx For a parent‘s evening at school 150 parents are expected. At each table four chairs can be placed. How many tables are needed? Show how you found your answer. xxxi The problem is really different from: Compute 150 ÷ 4 = xxxii A ladder, length three meters, is placed against the wall, one meter from the bottom of the wall. Up to which height on the wall does the ladder reach? xxxiii Here you see a bus problem. 1. Use arrows for this problem. Answer: +4 3 7 2. Now make your own problem. xxxiv – The growth factor of a bacterium type is 6 (per time unit). At the moment there are 4 bacteria. Calculate the point in time when there will be 100 bacteria. – The interest percentage for a year is eight per cent. $4000 is deposited at 0 time. At what point in time will this amount have increased to $5000. – Bill weighed 107 pounds last summer. He lost 4 pounds, and then he gained 11 pounds. How much does he weigh now? xxxv Which of these would be a fairly good estimate for the width of a classroom? Which of these is the best estimate for the length of a teacher‘s desk? xxxvi A variety of contexts is needed, as well as a range of roles for the contexts. The variety is needed to minimize the chance of featuring issues and phenomena that are not culturally relevant. The range of roles for the contexts needs further elaboration because of the effects on what we are measuring relates to this role. xxxvii Find the result of 4 x 2+ 6 x 3. xxxviii Maria bought a hamburger for $.90 and a coke for $.30. If the local sales tax is 5%, how, much change should she receive if she gives the clerk $2.00? xxxix Six matches must be assembled to form four congruent equilateral triangles each side of which is equal to the length of the matches. xl Prove that the formula: xli Hans‘ wife is dying. A pharmacist has discovered a medicine that would cure her illness, but sells it at a price for any pair of natural numbers n and m gives all the integral solutions of 121 that Hans cannot afford. Should Hans steal the medicine? xlii You are in your late thirties, your children are well into school, you husband is establishing a name for himself in his profession and you are bored. xliii Consider the following Pythagorean triplets. xliv Personal – Problems classified in the personal context category focus on activities of one‘s self, one‘s family or one‘s peer group. The kinds of contexts that may be considered personal include (but are not limited to) those involving food preparation, shopping, games, personal health personal transportation, sports, travel, and personal scheduling and personal finance xlv Under personal life we include, depending on age, games, daily scheduling, sports, shopping, saving, interpersonal relations, finances, voting, reading maps, reading tables, health, insurance, and so on. xlvi Societal – Problems classified in the societal context category focus on one‘s community (whether local, national or global). They may involve (but are not limited to) such things as voting systems, public transport, government, public policies, demographics, advertising, national statistics and economics. Although individuals are involved in all of these things in a personal way, in the societal context category the focus of problems is on the community perspective. xlvii In the local community, we see the intelligent citizen making appropriate judgments, making decisions, evaluating conclusions, gathering data and making inferences, and in general adopting a critical attitude — seeing the reasoning behind decisions. xlviii Occupational – Problems classified in the occupational context category are centred on the world of work. Items categorised as occupational may involve (but are not limited to) such things as measuring, costing and ordering materials for building, payroll/accounting, quality control, scheduling/inventory, design/architecture, and job-related decision making. Occupational contexts may relate to any level of the workforce, from unskilled work to the highest levels of professional work, although items in the PISA survey must be accessible to 15-yearold students. xlix Work and leisure involves reasoning, understanding data and statistics, finances, taxes, risks, rates, samples, scheduling, geometric patterns, two- and three-dimensional representations, budgets, visualizations, and so on. l School life relates to understanding the role of mathematics in society, school events (e.g., sports, teams, scheduling), understanding data, computers, and so on. li Scientific – Problems classified in the scientific category relate to the application of mathematics to the natural world and issues and topics related to science and technology. Particular contexts might include (but are not limited to) such areas as weather or climate, ecology, medicine, space science, genetics, measurement, and the world of mathematics itself. lii To function as an intelligent citizen, individuals need to be literate in many fields, not only in mathematics. The use of scientific situations or contexts in mathematics classes should not be avoided per se, but some care must be taken. If we try to teach students the right competencies but use the wrong context, we are creating a problem, not solving it. liii They are, rather, routine exercises organized to provide practice on a particular mathematical technique that, typically, has just been demonstrated to the student. liv Problems with vague and unclear goals. Solution strategies least constrained. lv • Often more than one acceptable solution strategy. • Convergent (one right answer). • Needed information often must be gathered. lvi - Solution strategy is usually predictable • Convergent (one right answer) • All starting information is usually part of the problem statement. lvii • Solution is not well defined or predictable. Multiple perspectives, goals, and solutions. • There is no single well-defined and agreed-upon solution; there may not be a fully satisfactory solution at all. • Needed information often must be gathered.