O sujeito e sua constituição UNIDADE III O sujeito não é o “eu” Ao utilizarmos o termo sujeito nos referimos ao sujeito da psicanálise. Tratase de um sujeito dividido, o ser falante marcado pela falta. Esse é o sujeito que se opõe a ideia de um individuo psicológico, detentor de uma ou mais personalidades, que sinteticamente se organiza em uma entidade mental denominada “eu”. Desse modo, devemos entender que o sujeito barrado da psicanálise é o sujeito do inconsciente, ao passo que a tentativa de montagem desse objeto mental que chamamos “eu” se dá na consciência. Freud percebe que o “eu” não é um construto dado desde nascimento, ele se desenvolverá. Mas, então, como se formará o “eu”? E como se constitui por outro lado o sujeito do inconsciente? Do auto-erotismo ao narcisismo O que temos desde o inicio são pulsões. Para o recém nascido não há consciência egoica, nem sequer a percepção de uma unidade corpórea quanto mais uma consciência moral. A forma como atuam as pulsões desde o inicio da existência de um ser humano Freud chamou de autoerotismo. As pulsões auto-eróticos designam um estágio anárquico e por isso caótico da vida pulsional do bebê. Há estimulações diversas que acometem toda superfície do corpo e que privilegiam certas zonas erógenas, como a boca, o anus e os genitais. Aos poucos, ocorre, então, o estabelecimento de uma imagem corpórea unificada. Elege-se a própria imagem como objeto a ser investido pelas pulsões. O “eu” se torna assim o primeiro objeto de investimento da criança. “As pulsões auto-eróticas que coexistem de modo anárquico e sem um objeto específico reúnem-se numa unidade e dirigem-se para um objeto: o “eu”.” (GARCIA-ROSA, 2005, p. 201) Assim, instala-se o que Freud chamará de narcisismo primário, momento em que o “eu” será investido pela pulsão assim como um objeto externo. . Corpo despedaçado . O Eu como objeto Narcisismo secundário . Zonas erógenas Narcisismo primário Auto erotismo Narcisismo primário e secundário . Eleição de um objeto externo Objeto externo A formação do “eu” 1. Narcisismo primário 2. Eu ideal 3. Relação com o outro 4. Espelho 1. Narcisismo secundário 2. Ideal do eu 3. Relação com o Outro 4. Linguagem Cristalização de imagens ideais. Identificação com um objeto fixo e reificado que a criança observa no espelho. A ordem simbólica realiza a internalizarão das imagens construídas a partir dos ideais paternos. Formação imaginária e simbólica do “eu” Formação imaginária do “eu” “Uma vez internalizadas, essas várias imagens fundem-se , digamos assim, em uma imagem global imensa que a criança vem a considerar o seu “eu”.” (FINK, 1998, p. 57) Formação simbólica do “eu” “Em geral, é essa cristalização de imagens que permite um “sentido ao eu” coerente e uma grande parte da nossa tentativa de compreender o mundo ao redor de nós envolve a justaposição do que vemos e ouvimos com essa auto-imagem internalizada: Como os acontecimentos se refletem em nós? Onde nos encaixamos? Esses acontecimentos constituem um desafio para a visão de nós mesmos?” (FINK, 1998, p. 57) Porque o “eu” é sempre falso? Espelho • As imagens refletidas no espelho são sempre invertidas (direitoesquerdo) • É difícil cortar cabelo olhando no espelho. Linguagem • Toda comunicação esta sujeita a malentendidos. • A abelha se comunica sem mal-entendidos, o homem não. Revisão 1. Como distinguimos o sujeito da psicanálise e o eu? 2. O que é o auto-erotismo e como as pulsões auto-eróticas se organizam narcisicamente? 3. O que ocorre na passagem do narcisismo primário para o narcisismo secundário? 4. Discorra sobre a formação imaginário do “eu” e a associe ao narcisismo primário. 5. Discorra sobre a formação simbólica do “eu” e a associe ao narcisismo secundário. 6. Explique porque o “eu” é sempre falso. O complexo de Édipo em Freud e Lacan O mito do Édipo rei - A tragédia Oráculo de Delfos Tebas Laio e Jocasta Édipo 1.Pastor 2. Tirésias 3. Esfinge Corinto Políbio e Mérope Complexo de Édipo em Freud: o nascimento da teoria. “Um único pensamento de valor genérico revelou-se a mim. Verifiquei, também no meu caso, a paixão pela mãe e o ciúme do pai e agora considero isso como um evento universal do inicio da infância, mesmo que não tão precoce como nas crianças que se tornaram histéricas. (Algo parecido com o que acontece com o romance da filiação na paranoia – heróis fundadores de religiões.) Sendo assim, podemos entender a força avassaladora de Édipo rei, apesar de todas as objeções levantadas pela razão contra a sua pressuposição do destino; e podemos entender porque os “dramas do destino” posteriores estavam fadados a fracassar lamentavelmente. Nossos sentimentos opõem-se a qualquer compulsão arbitrária e individual [do destino], tal como é pressuposto em Die Ahnfrau [de Grillparzer], etc. Mas a lenda grega capta uma compulsão que toda pessoa reconhece porque sente sua presença dentro de si mesma, cada pessoa da plateia foi, um dia, em germe ou na fantasia exatamente um Édipo como esse, e cada qual recua, horrorizada, diante da realização de um sonho a que transporta para a realidade, com a toda a carga de recalcamento que separa seu estado infantil do seu estado atual.” (FREUD, 1897, p. 365) As relações do filho com sua mãe são para ele uma fonte contínua de excitação e satisfação sexual, a qual se intensifica quanto mais ela lhe der provas de sentimentos que derivem de sua própria vida sexual, beijálo, niná-lo, considerá-lo substituto de um objeto sexual completo. Seria provável que uma mãe ficasse bastante surpresa se lhe dissessem que assim ela desperta, com suas ternuras, a pulsão sexual do filho. Ela acha que seus gestos demonstram um amor assexual e puro, em que a sexualidade não desempenha papel algum, uma vez que ela evita excitar os órgãos sexuais do filho mais que o exigido pelos cuidados corporais. Mas a pulsão sexual, como sabemos, não é despertada apenas pela excitação da zona genital; a ternura também pode ser muito excitante. A percepção da diferença anatômica “Sabemos como as crianças reagem as suas primeiras impressões da ausência de um pênis. Rejeitam o fato e acreditam que elas realmente, ainda assim, vêem um pênis.” • O pênis ainda é pequeno demais, ainda está para crescer. • O pênis estivera lá e foi retirado. A falta do pênis é vista como resultado de uma castração e, agora, a criança se defronta com a tarefa de chegar a um acordo com a castração em relação a si própria. Quais são os acordos possíveis? Desenvolvimento sexual infantil Fase oral Fase anal Fase fálica Fase genital (maturidade) Sujeito / Objeto Ativo / Passivo Ter / Não ter (castração) .Feminino - Objeto - Passivo - Não Ter . Masculino - Sujeito - Ativo - Ter Os três acordos possíveis para com a castração: 1. O recalque (Verdrangung) 1. 2. A negação (Verleugnung) 1. 3. Estrutura neurótica Estrutura perversa A abolição ou rejeição (Verwerfung) 1. Estrutura psicótica NEGAÇÃO O complexo de Édipo no menino Fase pré-genital / Bissexualidade . Fase fálica ( descoberta da diferença anatômica entre os sexos Fantasias com a mãe e manipulação do órgão Ameaça de castração que gera a angustia de castração Aquele que priva a criança da realização de seu desejo é aquele que transgride a regra. A percepção da mãe castrada produz angustia. Em um primeiro momento a criança irá negar a castração da mãe, a persistência deste estado levará o sujeito a homossexualidade. A criança não abandona o complexo de Édipo para preservar seu órgão, A mãe permanece sendo seu objeto de amor, mas somente na medida em que está possui o pênis. Identificação (destituição dos pais do lugar de objeto) A criança não pode ter os pais como objeto sexual então ela se identifica com eles e passa a desejar ser como eles. A criança começa a introjetar a lei da proibição do incesto e então adquire valores morais e ideais provenientes dos pais. Ela passa a viver os sonhos e as frustrações paternas. Ideal viril O supereu é inaugurado como um instancia psíquica propagadora do complexo de castração. A identificação com o pai sobrepuja todas as outras identificações , dando ao sujeito condições de reprimir durante a vida adulta o conteúdo pulsional logrado no Id. Sucede então o período de latência. IMPORTANTE: A castração conduz o menino a saída do Édipo O complexo de Édipo na menina Fase pré-genital / Bissexualidade . Fase pré-edipiana A menina ama a mãe e deve abandoná-la como objeto sexual e passar para o pai a fim de que a fase edipiana se instaure. Fase fálica ( descoberta da diferença anatômica entre os sexos A menina abandona a mãe como objeto sexual devido a decepção desta ser como ela: castrada. Como vimos, neste ponto é comum a criança negar a castração, porém a persistência desta negação pode gerar na menina a homossexualidade. A menina não vive a angustia de castração, mas sofre po devido a inveja do pênis. A menina redireciona seu amor de objeto para o pai e dá inicio ao complexo de Édipo. Em seguida observamos a dessexualização deste através de sua identificação. Uma vez que o pai não irá dar a menina o objeto invejado, ela desliza para o desejo de gerar uma criança do pai. Ao ser negada, ela o abandona como objeto sexual. Instauração do supereu e dos ideais morais e civilizatórios. Ideal virginal Revisão 1. Quais os elementos mais importantes extraídos por Freud do mito do Édipo? 2. A quem Freud aplica primeiro sua teoria do Édipo? 3. Qual a importância da diferença anatômica entre os sexos para o desenvolvimento da sexualidade infantil? 4. Descreva cada uma das fases da organização sexual. 5. Quais as saídas possíveis para castração? 6. Como se inicia o complexo de Édipo masculino? 7. O que é a fase pré-edipiana? 8. Como se inicia o Complexo de Édipo feminino? 9. O que é a fase de latência? O complexo de Édipo em Lacan “O Édipo em Lacan é a descrição de uma estrutura intersubjetiva.” (BLEICHMAR, 1984, p. 18) “O Édipo lacaniano é a descrição de uma estrutura e dos efeitos de representação que essa estrutura produz nos que a integram” (BLEICHMAR, 1984, p. 20) A família como estrutura Pai Falo Mãe Criança O falo e a falta Na estrutura edipiana de Lacan há um elemento que circula entre os demais dando a cada um seu valor e função. Este elemento é o falo que Lacan irá definir como o significante da falta. “O falo é o significante de uma falta.” A falta, como entendida pela filosofia, não pode se desvencilhar do humano. O homem é um ser da falta ou como prefere Lacan: um faltaa-ser. Ao longo da constituição subjetiva, há a uma maneira pela qual a falta é inscrita psiquicamente. Dos objetos ameaçados, o único a permanecer para alguns e ser perdido para outros é o pênis. É portanto a possibilidade de ausência/presença do pênis que abrem o espaço para a inscrição da falta pelo significante que denominamos: falo. O significante Imagem acústica de aspecto material capaz de ser percebida pelos órgãos sensoriais. Ex: uma palavra, um cheiro, um olhar, uma expressão, um fonema, uma fotografia e etc... O significante será sempre responsável por promover a inscrição de um significado, no entanto, toda vez que um significante ganha um significado nos deparamos com a impossibilidade dessa operação se efetuar totalmente. O significado nunca consegue abranger toda a realidade veiculada pelo significante. Por essa razão todo significante inscreve a falta. Um significante nunca ganhará um significado totalmente fiel a realidade que transporta, sempre haverá uma falta. Notadamente, a experiência humana com o sexo será sempre marcada por uma subjetivação problemática da diferença anatômica do sexo. O ser falante nunca encontrará um significado final para o significante fálico, haverá sempre um a falta. “O falo é, então, o que aparece como o que está em lugar da falta.” (BLEICHMAR, 1984, p. 22) Ao mesmo tempo que o significante é incapaz de encontrar um significado absoluto a realidade, ele nos permite a ilusão de que um certo significado temporário resolveria definitivamente o problema da falta. Os três tempos do Édipo Lacan irá nos ensinar que o complexo de édipo pode ser apreendido a partir da noção de estrutura, ou seja, os elementos que compõem o núcleo familiar de cujas relações a criança extrai o que a constitui exercem cada um deles funções. Assim, ao invés de nos preocuparmos com as características e os aspectos fenomenológicos que perpassam uma família e seus membros, entendemos que o mais importante está em saber determinar se há ou não a operação de uma determinada função. Efetuou-se a função paterna? E a materna? E a fálica? Tais funções podem ou não se operacionalizar ao longo de um processo que denominamos Édipo. Somente tendo passado por esse processo é que podemos afirmar que um sujeito se constitui como tal. Lacan divide esse processo em três tempos lógicos. Dizemos lógico em contraponto ao tempo cronológico que obedece a uma programação sequencial de desenvolvimento. O tempo lógico por sua vez ocorre no nível da estrutura e por isso escapa aos limites da temporalidade compartilhada. O primeiro tempo do Édipo A função materna: É a mãe que proporciona a criança a ilusão da existência de um corpo reificado e unitário. A criança não nasce com a percepção do seu próprio corpo como uma unidade. Isso precisa ser conquistado a partir da observação comparativa do próprio corpo com o corpo da mãe que proporciona a criança a antecipação de um corpo unificado. A esse processo Lacan dá o nome de Estádio do Espelho. A mãe é o Outro. Isso significa que da relação com a mãe a criança é extrai também os significantes que irão compor seu “eu”. É a mãe quem introduz a criança no campo da linguagem dando significado e sentido a cada expressão da criança. Nesse ponto a criança é o falo da mãe, ou seja, é justamente aquilo que lhe falta. A criança identifica-se com aquilo que é suposto faltar a mãe e permanece alienada a dialética do ser ou não ser o falo materno. Mãe Criança é o Falo O segundo tempo do Édipo Pela primeira vez a criança irá se defrontar com a presença do pai, com aquele ao qual se endereça o desejo da mãe. Portanto, se o pai passa a ocupar esse lugar do desejo materno, a criança passa a não mais ter a certeza de sê-lo. A presença paterna irá interditar a relação plena antes existente entre a mãe e a criança. A presença paterna irá incidir tanto sobre a mãe (privação) quanto sobre a criança (frustração e castração). Na medida em que permite a criança a experiência de sua ausência/presença dando a entender que seu objeto de desejo não se reduz a criança como falo, o terceiro termo entra em cena sendo aquilo que a mãe deseja em detrimento da criança. A criança atribui à imagem do pai/falo tudo aquilo que ela acredita precisar ser para obter o desejo da mãe. Assim, o pai se torna ao mesmo tempo um rival e alvo de identificações. Pai é o falo Mãe Criança O terceiro tempo do Édipo Aqui temos a passagem do pai como sendo o falo para o pai como tendo o falo, o que permite a criança entrar na dialética do ter ou não ter. Com isso podemos finalmente compreender a função paterna. O pai é uma metáfora e tem a função de elevar o desejo da mãe à categoria do significante. É assim, pela operação da metáfora paterna que o falo se torna um significante da falta, sendo que qualquer significado que lhe poderá ser atribuído terá como referência o significante mestre, o Nome-do-pai. Instaura-se a “presença da ausência” que pode ser entendida como a noção simbólica da existência de algo que não se observa na realidade. O pai tem a função de unir o desejo a lei. Ele finalmente separa a criança do acoplamento com a onipotência materna. Essa relação alienada ao desejo do Outro passa a ser regulada pela lei paterna, a qual o próprio pai está submetido. Pai Falo Mãe Criança A metáfora paterna Revisão 1. Quais os elementos da estrutura familiar? 2. Porque o falo é um dos elementos da estrutura familiar? 3. O que significa dizer que o falo é o significante de uma falta? 4. Descreva o primeiro tempo do Édipo apontando os principais aspectos da função materna. 5. Descreva o segundo tempo do édipo, explicando a entrada do pai como elemento da estrutura. 6. Explique o que é a metáfora paterna. Trabalho 3 Reúna em um único documento cada uma das perguntas que aparecem nas revisões da Unidade III e apresente uma resposta clara, objetiva a cada uma. As respostas devem se adequar ao enunciado das perguntas. O trabalho será avaliado nos seguintes aspectos: Organização e Didática: Uso correto da língua portuguesa. Sequência didática e organização lógica do assunto (alternância entre perguntas e respostas) Concatenação das frases e dos parágrafos. Clareza e objetividade. Referencias Bibliográficas Conteúdo: Conteúdo adequado ao tema proposto. Nível do conhecimento adequado ao de graduação (conteúdo proposto na disciplina fundamentos da psicanálise) Emprego de linguagem específica apropriado. Domínio do assunto, de conceitos e de definições. Originalidade (capacidade de transmissão escrita com palavras próprias) Referências Bibliográficas BLEICHMAR, Hugo. Introdução ao estudo das perversões: teoria do Édipo em Freud e Lacan. Artes Médicas, v. 1, p. 1, 1984. FINK, Bruce. O sujeito lacaniano. Zahar, 1998. FREUD, Sigmund. Carta 71. S. Freud, Edição standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud, p. 356-359, 1996. GARCIA-ROZA, Luiz Alfredo. Freud eo inconsciente. Zahar, 2005.