UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ CENTRO DE EDUCAÇÃO DA UNIVALI – BIGUAÇU CURSO DE PSICOLOGIA ANDRESSA LUIZA CATTANEO MACEDO ESTRUTURAS CLÍNICAS: Reflexões sobre o papel do Complexo de Édipo na formação das Estruturas Biguaçu 2009 2 ANDRESSA LUIZA CATTANEO MACEDO ESTRUTURAS CLÍNICAS: Reflexões sobre o papel do Complexo de Édipo na formação das Estruturas Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como requisito para obtenção do grau de Bacharel em Psicologia na Universidade do Vale do Itajaí, no curso de Psicologia. Orientação: Profª. Drª. Luciana Martins Saraiva. Biguaçu 2009 3 ANDRESSA LUIZA CATTANEO MACEDO ESTRUTURAS CLÍNICAS: Reflexões sobre o papel do Complexo de Édipo na formação das Estruturas Clínicas Este Trabalho de Conclusão de Curso foi considerado aprovado, atendendo os requisitos parciais para obter o grau de Bacharel em Psicologia na Universidade do Vale do Itajaí no curso de psicologia. Biguaçu, 26 de junho de 2009. Banca Examinadora Prof. ________________________________ Luciana Martins Saraiva (Orientadora). Prof. _______________________________ Paulo Cesar Nascimento (Membro). Prof. _______________________________ Mabel Franco Pinto (Membro). 4 RESUMO Desde os primordios, buscam-se explicações e descrições a cerca do comportamento humano. Dentre as muitas teorias desenvolvidas encontra-se a psicanálise, a qual defende que a personalidade desenvolve-se a partir de experiências infantis, marcadas por um conflito entre o sujeito, que visa a satisfação de seus impulsos instintivos e o mundo social, representado primeiramente pelas figuras parentais nos primeiros anos de vida. Tal conflito visa a interdição de determinadas formas de alcançar a satisfação, obrigando a criança desenvolver e organizar estratégias psíquicas que o levam à uma satisfação “aceitável”, caracterizando o Complexo de Édipo. Tal organização psíquica, subsidia a formação das Estruturas Clínicas, ou seja estruturas de personalidade. As três grandes Estruturas Clínicas caracterizam-se por: Neurose, Psicose e Perversão, sendo que cada qual representa um modo peculiar de funcionamento que repercute nas relações que o mesmo estabelece com o contexto social em que está inserido. Desta forma, foi realizada uma pesquisa com o objetivo de compreender o papel deste Édipo na formação das Estruturas Clínicas. Trata-se de uma pesquisa que utilizou o método qualitativo através da metodologia revisão bibliográfica. Os resultados indicam que é a partir do Complexo Edípico, mais especificamente, da sua dissolução, que as Estruturas Clínicas se organizam. Outras experiências infantis, tais como as funções parentais e a relação que as crianças estabelecem com os mesmos, influenciam significativamente no desenvolvimento de tais Estruturas, implicando diretamente na organização psíquica. Palavras-chave: Complexo de Édipo; Estruturas Clínicas; Revisão Bibliográfica. 5 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ........................................................................... 6 2 REFERENCIAL TEÓRICO ........................................................ 2.1 FUNÇÃO MATERNA ................................................................. 2.2 FUNÇÃO PATERNA .................................................................. 2.3 COMPLEXO DE ÉDIPO ............................................................. 2.4 ESTRUTURAS CLÍNICAS ......................................................... 2.4.1 Neurose ...................................................................................... 2.4.2 Perversão .................................................................................... 2.4.3 Psicose ....................................................................................... 2.4.4 As Estruturas na clínica psicanalítica ........................................ 2.4.5 Considerações sobre o capítulo.................................................. 8 8 10 12 16 19 21 23 24 26 3 CONSIDERAÇÕES FINAIS ......................................................... 29 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS............................................ 31 6 1 INTRODUÇÃO Para a Psicanálise, desde o nascimento a criança investe sua libido na figura materna, pois é a mãe quem o alimenta e ajuda-o em suas necessidades básicas. Desta forma, para a criança, seu mundo é constituído por ela e a mãe, configurando a relação dual mãe-bebê. Este tipo de relação constitui o estado Narciso. Por volta dos três aos cinco anos de idade, essa relação dual é ameaçada com a chegada de uma terceira pessoa na relação, ou seja, a figura paterna, que é responsável por separar essa dupla mãe-bebê, para que a criança entenda que há um mundo externo e uma realidade externa, sendo que o mesmo não pode deter-se somente nessa relação. Além disso, a imposição da figura paterna na relação é necessária para o desenvolvimento emocional infantil. Com essa ruptura da díade mãe-filho tem-se a passagem para a triangulação edípica, ou seja, para o Édipo. Desta forma, nessa passagem de Narciso a Édipo, dois Complexos estão envolvidos: O Complexo de Édipo e o de Castração. O primeiro configura-se como a ambivalência de sentimentos hostis e amorosos em relação às figuras parentais, pois nesse período, por volta dos três aos cinco anos, a criança vivencia um grande drama ao saber que ela não é tudo para a mãe e que não é capaz de satisfazê-la totalmente, por isso a convocação do terceiro, a figura paterna, para essa ruptura da díade mãe-filho. Quanto ao Complexo de Castração, refere-se na fantasia da criança de ser castrada, caso escolha por sustentar esse amor pela mãe e não aceitar a separação. Desta forma, a criança percebe a falta, ou seja, percebe que ela não é tudo e que não tem o falo para satisfazer a mãe, percebendo a diferença anatômica entre os sexos, onde o menino teme ser castrado e a menina acredita que já foi castrada. Esses dois Complexos ocorrem concomitantemente no desenvolvimento emocional infantil. Assim, para a psicanálise, sobretudo Freudiana, ela se organiza em torno do paradigma edípico sendo que após a passagem dos Complexos de Édipo e o de Castração, a saída do indivíduo frente a esses Conflitos, estabelece uma organização psíquica, ou seja, uma Estrutura Psíquica subjetiva. As três grandes Estruturas caracterizam-se por: Neurose, Psicose e Perversão. Para tanto, a função das figuras parentais, ou seja, da figura paterna e materna, exercem grande influência nessa passagem de Narciso a Édipo, pois ambos desempenham funções primordiais, as quais repercutirão na resposta do filho, ou seja, na sua organização psíquica. Para que a criança responda a tais Complexos, de forma “ideal”, os pais necessitam 7 desempenhar sua função adequadamente, por exemplo, a mãe precisa permitir a entrada do pai na relação mãe-criança, para que haja a cisão de tal simbiose, e o pai, por sua vez, necessita impor-se na relação. Caso os pais não desempenhem adequadamente essas funções, essa ausência quando paterna poderá repercutir, por exemplo, conforme Katz e Costa (1983), na não- separação da díade mãe-filho, o que abre caminhos para a Psicose. Se a falha ocorrer na função materna, por exemplo, a mãe não auxilia na separação da díade mãe-filho, isso poderá acarretar em dificuldades para a criança reconhecer a existência de um Outro, no caso o pai, e dessa forma, de acordo com Gomes e Resende (2004), a passagem da criança do mundo da família para o da sociedade fica comprometido. Este estudo propõe responder qual o papel do Complexo de Édipo na formação das Estruturas Clínicas, tendo como objetivos a compreensão deste papel do Édipo na formação de tais Estruturas; bem como analisar a relação da criança com as figuras materna e paterna, de forma ampliada, em cada Estrutura; e descrever a dissolução do Complexo de Édipo na formação das Estruturas Clínicas. A relevância científica do presente trabalho está na organização do conteúdo e dos conceitos relacionados às Estruturas Clínicas. Já a relevância social está na desmistificação dos conceitos e compreensão dos aspectos relacionados à temática, a fim de propiciar aos futuros profissionais psicólogos e aos terapeutas, um importante instrumento que os auxilie em seu trabalho. Utilizou-se a pesquisa na abordagem qualitativa, com o método de Pesquisa Bibliográfica, que segundo Marconi e Lakatos (1999), deve possibilitar a apresentação do tema sob um novo enfoque não se limitando a uma mera repetição das idéias dos autores consultados. Os resultados dessa pesquisa auxiliarão no esclarecimento da importância das funções parentais e do Complexo Edípico na formação das Estruturas Psíquicas, que são primordiais na compreensão dos fenômenos psíquicos no tratamento psicológico. 8 2 REFERENCIAL TEÓRICO Em psicanálise, as Estruturas Clínicas, conforme Kernberg (1991) são padrões de funcionamento psicológico subjetivo, estáveis e duradouros, que diante de situações específicas, organizam o comportamento, experiências e percepções do indivíduo. A formação, desenvolvimento e funcionamento dessas Estruturas Clínicas, estão muito atreladas às relações vivenciadas com as figuras primárias da vida do indivíduo. Tais figuras primárias referem-se à figura materna e paterna. Desde que nasce a criança já inicia seu desenvolvimento psicossexual. Conforme Zimerman (1999), a psicossexualidade é um processo evolutivo, de forma não-linear, é uma construção, considerando tanto aspectos inatos da criança, quanto os aspectos adquiridos pela influência do meio externo, principalmente os referentes aos pais. Tais fatores, segundo o autor, estão em constante interação e influenciam na formação da personalidade. Deste modo, o desenvolvimento da psicossexualidade, constitui-se de fases: Oral, Anal, Fálica, Período de Latência e a fase Genital, as quais auxiliarão na definição da personalidade. Além disso, o desenvolvimento também é marcado por Complexos, sobretudo o de Édipo, o qual as figuras primárias, paterna e materna, exercem sua função. No Complexo de Édipo, segundo Freud (1924), o pai desempenha papel importantíssimo ao trazer o filho à luz da realidade externa, configura-se como o fenômeno central do desenvolvimento psicossexual. Sendo o mesmo, de caráter decisivo, pois é através da sua dissolução, que as Estruturas Clínicas originam-se. Tais Estruturas formam-se a partir do modo que o sujeito lida com a Castração. Assim, de maneira sucinta, se o sujeito reconhece a castração, configura-se Neurótico. Se a Castração é inscrita, porém o sujeito a denega, ou seja, reconhece a Castração, mas a nega, configurando assim a Estrutura Perversa. E por fim, se não reconhece a Castração, a Estrutura é Psicótica. 2.1 FUNÇÃO MATERNA A figura materna é essencial para a sobrevivência do bebê, visto que é ela, quem remeterá os primeiros cuidados à criança, a qual se encontra em dependência absoluta, além 9 de estabelecer com a criança, conforme aponta Brenner (1987), a primeira relação de objeto, onde a mãe, para ambos os sexos, configura-se como esse primeiro objeto o qual o bebê investe sua libido. Para tanto, conforme aponta Alt e Benetti (2008), a maternidade envolve um processo de identificação entre a mãe e a criança, englobando tanto vivências reais e subjetivas da mãe e características da criança. Ainda, conforme as autoras anteriormente citadas, para exercer a função materna de forma “eficiente” é necessário que a mulher tenha internalizado experiências consideradas boas com suas próprias figuras cuidadoras, e mais ainda, a sua própria experiência, quanto à dissolução dos seus Complexos de Édipo e de Castração. A função materna, além dos primeiros cuidados, e da identificação, também influencia na saída do Narcisismo para o Édipo, sendo responsável pela mediação entre pai e filho, podendo facilitar ou dificultar essa entrada de uma terceira pessoa para a instauração do Complexo de Édipo (ROHDE apud SOUZA, 2007). Freud, em relação à Estruturação Psíquica, enfatizou mais a função paterna, porém, não deixou de considerar a importância da figura materna, no que concerne ao facilitar a entrada de uma terceira pessoa na relação, no caso, o pai. Contudo, distanciando do paradigma edípico proposto por Freud, alguns teóricos, como Melanie Klein e Winnicott atribuíram à mãe a função central no desenvolvimento da criança. Melanie Klein, em sua obra, dá grande ênfase à função materna, ou seja, uma concepção, conforme aponta Zimerman (1999, p. 98) “seiocêntrica”, a qual atribui à mãe uma função significamente maior na Estrutura Psíquica da criança. Deste modo, as relações primitivas do bebê com a mãe, mais precisamente com o objeto parcial seio, é dividido em “seio bom” e “seio mau”, e é de extrema importância para tal desenvolvimento. Conforme Winnicott (apud Brum e Schermann, 2004), a mãe tem função primordial no desenvolvimento emocional do bebê, de dependência para independência. Sendo que a dependência é absoluta quando o bebê nasce, mas diminui ao longo da vida. A mãe “suficientemente boa” propicia a integração do bebê, juntando as partes soltas em um mesmo corpo, e identificando-se com ele numa mesma unidade. Ainda, segundo Winnicott (1971), o rosto da mãe funciona como um espelho, o qual auxilia no desenvolvimento emocional da criança, pois olhando para o bebê, “aquilo com o que ela (mãe) se parece, se acha relacionado com o que ela vê ali”. (WINNICOTT, 1971, p. 154, grifo meu) 10 Bowlby (apud BRUM e SCHERMANN, 2004), assim como Winnicott, considera importante as primeiras relações da mãe e bebê para o desenvolvimento. Porém diverge de Winnicott em alguns pontos, como por exemplo: considera que estar apegado a uma figura materna e ser dependente de uma figura materna (Winnicott) são coisas distintas, apesar de ter base numa relação mãe-bebê. Além disso, o apego, segundo Bowlby está ausente no nascimento e começa ganhar força nos primeiros meses de vida. Bion (apud BLEICHMAR e BLEICHMAR, 1992, p.253), um pós-Kleiniano, defende a idéia de que há um vínculo, desde o nascimento, entre mãe e bebê, onde o bebê apresenta, além das necessidades corporais, necessidades psicológicas também. Já a mãe, configura-se como uma espécie de continente que, quando a angústia do bebê for intolerável, este pode descarregar em sua mãe, a qual se possuir certas capacidades emocionais, “poderá absorvêlas, metabolizá-las, devolvendo-as de maneira menos angustiante, e, portanto, mais assimilável para seu filho”. Ainda, segundo Zimerman (1999), a teoria de Bion, tem um valor eqüitativo, pois considera tanto o meio externo (extremo valorizado na teoria de Winnicott), quanto o mundo interno (extremo assumido por Klein) para a formação e desenvolvimento do psiquismo humano. Contudo, sendo teoria “seiocêntrica” ou não, a importância da função materna não é descartada e nem perde sua importância. Conforme apresenta Zimerman (1999, p.106), a função materna pode ser normal ou patológica, e tem conseqüências diretas na estruturação do sujeito. Segundo o autor e de acordo com o que o presente trabalho se propõe de modo sucinto, uma adequada maternagem caracteriza-se pela não frustração ou não gratificação excessiva, ou mesmo, a privação da frustração ou gratificação. Assim, uma normalidade da função materna deve, acima de tudo, visar uma “dessimbiotização” e abrir caminho para a entrada de uma terceira pessoa na relação, um pai, respeitado e valorizado como tal. Desta forma, a mãe está promovendo a passagem para a Triangulação Edípica, fato precursor e decisivo para a formação das Estruturas Clínicas. 2.2 FUNÇÃO PATERNA A principal função paterna no desenvolvimento da criança é a aproximação do pai com a dupla mãe-filho, para efetuar o “corte” em tal relação, ou seja, conforme palavras de Zimerman (1999, p. 107), o pai é que faz o papel de “terceiro”. Ou ainda, segundo Katz e 11 Costa (1983), o pai é a segunda identificação parental da criança e vai servir para “puxar” a criança do colo da mãe, evitando a prolongação da díade mãe-bebê. Para tanto, conforme Rohde et al (1991), o pai pode agir de forma indireta nessa relação, a partir do apoio que o mesmo dispensa à sua esposa, e também pode agir diretamente, caracterizando-se pela interação direta do pai com seu filho. Segundo Katz e Costa (1983), citando Freud, a figura paterna é responsável por: a) proteger a dupla mãe-bebê; b) ajudar o filho a se separar da mãe; c) direcionar a criança ao Princípio de Realidade; d) e por fim, se for um pai presente, permitirá à criança notar as diferenças entre identidade, sexo e etc. Ainda conforme as palavras de Gomes e Resende (2004), o pai tem função estruturante, a partir da instauração do Complexo de Édipo. Conforme Rohde et al (1991, p.129), além da função de terceiro, no rompimento da díade mãe-bebê, salienta, ainda, a função do pai como “sustentáculo” para a mãe, dando suporte na área emocional, ajuda com os cuidados com o bebê, suporte financeiro, e a condição para que a mulher fique segura e livre para envolver-se nas suas funções maternas, não necessitando ocupar de seu tempo para outros afazeres “dispensáveis” em tal momento. Para Freud (apud KATZ e COSTA, 1983) o pai logo após o nascimento do filho, é dispensável à sobrevivência da criança, sendo somente mais tarde alvo de interesse dessa criança, justamente quando esse pai aparece na relação como o Outro, configurando a Triangulação Edípica. Porém há situações em que esse pai não aparece, pelo menos de forma adequada, nessa relação. Por isso, Katz e Costa (1983, p.210), definiram de “privação paterna a ausência, debilidade ou inadequação das funções paternas no desenvolvimento emocional da criança”. Ou seja, se o pai não é ativo em suas funções, mostra-se silencioso diante da simbiose mãe-bebê, consequentemente não realiza-se o “corte” necessário, acarretando complicações quanto à organização subjetiva que essa criança desenvolverá, após a resolução dos Complexos de Édipo e o de Castração. As mesmas autoras caracterizam cinco tipos de pais, que apesar de sua presença, não desempenham suas funções de forma satisfatória, a conhecer: “pais autoritários”; “pais perfeitos”; “pais que negam as diferenças”; “pais maternizados” ; e os pais de personalidade “como se”. No que concerne as consequências de tal privação, as mesmas autoras, argumentam que pode causar uma série de transtornos emocionais, incluindo psicoses; problemas comportamentais; e a “pseudomaturidade”. E as causas da privação paterna, apresentadas por Katz e cols. (1989), sugere a “má” resolução do pai, dos seus próprios Conflitos Edipianos. Assim, podemos afirmar que, do 12 mesmo modo como a identificação mãe-bebê, passa pela experiência da própria mãe, quanto a sua infância, o pai também carrega uma história de vínculos do seu desenvolvimento e Estruturação Psíquica. Conforme aponta Zimerman (1999 p.107): É útil saber como foi o vínculo dele com seu respectivo pai, e até que ponto ele está repetindo com seu filho; qual é a representação interna que ele tem da esposa (mãe da criança) e que influirá bastante naquela que o filho terá da mãe, e também qual o ‘lugar’ que o pai ocupa no desejo e na representação que a esposa tem dele. De acordo com o mesmo autor anteriormente citado, a figura paterna também exerce a importante função de colocação e reconhecimento de limites e a aceitação das diferenças. Desta forma, o pai auxilia o filho na passagem do Princípio do Prazer para o de Realidade, condição necessária para o desenvolvimento emocional, pois a criança, volta-se agora para o social, ou seja, para o pai, irmãos e amigos. Porém, quando a função paterna falha, esta passagem do Narcisismo ao Édipo não é bem sucedida e acarreta consequências à criança. Uma das consequências, segundo Jerusalinsky (apud Kupfer, 2000), é a psicose. 2.3 COMPLEXO DE ÉDIPO Antes de explicitarmos o que é Complexo de Édipo e qual sua função, faz-se necessário, primeiramente, sabermos o que é Complexo para a psicanálise. Segundo Laplanche e Pontalis (1998, p. 70) Complexo define-se como: Conjunto organizado de representações e recordações de forte valor afetivo, parcial ou totalmente inconscientes. Um Complexo constitui-se a partir das relações interpessoais da história infantil; pode estruturar todos os níveis psicológicos: emoções, atitudes, comportamentos adaptados. Ainda conforme Lacan (2003), fatores culturais determinam o Complexo, sendo que o mesmo é compreendido conforme a sua referência com o objeto, porém com uma representação inconsciente. O Complexo de Édipo, segundo Freud (1924) constitui-se como um fenômeno central e decisivo no desenvolvimento sexual da primeira infância. Conforme Laplanche e Pontalis (1998, p. 77), “Complexo de Édipo é o conjunto organizado de desejos amorosos e hostis que a criança sente em relação aos pais”. Conforme Reis (1984), o Complexo de Édipo é um 13 drama vivenciado pela criança, por volta do terceiro ao quinto ano de idade, e constitui-se como a noção central da personalidade, na teoria freudiana. Para explicar a origem do Complexo de Édipo, as quais nasceram as restrições morais, organização social e a religião, Freud (1913) descreve um mito, “Totem e Tabu”, o qual, um pai detinha o poder e todas as mulheres do grupo, e por inveja e temor, os filhos o mataram e o devoraram. Porém, depois de tal fato, sem a proteção do pai e com o sentimento de culpa, instaurou-se uma nova ordem social, com a proibição do incesto e assassinato e instituindo a exogamia. Assim, a questão Edípica está vinculada com a interdição do incesto, ou ainda, com a introjeção da lei, a partir do qual o sujeito percebe que não é possível realizar ou fazer tudo que deseja, de modo que ele necessita organizar-se a partir das leis. Desta forma, segundo Brenner (1987), as experiências e acontecimentos dessa fase edípica têm significado e influência na vida da maior parte das pessoas, visto que os desejos incestuosos existentes na infância e os conflitos oriundos destes são uma experiência comum a toda humanidade, assim dando ao Complexo Edípico um caráter de universalidade. É durante a fase fálica do desenvolvimento psicossexual, que o Complexo de Édipo se desenvolve. Tal Complexo configura-se como um agrupamento das relações de objetos, a qual, de maneira inconsciente, o indivíduo apresenta fantasias de incesto com o genitor do sexo oposto aliando os intensos sentimentos de ódio e ciúme ao genitor do mesmo sexo, configurando-se como um verdadeiro caso de amor (BRENNER, 1987). Conforme o mesmo autor, no início de tal Complexo, para ambos os sexos, a relação de objeto com a mãe, é mais forte, seguido do desejo de possuir o amor e admiração da mãe com exclusividade e de dar bebês à mãe assim como fez o pai. Porém, concomitantemente com esse desejo incestuoso pela mãe e de ser o único objeto de amor para ela, vem os desejos de destruição e desaparecimento dos possíveis rivais, que seriam o pai e irmãos, despertando na criança, conflitos graves. Estes conflitos são principalmente, pelo temor tanto da retaliação (castração), quanto pela perda do amor do genitor, devido seus desejos ciumentos. Com o desenvolvimento emocional, a instância “Superego” ou “Ideal do Ego”, instaura-se e segundo Freud (1923, p.48) ele é “o herdeiro do Complexo de Édipo”, pois herdará as leis, como a proibição do incesto, e desta forma, constitui um método de obter controle sobre o Id. Porém, conforme Freud (1924), o Complexo Edipiano, apresenta-se diferente para meninos e meninas. Nos meninos, após a visão dos órgãos femininos, o caso de perder o seu pênis, torna-se um fato possível e a ameaça de castração já ganha efeito antecipado. Desta 14 forma, se o preço que o mesmo terá que pagar pelo amor a esse objeto parental custar-lhe-á o pênis, origina-se o conflito entre seu interesse narcísico (permanecer com o órgão) e a catexia libidinal nas figuras parentais, normalmente, prevalecendo a escolha do manter seu pênis intacto e recusar esse amor, sendo as catexias desses objetos abandonadas e substituídas por identificações. A partir daí, a autoridade e as proibições dos pais são internalizadas, constituindo o núcleo do superego. Porém todo esse processo ocasionou a perda da função do órgão genital, deixando-o sem sua função e assim marcando a entrada do menino no período de latência. Desta forma, o “ideal” seria uma verdadeira abolição e destruição do Complexo, contudo, pode haver somente uma repressão, o que Freud (1924) adverte que o mesmo continuará persistente mesmo que no estado inconsciente no Id, e poderá manifestar mais tarde seu efeito patológico. O desenvolvimento do Complexo Edipiano nas meninas apresenta-se de forma diferente dos meninos, no que concerne à organização fálica e no Complexo de Castração. Sendo que a menina explica o fato de não possuir um órgão grande como o menino, presumindo que anteriormente possuía-o, porém o perdera porque foi castrada. Desta forma, Freud (1924, p. 223) aponta-nos que: “Dá-se assim a diferença essencial de que a menina aceita a castração como um fato consumado, ao passo que o menino teme a possibilidade de sua ocorrência”. Porém no Complexo Edípico na menina, a renúncia do pênis vai surgir, seguida por uma tentativa de compensação, ou seja, na menina o desejo “desliza” de um pênis para um bebê. Desta maneira, ela volta-se para o pai com o desejo de dar-lhe um filho. Para Lacan, conforme Dor (1989) anuncia em sua obra, a metáfora do Nome-do-Pai, que articula a função fálica1 à ocorrência do Complexo de Castração, é o significante que irá estruturar e delimitar toda a trajetória Edipiana. Assim: Segundo Lacan, a função fundamental do Édipo aparece como coextensiva à função paterna. Trata-se, aqui, de uma função que deve ser entendida como algo radicalmente distinto da presença paterna, bem como de suas ocorrências negativas, tal a ausência, a carência e todas as outras formas de ‘inconsistência’ paternas. (Lacan apud Dor, 1989, p. 77-78) Segundo Dor (1989, p. 81), conforme sua obra de introdução à teoria Lacaniana, o Complexo de Édipo é composto por três momentos. No primeiro momento, a criança ainda apresenta-se numa relação quase fusional com a mãe, pois se identifica como sendo o objeto que faltava à mãe. No segundo momento, aparece a oscilação dessa identificação, pois a 1 Segundo Nasio (2007), o Falo não é o pênis enquanto órgão, ele é um pênis fantasiado, idealizado, símbolo de onipotência, ou seja, de poder absoluto. 15 criança é introduzida no registro da Castração e a questão entre “ser ou não o falo” aparece. Desta forma, nesse segundo momento, o pai já desempenha função fundamental na relação mãe-criança. E o terceiro e último momento condiz com o declínio do Complexo de Édipo e a simbolização da lei. Outro ponto que difere entre os sexos é a questão do Complexo de Castração, sendo pertinente anunciá-lo no presente trabalho, visto que se apresenta muito relacionado com o Complexo de Édipo. De acordo com Laplanche e Pontalis (1998, p.73) Complexo de Castração caracteriza-se como: “Complexo centrado na fantasia de castração, que proporciona uma resposta ao enigma que a diferença anatômica dos sexos (presença ou ausência de pênis) coloca para a criança. Essa diferença é atribuída à amputação do pênis na menina.” Conforme Reis (1984) o Complexo de Castração constitui o âmago do Complexo de Édipo. Desta forma, no menino, segundo Nasio (1995), o Complexo de Castração organiza-se de maneira muito diferente a da menina. Contudo apresenta certas semelhanças no que se refere à universalidade do pênis, o que é precondição para a constituição do Complexo de Édipo; e quanto à importância do papel da mãe, ocorre a separação da díade mãe-filho, depois de a criança descobrir-se castrada, o qual o menino separa-se com angústia e a menina com ódio. Conforme Nasio (1995) há duas diferenças quanto à Castração masculina e feminina. A primeira refere-se que no menino o Complexo de Castração termina numa renúncia ao amor pela mãe, sendo que a menina abre-se para o amor Edipiano pelo pai. Assim, o autor afirma: “o Édipo do menino nasce e se encerra com a Castração. O Édipo da menina nasce, mas não termina com a Castração”. (NASIO, 1995, p. 18). A segunda diferença, conforme o mesmo autor está no fato de a separação do Complexo de Castração ser a repetição de uma separação anterior vivenciada pela menina. Sendo essa primeira separação, a perda do seio materno. Desta forma, na menina reaparece, por ocasião do Complexo de Castração, o ressentimento e ódio anteriormente recalcados de forma “inexorável”. Assim, ressurge na filha o ódio, sob a forma de hostilidade e rancor, até pelo fato de tê-la feito menina. Essa atualização de “sentimentos negativos” em relação à mãe marca o fim do Complexo de Castração. Logo, a mãe está presente no início e no término do Complexo de Castração da menina. Ainda, Zimerman (1999), destaca a importância de outro Complexo, o Fraterno, no desenvolvimento emocional da criança. Este Complexo, segundo o autor, também se trata de um conjunto de sentimentos, tanto hostis quanto amorosos, mas experimentados em relação aos irmãos. Os irmãos são objetos de duplos investimentos, onde o primeiro investimento 16 refere-se aos duplos sentimentos, a ambivalência entre amor e ódio, ciúme e inveja para com os irmãos. O segundo investimento é o deslocamento para os irmãos de pulsões libidinais, ou agressivas, que seriam enviadas aos pais. Diante dessas experiências no desenvolvimento psicossexual infantil, principalmente dos Complexos de Édipo e o de Castração, têm-se a formação das Estruturas Clínicas, ou seja, uma organização psíquica subjetiva. Conforme Lacan (1966), toda Estrutura se define por um conjunto de elementos e de leis de composição interna aplicadas a esses elementos. Ainda, Dias (2004), em sua tese de Doutorado, citando Lacan, explicita que Estrutura Clínica é a estruturação de uma questão, sendo tal questão relacionada à posição do sujeito frente ao Édipo e à sua própria sexualidade. Dias (2004, p.103) ainda acrescenta: “A organização destas estruturas psíquicas decorre das dificuldades relacionadas à Castração, dos amores Edipianos, da interferência dos desejos recíprocos da mãe, do pai e da criança em relação ao objeto fálico.” Contudo, segundo Bergeret (1998), não é possível estabelecer se determinada Estrutura é patológica ou “normal”. O que pode ser feito refere-se a: Estabelecer uma hierarquia das maturações sexuais, dos níveis de elaboração dos processos mentais, dos graus atingidos pela força do ego, dos níveis de constituição de superego, das possibilidades de relação ou de independência objetal, etc. Desta forma temos três grandes Estruturas, a saber: Neurose, Psicose e Perversão. O sujeito neurótico é aquele que reconhece a Castração, e recalca-a, internalizando regras e obedecendo-as, pois se transgredí-las tem em seguida culpa e sofrimento. O perverso, por sua vez, reconhece a Castração, porém a denega, e não receia em transgredir regras e normas. Por fim, o psicótico é aquele que não reconhece a Castração, o ego rompe com a realidade, sendo que o sujeito vive conforme o Princípio de Prazer e do Processo Primário. 2.4 ESTRUTURAS CLÍNICAS Anteriormente à instauração do Complexo de Édipo2, as crianças não se diferenciam de acordo com o sexo, pois não vêem diferenças entre meninos e meninas. Eles brincam, 2 Freud situou o Complexo de Édipo por volta dos três anos de idade. Para Melanie Klein, a situação Edípica ocorre bem mais cedo, por volta dos seis ou oito meses de idade (ZIMERMAN, 2001) 17 tocam-se, sobem um em cima do outro, roçam-se, porém tanto para essas crianças quanto para os adultos que presenciam tal brincadeira, é normal e próprio da idade. A isso Freud (1923) chama de perversão3 polimorfa, para designar a sexualidade infantil, e que segundo Laplanche e Pontalis (2001, p. 342), ocorre quando essa “sexualidade infantil está estreitamente ligada à diversidade das zonas erógenas, e na medida em que se desenvolve antes do estabelecimento das funções genitais, propriamente ditas” . Desta forma, conforme expõe Delouya (2003, p.208): “A Bissexualidade Originária forma uma espécie de substrato sobre o qual se trabalha e se processa o Édipo”. Ainda de acordo com o mesmo autor, a elaboração dessa Bissexualidade Originária é um ponto crucial e determinante para o destino do Édipo, quanto sua dissolução e formação do seu herdeiro, o Superego. Assim, a resposta perante a Castração, seja negando-a, desmentindo-a ou rejeitando-a, implica em uma transformação da Bissexualidade Originária (DELOUYA, 2003). A transmissão tanto da Bissexualidade Originária quanto do programa Edípico é de ordem hereditária e cultural. Ou seja, essa transmissão é do inconsciente dos pais para criança, visto que em sua infância, os pais já viveram, presenciam e elaboraram essas mesmas etapas. Esta transmissão faz parte do desenvolvimento dos indivíduos e da espécie (FREUD, 1923). Melanie Klein (1996) menciona em sua obra a importância de certas experiências infantis no desenvolvimento da sexualidade. A primeira delas está ligada à observação do coito. Klein afirma que quando essa observação se dá após o período de desenvolvimento, ela poderá caracterizar um trauma na criança. Porém, ao contrário, se essa observação ocorrer em idade precoce, a criança também sofre alguns riscos, como ficar fixada em uma fase do desenvolvimento psicossexual. O outro tipo de experiência que Klein (1996, p. 226) refere-se é as: Relações sexuais que as crianças pequenas têm entre si, ou entre irmãos e irmãs ou amiguinhos, que consistem nos atos mais diversos: olhar, tocar, defecar juntos, felação, cunilíngua e muitas vezes tentativas diretas de realizar o coito. Assim, conforme a mesma autora, tais experiências são cruciais para a formação do Complexo de Édipo, a resolução de tal Complexo e para suas relações sexuais posteriores. Ainda, conforme a obra de Aberastury (1996), Klein descreve que no menino, há um período de homossexualidade logo no início do Complexo de Édipo, que segundo a mesma 3 Na psicanálise, a perversão é vista somente no âmbito da sexualidade e de uma forma geral, pode ser determinada como comportamentos psicossexuais atípicos para a obtenção do prazer sexual (LAPLANCHE & PONTALIS, 2001). Ainda, de acordo com Pajazckowska (2005), psicanaliticamente, perversão é uma atitude sexual, mas não necessariamente uma atitude genital (tendo em vista, que o conceito de sexualidade, para a psicanálise, é mais abrangente que a simples relação genital). 18 teórica, começa bem mais cedo (por volta de um ano de idade) em relação à descrição feita por Freud. Quanto à Bissexualidade, como uma opção sexual, Jorge (2007), em seu artigo a cerca do centenário da obra de Freud, relata que embora alguns psicanalistas (como Fliess) acreditassem que a Bissexualidade era uma predisposição biológica, para Freud, a Bissexualidade caracteriza-se como uma disposição psicológica, mas precisamente na escolha do objeto – homossexual ou heterossexual. Segundo Laplanche e Pontalis (2001, p. 55) a Bissexualidade é: Noção que Freud introduziu na psicanálise por influência de Wilhem Fleiss: todo ser humano teria constitucionalmente disposições sexuais simultaneamente masculinas e femininas que surgem nos conflitos que o sujeito enfrenta para assumir o seu próprio sexo. De acordo com Zimerman (1999), Freud em seus estudos clínicos, especialmente na análise do “Pequeno Hans”, comprovou a existência de “teorias” na mente das crianças. Essas “teorias” têm o propósito de ajudá-las a decifrar o mistério do nascimento. Além de tentar decifrar o grande enigma de sua existência, a criança, de acordo com Zornig (2008, p. 76), constrói, “através de sua fantasia, um lugar subjetivo que lhe permite deslocar-se da posição de alienação original no discurso parental”. Desta forma, Zimerman (1999, p. 43) também evidencia que Freud caracterizou a criança como um perverso polimorfo, devido as suas “fontes de excitação serem múltiplas e variadas”, caracterizando a Bissexualidade Originária. Fenichel (1981, p. 55), citando Freud, descreve algumas diferenças da sexualidade infantil em relação à sexualidade adulta. Entre elas, temos que a maior excitação, na sexualidade infantil, não se localiza necessariamente nos órgãos genitais, mas sim em diversas zonas erógenas. Outro ponto que difere é quanto aos objetivos, que não levam necessariamente ao contato sexual. Deste modo, o autor complementa: A criança pequena é criatura instintiva [...], cheia de uma sexualidade total ainda indiferenciada. [...] Toda ordem de excitação que se produz na criança pode tornarse fonte de excitação sexual: estímulos mecânicos e musculares, afetos, atividade intelectual e até a dor. Na sexualidade infantil, a excitação e a satisfação não estão nitidamente diferenciadas. Contudo, devido ao desenvolvimento sexual infantil, esse período dará lugar a outro caracterizado pelo funcionamento dos órgãos genitais como a principal zona erógena. Desta 19 forma, Fenichel (1981, p. 56) enfatiza que a “sexualidade pré-adulta” pode ser dividida em três principais períodos: o período infantil, o período de latência e a puberdade. Assim, como expõe Zimerman (2001, p. 55) “a bissexualidade, tanto a biológica quanto a psicológica, até um determinado grau é uma característica normal e universal.” Conforme vimos anteriormente e de acordo com Person et. al. (2007) o papel materno e o paterno exercem grande influência no desenvolvimento psíquico da criança, sendo que a criança internalizará alguns aspectos destes primeiros relacionamentos em sua vida. Ainda conforme o mesmo, além destas influências parentais, a criança também está sujeita a influenciar-se pelos relacionamentos com irmãos (até os “meio-irmãos”), avós, membros da família extensa (tio, tia, primos), parentes pelo segundo casamento, pessoas que não fazem parte da família, animais (estimação, animados ou inanimados) e alguma representação divina que a criança venha acreditar. Desta forma, a seguir passar-se-á ao estudo das Estruturas Clínicas, focando o papel do complexo de Édipo e as funções materna e paterna na formação de cada uma delas. 2.4.1 Neurose Conforme seu texto “Dissolução do complexo de Édipo”, Freud (1924, p. 221-222) afirma: Não vejo razão para negar o nome de ‘repressão’ ao afastamento do ego diante do complexo de Édipo [...]. O processo que descrevemos é, porém, mais que uma repressão. Equivale, se for idealmente levado a cabo, a uma destruição e abolição do complexo. Plausivelmente podemos supor que chegamos aqui à linha fronteiriça – nunca bem nitidamente traçada – entre o normal e o patológico. Se o ego na realidade não conseguiu muito mais que uma repressão do complexo, este persiste em estado inconsciente no id e manifestará mais tarde seu efeito patogênico. Desta forma, segundo Freud, o recalque ou ‘repressão’ é um dos destinos possíveis ao Complexo de Édipo, sendo que esse recalque pode ser de duas maneiras distintas: ou ele é um recalque eficaz, que dá conta da abolição total do complexo de Édipo (o que Freud considera como uma ‘saída normal’) ou tal censura apenas mantêm o Édipo no inconsciente, sendo que o mesmo se manifestará mais tarde, na forma de sintoma. O sintoma, conforme Zimerman (2001, p. 388): 20 É a expressão de um conflito inconsciente, geralmente a de um desejo proibido sofrendo um recalcamento de uma instância repressora, que só permite a manifestação indireta do desejo, camuflado e disfarçado sob a forma de um sintoma, de forma análoga ao que se passa no fenômeno do sonho. Freud no seu texto ‘O sentido dos sintomas’ (1917, p. 265) afirma que “os sintomas têm um sentido e se relacionam com as experiências do paciente”. No texto ‘Fixação em Traumas’ (1917, p. 287), Freud ainda acrescenta que não só o sentido do sintoma é inconsciente, “mas também existe uma relação inseparável entre este fato de os sintomas serem inconscientes e a possibilidade de eles existirem”. Ou seja, tal sentido deve ser inconsciente, sendo que o sintoma não se forma a partir de processos mentais conscientes. Desta forma, Freud conclui que “os sintomas neuróticos têm, portanto, um sentido, como as parapraxias e os sonhos, e, como estes, têm uma conexão com a vida de quem os produz” (FREUD, 1917, p. 265). Em “análise terminável e interminável”, Freud (1937) lembra-nos que o desaparecimento de tal sintoma só se concretiza quando os processos mentais inconscientes envolvidos tornam-se conscientes, ou seja, quando o reprimido torna-se consciente, sendo este um dos objetivos da análise. O complexo de Édipo para Lacan (1957) configura-se em três tempos: sendo o primeiro tempo, quando o filho situa-se com o falo materno, como sendo o único a satisfazer completamente a mãe. O pai neste primeiro tempo ainda não tem participação como terceiro, nesta relação; O segundo tempo caracteriza-se com a intervenção de um terceiro, ou seja, a figura paterna, fazendo com que a criança se depare com a questão da falta; e finalmente o terceiro tempo que é marcado pela posição da criança de ter ou não ter o falo, e não mais pela ser ou não ser. Desta forma, a criança, através da falta, passa a ser um sujeito desejante. Desta forma, para Lacan (1957), a neurose é a Estrutura Clínica caracterizada pela presença do recalque e do efeito patogênico que o mesmo causa no inconsciente, surgindo assim os sintomas. Desta maneira, a neurose configura-se como a estrutura de uma questão, sendo que a discussão do sujeito gira em torno da indagação “Quem eu Sou?” (LACAN, 1957) Esta pergunta, conforme Faria (2003), citando Lacan, nos leva a entender que a relação entre o Complexo de Édipo e a Neurose, se refere à falta do Outro e a queda da posição fálica que o sujeito enfrenta frente à Castração. Ou seja, é somente quando a criança percebe que ela não é o falo da mãe, e desta maneira busca entender, através de indagações, de quem é ela, ou então “o que este Outro quer de mim”? 21 Desta maneira, é conforme as significações que a criança dará frente a estas indagações, que a situará em alguma categoria de neurose. Conforme Zimerman (2001), estas categorias são: Neurose atual, Neurose de angústia, Neurose de caráter, Neurose mista, Neurose narcísica, Neurose traumática, Neurose fóbica e Neurose obsessiva. Contudo, por não se tratar do objetivo do presente trabalho não apresentaremos tais categorias individualmente, mas sim das Estruturas Clínicas (Neurose, Perversão e Psicose) que são o foco do trabalho. 2.4.2 Perversão Conforme relembra Person et. al. (2007, p. 121) “a perversão carrega três significados: o de doença, o de sanção moral e o da própria sexualidade humana”. Porém na psicanálise, o objetivo não é “condenar” ninguém, seja pelo mesmo burlar alguma regra socialmente aceita ou por se tratar de uma ‘anormalidade’ perante a sociedade. Por sua vez, homossexuais e/ou bissexuais são reconhecidos como pervertidos, perversos pela sociedade em geral, contudo, a escolha sexual não é sinônima de doença ou transtorno mental. Deste modo, acrescenta-se que “a sexualidade não tem nada intrinsecamente a ver com saúde ou doença mental” (PERSON et. al., 2007, p. 122). Na psicanálise, conforme enfatizado anteriormente, segundo Laplanche e Pontalis (2001), a perversão é vista somente no âmbito da sexualidade e de forma geral, pode ser determinada como comportamentos psicossexuais atípicos para a obtenção do prazer sexual. Zimerman (2001) lembra que a perversão quanto Estrutura Clínica, se organiza como defesa contra angústias. Deste modo, de acordo com Dias (2004), citando Freud, na perversão, o indivíduo reconhece a falta, porém a denega. Assim, para o perverso não importa leis, pois o que lhe importa é somente seu desejo e não o do outro, além de não querer perceber-se como incompleto, com falta, e por conseqüência a não-castração. Além disso, o autor complementa: Aceitar a castração sob reserva de transgredi-la continuamente é o que ocorre nas perversões, cujas origens situam-se entre dois pólos, o da angústia da castração e os mecanismos defensivos destinados a neutralizá-las (a angústia da castração) (DIAS, 2004, p. 108). 22 Ainda, conforme Dias (2004), esses mecanismos defensivos são: fixação (e a regressão) e a denegação da realidade, como forma de recusa em reconhecer a castração da mãe. Ou seja, a criança até reconhece a diferença entre os sexos, porém a denega, sendo que ela não aceita que a mãe não tem o objeto fálico e que ela (criança) não é o objeto de desejo materno e sim que este desejo encontra-se endereçado ao pai. De acordo com Lacan (1957), recordando os três tempos do Édipo, o primeiro tempo é caracterizado pela identificação do falo, porém, tal consideração é vista como normal, sendo que a posição da criança neste primeiro tempo é caracterizada como ‘perversão imaginária no plano imaginário’. Contudo, quando a criança reconhece que ela não é o único desejo materno é que a leva para o segundo tempo do Édipo. Assim, no segundo tempo, tem-se a entrada de um terceiro na relação, o pai, fazendo aparecer na criança a falta. Porém, quando a mesma não aceita tal dado é que a situa na Estrutura clínica perversão. Logo, sendo na passagem do segundo para o terceiro tempo do Édipo que acontece a entrada efetiva do pai no complexo Edípico, é que se situa também a identificação perversa neste tempo. Assim, conforme aponta Faria (2003), citando Lacan, é exatamente no momento em que o pai entraria na relação como o terceiro, ditando a lei, (através da qual, ele passaria a mensagem de que o filho não é o único desejo da mãe) que não ocorre na perversão. Quem passa a ditar tal lei é a mãe, como se ela fosse detentora do falo, sendo que a mesma oferece o suporte para que tal ruptura na relação entre ela e o filho não ocorra. Desta maneira, a mãe não convoca a figura paterna para tal relação, e a partir da negação. A negação do perverso configura-se em negar a questão do desejo materno estar voltado ao pai e a negação das diferenças entre os sexos (DIAS, 2004). Assim, com base no mecanismo da negação, a criança retorna para a mãe como uma segurança contra a castração. Ou seja, a mãe, assim como a figura paterna, tem papel fundamental para a instauração de tal ruptura simbiótica (FARIA, 2003). Ainda, convêm lembrar que, conforme Laplanche e Pontalis (2001, p. 341), Que existe perversão, quando o orgasmo é obtido com outros objetos sexuais (homossexualismo, pedofilia, bestialidade, etc.), ou por outras zonas corporais (coito anal, por exemplo) e quando o orgasmo é subordinado de forma imperiosa a certas condições extrínsecas (fetichismo, travestismo, voyeurismo e exibicionismo, sadomasoquismo); estas podem mesmo proporcionar, por si sós, o prazer sexual. 23 Estas categorias apresentadas por Laplanche & Pontalis (2001), que são: homossexualidade, pedofilia, bestilidade, fetichismo, travestismo, voyeurismo, exibicionismo, masoquismo e sadomasoquismo, não serão trabalhados por não se tratarem do foco do presente trabalho. 2.4.3 Psicose O termo Psicose foi criado no século XIX como substituto do termo ‘loucura’. Freud, em 1911, através da publicação “Notas psicanalíticas sobre um relato autobiográfico de um caso de paranóia”, o conhecido ‘Caso Schreber’, analisou tal Estrutura (ZIMERMAN, 2001). De acordo com Faria (apud Lacan, 2004), a psicose ocorre porque a operação de introdução da Lei paterna fracassa. Assim, para explicar teoricamente a origem do mecanismo psíquico psicótico, tem-se o conceito de Foraclusão, que segundo Nasio (1995, p. 149) é: [...] o nome que a psicanálise dá à falta de inscrição, no inconsciente, da experiência normativa da castração, experiência crucial que, na medida em que é simbolizada, permite à criança assumir seu próprio sexo e, desse modo, tornar-se capaz de reconhecer seus limites. Conforme expõe Lacet (2004, p 2), “Os significantes foracluídos, diferentemente do que ocorre no recalque, no qual são reintegrados ao inconsciente via simbólico, retornam de fora pela via do real, como é o caso dos fenômenos alucinatórios”. Assim, de acordo com Lacan, a psicose ocorre a partir de uma falta da função paterna no desenvolvimento da criança, ou seja, quando necessário a presença da função paterna para que a criança reconheça a castração (diferença entre os sexos e a aceitação de que a mãe tem outros desejos, além do filho), e se instaure assim a Lei paterna (LACAN, 1957). Desta forma, o psicótico é aquele que nem reconhece a Castração. Ainda, segundo Lacet (2004, p.5): O psicótico situa-se fora da lógica fálica, principal consequência da operação paterna [...] e quando a significação fálica não advém, , cria, no discurso, consequências avasssaladoras para o sujeito, que fica sem rumo frente a uma enxurrada de significações. 24 A “psicose propriamente dita” (ZIMERMAN, 2001, p.339), apresenta manifestações psicóticas, sendo as alucinações ou delírios. Tais manifestações, conforme Nasio (2001) são consideradas defesas do psicótico contra algo que causa dor e muito sofrimento (NASIO apud FREUD, 2001). Desta maneira, conforme Nasio (2001, p. 36) “o eu expulsa para fora um idéia que se tornou intolerável para ele, por ser demasiadamente investida, e, com isso, separa-se também da realidade externa da qual essa idéia é a imagem psíquica”. Assim, o eu acaba separando de si uma parte sua, porém tal representação deixada de lado também carrega consigo a realidade, sendo que ao fazer tal ação, o eu separa-se, em todo ou em parte, da realidade. Desta maneira, “o eu é vazado em sua substância, e a esse furo no eu corresponde um furo na realidade”. Assim, temos três grandes momentos, o superinvestimento do eu para com uma representação psíquica, a rejeição completa de tal representação, constituindo um furo na realidade da qual a representação fazia parte e por fim, a percepção pelo eu da parte rejeitada, sob a forma de um delírio ou alucinação que não deixa de ser uma realidade, tanto externa quanto interna (NASIO, 2001). Porém, como sabemos o inconsciente fala com o sujeito através das “escapadas”, para voltar ao ouvido do sujeito e assim surpreendê-lo. Desta maneira, para o psicótico as alucinações e delírios são estas “escapadas” do inconsciente, porém, diferentemente do neurótico, ele não reconhece como sendo do seu eu e sim como algo externo, que vem de fora, e tendo a “convicção dolorosa e inabalável de ser vítima de uma voz tirânica que o aliena” (NASIO, 2001, p. 39). Ainda conforme acrescenta Meyer (2008, p. 4), “É desta forma que o sujeito se apresenta [...] completamente exposto à ação do significante, falado e boicotado pelos fenômenos elementares (alucinações auditivas) e do automatismo mental”. 2.4.4 As Estruturas na clínica psicanalítica Conforme aponta Quinet (1997, p. 24), cada Estrutura Clínica tem uma forma particular quanto à forma de negação da Castração e como tal fenômeno se apresenta na vida 25 do indivíduo. Para tal compreensão, o mesmo autor, apresenta um quadro ilustrativo (Tabela 1) : Quadro 1: Estruturas Clínicas e suas respectivas formas de negação da Castração, local de retorno e o fenômeno pelo qual retorna a representação psíquica recalcada. ESTRUTURA FORMA DE CLÍNICA NEGAÇÃO Recalque Neurose (Verdrãngung) Desmentido Perversão (Verleugnung) Foraclusão Psicose (Verwerfung) LOCAL DE RETORNO FENÔMENO Simbólico Sintoma Simbólico Fetiche Real Alucinação Fonte: QUINET, 1997, p. 24. Assim, na Neurose, como já vimos, o Complexo de Édipo é recalcado, porém, o mesmo retorna na forma de sintoma, sendo que é através de tal sintoma, que temos acesso à organização psíquica do indivíduo, visto que tal sintoma traz consigo um desejo que não pode ser atendido na forma consciente, porém ele volta de forma “disfarçada”, visando à satisfação. Um exemplo disso está no caso do Homem dos Ratos, onde o mesmo apresentava a idéia obsessiva de que se visse uma mulher nua, seu pai teria que morrer. Desta forma, a representação do desejo da morte do pai obsessiva, que fora recalcada, retorna na forma de sintoma e expressa bem sua estrutura edípica, ou seja, proibição de ver uma mulher nua, ligada ao pai (QUINET, 1997). Contudo, Freud (1924) nos alerta acerca de um erro que pode vir a ocorrer na prática analítica: fundamentar o diagnóstico através do sintoma e não a partir da fala do paciente. Ainda, tal hipótese diagnóstica serve apenas para direcionar o tratamento, visto que cada Estrutura Clínica apresenta uma demanda diferente, e não para “rotular” ou classificar o paciente. Já na perversão, há o desmentido de tal Castração, e o retorno constitui-se no fenômeno fetiche, como por exemplo: Freud expõe o caso de um paciente cuja condição do desejo é atrelada a um determinado “brilho no nariz” do outro. A análise desvenderá um jogo de palavras translinguístico que permite entender tal atrelamento: brilho, em alemão glanze, é 26 homófono a glance que, em inglês, significa olhar. O segredo desse fetiche residia no fato deste sujeito ter vivido os primeiros anos de sua infância num país de língua inglesa. Eis a pista da constituição desse fetiche que demonstra sua determinação pelas coordenadas simbólicas da história do sujeito, denotando, como todo fetiche, o objeto pulsional em questão (o olhar) (QUINET apud FREUD, 1997, p. 25). Na psicose, a qual não há o reconhecimento de tal Castração, o retorno aponta “a relação de exterioridade do sujeito com o significante”, aparecendo nos distúrbios de linguagem, como as vozes alucinadas (QUINET, 1997, p. 25). Por exemplo, o sujeito que ouve vozes, considera-se como vítima de alguém que com uma voz aterrorizante faz dele um refém, sendo que o psicótico não entende que tais vozes não são ditas por um terceiro, alguém do mundo externo, mas sim, de uma representação, anteriormente superinvestida, que o seu ego, por não suportar tamanha dor e sofrimento, arrancou-o de si. Porém a realidade a qual esta representação pertence, também é aniquilada do ego, fazendo com que esta instância psíquica fique com um furo, um vazio, sendo que é a partir da percepção de tal “buraco” que surge as alucinações, que não deixam de ser realidade (NASIO, 2001). Ainda algo importante quanto ao tratamento analítico de um psicótico refere-se à que o analista deve estar ciente, de que este nunca tornar-se-á um neurótico, ou conforme Freud (1924), o analista não pode prometer inserir o psicótico na norma fálica, tornar o psicótico em um neurótico. Desta forma, o analista, conforme Lacet (2004, p. 11): “ Está aí um lugar possível ao analista, como secretário do alienado, fazer circular sua produção e procurar junto a ele um significante que possa reorientar sua posição subjetiva”. Ainda, conforme D’Avila (apud Freud, 2005, p. 143), outro aspecto intimamente ligado ao Complexo de Édipo e de suma importância no tratamento analítico, é a tranferência, aspecto essencial para dar-se início ao tratamento, sendo que “a tranferência é, grosso modo, reedições de conteúdos edípicos”, ou seja, compulsão à repetição por parte do analisante. Deste modo, ao analista é incubido o papel materno, paterno ou até ambos. Contudo, é necessário o manejo desta transferência, para que o indivíduo pare de repetir sintomas e preste atenção à suas queixas, para que o tratamento prossiga. 2.4.5 Considerações sobre o capítulo O Complexo de Édipo mostra-se como um organizador do funcionamento psíquico, sendo que o mesmo contempla vasta gama de sentimentos, como amor X ódio por um mesmo 27 objeto e que repercutirão pela vida toda do sujeito, seja na sua vida social em geral, quanto na transferência, em uma análise. Conforme explica Nasio (2007, p. 10), o Édipo “é um desejo sexual próprio de um adulto, vivido na cabecinha e no corpinho de uma criança de quatro anos e cujo objeto são os pais”. E claro, que esse desejo sexual, o qual o autor se refere, não é aquele desejo de união dos órgãos sexuais, visando a reprodução, mas sim, do sexual no sentido psicanalítico. Ainda, acrescenta que nenhuma criança escapa ao Édipo, pois as pulsões eróticas nesta idade são muito fortes, sendo que é impossível evitá-las e nenhum adulto pode impedir de ser o alvo de suas pulsões. Conforme expõe Delouya (2003), o Édipo processa-se e trabalha com base na Bissexualidade Originária. Sendo que tal elaboração desta Bissexualidade Originária é determinante para o destino do Édipo, quanto sua dissolução e formação do seu herdeiro, o Superego. Assim, a resposta perante a Castração, seja negando-a, desmentindo-a ou rejeitando-a, implica em uma transformação da Bissexualidade Originária (DELOUYA, 2003). Desta maneira, o Édipo concomitantemente com o Complexo de Castração, tem papel importantíssimo frente à formação e origem de cada Estrutura Clínica (Neurose, Psicose e Perversão). Assim, de acordo com Nasio (2007, p. 10) “a crise edipiana é um insuportável conflito entre o prazer erótico e o medo, entre a exaltação de desejar e o medo de se consumir nas chamas do desejo”. E é a partir da dissolução de tal Complexo Edípico que teremos a formação das Estruturas Clínicas. A formação de cada Estrutura Clínica dependerá de vários fatores, como: o que cada sujeito faz com as representações do Édipo, as quais foram reprimidas; como ele internalizou (e se internalizou) a Lei paterna (numa tentativa de dizer ao sujeito que não se pode fazer e ter tudo que deseja; interdição do incesto); papéis parentais exercidos de forma “sadia”, ou seja, se a figura materna possibilitou a entrada de um terceiro na relação (pai) e também se esta figura paterna desejou e entreviu nessa relação. Desta forma, se esta entrada de um terceiro na relação, instaurando a Lei e castrando a criança, produzir efeitos “esperados”, possibilitará que a criança reconheça também a realidade externa. Sendo assim, o Complexo de Édipo tem o importante papel de inserir o sujeito no convívio social, isto é, uma de suas funções primordias é trazer o indivíduo à luz da realidade externa e consequentemente proporcionar que o mesmo se relacione com os demais a sua volta, no contexto em que vive. Desta maneira, o Édipo ao desempenhar tal função, proporciona limites ao sujeito, os quais são primordiais para o convívio em grupos sociais. 28 Esta inserção, exige do sujeito a renúncia da satisfação pulsional e o controle dos seus instintos, isto é, o indivíduo não pode agir visando somente sua satisfação imediata, como acorria no processo primário, ele não pode tudo, há um reconhecimento de falta e impotência. Importante ressaltarmos que o Complexo de Édipo acontece de forma diferente para meninos e meninas. As meninas aceitam a Castração como consumada, enquanto os meninos abrem mão de seu desejo, para preservar seu pênis, evitando a Castração. As organizações psíquicas subjetivas, as Estruturas Clínicas, permearão a vida do sujeito, ou seja, a demanda do seu desejo manifestar-se-á conforme a Estrutura em questão. Sendo que a Neurose caracteriza-se pelos sintomas, como forma de satisfação, uma forma disfarçada, deslocada de obter satisfação, de forma que o recalcado não pode emergir de maneira que o Ego reconheça como tal. Já na Perversão teremos os fetiches e outros desvios quanto à satisfação sexual e por fim, na Psicose, o sujeito sofre alucinações e delírios como uma defesa, para não se deparar com o desejo, o qual o Ego não consegue suportar. Contudo, uma pessoa pode apresentar uma demanda de desejo, que se enquadra na Neurose, porém pode também apresentar traços Psicóticos e/ou Perversos. O mesmo pode ocorrer com as demais organizações psíquicas. 29 3 CONSIDERAÇÕES FINAIS A pesquisa realizada neste Trabalho de Conclusão de Curso, intitulada de “Estruturas Clínicas: reflexões sobre o papel do Complexo de Édipo na formação das Estruturas Clínicas”, apresentou uma breve revisão bibliográfica visando esclarecer a perguntar: qual o papel do Complexo de Édipo na formação das Estruturas Clínicas? Para tanto, foi realizado, uma pesquisa acerca da função dos papéis parentais, função materna e função materna, e as consequências de um desempenho “saudável” de tais funções. Buscou-se um conceito sobre o que é Complexo de Édipo e o que são as Estruturas Clínicas. O objetivo geral - compreender o papel do Complexo de Édipo na formação das Estruturas Clínicas – foi alcançado. Os estudos efetuados permitiram concluir que tal Complexo está intimamente ligado à formação subjetiva de cada indivíduo. Além disso, ao mesmo, compete a função de uma espécie de núcleo do funcionamento psíquico, sendo que a vasta gama de sentimentos que o mesmo desperta no indivíduo, repercutirá durante o desenvolvimento e vida do mesmo. Os objetivos específicos considera-se também que foram alcançados. Sendo que os autores pesquisados, consideram que a relação da criança com suas figuras parentais são de suma importância para a formação das Estruturas Clínicas. A descrição da dissolução do Complexo de Édipo em cada organização psíquica, que era um dos objetivos específicos, também foi realizada com sucesso, sendo que alguns autores acham impossível estudar a formação e desenvolvimento das Estruturas Clínicas, sem remeter-se à dissolução de tal Complexo, sendo que o mesmo é a base para a origem de tais organizações subjetivas. Considera-se como contribuição importante e significativa desta pesquisa, o entendimento da origem das Estruturas Clínicas, que durante a graduação teve-se pouco contato e consequentemente, pouco entendimento a cerca das mesmas. Este pouco contato deve-se tanto pelas poucas disciplinas da Psicanálise, quanto pelas ementas das mesmas, que não contemplam tal assunto profundamente. Tal compreensão é importantíssima para a prática clínica, sendo que o Complexo de Édipo é o ponto nodal do desenvolvimento psicossexual de um indivíduo. Outra questão importante, a qual o presente trabalho esclareceu e desmistificou, foi a íntima relação da psicanálise com a Psicologia Social. Freud publicou artigos que tratavam de 30 aspectos sociais, como o “Mal-estar na civilização” (1930), “Totem e Tabu” (1913) e “Psicologia das massas e análise do eu” (1895). Ainda, por vezes, presenciamos colegas psicólogos criticarem a abordagem psicanalítica, afirmando que a mesma não tem um cunho social, que não considera as necessidades das grandes massas e que se restringe ao atendimento clínico (terapeuta e paciente), sendo que as classes desfavorecidas economicamente não chegariam a tais consultórios, qualificando-a, assim, a psicanálise como uma ciência “para poucos”. Desta maneira, também recomendo que nas ementas das disciplinas, principalmente as que tratam de Psicologia Social, seja acrescido o foco psicanalítico, juntamente com suas contribuições perante o social e que desta forma, se tenha a oportunidade de reparar tal equívoco. Este tema tem possibilidades de expansão, sugere-se o estudo das categorias de cada Estrutura Clínica, as quais, no presente trabalho, só foram citadas. Desta forma, teríamos a descrição do Complexo de Édipo e sua dissolução em todas as categorias, como a histeria, Neurose Obsessiva, Fobia, entre outros. Quanto ao curso de Psicologia, sugere-se a inclusão nas ementas do assunto específico, para o entendimento de tais organizações psíquicas, que se faz fundamental na prática da área clínica psicanalítica. 31 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ABERASTURY, Arminda. Abordagens à Psicanálise de Crianças. Tradução: Francisco Franke Settineri. Porto Alegre: Artes Médicas, 1996. ATL, Melissa dos Santos; BENETTI, Silvia Pereira da Cruz. Maternidade e Depressão: Impacto na Trajetória de Desenvolvimento. Psicologia em Estudo, Maringá, v. 13, n.2, 2008. Disponível em http://www.scielo.br/scielo.php? script=sci_arttext&pid=S1413-73722008000200022&lng=pt&nrm=iso&tlng=pt. Acesso em: 26 Set 2008. BERGERET, Jean. A Personalidade Normal e Patológica. Tradução: Maria Elísia Valliatti Flores. Porto Alegre: ArtMed, 3ª Ed., 1998. BLEICHMAR, Noberto M. & BLEICHMAR Célia Leiberman de. A Psicanálise depois de Freud. Tradução: Franke Settineri. Porto Alegre: Artes Médicas, 1992. BRENNER, Charles. 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