Luciano Amaro Prof. de Direito Tributário do Mackenzie Princípio da legalidade tributária Art. 150. (...) é vedado... I – exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça Art. 97. Somente a lei pode estabelecer: I - a instituição de tributos, ou a sua extinção; II - a majoração de tributos, ou sua redução, ressalvado (...); III - a definição do fato gerador da obrigação tributária principal (...) e do seu sujeito passivo; IV - a fixação de alíquota do tributo e da sua base de cálculo (...); (...) § 1º Equipara-se à majoração do tributo a modificação da sua base de cálculo, que importe em torná-lo mais oneroso. Art. 114. Fato gerador da obrigação principal é a situação definida em lei como necessária e suficiente à sua ocorrência. Art. 108. Na ausência de disposição expressa, a autoridade competente para aplicar a legislação tributária utilizará sucessivamente, na ordem indicada: I – a analogia (...) § 1º O emprego da analogia não poderá resultar na exigência de tributo não previsto em lei. Art. 109. Os princípios gerais de direito privado utilizam-se para pesquisa da definição, do conteúdo e do alcance de seus institutos, conceitos e formas, mas não para definição dos respectivos efeitos tributários. Art. 110. A lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa ou implicitamente, pela Constituição Federal (...), para definir ou limitar competências tributárias. Art. 116. (...) Parágrafo único. A autoridade administrativa poderá desconsiderar atos ou negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador do tributo ou a natureza dos elementos constitutivos da obrigação tributária, observados os procedimentos a serem estabelecidos em lei ordinária. (redação dada pela LC 104/01) O sucesso de uma empresa depende de sua capacidade de planejar: tipo de produto, público alvo, mídia, logística etc. O planejamento tributário é apenas um dos aspectos do planejamento empresarial: ir ou não para um território com incentivo fiscal, ou com alíquota menor etc. A atenção para os aspectos fiscais pode ser um fator decisivo na viabilização da empresa ou na viabilização de um negócio específico. Ou uma oportunidade para economias legítimas. Há um consenso entre os autores no sentido de que ninguém é obrigado a seguir o caminho fiscalmente mais oneroso. O administrador, mais do que o direito, tem o dever de buscar o melhor caminho fiscal, para maximizar o resultado. O planejamento tributário, obviamente, precisa ser lícito. Deixar de recolher tributo devido não é planejamento, é infração legal, que pode tipificar crime tributário. É fundamental distinguir a chamada economia lícita de tributo da falta de pagamento de tributo devido (pura e simples ou matizada com atos que busquem ocultar a ocorrência do fato gerador). Há muita discussão semântica para diferençar o modo lícito e o modo ilícito de economizar tributo. Abstraindo essas discussões, o que importa é identificar, com razoável precisão, o que, legalmente, pode ou não ser feito para evitar (ou reduzir) o pagamento de tributo. Por comodidade didática, vamos chamar essas situações de elisão e evasão. O que o contribuinte fizer antes do fato gerador é lícito. O que fizer depois é ilícito. (Doutrina clássica; parecer do Procurador Geral da República) Equívoco: o problema não é fazer algo antes ou depois do fato gerador. Se o fato gerador efetivamente ocorrer (antes ou depois da prática evasiva, não importa), a obrigação tributária nasce e o tributo é devido. A questão, portanto, não é a de fazer algo (o ato para evitar o tributo) antes ou depois do fato gerador. O ato elisivo tem que ser praticado “em vez do fato gerador”. Portanto: elisão consiste em evitar o fato gerador e não em escondê-lo, com práticas anteriores ou posteriores à sua ocorrência. Se os meios utilizados pelo contribuinte forem legais, não há evasão (Doutrina clássica) Equívoco: embora cada um dos atos praticados possa ser legal, eles podem acobertar uma simulação. Art. 116. (...) Parágrafo único. A autoridade administrativa poderá desconsiderar atos ou negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador do tributo ou a natureza dos elementos constitutivos da obrigação tributária, observados os procedimentos a serem estabelecidos em lei ordinária. (redação dada pela LC 104/01) Teria a lei criado uma disposição para evitar a elisão ou apenas um preceito para combater a evasão? Ou seja: o Fisco pode desconsiderar atos praticados com o fim de evitar a ocorrência do fato gerador ou apenas os atos praticados para ocultar o fato gerador ocorrido? • Art. 116. (...) Parágrafo único. A autoridade administrativa poderá desconsiderar atos ou negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador do tributo ou a natureza dos elementos constitutivos da obrigação tributária, observados os procedimentos a serem estabelecidos em lei ordinária. Simulação: aparentar uma situação (desejada) que, na verdade, é falsa. P. ex., simular ou aparentar inocência (alguém que, na verdade, é culpado). Dissimulação: disfarçar uma situação real (não desejada), e aparentar uma situação (desejada) que, na verdade, é falsa. P. ex., dissimular a culpa, para aparentar inocência (alguém que, na verdade, é culpado). Simulação: aparentar uma situação (desejada) que, na verdade, é falsa. P. ex., simular ou aparentar inocência (alguém que, na verdade, é culpado). Dissimulação: disfarçar uma situação real (não desejada), e aparentar uma situação (desejada) que, na verdade, é falsa. P. ex., dissimular a culpa, para aparentar inocência (alguém que, na verdade, é culpado). A lei fala em dissimulação porque ela se reporta ao fato gerador. Ninguém simula fato gerador (só pelo prazer de pagar tributo). E ninguém dissimula isenção (também apenas pelo prazer de pagar tributo). Resumo: simulação e dissimulação são duas faces da mesma moeda: a falsidade. Conclusão: o parágrafo único do art. 116 do CTN não criou norma anti-elisão, não vedou o planejamento tributário. Ele combate a falsidade praticada para ocultar o fato gerador. Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica. Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica. “Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado(...): II – instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente” (CF, art. 150, II) “Sempre que possível, os impostos serão graduados (...) segundo a capacidade econômica do contribuinte”(CF, art. 145, §1º) Pode o princípio da igualdade ser invocado para cobrar tributos em situações semelhantes à prevista na lei de incidência? Pode o princípio da capacidade contributiva fundamentar a cobrança de tributos em situações que revelem capacidade igual à de uma situação tributada? Exemplos: > Patrimônio imobiliário é tributado; a lei pode ser aplicada para tributar patrimônio em valores mobiliários, jóias, obras de arte etc.? > Venda de imóvel é sujeita a imposto de transmissão. Esse tributo pode ser aplicado na venda de objetos valiosos móveis? A resposta é negativa. Igualdade e capacidade contributiva são garantias do indivíduo contra o Estado e não do Estado contra o indivíduo. A solução para atingir novas situações de capacidade contributiva é a lei e não o preenchimento de supostas lacunas. • Objeto: inconstitucionalidade do parágrafo único do art. 116 do CTN Art. 116. (...) Parágrafo único. A autoridade administrativa poderá desconsiderar atos ou negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador do tributo ou a natureza dos elementos constitutivos da obrigação tributária, observados os procedimentos a serem estabelecidos em lei ordinária. Verifica-se, inicialmente, que a norma (...) cria a possibilidade de atos ou negócios jurídicos serem desconsiderados por autoridade administrativa, desde que possam ser identificados os seguintes pré-requisitos: i) que haja ocorrido fato gerador de tributo ou que estejam presentes os elementos constitutivos de obrigação tributária; e, ii) que atos ou negócios jurídicos tenham sido praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência desse fato gerador ou dissimular a natureza dos elementos constitutivos dessa obrigação tributária. (...) vê-se, quanto ao fato gerador, que a norma impugnada fala em hipótese de dissimulação da ocorrência do fato gerador; o que conduz ao entendimento de que, por certo, o dispositivo legal em questão está se referindo a fato gerador cuja definição legal já existe; caso contrário, obviamente, não poderia ter sua ocorrência verificada. O mesmo se passa quanto à dissimulação da natureza dos elementos constitutivos da obrigação tributária, pois refere-se a elementos já previstos na legislação tributária. (...) devem ser afastadas as alegações de ofensa ao princípio da legalidade (art.5º, II e 37) e ao princípio da tipicidade fechada – corolário da legalidade estrita – , porquanto não se pretende a tributação sem a ocorrência do fato gerador previsto em lei. Ao contrário, o dispositivo impugnado deixa claro que o exercício da competência nele prevista pressupõe a ocorrência de fato gerador legalmente definido e faticamente verificável. (...) o propósito da norma (...) é o de impedir a evasão fiscal, razão pela qual permite a desconsideração de ato ou negócio jurídico praticado com a finalidade de mascarar a efetiva ocorrência de fato gerador ou a natureza de elemento constitutivo da obrigação tributária. (...) o planejamento tributário – processo de escolha de ação ou omissão que visa à economia de tributos – e a prática da elisão fiscal – conduta lícita que impede o surgimento da obrigação tributária – não estão ameaçados pela norma do parágrafo único do art. 116, do CTN; pois tanto um quanto o outro ocorrem em momento anterior à ocorrência do fato gerador; e a norma em questão trata da possibilidade de desconsideração de ato ou negócio jurídico praticado posteriormente ao fato gerador, com o propósito de dissimular sua ocorrência. CASUÍSTICA EVOLUÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA Evolução da legislação Compensação de prejuízos da própria empresa Compensação de prejuízos com lucros gerados após incorporação de empresa lucrativa (incorporação “às avessas”) Mudança de controle e de objeto, cumulativamente Operação “casa/separa” > Circunstâncias: “sinceridade” do casamento, “animus” de permanência, evidências, tempo decorrido entre o casamento e a eventual separação O ISS, como regra, é devido no local do estabelecimento prestador. Estabelecimento de fachada Jurisprudência mal construída “puniu” o desvio (mas atropelou a lei). Comprar o imóvel de uma empresa ou comprar a empresa? Explorar uma atividade na PF ou na PJ? Fazer um leasing ou uma locação ou uma compra a prazo ou uma chamada de capital para comprar a vista Distribuir dividendo ou JCP Alocação de investimento para maximizar JCP Não é possível criar uma fachada documental que oculte a situação material real. Mas também não se pode afirmar que tudo que o contribuinte fizer tem que ter uma razão extra-fiscal. O tributo não é uma variável neutra na tomada de decisões empresais. Jurisprudência tem levado a linha divisória para a esquerda Substância Densidade Razões econômicas (“extra-fiscais”)