Autos nº 024.08.249.689-4 28ª Vara Cível
COMARCA DE BELO HORIZONTE-MG
JUÍZO DA 28ª VARA CÍVEL
Processo nº 024.08.249.689-4
Autor: M. R. D. S.
Réus: TELECOMUNICAÇÕES DE SÃO PAULO S/A TELESP
ATLANTICO FUNDO DE INVESTIMENTO EM DIREITO CREDITÓRIOS NÃO
PADRONIZADOS
Ação Indenizatória c/ Pedido de Danos Morais em Decorrência de Ato Ilícito Cometido com
Pedido Liminar de Antecipação de Tutela
Sentença
M. R. D. S., devidamente qualificado às f.02, ajuizou Ação Indenizatória c/ pedido de Danos
Morais em decorrência de Ato Ilícito com Pedido Liminar de Antecipação de Tutela contra
TELECOMUNICAÇÕES DE SÃO PAULO S/A TELESP e ATLANTICO FUNDO DE
INVESTIMENTO EM DIREITO CREDITÓRIOS NÃO PADRONIZADOS, também
qualificados, alegando em suma que nunca teve relação contratual com as Requeridas.
Afirmou que não obstante a inexistência de relação contratual, teve conhecimento que seu
nome estava inserido nos cadastros de proteção ao crédito, por dívida contraída junto às
Requeridas.
Explicitou que através de Contrato de Cessão de Crédito, a primeira Ré cedeu os direitos
creditícios à segunda Ré, a qual emitiu o boleto bancário de cobrança. Requereu a
antecipação dos efeitos da tutela para que seu nome seja retirado dos cadastros de restrição ao
crédito e os benefícios da justiça gratuita. Pugnou pela procedência do pedido para que seja
confirmada a tutela antecipada e para que sejam as Rés condenadas ao pagamento de
indenização por danos morais. Juntou com a inicial procuração e documentos de f.15/24.
O despacho de f.26 deferiu os benefícios da justiça gratuita. Devidamente citada, a primeira
Ré apresentou contestação às fls.44/57, alegando a contratação do serviço por telefone; a
ocorrência da prestação dos serviços e a ausência da responsabilidade civil. A segunda Ré
apresentou contestação às f. 58/61, onde alegou preliminarmente a ilegitimidade passiva. No
mérito, a culpa exclusiva de terceiro e a inexistência de dano moral. Pugnou pela
improcedência do pedido. Impugnação à contestação às fls.65/75.
Intimados para especificação de provas, o Autor requereu a produção de prova testemunhal e
documental (f.77/78). Despacho saneador às fls. 83/84, deferiu a liminar pleiteada pelo Autor,
e às fls. 128/129 deferiu da inversão do ônus da prova.
Audiência de conciliação às fls.155. Memoriais às fls.235/239, 249/252v e 253/257.
É o relatório. DECIDO.
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Presentes as condições da ação e os pressupostos processuais de constituição e
desenvolvimento válido do processo, bem como todos os elementos necessários ao deslinde
da controvérsia, encontra-se o feito apto à prolação de sentença de mérito, o qual passo a
analisar.
Procedo ao julgamento antecipado da lide, na forma do art. 330, I, do CPC. Cuidam os autos
de ação de indenização por danos morais causados por suposta inclusão indevida do nome do
Autor nos cadastros restritivos ao crédito.
O Requerido apresentou preliminar de ilegitimidade passiva, alegando que não é responsável
pela inclusão do nome do Autor nos cadastros de restrição ao crédito.
Para que se compreenda a legitimidade das partes, é preciso estabelecer-se um vínculo entre o
Autor da ação, a pretensão trazida a juízo e o Réu. Ainda que não se configure a relação
jurídica descrita pelo Autor, haverá de existir, pelo menos, uma situação jurídica que permita
ao juiz vislumbrar essa relação entre parte autora, objeto e parte ré.
Regra geral, no sistema do CPC, é parte legítima para exercer o direito de ação (autor) aquele
que se afirma titular de determinado direito que precisa da tutela jurisdicional, ao passo que
será parte legítima para figurar no polo passivo (réu), aquele a quem caiba o cumprimento de
obrigação decorrente dessa pretensão.
Entendo que a legitimidade ad causam, conforme teoria da asserção, diz respeito à
verificação da pertinência abstrata com o direito material controvertido. Assim, se em uma
análise preliminar do feito verifica-se que o pedido deduzido pelo autor foi dirigido à ré,
atribuindo-lhe os fatos deduzidos na inicial, há a pertinência subjetiva para o feito.
In casu, verifica-se às fls. 21 e 102, que o Autor teve seu nome incluído no banco de dados no
SERASA pela segunda Ré, Atlântico Fundo de Investimento em Direito Creditório não
Padronizados, que adquiriu o crédito através de Contrato de Cessão com a primeira Ré.
Conforme é de geral conhecimento, a legitimidade para ser parte na relação jurídica
processual decorre do fato de estar alguém envolvido em conflito de interesses
independentemente da relação jurídica material, e que no desate da lide suportará os efeitos
da sentença.
Assim, a legitimação ativa caberá ao titular do interesse afirmado na pretensão e a passiva ao
titular do interesse que se opõe ou resiste à pretensão. Desta forma, rejeito a preliminar
suscitada pelo Requerido, porquanto há um liame entre as partes e os fatos relatados na
exordial.
No mérito, necessário tecer algumas considerações sobre a incidência do Código de Defesa
do Consumidor ao caso concreto. O art.2º do Código de Defesa do Consumidor dispõe que:
“Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como
destinatário final”.
A referida norma preceitua que para que a pessoa, física ou jurídica, seja considerada
consumidora, deve ser destinatária final do produto ou serviço.
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No presente caso, o Autor alega não ter celebrado com o Réu qualquer contrato de prestação
de serviço, motivo pelo qual, não pode, no caso, ser considerado consumidor. Assim,
inexistindo relação de consumo, inaplicável à espécie o Código de Defesa do Consumidor,
bem como os princípios que lhe são inerentes.
Feito o esclarecimento, passo a análise do pedido. Cuida-se o presente caso de hipótese de
responsabilidade extracontratual, uma vez que o Autor alega que nunca foi cliente ou fiador
junto a empresa telefônica.
A responsabilidade extracontratual, que decorre do dever legal de não lesar ninguém, pode
fundar-se na culpa ou no risco. Nessa linha, a responsabilidade civil baseia em três
pressupostos a saber: ação, comissiva ou omissiva (fato lesivo); dano (lesão a bem jurídico),
moral ou patrimonial; e nexo de causalidade entre o dano e a ação (fato gerador da
responsabilidade).
Nesse sentido, dizer de Antônio Lindbergh C. Montenegro, relativo aos pressupostos da
obrigação de indenizar relativamente ao dano contratual e extracontratual:
" a- o dano, também denominado prejuízo; b- o ato ilícito ou o risco, segundo a lei exija ou
não a culpa do agente; c- um nexo de causalidade entre tais elementos. Comprovada a
existência desses requisitos em um dado caso, surge um vínculo de direito por força do qual o
prejudicado assume a posição de credor e o ofensor a de devedor, em outras palavras, a
responsabilidade civil" (aut. menc., "Ressarcimento de Dano", Âmbito Cultural Edições,
1992, nº2, pág. 13).
Na espécie, o Autor busca a reparação por dano moral decorrentes da indevida inclusão de
seu nome nos cadastros do SERASA, em razão do inadimplemento de contrato de
empréstimo que supostamente figurou como devedor.
Os arts.186, 187 e 927 todos do Código Civil dispõem que: “Art.186. Aquele que, por ação
ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem,
ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito. Art.187. Também comete ato ilícito o
titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu
fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes. Art.927. Aquele que, por ato
ilícito (arts.186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.”
Assim, para que surja o dever de indenizar, a referida norma preceitua que o causador do
dano deve ter agido culposamente, isto é, com negligência, imprudência ou imperícia. Nesse
sentido, se faz necessário verificar a ocorrência do dano e se a conduta de seu causador
ultrapassou aquilo que se entende como razoável e que é aceito como fato comum, levando
em conta suas qualidades, defeitos e virtudes.
Como cediço, vivendo em sociedade, o homem tem que pautar a sua conduta de modo a não
causar dano a ninguém. Ao praticar os atos da vida, deve observar a cautela necessária para
que de seu atuar não resulte lesão a bens jurídicos alheios.
A inobservância desse dever de cuidado torna a conduta culposa, porquanto devia e podia ter
agido de outro modo. No caso dos autos, a imputação de débito constante em nome Autor,
feita pela primeira Ré sem lastro em contrato livremente assinado entre as partes e
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consequente inclusão de seu nome nos cadastros de inadimplentes pela segunda Ré são, por si
só, fatos capazes de ocasionar-lhe verdadeiro abalo moral e não apenas mero dissabor,
ensejando a responsabilidade civil do agente.
Ademais, verifica-se nos autos, que a primeira Ré não se desincumbiu de carrear aos autos
prova da relação jurídica entre as partes, qual seja o suposto contrato pactuado com o Autor.
Corroborando, observa-se, através do documento juntado à f.102, que o Autor não possuía
outras inscrições em seu nome, nos órgãos protetivos ao crédito, que não a promovida pela
segunda Ré.
Com efeito, a despeito da não incidência do Código de Defesa do Consumidor, a
responsabilidade da segunda Ré é objetiva, com base na teoria do risco, ou seja, esta responde
por danos causados a terceiros pela sua atuação presumidamente culposa no exercício de sua
atividade.
Verifica-se nos autos que a negligência da segunda Ré decorre de sua conduta culposa em não
verificar se a inclusão do débito no nome do Autor era devida, e se o Requerente foi quem
realmente contratou os serviços. Cumpre salientar, que mesmo se a contratação fosse
fraudulenta, em vista da utilização dos documentos falsos do Autor por um terceiro, a conduta
negligente estaria caracterizada, uma vez que é de responsabilidade da cessionária analisar a
existência e autenticidade dos documentos e contrato de origem do débito.
Desta forma, não tendo as Requeridas se desincumbido de comprovar fato impeditivo,
modificativo ou extintivo do direito da Autora, capaz de comprovar ter ocorrido culpa
exclusiva da vítima ou de terceiro, ou, ainda, que o débito realmente existe e decorre de
contrato assinado pelo próprio Autor, ônus que lhe competia, nos termos do art.333, II, do
Código de Processo Civil, tem-se que resta configurado o dever de indenizar.
Com relação a prova do dano moral, observa-se que esta decorre da inclusão indevida do
nome do Autor em cadastros de inadimplentes, sendo que a jurisprudência, tem entendido que
a caracterização do dano moral prescinde de prova objetiva do dano, sendo suficiente para
gerar o dever de indenizar a simples demonstração da existência da referida negativação, o
que se verifica nos autos com o documento de f.102.
Nesse sentido, entendimento do colendo Superior Tribunal de Justiça:
"RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO MORAL. PROTESTO INDEVIDO
E INJUSTA INSCRIÇÃO NA SERASA. PROVA DO DANO E DO NEXO
CAUSAL. REDUÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO. - A exigência
da prova do dano moral satisfaz-se com a demonstração do indevido protesto do
título e da irregular inscrição no cadastro de proteção ao crédito. (...)" - REsp.
N° 710.959 - MS, 4a Turma, rel. Min. Barros Monteiro, j. 20/09/2.005, DJ 10/10/2.005)
No que se refere ao valor da indenização, deve considerar que não se constitua forma de
enriquecimento, nem mesmo uma quantia ínfima para o Autor, servindo como meio punitivo
e impeditivo para as Rés evitarem a repetição do ocorrido. Portanto, fixo os danos morais em
R$12.000,00 (doze mil reais), valor capaz de compensar o mal causado pela conduta das
Requeridas e servir como punição às Rés para evitar casos similares, o que se observa com
frequência neste Juízo.
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Quanto ao valor, o Colendo Superior Tribunal de Justiça já assentou o entendimento:
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. INDENIZAÇÃO. FIXAÇÃO
EM SALÁRIOS MÍNIMOS. POSSIBILIDADE. DANOS MORAIS. INSCRIÇÃO
EM CADASTROS DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO. QUANTUM INDENIZATÓRIO
FIXADO EM 50 (CINQÜENTA) SALÁRIOS MÍNIMOS.
1. É inadmitida a utilização do salário mínimo como fator de correção monetária; todavia,
não há nenhuma vedação legal a que se fixe o valor de indenização por danos morais
tomando como referência tal parâmetro.
2. A alteração, em recurso especial, dos valores arbitrados a título de reparação de danos
morais somente é possível nos casos em que o valor determinado nas instâncias ordinárias
seja irrisório ou exagerado.
3. O STJ firmou entendimento de que é razoável a condenação a até 50 (cinqüenta) salários
mínimos por indenização decorrente de inscrição indevida em órgãos de proteção ao crédito.
4. Agravo regimental desprovido. (STJ – AgRg no REsp 971113/SP – Agravo Regimental no
Recurso Especial 2007/0173845-8 – Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA – T4 –
QUARTA TURMA – Dje 08/03/2010)(grifo nosso)
Corroborando o entendimento acima esposado, segue jurisprudências:
“APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. DANO MORAL. CADASTRO
EM ÓRGÃOS DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO. DEVER DE INDENIZAR. Cadastro
indevido do nome da autora em órgãos de proteção ao crédito. Dever da ré de indenizar a
autora pelos danos morais causados. Dispensada prova de prejuízo concreto, pois se trata de
dano moral puro. Valor da indenização. A quantificação do dano moral deve ter caráter
punitivo e compensatório, sem ensejar enriquecimento ilícito da autora. Adequado o valor
fixado na sentença. APELAÇÃO DESPROVIDA”. (APELAÇÃO CÍVEL Nº 70007146616,
SEXTA CÂMARA CÍVEL, TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RS, RELATOR: CACILDO DE
ANDRADE XAVIER, JULGADO EM 22/09/2004).
Desta forma, tendo o Autor suportado verdadeiro abalo moral com a indevida negativação de
seu nome, em indiscutível ilicitude da conduta das Rés e não se verificando na espécie,
nenhuma hipótese excludente do dever de indenizar, deve as Requeridas responderem pelos
prejuízos que causaram.
Posto isso, julgo PROCEDENTE o pedido do Autor, extinguindo o procedimento com
resolução do mérito, nos termos do art.269, I, do CPC, para declarar a inexigibilidade do
débito apontado pela segunda Ré e condenar as Requeridas, solidariamente, ao pagamento de
indenização por danos morais no importe de R$12.000,00 (doze mil reais), valor que deverá
ser corrigido pelos índices da tabela da Corregedoria Geral de Justiça de Minas Gerais desde
a data da publicação da sentença, ex vi da Súmula 362 do STJ e acrescido de juros de mora
de 1% ao mês desde a data do evento danoso, ou seja, a inclusão do nome do Autor nos
cadastros de proteção ao crédito, nos termos do art.398 do Código Civil e Súmula 54 do STJ.
Confirmo a tutela antecipada deferida às fls.83/84, para que o nome do Autor seja retirado
dos cadastros de restrição ao crédito.
Condeno, ainda, as Rés no pagamento das custas processuais e honorários advocatícios
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decorrentes da sucumbência que fixo em 20% sobre o valor atualizado da condenação, nos
termos do art.20, §3º, do CPC.
Transitada em julgado, arquive-se com baixa na distribuição P. R. I.
Belo Horizonte, 03 de outubro de 2013.
Iandara Peixoto Nogueira
Juíza de Direito
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