Cálculo Avançado A - Variáveis Complexas
CAPÍTULO VI – VARIÁVEIS COMPLEXAS
Neste capítulo, estudaremos as funções de variáveis de complexas, bem como limites,
continuidade, derivação e integração destas funções, analisando as diferenças e as semelhanças com o
cálculo de funções de uma variável real.
1. FUNÇÃO COMPLEXA:
Seja uma variável complexa, z = x + j y , onde x e y são números reais. Consideremos ainda a
variável complexa w = u + jv , onde u e v são números reais. Vamos supor que z está num plano, o
qual chamaremos de z-plano (domínio) e que w está em outro plano complexo chamado de w-plano
(imagem). Vamos ainda supor que existe uma regra que associa cada ponto do z-plano (ou uma porção
deste) com um ponto no w-plano. Desta forma dizemos que w é uma função de z , e podemos escrever
este fato simbolicamente como:
w = f (z ) .
(1.1)
Se a cada z corresponde um único valor de w, então a função é dita unívoca ou univalente ou
simplesmente função. Entre essas encontramos as funções racionais, exponenciais, trigonométricas e
hiperbólicas. Uma função que não é unívoca é dita plurívoca ou multivalente. As inversas das funções
exponenciais, trigonométricas e hiperbólicas, bem como as funções potência não inteira são funções
multivalentes e não serão estudadas aqui. Para maiores informações vide referências. “A menos que se
afirme em contrário iremos supor que todas as funções consideradas são unívocas”.
OBSERVAÇÃO :
Devemos notar que o z-plano e o w-plano são geometricamente similares, sendo muitas vezes
considerados o mesmo plano.
Uma função complexa sempre pode ser decomposta nas suas partes real u ( x, y ) e imaginária
v(x , y ) . Por exemplo, vamos decompor a função
f (z ) = z 2 + z + 1
(1.2)
em sua parte real e imaginária, substituindo a definição z = x + j y em f(z), obtendo-se que:
(
)
w = f (z ) = (x + jy )2 + x + jy + 1 = x 2 − y 2 + x + 1 + j(2 xy + y )
1
(1.3)
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e assim:
u (x , y ) = x 2 − y 2 + x + 1

 v(x , y ) = 2xy + y
(1.4)
Se quiséssemos o contrário, isto é, dada a função
(
)
f (z ) = x 2 − y 2 + x + 1 + j(2 xy + y )
(1.5)
para encontrarmos a função escrita em termos de z e z , devemos usar as propriedades do conjugado de
um número complexo, ou seja,
x=
z+z
2
e y=
z−z
2j
(1.6)
Transformação:
Propriedades de uma função real f(x), de uma variável real x, são demonstradas
geometricamente pelo gráfico da função. A equação y = f ( x) estabelece uma correspondência entre os
pontos x no eixo real x e os pontos y no eixo real y. Ao conjunto dos pontos (x, y) formados desta
correspondência chamamos de gráfico de f(x). Da mesma forma usamos uma superfície para exibir
graficamente uma função real z = f ( x, y ) , que relaciona um ponto (x, y) do plano domínio com o
número real z do eixo real z, este é um gráfico em três dimensões.
Entretanto, quando consideramos w = f ( z) , com z e w variáveis complexas, o domínio desta
função é um plano e a imagem também. Assim seu gráfico teria quatro dimensões, tornando
impraticável sua representação. Mesmo assim, algumas informações da função podem ser obtidas
através da observação da relação entre os pontos do domínio e da imagem. Utilizamos para isto, dois
planos complexos distintos: o z-plano e o w-plano, onde para cada ponto z = ( x, y ) no z-plano
corresponde a um ponto w = (u, v ) do w-plano. Escolhendo um conjunto de pontos no domínio da
função, podemos estudar a correspondência existente entre este conjunto e sua imagem. A esta relação
damos o nome de transformação de um conjunto de pontos do z-plano em um outro conjunto de
pontos no w-plano pela função. Este termo se aplica a conjuntos como uma curva, uma região, etc..
Para empregarmos certos termos geométricos, é conveniente, às vezes, considerar a aplicação
como uma transformação num só plano. A função w = z + 2 , por exemplo, pode ser encarada como
uma translação de cada ponto z à posição w = z + 2 , isto é, duas unidades à direita de z. A função
w = z leva cada ponto z na sua reflexão no eixo real.
2
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A transformação de curvas ou regiões fornece em geral mais informações sobre a função do
que as transformações de pontos individuais. Como exemplo, vamos considerar a função:
w = x 2 + y2 − j y
(1.7)
a qual leva os pontos de cada circunferência x 2 + y2 = c2 (figura 1.1a), onde c ≥ 0 , em pontos da reta
(
)
1
u = c, pois u = x 2 + y2 2 . Mas para obtermos todos os pontos do circunferência, y deverá assumir
todos os valores de -c até c, e como v = -y, então v deverá variar de c até -c. Assim, a imagem do
circunferência x 2 + y2 = c2 é o segmento de reta u = c compreendido entre as retas v = u e v = −u
(ver figura 1.1b). Visto que dois pontos do tipo z = x + jy e z = − x + jy tem a mesma imagem w, cada
ponto do segmento, exceto as extremidades, é imagem de dois pontos do circunferência. O domínio D
de definição da função w é o z-plano inteiro. Cada ponto de D se situa sobre uma destas
circunferências, pois c pode ser qualquer constante não negativa, e a imagem desta circunferência é um
segmento como o descrito acima. Reciprocamente, um segmento deste tipo é sempre imagem de uma
destas circunferências, pela função f. Assim, a imagem do z-plano, contradomínio R da função w, é o
quadrante u ≥ 0 e
− u ≤ v ≤ u.
y
v
u=v
c
c
u
x
u=-v
(a)
(b)
Figura 1.1: Exemplo de Transformação
Limite e Continuidade:
Chamamos de Vizinhança de z 0 com raio ρ a um conjunto definido por:
V(z 0 , ρ) = {z ∈ C / z − z 0 < ρ}
(1.8)
3
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Dizemos que uma função complexa f(z), definida em uma vizinhança de z 0 , possui limite L quando z
se aproxima de z0 por qualquer direção do plano complexo, se para qualquer número real positivo ξ ,
podemos determinar um outro número real positivo δ tal que f (z ) − L < ξ sempre que z − z 0 < δ.
Isto é, os valores de f(z) são tão próximos quanto desejarmos de L para todos os valores de z
suficientemente próximos de z0 (vide Figura 1.2). Escrevemos isto como:
lim f (z ) = L .
(1.9)
z → z0
Nota: Como a definição de limite é exatamente a mesma que a dada para o cálculo de uma
variável real, podemos demonstrar, da mesma forma que para funções de uma variável real que:
2. lim C = C
z →z 0
1. O limite quando existe é único.
4. lim [f (z ) + g(z )] = lim f (z ) + lim g( z)
z →z 0
z→z 0
z→z 0
3. lim z = z0
z →z 0
lim f (z )
f (z ) z→z 0
5. lim
=
lim g (z )
z →z 0 g(z )
z →z 0


7. lim [f (z )]n =  lim f (z )
z → z0
 z→ z0

z
6. lim f (z )g (z ) = lim f (z ) lim g(z )
z →z 0
z →z 0
z→ z0
1
n
8. lim [f ( z )]
z →z 0
1
n
δ
z0

n
=  lim f (z )
z →z0

f(z)
ξ
L
Figura 2.2: Limite de f(z) quando z tende à z0 .
OBSERVAÇÃO : Como a distância entre dois pontos “ z” e “a” é dada por z − a , segue
geometricamente que:
z − a = ρ,
(1.10)
representa uma circunferência de raio "ρ" com centro em " a" . Conseqüentemente, a desigualdade:
4
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z − a < ρ,
(1.11)
representa o conjunto de todos os pontos interiores desta circunferência e,
z − a ≤ ρ,
(1.12)
é a união dos pontos interiores com os pontos sobre a circunferência de centro " a" e raio "ρ" .
Uma função f(z) é dita Contínua em z = z0 se:
a) Existe L, tal que lim f (z ) = L .
z → z0
b) A função f(z) está definida no ponto z 0 , isto é f (z0 ) existe.
c) L = f (z0 ), ou seja ,
lim f (z ) = f (z0 ) .
z →z 0
OBSERVAÇÃO : Uma função é dita Contínua num conjunto S, se f(z) é contínua em cada
ponto z ∈ S.
Nota: Da mesma forma que limites, a definição de continuidade é exatamente a mesma que a
dada para o Cálculo de Uma Variável Real. Assim, podemos demonstrar, da mesma forma que para a
funções de uma variável real, que se f e g são duas funções contínuas em z 0 , então:
1. f + g é uma função contínua em z 0 .
2. f − g é uma função contínua em z 0 .
3. f .g é uma função contínua em z 0 .
4. f / g é uma função contínua em z 0 , desde que g (z0 ) ≠ 0.
Derivação:
Uma função f(z) é dita Derivável em um ponto z se existe o limite:
f (z + ∆z ) − f (z )
,
∆z
∆z→ 0
D zf (z ) = f ′(z ) = lim
(1.13)
e quando o limite (1.13) existe, ele é chamado de derivada de f(z) no ponto z.
Nota: Todas as regras familiares do cálculo diferencial real, tais como as regras de derivação
de uma constante, das potências de z, somas, produtos e quocientes de funções deriváveis e a regra da
cadeia para derivar funções de funções, continuam válidas no campo complexo. Assim sendo:
( )
1. D z (C) = 0 ;
2. D z z n = n z n −1 ;
5
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3. D z (C f (z )) = C Dz (f (z )) ;
4. D z (f (z ) + g(z )) = Dz (f (z )) + Dz (g (z )) ;
5. D z (f (z )g(z )) = f (z )Dz (g (z )) + g(z ).Dz (f (z )) ;
 f (z )  g (z ).D z (f (z )) + f (z ).D z (g (z ))
6. D z 
 =
;
 g(z ) 
[g(z )]2
7. Se u = u (z ), e Du (f (u )) existe , então Dz (f (u )) = Du (f ( u ) )Dz (u (z )) .
EXEMPLOS:
A derivada de f (z ) = z 2 em qualquer ponto z é 2z, pois:
f ′(z ) = lim
(z + ∆z )2 − z 2
∆z
∆z →0
= lim (2z + ∆z ) = 2 z .
(1.14)
∆z →0
Nota: É importante ressaltar que algumas funções simples não apresentam derivada em
nenhum ponto como, por exemplo, podemos citar, f (z ) = z , pois:
h ( z) =
f (z + ∆z ) − f (z ) [( x + ∆x ) − j(y + ∆y)] − (x − jy ) ∆x − j ∆y
=
=
∆z
∆x + j ∆y
∆x + j ∆y
(1.15)
e calcular o limite de (1.15) quando z → z 0 depende do caminho escolhido. Vamos primeiramente
escolher o caminho I da Figura 1.3, isto é, vamos fazer ∆y → 0 e depois ∆x → 0 , ou seja:
lim h ( z) = lim
∆z → 0
∆y →0
∆x → 0
∆x − j ∆y
=1
∆x + j ∆y
(1.16)
e depois, escolhendo o caminho II, ou seja, fazendo inicialmente ∆x → 0 e depois ∆y → 0 , obtendo:
lim h ( z) = lim
∆z → 0
∆x → 0
∆y → 0
∆x − j ∆y
= −1 .
∆x + j ∆y
(1.17)
II
z
z + ∆z
I
Figura 1.3: Caminhos I e II.
Assim, de (1.13) e (1.14) vemos que o limite depende do caminho escolhido, o que indica que
este não existe, ou seja, a função não é derivável em nenhum ponto.
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Analiticidade e Singularidade:
Se uma função f(z) possui derivada em um ponto z 0 z e se conseguimos uma vizinhança de
z 0 de tal forma que a derivada de f(z) exista em todos os pontos interiores a esta vizinhança dizemos
que a função f(z) é regular ou analítica em z 0 . Neste caso, z 0 é dito um ponto regular da f(z). Um
ponto z 0 é dito ponto singular, ou simplesmente uma singularidade de uma função f(z), se ele não é
um ponto regular desta função. Um ponto singular z 0 é dito singularidade isolada, se existe uma
vizinhança de z 0 onde todos os pontos desta vizinhança são regulares, exceto o próprio z 0 .
Uma função f(z) pode ser derivável em um ponto, mas não ser analítica neste ponto, por
exemplo, f ( z) = z . Em z = 0 , a função é derivável, pois:
2
∆z 2
f (0 + ∆z ) − f (0 )
∆z.∆z
= lim
= lim
= lim ∆z = 0 .
∆z
∆ z→0
∆z→0 ∆z
∆ z→0 ∆z
∆z→0
lim
(1.18)
Entretanto, checando em qualquer outro ponto distinto de zero, a derivada não existe, logo
todos os pontos são singulares, inclusive a origem, apesar da função ser diferenciável em z = 0.
Portanto, esta função não é analítica em ponto algum.

singularid ade removível


isolada polo
Tipos de singularidades: 
singularid ade es sen cial .


não isolada

Um ponto singular isolado z 0 de uma função f(z) é dito removível, se existe o limite:
lim f (z ) .
(1.19)
z→z 0
Um ponto singular isolado z 0 de uma função f(z) é chamado de pólo de ordem n de f(z), se:
lim (z − z 0 ) n f ( z) = L ,
(1.20)
z →z0
onde L é um número finito não nulo e n é o menor número inteiro positivo tal que (1.20) exista.
Uma singularidade isolada z 0 de f(z) é dita essencial se não existe n inteiro positivo tal que:
lim (z − z 0 ) n f ( z) < ∞ .
(1.21)
z →z0
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As Equações de Cauchy -Riemann:
As Equações de Cauchy-Riemann nos fornecem informações sobre a derivabilidade e a
analiticidade de uma função complexa f(z) em um dado ponto z do plano complexo. Estas informações
são apresentadas nos seguintes teoremas:
TEOREMA 1: Uma função f(z) é derivável num ponto z = (x, y) se, e somente se, satisfaz as
equações de Cauchy-Riemann:
∂v
 ∂u
 ∂x ( x , y) = ∂y ( x , y)


 ∂u ( x , y) = − ∂v ( x, y)
 ∂y
∂x
(1.22)
neste ponto. E mais, a derivada de f(z) é dada por:
f ′( z ) = u x ( x, y ) + j vx ( x , y) = v y − j u y .
(1.23)
TEOREMA 2: Uma função f(z) é analítica em um ponto z se, e somente se, as equações de
Cauchy-Riemann são satisfeitas em uma vizinhança de z.
Em outras palavras, acabamos de determinar um teste para a existência, ou não, da derivada
de uma função, o qual considera apenas a parte real e a parte imaginária desta função.
A Derivada das Funções Exponencial, Trigonométricas e Hiperbólicas:
A função exponencial é analítica em C, pois:
u (x y ) = e x cos y
e = e (cos y + j sen y ) = 
 v(x y) = e x sen y
z
x
(1.24)
e aplicando as condições de Cauchy-Riemann vê-se que u x = v y
e u y = − v x para qualquer
número z complexo. Assim, podemos calcular sua derivada:
( )
d z
e = u x + j v x = e x cos y + j e x sen y = e z
dz
(1.25)
As derivadas das funções trigonométricas e hiperbólicas são calculadas usando-se
propriedades da derivação e a derivada da exponencial, ou seja:
d(senh z ) 1  de z de− z  ez + e − z
=
−
=
= cosh z ,
dz
2  dz
dz 
2
(1.26)
e similarmente,
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d(cosh z )
= senh z ,
dz
(1.27)
d(sen z )
= cos z
dz
(1.28)
e
d(cos z)
= − sen z .
dz
(1.29)
As fórmulas (1.26 – 1.29) providenciam informações sobre a analiticidade das funções acima.
Vemos que sen z , cos z, senh z e cosh z são funções regulares em todo o plano complexo. A derivada
das funções tg z, sec z, cotg z, cosec z, tgh z, sech z, cotgh z e cosech z é obtida através da regra da
derivada da divisão e estas funções são singulares em pontos onde a função se torna infinita. Assim,
por exemplo, cada ponto onde cos z vale zero, é um ponto singular de tg z e sec z, isto é,
π
z = (2k + 1) + j 0,
2
como já foi visto no capítulo I. Assim, as funções tg z e sec z tem um número infinito de
singularidades isoladas distribuídas em intervalos uniformes ao longo do eixo real.
Como um segundo exemplo, vamos encontrar os pontos singulares de tgh z e sech z. Estas
funções são infinitas quando cosh z é zero, assim, temos que:
π
z = 0 + j(2n + 1) ,
2
(vide cap. I) os quais são infinitos pontos igualmente espaçados sobre o eixo imaginário.
Exercício: Achar as singularidades das funções cotg z, cosec z, cotgh z e cosech z.
2. INTEGRAÇÃO COMPLEXA:
A teoria de integrais curvilíneas, juntamente com a série de potências e o teorema dos
resíduos (vide referências), constitui uma parte importante da teoria das funções de variáveis
complexas. Uma de suas principais aplicações é a inversão de transformações integrais.
Curvas e caminhos:
Uma curva orientada ou paramétrica C no plano complexo (vide fig.2.1) é um conjunto de
pontos z = (x, y) tais que
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x = x ( t ) e y = y( t ) , com t ∈ [a, b],
onde x(t) e y(t) são funções contínuas da variável real t, no intervalo fechado [a,b]. Como z = x + j y,
podemos escrever,
z = z( t), com a ≤ t ≤ b .
t=b
t=b
t=b
t=a
t=a
(a)
t=a
(c)
(b)
Figura 2.1: (a) curva simples, (b),(c) curvas não-simples.
O ponto z(a) é o ponto inicial da curva C, e o ponto z(b) é o ponto final de C. Se z(a) = z(b), C
é dita uma curva fechada. Se não existem dois valores distintos de t em [a, b], denominados aqui
t1 e t 2 , com t1 < t 2 , t1 ≠ a e t 2 ≠ b , tais que z ( t1 ) = z ( t 2 ) , diz-se que a curva C é simples (Curva
de Jodan). Uma curva é dita suave se z ′ (t ) existe, é contínua e não se anula para nenhum t no
intervalo ]a, b[. Uma curva é dita retificável se tem comprimento finito L, isto é, se existe a integral:
b
2
L = ∫ ( x ′ + y′ )1 / 2 dt.
2
a
(a)
(b)
Figura 2.2: Exemplos de curvas fechadas: (a) simples, (b) não simples.
A figura 2.2 acima mostra o exemplo de duas curvas fechadas: (a) é uma curva simples
fechada e, em (b), cada um dos "loops" pode ser visto como uma curva simples fechada, mas a curva
completa não é uma curva simples fechada.
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Exemplos de Curvas:
Seja z (t ) = x (t ) + j y (t ) onde,
 x( t ) = t
2
1) 
, com 0 ≤ t ≤ 1 , ou simplesmente, y = x , com 0 ≤ x ≤ 1 .
2
 y( t ) = t
 x = cos t
2) 
, com 0 ≤ t ≤ 2π , ou simplesmente, x 2 + y 2 = 1 .
y
=
sen
t

 x( t ) = −1
3) 
, com − 1 ≤ t ≤ 1 .
 y(t ) = t
-1
 x (t) = t3

4) 
, com − 2 ≤ t ≤ 2 , ou simplesmente, y = x 2 / 3 .
 y( t ) = t 2
As curvas 1, 2 e 3 são suaves, a curva 4 não é suave, pois x ′( 0) e y′( 0) anulam-se
simultaneamente (observe pela figura acima que a curva não possui derivada na origem).
Um caminho é uma cadeia contínua de curvas suaves. O comprimento de um caminho é a
soma dos comprimentos das curvas suaves que o compõem. Como exemplos podemos citar o contorno
de retângulos e triângulos.
Exemplos de Caminhos:
1) A semicircunferência inferior, ligando de -1 até 1, parametrizada por z (t ) = cos t + j sin t , com
− π ≤ t ≤ 0.
2) A semicircunferência superior, ligando de 2 até 0, parametrizada por z (t ) = 1 + cos t + j sin t , com
0 ≤ t ≤ π.
3) O triângulo de vértices -2, 2 e j, percorrido no sentido anti- horário, parametrizado por
z (t ) = d1 ( t ) + d 2 ( t ) − d 3 ( t ), onde:
11
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d1 ( t ) = t , com − 2 ≤ t ≤ 2

d 2 ( t ) = 2 − t + j( t / 2 ), com 0 ≤ t ≤ 2 .
d ( t ) = (t − 2) + j(t / 2), com 0 ≤ t ≤ 2
 3
(b)
(a)
(c)
Figura 2.3: Exemplos de Caminhos: (a) ex. 1; (b) ex. 2; (c) ex. 3.
A Integral de Linha:
A integral de linha de uma função complexa f(z), onde z = x + jy é uma generalização
natural da definição real da integral definida. No caso de uma integral definida real, o caminho de
integração é um intervalo do eixo real, já no caso complexo, integramos ao longo de um caminho
orientado C. Assim, sendo C um caminho e f(z) uma função contínua sobre C, a integral complexa:
∫C f (z ) dz , ou simplesmente, ∫C f (z) dz ,
(2.1)
poderá ser definida e representada em termos das integrais reais, ou seja, fazendo-se
f (z ) = u ( x, y) + j v ( x, y) e dz = dx + j dy ,
(2.2)
obtemos que:
∫C f (z) dz = ∫C (u (x , y) dx − v(x, y) dy ) + j ∫C (v(x , y) dx + u(x , y ) dy ) ,
(2.3)
desde que existam as integrais reais do lado direito de (2.3).
O caminho C pode ser aberto ou fechado, mas devemos especificar a direção de integração,
pois uma mudança de direção resulta em mudança no sinal da integral. As integrais complexas são,
portanto, redutíveis a integrais reais curvilíneas e possuem as seguintes propriedades.
∫C (f (z ) + g(z )) dz = ∫C f (z ) dz + ∫C g(z) dz ;
(2.4)
∫C k f (z ) dz = k ∫C f (z ) dz , onde k é uma constante complexa;
(2.5)
∫C f (z) dz = ∫C1 f (z ) dz + ∫C 2 f (z ) dz , onde C = C1 + C 2 ;
(2.6)
12
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∫− C f (z )dz = − ∫C f (z ) dz .
(2.7)
O valor absoluto de uma integral pode ser estimado pela fórmula:
∫C f ( z) dz ≤ ML ,
(2.8)
onde M = max f ( z) sobre C, e L é o comprimento (1.1) da curva C.
Exemplos de Integrais:
1
∫ −1 z dz , onde o caminho C que une -1 até 1 é a semicircunferência inferior de raio 1
1)
centrada na origem. Portanto, a curva C é parametrizada por z (t ) = cos t + j sin t , com − π ≤ t ≤ 0 e,
assim, dz = z′( t ) dt = [− sin t + j cos t ] dt . Logo,
∫C z dz = ∫ − π [cos t − j sen t ][− sen t + jcos t ]dt = ∫ − π j dt = j t
0
0
0
−π
= π j.
(2.9)
2) Idêntico ao exemplo 1, onde C agora é um segmento horizontal unindo -1 até 1. Assim, C é
parametrizada por z (t ) = t , com − 1 ≤ t ≤ 1 . Portanto,
t2
∫C z dz =∫ −1 t dt = 2
1
1
−1
=0.
Note que o valor da integral
(2.10)
1
∫ −1 z dz
depende do caminho escolhido. Além disto, devemos observar
que f (z ) = z não é uma função analítica. Vamos então, fazer o mesmo para uma função analítica, por
exemplo, f ( z) = z.
3)
1
∫−1z dz,
onde o caminho C que une -1 até 1 é a semicircunferência inferior de raio 1
centrada na origem. Portanto, a curva C é parametrizada por z (t ) = cos t + j sin t , com − π ≤ t ≤ 0 e,
assim, dz = z′( t ) dt = [− sin t + j cos t ] dt . Logo,
∫C z dz = ∫ − π [cos t + j sen t ][− sen t + jcos t ]dt = ∫ − π (− sen 2t dt + j cos 2 t) dt = 0 .
0
0
(2.11)
4) Idêntico ao exemplo 3, onde C agora é um segmento horizontal unindo -1 até 1. Assim, C é
parametrizada por z (t ) = t , com − 1 ≤ t ≤ 1 . Portanto,
13
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∫C
z dz = ∫
1
−1
t dt =
t2
2
1
−1
= 0.
Devemos observar agora que o valor da integral
(2.12)
1
∫ −1z dz
é o mesmo, independente do caminho
escolhido. Resulta a seguinte pergunta, cuja resposta será dada na próxima seção: "Escolhendo-se
outros caminhos entre -1 e 1, o valor desta integral continuará sendo o mesmo?"
Teorema Integral de Cauchy:
As integrais de funções analíticas possuem algumas propriedades muito importantes.
Provavelmente a mais importante delas seja descrita pelo teorema integral de Cauchy.
Para apresentar este teorema precisamos do conceito de conjunto simplesmente conexo. Um
conjunto D é dito conexo se quaisquer dois de seus pontos podem ser unidos por uma linha totalmente
pertencente a D. Um conjunto D é dito simplesmente conexo se qualquer curva simples fechada
contida em D, pode ser deformada, sempre totalmente contida em D, até se tornar um ponto.
Teorema Integral de Cauchy: Seja f(z) uma função analítica num domínio simplesmente
conexo D. Se C é um caminho fechado simples de D, então
∫C f (z) dz = 0 .
(2.13)
Prova: Supondo que a derivada de f é contínua, temos
∫C f (z) dz = ∫C (u dx − v dy ) + j ∫C (u dy + v dx ) =
=
 ∂v ∂u 
 ∂u ∂v 
∫∫R  − ∂x − ∂y  dx dy + j ∫∫R  ∂x − ∂y  dx dy = 0,
(2.14)
onde, na segunda igualdade de (2.14) foi aplicado o teorema de Green no plano e, na terceira igualdade
as equações de Cauchy-Riemann.
Observação 1: O teorema de Green para o plano afirma que:
 ∂g ∂f 
∫∫R  ∂x − ∂y  dx dy = ∫C (f dx + g dy ),
(2.15)
onde R é uma região limitada e fechada no plano, cujo contorno é um caminho C e f (x , y ) e g(x , y )
são funções contínuas e possuem derivadas parciais f y ( x , y ) e g x ( x , y) contínuas em um domínio D
que contém R. Uma região fechada é um conjunto conexo que possui todos os seus pontos de fronteira.
14
Cálculo Avançado A - Variáveis Complexas
Observação 2: Goursat demonstrou este mesmo teorema sem a hipótese adicional de que
f ′(z ) deva ser contínua.
Exemplo: Seja C a circunferência unitária, centrada na origem, orientada positivamente.
5)
∫C e dz = 0, pois f (z) = e
6)
∫C
z
z
é uma função analítica, para todo z complexo.
dz
= 2 πj ≠ 0 . Mas, isto não contradiz o teorema de Cauchy, pois f ( z) = z −1 não é
z
analítica na origem, a qual pertence a região R interior ao caminho C.
dz
∫C z 2 = 0 , apesar de
7)
f ( z) = z − 2 não ser analítica em zero. Isto nos mostra que o teorema
dá condições suficientes, mas não necessárias.
Observação 3: Mostra-se que, se f(z) é uma função analítica em D, então a integral que liga
dois pontos de D independe do caminho tomado. Um exemplo disto foi dado nos exemplos 3 e 4
acima. Para verificar este fato, seja f(z) uma função analítica numa região que contenha um caminho
fechado C. Subdividindo o caminho de integração C, como na figura abaixo, em dois arcos C1 e − C 2 ,
obtemos, pelo teorema de Cauchy, que:
0 = ∫ f (z ) dz = ∫
C
C1
f ( z) dz − ∫
C2
-C2
f ( z) dz
z2
z1
e, em conseqüência,
∫C1 f (z) dz = ∫C 2 f (z ) dz ,
C1
ou seja, numa região onde f(z) é analítica, a integral entre dois pontos independe do caminho.
Teorema: Se f(z) é analítica em um domínio simplesmente conexo D e, se F(z) for uma
integral indefinida de f(z), ou seja, F´(z) = f(z), então para todos os caminhos situados em D que
ligam dois pontos a e b em D, têm-se que
b
∫a f (z ) dz = F( b) − F( a ) .
(2.16)
Este teorema permite o cálculo das integrais de linha de funções complexas através de
uma integral indefinida.
Exemplos:
8)
1+ 4 j 2
z dz =
j
∫
[
]
z 3 1+ 4 j 1
47
= (1 + 4 j)3 − j 3 = − − 17 j .
j
3
3
3
15
Cálculo Avançado A - Variáveis Complexas
9)
π/2
∫j
π/2
cos z dz = sen z j
= sen
π
− sen j = 1 − j senh( 1) .
2
A Fórmula Integral de Cauchy:
A conseqüência mais importante do teorema de Cauchy é a fórmula integral de Cauchy. Esta
fórmula é dada pelo teorema abaixo.
Teorema: Seja f(z) uma função analítica no interior e sobre um caminho fechado C. Se z 0 é
um ponto qualquer no interior de C, então:
f (z 0 ) =
1
f (z )
dz ,
∫
2πj C z − z 0
(2.17)
onde a integração é efetuada no sentido positivo ao longo de C.
A fórmula integral de Cauchy, mostra que o valor de uma função analítica numa região é
determinado em toda a região por seus valores na fronteira. A demonstração deste teorema é omitida.
Devemos observar também que a fórmula integral de Cauchy nos permite calcular uma integral de
linha desde que a função a ser integrada tenha uma única singularidade no interior do caminho C.
Exemplo: Encontre o valor das integrais abaixo, calculadas no sentido anti- horário:
I) I = ∫
C
z 2 +1
z 2 −1
z2 + 1
dz , onde:
C (z − 1)( z + 1)
dz = ∫
a) C é uma circunferência de raio 1 e centro 1. Neste caso, f ( z) =
I=∫
f (z )
C z −1
z2 +1
e z 0 = 1 . Assim,
z +1
= 2πj f (1) = 2 πj .
(2.18)
b) C é uma circunferência de raio 1 e centro -1. Neste caso, f ( z) =
z2 +1
e z 0 = −1 . Assim,
z −1
f (z )
= 2 πj f ( −1) = −2πj .
C z +1
I=∫
(2.19)
c) C é uma circunferência de raio 1 e centro j. Neste caso, I = 0, pois a função a ser integrada
não possui singularidades no interior do caminho C (vide teorema de Cauchy).
d) C é uma circunferência de raio 2 e centro 0. Neste caso, a função a ser integrada tem duas
singularidades no interior do caminho C, não satisfazendo as exigências da fórmula integral de
Cauchy. No entanto, podemos observar que:
16
Cálculo Avançado A - Variáveis Complexas
I=∫
z 2 +1
C1 z 2 − 1
 z2 + 1

z2 + 1
= 0,
dz = 2 πj 
+
C 2 z 2 −1
z+1
 z−1


z = −1
z =1 
dz + ∫
z2 +1
(2.20)
onde C1 é a parte de C ligando j até -j unida com o segmento de reta ligando -j até j e C2 é a parte de C
ligando -j até j unida com o segmento de reta ligando j até -j, ambos os caminhos orientados no sentido
z2 +1
anti-horário. Assim, no interior de C1 , f ( z) =
e z 0 = −1 , enquanto que no interior de C2 ,
z −1
f ( z) =
z2 +1
e z 0 = 1 . Isto nos dá a idéia de que quando uma função tem mais de uma singularidade
z +1
no interior do caminho, a integral é calculada usando a fórmula integral de Cauchy para cada
singularidade por vez e, então, somando-se os resultados obtidos. Vejamos o próximo exemplo:
II) Sendo C é a circunferência z = 3 , calcule a integral
z 2 dz
∫C (z 2 − 4 )(z + j) .
Como as singularidades da função a ser integrada são 2, -2 e -j e estão todas no interior do
caminho C, como foi feito no exemplo 1d acima, a integral assume o valor:


z 2 dz
z2
z2
z2

 = 2 πj . (2.21)
+
∫C (z − 2)(z + 2)(z + j) = 2πj (z + 2)(z + j) + (z − 2)(z + j)

( z − 2)( z + 2)
z= 2
z = −2
z= − j 

Deve-se observar que a fórmula integral de Cauchy não poderá ser aplicada se a função a ser
integrada tiver singularidades múltiplas, pois não poderemos separa- las como no exemplo I-d. Neste
caso, usaremos a fórmula que será apresentada na próxima seção.
Derivadas de uma Função Analítica:
Uma fórmula para a derivada de f(z) pode ser obtida derivando o lado direito da fórmula
integral de Cauchy (2.17). Nesta fórmula, a integral é uma função do parâmetro z 0 e pode ser
diferenciada em relação à z 0 . Similarmente às propriedades das integrais reais, supondo que o
contorno C seja uma cur va simples fechada orientada no sentido anti- horário, segue-se a regra de
Leibnitz, ou seja,
∂f (z, z 0 )
d
f (z, z 0 ) dz = ∫
dz .
∫
C ∂z
dz 0 C
0
(2.22)
Aplicando-se a regra de Leibnitz ao teorema integral de Cauchy, obtemos uma expressão para a
derivada da f(z),
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Cálculo Avançado A - Variáveis Complexas
f ′(z 0 ) =
1
f (z )
dz .
∫
2πj C (z − z 0 )2
(2.23)
Uma repetição deste processo nos fornece uma fórmula para a n-ésima derivada da f(z):
dn f
(z 0 ) = f ( n ) ( z 0 ) =
dz n
n!
f (z )
dz .
∫
2πj C (z − z 0 )n + 1
(2.24)
Rescrevendo-se a fórmula acima, obtemos uma fórmula para o cálculo da integral de linha de
uma função complexa que possui uma singularidade z 0 de multiplicidade (n + 1), qual seja:
f (z )
∫C (z − z )n + 1 dz =
0
2 πj ( n )
f (z 0 ) .
n!
(2.25)
Exemplo: Sendo C a circunferência z − j = 3 , positivamente orientada, calcule as seguintes
integrais de linha:
z 4 dz
∫C (z − j)4 =
III)
( )
2πj 4
z
3!
´´´
z= j
= −8π ,
(2.26)
pois, na fórmula (2.25), temos n = 3, z 0 = j (pertencente ao interior do caminho C) e f(z) = z4 .
IV)
∫C
z dz
=∫
(z + 1)
2
2
C
z dz
(z − j)2 (z + j)2
2π j  z

=
1!  (z + j) 2
′




z= j
2π j  z

+
1!  ( z − j) 2




′
= 0,
(2.27)
z= − j
onde procedemos de forma semelhante aos exemplos I-d e II, considerando z 0 = j e n = 1 na primeira
parcela e, z 0 = − j e n = 1 na segunda parcela.
V) ∫
C
z dz
(z − 1)(z
2
2
− 4z + 3
)
=∫
C
′

2πj 
z

=
1!  ( z 2 − 2z − 3) 
z dz
(z − 1) 2 (z + 1)( z − 3)
z =1
=


z
3πj

+ 2 πj 
=−
,
2

8
 ( z − 1) ( z − 3)  z =−1
(2.28)
onde consideramos z 0 = 1 e n = 1 na primeira parcela e a fórmula integral de Cauchy na segunda
parcela com z 0 = −1 . Cabe ressaltar que a singularidade z 0 = 3 da função a ser integrada está no
exterior do caminho C. Assim, não foi aplicado nenhum dos teoremas de Cauchy sobre esta
singularidade, mas ela continua fazendo parte da função (observe que ( z − 3) é fator dos
denominadores de ambas as parcelas).
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Finalizando, é importante observar que a fórmula integral de Cauchy é um caso particular da
fórmula (2.25), a qual pode ser chamada de fórmula integral generalizada de Cauchy. Em uma integral
de linha, esta fórmula é aplicada a cada uma das singularidades da função a ser integrada que estejam
no interior do caminho C. Já as singularidades da função que estiverem no exterior do caminho C não
são vistas pela integral como uma singula ridade, ou seja, a fórmula integral generalizada de Cauchy
não se aplica a ela, mas ela continua fazendo parte da função.
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