REFLEXÃO : A HISTÓRIA ÚNICA E SUJEITO HISTÓRICO SOCIAL
http://paulomarciosecundo.blogspot.com.br/2012/06/reflexao-historia-unica-esujeito.html; Acesso em 3/08/2012
O perigo da história única, isto é, da supervalorização de um aspecto cultural, cultural
ou político, dentre todas as perspectivas intervenientes que terminam por configurar o
tecido da vida humana, nas argumentações de Chimamanda Adichie, é que forjam-se
conhecimentos e comportamentos que na maioria das vezes correspondem aos
aspectos e interesses de uma classe em particular que não é a realidade do individuo
em particular.
A história única inscreve-se como mecanismo de funcionamento da ideologia por meio
do qual, as ideias e interesses de uma classe, geralmente a classe dominante, são
passados e assumidos como ideias e interesses de todas as camadas sociais. As ideias,
interesses, conhecimentos e valores do indivíduo, da sua classe de origem, da sua
etnia são subvalorizados e veiculados por meio de estereótipos, preconceitos,
equívocos.
A universalização da história única, de uma verdade absoluta sobre qualquer fato, cala
a voz das pessoas como sujeitos históricos sociais. Retira das pessoas o seu potencial
para o exercício de uma cidadania mais crítica e participativa. Adichie, argumenta que
assumia como leitora os valores dos personagens e obras literárias britânicas e norteamericanos até o momento em que descobriu nos escritores africanos valores e
interesses ame e interesses africanos.
Chimamanda Adichie descobre a voz dos africanos e mais do que isso descobre que
dentro da sociedade africana existem aspectos sociais e econômicos divergentes,
então não há uma história única nem mesmo dentro da mesma cultura. O grande
problema é que a “história única cria estereótipos. E o problema com estereótipos não
é que eles sejam mentira, mas que eles sejam incompletos. Eles fazem uma história
tornar-se única história”. A história única impõe-se como verdade absoluta.
Situadas à luz das concepções freireanas sobre a educação as argumentações de
Adichie sobre a história única demonstram a importância de questionamentos mais
críticos sobre o currículo e a proposta pedagógica da educação escolarizada. Dentro da
perspectiva Freireana o respeito ao currículo oficial e o seu cumprimento eficaz,
transmissão do saber sistematizado, e um de-serviço às classes populares, a imposição
de uma história única.
Primeiro, porque os conteúdos curriculares representam por si só a supremacia dos
conhecimentos considerados válidos, superiores, importantes, em detrimento dos
conhecimentos populares considerados folclóricos, senso comum, desorganizados,
vivências sem rigor acadêmico. Segundo, porque a transmissão de conteúdos
curriculares é feita de forma sistematizada, técnica e objetiva, enquanto na vivência
impera a convivência. Aquele pauta-se pela neutralização dos conflitos, uma vez que o
conhecimento cientificado se impõe como verdade neutra e imparcial. Este pauta pela
democratização do conflito, porque supõe a negociação de divergências.
Contra a história única denunciada por Chimamanda Adichi, Freire parece sugerir que
a educação precisa superar a supervalorização do currículo único. O professor constata
que formar é mais do que depositar as informações que o modo de produção
capitalista por meio do neoliberalismo quer universar.Freire convoca os educadores
formados e em formação à responsabilidade ética de conduzir os seres humanos a
uma reflexão e a uma atuação mais crítica sobre a realidade.
Freire destaca que a transmissão irrefletiva dos conhecimentos curriculares podem
conduzir as massas populares ao consumismo desenfreado e a alienação coletiva. Essa
última, aliás, é o aspecto fundante do conceito de história única que Adichie denuncia
como niveladora de um conhecimento estereotipado.
De acordo com Freire ensinar e aprender não se esgota na transmissão do saber
sistematizado que o currículo cristalizou como válido, legítimo e imparcial. O processo
pedagógico precisa se alongar nas condições de produção dos conhecimentos e nas
histórias de vida de educando e de educadores. A instituição escolar e os profissionais
da educação precisam aprender a respeitar e a trabalhar pedagogicamente os saberes,
as histórias dos educandos.
Em síntese a partir desse compromisso ético, pedagógico e político constrói-se a
possibilidade de uma proposta educacional que supere os estereótipos e preconceitos
de uma história única e repressora. Uma história que ignora a voz dos trabalhadores
que a construíram para dar voz apenas aos vencedores, socialmente e politicamente
valorizados como Bretch nos mostra no poema: Perguntas de um trabalhador que lê.
Postado por Paulo Márcio Secundo dos Santos às 12:00
Download

SANTOS, P. M. S. “A História única e sujeito histórico social”