TEORIA DA LITERATURA II AULA 02: FORMALISMO, NEW CRITICISM E FENOMENOLOGIA TÓPICO 01: O FORMALISMO VERSÃO TEXTUAL O Formalismo, o New Criticism e a Fenomenologia têm como característica comum a abordagem imanente da literatura. Isto quer dizer que seu objeto de estudo restringe-se à materialidade do texto literário. O texto literário é, portanto, o limite e o objeto de reflexão desses dois modos de estudo literário que consideram os demais campos de investigação que podem se relacionar à literatura (a história, a psicologia, a sociologia, a biografia) como não necessários à análise crítica ou de interesse suplementar. Embora muito distantes geográfica e culturalmente (Rússia, Estados Unidos e Europa, respectivamente), as três correntes de abordagem quase foram contemporâneas marcando, na primeira metade do século XX, uma nova postura que rompia com a tradição da crítica e da historiografia do século anterior. Por isso mesmo, cada um de modo próprio, dentro de seus respectivos contextos de manifestação e áreas de influência, possibilitaram que a teoria da literatura se estabelecesse como disciplina sustentada por diretrizes científicas em consonância com a Linguística e as Ciências Humanas. INÍCIO DO FORMALISMO: Um grupo de estudantes da Universidade de Moscou, entre 1914 e 1915, fundou o Círculo Linguístico de Moscou com o intuito de realizar pesquisas sobre linguística e poética bem como estimular esse campo de estudo. Em 1917, o grupo passou a ter apoio da recém fundada Sociedade de estudos da linguagem poética (OPOIAZ - sigla em russo) a despeito da crítica que recebiam do grupo de críticos dominante na Rússia ligado ao realismo socialista. A aproximação entre linguística e poética constituiu a tônica do movimento que recusava veementemente qualquer interpretação da obra literária que fosse de natureza extraliterária. Segundo esclarece Boris Schnaiderman (1976, p.IX): VERSÃO TEXTUAL Desde o início a nova corrente se caracteriza por uma recusa categórica às interpretações extraliterárias do texto. A filosofia, a sociologia, a psicologia etc. não poderiam servir de ponto de partida para a abordagem da obra literária. Ela poderia conter esta ou aquela filosofia, refletir esta ou aquela opinião política, mas do ponto de vista do estudo literário, o que importava era o priom, ou processo, isto é, o princípio da organização da obra como produto estético, jamais um fator externo. Victor Chklovski, no artigo " A arte como procedimento", de 1917, esclarece como a linguagem poética é um "desvio" da linguagem objeto (a linguagem do cotidiano). Como a linguagem cotidiana visa à comunicação, ao entendimento entre as pessoas, deve evitar distanciar o significante do significado, isto é, não deve ser criativa ou inovadora, apenas utilizar as relações já estabelecidas pelo signo linguístico para que o discurso seja claro e preciso. Em suma, a conceituação de Chklovski utiliza conceitos linguísticos que relembramos aqui: O Signo Linguístico é uma totalidade que reúne, não uma coisa e uma palavra, mas uma imagem acústica e um conceito e ou: significante + significado. O significante é a forma, a parte concreta da palavra, suas letras e fonemas que criam a imagem acústica. Já o significado é o conteúdo abstrato, o conceito transmitido pela palavra. Veja que nas frases as duas palavras em negrito têm o mesmo significante, mas dois significados diferentes: 1. Desenhei uma camisa de manga curta. 2. Minha fruta preferida é manga. Assim, temos: Significante: M /A /N /G /A (letras + fonemas) e significados: A partir da definição da dos elementos da comunicação (emissor, receptor, código, referente, canal e mensagem) e das funções da linguagem a eles ligadas (emotiva, conativa, metalinguística, referencial, fática e poética) Roman Jakobson define o que faz de determinada obra uma obra literária. Segundo ele, "a poesia é linguagem em sua função estética. Deste modo, o objeto do estudo literário não é a literatura, mas a literariedade, isto é, aquilo que torna determinada obra em obra literária. (Apud SCHNAIDERMAN, 1976, p.X). Dessa forma, a análise deve usar o método linguístico para revelar a literariedade, ou estranhamento, entendido como um conjunto de traços específicos do fato literário, revelado por uma comparação entre a linguagem poética e a linguagem objeto (do cotidiano). Na função poética o significante congrega diversos significados provocando o estranhamento pelo procedimento (priom) que se desvia do utilitarismo pragmático da linguagem cotidiana. A polissemia da linguagem poética provoca a dúvida, a ambiguidade e a surpresa. Nas palavras de Chklovski (1976, p.45): VERSÃO TEXTUAL E eis que para devolver a sensação de vida, para sentir os objetos, para provar que pedra é pedra, existe o que se chama arte. O objetivo da arte é dar a sensação do objeto como visão e não como reconhecimento; o procedimento da arte é singularização dos objetos e o procedimento que consiste em obscurecer a forma, aumentar a dificuldade e a duração da percepção; a arte é um meio de experimentar o devir do objeto, o que é já 'passado' não importa para a arte. A riqueza de significados ou a polissemia pode ser compreendida pelo seguinte esquema apresentado por Zavaglia (2003): Fonte [4] CONTRIBUIÇÕES DO FORMALISMO: O enfoque dado ao estudo dos traços característicos do discurso literário pelo formalismo que identifica a unidade da obra como uma forma na qual os elementos estão correlacionados e integrados acarretou na recusa a distinção entre "forma" e "fundo" (forma x conteúdo) na abordagem crítica da obra literária. Ou seja, na obra literária o assunto ou tema não pode ser desagregado do conjunto de procedimentos construtivos que o compõem e o singularizam. No que diz respeito ao estudo das narrativas, o formalismo foi o primeiro a estabelecer distinções entre romance e novela; realçou a importância do tempo na estrutura romanesca e distinguiu fábula de trama. Chklovski explica a "fábula" como enumeração dos acontecimentos da narrativa e a "trama" como a organização elaborada desses acontecimentos em uma certa disposição que forma a narrativa. Resumindo, a fábula diz respeito à história contada enquanto a trama abrange o modo como a história é arquitetada e organizada sob a forma de uma narrativa. Dessa forma, a obra é justificada como uma organização única, já que um mesmo assunto (fábula) pode ser organizado em diferentes tramas. Concluindo, a escolha dos temas ou motivos que compõe a fábula arquitetados em uma organização singular construída com o uso especial da linguagem poética produz a obra literária. Tal concepção exige que o artista - autor ou poeta - faça uso da língua aproveitando todos os recursos em seus diferentes níveis: sintático, fonológico e semântico. LEITURA COMPLEMENTAR Para aprofundar seus conhecimentos sugerimos a leitura da obra que reúne textos e depoimentos dos principais teóricos do Formalismo: EIKHENBAUM, Boris et al. Teoria da Literatura. Formalistas russos. Porto Alegre: Globo, 1976. FÓRUM No fórum deste tópico vocês deverão discutir a partir da leitura poemaA noite dissolve os homens (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.), de Carlos Drummond de Andrade a presença do desvio proporcionado pela utilização da linguagem poética e o efeito de estranhamento provocado em vocês. Vocês devem comentar utilizando o poema, os vários conceitos propostos pelo Formalismo: o desvio da linguagem, o estranhamento, a polissemia, a organização do tema em uma forma única. FONTES DAS IMAGENS 1. 2. 3. 4. http://www.adobe.com/go/getflashplayer http://www.adobe.com/go/getflashplayer http://www.adobe.com/go/getflashplayer http://www.scielo.br/img/revistas/delta/v19n2/a01img01.gif Responsável: Prof. Marcelo Almeida Peloggio Universidade Federal do Ceará - Instituto UFC Virtual