243 Dissatisfaction with medical practice Insatisfação com a prática da medicina Zuger A N Engl J Med. 2004;350(1):69-75. Comentado por: Eurípides Ferreira. Professor Emérito da Faculdade de Medicina da Universidade de Santa Maria (RS). Qualquer reunião entre médicos leva sempre a um tema: como a medicina está difícil de ser exercida hoje e como a satisfação profissional cai a cada dia. Isto é verdade mesmo? Se sim, por quê? Este artigo de Zuger mostra que nos EUA há realmente um aumento da insatisfação profissional, que por enquanto não levou muitos médicos a abandonar a profissão nem diminuiu o número de ingressantes nas Faculdades de Medicina. Não há relação entre especialidade e insatisfação, apesar de um dos problemas mais sérios levantados por todos os médicos americanos, o número de processos por malpractice, seja setorial – algumas especialidades como obstetrícia, ortopedia e neurocirurgia pagam prêmios proibitivos e aí sim, temos exemplos de médicos que mudam de especialidade e locais onde esses profissionais simplesmente não querem mais trabalhar. Um fenômeno novo nos EUA é a sindicalização dos médicos e organização destes como outros trabalhadores – isto aqui no Brasil é muito antigo... Um ponto também comum a médicos nos EUA e no resto do mundo é a dificuldade em lidar com expectativas irrealistas dos pacientes. Um médico indiano sintetiza numa frase bem esse drama: “os pacientes de meu pai achavam que ele era um Deus: meus pacientes não acham que eu seja, mas exigem que eu faça milagres...”. Um ponto crítico para os médicos americanos que os deixa muito angustiados é a demanda que é feita do seu tempo: eles consideram que não estão dando ao paciente o tempo devido, que é consumido em burocracias, papeladas e lidar com as HMO (os convênios locais...) Também a insatisfação de alguns médicos melhora quando a sua carga de pacientes é menor, ainda que a entrada de dinheiro também diminua... Outro ponto que deixa médicos infelizes é quando a sua lealdade e o foco no paciente competem com com exigências de seguradoras, HMOs, agências governamentais e órgãos da justiça, que fazem com que eles se sintam manipulados em detrimento da atenção ao paciente e do trabalho clínico. A autora acha que a alta satisfação com a profissão que vigorava entre os médicos norte-americanos no meio do século 20 foi apenas algo transitório, tanto que não ocorreu o mesmo em outros países. A insatisfação dos médicos não é exclusiva destes profissionais liberais: engenheiros, advogados, arquitetos também a têm cada vez mais, por restrições progressivas à autonomia profissional; e a das enfermeiras é ainda mais intensa. A autora recomenda seriamente que para diminuir esta insatisfação profissional as Escolas de Medicina dêem aos seus alunos durante o curso uma perspectiva realista de como vão trabalhar. A era dourada da liberdade profissional quase que absoluta – que na verdade não era para todos os médicos, e que nem sempre resultava nos melhores resultados para os pacientes – definitivamente acabou. einstein. 2004; 2(3):243