DIRETRIZES ASSISTENCIAIS DO HOSPITAL
SÍRIO-LIBANÊS
PADRONIZAÇÃO DA ABORDAGEM DO
EDEMA AGUDO DE PULMÃO
CARDIOGÊNICO
Pronto Atendimento
Preparado pelo Dr. Caio César Carvalho Nardelli
Supervisão: Dr. Jorge Mattar e Dr. Francisco Torggler
Discutido em reunião aberta em março de 2003
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A. INTRODUÇÃO
O edema do pulmão resulta do fluxo aumentado de líquidos, provenientes dos
capilares pulmonares para o espaço intersticial e alvéolos, que se acumulam nestas regiões
ao ultrapassarem a capacidade de drenagem dos vasos linfáticos, comprometendo a
adequada troca gasosa alvéolo-capilar. O aumento do fluxo de fluídos pelos capilares devese à elevação da pressão hidrostática como ocorre na disfunção cardíaca aguda ou ao
aumento da permeabilidade, como na síndrome do desconforto respiratório agudo. (1)
O edema agudo de pulmão cardiogênico (EAPC) é uma forma grave de
apresentação das descompensações cardíacas, constituindo uma emergência clínica que se
manifesta por um quadro de insuficiência respiratória de rápido início e evolução. Está
associado a um elevado risco à vida do paciente, tanto pelo quadro pulmonar agudo como
pela doença cardiovascular subjacente. (2)
Em relação à etiologia do EAPC, um estudo israelense mostrou, que 85% dos
pacientes apresentavam previamente doenças isquêmicas do coração, 70% apresentavam
hipertensão arterial sistêmica prévia, 53% eram valvopatas e 52% diabéticos. Os fatores
descompensadores mais comuns foram: emergência hipertensiva, fibrilação atrial aguda,
equivalente isquêmico cardíaco e infarto agudo do miocárdio. (3)
A abordagem terapêutica do EAPC deve ser direcionada para identificação e
remoção de quaisquer causas precipitantes de descompensação. Entretanto devido à
natureza aguda do problema, são necessárias inúmeras medidas iniciais inespecíficas que
visam à rápida estabilização clínica do paciente. Estas medidas objetivam o suporte
respiratório e a diminuição da pressão capilar pulmonar através do uso de substâncias
venodilatadoras (nitratos), diuréticos de alça e morfina. (4)
B. OBJETIVOS
ƒ
Estabelecer um protocolo de conduta clínica para avaliação e
tratamento do EAPC no Pronto Atendimento do Hospital Sírio-Libanês.
ƒ
Priorizar o emprego das melhores evidências da literatura atual,
visando segurança, efetividade e praticidade clínica.
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2
C. PROCEDIMENTOS UTILIZADOS.
Busca na literatura pelo Medline e nas bases de literatura médica Cochrane e
OVID, procurando por revisões sistemáticas, meta-análises, diretrizes de prática clínica,
estudos controlados duplo-cegos, revisões e estudos de coorte, utilizando os seguintes
termos:
▬
Acute pulmonary edema; treatment; differential diagnostic; diagnos*;
incidence; prevalence; continuous positive airway pressure; bilevel positive airway
pressure;cardigenic shock; hypotension.
•
Resultados: 18 trabalhos listados; excluídos 2 por falta de pertinência ao
contexto clínico focado.
As referências bibliográficas são citadas numericamente anexas ao grau de
recomendação A, B, C ou D e a outras informações em que são pertinentes. O critério de
classificação do grau de recomendação (que é relacionado à força de evidência científica do
trabalho) por nós utilizado é semelhante ao adotado pelo Projeto Diretrizes desenvolvido
pela Associação Médica Brasileira. Por se tratar de projeto de implementação local de
padronização de condutas, a comissão editorial assume, após atualização da busca na
literatura, as recomendações de Diretrizes construídas por entidades idôneas com a
metodologia de Classificação de Evidências, nos quais a análise das tabelas evidenciárias é
transparente, como recomendações tipo "A".
Todos os graus de recomendação, incluindo-se o "D", são baseados em
evidência científica. As diferenças entre o A, B, C e D deve-se exclusivamente ao desenho
empregado na geração da evidência. A correspondência entre o grau de recomendação e a
força de evidência científica é descrita em detalhes na tabela I e são resumidas a seguir:
A Meta-análises, Ensaios Clínicos Aleatorizados, Diretrizes baseadas em Evidência
B Outros Ensaios Clínicos ou Estudos Observacionais
C Relatos ou séries de casos
D Publicações baseadas em consensos ou opiniões de especialistas
A utilização do grau de recomendação associado à citação bibliográfica no
texto tem como objetivos principais: conferir transparência à procedência das informações,
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estimular a busca de evidência científica de maior força, introduzir uma forma didática e
simples de auxiliar a avaliação crítica do leitor, que arca com a responsabilidade da decisão
frente ao paciente que orienta.
Tabela I
Nível de Evidência
I – Revisão Sistemática e Meta-análise de Ensaios Controlados
e Aleatorizados
Ensaio Controlado e Aleatorizado com Intervalo Confiança
pequeno
Revisão Sistemática de Estudos Diagnósticos bem
desenhados.
Estudo Diagnóstico de Padrão Ouro Aleatorizado e
Controlado
Estudo Diagnóstico com Alta Sensibilidade e/ou
Especificidade
Diretriz nacional ou internacional editada por instituição
idônea, construída e bem documentada com a metodologia
de classificação de evidências.
Grau de Recomendação
A – Há evidências, cujos melhores
estudos são classificados com
nível de evidência I,
diretamente aplicáveis à
população alvo, que mostram
consistência geral dos
resultados, que suportam a
recomendação.
II – Outros Ensaios de intervenção com resultados ‘all or none’
Revisão Sistemática de Estudos de Coorte
Estudo de Coorte
Estudo de Coorte de cuidados médicos recebidos ‘outcomes
research’
Revisão Sistemática de Estudos de Caso Controle
Estudo Caso Controle
Revisão Sistemática de Estudos Diagnósticos cujo desenho gera
chance de viés.
Estudo Diagnóstico de Padrão Ouro que é Aleatorizado ou
Controlado
Estudo Diagnóstico que é Aleatorizado ou Controlado sem
Padrão Ouro
B – Há evidências cujos melhores
estudos são classificados com
nível de evidência II,
diretamente aplicáveis à
população alvo, e que mostram
consistência geral dos
resultados ou há evidências
extrapoladas de estudos de
nível de evidência I, que
suportam a recomendação.
C – Há evidências cujos melhores
III – Série de casos
Estudo Diagnóstico (estudo de Padrão Ouro ou estudo
Aleatorizado ou estudo Controlado)
estudos são classificados com
nível de evidência III, diretamente
aplicáveis à população alvo, que
mostram consistência geral dos
resultados e que suportam a
recomendação.
D – Recomendações extraídas de
IV – Consenso ou opinião de especialista
Diretrizes construídas sem a metodologia de classificação
de evidências
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estudos não analíticos, de
diretrizes construídas sem a
metodologia de classificação de
evidências, de séries de casos e de
opinião de especialista.
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D. DIAGNÓSTICO.
O diagnóstico do EAPC na sala de emergência é clínico, com base na história
clínica e exame físico. Porém o exame clínico inicial é limitado para indentifição de um
possível fator desencadeante do evento, sendo fundamental para isso a realização de exames
complementares(4).
1.História Clínica e Exame Físico.
•
Dispnéia de início agudo ou que piora agudamente;
•
Antecedente de doença cardiovascular;
•
Tosse e expectoração de aspecto róseo;
•
Taquipnéia, sudorese, cianose, agitação e ansiedade;
•
Tiragem intercostal e infraclavicular;
•
Ausculta pulmonar com estertores crepitantes difusos com ou sem
roncos
.
/ sibilos.
2.Exames Complementares.
•
Radiografia de tórax: Demostra alterações no parênquima pulmonar compatíveis com
edema alveolar. Em pacientes com alterações morfológicas prévias do parênquima a
congestão pulmonar é menos evidente. (5).
•
Eletrocardiograma : Exame fundamental para identificação de síndromes coronarianas
agudas e de taqui e bradiarritimias. (6)
•
Ecocardiograma transtorácico : Deve ser realizado na sala de emergência, porém, quando
o fator precipitante é nítido sua realização pode ser adiada (Recomendação A). O
ecocardiograma transesofágico é recomendado para melhor esclarecimento de alterações
detectadas pelo ecocardiograma transtorácico, como por exemplo, na suspeita de rotura de
cordoalhas tendíneas. (7)
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5
•
Exames laboratoriais.
Troponina I ou T e CKMB.
(8)
Hemograma;
Uréia, creatinina, sódio e potássio.
Gasometria arterial.
E. TRATAMENTO
1.Suporte Respiratório Não Invasivo.
I. Oxigenioterapia: consiste na oferta de o2 através de máscara facial aberta. É
a primeira de linha de suporte respiratório, deve ser mantida enquanto o material para
ventilação não invasiva é preparado. O fluxo inicial deve estar entre 5 a 10 l/min.
(4)
(RECOMENDAÇÃO A)
II. Ventilação não invasiva: A aplicação de pressão positiva nas vias aéreas
através de máscara facial fechada foi o grande avanço na terapia inicial do EAPC. O
benefício da pressão positiva está relacionado à redução da pré e pós carga melhorando o
desempenho contrátil do ventrículo esquerdo. Em relação ao pulmão, a pressão positiva em
vias aéreas aumenta a complacência pulmonar devido ao recrutamento das unidades
alveolares previamente colabadas. As duas formas de aplicação de pressão positiva em vias
aéreas, de forma não invasiva, são:
ƒ
Pressão positiva contínua (CPAP): É uma forma de ventilação que
consiste na aplicação de uma pressão única durante todo ciclo
respiratório, seu uso no EAPC deve ser iniciado com pressão entre 5 e
10 cmH2O podendo alcançar até no máximo 12,5 cmH2O.
(Recomendação A)
ƒ
Ventilação em binível pressórico: É uma forma de ventilação que
consiste na alternância de uma pressão positiva menor durante a
expiração e uma pressão positiva maior durante a inspiração,
oferecendo um auxílio inspiratório, reduzindo assim o trabalho
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respiratório do paciente de forma direta. A pressão inspiratória inicial
deve estar entre 8 e 10 cmH2O alcançando no máximo 12,5cmH20.
As duas formas de ventilação não invasiva, de acordo com vários estudos
realizados, principalmente com pressão positiva contínua, aceleram a melhora clínica e
gasométricas e diminuem a necessidade de intubação orotraqueal e posterior ventilação
mecânica quando comparadas com a oxigênioterapia convencional. (9,10,11,12)
2. Suporte Ventilatório Invasivo :
Pacientes em EAPC, a intubação orotraqueal é indicada na presença de
rebaixamento do nível de consciência, aparecimento de sinais clínicos de fadiga da musculatura
respiratória associados a hipoxêmia refratária e acidose respiratória. Essa conduta pode ser
tomada inicialmente em pacientes com infarto agudo do miocárdio com indicação de
angioplastia primária, naqueles com taquiarrítimias e necessidade de cardioversão elétrica e em
pacientes com choque cardiogênico.
3. Medicamentoso:
As drogas de primeira linha para o tratamento do EAPC são os nitratos,
diuréticos de alça e morfina. (4)
ƒ
Nitratos: o nitrato mais frequëntemente usado é o dinitrato de
isossorbida, na dose de 5mg sub lingual a cada 5 minutos, desde que a
pressão arterial sistólica se mantenha acima de 90 mmHg. Sua ação
benéfica resulta da diminuição da pré e pós carga melhorando o
desempenho sistólico do ventrículo esquerdo. (13,14) (Recomendação A)
ƒ
Diuréticos : A Furosemida
é usada na dose de 0,5 até 1mg por
kilograma de peso, por via intravenosa. Se o paciente já fez uso desta
droga no dia do evento, o dobro da dose já usada deve ser aplicada.
Caso o paciente tenha insuficiência renal oligo-anúrica, uma dose de
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7
100 a 200 mg deve ser aplicada lentamente. A resposta inicial esperada
é a melhora do desconforto respiratório devido à venodilatação. Esta se
inicia em torno de 5 minutos após a aplicação e após 20 a 30 minutos
ocorrerá a diurese propriamente dita. Dentro de 20 minutos da
aplicação do diurético, se não houver resposta diurética ou melhora do
desconforto respiratório, o dobro da dose inicial deve ser aplicada. (15,16)
(Recomendação A)
ƒ
Morfina : A morfina é uma droga de grande auxílio na terapêutica do
edema pulmonar pois promove venodilatação, reduz o retorno venoso
em até 40 %, diminui a ansidade do paciente, reduz sua descarga
adrenérgica e conseqüentemente a pós carga. A dose usada é de 1 a 3
mg a cada 5 minutos, devendo-se monitorizar o nível de consciência, a
frequência cardíaca, a pressão arterial e náuseas. (17) (Recomendação A)
Se após o uso inicial destas drogas o paciente continuar desconfortável,
vasodilatadores venosos e arteriais em infusão contínua podem ser administrados. O
nitroprussiato de sódio na dose de 0,1 até 5 microgramas por minuto pode ser infundido se o
paciente não apresentar história prévia de coronariopatia, dor torácica ou alterações
isquêmicas no eletrocardiograma atual. Caso haja algum indicativo de coronariopatia a droga
utilizada será a nitroglicerina inicialmente com 5- 10 microgramas até 200-500 microgramas
por minuto. (13)
Drogas inotrópicas como a dobutamina na dose de 2 – 20 microgramas por kilo
por minuto são utilizadas em doentes que têm disfunção ventricular esquerda com quadro
clínico refratário ou no paciente hipotenso bem perfundido.(18) Em pacientes em edema agudo
de pulmão associado a choque cardiogênico deve-se realizar a intubação orotraqueal precoce
e priorizar o uso de drogas vasopressoras como a noradrenalina na dose 0,5 a 30 microgramas
por kilo por minuto, intravenosa ou dopamina na dose 5 a 15 micrograma por kilo por minuto,
intravenosa, até a estabilização da pressão arterial. Atingida a estabilidade hemodinâmica,
iniciar o uso de diuréticos e cogitar a associação de vasodilatadores. (4)
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Início/piora súbita dispnéia
Antecedente de cardiopatia
Tosse expectoração rósea
Taquipnéia,sudorese,taquicardia
EC difusos com roncos/sibilos.
EDEMA AGUDO DE PULMÃO
(Diagnóstico Clínico)
Considerar
• Asma
• DPOC
• Causas não
cardiológicas
do EAP
SALA DE EMERGÊNCIA
• Membros inferiores pendentes
• PAs > 90 mm Hg → 5mg Isordil SL 5/5 min até máximo de 15mg
• Oxigenioterapia: máscara (5-10 L/min)
• Oximetria de pulso (Sat O2 > 90%)
• Monitoração cardíaca contínua
• Acesso venoso periférico
• Exames laboratoriais (HMG, CKMB, troponina*, Ur, Cr, Na, K, Gaso arterial, RX
tórax)
• Procurar causa→ história e exame físico / ECG
• Ventilação não-invasiva com máscara facial, inicialmente usando CPAP (10 cm H2O)
COM CHOQUE
SEM CHOQUE
Furosemida1
Morfina2
Estabilização da PA
Noradrenalina6/
dopamina7
CONSIDERAR
INTUBAÇÃO
OROTRAQUEAL
MANUTENÇÃO DESCONFORTO
RESPIRATÓRIO:
• PAs > 100: Nitroglicerina3/ Nitroprussiato
de Sódio4
• Hipotensão arterial sem choque ou
disfunção do VE:
Dobutamina5
• Considerar realização ECO
transtorácico
Considerar no IAM com supra ST
intubação orotraqueal precoce
1)
2)
3)
4)
5)
6)
7)
Piora do quadro clínico
(fadiga respiratória e
↓ do nível de consciência,
saturação O2 < 90%)
Melhora do quadro clínico
(padrão respiratório confortável
e saturação O2 > 90%)
Retirada lenta da assistência
ventilatória com ↓ gradativa da
pressão positiva
0,5-1,0 mg/ Kg IV (Se paciente c/ insuf. renal: 100-200 mg lentamente. Repetir dobro da dose inicial se não houver
resposta)
1,0-3,0 mg cada 5 min. (Monitorizar nível de consciência, freqüências respiratória e cardíaca e náuseas)
5,0 a 10,0 µg/ min. até 200-500µg/ min. (Dor torácica ou qualquer indicativo de insuficiência coronariana)
0,1 até 5,0 µg/ Kg/ min. (Somente se o paciente não apresentar nenhuma evidência de insuficiência coronariana)
2,0-20,0 µg/ Kg/ min.
0,5 a 30 µg/ min IV
*Troponina/ CKMB: Repetir entre 6 e 8h do início do evento.
5,0 a 15,0 µg/ Kg/ min IV
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9
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padronização da abordagem do edema agudo de pulmão