AVANÇOS NA IMPLATAÇÃO DO MODELO DE ASSISTÊNCIA AO PARTO E NASCIMENTO
HUMANIZADOS E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A REDUÇÃO DA MORTALIDADE
MATERNA: EXPERIÊNCIA DE BELO HORIZONTE
ROSÂNGELA DURSO PERILLO
Com o objetivo de promover a saúde e a qualidade de vida da mulher e da criança, a redução da
mortalidade materna, infantil e fetal e as desigualdades assistenciais foi constituída uma comissão na
Secretaria Municipal de Saúde para atuação mais efetiva na organização da assistência de saúde da
criança e da mulher, garantindo assistência digna e qualificada neste momento da vida, particularmente
importante e decisivo no futuro do indivíduo.
Em 1994 foi estruturada a Comissão Perinatal, fórum interinstitucional e intersetorial deliberativo
permanente, e gestor das políticas relativas à assistência de saúde da gestante e do recém-nascido (RN).
Esta Comissão tem a atribuição de executar o planejamento, avaliação, monitoramento, e divulgação das
ações de saúde, envolvendo a rede de assistência à linha de cuidado integral, desde o planejamento
familiar e a saúde da mulher, ao pré-natal de baixo e de alto risco, incluindo o apoio propedêutico e
terapêutico, e a rede hospitalar com leitos de obstétricos e neonatais de baixo e de alto risco, para
adequação dos serviços à necessidade da população.
A Comissão Perinatal está vinculada à Gerência de Regulação da Secretaria Municipal de Saúde,
departamento responsável por toda a rede de serviços contratados ao SUS-BH, e que, por este motivo,
legitima as ações da Comissão diante dos hospitais do município - que necessariamente compõem a rede
assistencial para a gestante e o recém-nascido - e amplia a atuação da Comissão para além da atenção
básica, que ainda tem sido o reduto de ações limitadas das gestões municipais, predominante no âmbito
nacional.
É composta por representantes das diversas gerências da Secretaria Municipal de Saúde (Gerência
de Epidemiologia e Informação, Coordenação de Atenção à Criança, Coordenação de Atenção à Mulher,
Controle e Avaliação Ambulatorial, Controle e Avaliação Hospitalar Vigilância Sanitária, Comitê
Municipal de Prevenção de Óbitos BH VIDA),represente das maternidades e do berçários de cada
hospital integrante do fluxo de assistência à gestante e ao recém-nascido de alto risco (Hospital Municipal
Odilon Behrens, Maternidade Odete Valadares, Hospital das Clínicas, Hospital Júlia Kubistcheck,
Maternidade Hilda Brandão – Santa Casa de Belo Horizonte, Hospital Sofia Feldman e Hospital Risoleta
Tolentino Neves), representante dos Hospitais Pediátricos, da Associação Mineira de Hospitais,
representantes das diversas associações de classe (Sociedade Mineira de Pediatria, Sociedade Mineira de
Ginecologia e Obstetrícia, Conselho Regional de Medicina, Associação Brasileira de Enfermagem
Obstétrica (ABENFO) Regional Minas Gerais, Rede Feminista de Saúde - Regional Minas Gerais),
representantes da sociedade civil (Pastoral da Criança, Conselho Municipal da Criança, Conselho
Municipal de Direitos da Mulher) e representante do Ministério Público.
A Comissão Perinatal engloba o Comitê Municipal de Prevenção de Óbitos BH VIDA, que
investiga desde 1997 todos os óbitos de mulher em idade fértil e desde 2002 os óbitos infantis e fetais
com peso de nascimento maior ou igual a 1500g e sem malformações congênitas graves, propiciando a
identificação de possíveis falhas na assistência e das medidas para sua prevenção. O Comitê atua em
parceria com as Escolas de Enfermagem e de Medicina da UFMG, contribuindo para a formação dos
profissinais.
O Comitê Municipal de Prevenção de Óbitos – BH VIDA é um organismo interinstitucional, de
caráter eminentemente educativo, congregando instituições governamentais e da sociedade civil
organizada, contando com participação multiprofissional, cuja atribuição é identificar, dar visibilidade,
acompanhar e monitorar os óbitos infantis, fetais e maternos.
O objetivo geral é elucidar as circunstâncias da ocorrência dos óbitos infantis, fetais e maternos
identificando os fatores de risco e propondo medidas de melhoria da qualidade da assistência à saúde para
a redução da mortalidade perinatal, infantil e materna.
A análise de cada caso é realizada por meio de entrevista domiciliar e análise de prontuários
ambulatoriais e hospitalares, com o objetivo de conhecer as circunstâncias relacionadas às condições de
vida e de assistência que possam ter influenciado a ocorrência do óbito.
O Comitê Municipal de Prevenção de Óbitos BH-VIDA realiza, após investigação dos casos,
discussões com as equipes de atenção básica e hospitalar que prestaram a assistência. Além disto,
realizada também a revisão constante dos protocolos de atendimentos considerando as evidências
científicas mais recentes, contribui na organização dos serviços baseada na vinculação do paciente à sua
unidade de saúde de referência e responsabilização da equipe de saúde pela assistência.
Em Belo Horizonte nasce cerca de 30.000 crianças por ano. O público alvo do trabalho da
Comissão Perinatal é a população de mulheres gestantes dependentes do SUS-BH e seus bebês, estimada
em 25.000 (70 a 80% da população SUS-dependente). Devemos, no entanto, considerar também os seus
familiares, que sofrem conseqüências dramáticas com as perdas prematuras (e na maioria das vezes
preveníveis), como no caso da ocorrência da morte de uma mulher relacionada com a gravidez, o parto e
o puerpério, a morte intra-útero do feto no final da gravidez ou a morte do bebê nos primeiros dias de
vida.
A Comissão Perinatal Constituem-se como importante instrumento de avaliação da assistência de
saúde, para subsidiar as políticas públicas e ações de intervenção, contribuindo para o melhor
conhecimento sobre os óbitos e possibilidades de redução da mortalidade.
A constituição de fórum permanente com continuidade do trabalho desde 1999 em reuniões
mensais tem sido fundamental para a conformação de fato de uma rede integrada de saúde,
responsabilizando os gestores e diretores dos serviços para garantir assistência de qualidade.
A avaliação sistemática da qualidade dos hospitais, iniciativa ainda incipiente na gestão do SUS
no país (que ainda tem sua atuação muito limitada ao controle de faturas) e o apoio dos gestores
municipais para fechamento de serviços de baixa qualidade foi determinante para o sucesso da
intervenção.
A ação integrada do Comitê Municipal de Prevenção de Óbitos BH VIDA possibilita o
monitoramento de eventos-sentinela com retorno de informações para os serviços promoverem adequação
da assistência e prevenção de novas ocorrências. As principais dificuldades dizem respeito à mudança das
práticas nos serviços de saúde, herança de uma cultura de discriminação da população pobre e da mulher
e que privilegia a conveniência institucional com visão medicalizada do parto e procedimentos excessivos
e prejudiciais como as altas taxas de cesarianas.
A construção de uma nova relação de direitos e equidade e a regionalização da assistência é ainda
são os principais desafios, com sobrecarga do atendimento em BH e pouco investimento dos municípios
da região.
Os resultados alcançados em BH são importantes e se constituem como referência para o país,
com grandes avanços na qualificação do cuidado à gestante e ao recém-nascido. No entanto, é necessário
manter a vigilância e monitoramento permanentes para maior redução dos óbitos evitáveis em mulheres e
crianças, com o apoio dos serviços e gestores de saúde, bem como de toda a sociedade.
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