Fundação Oswaldo Cruz
Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca
Programa de Pós-Graduação em Saúde Pública
ESTUDO DA MORTALIDADE PERINATAL EM UMA REGIÃO DO
RIO DE JANEIRO: ASPECTOS METODOLÓGICOS,
DESCRITIVOS E DETERMINANTES
Apresentada por
Sandra Costa Fonseca
Tese submetida à Coordenação do Curso de Pós-graduação em Saúde Pública, como
requisito para obtenção do Título de Doutor em Ciências na área de Saúde Pública
Orientador:
Prof. Evandro da Silva Freire Coutinho
Rio de Janeiro, março de 2005
Fonseca, Sandra Costa
Mortalidade perinatal em uma localidade do Rio de Janeiro: aspectos metodológicos,
descritivos e determinantes / Sandra Costa Fonseca. – 2005.
xv, 116p.
Orientador: Evandro da Silva Freire Coutinho
Tese (Doutorado em Saúde Pública) – Escola Nacional de Saúde Pública,
FIOCRUZ.
1. Mortalidade perinatal 2. Revisão metodológica 3.Fatores de risco
ii
DEDICATÓRIA
Às mulheres que freqüentam as unidades públicas
e que, apesar de todas as adversidades, têm generosidade e
desprendimento para participar de pesquisas, contribuindo
imensamente para o conhecimento epidemiológico.
iii
AGRADECIMENTOS
A Letícia, Renata e Ernesto, pela compreensão com tantos momentos roubados do
nosso cotidiano;
Ao Evandro Coutinho, pela orientação competente e segura, e por todo aprendizado
nestes quatro anos de doutorado;
À Maria do Carmo Leal, pelo incentivo e participação fundamental nesta tese, desde os
seminários avançados até a publicação do primeiro artigo;
À Sonia Lansky, pela valiosa contribuição no início do projeto, com sugestões de
referências bibliográficas;
A Maria do Carmo Leal e Gulnar Azevedo S. Mendonça, pelas sugestões e críticas na
fase de qualificação;
À Elizabeth de Castro Ferreira, amiga e colega de construção do Núcleo de
Epidemiologia do HMRPS/MLD, pelo apoio incondicional durante todo o doutorado;
À Regina Cláudia G. Coutinho, amiga de longa data, pela enorme ajuda com as
questões da informática e processamento dos dados;
Ao Otávio Maia Porto, diretor do HMRPS/MLD, pela confiança depositada no meu
projeto profissional e pela valorização do Núcleo de Epidemiologia;
iv
À Ana Lúcia Alves, gerente da MLD, por ter acreditado no projeto desde o início e
pelo exemplo de seriedade na assistência materno-infantil;
A Marcos Augusto B. Dias e Rosa M.S.M. Domingues, pela "transmissão" do trabalho
de monitoramento de óbitos na MLD;
À Comissão de Revisão de Óbitos da MLD - Luís Otávio L. F. Matos, Mônica Esposito
Silva, Nadir Gomes B. Santos - pela contribuição na análise dos óbitos perinatais;
Às assistentes sociais Leila Regina F. Marques, Solange Rangel e Sheila Carla R.
Nascimento, pela colaboração no início da coleta de dados;
À Vera Regina P. Alves, mais que secretária, figura onipresente da MLD, pela
inestimável ajuda em vários momentos do trabalho de campo;
À equipe do Serviço de Arquivo Médico e Estatística do HMRPS, pela solicitude na
disponibilização dos prontuários;
À Coordenação de Programas de Epidemiologia da SMS/RJ, em especial à Mariza
Theme e Tatiana Campos, pela constante disponibilidade e solicitude na utilização dos
dados do SINASC e das fichas de investigação de óbito perinatal;
Às amigas Vânia de Mattos Fonseca, Kátia Silveira da Silva e Maria Virginia Peixoto
Dutra, pelo estímulo e idéias compartilhadas, ao longo do mestrado e doutorado.
v
RESUMO
Estudou-se a mortalidade perinatal em uma localidade do Rio de Janeiro,
contextualizada no cenário de outros estudos sobre o tema no Brasil.
O primeiro artigo revisou, com ênfase metodológica, artigos sobre mortalidade
perinatal no Brasil. Foram encontradas taxas elevadas e diferenças regionais, com
natimortalidade variando de 9‰ em Belo Horizonte a 17,9‰ em Fortaleza, e
neomortalidade precoce de 7,4‰ em Caxias do Sul a 15,3‰ em Fortaleza.
Características populacionais e abordagens metodológicas explicam estas variações.
Notou-se progressiva utilização do SINASC e do SIM, predomínio de estudos sobre
neomortalidade, incorporação das classificações de causas e discordância em relação a
alguns fatores de risco.
O segundo artigo descreveu os óbitos perinatais de uma maternidade pública,
com cobertura de 50% dos partos de uma região do Rio de Janeiro. Foram estudados
512 casos (74% natimortos), de 1999 a 2003. A maioria dos óbitos fetais ocorreu antes
do parto e os óbitos neonatais precoces nos primeiros três de vida. A mediana de peso
foi 1420 g e a de idade gestacional 31 semanas. Vinte e quatro por cento dos óbitos
cursaram com retardo de crescimento intra-uterino. As principais causas básicas foram
afecções maternas (hipertensão e sífilis). De acordo com a classificação de
Wigglesworth, foram considerados evitáveis cerca de 50% dos óbitos.
O terceiro artigo foi um caso-controle aninhado que investigou os determinantes
da mortalidade perinatal na mesma maternidade, de 2002 a 2004. A análise dos dados,
através de modelo hierárquico, revelou a importância de vínculo empregatício, situação
marital estável, acompanhante na internação e pré-natal adequado como protetores,
enquanto violência doméstica e presença de morbidade na gravidez aumentaram o risco.
vi
Baixo peso e prematuridade foram os maiores determinantes do óbito neonatal precoce.
O pré-natal teve efeito ainda mais acentuado nas pacientes com morbidade, destacandose como estratégia de redução do risco em populações socioeconomicamente
desfavorecidas.
vii
ABSTRACT
This work intended to study perinatal mortality in a limited region in the city of
Rio de Janeiro, in the context of other studies in Brazil.
The first paper concerns to a review of latest papers about perinatal mortality in
Brazil, finding high rates and regional differences. Stillborn rates varied from 9‰ in
Belo Horizonte to 17,9‰ in Fortaleza and neomortality rates varied from 7,4‰ in
Caxias do Sul to 15,3‰ in Fortaleza. Populational features and methodological
approaches can explain these differences. The review showed a growing utilization of
data bases, mainly SINASC and SIM, few studies on stillbirth, the incorporation of
classification schemes and disagreement concerning risk factors.
The second paper described perinatal deaths from a maternity with regionalized
attendance and high coverage in Rio de Janeiro. There were 512 deaths (74% stillborns)
from 1999 to 2003. Stillborns occurred mainly antepartum and early neonatal deaths
concentrate in the first three days of life. Birth-weight median was 1420 g and
gestational age median was 31 weeks. Twenty-four percent of perinatal deaths were
small for gestational age. Maternal affections (hypertension and syphilis) and placental
complications were the principal causes of death. Accordingly to Wigglesworth
classification, 50% of deaths were avoidable.
viii
Third paper was about a nested case-control in the same maternity, investigating
determinants of perinatal mortality, from 2002 to 2004. Statistical analysis, using a
structured hierarchical model, showed that regular jobs, stable marital status, being with
someone during admission, and adequate prenatal care had protective effect against
perinatal mortality. Domestic violence and morbidity during pregnancy increased the
risk. Low birth-weight and gestational age were confirmed as the greatest determinants
of early neonatal death. Prenatal care was even more protective in high-risk mothers,
becoming a strong strategy to reduce risk in populations with low socioeconomic levels.
ix
SUMÁRIO
Apresentação
1
1. Introdução
3
2. Artigo 1 – Pesquisa sobre mortalidade perinatal no Brasil: revisão da
8
metodologia e dos resultados
Resumo
2.1. Introdução
2.2. Metodologia
2.3. Resultados
2.4. Discussão
2.5. Referências bibliográficas
8
9
12
13
23
26
3. Artigo 2 – Óbitos perinatais em uma localidade do MRJ – 1999 a 2003:
40
Características biológicas e evitabilidade
Resumo
3.1. Introdução
3.2. Metodologia
3.3. Resultados
3.4. Discussão
3.5. Referências bibliográficas
40
41
43
46
50
55
4. Artigo 3 – Fatores de risco para mortalidade perinatal em uma região do Rio
61
de Janeiro, Brasil, 2002 a 2004: estudo caso-controle aninhado.
Resumo
4.1. Introdução
4.2. Metodologia
4.3. Resultados
4.4. Discussão
4.5. Referências bibliográficas
61
62
65
71
76
82
5. Considerações finais e desdobramentos
5.1. Referências bibliográficas
98
101
Anexos
1. Ficha de Investigação de óbito fetal e neonatal da SMS (artigo 2)
2. Instrumento de coleta do estudo caso-controle (artigo 3)
3. Termo de consentimento esclarecido do estudo caso-controle (artigo 3)
4. Índice de Adequação do Pré-Natal de Kotelchuck (artigo 3)
5. Instrumento para avaliar violência domiciliar (artigo 3)
105
107
113
114
115
Abuse Assessment Screening
6. Instrumento para avaliar consumo de álcool - T-ACE
116
x
LISTA DE FIGURAS
Página
Artigo 3
Figura 1
Modelo de determinação de mortalidade perinatal
70
xi
LISTA DE TABELAS
Página
Introdução
Tabela 1
Óbitos fetais e neonatais precoces em residentes da AP 4.0 e
Tabela 2
7
percentual ocorrido na MLD, 1999 a 2003.
Número de consultas de pré-natal das usuárias da MLD e das
7
maternidades públicas do Rio de Janeiro
Artigo 1
Tabela 1
Taxas de Mortalidade perinatal, fetal e neonatal no Brasil na
Tabela 2
década de 90 (por mil nascimentos)
Estimativas de efeito dos principais
de
35
Tabela 3
mortalidade perinatal
Artigos descritivos – autor e periódico, características
36
Tabela 4
metodológicas
Artigos sobre
ano,
38
Distribuição do nº absoluto e coeficiente de mortalidade (por mil
58
determinação
–
autor,
34
determinantes
periódico,
características metodológicas
Artigo 2
Tabela 1
nascimentos) por peso – óbitos perinatais, fetais e neonatais
Tabela 2
precoces – MLD, Rio de Janeiro, 1999 a 2003.
Distribuição dos óbitos perinatais, fetais e neonatais por faixa de
58
Tabela 3
idade gestacional – MLD, Rio de Janeiro – 1999 a 2003.
Distribuição dos óbitos perinatais de acordo com o crescimento
58
intra-uterino, por faixa de idade gestacional, MLD, Rio de
Tabela 4
Janeiro, 1999 a 2003.
Percentual de nascidos vivos de baixo peso e coeficientes de
59
mortalidade neonatal de acordo com faixas de peso, MLD, Rio
Tabela 5
de Janeiro, 1999 a 2003.
Distribuição dos óbitos perinatais por faixa de peso, de acordo
59
com a classificação de Wigglesworth , MLD, Rio de Janeiro,
Tabela 6
1999 a 2003.
Distribuição dos óbitos perinatais, de acordo com a classificação
59
de Wigglesworth, para MLD (Rio de Janeiro) e outras
localidades brasileiras.
Artigo 3
Tabela 1
Variáveis maternas estudadas – casos e controles – óbitos
91
xii
Tabela 2
perinatais, MLD, 2002 a 2004
Características dos fetos/RN – casos x controles – óbitos
92
Tabela 3
perinatais, MLD, 2002 a 2004
Análise bivariada dos fatores distais e intermediários para
93
Tabela 4
mortalidade perinatal – MLD, 2002 a 2004
Análise bivariada dos fatores proximais para mortalidade
94
Tabela 5
perinatal – MLD, 2002 a 2004
Análise multivariada estruturada (todas as observações) –
95
Modelo final principal para os três desfechos – óbito perinatal,
Tabela 6
fetal e neonatal precoce, MLD, 2002 a 2004
Análise multivariada estruturada – Modelos finais para os três
96
Tabela 7
desfechos apenas em multíparas, MLD, 2002 a 2004
Análise multivariada estruturada - Modelos finais (alternativos)
97
para todas as observações – óbito perinatal, MLD, 2002 a 2004
xiii
LISTA DE QUADROS
Artigo 2
Quadro 1
Página
Classificação de Wigglesworth modificada por Keeling e
59
relação com falhas na assistência
xiv
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
Abreviaturas
AIG
AP
CIUR
DUM
GIG
IG
PIG
MP
OR
RN
RR
USG
Adequado para idade gestacional
Área Programática
Crescimento intra-uterino retardado
Data da última menstruação
Grance para idade gestacional
Idade gestacional
Pequeno para idade gestacional
Mortalidade perinatal
Odds ratio (razão de chances)
Recém-nascido
Risco relativo
Ultra-sonografia
Siglas
APNCU
CID
DNV ou DN
DO
HMRPS
IBGE
OMS
MLD
MRJ
SEADE
SIH
SINASC
SIM
SMS
SUS
VDRL
Adequacy Prenatal Care Utilization
Classificação Estatística Internacional de Doenças
Declaração de Nascido Vivo
Declaração de Óbito
Hospital Municipal Raphael de Paula Souza
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
Organização Mundial de Saúde
Maternidade Leila Diniz
Município do Rio de Janeiro
Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados
Sistema de Informações Hospitalares
Sistema de Informações sobre Nascidos vivos
Sistema de Informações de Mortalidade
Secretaria Municipal de Saúde
Sistema Único de Saúde
Venereal Disease Research Laboratories
1
APRESENTAÇÃO
Um dos desafios que se colocam para a Epidemiologia é transformar
conhecimento em ações que modifiquem perfis de morbidade e mortalidade da
população.
No Rio de Janeiro, as unidades hospitalares públicas contam com Núcleos de
Epidemiologia, responsáveis pela vigilância epidemiológica e pelo monitoramento e
análise de vários indicadores hospitalares.
A partir do trabalho de monitoramento de óbitos perinatais em uma destas
unidades – a Maternidade Leila Diniz (MLD), pertencente ao Hospital Municipal
Raphael de Paula Souza – surgiu a idéia de aprofundar o conhecimento sobre
mortalidade perinatal, ainda elevada no Rio de Janeiro, a fim de prover melhores
subsídios para as ações de saúde.
As características de atendimento desta unidade, estritamente regionalizada, e
com cobertura de praticamente 50% das parturientes usuárias do Sistema Único de
Saúde de sua área geográfica, permitem uma aproximação dos indicadores de saúde
perinatal da região. Com isto, a possibilidade de aplicação dos resultados da pesquisa
em benefício da população usuária se torna mais factível, dando maior relevância e
utilidade ao trabalho. Uma outra vantagem seria a superação da questão da
subnotificação, um dos entraves no estudo de mortalidade. O estudo realizado dentro da
unidade propiciaria conhecer a totalidade dos óbitos ocorridos, independente dos
tradicionais sistemas de informação.
2
Na introdução deste trabalho - primeiro capítulo - apresentam-se a justificativa e
os objetivos.
Para definir o arcabouço da pesquisa, foi realizada uma revisão sobre os
principais aspectos metodológicos do estudo da mortalidade perinatal, enfatizando
conceitos, aspectos de aferição, fontes de dados e modelos de análise. A fim
contextualizar a pesquisa além do nível regional, foram revisados os estudos nacionais
da última década, sumarizando suas características e principais resultados. Esta revisão,
com ênfase nos aspectos metodológicos, constituiu o primeiro artigo da tese,
apresentado no segundo capítulo.
O segundo artigo - terceiro capítulo - é um estudo descritivo sobre os óbitos
perinatais ocorridos no período de 1999 a 2003 na referida unidade e que representaram
60% da mortalidade perinatal da área geográfica em estudo. São apresentados os
coeficientes de mortalidade, as características biológicas – peso, idade gestacional,
crescimento intra-uterino – as causas básicas e a classificação por evitabilidade.
O terceiro artigo - quarto capítulo - se concentra no período de outubro de 2002
a outubro de 2004 e investiga os determinantes de óbito perinatal nesta mesma
população, através de um caso-controle aninhado. Um modelo estruturado foi usado
para análise estatística, baseada na hipótese de uma inter-relação hierárquica entre
fatores socioeconômicos, biológicos, comportamentais e assistenciais.
O quinto capítulo tece considerações finais diante dos resultados encontrados
nos artigos 1, 2, e 3, articulando-os e propondo sugestões tanto para pesquisas
epidemiológicas futuras quanto para aplicação nos serviços assistenciais.
3
1. Introdução
A mortalidade perinatal, um dos mais relevantes indicadores de saúde maternoinfantil, ainda se encontra elevada no Brasil, principalmente se considerarmos as
diferenças regionais e locais.
Na cidade do Rio de Janeiro, com cerca de seis milhões de habitantes, dados de
2002 e 2003 apontam taxas de 18,6‰ e 17,4‰, respectivamente 1. As desigualdades
encontradas no âmbito nacional se reproduzem no Rio, e as taxas observadas nas dez
áreas programáticas (APs) nas quais se divide a cidade variam de 9,3‰ na AP 2.3 a
23,2‰ na AP 5.1. Ainda, dentro de uma mesma área programática, encontram-se
diferenças entre as regiões geográficas, como é o caso da AP 4.0, com taxa de 13,4‰,
que compreende a região da Barra da Tijuca, com taxa de 8,2‰ e a região de
Jacarepaguá, cuja taxa é de 17,6‰1.
A mortalidade perinatal é monitorada pela Gerência de Informações
Epidemiológicas da Secretaria Municipal de Saúde, com emissão de relatórios
periódicos. As fontes de dados são os grandes sistemas de informação – SINASC e
SIM, além de um instrumento especialmente desenhado para investigar os óbitos
perinatais 2. Este instrumento complementa a informação quantitativa e qualitativa
gerada pelas declarações de óbito, mas está implantado apenas nas unidades municipais
e ainda enfrenta problemas quanto ao preenchimento adequado.
Vários trabalhos têm sido produzidos, sobre mortalidade perinatal no Rio de
Janeiro
, usando como fonte estas bases de dados, explorando principalmente a
3,4,5
mortalidade neonatal. Os resultados têm mostrado associação com baixa escolaridade,
pré-natal deficiente e idade materna inferior a 20 anos. No entanto, algumas limitações
na utilização destas fontes têm sido descritas, como a qualidade do preenchimento dos
instrumentos que alimentam os sistemas de informação6,7.
4
Portanto, embora o Rio conte com sistemas de monitoramento da mortalidade
perinatal atuando nos serviços locais e no nível gerencial e exista uma inter-relação
entre os serviços e a produção acadêmica, alguns entraves operacionais e metodológicos
ainda dificultam a melhor apreensão deste relevante problema de saúde pública. Por
outro lado, não há registro de estudos regionalizados, ainda que as dimensões
geográficas e populacionais da cidade e a divisão dos serviços assistenciais por áreas
programáticas justifiquem esta abordagem.
Na supracitada área programática 4, outras condições propiciam estudos
epidemiológicos da mortalidade perinatal. Existe apenas uma maternidade pública, com
características de atendimento regionalizado – 94% das pacientes são moradoras da
área, principalmente da região de Jacarepaguá – e alta cobertura do Sistema Único de
Saúde, já que responde por 50 a 60% dos partos das usuárias do SUS nesta área. A
maioria das pacientes atendida na maternidade realiza o pré-natal em unidades também
localizadas na AP4 e vinculadas ao SUS, todas da rede municipal. Os óbitos fetais
ocorridos na área têm se concentrado nesta unidade, atingindo nos últimos anos uma
cobertura de 75% enquanto para os neonatais precoces, este percentual é menor (tabela
1). Portanto, os indicadores de saúde perinatal da população atendida nesta maternidade
podem ser extrapolados, com algumas limitações, para o conjunto de usuárias do SUS
da AP4.
Além destas características, a população atendida na maternidade representa
uma parcela socioeconomicamente desfavorecida da região. Analisando os dados
provenientes do SINASC em período recente – 2000 a 2003 – observa-se que 24,4% são
adolescentes e 63% sequer completaram o ensino fundamental. Estes números são
semelhantes aos encontrados nas maternidades públicas, alocadas no estrato1, em um
5
inquérito sobre saúde perinatal no Rio de Janeiro 8.
Em relação ao pré-natal, os
indicadores são piores que os relatados no mesmo estudo (tabela 2).
Desta forma justifica-se o estudo da mortalidade perinatal da população atendida
nesta maternidade, visando uma melhor compreensão das características e
determinantes deste fenômeno em uma população socioeconomicamente desfavorecida,
com possibilidades de generalização para populações semelhantes.
Assim, os objetivos desta tese foram:
1. Revisar aspectos metodológicos do estudo da mortalidade perinatal.
2. Descrever o estado da arte sobre pesquisa da mortalidade perinatal no Brasil.
3. Descrever os padrões da mortalidade perinatal (peso, idade gestacional, causa
básica, classificação de evitabilidade) no período de 1999 a 2003, em uma
população específica de usuárias do SUS, no Município do Rio de Janeiro.
4. Identificar os fatores de risco para perimortalidade, natimortalidade e
neomortalidade precoce nesta mesma população.
Referências Bibliográficas
1. Gerência de Informações Epidemiológicas/ Coordenação de Programas de
Epidemiologia/ Secretaria Municipal de Saúde. http://www.saude.rio.rj.gov.br
2. Gomes MASM, Campos TP, Giannini NM, Silva RI. Investigação dos óbitos
fetais e neonatais nas maternidades municipais – Rio de Janeiro 1998. In: Anais
do Congresso de Epidemiologia. Rio de Janeiro, 1998.
6
3. Noronha CP, da Silva RI, Theme Filha MM, Monteiro EA. Mortalidade neonatal
na cidade do Rio de Janeiro. Análise de coorte a partir do SINASC. In: Anais do
Congresso de Epidemiologia. Rio de Janeiro, 1998.
4. Theme Filha MM, Silva RI, Noronha CP. Situação da mortalidade perinatal no
Município do Rio de Janeiro. In: Anais do Congresso de Epidemiologia. Rio de
Janeiro, 1998.
5. Andrade CLT, Szwarcwald CL. Análise espacial da mortalidade neonatal
precoce no Município do Rio de Janeiro, 1995-1996. Cad Saúde Pública 2001;
17:1199-210.
6. Noronha CP, Silva RI, Theme MM, Monteiro EA. Concordância dos dados entre
os sistemas de informação sobre nascidos vivos e de mortalidade para os óbitos
neonatais da cidade do Rio de Janeiro. In: Anais do Congresso de
Epidemiologia. Rio de Janeiro, 1998.
7. Theme Filha MM, Granado S, Leal MC. Confiabilidade do Sistema de
Informações sobre Nascidos Vivos Hospitalares no Município do Rio de Janeiro,
199-2001. Cad Saúde Pública 2004, 20 Suppl. 1: S83-91.
8. Leal MC, Gama SGN, Campos MR, Cavalini LT, Garbayo LS, Brasil CLP, et
al. Fatores associados à morbi-mortalidade perinatal em uma amostra de
maternidades públicas e privadas do Município do Rio de Janeiro, 1999-2001.
Cad Saúde Pública 2004; 20 Suppl. 1:S20-33.
7
Tabela 1 – Óbitos fetais e neonatais precoces em residentes da AP 4.0 e percentual
ocorrido na MLD, 1999 a 2003.
Fetais
MLD
Neonatais
MLD
1999
2000
2001
2002
2003
Total
(total)
137
113
111
84
72
517
76 (55%)
77 (68%)
81 (73%)
81 (96%)
62 (86%)
377 (75%)
precoce (total)
83
88
77
75
87
410
29 (35%)
26 (30%)
22 (28%)
27 (36%)
31 (36%)
135 (32%)
Tabela 2 – Número de consultas de pré-natal das usuárias da MLD e das
maternidades públicas do Rio de Janeiro
Número de
Maternidades públicas Maternidade
consultas
0-3
4-6
7 e mais
do MRJ (2001)
Leila Diniz
18,8%
40%
41,2%
(2000 a 2003)
25%
41%
34%
8
2. Artigo 1 – Pesquisa sobre mortalidade perinatal no Brasil: revisão da
metodologia e dos resultados *
Resumo: A mortalidade perinatal persiste como relevante evento em saúde pública,
demandando estudos epidemiológicos, tanto para definir sua magnitude e variações
temporais, como para identificar seus determinantes e apontar as intervenções
adequadas. Existem ainda questões conceituais e metodológicas controversas, gerando
heterogeneidade nos estudos e prováveis vieses. No Brasil, nos últimos anos, desponta
uma produção crescente sobre o tema, principalmente no sudeste e sul do país. Foram
revistos 24 artigos de 1996 a 2003, focalizando: definições e classificações utilizadas,
fontes de dados, desenhos de estudo, formas de aferição das variáveis, modelos de
análise estatística e principais resultados. A revisão mostrou a progressiva utilização de
bancos de dados informatizados, principalmente o SINASC e o SIM, o pequeno número
de estudos sobre natimortalidade, a incorporação ainda incipiente das classificações de
causas e a discordância em relação a alguns fatores de risco. Palavras-chave:
mortalidade perinatal; revisão; metodologia
Abstract: Perinatal mortality rate remains a public health problem, demanding
epidemiological studies to describe its magnitude and time trends, identify risk factors,
and point out adequate interventions. There are still methodological controversies,
resulting in heterogeneous studies and possibly biases. In Brazil, there has been a
growing scientific production on this theme, mainly in southern and south-eastern
regions. Twenty-four articles from 1996 to 2003 were reviewed, focusing: definitions
and classifications, data sources, study designs, variables measurement, statistical
analysis and results. The review showed a growing utilisation of data bases, mainly
SINASC and SIM, few studies on stillbirth, the incorporation of classification schemes
and disagreement concerning risk factors. Key words: Perinatal mortality; review;
methodology
* Artigo publicado: Fonseca SC, Coutinho ESF. Pesquisa sobre mortalidade perinatal no Brasil:
revisão da metodologia e dos resultados. Cadernos de Saúde Pública 2004; 20 Supl. 1: S7-S19.
9
2.1. Introdução
A mortalidade perinatal, que engloba óbitos fetais e óbitos neonatais precoces, é
um indicador de saúde materno-infantil, refletindo tanto as condições de saúde
reprodutiva, por sua vez ligadas a fatores socioeconômicos, quanto a qualidade da
assistência perinatal – pré-natal, parto, e neonatal 1.
Anualmente ocorrem cerca de 7,6 milhões de mortes perinatais, das quais 98%
nos países em desenvolvimento 2. Nestes, cerca de 57% são representadas pelos óbitos
fetais, cuja queda tem sido muito lenta. Comparada à natimortalidade, a neomortalidade
tem apresentado maior redução, porém esta não é tão intensa quanto a que se apresenta
nos países desenvolvidos, onde diminui-se a mortalidade em todas as faixas
gestacionais e de peso 3,4,5.
Por sua relevância em saúde pública, a mortalidade perinatal é objeto de vários
estudos epidemiológicos. Observa-se, no entanto, grande heterogeneidade nos aspectos
conceituais e metodológicos, tais como: definição, classificação, fontes de dados,
delineamentos, determinantes, aferição de variáveis e análise estatística.
A definição atual
2
da mortalidade perinatal tem como numerador dois
componentes – óbitos fetais a partir da 22ª semana (natimortalidade) e os óbitos
neonatais menores que sete dias de vida (neomortalidade precoce), e como denominador
o número total de nascimentos (vivos e mortos). Contudo, outras definições são usadas
e não há homogeneidade para definir nascido vivo e natimorto
6,7,8
. Para a definição de
natimorto, são usados dois critérios: idade gestacional (28 semanas ou 24 semanas) e/ou
peso – a partir de 500 g 8. É importante destacar que a natimortalidade, embora
represente um dos desfechos desfavoráveis em saúde materno-infantil, é menos
estudada que a neomortalidade, talvez pela insuficiência de registros
9,10
. Quanto ao
óbito neonatal, a maioria dos estudos considera apenas aqueles com menos de sete dias,
10
havendo no entanto autores que defendem a inclusão de todos os óbitos neonatais
(menores de 28 dias) no cálculo da mortalidade perinatal 6. Recentemente, Kramer et al.
11
advogaram a extinção do termo mortalidade perinatal, já que, pelo menos nos países
desenvolvidos, os determinantes da natimortalidade vêm se distinguindo cada vez mais
dos da neomortalidade.
As classificações de causas de mortalidade permitem sistematizar e compreender
melhor a complexa determinação da mortalidade perinatal
12,13
. Uma das mais
conhecidas e utilizadas é a de Wigglesworth 14, que serviu de base para outros modelos,
como a de Keeling et al. 12. Esta classificação relaciona cinco categorias fisiopatológicas
(anteparto, malformações, prematuridade, asfixia, infecções específicas e outras) à
possível falha na assistência perinatal. No Brasil, a Fundação SEADE
15
desenvolveu
uma classificação que agrupa as causas básicas, segundo a redutibilidade e a
intervenção perinatal associada. Na Europa, os países nórdicos têm produzido modelos
mais complexos de classificação, incorporando a avaliação do crescimento intrauterino8,13. Lansky et al. 16 revisaram as diferentes classificações e seu uso nos estudos de
mortalidade perinatal, com destaque para a avaliação de evitabilidade dos óbitos.
Quanto às fontes de dados, o mais comum é a utilização de dados secundários,
provenientes dos sistemas de informações sobre nascimentos e óbitos ou de registros
hospitalares. A vinculação dos sistemas, através de técnicas de linkage, permite o
monitoramento temporal de vários desfechos perinatais e o estudo de diversos fatores de
risco 17. Outra vantagem é a base populacional, em substituição aos dados hospitalares,
por vezes enviesados. No Brasil, o SINASC (Sistema de Informações sobre Nascidos
Vivos) foi implantado em 1990, e só mais recentemente começou a ser utilizado para
pesquisa, em conjunto com o SIM (Sistema de Informações de Mortalidade). Alguns
problemas destas fontes de dados – subnotificação, falta de preenchimento de variáveis
11
e/ou a discordância na informação entre dois sistemas – já foram suficientemente
demonstradas
. Outro problema é a escolha das variáveis que constam dos bancos.
18,19,20,
Por exemplo, em outros países, tabagismo, peso e altura materna – fatores de risco
perinatal – constam da declaração de nascimento, enquanto no Brasil, estes dados não
são coletados. O formato da variável também pode ser limitante; por exemplo, a
informação sobre idade gestacional no SINASC e no SIM é coletada de forma agrupada
(faixas de idade gestacional) ao invés da forma contínua (número de semanas),
impedindo avaliação mais precisa da prematuridade e do crescimento intra-uterino.
Portanto, se por um lado, as bases são uma ferramenta bastante útil para monitorar
tendências e sugerir possíveis fatores, por outro, oferecem limitações para investigar
fatores de risco perinatais.
Em relação aos delineamentos, a maioria dos estudos de risco utiliza o estudo de
coorte; isto se explica pela disponibilidade de bases de dados populacionais,
principalmente em países desenvolvidos, onde diversos fatores de risco são coletados de
rotina. O estudo caso-controle é menos utilizado; no entanto, mostra-se um
delineamento adequado para estudos de causalidade, desde que vários requisitos
metodológicos sejam atendidos, com especial destaque para a seleção dos controles 21,22,.
O estudo da determinação de mortalidade perinatal está imbricado com o estudo
do baixo peso ao nascer
23
e seus componentes – prematuridade e crescimento intra-
uterino retardado (CIUR). Todavia, a mortalidade perinatal resulta de uma complexa
cadeia causal, onde prematuridade e CIUR, com ou sem baixo peso, são os
determinantes proximais, desencadeados por sua vez, por fatores intermediários e
distais. Como determinantes distais mais importantes, listam-se os fatores
socioeconômicos, que através da mediação de fatores intermediários, aumentam o risco
de prematuridade e CIUR 24,25. Como fatores intermediários, listam-se: fatores biológicos
12
maternos, história reprodutiva, hábitos maternos, doenças maternas, assistência pré e
perinatal. Por conta da complexidade e da inter-relação entre os determinantes, e da
limitação de análises baseadas apenas em significância estatística, recomendam-se
modelos de análise hierarquizada 24,26.
Por fim, o processo de aferição das variáveis merece especial consideração. É
comum que os estudos não especifiquem como foi a aferição ou usem diferentes
instrumentos. Para idade gestacional (IG), é usada a data da última menstruação
(DUM), a avaliação do tamanho do feto por exame ultra-sonográfico (USG) ou métodos
de avaliação neonatal
. Como bem estudado por Alexander et al.
27,28,
29
existe
discordância entre estas estimativas de idade gestacional. Quanto à adequação de
peso/IG (proxy do crescimento intra-uterino), também são usadas diferentes curvas, mas
no Brasil, na maioria dos serviços, ainda se usa a de Lubchenco et al. 30, considerada
inadequada, tendendo a subestimar a prevalência de crianças PIG (pequenos para idade
gestacional). Existem várias curvas mais recentes e/ou mais robustas do ponto de vista
metodológico
. Em relação às demais variáveis estudadas na pesquisa sobre
31,32,33,34,35,36
mortalidade perinatal, também se observa heterogeneidade quanto à sua aferição:
diferentes conceitos e instrumentos são utilizados para mensurar nível socioeconômico,
pré-natal, tabagismo, alcoolismo, antropometria materna, morbidade e outros fatores.
Considerando todos estes aspectos metodológicos, este trabalho se propõe a
rever a literatura recente sobre mortalidade perinatal, fetal e neonatal, no Brasil.
2.2. Metodologia
Foi feita uma revisão bibliográfica (MEDLINE e LILACS) com as palavraschave: mortalidade perinatal, fetal, ou neonatal, natimortalidade, neomortalidade, óbito
13
fetal, óbito neonatal. Foram selecionados artigos originais, nos quais a mortalidade
perinatal, fetal ou neonatal eram os desfechos principais, em localidades brasileiras. O
período de publicação selecionado foi 1996 a 2003 para refletir a produção mais recente
sobre o tema (da década de 90 até a atualidade). Foram considerados artigos descritivos
aqueles que apresentaram características e/ou classificações dos óbitos perinatais,
descrevendo taxas ou séries temporais. Foram considerados artigos sobre determinação
aqueles que exploraram a relação entre fatores de risco e os desfechos de mortalidade
perinatal, fetal ou neonatal, estimando medidas de efeito. Vinte e quatro artigos foram
identificados e analisados quanto aos aspectos metodológicos descritos anteriormente.
A Tabela 1 apresenta as taxas de mortalidade encontradas nos diversos trabalhos e a
Tabela 2 as estimativas de efeito dos determinantes de mortalidade perinatal, fetal e
neonatal.
2.3. Resultados
Estudos descritivos (Tabela 3)
a) Região Sul – Em Pelotas, Menezes et al.
37
compararam as taxas de mortalidade
perinatal, fetal e neonatal precoce, referentes às coortes de 1982 e de 1993, abrangendo
toda a população de nascimentos. Houve redução de 31% da mortalidade perinatal no
período. O ponto de corte para os óbitos fetais foi de 28 semanas. A idade gestacional
foi calculada pela DUM e o crescimento intra-uterino, pela curva de Williams et al. 31.
Os óbitos foram descritos por sexo, peso, IG e CIUR, além de variáveis
sociodemográficas. Nas duas coortes predominou a baixa idade gestacional, embora
14
houvesse muitos casos com IG desconhecida. As causas básicas foram determinadas
pelos pesquisadores, após análise de cada caso. Foi adotada a classificação de
Wigglesworth (modificada por Keeling), mostrando que as mortes fetais anteparto e por
imaturidade diminuíram e as malformações praticamente não se alteraram; por outro
lado houve aumento dos óbitos por asfixia. Estes resultados sugerem melhoria das
condições maternas e de assistência pré-natal e neonatal, ao passo que apontam
problemas no cuidado obstétrico.
Miura et al.
38
apresentaram as características da mortalidade perinatal, fetal e
neonatal (óbitos ≥ 500g), obtidas dos registros e prontuários do Hospital de Clínicas de
Porto Alegre, de 1984-1990. Descreveram os coeficientes para o período completo, e
não a evolução temporal. A taxa de mortalidade perinatal foi 28,4‰, a fetal 18,4‰ e a
neonatal 12,7‰. Não houve avaliação por idade gestacional ou crescimento intrauterino, apenas por faixa de peso. As causas básicas foram comparadas em dois
períodos: 1984-1987 e 1988-1990. Foi utilizada a classificação do Quebec 38. Para os
neomortos, as causas mais comuns foram infecção intra-uterina e doença da membrana
hialina, com aumento significativo de óbitos por malformações no segundo período;
para os natimortos foram asfixia, infecções intra-uterinas e toxemia, com poucas
diferenças entre os dois períodos.
Em Caxias do Sul, Rio Grande do Sul, De Lorenzi et al.
39
avaliaram a
natimortalidade – óbitos maiores que 500g e com 22 semanas ou mais – no período de
1996 a 1997, tendo como base declarações de óbito (D.O.), revisão de prontuários e
entrevistas. Foram calculados os percentuais por faixa de peso, IG e causas. Dois terços
dos casos tinham peso menor que 2500g e idade gestacional menor que 37 semanas.
Não é explicitado o critério de definição de IG. Apenas 6% foram classificados como
15
PIG (usando a referência de Lubchenco30). A população se restringiu a pacientes do SUS
e a causa básica mais comum foi hipertensão.
b) Região Sudeste – Leal e Szwarcwald
3,40
descreveram a evolução da mortalidade
neonatal total (menos de 28 dias) no Estado do Rio, de 1979 a 1993, usando dados
populacionais do SIM e do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). A
evolução temporal foi analisada considerando-se a variação anual, calculada por
regressão exponencial. No primeiro artigo, são analisadas três grandes áreas do estado:
capital, cinturão metropolitano e interior. A mortalidade neonatal teve decréscimo lento
em todas as áreas, sendo o pior desempenho no interior. Na análise por faixa etária
(número de dias de vida), observou-se que, quanto mais perto do nascimento, menor a
queda da mortalidade; nas primeiras horas de vida, chegou a ocorrer aumento do
coeficiente. Não houve análise por peso e idade gestacional. No segundo artigo, as
autoras utilizaram a classificação da Fundação SEADE ampliada, para analisar a
evolução de causas de óbito. Foram calculados os coeficientes por causa e a mortalidade
proporcional. Destacou-se a baixa qualidade da informação quanto às causas básicas,
principalmente na primeira semana de vida, dificultando a interpretação dos resultados.
Considerando esta limitação, houve diminuição de óbitos por imaturidade e CIUR no
período estudado, enquanto aumentaram os óbitos por problemas respiratórios, e
aqueles por asfixia se mantiveram inalterados.
Em Ribeirão Preto, São Paulo, Sardas & Manço
41
relataram os óbitos fetais –
considerados a partir de vinte semanas - no período de 1991 a 1992, tendo como fonte
de informação as declarações de óbito registradas na cidade (40% provenientes de
outros municípios). Os óbitos foram descritos segundo faixa de peso, IG e idade
materna, assinalando-se a ausência destes dados em mais de 30% dos atestados. Dos
casos com peso e IG conhecidos, 73% era de fetos abaixo de 2500g e 73% tinham 28 ou
16
mais semanas. As causas mais freqüentes, de acordo com a CID-9 42, foram hipoxia
intra-uterina e complicações de placenta, cordão e membranas.
Aquino & Cecatti
43
realizaram análise descritiva dos óbitos fetais com mais de
vinte semanas, ocorridos antes do trabalho de parto, em unidade hospitalar de São
Paulo, entre 1996 e 1997. O estudo foi prospectivo e os resultados foram apresentados
na forma de média e desvio padrão para variáveis como peso, IG, idade materna e
consultas de pré-natal. Não há descrição da taxa de mortalidade fetal. Do total de óbitos,
25% foram por causas indeterminadas e 20% relacionados à doença hipertensiva.
Mariotoni & Barros Filho
44
descreveram as taxas de mortalidade hospitalar por
peso ao nascer, em uma maternidade responsável por metade dos nascimentos de
Campinas, São Paulo. Foram usados registros hospitalares durante o período de 1975 a
1996. Não houve ponto de corte para definir mortalidade neonatal; em alguns casos, de
número não especificado, o óbito pode ter ocorrido após 28 dias de vida. Não há
descrição de IG. A mortalidade neonatal hospitalar diminuiu entre 1975 e 1996, apesar
da distribuição por faixas de peso ter se mantido constante em todo o período.
Lansky et al.
45
estudaram 826 óbitos perinatais ocorridos no ano de 1999, em
Belo Horizonte, Minas Gerais, e analisaram a possibilidade de prevenção, valendo-se da
classificação de Wigglesworth modificada. Foram estudados os nascidos mortos com
peso acima de 500 g e/ou idade gestacional maior que 22 semanas e óbitos neonatais
precoces com peso ao nascer acima de 500 g. As informações sobre os nascidos vivos
foram obtidas do SINASC/Belo Horizonte, cuja cobertura chega a 100%. Os óbitos
foram avaliados com base nas consultas às declarações e prontuários hospitalares, para
confirmação da causa básica e classificação. Os coeficientes foram apresentados por
faixas de peso e classificação de causa. Predominou o grupo de asfixia intraparto (34%),
seguido dos óbitos anteparto (30%) e por imaturidade (22,6%).
17
c) Região Nordeste – Leite et al.
45
analisaram a mortalidade perinatal e neonatal,
estimando as taxas e a proporção de mortes evitáveis. O critério para definir nascido
vivo e natimorto foi o peso igual ou superior a 500g. Foram acompanhados da coorte de
1995 todos os nascimentos das maternidades públicas e conveniadas (SUS/Fortaleza),
responsáveis por 85% dos partos na cidade. A informação foi retirada de prontuários,
registros hospitalares, declarações de óbitos e do SINASC. Não foram avaliados IG ou
CIUR. Os óbitos foram classificados por peso (apenas 0,08% sem informação) e grupo
de causas (Wigglesworth modificado por Keeling) para avaliar sua evitabilidade. De
acordo com a classificação utilizada, 48,4% foram óbitos fetais anteparto; 34,7% por
imaturidade; 8,9% por asfixia; 5,4% por malformações e o restante por condições
específicas. Foram considerados evitáveis 34% dos óbitos perinatais, apontando para
problemas na qualidade do pré-natal e da assistência neonatal terciária.
Ribeiro & Silva
47
acompanharam a evolução da mortalidade neonatal – menos
de 28 dias – em São Luís, Maranhão, nos anos de 1979 a 1996, usando como fonte de
dados o SIM e o IBGE. Foi calculada a variação anual, por regressão exponencial. A
mortalidade neonatal teve aumento importante no período estudado, principalmente a
neomortalidade precoce, concentrada no primeiro dia de vida. Não houve descrição de
peso ou IG. Em relação às causas, de acordo com a classificação SEADE, ocorreu
aumento das causas reduzíveis por diagnóstico precoce e das parcialmente reduzíveis
pelo controle da gravidez. Este aumento pode ser explicado, em parte, por melhoria no
registro de óbitos, mas certamente houve piora na assistência perinatal.
d) Brasil: Schramm e Szwarcwald
20
utilizaram o Sistema de Informações Hospitalares
(SIH) do SUS para estudar as taxas de mortalidade neonatal – precoce e tardia – e
natimortalidade hospitalares no país no ano de 1995. Pelo tipo de fonte de dados, não
18
foram avaliados peso, IG, CIUR ou causa básica. As grandes variações encontradas
apontaram para subestimativas na região Norte e Nordeste.
Estudos sobre determinação (Tabela 4)
a) Região Sul: Em Pelotas, Menezes et al. 48 acompanharam a coorte de nascimentos de
1993, estudando as causas de mortalidade perinatal, fetal (com 28 semanas ou mais) e
neonatal precoce (menos de 7 dias). A idade gestacional (baseada na DUM), não foi
analisada, pelo grande sub-registro. Não houve distinção por grupo de causa básica. A
análise estatística foi por regressão logística, segundo um modelo hierárquico, no qual
fatores socioeconômicos estavam no nível distal; fatores reprodutivos e biológicos, no
nível intermediário, e o peso ao nascer, no nível proximal. Os determinantes
encontrados para mortalidade perinatal foram: baixa escolaridade, idade materna
elevada e sexo masculino. Para a neomortalidade precoce esses fatores foram idade
materna elevada, pré-natal inadequado (menos de 5 consultas), baixo peso do recémnascido e sexo masculino, enquanto para natimortalidade foram a baixa escolaridade
materna (menor que 4 anos) e a idade da mãe igual ou superior a 35 anos.
Araújo et al.
49
identificaram os determinantes da mortalidade neonatal precoce
(sete dias ou menos) em Caxias do Sul, na coorte de nascimentos hospitalares do ano de
1995. As crianças foram acompanhadas até sete dias de vida, e a mortalidade
concentrou-se no primeiro dia de vida. Variáveis sociodemográficas, reprodutivas e
características do RN foram coletadas pelos pesquisadores. Não há referência ao método
usado para estimar idade gestacional e crescimento intra-uterino. A análise estatística
foi multivariada (regressão logística). Os fatores mais relevantes foram idade materna
19
igual ou superior a 35 anos, história de natimorto anterior, Apgar < 7, prematuridade,
baixo peso e sexo masculino.
Também em Caxias do Sul, Vardanega et al.
50
estudaram os fatores materno-
fetais e assistência pré-natal para a ocorrência de óbito fetal com 22 semanas ou mais
e/ou peso superior ou igual a 500g, em um estudo caso-controle retrospectivo. Os dados
foram retirados dos prontuários de uma unidade hospitalar, incluindo somente os casos
ocorridos antes do trabalho de parto. O pré-natal foi avaliado qualitativamente, usando
critérios de adequação do Ministério da Saúde. Apenas idade materna elevada (acima de
35 anos) foi considerada determinante do óbito fetal após análise multivariada.
b) Região Sudeste: Leal & Szwarcwald
51
exploraram a dimensão espacial de
indicadores socioambientais e de assistência médica para explicar a ocorrência de
mortalidade neonatal no Estado do Rio de Janeiro, comparando a década de 80 e de 90.
As fontes de dados para nascimentos e óbitos foram respectivamente as estatísticas de
registro civil e o SIM. Para os fatores de risco socioambientais – escolaridade, renda,
condições sanitárias – foi construído um indicador composto, chamado nível
socioeconômico (NSE) a partir dos censos demográficos (IBGE). Para assistência
médica, foi usado número de leitos, número de obstetras e proporção de partos cesáreos
(fonte: Assistência Médico Sanitária, IBGE). Neste estudo ecológico, foram utilizadas
medidas de autocorrelação espacial na análise estatística. A mortalidade neonatal foi
dividida em 3 grupos: primeiro dia de vida, uma seis dias e sete a 27 dias. Não foi usada
classificação por causas nem distinção entre prematuridade e CIUR. Os resultados
mostraram que, na década de 80, havia associação entre indicadores socioeconômicos e
a mortalidade; entretanto, na década de 90, destacou-se a relação entre os indicadores de
assistência e a mortalidade, principalmente no primeiro dia de vida.
20
Almeida & Mello Jorge
52
estudaram o retardo de crescimento intra-uterino –
pequenos para idade gestacional (PIG) – como fator de risco para mortalidade neonatal
(óbitos com menos de 28 dias) no Município de Santo André, São Paulo, usando o
SINASC, o SIM e os registros hospitalares das maternidades. Para classificar os RN
quanto ao CIUR, foi usada a curva de Lubchenco 30. A idade gestacional baseou-se na
DUM, com exclusão dos casos em que era desconhecida. A análise foi apenas bivariada,
e encontrou-se um risco relativo de 8,3 para mortalidade neonatal, comparando PIG e
não-PIG. Separando por idade gestacional, o RR foi de 4,8 entre os prematuros e de
10,6 entre os RN a termo.
Por meio de um estudo caso-controle, Aquino et al.
53
avaliaram os óbitos fetais
com 20 semanas ou mais, ocorridos antes do trabalho de parto, em um hospital da
periferia de São Paulo. Os controles eram os dois partos com nascidos vivos seqüenciais
ao óbito fetal. Um questionário foi utilizado para levantar os fatores de risco, entre
variáveis sociodemográficas, reprodutivas e assistenciais. Após análise multivariada,
somente as ocorrências de natimorto prévio, anemia, diabetes e hospitalização durante a
gravidez foram identificados como determinantes.
O trabalho de Andrade & Szwarcwald
54
é um outro estudo ecológico, que
explorou a relação entre indicadores socioeconômicos (analfabetismo, moradia, renda) e
maternos (idade, pré-natal, tipo de parto, tipo de hospital, coeficiente de natalidade) na
distribuição geográfica da mortalidade neonatal do Município do Rio de Janeiro. Foi
considerada a faixa etária de 0-3 dias, período onde se concentram os óbitos neonatais.
As fontes de dados foram três sistemas: SINASC, SIM e o Censo Demográfico do
IBGE. A análise estatística utilizou técnicas para dados de áreas e mediu a
autocorrelação espacial. Os óbitos foram analisados globalmente, sem distinção por
causa, ou IG e CIUR. As variáveis que melhor explicaram a concentração espacial de
21
óbitos foram: proporção de mães adolescentes, proporção de residentes em favelas,
proporção de chefes com renda igual ou inferior a 1 salário.
Almeida et al.
55
utilizaram os dados do SINASC e do SIM na cidade de São
Paulo para avaliar a influência do peso, de fatores sociodemográficos e assistenciais na
mortalidade neonatal. Em um estudo caso-controle, analisaram os óbitos neonatais
(menos de 28 dias) em conjunto e separados por faixa de peso (abaixo de 1500g, 1500 a
2499 e igual ou superior a 2500g), com exclusão das malformações congênitas e dos
gemelares. A ausência de informação para algumas variáveis foi bem elevada: 30% para
escolaridade, paridade e natimorto prévio. No caso do pré-natal, esse percentual chegou
a 60%. Mesmo assim os autores incluíram na análise todos os casos e controles,
construindo uma categoria “sem informação”. O modelo hierarquizado final para o
conjunto apontou como determinantes: idade materna inferior a 20 anos, parto em
unidade do SUS, baixo peso e prematuridade.
Andrade et al. 56 elegeram renda do chefe da família e escolaridade materna para
estudar a relação entre desigualdades socioeconômicas e o óbito perinatal na cidade do
Rio de Janeiro. A fonte de dados foi o inquérito
57
realizado no Rio de Janeiro entre
1999 e 2001, que descreveu os parâmetros populacionais das puérperas de 47
maternidades, onde a mortalidade perinatal global foi 16‰. O estudo de Andrade não
descreve as características dos óbitos, tais como peso, idade gestacional e causas.
Utilizando as medidas de razão de taxas, risco atribuível, índice de dissimilaridade,
coeficiente angular de desigualdade e índice de concentração (curva de Lorenz), os
autores encontraram gradientes importantes de desigualdade socioeconômica: quanto
mais baixa a renda e/ou a escolaridade, maior a freqüência de óbitos perinatais.
22
c) Região Centro-Oeste: Morais Neto & Barros
58
estudaram a mortalidade neonatal
(menos de 28 dias) e pós-neonatal em Goiânia, acompanhando a coorte de nascimentos
de 1992, usando dados do SINASC e do SIM. Através do procedimento de linkage dos
bancos, foi explorada a relação entre grau de instrução materno, tipo de hospital, idade
materna, peso ao nascer, categorias de IG, sexo, tipo de gravidez e de parto com a
mortalidade. Não há referência ao método de estimação da IG constante das DNs em
Goiânia. A análise foi por regressão logística, a partir de modelo hierárquico. Não foi
utilizada classificação de causas de óbito. Baixo peso, prematuridade e nascimento em
hospital público mostraram associação com mortalidade neonatal.
Em 2001, Morais Neto et al. 59 realizaram linkage dos bancos do SINASC e SIM
para o período de 1992 a 1996, envolvendo 10000 nascidos vivos em Goiânia, e
definiram a distribuição espacial para mortalidade neonatal e pós-neonatal. Para
mortalidade neonatal, a área caracterizada como antiga periferia da cidade mostrou o
maior risco, explicado possivelmente pelas deficiências na qualidade da atenção prénatal, ao parto e neonatal. Foi utilizada a estratégia de análise de dados de área,
adicionadas de taxas Bayesianas, para minimizar a instabilidade das probabilidades de
morte. Não houve avaliação da mortalidade neonatal precoce em separado, nem análise
por peso e idade gestacional.
d) Região Nordeste: Rouquayrol et al.
60
investigaram os fatores de risco
(sociodemográficos, reprodutivos, comportamentais e assistenciais) de natimortalidade
em Fortaleza. Foram considerados os óbitos fetais com mais de vinte semanas de
gestação, em uma unidade hospitalar de referência. Nesta unidade, a taxa de
natimortalidade foi de 42‰. O desenho usado foi caso-controle: durante um ano (entre
1992 e 1993), foram captados 125 casos (natimortos) e 250 controles (nascidos vivos).
23
Por razões logísticas, os casos não representaram o censo de natimortos do período. Os
natimortos foram estudados de forma global, sem classificação pela causa básica ou
distinção entre prematuridade e CIUR. Para análise estatística, foi utilizada regressão
logística, a partir de um modelo hierárquico. Os determinantes foram: pré-natal
inadequado (menos de quatro consultas), analfabetismo materno, renda que um saláriomínimo e morbidade materna. Adolescência, comparada à idade igual ou superior a
vinte anos, teve efeito protetor.
2.4. Discussão
A mortalidade perinatal, apesar de decréscimo na última década, mostra-se ainda
elevada no Brasil, com diferenças importantes no nível nacional e regional. A
natimortalidade variou de 9‰ em Belo Horizonte a 17,9‰ em Fortaleza, enquanto a
neomortalidade precoce variou de 7,4‰ em Caxias do Sul a 15,3‰ em Fortaleza
(Tabela 1). Observa-se a discordância entre a informação proveniente do SIH/SUS e dos
estudos baseados no SINASC/SIM e em dados primários, explicados por falhas na
cobertura dos dois sistemas 20. Além destas diferenças, os estudos de série temporal
mostram mudanças profundas em pouco tempo, apontando a necessidade de constante
monitoramento.
Os principais estudos sobre o tema foram desenvolvidos nas regiões Sul e
Sudeste e publicados em periódicos da área de Saúde Pública. Observou-se
heterogeneidade quanto às definições adotadas, principalmente dos óbitos fetais,
prejudicando a comparabilidade entre os estudos. Poucos trabalhos usaram
classificações de óbito perinatal, sendo a de Wigglesworth 14, adaptada por Keeling
12
a
24
mais citada. Predominou o uso de dados secundários; os grandes sistemas de
informações têm sido cada vez mais utilizados, principalmente o SINASC e o SIM.
Nem sempre os autores relataram a freqüência de dados ignorados nestes sistemas; em
alguns casos, a ausência de informação sobre variáveis importantes como peso e idade
gestacional foi superior a 30%. A estratégia para lidar com estas perdas foi variada:
alguns autores optaram pela exclusão dos casos sem informação enquanto outros pela
imputação de valores compatíveis. Quanto à aferição das variáveis, a idade gestacional
em geral é mensurada com base na DUM, mas alguns trabalhos não forneceram esta
informação. Em muitos serviços de saúde a declaração de nascido vivo, que alimenta o
banco do SINASC, é preenchida por pediatras, que utilizam a avaliação de Capurro ou
New Ballard para estimar IG. Estudo recente no Rio de Janeiro
61
mostrou que o New
Ballard tendeu a superestimar a IG, gerando falsos negativos na classificação de
prematuridade. Por outro lado, alguns estudos excluíram os casos com IG desconhecida,
o que pode também enviesar os resultados. Nos poucos trabalhos que avaliaram os
óbitos quanto ao crescimento intra-uterino, ainda se observou o uso da curva de
Lubchenco, sendo que apenas Menezes et al.
37
usaram a de Williams. Destaca-se
também a mensuração do pré-natal, que foi apenas quantitativa na maioria dos estudos,
com diferentes pontos de corte para número de consultas.
Existem mais estudos sobre a determinação da neomortalidade do que sobre
natimortalidade e mortalidade perinatal. Os determinantes de mortalidade são estudados
para os óbitos de forma global e não por causas específicas. Uma explicação possível é
que, apesar das taxas elevadas, o número absoluto de óbitos é baixo, e a análise por
subgrupos acarretaria perda de significância estatística, principalmente em estudos
locais e períodos curtos. Entre os estudos de determinação, um foi transversal, quatro
com o delineamento de coorte, quatro estudos caso-controle e três ecológicos,
25
incorporando as técnicas de geoprocessamento. Notou-se a utilização crescente de
análise estatística através de modelo hierárquico, tornando os resultados dos estudos
mais consistentes.
Na maioria dos estudos, alguns fatores maternos mostraram-se associados à
mortalidade fetal e neonatal, como idade elevada, presença de morbidade materna e
história reprodutiva desfavorável, principalmente a ocorrência de natimorto prévio.
Fatores proximais como sexo do RN, peso ao nascer, idade gestacional e baixo Apgar
foram corroborados para mortalidade neonatal. Pré-natal inadequado, baixa renda e
baixa escolaridade mostraram-se como fatores de risco tanto para mortalidade fetal
como neonatal, embora alguns estudos apontassem valores não-significativos. Outros
determinantes tiveram resultados conflitantes ou não significativos, como adolescência,
peso materno, tabagismo e alcoolismo. Isto pode ser explicado por diferenças regionais,
mas principalmente por questões metodológicas, como instrumentos de coleta
utilizados, os diferentes pontos de corte, a forma de registro destas variáveis nos bancos
de dados e a impossibilidade de ajuste para fatores não incluídos nos sistemas de
informação. Também pode ter contribuído o pequeno tamanho amostral de alguns
estudos.
Conclui-se que a pesquisa sobre mortalidade perinatal pode ainda ser expandida
e aprimorada no Brasil. O uso dos grandes sistemas de informação deve ser estimulado,
permitindo o acompanhamento de grandes coortes de nascimentos; esforços devem
feitos no sentido de melhorar a qualidade da informação e ampliar as possibilidades de
investigação, acrescentando novas variáveis. Esquemas de classificação de causa, como
o de Wigglesworth, poderiam ser incorporados tanto nos serviços de saúde, quanto na
pesquisa. Quanto aos estudos de determinação, o número ainda pequeno e a
heterogeneidade metodológica dificultam a sumarização dos resultados. Devem ser
26
incentivados estudos primários, principalmente em nível regional, em virtude da grande
diversidade nos eventos perinatais observada no Brasil. Se possível, deve-se realizar a
investigação por subgrupos de causa específica, considerando-se principalmente a
prematuridade e crescimento intra-uterino, com adoção de curvas mais adequadas, como
a de Williams
31
ou do Centro Latino-americano de Perinatologia 32. Delineamentos
como caso-controle e estudos ecológicos se mostram como ferramentas epidemiológicas
interessantes para o estudo de fatores de risco. Finalizando, a aferição criteriosa das
variáveis e a construção de modelos de determinação hierárquicos devem se enfatizadas,
garantindo a validade interna dos estudos e possibilitando análises mais refinadas.
2.5. Referências Bibliográficas
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34
Tabela 1 – Taxas de Mortalidade perinatal, fetal e neonatal no Brasil na década
de 90 (por mil nascimentos)
Perinatal
Brasil*
14
Neonatal
precoce
8
Norte*
11
7
8
Nordeste*
São Luís
Fortaleza
14
7
9
28,2
17,9
15,1
Centro-Oeste*
Goiânia
13
8
10
11
Sudeste*
Estado RJ
Rio de Janeiro
Belo Horizonte
São Paulo
Campinas
Ribeirão Preto
16
11
13
17,4
9,0
11,2
Sul*
Pelotas
Caxias do Sul
32,8
16,0
20,2
Fetal
Neonatal total
11
11,9
11
8,9**
22,1**
12
10,5**
13,7
8
11,7
7,4
11
14,3
12,7
* Dados do artigo de Schramm e Szwarcwald (2000). Os demais resultados foram retirados dos artigos
correspondentes às localidades, sendo considerados apenas aqueles com dados populacionais.
** Considerando apenas fetos > 28 semanas
35
Tabela 2 – Estimativas de efeito dos principais determinantes de mortalidade
Determinante
Hospital público/SUS
Óbito perinatal
Óbito fetal
Óbito neo precoce
⇑2
Assistência inadequada
≥ 35 anos
2,4 4
Peso < 50 kg
1,4 4 (NS)
0,36 1
2,0 5(NS)
2,11 (NS)
2,5 4
2,9 11
1,1 4 (NS)
Baixa renda
1,3 4 (NS)
7,6 12
1,3 5 (NS)
2,1 1
Adolescência
Residência precária
4,1 8 (NS)
⇑9
2,75 4
4,52 8
1,3 8 (NS)
1,6 4 (NS)
⇑9
2,4 4 (NS)
⇑9
3,3 1
4,6 8 (NS)
3,0 4
Tabagismo
2,9 4
3,112
0,8 4 (NS)
1,4 1 (NS)
2,3 8 (NS)
1,6 4 (NS)
0,6 4 (NS)
Consumo álcool
0,9 4 (NS)
1,3 1 (NS)
0,9 4 (NS)
Pré-natal inadequado
NS 9
Paridade ≥ 4
0,9 4 (NS)
1,75 1
2,9 5
3,3 1
7,4 5 (NS)
0,9 4 (NS)
Natimorto prévio
2,5 4 (NS)
Baixo peso prévio
1,98 4
Sexo masculino
1,54 4
Analfabetismo
Baixa escolaridade
Morbidade materna
Óbito neonatal
2,3 6
1,5 10
⇑7
1,5 10
NS 10
NS 10
NS 10
NS 10
4,0 4
5,2 5
2,9 4
3,1 4
1,8 8 (NS)
2,3 8 (NS)
1,3 5 (NS)
18,2 8
2,6 4 (NS)
1,6 4 (NS)
1,2 4 (NS)
1,061 (NS)
1,85 4
4,2 8
NS 10
Muito baixo peso
36,4 4
5,9 8
58,8 8
8,92 6
6,96 10
125,410
IG < 37 s
5,6 8
PIG
1,5 8 (NS)
8,94 6
3,7510
8,3 3
Apgar < 7
10,1 8
Baixo peso ao nascer
NS – estatisticamente não significativo. Os valores numéricos expressam odds ratio ou razão de taxas;
⇑ expressa aumento do risco em estudos ecológicos. 1. Rouquayrol et al.; 2. Leal & Szwarcwald.;
3.Almeida & Mello Jorge; 4. Menezes et al.; 5. Aquino et al.; 6. Morais Neto & Barros; 7. Morais Neto et
al.; 8. Araújo et al.; 9. Andrade & Szwarcwald; 10. Almeida et al.; 11. Vardanega et al.; 12. Andrade et al.
36
Tabela 3 - Artigos descritivos – autor e periódico, características metodológicas
Autor/Local do
Periódico/ano
Desfecho
Definição adotada
Classificação
estudo
publicação
estudado
de causas
Menezes et al,
Cad Saúde Pública Mortalidade
Wigglesworth
Óbitos fetais ≥ 28
Pelotas (RS)
1996
perinatal, fetal e sem e neonatais < 7 d (adaptada p/
neonatal precoce Peso ≥ 500g
Keeling)
Metodologia
Base populacional
Coorte 1982 (n=194) v.
1993 (n=117)
Comparação temporal de
coeficientes (por sexo,
peso, CIUR e grupo de
causas)
Tipo de dados/
período
Primários
1982 e 1993
Leal &
Szwarcwald,
Estado do Rio
Rev Saúde Pública,
1996a
Mortalidade
neonatal
Óbitos < 28 dias
Nenhuma
Base populacional
Série temporal
Variação anual (taxa)
Leal &
Szwarcwald,
Estado do Rio
Cad Saúde Pública,
1996b
Mortalidade
neonatal
Óbitos < 28 dias
Fundação
SEADE
Base populacional
Secundários
Variação dos coeficientes SIM/IBGE
por causas e da mortalidade 1979 a 1993
proporcional
Leite et al.
Fortaleza (CE)
J Pediatria
1997
Mortalidade
perinatal, fetal e
neonatal precoce
Óbitos fetais e
Wigglesworth Base populacional(n=1337)
Coorte
neonatais precoces c/ (Keeling)
Coeficientes por peso e
peso ≥ 500g
grupo de causas
Secundários
SINASC
Mortalidade
perinatal, fetal e
neonatal
Óbitos fetais e
neonatais
Peso ≥ 500 g
Secundários
Prontuários
1984-90
Miura et al.
Porto Alegre (RS)
Rev Assoc. Méd.
Brasileira, 1997
Quebec
Base hospitalar (n=632)
Comparação de causas
básicas
Taxas por faixa de peso
Secundários
SIM/IBGE
1979 a 1993
Prontuários
D.O.
1995
37
Sardas & Manço
Ribeirão Preto
(SP)
Medicina (R. Preto) Mortalidade fetal Óbitos fetais
1997
> 20 sem
CID-9
Base populacional (n=299) Secundários
Descrição por peso, IG e
D. O.
causas básicas
1991-1992
Aquino & Cecatti
São Paulo (SP)
Rev Bras Ginecol e
Obstet
1998
Mortalidade fetal Óbitos fetais
(anteparto)
> 20 sem
Nenhuma
Base hospitalar (n=122)
Descrição por causas
De Lorenzi et al.
Rev Científica da
Caxias do Sul (RS) AMECS, 1999
Mortalidade fetal Óbitos fetais ≥ 22
semanas
Peso > 500 g
Nenhuma
Base populacional (n = 78) Secundários
Descrição dos percentuais D.O./Prontuário
por causa, peso e IG
1996 e 1997
Ribeiro & Silva
São Luís (MA)
Cad. Saúde Pública
2000
Mortalidade
neonatal
Fundação
SEADE
Base populacional(n=5435) Secundários
Série temporal
SIM/ IBGE
Variação do coeficiente
1979-96
Schramm &
Swarcwald
Brasil
Cad Saúde Pública
2000
Mortalidade fetal, Óbitos fetais de
neonatal precoce qualquer IG/peso
e tardia
Neo < 7 e 7-27 dias
Nenhuma
Base populacional
Comparação de taxas
Secundários
SIH/SUS
1995
Mariotoni &
Barros Fº
Campinas (SP)
Rev Saúde Pública
2000
Mortalidade
neonatal
hospitalar
Nenhuma
Óbitos hospitalares
mesmo que > 28 dias
Base hospitalar (n=1134)
Coeficientes por faixa de
peso
Secundários
Registros
hospitalares
1975-96
Lansky et al.
Belo Horizonte
(MG)
Cad Saúde Pública
2002
Mortalidade
perinatal, fetal e
neonatal precoce
Óbitos fetais > 22
sem e/ou > 500g
Óbitos neonatais < 7
dias e > 500g
Óbitos < 28 dias
Wigglesworth Base populacional (n= 826)
(Keeling)
Coorte
Coeficientes por peso e
grupo de causas
n = Nº total de óbitos analisados a partir da base de estudo. Em alguns trabalhos, este valor não foi especificado
Primários
1996 -1997
Secundários
SINASC/D.O.
Prontuários
1999
38
Tabela 4 - Artigos sobre determinação – autor, periódico, ano, características metodológicas
Autor/Local
Periódico
Desfecho
Definição
Base populacional (nºcasos)
ano publicação
Desenho
Rouquayrol et J Pediatria
Mortalidade
Óbitos fetais
Base hospitalar (n=125)
al.
1996
fetal
> 20 semanas
Caso-controle
Fortaleza (CE)
Tipo de dados/
período
Primários
1992-93
Análise
Leal &
Rev Saúde
Swarcwald
Pública
Estado do Rio 1997
de Janeiro
Mortalidade
neonatal
Óbitos < 28 dias Base populacional
Ecológico
(geoprocessamento)
Secundários
SIM/IBGE
1979-81
e 1990-92
Autocorrelação
espacial
Almeida e
Mello Jorge
Santo André
(SP)
Rev Saúde
Pública
1998
Mortalidade
neonatal
Óbitos < 28 dias Base populacional (n=55)
Coorte
Secundários
SINASC/SIM
Prontuários
1992
Bivariada
Menezes et al. Rev Saúde
Pelotas (RS)
Pública
1998
Mortalidade
perinatal
Base populacional (n=117)
Óbitos fetais ≥
Coorte
28 sem
Óbitos neonatais
< 7 dias
Primários
1993
Multivariada
(hierarquizada)
Aquino et al.
São Paulo
(SP)
São Paulo Med J
1998
Mortalidade
fetal
Óbitos fetais
≥ 20 sem
(anteparto)
Primários
1996-1997
Multivariada
Morais Neto
& Barros
Goiânia (GO)
Cad Saúde
Pública
2000
Mortalidade
neonatal
Óbitos < 28 dias Base populacional (n=231)
Coorte
Secundários
SINASC/SIM
1992
Multivariada
(hierarquizada)
Base hospitalar (n=122)
Caso-controle
Multivariada
(hierarquizada)
39
Morais Neto et Cad Saúde
al.
Pública
Goiânia (GO) 2001
Mortalidade
neonatal
Óbitos < 28 dias Base populacional
Ecológico
(geoprocessamento)
Secundários
SINASC/SIM
1992 - 96
Autocorrelação
espacial
Araújo et al.
Caxias do Sul
(RS)
J Pediatria
2000
Mortalidade
neonatal
precoce
Óbitos neonatais Base populacional (n=42)
Coorte
≤ 7 dias
Primários e
secundários
Prontuários
1995
Multivariada
Andrade &
Cad Saúde
Swarcwald
Pública
Rio de Janeiro 2001
(RJ)
Mortalidade
neonatal do
1º ao 3º dia
Óbitos neonatais Base populacional
Ecológico
≤ 3 dias
(geoprocessamento)
Secundários
SINASC/SIM
Censo IBGE
1995-96
Autocorrelação
espacial
Almeida et al. Rev Bras
São Paulo
Epidemiol
(SP)
2002
Mortalidade
neonatal
Óbitos neonatais Base populacional (n=893)
Caso-controle
Secundários
SINASC/SIM
1995
Multivariada
(hierarquizada)
Óbitos fetais
≥ 22 sem e/ou ≥
500g
(anteparto)
Base hospitalar (n=60)
Caso-controle
(retrospectivo)
Secundários
Prontuários
1998 - 2001
Multivariada
Òbito entre 22ª
sem gest e o 7º
dia de vida
Base populacional
Transversal
Primários
Secundários
Prontuários
1999-2001
Bivariada
Vardanega et
al.
Caxias do Sul
(RS)
Rev Bras Ginecol Mortalidade
Obstet
fetal
2002
Andrade et al. Cad Saúde
Rio de Janeiro Pública
(RJ)
no prelo
Mortalidade
perinatal
n = Nº total de óbitos analisados a partir da base de estudo. Em alguns trabalhos, este valor não foi especificado
40
3. Artigo 2. Óbitos perinatais em uma localidade do MRJ – 1999 a 2003:
Características biológicas e evitabilidade
Resumo: Foram estudados os óbitos perinatais de uma maternidade pública (MLD),
cujo atendimento é regionalizado e cobre 50% das usuárias do Sistema Único de Saúde
de uma região delimitada do Rio de Janeiro. Descrevem-se as características biológicas
e as taxas de mortalidade fetal, neonatal e perinatal por faixas de peso. A classificação
de Wigglesworth foi usada para avaliar evitabilidade. O período de acompanhamento
foi de 1999 a 2003 e o instrumento utilizado foi a ficha de investigação de óbito
perinatal da Secretaria Municipal de Saúde, complementado por revisão de prontuários
e dos cartões de pré-natal. No período estudado houve cerca de 19000 nascimentos de
residentes da região, com 512 óbitos perinatais (74% natimortos). A maioria dos óbitos
fetais ocorreu antes do parto e os óbitos neonatais precoces nos primeiros três dias de
vida. A mediana de peso foi 1420 g e a de idade gestacional 31 semanas. Vinte e quatro
por cento dos óbitos cursaram com retardo de crescimento intra-uterino. As principais
causas básicas foram afecções maternas (hipertensão e sífilis) e complicações de
membrana, placenta e cordão. Foram considerados evitáveis cerca de 50% dos óbitos.
Palavras-chave: mortalidade perinatal, coeficientes por faixa de peso, evitabilidade.
Abstract: Perinatal deaths were studied at a maternity unit with regional attendance and
high coverage in Rio de Janeiro were studied, focusing on biological characteristics,
birth weight-specific mortality rates and evitability evaluation. Follow-up occurred
between 1999 and 2003, using a standard data collection tool and medical records to
investigate perinatal deaths. During this period there were 19000 births and 512
perinatal deaths (74% stillborns). Stillborns were mainly antepartum and neonatal
deaths concentrate on the first three days of life. The median birthweight was 1420 g
and median gestational age was 31 weeks. Twenty-four percent of perinatal deaths were
small for gestational age. Maternal affections (hypertension and syphilis) and placental
complications were the principal causes of death. Accordingly to Wigglesworth
classification, 50% of deaths were avoidable. Key words: perinatal mortality, birthweight rates, evitability.
41
3.1. Introdução
A mortalidade perinatal, apesar do decréscimo na última década, mostra-se ainda
elevada no Brasil, com diferenças importantes no nível nacional e regional. Uma
revisão dos estudos mais recentes1 mostrou que a natimortalidade variou de 9‰ em
Belo Horizonte a 17,9‰ em Fortaleza, enquanto a neomortalidade precoce variou de
7,4‰ em Caxias do Sul a 15,3‰ em Fortaleza. Além das diferenças na magnitude,
observou-se heterogeneidade em diversos aspectos metodológicos, prejudicando a
comparabilidade entre os estudos. As definições adotadas para óbitos fetais ora se
basearam no peso, ora na idade gestacional, com diferentes pontos de corte. Nos estudos
de base secundária, foi elevada a proporção de dados ignorados, em variáveis
importantes como peso e idade gestacional. Nos poucos trabalhos que avaliaram os
óbitos quanto ao crescimento intra-uterino, ainda se adotou a curva de Lubchenco2,
sendo que apenas Menezes et al.3 usaram a de Williams et al. 4 . Poucos trabalhos
3,5,6,7
usaram classificações de evitabilidade de óbito perinatal, sendo a de Wigglesworth 8,
adaptada por Keeling et al. 9 a mais citada.
O estudo da mortalidade perinatal em nível regional/local vem sendo cada vez
mais enfatizado10, e a aplicação de metodologias para avaliar causas básicas e
evitabilidade é fundamental para se planejar adequadamente as ações de saúde na área
perinatal11.
Na Cidade do Rio de Janeiro (RJ), a mortalidade perinatal (MP) no ano de 2003
foi de 17,4‰ 12, sendo a fetal 9,9‰ e a neonatal precoce 7,6‰. Pelas grandes dimensões
geográficas e diferenças socioeconômicas do município, observam-se variações do
42
cenário perinatal entre as diversas regiões administrativas, com a taxa de MP oscilando
de 9,3 a 23,2‰.
Na área programática 4 (AP4), que compreende as regiões de Jacarepaguá e
Barra da Tijuca, com cerca de 700.000 habitantes, existe uma diferença relevante, sendo
a MP em Jacarepaguá (17,6‰) o dobro da Barra da Tijuca (8,2‰). Na AP4 funciona
uma única maternidade pública, a Maternidade Leila Diniz (MLD), pertencente ao
Hospital Municipal Raphael de Paula Souza (HMRPS/SMS), com caráter estritamente
regional, já que 93% das pacientes atendidas são moradoras da própria AP4. Em termos
de cobertura, a MLD é responsável por cerca de 50 a 60% dos partos de usuárias do
Sistema Único de Saúde (SUS) que residem na área, concentrando-se o atendimento aos
bairros adstritos à maternidade. Por outro lado, 60% dos óbitos perinatais (80% dos
óbitos fetais e 30% dos óbitos neonatais precoces) da área ocorrem nesta unidade e
refletem, de forma aproximada, a situação perinatal desta população. Os óbitos são
monitorados e analisados mensalmente por uma comissão de revisão de óbitos, através
de um instrumento padronizado da Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro
(SMS-RJ).
O objetivo deste estudo foi descrever e analisar os óbitos perinatais atendidos na
Maternidade Leila Diniz, no período de 1999 a 2003. Os aspectos destacados foram:
características maternas; características biológicas dos fetos e recém-nascidos (RN) –
peso, idade gestacional (IG) e crescimento intra-uterino; coeficientes de mortalidade por
faixa de peso; classificação por evitabilidade e causas básicas. Foram analisadas
também algumas características separadamente para óbitos neonatais precoces e óbitos
fetais.
43
3.2. Metodologia
População
Foram incluídos no estudo as pacientes residentes na AP4, atendidas na MLD no
período de 1999 a 2003, que tiveram suas gestações terminadas em óbito perinatal –
óbito neonatal precoce (menos que sete dias de vida) ou óbito fetal com idade
gestacional igual ou superior a 22 semanas. Foi utilizado o peso de 500g como ponto de
corte para os dois eventos.
Coleta dos dados
O instrumento utilizado para coleta de dados – Ficha de Investigação de Óbito
Fetal e Neonatal
, – contém variáveis socioeconômicas e demográficas, histórico
13
obstétrico materno, dados da assistência pré-natal, obstétrica e neonatal e características
biológicas do feto. Os dados foram colhidos, pelos médicos responsáveis pelos Serviços
de Neonatologia e Obstetrícia e pelo Núcleo de Epidemiologia, baseados nos registros
de prontuários, cartões de pré-natal, boletins de atendimento e livros de registro de
partos. O armazenamento dos dados foi feito no programa Epi-Info 6.04 14. A partir de
outubro de 2002, além da coleta padronizada, entrevistas com as pacientes foram
realizadas dentro de um estudo caso-controle para identificar os determinantes de óbito
perinatal. Estas informações foram acrescidas aos dados secundários. Para a realização
deste estudo, todas as fichas e os respectivos prontuários foram revistos para
complementar as informações ausentes, confirmar a causa básica de óbito e aplicar a
classificação de evitabilidade9.
44
Variáveis estudadas:
a) Características biológicas
A informação sobre peso estava presente em todos os casos. O peso foi aferido,
pela enfermagem, nos casos de óbito fetal e pelo pediatra, em todos os RN, na sala de
parto.
A informação sobre idade gestacional contida nas fichas era coletada segundo a
data da última menstruação (DUM) e/ou avaliação ultra-sonográfica (USG), nos óbitos
fetais. Nos óbitos neonatais, segundo a DUM, USG e/ou estimativas neonatais, em geral
o escore de Capurro
15
para os RN a termo e o escore New Ballard
16
para os RN pré-
termo. A informação sobre IG estava ausente ou discrepante em um percentual elevado
de fichas. Os prontuários foram revistos e foi possível recuperar a informação, de
acordo com os seguintes critérios: foi priorizada a informação pela DUM, quando havia
concordância com USG precoce, isto é, realizada até a 24ª semana 17; quando não havia
informação pela DUM ou havia discordância maior que duas semanas, foi priorizada a
USG. Quando as duas estavam ausentes, utilizaram-se, tanto no feto quanto no RN, as
medidas antropométricas: comprimento e perímetro cefálico (PC). O comprimento e/ou
o PC foram estimados como o percentil 50 de acordo com as tabelas propostas na
literatura 18,19,20,21. Para os óbitos neonatais, além da antropometria, foi usada a estimativa
clínica 15,16. Desta forma, foi criada uma variável, a IGEST (idade gestacional estimada),
que descreveu a melhor estimativa de idade gestacional, permitindo também a
estimativa de crescimento intra-uterino.
45
Para avaliar o crescimento intra-uterino, foi seguida a recomendação da OMS 22,
de se utilizar a curva de Williams 4, uma referência construída a partir de nascimentos
vivos e mortos. Foi considerado indicativo de crescimento retardado (CIUR) o peso
abaixo do percentil 10 para a idade gestacional correspondente.
b) Coeficientes de mortalidade
Foram analisados para o período global, em função da pequena variabilidade
anual por faixa de peso. Apenas a mortalidade neonatal precoce é apresentada
anualmente. Para cálculo dos coeficientes, utilizou-se no denominador o total de
nascimentos ocorridos na MLD, cujas mães fossem residentes na AP4 (a partir da
informação do SINASC).
c) Classificação por evitabilidade e causas básicas
Foi utilizada a Classificação de Wigglesworth adaptada 9. Esta classificação
agrupa os óbitos perinatais em cinco categorias mutuamente excludentes, de base
fisiopatológica e associa cada categoria a possíveis falhas na intervenção pré-natal e/ou
perinatal (Quadro 1). Após análise das fichas e prontuários, os óbitos eram alocados nas
categorias de acordo com algoritmo proposto por Keeling9. Para avaliar as causas
básicas, priorizou-se o evento inicial na cadeia causal, buscando morbidades que
tivessem desencadeado o desfecho reprodutivo. As causas foram agrupadas de acordo
com a CID-10 23.
Análise estatística
Os testes estatísticos utilizados foram qui-quadrado para comparar proporções e
teste t para médias.
46
Questões éticas
Este estudo fez parte de um projeto de investigação de óbitos perinatais,
aprovado pelo Comitê de Ética da Escola Nacional de Saúde Pública e pela direção da
unidade.
3.3. Resultados
No período de janeiro de 1999 a dezembro de 2003, ocorreram 19340
nascimentos na MLD, de residentes da AP4. Houve 512 óbitos perinatais com peso >
500g, 377 fetais e 135 neonatais precoces. Estes últimos ocorreram predominantemente
nos primeiros três dias de vida, sendo que metade no 1º dia. As pacientes com óbito
fetal já chegaram à maternidade com o feto morto em 84% dos casos. O restante
ocorreu antes do parto, mas com a paciente já internada (8%) ou durante o trabalho de
parto (8%).
O coeficiente de mortalidade perinatal oscilou em torno de 25‰ no período. A
mortalidade fetal teve pouca variação, ficando próxima de 18‰ em todos os anos. Já a
mortalidade neonatal precoce manteve-se abaixo de 8‰, com o menor valor em 2001
(5‰).
As pacientes que tiveram óbito perinatal eram primíparas em 37% dos casos e
multíparas de quatro ou mais gestações em 11%. A idade média foi 25 anos, com 22%
de adolescentes e 14% com idade igual ou superior a 35 anos. Do total de casos, 3%
eram gestações gemelares. A avaliação do pré-natal foi dificultada porque a informação
sobre início das consultas estava ausente em mais de 30% das fichas e a informação
47
sobre número de consultas já era codificada em categorias agrupadas. O pré-natal foi
ausente em 37% e inadequado em pelo menos outras 15%, considerando o índice de
Kotelchuk adaptado24. Apenas 16% realizaram seis ou mais consultas, conforme
recomendação do Ministério da Saúde.
Características biológicas
A mediana de peso dos 512 óbitos perinatais foi 1420g (média 1700g, DP
1003g), sendo que 77% dos óbitos tiveram peso menor que 2500g e 52% abaixo de
1500g. Houve diferença entre as medianas considerando isoladamente óbitos neonatais
precoces (mediana de 1200g) e fetais (1500g). Houve um percentual maior de extremo
baixo peso (< 1000g) e muito baixo peso (<1500) entre os óbitos neonatais precoces,
comparados aos fetais, sendo a diferença estatisticamente significativa. A distribuição
por faixas de peso é apresentada na tabela 1.
A mediana para os óbitos perinatais foi 31 semanas. No entanto houve diferença
estatisticamente significativa na distribuição por faixa gestacional entre neomortos e
natimortos. Os óbitos neonatais tiveram maior freqüência de idades gestacionais baixas,
de forma consistente com a distribuição de peso descrita na tabela anterior, com
mediana de 30 semanas. Quanto aos óbitos fetais, a mediana foi mais elevada – 32
semanas – também compatível com a distribuição de peso. Não foi possível estimar a
IG em 5% dos casos fetais e, portanto em 4% dos óbitos perinatais (tabela 2).
O crescimento intra-uterino retardado (CIUR) ocorreu de maneira ínfima nas
idades gestacionais baixas (< 28 semanas), aumentando com o avanço da gestação e
concentrando-se entre 32 e 36 semanas (Tabela 3). Embora o CIUR tivesse sido mais
48
freqüente nos natimortos (24%) do que nos neomortos (18%), não se detectou diferença
significativa para esta diferença nem para o padrão por idade gestacional.
Coeficientes de mortalidade peso-específico
A tabela 1 mostra os coeficientes de mortalidade para cada faixa de peso.
Observam-se valores decrescentes à medida que aumenta o peso de nascimento. Para
óbito perinatal, o coeficiente dos menores de 2500g foi 24,5 vezes maior que entre os de
peso maior ou igual a 2500g. Para óbito neonatal precoce, foi 33,5 vezes maior.
Analisando a mortalidade neonatal precoce por faixas de peso, observou-se estabilidade
nos últimos quatro anos do período, em relação aos menores de 1500g. (tabela 4).
Classificação por Evitabilidade e causas básicas
Utilizando a classificação de Wigglesworth/Keeling9, observou-se para todas as
faixas de peso o predomínio de óbitos anteparto (tabela 5). Para os menores de 1500g, a
prematuridade foi a segunda categoria. Nas faixas de 1500 a 2499g, as causas
específicas, que nesta população são representadas majoritariamente pelos casos de
sífilis congênita, ocuparam a segunda posição. Já nos nascimentos com peso igual ou
superior a 2500g, destacou-se também a asfixia intraparto com 18% de casos. As
malformações tiveram freqüência semelhante em todas as faixas, sendo a categoria
menos freqüente no total. Também se analisou a evolução temporal desta classificação.
Em todos os anos do período estudado, houve predomínio de óbitos anteparto. A
contribuição da asfixia intraparto e da prematuridade tenderam à queda, exceto por um
aumento desta última em 2003. O percentual de malformações não se alterou.
49
Comparando estes resultados com o de trabalhos envolvendo partos hospitalares
de outras cidades do Brasil
3,5,7
, observam-se valores menores para asfixia intraparto
(com exceção de Fortaleza) e prematuridade, enquanto os óbitos anteparto e aqueles por
causas específicas foram bem mais elevados (Tabela 6).
Causas básicas
Considerando os óbitos perinatais como um todo, encontramos como causas
básicas
mais
freqüentes:
afecções
maternas
(31%),
principalmente
doenças
hipertensivas e sífilis; complicações da placenta, membranas e cordão (24%), com
destaque para descolamento de placenta e amnionite; malformações congênitas (8%),
hipóxia intra-uterina intraparto (6%); trabalho de parto prematuro (6%); seguidos de
infecções perinatais, CIUR e diabetes. Permaneceram com causa indeterminada 15%
dos óbitos, considerando também os diagnósticos de hipoxia intra-uterina não
especificada. As causas se distribuíram de forma diferenciada, ao analisarmos óbitos
fetais e neonatais precoces, de acordo com a idade gestacional.
Óbitos fetais
No grupo < 37 semanas, as causas mais freqüentes foram afecções maternas
(37%), destacando-se novamente hipertensão e sífilis. Depois vieram as alterações
placentárias, de membrana e cordão (26%), e um elevado percentual de causas não
definidas (21%). As malformações congênitas e o crescimento intra-uterino retardado
responderam por 5% cada um. Infecções perinatais, diabetes, hipoxia intra-uterina intraparto explicaram o restante dos casos.
50
Nos natimortos ocorridos a termo, também predominaram as afecções maternas
(27%) e as alterações de placenta, membrana e cordão (25%). Logo a seguir, vieram as
causas não definidas (17%). A asfixia perinatal respondeu por 12% dos casos, seguida
de diabetes, crescimento intra-uterino retardado e sífilis congênita.
Óbitos neonatais precoces
Entre os prematuros (105 casos), foi possível explicar o mecanismo da
prematuridade em 50% dos recém-nascidos: afecções maternas (hipertensão, infeção
urogenital, amniorrexe) em 14 casos, complicações da placenta, membranas e cordão
em 20 casos, malformações congênitas em 15 casos, infecções (estreptococo B ou
sífilis) em 8 casos. Nos demais, não foi possível identificar o deflagrador do trabalho de
parto prematuro. As causas conseqüenciais mais comuns de óbito foram síndrome de
angústia respiratória (doença de membrana hialina) e sepse neonatal.
Os RN a termo (30 casos) que evoluíram para o óbito tiveram como causa mais
freqüente (33%) asfixia ao nascer, acompanhada ou não de síndrome de aspiração
meconial. A seguir vieram malformações congênitas (23%) e infecções perinatais
(20%). Os demais casos foram de patologias variadas, como policitemia e enterocolite.
3.4. Discussão
Embora os dados deste trabalho se refiram a uma única maternidade, suas
características de abrangência geográfica e cobertura do SUS permitem extrapolar os
resultados para uma população de cerca de 300.000 mulheres em idade fértil dos bairros
adstritos à maternidade.
51
As características biológicas dos fetos e RN evidenciaram as questões do baixo
peso, prematuridade e crescimento intra-uterino retardado, eventos já corroborados
como associados à mortalidade perinatal. Quase 80% dos óbitos perinatais tinham IG
abaixo de 37 semanas, sendo que os óbitos neonatais precoces apresentaram idades
gestacionais mais baixas que os fetais. O retardo do crescimento intra-uterino (CIUR) só
se tornou relevante após 28 semanas, concentrando-se na faixa de 32 a 36 semanas. O
percentual de CIUR encontrado para os óbitos fetais foi semelhante ao relatado por
Conde-Agudelo et al 25 estudando uma base de dados de países latino-americanos (SIP –
Sistema de Informação Perinatal) e utilizando a curva referendada pela OMS 4. Petersson
et al.
26
também encontraram cerca de 22% de insuficiência placentária associada ao
CIUR nos óbitos fetais em Estocolmo, Dinamarca, analisando os anos de 1998 e 1999.
Valor bem próximo – 23,4% - foi o relatado por Borrell et al. 27, em Barcelona, no
período de 1993 a 1997. Deve ser ressaltado que o CIUR pode ser detectado no
acompanhamento pré-natal e é passível de intervenção 28,29.
A interpretação dos dados relativos ao baixo peso na mortalidade perinatal deve
ser feita separadamente para óbitos neonatais e fetais. No caso dos óbitos neonatais,
nascer com baixo peso e/ou prematuridade desencadeia outros eventos – respiratórios,
hemodinâmicos, metabólicos ou infecciosos, que dão seqüência à cadeia causal, até a
ocorrência do óbito. No caso dos óbitos fetais, o nascimento em idade gestacional
precoce e/ou com baixo peso é conseqüência de processos patológicos que culminaram
com o decesso fetal, fechando a cadeia causal 30.
Cabe mencionar alguns aspectos metodológicos na análise das variáveis
biológicas. A utilização dos dados antropométricos se mostrou bastante útil para estimar
idade gestacional, quando não havia informação das outras fontes. O comprimento foi
compatível com a idade gestacional estimada pela USG em 65% dos casos neonatais e
52
60% dos fetais, quando este dado era disponível. Por outro lado, confirmou-se a
tendência de superestimação dos métodos clínicos para os casos neonatais, já relatada
na população de neonatos do Rio de Janeiro
31
. Comparando a estimativa ultra-
sonográfica e o Ballard, este mostrou superestimação maior ou igual a duas semanas em
65% dos casos. Em relação ao crescimento intra-uterino, o uso da curva de Williams
detectou 24% de fetos/RN com crescimento fetal retardado, sendo que após 31 semanas
este valor sobe para 38%. Caso fosse usada a curva de Lubchenco, os valores seriam
15% e 23% respectivamente, mostrando a inadequação desta curva, que ainda é usada
nos serviços de saúde e como instrumento de pesquisa.
Os coeficientes de mortalidade neonatal precoce foram comparáveis aos do
município. Isto pode ser explicado, em parte, pela transferência de algumas gestantes de
risco para unidades terciárias, mas sugere que, apesar dos indicadores socioeconômicos
desfavoráveis da população usuária, a existência de suporte tecnológico e recursos
humanos capacitados na atenção neonatal é capaz de minimizar as desigualdades. A
Maternidade Leila Diniz fez parte de um projeto de qualificação do atendimento
neonatal, no período de 1996-2001, com investimentos em recursos humanos e
equipamentos 32. A análise dos coeficientes de mortalidade por faixa de peso corrobora a
boa performance da unidade em relação à neomortalidade precoce. Embora pequeno, o
contingente total de nascidos vivos menores de 1500g foi responsável por 60% dos
óbitos neonatais e pequenos aumentos no número absoluto tiveram repercussão no
coeficiente de mortalidade global (tabela 4). Para esta faixa de peso, o coeficiente no
período total foi 225‰, com pequena variação anual. No município, como um todo, esta
taxa caiu de 432,9‰ em 1998 para 375,6‰ em 2002. As maternidades consideradas
terciárias da rede municipal do Rio de Janeiro apresentaram no ano de 2000 taxas
variando entre 280‰ e 370‰ 32. Estudos em outras localidades do Brasil mostram
53
também taxas elevadas para esta faixa de peso: em Belo Horizonte 7, no ano de 1999,
315‰; na região sul da cidade de São Paulo 33, no período 2000-2001, 456‰.
Em contraponto, a mortalidade fetal se mantém mais elevada que a descrita para
o Rio de Janeiro. Deve ser ressaltado que os óbitos fetais da AP4 se concentram na
MLD enquanto os neonatais precoces ocorrem em outras unidades públicas e algumas
privadas, sugerindo diferenças socioeconômicas na gênese dos dois tipos de óbito.
Quando se aplicou a classificação de evitabilidade, o elevado percentual de
óbitos anteparto aponta para problemas na atenção pré-natal, desde a completa ausência
até a possibilidade de mau acompanhamento. Usando o peso de 1000g como ponto de
corte para viabilidade e excluindo as malformações congênitas letais, podemos estimar
um número elevado de óbitos potencialmente evitáveis, em torno de 60%. Mesmo se
usarmos um ponto de corte mais conservador – 1500 g, os óbitos evitáveis seriam cerca
de 40% do total. A análise das causas básicas corrobora esta estimativa, já que afecções
maternas passíveis de tratamento, como hipertensão e sífilis estão entre as causas mais
freqüentes.
A comparação desta classificação com a de outras localidades deve ser
criteriosa. Os demais estudos utilizaram uma base populacional praticamente completa.
No caso da MLD, cerca de 60% dos óbitos estão representados, principalmente os
fetais. Isto explica o baixo percentual da categoria prematuridade, já que muitas
gestantes de risco são transferidas para unidades terciárias. Por outro lado, o baixo
percentual de asfixia perinatal fala a favor de bom cuidado obstétrico e de reanimação
neonatal. O valor elevado da categoria de causas específicas se explica pelo esforço em
investigar e monitorizar a sífilis congênita no Município do Rio de Janeiro,
principalmente nas maternidades municipais, como a MLD 34.
54
As causas básicas revelam que algumas patologias agem no período perinatal de
forma indistinta, resultando tanto em óbito fetal quanto neonatal. Um exemplo é a
asfixia intraparto que contribuiu principalmente para os óbitos ocorridos em conceptos
de termo. Outras patologias concentraram-se nos óbitos fetais, como as doenças
hipertensivas e a sífilis, enquanto as malformações congênitas foram mais freqüentes
nos neomortos. O elevado percentual de causa indeterminada tem duas explicações. A
primeira foi a forma de classificar o diagnóstico “anoxia intra-uterina”, um dos mais
freqüentes nos atestados de óbito fetal. Alguns autores optam por incluí-la no capítulo
de transtornos respiratórios do período perinatal; no entanto, na maioria dos casos
ocorridos na MLD, esta terminologia foi mal empregada para classificar óbitos de causa
não definida. Uma outra razão, em menor número de casos, foi a dificuldade em realizar
necropsias na rede pública, impedindo a melhor apreensão da etiologia de alguns óbitos
perinatais.
Os óbitos perinatais atendidos pela MLD refletem aproximadamente a situação
perinatal dos usuários do SUS em uma região populosa do Rio de Janeiro e apontam
para a necessidade de melhorar a oferta e qualificar a assistência pré-natal na região,
além de continuar investindo na atenção neonatal de risco. Finalizando, deve ser
enfatizada a necessidade de investigação mais refinada da mortalidade. Devem ser
valorizadas as descrições dos coeficientes por faixa de peso, a informação sobre idade
gestacional e crescimento intra-uterino – de preferência usando a curva de Williams.
Também deve ser aprimorada a determinação das causas do óbito, diminuindo o
percentual de causas mal-definidas. Desta forma, a investigação rotineira dos óbitos
perinatais poderá ampliar o subsídio para as ações de saúde na área perinatal.
55
3.5. Referências bibliográficas
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59
Quadro 1 – Classificação de Wigglesworth modificada por Keeling e relação com falhas na assistência
Possível falha na assistência
Tipo de óbito
Grupo 1
ocorrido antes do trabalho de parto
pré-natal
(natimortos)
Grupo 2
por malformações congênitas letais
acompanhamento periconcepcional e
(natimortos e neomortos) –
aconselhamento genético anterior
Grupo 3
por prematuridade (neomortos)
atendimento obstétrico e/ou neonatal.
Grupo 4
Grupo 5
por asfixia perinatal (natimortos durante
trabalho de parto ou neomortos com asfixia
grave)
por causas específicas (natimortos e
neomortos) – infecções, isoimunização
atenção obstétrica ou na reanimação
neonatal.
pré-natal, atendimento obstétrico e/ou
neonatal
Tabela 1 – Distribuição do nº absoluto e coeficiente de mortalidade (por mil nascimentos) por peso –
óbitos perinatais, fetais e neonatais precoces – MLD, Rio de Janeiro, 1999 a 2003.
Peso ao nascer Nascidos Óbitos Coeficiente Óbitos
Coeficiente Óbitos
Coeficiente
vivos
fetais Mortalidade neonatais Mortalidade perinatais Mortalidade
(AP4)
fetal
precoces neo precoce
perinatal
500 – 999g
1000 – 1499g
1500 – 1999g
2000 – 2499g
148
212
390
1244
113
74
54
46
432,9
258,7
121,6
35,6
61
20
16
10
412,1
94,3
40,9
8,0
174
94
70
56
666,6
328,6
157,6
45,0
< 1500g
< 2500g
≥ 2500g
360
1994
17346
187
287
90
341,8
125,8
5,1
81
107
28
225,0
53,7
1,6
258
384
118
471,6
168,3
6,8
Total
19340
377
19,0
135
7,0
512
25,9
Tabela 2 – Distribuição dos óbitos perinatais, fetais e neonatais por faixa de idade gestacional – MLD,
Rio de Janeiro – 1999 a 2003.
Idade gestacional (semanas)
<22
22 a 27
28 a 31
32 a 36
≥ 37
IGNORADA
Óbitos perinatais
6 (1%)
138 (27%)
103 (20%)
133 (26%)
114 (22%)
18 (4%)
Óbitos fetais
6 (1,5%)
85 (22,5%)
75 (20%)
109 (29%)
84 (22%)
18 (5%)
Neo precoce
53 (39%)
28 (21%)
24 (18%)
30 (22%)
Tabela 3 – Distribuição dos óbitos perinatais de acordo com o crescimento intra-uterino, por faixa de
idade gestacional, MLD, Rio de Janeiro, 1999 a 2003.
< 28 semanas
28 a 31
32 a 36
≥ 37
Total
AIG
92%
78%
52%
55%
70%
PIG
3%
19%
44%
32%
24%
GIG
5%
3%
4%
12%
6%
60
Tabela 4 – Percentual de nascidos vivos de baixo peso e muito baixo peso e coeficientes de mortalidade
neonatal de acordo com faixas de peso, MLD, Rio de Janeiro, 1999 a 2003.
1999
2,1%
10,8%
2000
1,6%
10,2%
2001
1,6%
10,2%
2002
1,8%
10,3%
2003
2,1%
9,8%
Coeficientes de mortalidade/peso
< 1500
180,7‰
225,8‰
246,1‰
250‰
256‰
< 2500
48,4‰
48,2‰
48,7‰
53,7‰
71,8‰
≥ 2500
2,2‰
2,0‰
0,5‰
2,1‰
1,1‰
Total
7,0‰
6,5‰
5,3‰
7,1‰
7,9‰
Percentual de n. vivos < 1500
Percentual de n. vivos < 2500
Tabela 5 – Distribuição dos óbitos perinatais por faixa de peso, de acordo com a classificação de
Wigglesworth , MLD, Rio de Janeiro, 1999 a 2003.
Peso ao
Anteparto
Malformação
Prematuridade
Asfixia
Específicas
nascer (g)
Intraparto
n
%
n
%
n
%
n
%
n
%
500- 999
88
50,6
10
5,7
58
33,3
12
6,9
6
3,4
1000-1499
55
58,5
8
8,5
14
14,9
4
4,3
13
13,8
1500-1999
40
57,0
8
11,5
4
5,7
3
4,3
15
21,5
2000-2499
32
57,0
3
5,5
_
_
6
10,7
15
26,8
< 2500
≥ 2500
215
71
54,6
60,2
29
9
7,4
7,6
76
_
19,3
_
25
21
6,3
17,8
49
17
12,4
14,4
Total
286
56,0
38
7,4
76
14,8
46
9,0
66
12,8
Tabela 6 - Distribuição dos óbitos perinatais, de acordo com a classificação de Wigglesworth , para MLD
(Rio de Janeiro) e outras localidades brasileiras.
Mat. Leila Diniz Pelotas
(Rio de Janeiro) 1993
1999-2003
Anteparto
56%
25%
Malformado
7,4%
11%
Prematuridade
14,8%
17%
Asfixia intraparto 9%
38%
Específicas
12,8%
8%
Total
512 (377 fetais)
117 (55 fetais)*
* só incluídos óbitos fetais ≥ 28 semanas
Fortaleza
1995
Belo Horizonte
1999
48,45%
5,4%
34,7%
8,9%
2%
1337 (730 fetais)
30,1%
8,4%
22,6%
34,9%
4%
826 (461 fetais)
61
4. Artigo 3. Fatores de risco para mortalidade perinatal em uma região do Rio de
Janeiro, Brasil, 2002 a 2004: estudo caso-controle aninhado.
Resumo: Um estudo caso-controle aninhado foi realizado para investigar os
determinantes da mortalidade perinatal em uma população usuária dos serviços públicos
de uma região delimitada do Rio de Janeiro, de 2002 a 2004. Os dados foram coletados
através de questionário e complementados em prontuários e cartões de pré-natal. Para
análise estatística, foi estruturado um modelo explicitando relações hierárquicas entre os
fatores socioeconômicos, psico-sociais, reprodutivos, comportamentais, assistenciais e
biológicos do concepto. Os resultados revelaram a importância de vínculo empregatício,
situação marital estável, acompanhante na internação e pré-natal adequado como
protetores de mortalidade perinatal, enquanto violência doméstica e presença de
morbidade na gravidez aumentararam o risco. Baixo peso e prematuridade foram
corroborados como maiores determinantes do óbito neonatal precoce. O pré-natal se
mostrou ainda mais protetor nas pacientes com morbidade, destacando-se como
estratégia de redução do risco em populações desfavorecidas do ponto de vista
socioeconômico. Palavras-chave: mortalidade perinatal, caso-controle, fatores de risco.
Abstract: A nested case-control was conducted to explore the determinants of perinatal
mortality in a population attended by public services in Rio de Janeiro. Data were
collected from mothers' interviews and medical records. A structured model was
proposed to perform statistical analysis, attributing hierarchical levels to socioeconomic, reproductive, behavioral, health care, and biological factors. The results
showed that work stability, a stable marital status, the presence of a companion during
admission, and adequate prenatal care had protective effect against perinatal mortality
whereas domestic violence and morbidity during pregnancy increased the risk. Low
birth weight and prematurity were confirmed as the greatest determinants of early
neonatal death. Prenatal care was even more effective in high-risk patients, becoming a
strong strategy at reducing risk mortality in populations of low socioeconomic status.
Key words: perinatal mortality, case-control, risk factors.
62
4.1. Introdução
A forma de estudar os determinantes de eventos perinatais tem sido reformulada
nos últimos anos. Kiely 1, em 1991, alinhou quatro grandes problemas encontrados em
estudos de mortalidade perinatal: o uso incorreto de variáveis intervenientes como
fatores de “confundimento”, a definição de faixas muito amplas para o peso ao nascer, a
interação entre peso ao nascer e variáveis socioeconômicas, e a análise simultânea de
variáveis com alto grau de colinearidade. Estes problemas resultam freqüentemente na
subestimação do efeito de alguns determinantes, notadamente os sociodemográficos.
Suas sugestões para superar estes problemas valorizam o modelo biológico de
determinação e o uso de estratégias como análise estruturada.
Kramer et al.
2,3
recomendam que os estudos na área perinatal privilegiem a
identificação dos mecanismos pelos quais as desigualdades socioeconômicas levam a
desfechos perinatais desfavoráveis. Da mesma forma que Kiely, alertam para a correta
interpretação das relações entre fatores socioeconômicos (determinantes distais) e seus
mediadores (determinantes intermediários), na gênese do baixo peso e da
prematuridade, utilizando um modelo conceitual estruturado ou hierarquizado. Além
desta recomendação, incorporam ao modelo determinantes intermediários pouco
estudados, como fatores psico-sociais (apoio social, situação conjugal, nível de estresse,
violência doméstica). Em outro artigo4, propõem que os componentes da mortalidade
perinatal – neomortalidade precoce e natimortalidade – sejam estudados separadamente
quanto à sua etiologia, já que, pelo menos nos países desenvolvidos, os fatores de risco
vêm se tornando distintos.
63
No Brasil, onde a mortalidade perinatal é ainda bastante elevada, os estudos de
determinação começaram a incorporar algumas destas recomendações5: vários autores6, 7,
8, 9, 10
utilizaram modelos estruturados hierárquicos para identificar os determinantes da
mortalidade fetal, perinatal e neonatal. Os resultados apontaram para desigualdades
socioeconômicas e demográficas, embora conflitantes para algumas variáveis, como
escolaridade materna e adolescência. As variações nas características populacionais, na
distribuição dos determinantes e suas inter-relações, e nas abordagens metodológicas,
como definição e mensuração de algumas variáveis, podem explicar tais diferenças
entre os estudos.
Na Cidade do Rio de Janeiro, cuja população chega a seis milhões de habitantes,
a mortalidade perinatal em 2003 encontrava-se no patamar de 17,4‰, variando de 9,3‰
a 23,2‰ nas diversas regiões da cidade 11.
Um inquérito sobre a situação perinatal no Rio de Janeiro
12
mostrou gradientes
socioeconômicos quando estratificou as maternidades em públicas (estrato 1),
conveniadas (estrato 2) e privadas (estrato 3). A taxa de óbito perinatal foi 29‰ no
primeiro estrato, 13‰ no segundo e apenas 4‰ no terceiro. As puérperas com baixa
escolaridade materna, idade inferior a 20 anos e cor da pele parda ou preta se
concentraram nos estratos 1 e 2, enquanto as mães com ensino médio completo ou curso
superior, cor da pele branca, e idade superior a 35 anos no terceiro estrato. O ingresso
precoce e o número adequado de consultas de pré-natal ocorreram em cerca de 95% das
pacientes do estrato 3 e em apenas 50 a 60 % dos demais estratos.
Dois trabalhos recentes estudaram determinantes de mortalidade neonatal e
perinatal no Rio de Janeiro. O primeiro
13
foi um estudo ecológico que identificou
proporção de mães adolescentes, renda menor que um salário-mínimo, e residência em
favela como os fatores explicativos da distribuição de óbitos neonatais precoces na
64
cidade. O segundo estudo 14, através de indicadores de dissimilaridade, mostrou que
quanto mais baixa a renda e/ou a escolaridade, maior a freqüência de óbitos perinatais.
No entanto, não existem até o momento, estudos regionalizados de mortalidade
perinatal no Rio de Janeiro. Cada área programática do município compreende duas ou
mais regiões, atingindo contingentes populacionais semelhantes a municípios de médio
e grande porte. Os serviços de saúde pública, vinculados ao Sistema Único de Saúde
(SUS), também estão organizados por área programática, principalmente os de atenção
básica, como o pré-natal. A área programática 4 (AP4), com cerca de 700.000
habitantes, tem taxa de mortalidade perinatal de 13,4‰ e compreende duas regiões,
Barra de Tijuca e Jacarepaguá, cujas taxas são respectivamente 8,2‰ e 17,6‰ 11. Uma
única maternidade pública atende esta área programática, realizando cerca de 4000
partos por ano, que representam 50% dos nascimentos da população atendida pelo SUS.
Dados do Sistema de Informações de Nascidos Vivos (SINASC), colhidos
periodicamente, mostram que as usuárias desta maternidade têm baixa escolaridade e
alto percentual de adolescentes.
Em uma população razoavelmente homogênea e desfavorecida do ponto de vista
social e econômico, que variáveis explicam a ocorrência de óbito perinatal? No presente
trabalho, discute-se o processo de determinação da mortalidade perinatal da população
atendida na Maternidade Leila Diniz (MLD) no período de 2002 a 2004. Foram
investigados fatores socioeconômicos, reprodutivos, biológicos e ligados à qualidade da
assistência pré-natal e perinatal. A hipótese norteadora é de que, diante de condições
biológicas e socioeconômicas adversas, a qualidade da assistência, principalmente no
pré-natal, pode intervir na diminuição da mortalidade perinatal 15 .
65
4.2. Metodologia
Local do estudo
A Maternidade Leila Diniz é uma maternidade de risco médio, com 60 leitos
obstétricos, 15 de unidade neonatal intermediária e 5 de unidade neonatal intensiva.
Pertence ao Hospital Raphael de Paula Souza, vinculado à Secretaria Municipal de
Saúde do Rio de Janeiro. A população atendida é, em sua grande maioria (94%),
originária dos bairros da AP4, principalmente da região de Jacarepaguá.
Desenho do estudo
Foi realizado um caso-controle aninhado, no qual a coorte de nascimentos foi
acompanhada no período de outubro de 2002 a outubro de 2004. Os casos de óbito
perinatal foram captados e comparados a controles selecionados entre os nascidos vivos
no mesmo período, numa razão de 1:2. Assim, os controles representaram a população
sob risco na época de ocorrência do caso, caracterizando um caso-controle concorrente
. Os casos foram incidentes e a amostragem de controles foi aleatória, por densidade.
16
Critérios de inclusão
Foram incluídos os óbitos fetais ≥ 22 semanas e os óbitos neonatais < 7 dias de
vida, todos com peso ≥ 500g. Foram excluídos os óbitos de gestações gemelares. Os
partos domiciliares e os ocorridos em via pública ou nas emergências próximas à MLD
– que costumam representar um percentual mínimo do total – também foram incluídos,
66
caso tivessem sido admitidos logo após o parto. Tanto os casos como os controles eram
de pacientes residentes na AP4 (Jacarepaguá e Barra).
População base
A população atendida na MLD tem indicadores sociodemográficos diferenciados
(SINASC), quando comparada à população de toda a AP4. A escolaridade materna é
baixa, o percentual de adolescentes é de 25%. Apenas 30% das pacientes realizam mais
do que seis consultas de pré-natal. Para os nascidos vivos, a prevalência de baixo peso
fica em torno de 10% e a de prematuridade em 9%.
Instrumento de coleta de dados
A informação sobre as variáveis do estudo foi coletada por meio de questionário
padronizado e complementada com os dados do cartão de pré-natal e dos prontuários. A
coleta foi realizada principalmente pela investigadora principal e num percentual
pequeno dos casos, pelas assistentes sociais que participaram no início do projeto.
Variáveis do estudo
Para a variável dependente – óbito perinatal – foram considerados os óbitos
neonatais precoces (<7dias) e os óbitos fetais > 22 semanas; para ambos foi usado o
ponto de corte de 500g, para melhor comparabilidade.
Para representar os fatores socioeconômicos, foram escolhidas a cor da pele, a
escolaridade materna, a renda familiar e a existência ou não de vínculo empregatício
67
do chefe da família. A cor da pele foi aferida pelo observador, usando as mesmas
categorias da declaração de nascido vivo (DNV). A escolaridade foi medida em anos de
estudo (séries completas sem repetência). A renda foi medida em reais e convertida para
nº de salários-mínimos. Para avaliar a dimensão de apoio psico-social: a situação
conjugal, considerada estável quando a paciente viveu com o companheiro durante a
gravidez, independente do estado civil; e a presença de acompanhante no momento da
admissão na MLD.
A idade materna foi medida em anos e dividida em três categorias – ≤ 19 anos,
20-34 anos, ≥ 35 anos. Em relação à história reprodutiva, foram consideradas a paridade
e a ocorrência de óbito perinatal anterior (apenas para as multíparas).
A presença de morbidade na gravidez foi avaliada pelo relato da paciente, e
pelos dados do cartão de pré-natal e prontuário. Foram selecionadas as patologias já
corroboradas na literatura
17,18
como sendo de alto risco para óbito perinatal: doenças
hipertensivas, diabetes, doenças da tiróide, sífilis, toxoplasmose, infecção pelo HIV,
infecção urinária ou genital.
Informação sobre o hábito de fumar e o consumo regular de álcool na gravidez
foram obtidas diretamente com a paciente. Para o consumo de álcool, utilizou-se o
questionário T-ACE 19. Em relação à ocorrência de violência doméstica, foi utilizado o
Abuse Assessment Screening 20, na versão já validada para o português21. As perguntas
relativas a estes instrumentos foram entremeadas no questionário utilizado para as
demais variáveis.
O pré-natal foi avaliado de duas formas: um critério de utilização, que ajusta
número de consultas para idade gestacional – APNCU (Adequacy of Prenatal Care
Utilization Index) 22 – já referendado na literatura23 em pacientes do Rio de Janeiro, e um
critério de qualidade, construído para este trabalho. O critério de qualidade foi baseado
68
no APNCU, acrescentando avaliação do conteúdo, de acordo com recomendado por
outros autores que estudaram pré-natal em nosso meio
24, 25, 26
. Foi valorizado se o pré-
natal realizou intervenções efetivas dentro de um mínimo aceitável de consultas 27, tais
como investigar e tratar condições de risco, e se houve monitorização adequada do
crescimento intra-uterino
. Portanto, foi considerada importante, mais do que a
28, 29
captação precoce, o seguimento do pré-natal, já que do 2º para o 3º trimestre, estas
patologias se tornam mais presentes e demandam intervenção oportuna 30. O pré-natal foi
considerado bom se todos os requisitos a seguir foram atendidos: número de consultas
intermediário ou adequado (critério APNCU) para a idade gestacional, início até o 5º
mês, acompanhamento pelo menos quinzenal a partir de 36 semanas, monitorização do
crescimento fetal e investigação/tratamento das principais morbidades. Por outro lado,
foi considerado ruim na ocorrência de qualquer dos seguintes eventos: não realização de
pelo menos metade das consultas recomendadas (incluindo pacientes que não fizeram
pré-natal), início após o 5º mês, não realização do VDRL, ausência de
investigação/tratamento das principais morbidades, acompanhamento mais espaçado
que quinzenal a partir de 36 semanas. A informação sobre o pré-natal foi coletada a
partir dos registros do cartão e do relato da paciente. Na falta do cartão, a informação foi
resgatada nas unidades de realização do pré-natal.
O peso tanto dos fetos quanto dos RN foi aferido logo após o parto, pela equipe
de rotina. Quanto à idade gestacional, foi calculada de acordo com os seguintes
critérios: foi priorizada a informação pela DUM, quando havia concordância com USG
precoce, isto é, realizada preferencialmente antes de 24 semanas
31,32
; quando não havia
informação pela DUM ou havia discordância maior que duas semanas, foi usada a USG.
Quando as duas estavam ausentes, utilizaram-se as medidas antropométricas
(comprimento e perímetro cefálico), com base em tabelas propostas na literatura
33, 34, 35,36
.
69
Para os óbitos neonatais, se não houvesse informação da DUM e da USG, foram usadas
as medidas antropométricas e/ou a estimativa clínica
. Desta forma, foi criada uma
37, 38
variável – idade gestacional estimada – que descreveu a melhor estimativa de idade
gestacional, permitindo também a estimativa de crescimento intra-uterino. Para avaliar
o crescimento intra-uterino, foi usada a curva recomendada pela OMS 39, uma referência
construída a partir de nascimentos vivos e mortos, na Califórnia 40. Foi considerado
indicativo de crescimento retardado (CIUR) o peso abaixo do percentil 10 para a idade
gestacional correspondente.
Foi utilizada a Classificação de Wigglesworth 41, adaptada por Keeling et al. 42,
para avaliar a evitabilidade dos óbitos. Para avaliar as causas básicas, priorizou-se o
evento inicial na cadeia causal, buscando morbidades que tivessem desencadeado o
desfecho reprodutivo. As causas foram agrupadas de acordo com a CID-10.
Análise estatística
Estruturou-se um modelo explicativo estruturado em níveis hierárquicos
43
,
postulando-se que as condições socioeconômicas determinam ou estão associadas aos
fatores intermediários de mortalidade perinatal
1, 2, 3
. Inicialmente todas as variáveis
independentes foram testadas em relação à variável dependente (óbito), Aquelas com
p<0,25 entraram no modelo multivariado, deixando no modelo final apenas aquelas com
p<0,10. Foram considerados no nível distal: socioeconômicos e psico-sociais. Estas
variáveis foram dicotomizadas e constituíram o primeiro nível de análise. No nível
intermediário, foram incluídos fatores ligados à história reprodutiva, assistência prénatal, hábitos (tabagismo e alcoolismo) e exposição à violência. No nível proximal,
peso, idade gestacional e crescimento intra-uterino. A cada nível, as variáveis foram
70
controladas para as demais do mesmo nível e para as de nível superior, mas não para as
de nível inferior. Assim, a estimativa obtida em cada nível diz respeito ao efeito da
variável já ajustado para os possíveis fatores de “confundimento”, mas não para as
possíveis variáveis mediadoras. No nível intermediário também foi testada a interação
entre pré-natal e morbidade materna, supondo que o efeito do pré-natal pudesse ter
comportamento diferente em pacientes com e sem morbidade. A violência doméstica
também foi testada no nível distal, como fator psico-social, em um modelo alternativo.
Foram rodados modelos para todas as observações e só para as multíparas. O modelo
completo está representado na figura 1.
Os dados foram armazenados no EPIINFO 6-04 e analisados no STATA 6.0. A
razão de chances (odds ratio) de exposição entre casos e controles permitiu a estimativa
não enviesada da razão de taxas. Pela incidência da variável de desfecho ser baixa, a
razão de taxas tem um valor muito próximo tanto da razão de riscos quanto da razão de
chances. Apesar do número pequeno de observações e da conseqüente perda de poder
estatístico, também foram analisados isoladamente os óbitos fetais e neonatais precoces.
Socioeconômicos
(cor, renda, escolaridade, vínculo empregatício)
Fatores
Distais
Psico-sociais
(situação conjugal, acompanhante)
Sexo*
Intermediários
Biológicos maternos
Idade, morbidade
Proximais
Reprodutivos
Paridade
óbito anterior**
Comportamentais
Tabagismo, alcoolismo
Violência doméstica na gravidez***
Biológicos feto/RN
Peso****
Idade gestacional****
Crescimento intra-uterino
Figura 1 – Modelo de determinação da mortalidade perinatal
* sexo entrou no modelo de forma independente, sem se relacionar com os níveis
** apenas no modelo para multíparas
*** violência também foi testada no nível distal, no bloco dos fatores psico-sociais
**** apenas no modelo para óbito neonatal precoce
Questões éticas
Assistenciais
Pré-natal
71
Este estudo fez parte de um projeto de investigação de óbitos perinatais,
aprovado pelo Comitê de Ética da Escola Nacional de Saúde Pública e pela direção da
unidade.
4.3. Resultados
No período do estudo, ocorreram na MLD 7134 nascimentos provenientes da
AP4 e 188 óbitos perinatais que atendiam aos critérios de inclusão. Foram investigados
180 casos e 360 controles. As perdas (4%) se deveram a duas recusas das pacientes,
dois casos de óbito materno antes da admissão na MLD, e quatro altas de pacientes
antes da abordagem para entrevista.
A tabela 1 mostra a distribuição das principais variáveis maternas, para os
controles e os casos – óbitos perinatais, fetais e neonatais.
O percentual de adolescentes foi o mesmo, mas as pacientes com idade igual ou
superior a 35 anos foram mais freqüentes entre os casos, notadamente aquelas com
óbito fetal. A distribuição de cor da pele foi semelhante, mas o número de pacientes
com cor da pele não-branca foi maior entre os óbitos fetais, o inverso ocorrendo nos
óbitos neonatais precoces. Não se observaram diferenças na distribuição de faixas de
renda e escolaridade, mas a freqüência de empregos estáveis, caracterizada pelo vínculo
empregatício do chefe de família, foi maior entre os controles.
A maioria das pacientes vivia com o companheiro durante a gravidez e chegou
acompanhada na maternidade, sendo as duas proporções maiores no grupo de controles.
72
Não houve diferenças em relação à multiparidade, mas entre as pacientes com
óbito neonatal precoce, a freqüência de nulíparas foi maior. Considerando apenas as
multíparas, foi mais elevada a ocorrência de óbito perinatal anterior no grupo de casos
que no de controles, concentrado nas pacientes com óbito fetal. O evento anterior mais
relatado foi óbito fetal.
A prevalência de tabagismo foi elevada, destacando-se o grupo de pacientes que
cursou com óbito fetal. Não houve diferença importante em relação ao consumo de
álcool. Também foi elevado o percentual de mulheres que relataram já ter sofrido
violência doméstica antes e/ou durante a gravidez, geralmente perpetrada pelo próprio
parceiro, sendo maior no grupo dos casos.
A presença de morbidade durante a gravidez foi mais elevada nas pacientes do
grupo de casos, principalmente naquelas com óbito fetal. As doenças hipertensivas
incidiram nos dois grupos, mas a infecção urinária foi mais comum entre os controles e
a sífilis, entre os casos.
Em relação ao pré-natal, apenas 6% do grupo de controles não haviam realizado,
em comparação com 31% do grupo de casos. Usando o critério APNCU, foi maior o
percentual classificado como adequado entre os controles. Usando o critério de
qualidade, a diferença foi ainda maior: o número de pacientes controles que realizou um
bom pré-natal foi maior que o dobro do número de casos.
As características dos fetos e recém-nascidos foram marcadamente diferentes
entre casos e controles (tabela 2). Nos controles, a mediana de peso foi bem mais
elevada e os percentuais de baixo peso, muito baixo peso e crescimento intrauterino
retardado foram bem menores. Houve predomínio de sexo masculino nos óbitos
neonatais precoces.
73
As principais causas básicas de óbito foram afecções maternas (P00), com
destaque para transtornos hipertensivos e sífilis, seguidas das complicações da placenta,
cordão e membranas (P02) e dos transtornos relacionados com gestação de curta
duração (P07) e crescimento fetal retardado (P05). Dezoito por cento dos casos
permaneceram com causa básica indeterminada. A classificação de Wigglesworth
mostrou 58% de óbitos anteparto, 15% de prematuridade, 6% de asfixia intraparto, 8%
de malformações congênitas e 13% de patologias específicas, na maioria sífilis
congênita. Nas faixas de maior peso, persistiu com maior percentual o grupo de óbitos
anteparto, diminuiu o da prematuridade e aumentou a participação da asfixia perinatal e
das infecções específicas.
A tabela 3 mostra a análise bivariada, com os odds ratios (OR) não ajustados
para cada variável independente do bloco distal e intermediário.
Renda e escolaridade materna não mostraram associação com óbito perinatal. O
resultado foi o mesmo quando se analisaram as variáveis de forma contínua ou
categorizada em três níveis. A existência de vínculo empregatício, porém, mostrou
efeito protetor para óbito perinatal, tendo apresentado significância limítrofe nas
análises isoladas de óbito fetal e neonatal (p=0,08). A cor da pele não apresentou
associação, exceto para óbito fetal, sendo que a significância estatística para cor ficou
limítrofe para óbito fetal (p=0,07).
Ter relação conjugal estável e estar acompanhada no momento da internação
mostraram-se protetores para óbito perinatal, fetal e neonatal.
Idade maior ou igual a 35 anos teve OR próximo de 2 para óbito perinatal e fetal,
porém com nível limítrofe de significância (p=0,07 e p=0,052, respectivamente),
enquanto a categoria adolescência não evidenciou risco aumentado. A presença de
morbidade materna na gravidez associou-se com óbito perinatal e fetal.
74
A nuliparidade teve associação limítrofe para óbito neonatal e perinatal. Entre as
multíparas, óbito perinatal anterior teve OR de grande magnitude para óbito perinatal e
fetal.
Tabagismo mostrou associação apenas com óbito fetal, enquanto alcoolismo não
apresentou evidência de risco. Episódios de violência doméstica durante a gravidez
apresentaram OR maior que 2 para óbito perinatal, fetal e neonatal (este último sem
significância estatística).
O pré-natal adequado, medido pelo índice de utilização (APNCU) ou pelo
critério de qualidade proposto neste trabalho, indicou proteção para os três tipos de
óbito. Ressalve-se apenas que a categoria de pré-natal intermediário do critério APNCU
teve efeito protetor porém com significância limítrofe (p=0,053).
Das características biológicas (tabela 4), peso e idade gestacional foram as
variáveis com maior magnitude de associação, tanto na forma contínua como
categorizada, para os óbitos neonatais precoces; enquanto o crescimento retardado
associou-se com óbito fetal e perinatal. Sexo masculino relacionou-se apenas com óbito
neonatal precoce.
Em relação à análise multivariada, a tabela 5 mostra o modelo principal final,
com as estimativas de efeito para óbito perinatal, fetal e neonatal precoce, incluindo as
observações de todas as pacientes e utilizando o critério de qualidade de pré-natal. No
primeiro nível (distal), persistiram como determinantes para óbito perinatal: a situação
marital, a presença de acompanhante na chegada à maternidade e vínculo empregatício
do chefe da família. Para óbito fetal e neonatal, separadamente, vínculo empregatício
mostrou significância limítrofe.
No segundo nível (intermediário), ter realizado um pré-natal adequado foi
protetor, ressalvando-se que, por conta da interação entre pré-natal e morbidade, o
75
modelo final para óbito perinatal mostra as diferentes estimativas do efeito do pré-natal
nas duas categorias: nas pacientes sem morbidade houve redução de 60% do risco
enquanto naquelas com morbidade, a proteção foi ainda maior – 80%. A presença de
interação não alcançou significância estatística nas análises separadas de óbito fetal e
neonatal precoce, observando-se que morbidade se manteve como fator de risco apenas
para óbito fetal. A ocorrência de violência doméstica não alcançou significância,
embora com OR próximo a 2 e não foi incluída neste modelo. A nuliparidade aumentou
o risco apenas de óbito neonatal precoce.
No terceiro nível (proximal), quanto maior o peso, menor a ocorrência de óbito
neonatal precoce, em qualquer forma de análise da variável. Para idade gestacional, a
análise categorizada mostrou que quanto maior a faixa de idade gestacional, menor o
risco de óbito; porém a mesma variável na forma contínua perdeu em magnitude e
significância. O crescimento retardado (CIUR) manteve efeito na análise multivariada,
para óbito perinatal e fetal. No entanto tornou-se não significativo para óbito neonatal
precoce.
Analisando-se separadamente as multíparas (tabela 6), verificou-se que a
ocorrência de óbito perinatal anterior aumentou o risco, reproduzindo na maioria dos
casos, o padrão de natimortalidade. O restante do modelo ficou bastante semelhante ao
do total de pacientes, exceto pela ausência de vínculo empregatício, cuja associação
com óbito perinatal não se mostrou significativa. A interação entre morbidade e prénatal também não teve significância estatística.
Duas análises alternativas foram realizadas apenas para os óbitos perinatais,
considerando todas as observações (tabela 7). A primeira, utilizando o critério APNCU
para avaliar o efeito do pré-natal. Os resultados foram semelhantes ao do modelo com
critério de qualidade do pré-natal, excetuando-se a interação com morbidade, que não
76
foi significativa. Destaque-se que neste modelo, a associação da violência doméstica
com óbito perinatal teve significância limítrofe e a variável foi mantida no modelo. A
segunda análise deslocou a variável violência para o nível distal, incluída no bloco de
fatores psico-sociais; observou-se então que a associação da violência com o risco de
óbito perinatal alcançou significância estatística.
4.4. Discussão
Os resultados obtidos neste trabalho revelaram a importância de fatores
socioeconômicos, psico-sociais e assistenciais na determinação do óbito perinatal em
uma população específica.
Apesar de se referirem às pacientes de uma única maternidade, as características
de regionalização e cobertura tornam os resultados relevantes para as usuárias de
serviços públicos nesta região e potencialmente generalizáveis para outras regiões
semelhantes no Rio de Janeiro.
Em relação aos fatores socioeconômicos, renda e escolaridade provavelmente
não expressaram seu efeito pela ausência de um gradiente importante na população
estudada. Estudos que encontraram associação com óbito mostraram estimativas de
maior magnitude e significância quando comparados extremos de renda ou escolaridade
. Szwarcwald et al.
44,45,46,47
48
afirmam que a escolaridade pode perder a capacidade
discriminante quando a população se concentra em um determinado nível, sem
apresentar todo o espectro do indicador. A condição de vínculo empregatício do chefe
de família teve efeito protetor, sugerindo que a estabilidade financeira, em população de
baixa renda, pode ser um indicador socioeconômico. A escolha de indicadores
77
adequados na avaliação das desigualdades socioeconômicas em saúde perinatal ainda
está em discussão na literatura 44,48,49.
A estabilidade conjugal e a presença do companheiro ou da família no momento
da internação – fatores de apoio psico-social – tiveram comportamento de proteção em
todas as análises. Para que o apoio social seja efetivo na prevenção de desfechos
desfavoráveis, ele deve ser duradouro e prévio à gestação
. O acompanhante dos
2,3
controles era freqüentemente (93%) o companheiro ou familiar próximo, como a mãe da
paciente, pessoas que provavelmente estiveram envolvidas durante toda a gravidez; por
outro lado, entre os casos, houve um percentual razoável em que o acompanhante foi
uma pessoa amiga ou mesmo um vizinho (12,5%), cujo envolvimento é supostamente
bem menor.
A idade materna avançada, fator de risco amplamente corroborado na literatura 5,
mostrou associação, porém com significância limítrofe, mesmo para óbitos fetais, tendo
desaparecido na análise multivariada. Isto pode ter ocorrido tanto por falta de poder do
estudo, como pela presença de outro determinante, a morbidade, que é um importante
mediador da associação entre idade1 e mortalidade perinatal. Por outro lado,
adolescência, que tem mostrado resultados conflitantes, nesta população não foi
identificada como determinante de óbito perinatal. Outros estudos na população do Rio
de Janeiro têm apontado adolescência como fator de risco para mortalidade neonatal
13,
, mas nenhum deles utilizou análise multivariada, com ajuste para fatores
50
socioeconômicos. Já foi demonstrado que as puérperas adolescentes no Rio de Janeiro
apresentam piores indicadores, comparadas às puérperas de 20-34 anos (sem
experiência anterior de gravidez na adolescência), destacando-se baixa escolaridade,
desemprego paterno e ausência do pai do RN 51. Na década de 90, na Suécia, Olausson
78
et al.52 concluíram que o efeito da adolescência na mortalidade fetal e infantil era
praticamente explicado pelas diferenças socioeconômicas.
A violência doméstica, tanto por seu efeito traumático direto, como pelo
aumento dos níveis de estresse psicológico, tem sido implicada em desfechos adversos
perinatais
. No presente estudo, a ocorrência de violência durante a gravidez
53,54,55
mostrou associação com óbito perinatal nas formas alternativas de análise, embora não
tenha alcançado significância no modelo principal. Também foi mais comum entre os
casos a ocorrência de episódios de violência anteriores à gravidez, sugerindo uma
situação de estresse crônico, cada vez mais implicado como desencadeante de
prematuridade e conseqüentes desfechos perinatais 56, 57.
A presença de morbidade aumentou o risco de óbito perinatal e fetal, não
havendo associação para óbito neonatal precoce isolado. Os mecanismos que deflagram
o parto prematuro não são ainda de todo conhecidos, mas podem estar ligados a
patologias maternas não mensuradas rotineiramente, como a vaginose bacteriana 58, o
que explica a ausência desta associação.
Quanto ao risco reprodutivo, confirmou-se a associação entre episódio anterior e
nova ocorrência de óbito perinatal, mostrada em outros estudos nacionais5. O padrão foi
semelhante ao encontrado por Menezes et al.8, com o risco concentrado nos óbitos
fetais. Em cerca de metade das pacientes, esta associação pôde ser explicada pela
manutenção ou repetição de transtornos hipertensivos; nas demais não foi possível
identificar a etiologia. A nuliparidade aumentou o risco para óbito neonatal precoce,
enquanto multiparidade não teve efeito para óbito algum.
Muito tem sido discutido acerca do papel protetor do pré-natal quanto aos
desfechos perinatais
. O viés da prematuridade, a dificuldade em mensurar
30,59,60
adequação do pré-natal, e o viés de auto-seleção têm sido apontados como problemas
79
para estabelecer a real associação entre o cuidado pré-natal e o desfecho perinatal. Neste
trabalho optou-se por usar critérios com ajuste para idade gestacional e valorizar
aspectos qualitativos na tentativa de resolver as duas primeiras questões. Quanto ao viés
de auto-seleção, a estratégia foi o ajuste para variáveis habitualmente relacionados à
baixa procura do pré-natal: escolaridade, renda, situação conjugal, idade, paridade,
tabagismo/alcoolismo
. Ainda assim, características não conhecidas ou não
26,61,62
mensuráveis relacionadas ao auto-cuidado podem enviesar esta associação.
Em qualquer das formas usadas para análise, seja critério APNCU ou critério de
qualidade, o pré-natal se mostrou fortemente protetor para óbito perinatal, fetal, e
neonatal. Destacou-se a diferença de comportamento do pré-natal quando se incluiu o
termo de interação com morbidade. O pré-natal foi mais efetivo nas pacientes de risco,
isto é, portadoras de alguma patologia. Estas pacientes, quando realizam o pré-natal
adequado, podem ter seu risco diminuído em até 80%. Nas pacientes sem risco, a
proteção foi menor mas ainda assim de grande magnitude, sugerindo outras vias de
atuação do pré-natal, além do tratamento de condições mórbidas. Quando as variáveis
proximais, peso e idade gestacional, eram incluídas no modelo, praticamente todas as
variáveis, inclusive o pré-natal, sofriam alteração na magnitude e na significância,
apontando para provável mediação do efeito na mortalidade através destas
características biológicas do concepto. Achados protetores semelhantes foram
encontrados na população do Rio, na relação entre pré-natal e baixo peso ao nascer 47,63.
Reforça-se a importância da assistência pré-natal adequada como estratégia para
diminuir as desigualdades na saúde perinatal, principalmente em populações como a
deste estudo 64.
Em relação às variáveis biológicas, duas questões metodológicas merecem
discussão: estimação da idade gestacional e do crescimento intra-uterino. A elevada
80
freqüência de realização de USG nesta população, mesmo entre as pacientes que não
realizaram pré-natal, somada à utilização dos dados antropométricos de RN e fetos
contribuíram para estimativa da IG em todos os controles e em 98% dos casos. Em
relação ao crescimento fetal, o uso da curva de Williams detectou 14% de RN PIG entre
os controles, achado semelhante em populações do sul
65
e nordeste do país 66, usando o
mesmo instrumento. Caso tivesse sido aplicada a curva de Lubchenco, seriam
diagnosticados apenas 5% de recém-nascidos pequenos para a idade gestacional,
mostrando a inadequação desta curva, ainda utilizada nas unidades públicas do MRJ.
O peso e a idade gestacional confirmaram-se como fatores com maior poder
explicativo para óbito neonatal precoce. Embora os óbitos fetais também cursassem
com pesos e idades gestacionais baixas, optou-se por não incluir estas variáveis como
proximais para óbito fetal. Vale ressaltar as diferentes interpretações para estas variáveis
quanto a óbito neonatal e fetal. No processo da neomortalidade, o baixo peso e a
prematuridade carreiam uma fragilidade inerente à imaturidade biológica, com quadros
específicos, como a doença de membrana hialina e maior suscetibilidade a infecções e
complicações, aumentando diretamente o risco de óbito. Ambos atuam como fatores
proximais que desencadeiam outros eventos na cadeia causal até a ocorrência do óbito.
No caso dos natimortos, processos mórbidos interferem na evolução normal da
gravidez, resultando em crescimento fetal retardado e/ou baixo peso e/ou parto
prematuro 1, fechando a cadeia causal. Assim, embora possa haver associação
estatística, a interpretação do fenômeno biológico deve ser diferenciada. Como o retardo
de crescimento fetal, proxy de insuficiência placentária, pode estar na origem dos
eventos, apenas CIUR foi incluído como variável proximal para óbitos fetais. No
modelo final, idade gestacional e crescimento intra-uterino perderam significância,
provavelmente pela grande colinearidade com o peso.
81
A adoção de modelos estruturados ou hierarquizados tem trazido novas
contribuições à compreensão de fenômenos multicausais na área da saúde perinatal e
infantil
. A escolha dos níveis de análise e da suposta inter-relação entre as
6,7,8,9,67
variáveis deve ser feita a priori, com base principalmente na plausibilidade biológica.
No entanto, é bastante difícil a definição de algumas destas relações, assim como a
avaliação de confundimento e interveniência. Os autores que utilizaram este modelo têm
feito diferentes escolhas quanto à estruturação dos níveis; enquanto variáveis como
renda e escolaridade sempre estão no nível distal, idade materna e situação marital ora
estão no distal, ora no intermediário.
No presente estudo, a variável violência na gravidez pode ser exemplificada para
discutir as peculiaridades deste tipo de análise. Apesar de ter ficado no nível
intermediário na análise principal, foi testada também no nível distal, como pertencente
ao grupo de fatores psico-sociais. Neste caso, não perdeu significância e manteve sua
magnitude com OR próximo de 2. Quando deslocada para o nível intermediário, o OR
foi semelhante mas deixou de ter significância. Isto pode ter ocorrido pelo fenômeno de
confundimento com pré-natal ou, por outro lado, por ser mediada pelo pré-natal. Por
conta destas duas possibilidades, independente da significância, optou-se por considerala uma variável explicativa para óbito perinatal nesta população.
Constituiu um fator limitante do estudo o fechamento parcial da unidade
neonatal, afetando o movimento de internações durante o 2º e o 3º trimestre de 2004.
Com isto, não se atingiu o número previsto de casos, diminuindo o poder estatístico do
estudo. É pouco provável que tenha havido viés de seleção no caso dos natimortos, pois
a grande maioria dos casos ocorreu no período anteparto, e não houve restrição
qualitativa para sua internação. No entanto, para os neomortos precoces, é difícil
avaliar, já que algumas pacientes de risco foram transferidas antes do parto para
82
unidades terciárias. Quanto aos oito casos que não participaram do estudo, a maioria era
de perdas fetais (6), seis não haviam realizado o pré-natal e as outras duas menos que
quatro consultas. Duas pacientes eram hipertensas e uma apresentava sífilis. Portanto,
caso tivessem entrado no estudo, provavelmente reforçariam o pré-natal como fator
protetor e morbidade como fator de risco.
Como última consideração, apesar do número reduzido, as análises isoladas de
óbitos fetais e neonatais precoces revelaram alguns aspectos distintos, reforçando a
recomendação de Kramer et al. 3 quanto à diferenciação etiológica dos dois fenômenos.
Portanto, em nosso meio, justifica-se ainda estudar a mortalidade perinatal como um
processo único, mas cabem análises da mortalidade neonatal precoce e fetal, que
possibilitarão um maior conhecimento e maior subsídio para intervenções.
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91
Tabela 1 – Variáveis maternas estudadas – casos e controles – óbitos perinatais, MLD, 2002 a 2004
Variáveis analisadas
Casos
(n=180)
Óbitos fetais
(n=134)
Óbitos neonatais Controles
(n=46)
(n=360)
Idade
≤ 19 anos
20-34 anos
≥ 35 anos
21,7
66,6
11,7
21,6
65,7
12,7
21,7
69,3
9,0
21,1
71,7
7,2
Cor da pele
Branca
Parda/Preta
31,1
68,9
26,9
73,1
43,5
56.5
35,6
64,4
Escolaridade
0-3
4-7
8-11
12 e +
13,4
44,4
40,4
1,7
11,2
47,8
41,0
0
6,5
43,5
49
2,0
10,0
46,7
42,7
0,6
Renda familiar
≤ 1 SM
1,1 a 3 SM
> 3 SM
22,3
52,2
25,5
23,1
49,9
27,0
20,0
60,0
20,0
20,6
53,9
25,5
Vínculo empregatício chefe da família
Sim
44,0
46,0
38,0
56,0
Situação conjugal
União estável
62,0
63,4
58,7
78,0
Acompanhante
Sim
Companheiro ou familiar próximo
89,5
88,0
90,2
87,0
87,0
90,0
96,4
93,0
Paridade
Primípara
1 a 3 partos anteriores
≥ 4 partos anteriores (grande multípara)
42,8
47.8
10,4
39,6
49,2
11,2
52,2
43,5
4,3
36,1
53.3
10,6
Óbito perinatal anterior
Sim
15,5
18,5
4,5
4,8
Morbidade
Sim
35,0
41,8
19,6
25,5
Episódio de violência doméstica
Durante a gravidez
Anteriores e/ou na gravidez
11,1
26,0
11,2
28,4
10,9
19,6
5,3
15,6
Tabagismo
Sim
25,0
30,0
10,9
19,2
Consumo de álcool
Sim
12,8
14,2
8,7
11,4
Índice de Kotelchuck
Adequado
Intermediário
Inadequado
27,4
15,1
57,6
26,1
14,9
59
32,6
15,2
52,2
40,0
17,0
43,0
Qualidade do pré-natal*
Bom
Ruim
30,7
69,3
28,0
72,0
34,8
65,2
68,2
31,8
92
Tabela 2 – Características dos fetos/RN – casos x controles – óbitos perinatais, MLD, 2002 a 2004
Variáveis analisadas
Casos (%)
Óbitos fetais
Óbitos
Controles (%)
(n=180)
(n=134)
neonatais
(n=360)
(n=46)
Sexo
Masculino
55,0
50,4
67,4
49,0
Feminino
45,0
49,6
32,6
51,0
Peso
Mediana (g)
1325
1370
1077
3180 g
Faixas de peso
< 1500 g
1500 – 1999 g
2000 – 2499 g
< 2500
≥ 2500 g
55,6
15,0
11,6
82,2
17,8
53,7
14,2
13,4
81,3
18,7
60,9
17,4
6,5
84,8
15,2
1,1
1,7
7,5
10,3
89,7
Idade gestacional
Mediana (semanas)
31
32
29
39
Faixas de idade gestacional
< 28 semanas
28-31
32-36
< 37
≥ 37
31,1
22,8
24,4
78,3
21,7
28,8
19,7
29,5
78,0
22,0
37,0
30,4
10,9
78,3
21,8
0,3
1,1
6,7
8,1
91,9
Relação peso/ idade gestacional
PIG
AIG
GIG
25,8
72,5
1,7
26,5
71,2
2,3
23,9
76,1
0
14,7
79,7
5,6
93
Tabela 3- Análise bivariada dos fatores distais e intermediários para mortalidade perinatal – MLD,
2002 a 2004
Variáveis analisadas
Óbitos perinatais
Óbitos fetais (n=134)
Óbitos neonatais (n=46)
(OR não ajustado)
(OR não ajustado)
(OR não ajustado)
Renda
> 1 SM
0,89 (0,57 –1,3)
0,87 (0,54-1,40)
0,94 (0,44-1,99)
Vínculo empregatício
Sim
0,64 (0,44- 0,93)
0,68 (0,45-1,03)
0,53 (0,27-1,02)
Escolaridade
≥ 8 anos
1,05 (0,73-1,5)
0,96 (0,64-1,44)
1,38 (0,74-2,55)
Cor da pele
Não-branca
1,22 (0,83-1,79)
1,5 (0,96-2,32)
0,71 (0,38-1,33)
Situação conjugal
Relação estável
0,466 (0,31-0,69)
0,49 (0,32-0,76)
0,39 (0,20-0,74)
Acompanhante
Sim
0,31 (0,15-0,65)
0,34 (0,15-0,77)
0,24 (0,08-0,69)
Idade
20-34 anos
≤ 19 anos
≥ 35 anos
1
1,1 (0,70-1,71)
1,73 (0,93-3,2)
1,11 (0,68-1,82)
1,91 (0,99-3,69)
1,06 (0,49-2,25)
1,24 (0,40-3,78)
Morbidade
Sim
1,64 (1,11-2,42)
2,09 (1,37-3,17)
0,70 (0,32-1,52)
Paridade
1 a 3 partos
Nulípara
Grande multípara
1
1,32 (0,90-1,93)
0,99 (0,53-1,87)
1,18 (0,77-1,81)
1,14 (0,59-2,22)
1,77 (0,94-3,34)
0,50 (0,11-2,25)
Óbito perinatal
Anterior
3.62 (1,6-8,1)
4,43 (1,96-10,23)
0,93 (0,11-7,63)
Tabagismo
Sim
1,4 (0,91-2,15)
1,79 (1,14-2,82)
0,51 (0,19-1,34)
Consumo de álcool
Sim
1,13 (0,66-1,96)
1,28 (0,71-2,30)
0,74 (0,25-2,17)
Violência gravidez
Sim
2,24 (1,16-4,32)
2,26 (1,11-4,59)
2,18 (0,77-6,17)
Pré-natal (APNCU)
Adequado
Intermediário
Inadequado
0,52 (0,35-0,79)
0,67 (0,39-1,12)
1
0,64 (0,41-1,01)
0,72 (0,41-1,28)
1
0,68 (0,30-1,82)
0,74 (0,30-1,82)
1
Pré-natal (qualitativo)
Bom
0,31 (0,21-0,46)
0,29 (0,19-0,45)
0,37(0,19-0,72)
94
Tabela 4 – Análise bivariada dos fatores proximais para mortalidade perinatal – MLD,
2002 a 2004
Óbito perinatal
Óbito fetal
Óbito neonatal precoce
Peso (contínua)
NT
NT
0,997 (0,996-0,9978)
Peso categorizado
< 2500g
1500-2499g
< 1500g
NT
NT
Idade gestacional
(contínua)
NT
NT
IG categorizada
< 37 sem
32-36 sem
< 32 sem
NT
NT
CIUR
2,07 (1,33- 3,25)
2,14 (1,31-3,48)
1,90 (0,90-3,98)
Sexo masculino
1,22 (0,85-1,74)
1,01 (0,68-1,50)
2,16 (1,12-4,13)
NT – não testado
48,6 (20,3-116,5)
15,4 (5,6-42,3)
323 (89,1-1170,6)
0,62 (0,56-0,69)
39,6 (17,89-87,61)
6,6 (2,09-20,80)
204,6 (65,8-636,5)
95
Tabela 5 – Análise multivariada estruturada (todas as observações) – Modelo final principal para
os três desfechos – óbito perinatal, fetal e neonatal precoce, MLD, 2002 a 2004
Modelos finais
ORs ajustados
Óbito perinatal
Modelo 1º nível - distal
Com vínculo empregatício
Relação conjugal estável
Presença de Acompanhante
0,64 (0,43-0,94)
0,53 (0,34-0,81)
0,28 (0,13-0,61)
Modelo do 2º nível – intermediário*
Pré-natal de boa qualidade
Pacientes sem morbidade
Pacientes com morbidade
0,43 (0,26-0,71)
0,20 (0,09-0,44)
Modelo do 3º nível – proximal **
CIUR
1,69 (1,02-2,81)
Óbito Fetal
Modelo 1º nível - distal
Relação conjugal estável
Presença de Acompanhante
Vínculo empregatício
0,54 (0,34-0,86)
0,31 (0,13-0,71)
0,69 (0,45-1,05) p=0,08
Modelo do 2º nível – intermediário*
Morbidade
Pré-natal boa qualidade
2,15 (1,38-3,35)
0,32 (0,20-0,50)
Modelo do 3º nível – proximal **
CIUR
1,95 (1,18-3,21)
Óbito Neonatal precoce
Sexo masculino
2,16 (1,12-4,13)
Modelo 1º nível - distal
Relação conjugal estável
Presença de Acompanhante
Vínculo empregatício
0,48 (0,24-0,96)
0,21 (0,07-0,62)
0,54 (0,27-1,07) p=0,08
Modelo do 2º nível – intermediário*
Nuliparidade
Pré-natal boa qualidade
2,05 (1,02-4,08)
0,32 (0,16-0,65)
Modelo do 3º nível – proximal **
Peso
Variável contínua
Categorizada (< 2500g)
0,997 (0,996-0,998)
11,87 (3,77-37,32)
Idade gestacional
Categorizada (< 37 semanas )
6,7 (2,25-20,06)
* ajustado para as variáveis do nível distal
** ajustado para as variáveis do nível distal e intermediário
96
Tabela 6 – Análise multivariada estruturada – Modelos finais para os três desfechos apenas em
multíparas, MLD, 2002 a 2004
Óbito perinatal
Óbito fetal
Óbito neonatal
(OR ajustado)
(OR ajustado)
precoce (OR ajustado)
Modelo 1º nível – distal
Relação conjugal estável
0,52 (0,28-0,96)
Presença de Acompanhante
0,29 (0,12-0,73)
0,55 (0,29-1,02)
(p=0,06)
NI
Morbidade
Pré-natal boa qualidade
1.82 (1,01-3,29)
0,22 (0,11-0,40)
2,09 (1,13-3,83)
0,24 (0,12-0,46)
Óbito perinatal anterior
5,59 (2,20-14,17)
5,91 (2,34-14,93)
Peso
Variável contínua
Categorizado: BPN (<2500)
NT
NT
Idade gestacional
Variável contínua
PMT (<37 sem)
NT
CIUR
2,24 (1,06-4,75)
NI
0,12 (0,03-0,44)
Modelo do 2º nível –
intermediário *
NI
0,36 (0,13-1,02)
(p=0,057)
NI
Modelo do 3º nível –
Proximal **
0,996 (0,994-0,998)
67,3 (7,44-609,33)
NT
NI
NI
* ajustado para as variáveis do nível distal
** ajustado para as variáveis do nível distal e intermediário
NT – não testado no modelo
NI – não incluído no modelo (sem significância)
2,12 (0,98-4,61)
p=0,056
NI
97
Tabela 7 – Análise multivariada estruturada - Modelos finais (alternativos) para todas as
observações – óbito perinatal, MLD, 2002 a 2004
Modelos
OR ajustado
Modelo com escore de Kotelchuck (APNCU)
Modelo 1º nível – distal
Com vínculo empregatício
Relação conjugal estável
Presença de Acompanhante
0,64 (0,43-0,94)
0,53 (0,34-0,81)
0,28 (0,13-0,61)
Modelo do 2º nível – intermediário *
Morbidade
Pré-natal adequado
Pré-natal intermediário
Violência gravidez
1.64 (1,07-2.51)
0,51 (0,32-0,81)
0,56 (0,31-1,00) p=0,053
2,06 (098-4,33) p=0,054
Modelo do 3º nível – proximal **
CIUR
2,24 (1,06-4,75)
Modelo considerando violência no nível distal
Modelo do 1º nível – distal
Com vínculo empregatício
Relação conjugal estável
Presença de Acompanhante
Violência gravidez
0,67 (0,45-0,99)
0,55 (0,36-0,84)
0,29 (0,13-0,63)
2,14 (1,04-4,42)
Modelo do 2º nível – intermediário*
Morbidade
Pré-natal boa qualidade
1.60 (1,03-2.48)
0,31 (0,20-0,48)
Modelo do 3º nível – proximal **
CIUR
1,8 (1,1-2,98)
* ajustado para as variáveis do nível distal
** ajustado para as variáveis do nível distal e intermediário
98
5. Considerações finais e desdobramentos
Duas vertentes podem ser consideradas a partir deste trabalho: a primeira, em
relação aos resultados encontrados quanto aos determinantes de óbito perinatal, e a
segunda, em relação aos aspectos metodológicos que perpassaram tanto os artigos
analisados na revisão quanto os desenvolvidos para esta tese. Para as duas vertentes,
alguns desdobramentos são sugeridos no âmbito dos serviços e no da pesquisa
epidemiológica.
Em relação aos serviços de saúde, colocam-se algumas questões: como realizar o
enfrentamento diante das desigualdades no âmbito da saúde pública? Como abordar
“variáveis” que escapam ao tradicional modelo de assistência, como a violência
doméstica, no atendimento às pacientes, durante o pré-natal? Como qualificar cada vez
mais o pré-natal e ampliar a cobertura?
Quanto aos desdobramentos na pesquisa, as questões concernem à melhor
aferição das variáveis, com o uso de instrumentos mais acurados e ao refinamento da
investigação, através de delineamentos e modelos de análise adequados.
Os resultados dos vários artigos nacionais e do estudo na Maternidade Leila
Diniz, aqui apresentados, parecem convergir para a evidência dos fatores
socioeconômicos na gênese da mortalidade perinatal e revelam que outros fatores já
sugeridos na literatura, como os psico-sociais – relação marital instável, violência
doméstica – podem estar contribuindo para o fenômeno, além das variáveis biológicas,
extensamente corroboradas como baixo peso ao nascer, prematuridade, e crescimento
intra-uterino retardado.
Por outro lado, a quantidade e mais ainda, a qualidade da assistência se mostra
capaz de proteger a população, já desfavorecida socioeconomicamente e com níveis de
99
morbidade elevados. Em que pesem as dúvidas sobre a relação de causalidade entre prénatal e desfechos perinatais, as diversas formas de análise neste trabalho e em outros
sugerem evidência em relação a este efeito protetor. Parte do efeito se explica pela
detecção e tratamento de morbidades, como hipertensão, infecção urinária e sífilis; ao
passo que o efeito sobre o peso do concepto, ainda que apontado como protetor em
vários trabalhos, permanece ainda controverso 1. Embora não tenha sido validado, o
critério de qualidade proposto para este trabalho teve resultados consistentes com o
APNCU e mostrou diferenças na mortalidade, mesmo com ajuste para variáveis
sabidamente envolvidas no acesso ao pré-natal.
Diferentes abordagens para mensuração de variáveis socioeconômicas têm sido
descritas; no entanto o poder discriminante tem se mostrado limitado em algumas
situações
, impedindo um melhor dimensionamento do efeito destas variáveis. No
2,3
presente estudo, tentou-se mensurar classe social, segundo a proposta de Lombardi et
al.4, mas a falta de informação sobre o grau de qualificação do companheiro
(escolaridade, tipo de atividade) impediu a classificação de um percentual elevado de
pacientes, principalmente entre os casos. No entanto, a variável “vínculo empregatício”
mostrou-se capaz de apontar para desigualdade socioeconômica na mortalidade
perinatal.
No caso da violência doméstica, o instrumento utilizado, o AAS (Abuse
Assessment Screening) detectou valor semelhante ao relatado no inquérito de Leal et al,
no estrato das maternidades públicas 5, porém inferior ao referido por Moraes e
Reichenheim 6, que usaram um instrumento mais acurado – Revised Conflict Tactics
Scales (CTS2), em população semelhante de usuárias do SUS. No entanto, o AAS foi
capaz de discriminar, no presente trabalho, as diferentes prevalências de violência
doméstica entre casos e controles.
100
Os dados sobre crescimento intrauterino mostraram um percentual elevado de
RN e fetos com retardo de crescimento fetal, ao se usar a curva recomendada pela OMS.
Esta questão tem sido pouco valorizada em nosso meio, e a curva utilizada ainda é a de
Lubchenco, inadequada sob vários aspectos metodológicos. É necessário que os
serviços adotem uma curva mais apropriada, seja a da OMS ou outra com o padrão
brasileiro. No âmbito da pesquisa também deve ser incentivada a adoção
preferencialmente da curva de Williams, para melhor comparabilidade entre os estudos.
Muitos trabalhos optaram por não avaliar idade gestacional, pelo elevado
percentual de informação ausente, seja em prontuários ou em registros vitais. No
presente trabalho foi possível estimar a IG para a maioria das pacientes, graças à
utilização de um algoritmo que privilegiou USG e utilizou também medidas
antropométricas do feto e recém-nascido. A mensuração dos fetos com peso igual ou
superior a 500g e de todos os RN deve ser mandatória, pela importância na definição da
idade gestacional e para o acompanhamento antropométrico no caso dos RN.
Nesta população chamou a atenção a freqüência de realização de ultrasonografia precoce, mesmo naquelas que não fizeram pré-natal. O acesso a este exame
foi facilitado pela oferta na própria unidade e pela existência, na região, de serviços
privados de imagem provavelmente acessíveis a estas pacientes. Embora estudos de
revisão não evidenciem papel protetor da USG precoce, ela se mostra bastante útil para
definir a IG correta e ajudar decisões como interrupção de gestações que cursam com
insuficiência placentária e CIUR grave.
As principais recomendações para os serviços de saúde dizem respeito ao prénatal. Ficou evidenciado que, tanto quanto a captação precoce, é importante o
acompanhamento no último trimestre, com consultas mais freqüentes. Várias pacientes
desenvolveram doença hipertensiva ou insuficiência placentária no último mês,
101
evoluindo para óbito fetal, e ficaram sem diagnóstico e conseqüente intervenção por
conta do espaçamento entre as consultas. Os resultados deste trabalho mostraram que o
pré-natal exerce efeito protetor ainda mais acentuado nas pacientes portadoras de
patologias, diminuindo o risco de mortalidade em até 80%. Para se obter este efeito é
preciso que no nível local, os fluxos de referência e contra-referência sejam mais ágeis
no atendimento à gestante de risco, principalmente no agendamento das consultas.
Não se justifica, à luz do conhecimento atual e da disponibilidade diagnóstica e
terapêutica, que ainda ocorram óbitos perinatais por sífilis. Apesar das campanhas
recentes para melhorar a investigação desta patologia e do conseqüuente decréscimo na
morbi-mortalidade 7, ela ainda ocupa um lugar importante na mortalidade perinatal. A
não realização do pré-natal foi o principal motivo de não se fazer o diagnóstico e
estratégias de captação devem ser pensadas para pacientes de risco.
O retardo de crescimento intra-uterino, associado ou não a outras morbidades se
mostrou um evento importante na mortalidade perinatal. Tecnologias simples como
mensuração da altura uterina e seu registro gráfico para o monitoramento do
crescimento fetal devem ser valorizadas; assim como deve ser ampliado o acesso a
tecnologias mais complexas, como Doppler-fluxometria.
Em relação a variáveis de cunho psico-social, como a violência doméstica, é
fundamental a abordagem multidisciplinar, e a capacitação dos profissionais de saúde
para o diagnóstico durante o pré-natal deve ser incentivada.
O cartão de pré-natal se mostrou uma ferramenta robusta tanto para pesquisa
quanto para assistência. Mais de 90% das pacientes compareceram à maternidade
portando seu cartão e a qualidade do registro se mostrou bastante boa. Existem dois
modelos de cartão em uso nas unidades do Rio de Janeiro e alguns ajustes poderiam ser
feitos para tornar a informação ainda mais completa.
102
Outras fontes de dados usadas tanto pelos serviços quanto pelos pesquisadores
são as declarações de nascido vivo (DNV) e de óbito (DO), já discutidas no primeiro
capítulo desta tese. Cabe novamente recomendar o estímulo ao preenchimento completo
e padronizado destes impressos, e, na medida do possível a revisão de variáveis como
idade gestacional e a inclusão de outras como avaliação de crescimento intra-uterino.
Finalizando, devem ser comentadas duas iniciativas recentes: a primeira, no Rio
de Janeiro 8, onde se propõe, além do tradicional monitoramento dos óbitos perinatais, a
inclusão de um sistema de vigilância ativa, incorporando a classificação de
evitabilidade; a segunda, do Ministério da Saúde 9, que instituiu os comitês de
prevenção do óbito infantil e fetal, no nível nacional, estadual e municipal. Os objetivos
principais destes comitês – monitoramento, melhoria da informação, investigação de
fatores de risco, implantação de estratégias para diminuição da mortalidade – vêm ao
encontro de vários aspectos discutidos neste trabalho e descortinam, junto à crescente
pesquisa epidemiológica nesta área, novas possibilidades de enfrentamento deste
relevante problema de saúde pública.
Referências bibliográficas
1. Silveira SD, Santos IS. Adequação do pré-natal e peso ao nascer: uma revisão
sistemática. Cad Saúde Pública 2004; 20 (5): 131-9.
2. Moraes CL. Aspectos Metodológicos relacionados a um estudo sobre a violência
familiar durante a gestação como fator de propensão da prematuridade do
recém-nascido. 2001. 237 f. Tese (Doutorado em Saúde Pública) – Escola
Nacional de Saúde Pública, Fundação Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro.
103
3. Swarcwald CL, Bastos FI, Andrade CLT. Medidas de desigualdad em salud: la
discusión de algunos aspectos metodológicos con una aplicación para la
mortalidad neonatal en el Municipio de Rio de Janeiro, 2000. Cad Saúde Pública
2002; 18 (4): 959-70.
4. Lombardi C, Bronfman M, Facchini LA, Victora CG, Barros FC, Beria JU,
Teixeira AMB. Operacionalização do conceito de classe social em estudos
epidemiológicos. Rev Saúde Pública 1988; 22(4):253-65.
5. Leal MC, Gama SGN, Campos MR, Cavalini LT, Garbayo LS, Brasil CLP,
Szwarcwald CL. Fatores associados à morbi-mortalidade perinatal em uma
amostra de maternidades públicas e privadas do Município do Rio de Janeiro
(MRJ), 1999-2001. Cad Saúde Pública 2004, 20 Suppl 1: S20-S33.
6. Moraes CL, Reichenheim ME. Domestic violence during pregnancy in Rio de
Janeiro, Brazil. Int J Obstet Gynecol 2002; 79:269-72.
7. Saraceni V, Leal MC. Avaliação da efetividade das campanhas de eliminação da
sífilis congênita na redução da morbidade e mortalidade perinatal: Rio de
Janeiro. Cadernos de Saúde Pública 2003; 19 (5): 1341-9.
8. Theme Filha MM, Silva RI, Saraceni V, Leal MC. Mortalidade perinatal no
Município do Rio de Janeiro: uma proposta de vigilância ativa. Revista
Brasileira de Epidemiologia. Suplemento especial (versão eletrônica) – junho de
2004. Livro de resumos, VI Congresso Brasileiro de Epidemiologia, Recife,
2004.
9. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações
Programáticas Estratégicas. Manual dos comitês de prevenção do óbito infantil
e fetal. Brasília: Ministério da Saúde, 2004.
104
ANEXOS
105
Anexo 1
Ficha de Investigação de Óbito Fetal e Neonatal –
Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro
Superintendência de Saúde Coletiva
Coordenação de Programas de Atenção Integral à Saúde
Coordenação de Programas de Epidemiologia
(FRENTE)
UNIDADE:
DATA PREENCHIMENTO:
AP:
/
/
RESPONSÁVEL:
I. IDENTIFICAÇÃO MATERNA
Nome:
Idade:
Cor:
Nº prontuário:
Procedência:
Resideência
Outra Instituição: ___________________
Endereço:
Grau de Instrução: 1. Nenhum 2. 1ºgr.Inc. 3. 1ºgr.comp. 4. 2ºGrau 5. Sup
Situação conjugal:
Ocupação:
Observações:
6. Ignorado
II. ANTECEDENTES OBSTÉTRICOS
Gestações:
Abortos:
Partos: Vaginais:____ Cesáreo _______ Fórceps________
III. ASSISTÊNCIA PRÉ-NATAL
Pré-natal: 1. Sim 2. Não 6. Ignorado 7. Não consta no prontuário
Local(is):
Época de início: 1. 1º trim 2. 2º trim
3. 3º trim
6. Ignorado 7. Não consta no prontuário
Número de consultas: 1. < 3 2. 3 a 5
3. 6 ou mais
6. Ignorado 7. Não consta no prontuário
Intercorrências: : 1. Sim 2. Não
DHC
Hipert Gest. /toxemia
Hepatite B
Isoimunização Rh
Diabetes
Fumo.....cig/dia
HIV
Cardiopatia
Diabetes gestac.
Toxoplasmose
Sífilis
Rubéola
Medicações __________________
Drogas __________________________
Hemorragia_____ trimestre
Outras doenças infecciosas: ________________
Observações: __________________
IV. DADOS DA ADMISSÃO, TRABALHO DE PARTO E PARTO
Data de Admissão:___/___/____ Horário: ____h_____min. 6. Ignorado 7. Não consta no prontuário
BCF na Admissão: 1. Positivo 2. Inaudível 6. Ignorado 7. Não consta no prontuário
Duração total do trabalho de parto: _______ horas 6. Ignorado 7. Não consta no prontuário
Amniorrexe: 1. No ato 2. < 6 horas
3. 6 a 24 horas 4. > 24 horas 6. Ignorado 7. Não consta no prontuário
Características do líquido amniótico:
claro sem grumos
claro com grumos
tinto de mecônio
mecônio espesso
fétido/purulento
Hemorrágico
ausente
ignorado Não consta no prontuário
Características Placenta/ Cordão Umbilical ____________________
Parto: 1. Vaginal
2. Cesáreo
Local de Ocorrência:
1. Hosp.
3. Fórceps
Data: :___/___/____ às ____h_____min
2. via pública
3. transp. Domic.
4. outros
5. domicílio
6. Ignorado
7. Não consta no prontuário
Duração do per. Expulsivo: ____________min
6. Ignorado
7. Não consta no prontuário
Intercorrências durante a Internação, o trabalho de parto e o parto:
Procedimentos e/ou medicamentos utilizados durante a internação, o trabalho de parto e o parto:
106
Observações :
107
(VERSO)
V. TIPO DE ÓBITO
1. FETAL
2. NÃO FETAL
EM CASO DE ÓBITO FETAL, PULE PARA O ITEM VII
EM CASO DE ÓBITO NÃO FETAL, PREENCHA O ITEM VI
VI. DADOS DO RECÉM-NASCIDO E EVOLUÇÃO CLÍNICA NEONATAL
Nome:
Nº Prontuário:
Idade:
Nº DN:
Score/risco:
Sexo: 1. masculino
2. feminino
6. ignorado
7. não consta no prontuário
Peso: ___________g
Idade Gestac.: DUM _____sem Ballard ______ sem CS _______sem
1. AIG
2. PIG
3. GIG
Apgar : 1º min_____ 6. ignorado
7. não consta no prontuário
Apgar : 5º min_____ 6. ignorado
7. não consta no prontuário
Manobras de reanimação na Sala de parto: 1. Sim
2. Não
6. ignorado
7. não consta no prontuário
O2 inalatório
Ambu + máscara
Tubo traqueal
Massagem cardíaca
Cateterismo umbilical
Drogas_______________________________
Tocotraumatismo: : 1. Sim 2. Não 6. ignorado
Anomalia Congênita: 1. Sim ____________________________ 2. Não 6. ignorado
VDRL materno: 1. Pos./título______
2. Neg.
VDRL RN
: 1. Pos./título______
2. Neg.
Intercorrências:
Hipoglicemia
Aspiração Meconial
alterações hemodinãmicas
Tratamento:
Fototerapia
3. Não realizado 7. Não consta no prontuário
3. Não realizado 7. Não consta no prontuário
Convulsão
Pneumonia
Dç. Memb. Hialina
Distúrbios iônicos
Sepse
hidratação venosa _________ dias
Taquipnéia transitória
Pneumotórax
Icterícia
Assistência ventilatória: CPAP nasal _____ dias Respirador _______dias
Hood ______ dias
NPT: 1. Sim ________ dias
2. Não
Surfactante: 1. Sim 2. Não nº doses ____
Cateterismo umbilical arterial : 1. Sim ___dias
2. Não
Venoso: 1. Sim ___dias
2. Não
Antibioticoterapia:
Esquema
Antibiótico
1. Sim
2. Não
Exsanguineotransfusão:
1. Sim, parcial
2. Sim, total
2. Não
1º esquema_______________________ dt. Início: ________ __________ dias
2º esquema_______________________ dt. Início: ________ __________ dias
3º esquema_______________________ dt. Início: ________ __________ dias
VII. EM CASO DE ÓBITO FETAL
Peso: _______g
Sexo:
Idade gestac.: DUM____sem
1. Admitido Morto
2. Óbito na gestação durante a internação
USG: ______sem
. Óbito no trabalho de parto
VIII. DADOS DO ÓBITO
Data:
/
/
_____h_____min
Dia da semana ___________ feriado 1. Sim
Local de ocorrência:
1. Hospital
2.domicílio 3. via pública
4. outros
Causa mortis: a)____________________________________________________________
b)__________________________________________________
c)__________________________________________________
d)__________________________________________________
Observações complementares:_______________________________________
Dados da Anatomia Patológica: ________________________________________
Obs: modelo de impresso utilizado no período de coleta dos dados do artigo 2
2. Não
108
ANEXO 2
Instrumento de coleta
Identificação
Prontuário ___________
Nº pesquisa _____________
Data de Nascimento _____/_____/ ________
Idade _______ Cor ___________
Residência (Bairro) _______________________________
Naturalidade ______
Dados socioeconômicos
1. Escolaridade
1a Sabe ler e escrever? 1.Sim ( ) 2. Não ( ) 9.NI ( )
1b Estudou até a ..... série (completa) do ..... grau / não estudou ( ) / NI ( )
anos de estudo _________________
2. Renda familiar
Valor.........(somando paciente + companheiro + outros familiares + ajudas, tipo cesta básica)
em salários mínimos = _________________
3. Ocupação
3a Tipo: trabalho doméstico ( ) trabalho fora de casa ________________ ( ) NI ( )
3b Trabalhou ? 1. não ( ) 2. parte da gravidez ( ) 3. toda a gravidez ( ) 9.NI ( )
Chefe da família .................................. Ocupação ...................................Salário.........
Vínculo empregatício: ( ) sim ( ) não
4. Situação familiar/ apoio social
4.1.Estado marital:
1.Sem companheiro ( ) 2. Tem companheiro, mas não vive c/ ele ( )
3. Vive com companheiro ( ) 4. Casada ( ) 5. Separada ( )
6. Viúva ( ) 9. NI ( )
Viveu com o companheiro durante toda a gestação? ( ) sim ( ) não
109
4.2. Idade do Pai da criança: ______NI ( )
4.3. Escolaridade do pai: estudou até a ___ série do ___ grau / não estudou ( ) / NI ( )
4..4. Ocupação ____________________ salário ________________
Caso não viva c/ companheiro
4.5.. Vive só ( ) Com filhos ( ) Com familiares ( ) Com amigos ( ) Outra ( )
4.6. Como chegou à maternidade?
Carro( ) táxi( ) ônibus( ) a pé( ) kombi/van ( ) ambulância ( ) outro ( ) NI ( )
4.7. Veio acompanhada de alguém? Sim ( ) Não ( )
Quem: companheiro ( ) mãe ( ) familiar ( ) amiga (o) ( ) outro __________ NI ( )
5. Antropometria/Nutrição materna
6a Qual era seu peso antes da gravidez? ______ NI ( )
6b Qual a sua altura? ______ NI ( )
6c Ganho de peso na gestação _________ (cartão) / (aproximadamente_______) NI ( )
6dVocê acha que seu apetite mudou na gestação? 1.Sim ( )
2. não ( ) 9. NI ( )
6e Você costuma beber alguma bebida alcoólica? 1.Sim ( )
2. não ( ) 9. NI ( )
6f Você sentiu necessidade de diminuir a bebida durante a gravidez (C)?
1.Sim ( )
2. não ( ) 3. NA ( )
9. NI ( )
6. Hábitos (durante a gravidez)
7a Fumou durante a gravidez? 1.Sim ( )
2. Não ( ) 9. NI ( )
7b Em que período? Toda a gestação ( ) Parou no ... mês ( ) 9. NI ( )
7c. Quantos cigarros por dia ? ............. 9. NI ( )
7c As pessoas a aborreciam criticando seu modo de fumar?
1.Sim ( )
2. Não ( ) 3. NA ( )
9. NI ( )
7d As pessoas a aborreciam criticando seu modo de beber (A)?
1. não bebe 2. Sim ( ) 3. Não ( ) 9. NI ( )
110
7g Quantas doses são necessárias para deixar você “alta”? (T)
1. não bebe ( ) 2. Uma ( ) 3. Duas ( ) 4. > duas ( )
9. NI ( )
7h Você dormiu bem durante a gravidez? 1. Sim ( ) 2. Não ( ) 9. NI ( )
7i Costumava acordar durante a noite? 1. Sim ( ) 2. Não ( )
9. NI (
)
7j Alguma vez precisou de uma dose de bebida para começar o dia? (E)
1. Não bebe ( ) 2. Sim ( ) 3. Não ( )
9. NI ( )
7. História clínica
8 a Alguma doença antes da gravidez? 1.Sim ( )
8 b Hipertensão ( ) Diabetes ( )
2. Não ( ) 9. NI ( )
Infecção urinária ( ) Sífilis ( )
Outra ( ) __________________________ NI ( )
8c Fazia acompanhamento clínico? 1.Sim ( )
2. Não ( ) 3. NA ( )
9. NI ( )
8 d Tratamento durante a gravidez? 1.Sim ( )
2. Não ( ) 3. NA ( )
9. NI ( )
8e Intercorrência clínica nesta gravidez? 1. Sim ( ) 2. Não ( ) 9. NI ( )
Qual? __________________________________________________________
Observações:
111
8. Violência domiciliar – (versão em português do Abuse Assessment Screen)
1. Você já foi alguma vez maltratada emocionalmente ou fisicamente pelo seu parceiro
ou alguém importante para você?
SIM ( ) NÃO ( )
2. Neste último ano (12 meses), alguém lhe bateu, esbofeteou, chutou ou machucou
fisicamente?
SIM ( ) NÃO ( )
Caso afirmativo, quem? (Por favor, marque com um círculo uma ou mais opções)
Marido Ex-marido Namorado Estranho Outro
Número de vezes ................
3. Desde que você engravidou, alguém lhe bateu, esbofeteou, chutou ou machucou
fisicamente?
SIM ( ) NÃO ( )
Caso afirmativo, quem? (Por favor, marque com um círculo uma ou mais opções)
Marido Ex-marido Namorado Estranho Outro
Número de vezes ................
Marque cada episódio de acordo com a escala a seguir:
1. Ameaça de maus-tratos/ agressão, inclusive com arma
2. Tapa, empurrão, sem machucar ou ferimento ou dor duradoura
3. Soco, chute, machucado/ mancha roxa, cortes e/ou dor contínua
4. Espancamento, contusões severas, queimaduras, ossos quebrados
5. Danos na cabeça, internos ou permanentes
6. Uso de armas, ferimento por arma
4. Neste último ano (12 meses), alguém forçou você a realizar atividades sexuais?
SIM ( ) NÃO ( )
Caso afirmativo, quem? (Por favor, marque com um círculo uma ou mais opções)
Marido Ex-marido Namorado Estranho Outro
Número de vezes ................
5. Você tem medo do seu parceiro ou de alguém listado acima?
SIM ( ) NÃO ( )
112
9. História obstétrica
10a Paridade – Gesta _____ Partos _______ Cesáreas ____ Abortamentos __________
10 b Intervalo interpartal – data parto anterior: ____/____/___
(___anos)
10c Desfecho perinatal prévio – natimorto ( ) neomorto ( )
10 d Intercorrência obstétrica nesta gravidez 1.Sim ( )
2. Não ( ) 9. NI ( )
Qual?
10. Assistência perinatal
Pré-natal: 1.Sim ( )
2. não ( ) 9. NI ( )
Local ___________ NI ( ) Nº consultas ____
Sabe a DUM? 1.Sim ( )
2. não ( ) 9. NI ( ) ____/_____/____
Cartão – sim ( ) não ( )
Início PN: data (cartão): ____/____/___ Peso início..............
Final PN (____/____/___) peso............
IG início: ........ semanas de gestação/ ou .......mês da gestação
dT- sim ( ) não ( ) VDRL - sim ( ) não ( ) Resultado______ Tratamento sim ( ) não ( )
EAS- sim ( ) não ( ) Resultado ________Tratamento sim ( ) não ( )
PA - sim ( ) não ( ) Resultado ________ Tratamento sim ( ) não ( )
FU - sim ( ) não ( ) Medidas de FU: data (...cm):
.../.../....(
) ../.../....( ) ../.../....( ) ../.../....( ) ../.../....( ) ../.../....( ) ../.../....( ) ../.../....( )
USG - sim ( ) não ( ) 1ª ___/____/____ IG ______ 2ª ______/_____/______ IG ____
Admissão
Foi fácil conseguir vaga? Sim ( ) não ( ) ______________________________
Data _________ Hora ________
Parto – hospitalar ( ) domiciliar ( ) via pública ( ) ____________________
Ausculta feto – BCF positivo ( ) negativo ( ) NI ( )
Tipo de parto – vaginal ( ) fórceps ( ) cesáreo ( ) Indicação______________ NI ( )
Apresentação – cefálica ( ) pélvica ( ) outra ____________ NI ( )
Data – _____/_____/____ Hora ________
______________________________________________________________________
113
11. Desfecho perinatal
Óbito fetal 1. Sim ( ) 2. Não ( ) Data ____________ Hora _______
Admitido morto ( ) Gestação ( ) Trabalho de parto ( )
Peso ...........g
Sexo ( ) Comprimento: ......................
IdGest - DUM ____s ____ d / USG ____s ____ d / ignorado ( )
Avaliação de CIUR – PIG( ) AIG ( ) GIG( ) / ignorado ( )
Óbito neonatal 1. Sim ( ) 2. Não ( ) Data ___________ Hora ___________
Peso ...........g
Sexo ( ) comprimento................ Apgar ...../.....
Idade (óbito) ..... dias e ...... horas de vida
IdGest : DUM ___s ___ d/ USG ___s___ d /Capurro ___s ___ d / Ballard ___s ___ d /
ignorado ( )
Avaliação de CIUR – PIG( ) AIG ( ) GIG( ) / ignorado ( )
Observações quanto à assistência perinatal (comissão de óbito)
Falha na assistência obstétrica 1. Sim ( ) 2. Não ( ) 9. NI ( )
Falha na assistência neonatal 1. Sim ( ) 2. Não ( ) 9. NI ( )
Outras ( ) ___________________________________________
_____________________________________________________________________
12. Causa do óbito/ Classificação
Causa mortis ______________________________
______________________________
______________________________
______________________________
CID causa básica ____________
Classificação Wigglesworth/ KeelingAnteparto ( )
Intraparto/Asfixia ( )
Prematuridade ( )
Malformação ( )
Específicas ( )
114
ANEXO 3
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
Estamos realizando uma pesquisa que faz parte de uma tese de doutorado.
Esta pesquisa é sobre fatores que podem interferir na gravidez e no parto e que
podem trazer problemas para o bebê. As informações que você fornecer vão nos
ajudar a entender porque estes problemas acontecem e como podemos melhorar o
atendimento nos serviços de saúde, tentando resolver estes problemas.
Gostaríamos de fazer uma entrevista com você, perguntando sobre sua saúde,
sua escolaridade, seu trabalho, seus hábitos, suas outras gestações, seu pré-natal e
outras questões. Se você concordar em participar deste estudo, a entrevista poderá
ser realizada agora ou em outro momento, se você preferir.
Sua participação no estudo é uma escolha, e não vai interferir de forma alguma
no seu tratamento aqui na maternidade. Você pode interromper a entrevista quando
quiser, pode perguntar qualquer dúvida, e pode se recusar a responder algumas
perguntas. Todas as informações deste estudo serão confidenciais, isto é, seu nome
não aparecerá em nenhum momento. Os resultados da pesquisa serão apresentados
em conjunto, não sendo possível identificar as pessoas que participaram.
Você receberá uma cópia deste termo onde consta o telefone e o endereço do
pesquisador principal, podendo tirar suas dúvidas sobre o projeto e sua participação,
agora ou a qualquer momento.
Sua participação é muito importante e agradecemos a sua atenção.
Declaro que compreendi as informações deste termo de consentimento e concordo
em participar da pesquisa
Assinatura da entrevistada (ou responsável legal, em caso de mãe adolescente)
Pesquisadora principal: Dra Sandra Fonseca – Tel 24414790
115
Anexo 4
Índice de Adequação da Utilização do Pré-Natal
Adequacy of Prenatal Care Utilization Index
I. Mês de início do pré-natal (Adequação do Início do pré-natal)
Mais que adequado: 1º ou 2º mês
Adequado: 3º ou 4º mês
Intermediário: 5º ou 6º mês
Inadequado: 7º mês em diante, ou nenhuma consulta
II. Proporção alcançada do número de consultas recomendadas pelo Colégio
Americano de Obstetras e Ginecologistas (Adequação de serviços recebidos)
Mais que adequado: ≥ 110%
Adequado: 80-109%
Intermediário: 50-79%
Inadequado: <50%
III. Sumarização do Índice de Adequação do Pré-Natal
Mais que adequado: início até o 4º mês e 110% ou mais das consultas recomendadas
Adequado: início até o 4º mês e 80-109% das consultas recomendadas
Intermediário: início até o 4º mês e 50-79% das consultas recomendadas
Inadequado: início após o 4º mês ou <50% das consultas recomendadas
Fonte: Kotelchuck M. An evaluation of the Kessner Adequacy of Prenatal Care Index and a
proposed Adequacy of Prenatal Care Utilization Index
116
Anexo 5
Instrumento para avaliar violência domiciliar
Abuse Assessment Screen
1) Have you ever been emotionally or physically abused by your partner or YES
some one important to you?
NO
YES
NO
3) Since you’ve been pregnant, have you been hit, slapped, kicked, or YES
otherwise physically hurt by someone?
If yes, by whom? (circle all that apply)
Husband Ex-husband Boyfriend Stranger Other Multiple
Number of times_______
NO
2) Within the last year, have you been hit, slapped, kicked, or
otherwise physically hurt by someone?
If yes, by whom? (circle all that apply)
Husband Ex-husband Boyfriend Stranger Other Multiple
Number of times_______
Mark the area of injury on a body map
Score each incident according to the following scale
Threats of abuse, including use of a weapon
Slapping, pushing; no injuries and/or lasting pain
Punching, kicking, bruises, cuts, and/or continuing pain
Beaten up severe contusions, burns, broken bones
Head, internal, and/or permanent injury
Use of weapon, wound from weapon
4) Within the last year, has anyone forced you to have sexual
activities?
If yes, by whom? (circle all that apply)
Number of times_______
YES
NO
5) Are you afraid of your partner or anyone listed above?
YES
NO
•
•
•
Respostas positivas às questões 2, 3 ou 4 são indicativas de violência doméstica.
A versão em português utilizada neste trabalho está contida no instrumento de coleta,
no item número 8.
Fonte: Mac Farlane et al. Assessing for abuse during pregnancy. JAMA 1992;
267(23):3176-8.
117
Anexo 6
Instrumento para avaliar consumo de álcool
T-ACE – questionário para identificar consumo de risco , isto é, suficiente para causar
danos ao embrião/feto
T – How many drinks does it take to make you feel high? (TOLERANCE)
A – Have people ANNOYED you by criticizing your drinking?
C – Have you felt you ought to CUT DOWN on your drinking?
E – Have you ever had a drink first thing in the morning to steady our nerves or get rid
of a hangover (EYE-OPENER)?
• Resposta positiva ao item T = 2 pontos, aos demais itens = 1 ponto. Escore ≥ 2
indica consumo de risco
• Fonte: Sokol et al. The T-ACE questions: practical prenatal detection of riskdrinking. Am J Obstet Gynecol 1989; 160: 863-70.
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estudo da mortalidade perinatal em uma região do rio de janeiro